Patricia Rego _ Domingas Simplicio Redes Localizadas a Participação Cívica, Meio Local

12
REDES LOCALIZADAS: A PARTICIPAÇÃO CÍVICA, A PARTIR DO MEIO LOCAL Patrícia Pedro-Rêgo * Domingas Simplício ** Palavras-chave: Participação cívica, voluntariado, território, redes localizadas. 1. Introdução A participação cívica pode ser analisada através da prática voluntária desenvolvida em organizações privadas sem fins lucrativos, o designado terceiro sector. Este abarca uma multiplicidade de interesses sociais, lúdicos, desportivos e culturais. As oportunidades de participação ligam-se ao desenvolvimento dos direitos de cidadania. Em particular o elemento social de cidadania é constituído pelo conjunto de direitos relativos ao bem-estar económico e social aspecto que, em Portugal, se estrutura tardiamente, na realidade só depois da mudança política ocorrida em 1974. Nesta comunicação o que nos interessa analisar é a liderança dos grupos de cidadãos formalmente organizados em actividades ou instituições com uma inscrição territorial. Interessa-nos identificar não só perfis e motivações destes dinamizadores locais como também os interesses particulares ou gerais que representam e as redes de liderança em que se inscrevem no território. O território é então um espaço público de acção colectiva onde os dirigentes estão em posição privilegiada para estabelecer relações com espaços mais vastos. Assim, a concepção de território que nos interessa integra as componentes que Ferrão (2001) designa de territorializadas (exprimindo proximidade, encontro quotidiano e existência de especificidades sociais e culturais partilhadas pela população) e em rede (traduzindo interacção, integração, conectividade e organização em rede). O território que integra estas * Universidade de Évora, Dep. Geociências, e-mail: [email protected] ** Universidade de Évora, Dep. Geociências, e-mail: [email protected]

description

Patricia Rego _ Domingas Simplicio Redes Localizadas a Participação Cívica, Meio Local

Transcript of Patricia Rego _ Domingas Simplicio Redes Localizadas a Participação Cívica, Meio Local

  • REDES LOCALIZADAS: A PARTICIPAO CVICA, A PARTIR DO

    MEIO LOCAL

    Patrcia Pedro-Rgo*

    Domingas Simplcio**

    Palavras-chave: Participao cvica, voluntariado, territrio, redes localizadas.

    1. Introduo

    A participao cvica pode ser analisada atravs da prtica voluntria desenvolvida em

    organizaes privadas sem fins lucrativos, o designado terceiro sector. Este abarca uma

    multiplicidade de interesses sociais, ldicos, desportivos e culturais.

    As oportunidades de participao ligam-se ao desenvolvimento dos direitos de cidadania.

    Em particular o elemento social de cidadania constitudo pelo conjunto de direitos relativos

    ao bem-estar econmico e social aspecto que, em Portugal, se estrutura tardiamente, na

    realidade s depois da mudana poltica ocorrida em 1974.

    Nesta comunicao o que nos interessa analisar a liderana dos grupos de

    cidados formalmente organizados em actividades ou instituies com uma inscrio

    territorial. Interessa-nos identificar no s perfis e motivaes destes dinamizadores

    locais como tambm os interesses particulares ou gerais que representam e as redes de

    liderana em que se inscrevem no territrio. O territrio ento um espao pblico de

    aco colectiva onde os dirigentes esto em posio privilegiada para estabelecer

    relaes com espaos mais vastos.

    Assim, a concepo de territrio que nos interessa integra as componentes que Ferro

    (2001) designa de territorializadas (exprimindo proximidade, encontro quotidiano e existncia

    de especificidades sociais e culturais partilhadas pela populao) e em rede (traduzindo

    interaco, integrao, conectividade e organizao em rede). O territrio que integra estas

    * Universidade de vora, Dep. Geocincias, e-mail: [email protected] ** Universidade de vora, Dep. Geocincias, e-mail: [email protected]

  • 2

    duas perspectivas na acepo deste autor um meio localizado que retoma a designao

    apresentada por Bourdin em 2000.

    Aceitando o conceito de participao defendido por Antnio Barreto segundo o

    qual a participao a aco tendente a envolver um cidado ou um grupo de

    cidados nos processos comunitrios, cvicos e polticos que lhes dizem respeito

    (2002, p.45) possvel distinguir a participao segundo a sua natureza em poltica,

    cvica e social. Entendemos, no entanto, que a vastido do mbito da participao

    cvica tal que ela recobre, na nossa perspectiva, as formas mais particulares de

    participao poltica e social.

    Atendendo a que a participao cvica pressupe a actuao de actores em meios

    localizados, o contexto das suas aces no pode descurar o conceito de capital

    social. Putnam (2000) faz a seguinte formulao para este conceito: O capital

    social refere-se a relaes entre indivduos redes sociais e normas de reciprocidade

    e confiana delas resultantes (p.19). Segundo este autor, o capital social assume

    duas formas: uma correspondente s redes sociais de proximidade desenvolvidas no

    interior de um lugar/comunidade (bonding capital); a outra prende-se com as redes

    sociais de longa distncia, desenvolvidas entre lugares/comunidades (bridging

    capital).

    Os poucos dados relativos participao cvica da populao portuguesa, patentes no

    Estudo Europeu dos Valores em 1990 e 1999, indicam no s que esta fraca no contexto

    europeu como tem diminudo (quadro I).

    A explicao para os baixos valores de participao cvica em Portugal tem sido

    encontrada na tardia democracia portuguesa, na persistncia de uma incipiente cultura

    cvica, na estrutura scio demogrfica da populao, nas caractersticas do mercado

    laboral, na fraca socializao familiar sobre as prticas de participao, na importncia

    da participao cvica informal e na estrutura do terceiro sector portugus pouco

    receptivo ao acolhimento de trabalho voluntrio (Delicado, 2002 e 2003;Barreto, 2002;

    Pedro-Rgo, 2001).

  • 3

    Quadro I Taxas de pertena e voluntariado em associaes

    Pertena a associaes

    Voluntariado em associaes

    Portugal 1990 34,0 18,9

    Portugal 1999 25,6 16,3

    EU 1990 54,7 57,2

    EU 1999 57,3 37,3

    Espanha 30,9 17,6

    Itlia 43,8 30,7

    Frana 38,7 26,4

    Alemanha 51,5 24,3

    Reino Unido 50,9 38,0

    Sucia 87,8 68,0

    Dinamarca 96,1 56,4

    Fonte: Valores Sociais: mudanas e contrastes em Portugal e na

    Europa, 2003, ICS-UL, coord. J. Vala; M. Villaverde Cabral; A.

    Ramos, p.233

    No entanto, a participao cvica no igual em todo o territrio verificando-se que ela

    afectada pela dimenso dos lugares sendo mais intensa nas pequenas localidades (quadro II). Assim

    focaremos a nossa ateno nos meios locais de pequena dimenso onde a participao

    significativa e onde a sociedade civil apresenta aspectos particularmente dinmicos.

    Quadro II Pertena e voluntariado em associaes segundo a dimenso da localidade

    Dimenso da localidade Pertena a associaes (%) Voluntariado em associaes (%)

    Menos de 2000 habitantes 43,8 36,6

    2000 a 20000 habitantes 23,6 25,3

    20000 a 100000 habitantes 15,9 15,9

    Mais de 100000 habitantes 16,8 22,1

    Fonte: Valores Sociais: mudanas e contrastes em Portugal e na Europa, 2003, ICS-UL, coord.

    J. Vala; M. Villaverde Cabral; A. Ramos, p.240

    A anlise do envolvimento cvico dos lderes associativos concretiza-se nesta

    fase da investigao em dois meios localizados de nvel hierrquico diferenciado no

  • 4

    espao alentejano: Alcovas (2100 habitantes e 20 associaes) e Montemor-o-Novo

    (11000 e 80 associaes).

    A participao cvica nestes meios que constituem contextos particulares de

    interaco (entre indivduos e organizaes) e aco (de indivduos e organizaes)

    pe em evidncia a sua componente relacional: O territrio constitui, de facto, uma

    componente essencial dos processos de construo social da cidadania, pelos

    contextos particulares de interaco social e de aco colectiva que propicia

    (Ferro, 2001, p.5).

    Se a participao cvica permite concretizar os projectos colectivos dos

    dinamizadores locais, a importncia desta participao os seus efeitos sociais e

    territoriais depende da capacidade destes indivduos em conseguir adaptar a

    informao que possuem ou a que acedem s necessidades concretas das

    comunidades onde se inserem e que pretendem representar.

    De qualquer modo o patrimnio em capital social dos lderes associativos locais

    parece ser um elemento fundamental na construo social da cidadania.

    2. Metodologia

    A metodologia seguida partiu de um conjunto de entrevistas realizadas a dirigentes

    dinmicos e particularmente bem inseridos no meio associativo. Alguns destes dirigentes tm

    um longo percurso de participao cvica e pertencem direco de mais do que uma

    associao. As doze associaes que motivaram o contacto com estes voluntrios situam-se

    em Alcovas (seis) e Montemor-o-Novo (seis) e so de tipo diversificado desde as

    dominadas por actividades culturais, recreativas e desportivas at s de cariz social e poltico

    As entrevistas seguiram um guio tipo mas que permitiu respeitar o discurso do

    entrevistado, no incluindo questes fechadas. As questes incidiram sobre os percursos de

    vida dos voluntrios, as motivaes para o voluntariado e as dificuldades e encargos desta

    ddiva de tempo. Os entrevistados reflectiram ainda sobre a promoo do voluntariado e

    sobre a ligao das associaes ao territrio.

    A caracterizao qualitativa dos voluntrios, obtida atravs das entrevistas, foi

    completada por uma componente quantitativa respeitante recolha de dados scio-

    econmicos (quadro III).

  • 5

    Apesar da dificuldade de sistematizar as respostas obtidas nas entrevistas, efectuou-se

    uma anlise do contedo do discurso directo dos voluntrios, identificando ideias recorrentes

    (trs ou mais respostas idnticas) e especficas mas relevantes para a investigao.

    Quadro III Caracterizao dos entrevistados (voluntrios de direco)

    Caractersticas N de

    entrevistas

    Sexo

    Homens

    Mulheres

    7

    5

    Idade

    20 30 anos

    31 45 anos

    46 50 anos

    1

    7

    4

    Naturalidade

    da localidade

    de fora

    3

    9

    Residncia

    na localidade

    fora da localidade

    11

    1

    Condio perante o trabalho

    activos

    desempregados

    11

    1

    Profisso

    cientficas, tcnicas, artsticas

    quadros superiores administrat.

    administrativos

    militares

    7

    2

    2

    1

    Caractersticas N de

    entrevistas

    Escolaridade

    6 ano

    9 ano

    12 ano

    ensino superior

    ensino ps-graduado

    1

    1

    1

    5

    4

    Estado civil

    solteiros

    casados

    divorciados

    2

    9

    1

    Rendimentos ilquidos mensais

    menos de 400 euros

    400 1000 euros

    1000 2500 euros

    mais de 2500 euros

    no responde

    1

    0

    8

    2

    1

    Prtica religiosa

    praticante

    no praticante

    sem religio

    5

    5

    2

    3. Resultados

    O dinamismo de participao cvica evidenciado nos voluntrios de direco de Alcovas

    e Montemor-o-Novo parece resultar de altos valores de capital social patentes quer na

    caracterizao scio-econmica efectuada quer nas ideias defendidas nas entrevistas.

  • 6

    Esta actividade cvica potenciada pela pequena dimenso destas comunidades onde as

    actuaes destes actores particularmente qualificados intensificam o desenvolvimento de

    redes de proximidade ao mesmo tempo que inscrevem os lugares em redes de longa distncia.

    Assim, a participao cvica o veculo para a criao de redes localizadas em meio local de

    pequena dimenso.

    4. Perfis dos dirigentes associativos

    Os lderes entrevistados repartem-se por ambos os sexos e apresentam um perfil onde

    dominam os indivduos casados e com filhos, com idades entre os 31 e os 45 anos. Embora

    nascidos fora, residem nas localidades onde desenvolvem o voluntariado. O seu nvel de

    escolaridade muito elevado (superior ou ps-graduado). So activos e desempenham com

    frequncia profisses cientficas, tcnicas ou artsticas e auferem rendimentos entre os 1000 e

    os 2500 euros (ver quadro III). A estas caractersticas, reveladoras de uma boa insero em

    redes sociais (redes familiares e de trabalho), junta-se o facto de mais de 40% participarem

    nos corpos sociais de outras associaes. Note-se que as experincias anteriores, a formao

    profissional e a formao acadmica so consideradas, em 50% dos casos, importantes para o

    desempenho do voluntariado de direco. Curiosamente, os entrevistados revelaram que as

    ddivas de tempo ocorrem preferencialmente (8 respostas) em meio associativo (voluntariado

    formal). De qualquer modo, a participao cvica favorecida pela disponibilidade de tempo:

    9 dos 12 entrevistados consagram mais de 6 horas por semana a esta actividade e destes 6

    dedicam-lhe mais de 12 horas semanais.

    As entrevistas revelaram que frequentemente a participao cvica tem tradio familiar (4

    respostas) e iniciada em grupos de juventude (escuteiros, grupos de jovens da igreja, etc.) ou

    durante a formao acadmica (6 respostas).

    No s a maioria das instituies/associaes alvo desta participao se situa na

    localidade de residncia dos voluntrios (11 respostas) como tambm o envolvimento cvico

    ocorre na sequncia de mudanas de residncia (7 respostas).

    5. Motivaes e valores dos dinamizadores associativos

    No s a aco voluntria uma opo tica no convencional como se define como um

    compromisso respondendo a um imperativo, a uma obrigao ou a uma exigncia auto-imposta.

    Embora a perspectiva individualista esteja desde sempre ligada aco voluntria, o interesse

  • 7

    dedicado a terceiros que impe o voluntariado no contexto da modernidade. Assim, na questo

    relativa s motivaes para o voluntariado, os entrevistados revelam preocupaes de ordem

    altrusta e orientadas para os outros: o dever cvico e o desejo de ajudar terceiros referido

    (6 respostas) a par da tomada de conscincia das carncias locais (4 respostas).

    No entanto, o discurso dos voluntrios de direco no exclui motivaes individualistas

    mesmo quando a participao entendida como uma responsabilidade cvica para com os

    filhos ou para com a sociedade.

    A minha colaborao com as escolas decorre tambm da minha situao de pai. Por

    exemplo, solicitaram-me que fizesse uma pequena coreografia com os alunos com base numa

    msica de um grupo portugus de Hip-hop, no quadro da disciplina de educao fsica. Esta

    relao nasce do esprito e do desejo de criar novos pblicos (Antnio, 47 anos, coregrafo,

    casado, com filhos menores).

    Entre as motivaes de cariz individualista contam-se a afirmao pessoal, o

    reconhecimento social e familiar, o convvio com terceiros, o escape rotina diria, o

    enriquecimento pessoal e profissional, a possibilidade de praticar ou dinamizar actividades do

    interesse dos actores e ainda a concretizao de projectos pessoais.

    H vrios motivos. A vontade de fazer coisas, uma forma de afirmao, qualquer pessoa

    gosta de se sentir bem, de ser conhecido, de deixar o nome aos filhos. muito melhor

    trabalhar em grupo do que sozinho deixar obras feitas ligadas ao nosso nome. Estar dentro

    do meio, da comunidade onde se vive, contactar com as pessoas (Bruno, 35 anos, quadro

    superior da administrao pblica, casado, com filhos menores).

    Assim vrias entrevistas revelam que os lugares so importantes para estes actores

    contribuindo para criar o sentido da sua identidade (Entrikin, 1991, referido por Unwin,

    1995).

    As associaes devem promover o convvio entre as pessoas que reforce a comunidade.

    Isto so coisas que se conseguem com iniciativas. Encontra-se ali um espao de integrao

    social. (Carlos, 40 anos, professor, casado, com filhos menores).

  • 8

    Escolhi este lugar para residir porque foi aqui que resolvi fixar as minhas razes

    (Antnio, 47 anos, coregrafo, casado, com filhos menores).

    Em particular, referido o interesse da pequena dimenso dos lugares onde estes actores

    desenvolvem as suas actividades de voluntariado.

    A motivao para a participao tem a ver com as pessoas e com os lugares. Numa terra

    pequena como esta, as pessoas que tm os mesmos interesses encontram-se frequentemente.

    Por isso eu gosto de terras pequenas. Nos meios pequenos temos mais liberdade (Daniela, 49

    anos, professora, casada).

    6. A participao cvica e o poder

    A participao em espaos pblicos objecto de poder e por isso passvel de conflito

    entre os dirigentes associativos e o poder local (poltico). Verificou-se com alguma frequncia

    que a motivao dos voluntrios foi orientada pelo desejo de protagonismo e de procura de

    visibilidade na interveno dos indivduos nas comunidades locais. Esta atitude revela-se

    como forma de servir a comunidade pela via poltica, correspondendo ao desejo de lutar

    contra a injustia social, por novas ideias e pelo exerccio do direito de cidadania.

    Este um espao onde posso exercer os meus direitos de cidadania e de participao. Um

    espao de liberdade e sem tutelas onde sinto que eu e as pessoas que aqui trabalham

    podemos exercer as nossas actividades de cidadania e contribuir para o fortalecimento da

    sociedade civil, de participao efectiva. Estamos a contribuir para os direitos e obrigaes

    de cidadania (Eduarda, 31 anos, quadro superior da funo pblica, solteira).

    Ns no estamos de acordo com a fora poltica que est a gerir a Cmara e pensamos

    que podemos enriquecer a vida do municpio. Formmos uma alternativa para apresentar

    aos cidados quando se realizaram eleies. Tentamos provocar uma agitao para se

    criarem alternativas e criar inclusive um sentido de maior exigncia a quem governa

    (Fernando, 49 anos, mdico, casado).

  • 9

    7. Promoo do voluntariado: sugestes

    A divulgao de boas prticas tanto a nvel associativo como a nvel individual (5

    respostas) a principal sugesto dos inquiridos para a promoo do voluntariado formal. Em

    complemento, devem ser incentivados e premiados os bons desempenhos.

    O tempo tambm influi de forma decisiva na prtica voluntria. Por um lado, a

    flexibilidade de horrios favorece a participao cvica, por outro, so sugeridas actividades

    voluntrias de curta durao como forma de cativar novos pblicos.

    O voluntariado pode ser promovido atravs de aces e campanhas de curta durao que

    cativam muitas adeses (banco de tempo, cursos de portugus para emigrantes do Leste

    Europeu, Banco Alimentar contra a Fome) (Guilhermina, 60 anos, professora, solteira).

    A formao outro aspecto considerado na promoo de voluntariado sendo sinalizadas

    duas vertentes: a formao de dirigentes associativos (vocacionada para um grupo restrito de

    interessados) e a educao para a cidadania nas escolas (afectando a generalidade da

    populao).

    Analisando a vida/dinmica associativa com o objectivo de encontrar frmulas para o

    sucesso da participao, os inquiridos referiram a importncia do envolvimento das famlias

    dos praticantes/utentes de actividades e a necessidade da promoo do trabalho em equipa.

    Foi referido que a integrao em redes locais e em redes desterritorializadas uma das

    componentes do sucesso do voluntariado.

    Estou a dinamizar um projecto, a arranjar financiamentos para ele e, neste mbito, a

    enquadrar as propostas artsticas dos jovens estudantes de Belas Artes que esto a viver em

    Montemor. Tenho vindo a dar apoio associao naquilo que so os contactos com as

    instituies a nvel central (Daniela, 49 anos, professora, casada).

    A pequena dimenso dos lugares favorece a participao cvica j que nas pequenas

    comunidades maior a visibilidade das aces desenvolvidas no mbito do voluntariado

    formal.

    Aqui h muita gente a querer fazer voluntariado. Temos um terceiro sector que o

    associativo que envolve muita gente. H muitas associaes em Alcovas. H uma grande

  • 10

    economia volta de tudo isto. Todas as terrinhas tm filarmnicas, grupos corais, grupos

    desportivos, associaes de reformados, centros de dia, misericrdias muita gente

    envolvida que no ganha nada mas gera-se dinmica e emprego. Mesmo o tempo que as

    pessoas gastam nas instituies e no quantificado tempo de produo (Bruno, 35

    anos, quadro superior da administrao pblica, casado, com filhos menores).

    8. As associaes e o territrio

    A maioria das associaes est bem integrada nas localidades de Alcovas e Montemor.

    Este aspecto relaciona-se com o tipo de associao e com a dimenso das comunidades.

    Os entrevistados referem que as associaes que desenvolvem actividades especficas so

    as menos conhecidas da populao (5 respostas).

    O tempo pesa na relao entre a populao associativa e o territrio: a integrao de uma

    associao na comunidade relaciona-se no s com a antiguidade da associao, como

    tambm com o tempo de fixao da populao local.

    A Associao tem 143 anos e obrigatoriamente um elemento social importante.

    Tem 1300 scios, tendo crescido muito nas ltimas dcadas. Tem um peso muito

    grande quando pensamos na populao de Montemor. Dada a sua idade, dadas as

    actividades, dado o nmero de pessoas que j passaram pelos rgos sociais, dado o

    nmero de sciosquase toda a cidade est ligada Sociedade. J o centro de judo

    mais novo e pratica um desporto esquisito que existe em Montemor desde 1976

    mas muito menos popular que o futebol. Para alm do mais as caractersticas do

    judo afastam-no da populao. um desporto individual e exigente (Henrique, 50

    anos, professor, casado, com filhos menores).

    As associaes tm uma reconhecida inscrio territorial, constituindo os espaos

    pblicos de prestao de servios sociais, culturais, recreativos e desportivos. Elas

    podem ser importantes plos de emprego escala local e contribuem para o reforo

    da comunidade por promoverem as relaes sociais de proximidade quer em termos

    gerais (convvio e outras) quer em termos especficos (integrao das famlias no

    mbito escolar, criao do sentido de identidade atravs de grupos que representam a

    terra, entre outras).

  • 11

    9. Concluses

    O dinamismo associativo evidenciado em Alcovas e Montemor-o-Novo favorecido

    pela dimenso destes meios localizados onde actores com elevado capital social no que toca

    insero em redes sociais de proximidade e de longa distncia desenvolvem aces e

    interaces que assumem grande visibilidade.

    Na generalidade dos casos estas localidades no tm oferta alternativa e as

    actividades/servios propostos servem a populao local. Pontualmente uma actividade

    especfica e original atrai pblicos do exterior, alterando-se o sentido da centralidade dos

    lugares. Verificou-se que as ideias de alguns actores contribuem para a construo desta

    centralidade.

    A participao cvica contribui para criar o sentido da identidade dos lderes locais

    assumindo aspectos profissionais, familiares, ldicos, cvicos e polticos. Em particular, os

    conflitos que ocorrem nos espaos pblicos de aco colectiva revelam a estreita ligao entre

    a participao e o poder.

    A faceta mais pragmtica da participao cvica no exclui preocupaes de ordem

    altrusta evidenciadas no discurso de muitos dos voluntrios de direco entrevistados.

    As aces e interaces desenvolvidas no quadro associativo, em pequenas comunidades,

    acabam por favorecer o desenvolvimento local porque materializam o fortalecimento de

    diversos tipos de redes (familiares, sociais, institucionais) essenciais construo social da

    cidadania.

    10. Bibliografia

    Barreto, A. (2002) A participao cvica e poltica e a evoluo da sociedade portuguesa

    in O estado e o cidado, Actas dos VIII Cursos Internacionais de Vero de Cascais,

    Cmara Municipal de Cascais, Cascais, pp. 45- 60.

    Bourdin, A. (2000) La question locale, Presses Universitaires de France, Paris.

    Delicado, A. (2002) Caracterizao do voluntariado social em Portugal in Revista

    Interveno Social, 25/26, Instituto Superior de Servio Social, Beja, pp. 127-140.

    Delicado, A. (2003) A solidariedade como valor social no Portugal contemporneo in

    Valores sociais: mudanas e contrastes em Portugal e na Europa, Imprensa de

    Cincias Sociais, Lisboa, pp. 199-256.

  • 12

    Ferro, J. (2001) O territrio, a ltima fronteira da cidadania? in Cadernos de Geografia,

    Coimbra, pp. 1-6.

    Pedro-Rgo, P. (2001) Instituies de Solidariedade Social: Participao Cvica e

    Desenvolvimento Local, Universidade de vora, vora, policopiado.

    Putnam, R. (2000) Bowling Alone, Simon and Schuster, Nova Iorque.

    Unwin, T. (1995) El lugar de la geografa, Ctedra, Madrid