Parecer Relatório ESEQ Interna/EAI/2015_16... · 2018-02-16 · 2015/2016 PARECER Na ... No ensino...
Transcript of Parecer Relatório ESEQ Interna/EAI/2015_16... · 2018-02-16 · 2015/2016 PARECER Na ... No ensino...
1
RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO INTERNA DA ESEQ 2015/2016
PARECER
Na sequência da solicitação realizada pelo Diretor da Escola Secundária Eça de Queirós
da Póvoa de Varzim (ESEQ), foi elaborado um parecer crítico sobre o Relatório de Avaliação
Interna 2015/2016 apresentado pela Equipa de Avaliação Interna (EAI). A apreciação
sustentou-se na análise da informação constante neste Relatório, tendo como como referência
o Projeto Educativo (PE), o Regulamento Interno (RI) e o Plano de Atividades (PA).
Adicionalmente, e sempre que considerado pertinente, recorreu-se à consulta e mobilização de
outras informações oficiais publicadas no website da ESEQ, bem como a resultados de
investigação recolhidos nos últimos anos no âmbito de diferentes pesquisas desenvolvidas
nesta escola (Dissertação de Mestrado, Tese de Doutoramento, Monografia da Escola e
Projeto financiado pela FCT1). Privilegiou-se uma análise contextualizada e circunscrita aos
três domínios delineados pela EAI:
i) Resultados
ii) Autonomia e liderança
iii) Gestão e prestação do serviço educativo.
1 Trabalho financiado por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projeto PTDC/IVC-PEC/4942/2012 do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho (CIEd), intitulado Entre Mais e Melhor escola: A excelência académica na escola pública portuguesa, coordenado por Leonor L. Torres.
2
Apreciação global do Relatório
A EAI integra elementos representativos de alguns setores da comunidade educativa
(professores, pais e encarregados de educação e estudantes), dimensão fundamental ao
desenvolvimento de uma abordagem holística da organização escolar. O confronto de
perspetivas e de interesses sobre o universo escolar enriquece o exercício avaliativo, pelo que
se entende que esta equipa beneficiaria com a integração de contributos de outros atores,
designadamente, um representante do pessoal não docente e um representante da comunidade
local que se destacasse como "ator" estratégico na questão da interação da escola com a
sociedade. Tratando-se de uma avaliação global do PE, focada em três pilares fundamentais, a
complementaridade dos olhares revela-se indispensável para garantir um certo distanciamento
crítico e acautelar visões excessivamente comprometidas com os processos de escolarização.
Do ponto de vista da estrutura, o Relatório em apreço apresenta uma organização da
informação clara e coerente. Privilegia dados factuais e ilustrativos das tendências verificadas
nos últimos anos, oferecendo uma panorâmica objetiva e contextualizada da escola. Face ao
volume de informação consultada, é de realçar a relevância dos dados selecionados, a
preocupação em confrontar (sempre que possível) os resultados da ESEQ com o contexto
nacional e o rigor da análise interpretativa. Em termos globais, o Relatório apresenta uma
dimensão adequada, tendo em vista a sua potencial utilização como instrumento de regulação
política e pedagógica.
Considerando os três domínios estruturantes do Relatório, depreende-se alguma
assimetria no que respeita à análise concedida a cada um deles: o domínio dos resultados
ocupa metade do Relatório (15 páginas); o domínio gestão e prestação do serviço educativo
cerca de um terço (10 páginas); o domínio autonomia e liderança é objeto de uma análise mais
reduzida (5 páginas). Este desequilíbrio parece resultar da ausência de dados mensuráveis em
relação a algumas dimensões. Contudo, no âmbito de um exercício avaliativo seria relevante
para o desenvolvimento estratégico da instituição levantar evidências que ajudassem a
identificar os aspetos mais e menos positivos, bem como os constrangimentos e oportunidades
de melhoria, de modo a que este balanço pudesse nortear a política da escola, reforçando,
ajustando ou redirecionando o seu rumo e as suas ações no futuro. Ou seja, ressalta deste
Relatório um modelo avaliativo restrito aos dados quantitativos compilados pelos vários
órgãos e serviços da ESEQ que, apesar se serem muito relevantes, não esgotam, por si só, o
3
conhecimento da realidade educativa. Outros processos e práticas educativas não
mensuráveis, mas efetivamente concretizadas ao longo do ano nesta escola, poderão ser
mobilizadas para efeitos de uma avaliação globalmente mais qualitativa.
1. Resultados
Constituindo o domínio mais trabalhado e refletido, os resultados (académicos e sociais)
são apresentados por ano de escolaridade e, sempre que possível, duplamente
contextualizados: externamente, por referência às médias nacionais e, internamente, por
comparação com os valores obtidos nos últimos anos. Como tendência dominante destaca-se
uma assinalável estabilidade nos resultados académicos internos e externos, sem grandes
oscilações anuais, tanto no nível básico, como no nível secundário, com valores sempre acima
das médias nacionais. No ensino básico e no ano objeto (2015/2016), verifica-se uma ligeira
subida das médias das avaliações internas nos 7° e 8º anos e uma ligeira descida no 9° ano.
Curioso verificar que a percentagem de negativas subiu nos 7° e 8° anos, mas desceu no 9°
ano para o valor mais baixo dos últimos anos.
Ao nível do ensino secundário, o cenário é ainda mais estável e marcado pela
sustentabilidade da "qualidade do sucesso", constatando-se uma melhoria dos resultados à
medida que se avança no ano de escolaridade. Efetivamente, ao longo do percurso do
secundário (10º, 11º e 12° anos), verifica-se que as médias internas sobem e a percentagem de
negativas desce, à exceção do ano objeto que registou uma ligeira subida do número de
negativas no 10º e 11° anos de escolaridade.
A estabilidade e sustentabilidade dos resultados obtidos na ESEQ parece refletir, de
forma inequívoca, a importância de uma cultura alicerçada na qualidade, na exigência e no
rigor, que constitui já uma imagem de marca desta escola sedimentada na longa duração, tal
como foi comprovado em várias investigações desenvolvidas neste contexto (Torres, 1997,
2004, 2014). Aliás, um análise de conteúdo efetuada ao PE com recurso à nuvem de palavras
mais frequentes elaborada a partir do software Nvivo (versão 11.2.1), evidencia justamente a
importância atribuída à qualidade e à comunidade como traços da identidade ESEQ.
4
Afirmando-se como escola de referência nacional na preparação dos alunos para o
ingresso no ensino superior, os resultados obtidos nos exames nacionais revelam-se uma meta
fundamental para a projeção da imagem social da ESEQ. Assim, a comparação entre os
desempenhos internos, as médias nacionais e os resultados obtidos nos exames constitui já um
exercício permanente de monitorização, bem patente neste Relatório. Observava-se, a este
nível, um cenário bastante favorável em todos os níveis de ensino. Contudo, alguns
indicadores sinalizados no documento em análise deverão merecer uma reflexão interna: i) os
resultados às disciplinas do ensino secundário que tendem, ano após ano, a obter resultados
abaixo da média nacional (Filosofia e Geometria Descritiva A); ii) uma ligeira descida dos
resultados nos exames do ensino básico em 2016; iii) a taxa de sucesso bastante abaixo da
média nacional no 3° ano do curso profissional de técnico de multimédia.
Uma última apreciação no campo dos resultados académicos que se prende com o
ingresso no ensino superior. Sendo a taxa de colocação na 1ª fase genericamente muito
positiva (acima dos 80% na última década), não deixa de merecer atenção o facto de apenas
50% dos alunos ter sido colocados em 1ª opção. Dados recentes recolhidos nesta escola no
âmbito de um projeto de pesquisa revelam que entre os alunos que integraram o quadro de
excelência entre 2003 e 2014 (n=603), com médias internas superiores a 18 valores, apenas
58% conseguiram ingressar no par estabelecimento/curso desejado como 1ª opção. Este dado
poderá ser um indicador importante para, internamente, ao nível dos Serviços de Psicologia e
Orientação, se repensar estratégias de preparação e ajustamento das carreiras pós-secundárias
dos alunos.
Em relação aos resultados sociais, as estatísticas das atividades realizadas pelos diversos
grupos de recrutamento evidenciam um forte dinamismo pedagógico e cultural, muito para
além do mero espaço letivo. Contudo, a natureza quantitativa destes dados não permite avaliar
a articulação e/ou complementaridade das atividades com os programas curriculares, nem o
5
tipo de atividades promovidas e/ou organizadas pelos estudantes, numa lógica de
desenvolvimento da participação ativa nas dinâmicas escolares. Ainda no campo dos
resultados sociais, embora os dados da ação social escolar e das bolsas de mérito revelem uma
preocupação com as questões da inclusão, a ausência no Relatório de valores relativos
(percentagens por referência ao universo de alunos), dificulta uma análise evolutiva desta
dimensão. Por sua vez, as informações relativas ao apoio pedagógico revelam uma progressão
crescente dos alunos que frequentam as aulas de apoio, mas não é possível descortinar a
natureza da progressão, isto é, se se restringe à aprovação da disciplina ou se visa melhorar o
nível de desempenho dos alunos. Este dado seria importante para compreender a própria
natureza dos apoios pedagógicos. Por exemplo, dados recolhidos numa pesquisa efetuada
nesta escola sobre a excelência académica demonstram que aproximadamente 30% de alunos
provenientes de baixos estratos socioculturais conseguem obter desempenhos de excelência.
Nestes casos em particular, qual o papel desempenhado pelos apoios pedagógicos?
2. Autonomia e liderança
O PE apresenta uma visão e uma linha de rumo muito clara no que respeita ao
aprofundamento da autonomia.
Os dados apresentados no Relatório permitem apenas deduzir algumas tendências
dominantes: a evolução do número de turmas e de alunos matriculados nos últimos 3 anos
revela, globalmente, uma diminuição de alunos, com a exceção do ensino básico e do 12° ano.
Na ausência de outras informações, fica a dúvida se esta diminuição representará um mero
reflexo da quebra de natalidade verificada nos últimos anos ou a diminuição da capacidade de
atração da escola.
No plano organizacional, os dados relativos às reuniões e aos protocolos apenas
visibilizam uma componente do complexo trabalho efetuado na escola, não dando a conhecer
a concretização de outras estratégias plasmadas no PE. Por exemplo, em relação à natureza da
articulação inter-órgãos, à valorização das lideranças intermédias e à mobilização de todos os
atores nas atividades promovidas pela ESEQ não constam indicadores passíveis de apoiarem
o exercício avaliativo.
A valorização da imagem social da escola tem constituído um traço identitário da ESEQ
inscrito nos vários PE. A divulgação de projetos e ações de sucesso é apresentada no
Relatório a partir do exemplo do número de alunos que integram o quadro de valor e
excelência. Apesar de constituir um ritual antigo nesta escola (recuperado no ano letivo
6
2013/2004) e com um impacto significativo junto da comunidade, outras iniciativas poderiam
ser aqui nomeadas como evidências do trabalho de divulgação da imagem da escola:
publicitação na webpage dos resultados de ingresso no ensino superior, publicação do
Anuário, publicação do jornal escolar Ecos, entre outras atividades de relevância.
3. Gestão e prestação do serviço educativo
Pautada por uma rigorosa planificação das atividades letivas, a ESEQ apresenta uma
elevada taxa de cumprimento de aulas e planos, tanto no ensino básico como no ensino
secundário. A par das atividades estritamente letivas (sala de aula), realizaram-se inúmeras
outras atividades afetas aos vários departamentos, evidenciando um significativo dinamismo
pedagógico ao serviço de uma educação integral dos estudantes. Por outro lado, visando
ajustar as atividades aos diferentes ritmos dos alunos e promover uma melhoria constante dos
desempenhos, investiu-se em aulas de apoio pedagógico e na coadjuvação na sala de aula, que
incidiu maioritariamente nos professores de Matemática e de Português. No que respeita aos
apoios pedagógicos, é de destacar a sistematicidade com que esta medida tem sido acionada
nos últimos anos, com reflexos notórios na taxa de progressão dos alunos.
A monitorização e avaliação do ensino e das aprendizagens é realizada ao nível dos
vários órgãos de gestão intermédia e a partir de vários suportes informáticos. Aliás, a
intensificação do uso de plataformas informáticas para efeitos da gestão pedagógica e
comunicação institucional aparece neste Relatório como um aspeto relevante em termos de
acréscimo de eficácia. Todavia, tal facto poderá estar igualmente correlacionado com a
redução do grau de satisfação dos docentes em relação aos equipamentos informáticos
plasmada nos inquéritos de satisfação.
Analisando os resultados dos inquéritos de satisfação, sobressai um elevado
reconhecimento da qualidade desta instituição por parte dos vários atores educativos, quer ao
nível do serviço prestado, quer em relação aos equipamentos, aos órgãos e demais estruturas,
atingindo valores máximos no ano objeto. Os dados apresentados evidenciam a existência de
um clima de escola favorável à integração dos atores e impulsionador de um ambiente
propício à aprendizagem.
Por fim, em relação ao desenvolvimento profissional dos professores, as estatísticas
apresentadas revelam alguma assimetria, tendo por referência o grupo de recrutamento, o
número de horas e o tipo de formação realizada. Constituindo a formação profissional uma
dimensão central na garantia da qualidade dos processos de ensino e aprendizagem e à própria
7
capacidade de melhoria da instituição, os dados apresentados no Relatório não permitem
efetuar uma apreciação crítica acerca da adequação às atuais exigências educacionais e ao
impacto efetivo sobre a melhoria e sustentabilidade da ESEQ.
Considerações finais: Pontos fortes e margens de melhoria
A ESEQ é uma instituição centenária herdeira de uma cultura liceal alicerçada nos valores da
qualidade, da exigência, do mérito e da excelência dos processos e resultados educativos.
Vocacionada, em primeira instância, para garantir uma boa preparação dos jovens para o
ingresso no ensino superior, afirmou-se na comunidade como uma instituição de referência
local e nacional. Os dados apresentados neste Relatório evidenciam a força de uma cultura
baseada na produção de resultados de excelência, reforçada por uma direção comprometida
com este ideário e por lideranças intermédias empenhadas na sua concretização. A
convergência de esforços no encalço de uma missão clara e bem definida constitui a principal
linha identitária desta escola, que vem sendo sedimentada na longa duração e, como tal,
representa para a comunidade uma imagem de marca a preservar. Porém, este ponto forte, por
revelar uma singularidade profundamente enraizada na instituição, pode suscitar algumas
fragilidades ou efeitos não previstos a merecer reflexão. Elegem-se, a título ilustrativo, apenas
três dimensões a que se associam possíveis margens de melhoria.
I - A primeira, induzida pela crença nos valores da meritocracia e pressionada pelas atuais
políticas de accountability, releva de uma certa tendência para reduzir os processos educativos
a meros exercícios de mensuração (ou quantitificação) e comparação (local, regional, nacional
e mesmo internacional). Nesta perspetiva, tudo o que não é mensurável tende a tornar-se
invisível, podendo mesmo ser considerado acessório ou até um fator perturbador da gestão
performativa. Sendo os processos educativos e a gestão das organizações escolares
caracterizadas simultaneamente pela complexidade e singularidade, entende-se necessário
pensar em formas alternativas de avaliação institucional, mais endógenas e menos reféns de
fórmulas externas, que restituam os sentidos plurais da missão educativa da escola. Ou seja, e
utilizando um chavão adaptado a este pensamento, "há mais vida na escola para além dos
números". A ESEQ desenvolve inúmeras estratégias e orientações no seu quotidiano que
escapam a estas lógicas contabilísticas e que não deixam de ser centrais à concretização das
suas prioridades educativas.
8
II - A segunda, emergente da centralização crescente das plataformas informáticas na vida das
escolas, no pressuposto de que as mesmas geram mais eficácia ao nível da gestão e
comunicação, pode conduzir a uma certa despersonalização das relações profissionais e
pedagógicas, efeito já apontado no início do século passado a propósito da burocratização das
organizações sociais. A transformação do clima escolar e a intensificação das práticas de
trabalho, visível já em inúmeras escolas e universidades, poderão ser contrariados, pensando-
se em espaços e tempos dedicados ao convívio e à reflexão coletiva, à partilha e ao confronto
de ideias. Estes momentos são vitais ao reforço da cultura da escola e à revitalização do
sentido de pertença.
III - Por último, a terceira dimensão deriva do envelhecimento do corpo docente e não
docente. Se a estabilidade e maturidade profissionais dos professores, funcionários e das
lideranças constitui uma vantagem em termos de coesão cultural, por outro lado, o
progressivo envelhecimento destes atores pode gerar um défice de renovação e mudança
essencial ao dinamismo das organizações educativas. Neste sentido, o investimento na
formação e atualização profissional pode constituir uma orientação indispensável ao
melhoramento das práticas, à inovação dos processos de ensino-aprendizagem e, igualmente,
à forma de (re)perspetivar estrategicamente a missão da ESEQ. Uma formação não
estritamente técnica, voltada para as dimensões de suporte à leccionação, mas,
complementarmente, uma formação mais ampla referenciada às questões de política educativa
e organizacional ajudaria a olhar criticamente a escola e o seu lugar na sociedade
contemporânea. A ESEQ atingiu um nível de desenvolvimento institucional assinalável,
sendo agora relevante e oportuno refletir criticamente sobre o percurso evolutivo e traçar
estratégias futuras de atuação. Esta abordagem exigirá, certamente, uma leitura distanciada,
holística e reflexiva que aporte contributos pertinentes aos (novos) rumos da ESEQ.
Registe-se com apreço o excelente trabalho realizado pela EAI na compilação e
produção de informação útil à gestão da ESEQ, que muito facilitou e inspirou a elaboração do
presente parecer.
Póvoa de Varzim, 2 de janeiro de 2017
Leonor Lima Torres