Parecer na ADI 3880

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Prof. Dr. Túlio Vianna OAB-MG 107.153 – www.tuliovianna.org 1 Parecer O Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico – IBDE – por meio de seu ilustre advogado Prof. Ms. José Carlos de Araújo Almeida Filho solicitou minha opinião acerca da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.880, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – contra os artigos 1º, §2º, III, b, 2º, 4º, 5º e 18 da Lei 11.419 de 19 de dezembro de 2006. Para tanto encaminhoume cópia da exordial, propondome os seguintes quesitos quanto à constitucionalidade da referida lei: 1º. Há ofensa ao direito ao livre exercício da profissão de advogado no art.1º, §2º, III, b, da lei? 2º. Há violação do princípio da proporcionalidade no art. 1º, III, b, da lei? 3º. Há violação das prerrogativas constitucionais da OAB no art. 2º da lei? 4º. Há violação do princípio constitucional da isonomia nos arts.4º e 5º da lei? 5º. Há violação do princípio da publicidade dos atos processuais nos arts. 4º e 5º da lei? 6º. Há violação da competência constitucional do Presidente da República no art.18 da lei? 1. Das prerrogativas constitucionais da OAB Por uma questão metodológica, analisarei inicialmente o quesito nº3, cuja resposta será utilizada como fundamento para a análise dos quesitos nº1 e 2. Passemos à análise da Lei 11.419/2006, que em seu artigo 1º, §2º, III, b, prevê: §2º Para o disposto nesta Lei, considerase: III assinatura eletrônica as seguintes formas de identificação inequívoca do signatário: a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada, na forma de lei específica;

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Parecer do Prof. Dr. Tulio Ljma Vianna, nos autos da ADI 3880, ajuizada pela OAB, relativa ao Processo Eletrônico.

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Parecer 

 

O  Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico –  IBDE – por meio de seu  ilustre advogado Prof. 

Ms.  José  Carlos  de  Araújo  Almeida  Filho  solicitou minha  opinião  acerca  da  Ação Direta  de 

Inconstitucionalidade nº 3.880, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do 

Brasil – OAB – contra os artigos 1º, §2º, III, b, 2º, 4º, 5º e 18 da Lei 11.419 de 19 de dezembro 

de 2006. Para  tanto  encaminhou‐me  cópia da  exordial, propondo‐me os  seguintes quesitos 

quanto  à  constitucionalidade  da  referida  lei:  1º. Há  ofensa  ao  direito  ao  livre  exercício  da 

profissão  de  advogado  no  art.1º,  §2º,  III,  b,  da  lei?  2º.  Há  violação  do  princípio  da 

proporcionalidade no art. 1º, III, b, da lei? 3º. Há violação das prerrogativas constitucionais da 

OAB no art. 2º da lei? 4º. Há violação do princípio constitucional da isonomia nos arts.4º e 5º 

da lei? 5º. Há violação do princípio da publicidade dos atos processuais nos arts. 4º e 5º da lei? 

6º. Há violação da competência constitucional do Presidente da República no art.18 da lei? 

1. Das prerrogativas constitucionais da OAB 

Por  uma  questão  metodológica,  analisarei  inicialmente  o  quesito  nº3,  cuja  resposta  será 

utilizada como fundamento para a análise dos quesitos nº1 e 2. 

Passemos à análise da Lei 11.419/2006, que em seu artigo 1º, §2º, III, b, prevê: 

§2º Para o disposto nesta Lei, considera‐se: 

III  –  assinatura  eletrônica  as  seguintes  formas  de  identificação 

inequívoca do signatário: 

a)  assinatura  digital  baseada  em  certificado  digital  emitido  por 

Autoridade Certificadora credenciada, na forma de lei específica; 

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b)  mediante  cadastro  de  usuário  no  Poder  Judiciário,  conforme 

disciplinado pelos órgãos respectivos. 

Inicialmente  cabe  consignar  aqui  a  impropriedade  técnica  do  inciso  III  que  se  refere  à 

assinatura eletrônica como instrumento de identificação, quando, na verdade, esta será usada 

como um instrumento de autenticação. 

A autenticação é um processo de verificação para se assegurar que a pessoa X é  realmente 

quem ela alega ser. 1 Trata‐se de uma comparação 1:1, exempli gratia, o reconhecimento de 

firma que tradicionalmente foi realizado pelos cartórios comparando a assinatura manuscrita 

com uma anterior previamente cadastrada. 

A  identificação,  por  sua  vez,  é  um  processo  usado  para  se  descobrir  a  identidade  de  um 

indivíduo quando esta é desconhecida (o usuário não faz nenhuma alegação de identidade). 2 

Trata‐se de uma comparação 1:N, exempli gratia, a comparação da arcada dentária de ossadas 

desconhecidas  com os  registros de  supostas vítimas até que  se  identifique de qual delas  se 

trata. 

Vê‐se, pois, claramente que o procedimento disciplinado pela lei não é de identificação, mas 

de autenticação,  já que a assinatura eletrônica, ao contrário da manuscrita, que muita vez é 

ilegível, traz sempre de forma cristalina o nome completo do subscritor. 

E é aqui que se encontra o busílis da primeira tese levantada pela OAB: não é a autenticação 

dos advogados que é prerrogativa da OAB, mas tão‐somente a sua identificação. 

                                                            

1 VIANNA, Túlio Lima. Transparência pública, opacidade privada. Rio de Janeiro: Revan, 2007. p.135. 

2 VIANNA, Túlio Lima. Transparência pública, opacidade privada. Rio de Janeiro: Revan, 2007. p.136. 

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Partindo‐se  de  uma  interpretação  conforme  a  Constituição  sem  redução  de  texto,  é 

perfeitamente possível  interpretar‐se a palavra “identificação”, constante na Lei 11.419, por 

visível  equívoco  técnico  do  legislador,  como  “autenticação”,  afastando‐se  assim  qualquer 

inconstitucionalidade da norma. 

Também o art.2º da Lei 11.419/06 trata de autenticação e não de identificação. Vejamos: 

Art.2º. O envio de petições, de recursos e a prática de atos processuais 

em  geral  por  meio  eletrônico  serão  admitidos  mediante  uso  de 

assinatura eletrônica, na forma do art.1º desta Lei, sendo obrigatório o 

credenciamento prévio no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos 

órgãos respectivos. 

Se  –  e  somente  se  –  o  credenciamento  tiver  por  única  finalidade  a  autenticação  dos 

advogados, não há  falar em  inconstitucionalidade do dispositivo, pois  seria  inadmissível que 

um órgão de classe tivesse a prerrogativa de autenticar seus membros. 

Para que não  restem dúvidas,  tomemos o exemplo de uma peça  impressa encaminhada por 

um  advogado  a  um  tribunal  pelos  meios  tradicionais.  Se  houver  dúvidas,  quanto  à 

autenticidade da assinatura, sua validade poderá ser comprovada não só confrontando‐a com 

a  assinatura  constante  em  sua  carteira  de  advogado,  mas  também  em  sua  carteira  de 

identidade emitida pela Secretaria de Segurança Pública, em sua carteira de motorista emitida 

pelo  DETRAN  ou  em  um  cartório  de  notas  no  qual  tenha  firma  cadastrada.  Este  é  um 

procedimento de autenticação e, decididamente, não é prerrogativa da OAB.  

Se, porém, a dúvida for sobre sua  legitimidade para o exercício da profissão,  inevitavelmente 

será necessário recorrer‐se à OAB, pois somente ela terá os registros de seu diploma, de sua 

aprovação no exame de ordem, do pagamento das anuidades, da ausência de suspensões ou 

impedimentos,  etc.  Somente  a OAB,  em  um  universo  de N  advogados,  poderá  afirmar que 

aquele  subscritor  em  questão  está  ou  não  no  exercício  regular  da  profissão  de  advogado. 

Trata‐se de um processo de identificação não de um nome, mas de uma característica pessoal 

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no qual a comparação 1:N  se dá a partir do nome do advogado em  relação ao conjunto de 

todos os advogados regularmente inscritos. 

Os cadastros a que se referem  tanto o art.1º, §2º,  III, e o art.2º da Lei 11.419/06 não visam 

identificar a característica de advogado do subscritor das peças eletrônicas, mas tão‐somente 

autenticá‐los. Destarte, não há falar em qualquer inconstitucionalidade do dispositivo, desde 

que  se  faça uma  interpretação  conforme  a Constituição  sem  redução de  texto, na  qual  a 

palavra “identificação” seja entendida exclusivamente como “autenticação”. 

2. Do livre exercício da advocacia 

A obrigatoriedade do cadastro do advogado para fins de sua autenticação, por outro lado, em 

nada  impede o  livre exercício da advocacia desde que qualquer advogado possa se  inscrever 

gratuitamente  no  sistema,  independente  de  qualquer  outra  condição  imposta  pelo  Poder 

Judiciário. 

A  simples  exigência de um  cadastro no qual  se  informe  endereço,  telefone  e outros dados 

estritamente necessários para a comunicação com as partes, não pode ser considerada uma 

restrição ao exercício da advocacia, pois estes mesmos dados já eram informados nas petições 

iniciais  impressas,  por  disposição  expressa  do  art.  39  do  Código  de  Processo  Civil,  e  os 

servidores do Judiciário já os cadastravam nos sistemas informáticos judiciais. 

É possível que no futuro alguns tribunais se excedam nas exigências dos dados que constarão 

em  seus  cadastros, mas,  por  ora,  não  se  pode  discutir  a  inconstitucionalidade  destes  atos 

hipotéticos. O estrito cumprimento da  lei com a criação de cadastros pelo Poder  Judiciário 

tão‐somente para fins de autenticação, não traz consigo nenhum obstáculo ao exercício da 

profissão  de  advogado  e,  portanto,  nenhuma  inconstitucionalidade.  A má  implementação 

destes cadastros, no entanto, pode trazer alguma violação futura à Constituição, mas somente 

no momento oportuno poderá ser contestada. 

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3. Do princípio da proporcionalidade 

Em  uma  ponderação  entre  o  pequeno  ônus  criado  ao  advogado  de  preencher  e  manter 

atualizado um cadastro com dados de contato no Poder Judiciário e o benefício da celeridade 

processual advindo da informatização judicial, fica evidente a proporcionalidade da medida. 

A  existência  de  um  cadastro  do  Poder  Judiciário  com  dados  de  contato  do  advogado  é 

perfeitamente  adequada  às  finalidades  que  se  propõem  o  procedimento  eletrônico: 

proporcionar  uma maior  celeridade  processual  e  uma  redução  de  custos  do  procedimento 

judicial. 

É  bem  verdade  que,  na  ausência  de  um  cadastro  prévio,  os  servidores  do  Poder  Judiciário 

poderiam continuar colhendo manualmente dados como número da OAB, endereço, telefone, 

etc  diretamente  das  peças  processuais  e  os  cadastrando  nos  bancos  de  dados  judiciais,  tal 

como  já ocorre. Esta  solução, no entanto, é mais dispendiosa aos cofres públicos, pois há o 

custo do salário do servidor responsável pelo cadastramento. 

Destarte, o cadastro se mostra necessário em termos de economia ao erário público e o ônus 

criado  ao  advogado  de  preencher  tal  cadastro  na  Internet  justifica‐se  perfeitamente,  em 

razão dos benefícios proporcionados. 

4. Do  princípio  da  publicidade  dos  atos  processuais  e  da  isonomia 

entre os advogados 

Insurge‐se  também  a Ordem dos Advogados do Brasil  contra  a  criação do Diário de  Justiça 

Eletrônico, prevista no art.4º da Lei 11.419/06: 

Art.4º.  Os  tribunais  poderão  criar  Diário  da  Justiça  eletrônico, 

disponibilizado  em  sítio  da  rede  mundial  de  computadores,  para 

publicação  de  atos  judiciais  e  administrativos  próprios  dos  órgãos  a 

eles subordinados, bem como comunicações em geral. 

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(...) 

§2º. A publicação eletrônica na  forma deste artigo  substitui qualquer 

outro  meio  e  publicação  oficial,  para  quaisquer  efeitos  legais,  à 

exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal. 

Alega, em síntese, que muitos advogados não teriam como acompanhar suas demandas e as 

decisões judiciais por não terem acesso à Internet. Fundamenta sua argumentação em dados 

do Comitê Gestor de  julho/agosto de 2006 que constatou que apenas 33,32% da população 

brasileira já acessou a Internet.3 

De fato, trata‐se de uma proporção extremamente pequena e que reflete a estratificação de 

classe  de  nossa  sociedade,  mas  em  nada  obsta  a  informatização  judicial,  pois  a  mesma 

pesquisa  indica  também  que  86,95%  dos  brasileiros  com  curso  superior  já  acessou  a 

Internet.4   Dentre os brasileiros com curso superior que nunca acessaram a  Internet 49,36% 

alegou que não o fez por não ter necessidade/interesse e apenas 1,67% respondeu que não o 

fez por não haver acesso à Internet na cidade onde vive.5 

Vê‐se, pelos dados apontados, que a maioria dos advogados não acessa a  Internet não por 

dificuldades  financeiras ou por ausência de provedores de acesso em  suas cidades, mas por 

não vislumbrar na tecnologia qualquer interesse profissional ou pessoal. 

Argumenta ainda a OAB que, com a  implantação do Diário de Justiça Eletrônico, a população 

em  geral  teria maiores  dificuldades  em  acompanhar  as  causas  de  seu  interesse,  em  uma 

análise surreal dos dados da citada pesquisa. 

                                                            3 http://www.cetic.br/usuarios/tic/2006/rel‐int‐01.htm  

4 http://www.cetic.br/usuarios/tic/2006/rel‐int‐01.htm  

5 http://www.cetic.br/usuarios/tic/2006/rel‐int‐15.htm  

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Ora,  a  tiragem  do  Diário  Oficial  da  União  em  papel  é  de  cerca  de  30.000  exemplares6  e, 

portanto,  infinitamente menor  que  os  7,7 milhões  de  domicílios  brasileiros  com  acesso  à 

Internet.7 Assim, não há falar em redução, mas sim em um aumento de cerca de 26.000% da 

publicidade processual.  

Registre‐se  ainda  que  o  fato  de  a  maioria  dos  brasileiros  não  possuir  computadores  nas 

residências não  implica necessariamente na ausência de acesso à  Internet,  já que 24,4% dos 

usuários de Internet acessam do local de trabalho, 15,56% da escola, 16,16% da casa de outra 

pessoa, 30,3% de centro público de acesso pago (Internet café,  lanhouse ou similar) e 3,49% 

de  centro  público  de  acesso  gratuito  (telecentro,  biblioteca,  entidade  comunitária,  etc).8 

Desnecessário mencionar  que  o  número  destes  locais  alternativos  de  acesso  à  Internet  é 

infinitamente  superior  ao  número  de  locais  onde  se  possa  consultar  um  Diário  Oficial 

impresso. 

Por  fim,  seria  um  absurdo  cogitar  que  o  fato  de muitos  advogados  não  terem  condições 

econômicas  de  adquirir  os  necessários  sistemas  informáticos  pudesse  representar  um 

obstáculo à informatização judicial. 

Assim  como  se  espera  que  um médico  estude  constantemente  novos medicamentos  que 

venham a diminuir o sofrimento de seus pacientes, espera‐se também do advogado que este 

esteja  atento  aos  novos  instrumentos  tecnológicos  que  venham  a  trazer  benefícios  a  um 

julgamento mais célere das demandas. Aos médicos que não possuem condições econômicas 

                                                            6 Ao responder a questionamento do relator da comissão, deputado Márcio Reinaldo Moreira (PP‐MG), o presidente da Abio informou que há uma média de 3,6 milhões de acessos mensais à página inicial da Imprensa Nacional, excluídos os acessos diretos ao conteúdo do Diário Oficial da União (DOU) em versão eletrônica.  Por  outro  lado,  segundo  Alqueres,  a  tiragem  do  DOU  em  papel  é  de  cerca  de  30  mil exemplares. Fonte: http://www2.camara.gov.br/homeagencia/materias.html?pk=%20100268  

7 14,49% de um total estimado de 53,1 milhões de domicílios, segundo a mesma pesquisa citada pela OAB: http://www.cetic.br/usuarios/tic/2006/rel‐geral‐05.htm 

8 http://www.cetic.br/usuarios/tic/2006/rel‐int‐04.htm  

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para adquirirem as modernas parafernálias eletrônicas de diagnósticos só resta solicitarem de 

seus  clientes  que  façam  os  exames  em  clínicas  de  terceiros, mas  seria  inconcebível  que  se 

recusassem a utilizar das novas tecnologias por não poderem comprá‐las. Aos advogados que 

não  puderem  adquirir  um  computador  com  conexão  à  Internet,  de modo  análogo,  caberá 

terceirizarem  estes  serviços  para  outros  escritórios  ou,  simplesmente,  realizarem  o 

acompanhamento processual em centros públicos de acesso à  Internet. Certo, porém, é que 

não  poderão  alegar  dificuldades  econômicas  como  impedimento  para  a  informatização 

judicial, pois, para as partes, esta só trará benefícios, especialmente em termos de celeridade. 

A  tentativa  da  OAB  de  brecar  a  informatização  judicial  por  via  de  ação  direta  de 

inconstitucionalidade,  pelo  singelo  argumento  de  dificuldades  econômicas  de  alguns 

profissionais, mais se aproxima de um luddismo pós‐industrial do que de um efetivo auxílio a 

estes  advogados.  Melhor  seria  se  a  OAB,  sensível  que  se  mostra  as  dificuldades  destes 

advogados,  proporcionasse  condições mínimas  para  que  eles  pudessem  se  inserir  na  nova 

dinâmica da sociedade pós‐moderna, marcada pelo predomínio das comunicações eletrônicas.  

5. Da competência constitucional do Presidente da República 

Finalmente, argúi a OAB a inconstitucionalidade do art.18 da Lei 11.419/06 que tem a seguinte 

redação: 

Art.18. Os órgãos do Poder Judiciário regulamentarão esta Lei, no que 

couber, no âmbito de suas respectivas competências. 

ao argumento que compete privativamente ao Presidente da República a regulamentação de 

lei, tal como disposto no art.84, IV, da Constituição da República: 

Art.84. Compete privativamente ao Presidente da República: 

(...) 

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IV –  sancionar, promulgar e  fazer publicar as  leis, bem  como expedir 

decretos e regulamentos para sua fiel execução. 

Vê‐se, mais uma vez que o legislador ordinário não tomou os devidos cuidados com a precisão 

técnica das palavras, já que não cabe ao Poder Judiciário regulamentar a lei, mas tão‐somente 

discipliná‐la através de resoluções no âmbito de sua competência, tal como, verbi gratia, foi 

feito pelas Resoluções 341/2007 e 344/2007 deste Supremo Tribunal Federal e pela Resolução 

02/2007 do Superior Tribunal de Justiça.  

Destarte,  entendo  que  no  presente  caso  se  faz  necessária  uma  declaração  de 

inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, tão‐somente para se excluir a hipótese 

interpretativa de expedição de regulamento por parte do Poder Judiciário. 

6. Conclusão 

Por todo o exposto, não hesito em responder aos quesitos formulados da seguinte forma: 

1º. Há ofensa ao direito ao livre exercício da profissão de advogado no art.1º, §2º, III, b, da 

lei?  Resposta:  NÃO,  pois  a  simples  obrigatoriedade  de  um  cadastramento  prévio,  com 

informações de números de documentos e dados de contato, não cria qualquer obstáculo ao 

exercício da advocacia. 

2º. Há violação do princípio da proporcionalidade no art. 1º,  III, b, da  lei? Resposta: NÃO, 

pois é perfeitamente proporcional a exigência de um  simples  cadastro prévio para evitar os 

custos  decorrentes  da  alocação  de  servidores  públicos  para  a  função  de  localizar  tais 

informações nas peças e cadastrá‐las no sistema. 

3º. Há violação das prerrogativas constitucionais da OAB no art. 2º da  lei? Resposta: NÃO, 

pois,  a  partir  de  uma  interpretação  conforme  a  Constituição  sem  redução  de  texto,  é 

perfeitamente  possível  limitar  a  finalidade  dos  referidos  cadastros  à mera  autenticação  do 

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advogado, afastando‐se assim a hipótese de identificação do advogado pelo Poder Judiciário, 

que, de fato, é prerrogativa da Ordem dos Advogados do Brasil. 

4º. Há  violação do princípio  constitucional da  isonomia nos arts.4º  e 5º da  lei? Resposta: 

NÃO, pois a ausência de  computador  com acesso à  Internet no escritório do advogado não 

impede  o  exercício  da  profissão,  já  que  é  perfeitamente  possível  ao  profissional  acessar  a 

Internet a partir de um centro público de acesso.  

5º. Há  violação do princípio da publicidade dos atos processuais nos arts. 4º  e 5º da  lei? 

Resposta: NÃO, pelo contrário. Tomando‐se por base a atual tiragem do Diário Oficial da União 

de 30.000 exemplares e o número de domicílios brasileiros com acesso à  Internet, estimado 

em  7,7  milhões  pode  se  concluir  que  haverá  um  expressivo  aumento  da  publicidade 

processual. 

6º. Há violação da competência constitucional do Presidente da República no art.18 da  lei? 

Resposta:  SIM,  pois  não  cabe  ao  Poder  Judiciário  regulamentar  leis, mas  discipliná‐las  por 

meio de resoluções. Sugere‐se a declaração de  inconstitucionalidade parcial sem redução de 

texto, tão‐somente para se excluir a hipótese interpretativa de expedição de regulamento por 

parte do Poder Judiciário. 

É o parecer. 

Belo Horizonte, 4 de junho de 2007. 

 

TÚLIO VIANNA Professor Adjunto da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais 

Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná OAB‐MG 107.153