PARECER HOMOLOGADO DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO.

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PARECER HOMOLOGADO Despacho do Ministro, publicado no D.O.U. de 24/1/2012, Seo 1, Pg. 10.

MINISTRIO DA EDUCAO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAO INTERESSADO: Conselho Nacional de Educao/Cmara de Educao Bsica UF: DF ASSUNTO: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio COMISSO: Adeum Hilrio Sauer (presidente), Jos Fernandes de Lima (relator), Francisco Aparecido Cordo, Mozart Neves Ramos e Rita Gomes do Nascimento. PROCESSO N: 23001.000189/2009-72 PARECER CNE/CEB N: COLEGIADO: APROVADO EM: 5/2011 CEB 4/5/2011 I RELATRIO 1. Introduo O Brasil vive, nos ltimos anos, um processo de desenvolvimento que se reflete em taxas ascendentes de crescimento econmico tendo o aumento do Produto Interno Bruto ultrapassado a casa dos 7%, em 2010. Este processo de crescimento tem sido acompanhado de programas e medidas de redistribuio de renda que o retroalimentam. Evidenciam-se, porm, novas demandas para a sustentao deste ciclo de desenvolvimento vigente no Pas. A educao, sem dvida, est no centro desta questo. O crescimento da economia e novas legislaes, como o Fundo de Desenvolvimento da Educao Bsica (FUNDEB), a Emenda Constitucional n 59/2009 que extinguiu a Desvinculao das Receitas da Unio (DRU) e disps sobre outras medidas, tm permitido ao Pas aumentar o volume de recursos destinados Educao. Tais iniciativas, nas quais o Conselho Nacional de Educao (CNE) tem tido destacada participao, visam criar condies para que se possa avanar nas polticas educacionais brasileiras, com vistas melhoria da qualidade do ensino, formao e valorizao dos profissionais da educao e incluso social. Para alcanar o pleno desenvolvimento, o Brasil precisa investir fortemente na ampliao de sua capacidade tecnolgica e na formao de profissionais de nvel mdio e superior. Hoje, vrios setores industriais e de servios no se expandem na intensidade e ritmos adequados ao novo papel que o Brasil desempenha no cenrio mundial, por se ressentirem da falta desses profissionais. Sem uma slida expanso do Ensino Mdio com qualidade, por outro lado, no se conseguir que nossas universidades e centros tecnolgicos atinjam o grau de excelncia necessrio para que o Pas d o grande salto para o futuro. Tendo em vista que a funo precpua da educao, de um modo geral, e do Ensino Mdio ltima etapa da Educao Bsica em particular, vai alm da formao profissional, e atinge a construo da cidadania, preciso oferecer aos nossos jovens novas perspectivas culturais para que possam expandir seus horizontes e dot-los de autonomia intelectual, assegurando-lhes o acesso ao conhecimento historicamente acumulado e produo coletiva de novos conhecimentos, sem perder de vista que a educao tambm , em grande medida, uma chave para o exerccio dos demais direitos sociais. nesse contexto que o Ensino Mdio tem ocupado, nos ltimos anos, um papel de destaque nas discusses sobre educao brasileira, pois sua estrutura, seus contedos, bem como suas condies atuais, esto longe de atender s necessidades dos estudantes, tanto nos aspectos da formao para a cidadania como para o mundo do trabalho. Como consequncia

dessas discusses, sua organizao e funcionamento tm sido objeto de mudanas na busca da melhoria da qualidade. Propostas tm sido feitas na forma de leis, de decretos e de portarias ministeriais e visam, desde a incluso de novas disciplinas e contedos, at a alterao da forma de financiamento. Constituem-se exemplos dessas alteraes legislativas a criao do FUNDEB e a ampliao da obrigatoriedade de escolarizao, resultante da Emenda Constitucional no 59, de novembro de 2009. A demanda provocada por essas mudanas na legislao, por si s, j indica a necessidade de atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio (Parecer CNE/CEB no 15/98 e Resoluo CNE/CEB n 3/98), alm de se identificarem outros motivos que reforam essa necessidade. A elaborao de novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio se faz necessria, tambm, em virtude das novas exigncias educacionais decorrentes da acelerao da produo de conhecimentos, da ampliao do acesso s informaes, da criao de novos meios de comunicao, das alteraes do mundo do trabalho, e das mudanas de interesse dos adolescentes e jovens, sujeitos dessa etapa educacional. Nos dias atuais, a inquietao das juventudes que buscam a escola e o trabalho resulta mais evidente do que no passado. O aprendizado dos conhecimentos escolares tem significados diferentes conforme a realidade do estudante. Vrios movimentos sinalizam no sentido de que a escola precisa ser repensada para responder aos desafios colocados pelos jovens. Para responder a esses desafios, preciso, alm da reorganizao curricular e da formulao de diretrizes filosficas e sociolgicas para essa etapa de ensino, reconhecer as reais condies dos recursos humanos, materiais e financeiros das redes escolares pblicas em nosso pas, que ainda no atendem na sua totalidade s condies ideais. preciso que alm de reconhecimento esse processo seja acompanhado da efetiva ampliao do acesso ao Ensino Mdio e de medidas que articulem a formao inicial dos professores com as necessidades do processo ensino-aprendizagem, ofeream subsdios reais e o apoio de uma eficiente poltica de formao continuada para seus professores tanto a oferecida fora dos locais de trabalho como as previstas no interior das escolas como parte integrante da jornada de trabalho e dotem as escolas da infraestrutura necessria ao desenvolvimento de suas atividades educacionais. No sentido geral, da forma como est organizado na maioria das escolas, o Ensino Mdio no d conta de todas as suas atribuies definidas na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB). O trabalho Melhores Prticas em Escolas de Ensino Mdio no Brasil (BID, 2010) mostrou, entretanto, que possvel identificar, nos Estados da Federao, escolas pblicas que desenvolvem excelentes trabalhos. Com a promulgao da Lei n 9.394/96 (LDB), o Ensino Mdio passou a ser configurado com uma identidade prpria, como etapa final de um mesmo nvel da educao, que a Educao Bsica, e teve assegurada a possibilidade de se articular, at de forma integrada em um mesmo curso, com a profissionalizao, pois o artigo 36-A prev que o Ensino Mdio, atendida a formao geral do educando, poder prepar-lo para o exerccio de profisses tcnicas. No Brasil, nos ltimos 20 anos, houve uma ampliao do acesso dos adolescentes e jovens ao Ensino Mdio, a qual trouxe para as escolas pblicas um novo contingente de estudantes, de modo geral jovens filhos das classes trabalhadoras. Os sistemas de ensino passam a atender novos jovens com caractersticas diferenciadas da escola tradicionalmente organizada. Situao semelhante acontece com o aumento da demanda do Ensino Mdio no campo, cujo atendimento induz a novos procedimentos no sentido de promover a permanncia dos mesmos na escola, evitando a evaso e diminuindo as taxas de reprovao. 2

Apesar das aes desenvolvidas pelos governos estaduais e pelo Ministrio da Educao, os sistemas de ensino ainda no alcanaram as mudanas necessrias para alterar a percepo de conhecimento do seu contexto educativo e ainda no estabeleceram um projeto organizativo que atenda s novas demandas que buscam o Ensino Mdio. Atualmente mais de 50% dos jovens de 15 a 17 anos ainda no atingiram esta etapa da Educao Bsica e milhes de jovens com mais de 18 anos e adultos no concluram o Ensino Mdio, configurando uma grande dvida da sociedade com esta populao. De acordo com o documento Sntese dos Indicadores Sociais do IBGE: uma anlise das condies de vida da populao brasileira (IBGE, 2010), constata-se que a taxa de frequncia bruta s escolas dos adolescentes de 15 a 17 anos de 85,2%. J a taxa de escolarizao lquida dos mesmos adolescentes (de 15 a 17 anos) de 50,9%. Isso significa dizer que metade dos adolescentes de 15 a 17 anos ainda no est matriculada no Ensino Mdio. No Nordeste a taxa de escolaridade lquida ainda inferior, ficando em 39,1%. A proporo de pessoas de 18 a 24 anos de idade, economicamente ativas, com mais de 11 anos de estudos de 15,2% e a proporo de analfabetos nessa mesma amostra atinge a casa de 4,6%. Especificamente em relao ao Ensino Mdio, o nmero de estudantes da etapa , atualmente, da ordem de 8,3 milhes. A taxa de aprovao no Ensino Mdio brasileiro de 72,6%, enquanto as taxas de reprovao e de abandono so, respectivamente, de 13,1% e de 14,3% (INEP, 2009). Observe-se que essas taxas diferem de regio para regio e entre as zonas urbana e rural. H tambm uma diferena significativa entre as escolas privadas e pblicas. Em resposta a esses desafios que permanecem, algumas polticas, diretrizes e aes do governo federal foram desenvolvidas com a proposta de estruturar um cenrio de possibilidades que sinalizam para uma efetiva poltica pblica nacional para a Educao Bsica, comprometida com as mltiplas necessidades sociais e culturais da populao brasileira. Nesse sentido, situam-se a aprovao e implantao do FUNDEB (Lei n 11.494/2007), a formulao e implementao do Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), e a consolidao do Sistema de Avaliao da Educao Bsica (SAEB), do Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM) e do ndice de Desenvolvimento da Educao Bsica (IDEB). No mbito deste Conselho, destacam-se as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educao Bsica (Parecer CNE/CEB n 7/2010 e Resoluo CNE/CEB n 4/2010) e o processo de elaborao deste Parecer, de atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio. O Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), concretizado por Estados e Municpios, por meio da estruturao da adeso ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educao e respectivos Planos de Aes Articuladas (PAR), conduz reviso das polticas pblicas de educao e potencializa a articulao de programas e aes educacionais de governo. A concepo de uma educao sistmica expressa no PDE, ao valorizar conjuntamente os nveis e modalidades educacionais, possibilita aes articuladas na organizao dos sistemas de ensino. Significa compreender o ciclo educacional de modo integral, promovendo a articulao entre as polticas orientadas para cada nvel, etapa e modalidade de ensino e, tambm, a coordenao entre os instrumentos disponveis de poltica pblica. Viso sistmica implica, portanto, reconhecer as conexes intrnsecas entre Educao Bsica e Educao Superior; entre formao humana, cientfica, cultural e profissionalizao e, a partir dessas conexes, implementar polticas de educao que se reforcem reciprocamente. Para levar adiante todas as ideias preconizadas na LDB, a educao no Ensino Mdio deve possibilitar aos adolescentes, jovens e adultos trabalhadores acesso a conhecimentos que 3

permitam a compreenso das diferentes formas de explicar o mundo, seus fenmenos naturais, sua organizao social e seus processos produtivos. O debate sobre a atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio deve, portanto, considerar importantes temticas, como o financiamento e a qualidade da Educao Bsica, a formao e o perfil dos docentes para o Ensino Mdio e a relao com a Educao Profissional, de forma a reconhecer diferentes caminhos de atendimento aos variados anseios das juventudes e da sociedade. sabido que a questo do atendimento das demandas das juventudes vai alm da atividade da escola, mas entende-se que uma parte significativa desse objetivo pode ser alcanada por meio da transformao do currculo escolar e do projeto poltico-pedaggico. A atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio deve contemplar as recentes mudanas da legislao, dar uma nova dinmica ao processo educativo dessa etapa educacional, retomar a discusso sobre as formas de organizao dos saberes e reforar o valor da construo do projeto poltico-pedaggico das escolas, de modo a permitir diferentes formas de oferta e de organizao, mantida uma unidade nacional, sempre tendo em vista a qualidade do ensino. Para tratar especificamente da atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio foi criada, em janeiro de 2010, pela Portaria CNE/CEB n 1/2010, recomposta pela Portaria CNE/CEB n 2/2010, a Comisso constituda na Cmara de Educao Bsica (CEB) do CNE, formada pelos Conselheiros Adeum Sauer (presidente), Jos Fernandes de Lima (relator), Mozart Neves Ramos, Francisco Aparecido Cordo e Rita Gomes do Nascimento. Registre-se, por oportuno, que o Conselho Nacional de Educao, no cumprimento do que determina o art. 7o da Lei no 9.131/95 (que altera dispositivos da Lei n 4.024, de 20 de dezembro de 1961), vinha trabalhando na atualizao das vrias Diretrizes Curriculares Nacionais. Alm da elaborao das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educao Bsica, j foram atualizadas, entre outras, as Diretrizes para a Educao Infantil, para o Ensino Fundamental e para a Educao de Jovens e Adultos. Em agosto de 2010, a Secretaria de Educao Bsica do Ministrio da Educao (SEB/MEC) encaminhou ao CNE uma sugesto de resoluo feita por especialistas daquela Secretaria e outros contratados especificamente para elaborao do referido documento. Juntamente com a proposta de resoluo, a SEB encaminhou outros documentos para subsidiar as discusses, alm de disponibilizar tcnicos para acompanhamento dos trabalhos, dentre os quais cumpre destacar o Diretor de Concepes e Orientaes Curriculares para a Educao Bsica, Carlos Artexes Simes, e a Coordenadora Geral do Ensino Mdio, Maria Eveline Pinheiro Villar de Queiroz, bem como o consultor Bahij Amin Aur. A proposta foi encaminhada aos membros do Frum dos Coordenadores do Ensino Mdio que apresentaram, alm das sugestes das Secretarias Estaduais de Educao, um documento coletivo discutido na reunio do Frum, realizada em Natal, RN, em 1 de setembro de 2010. Em seguida, a mesma proposta foi submetida apreciao de especialistas que deram suas sugestes na reunio conjunta com os membros da Comisso Especial da CEB e da Secretaria de Educao Bsica do MEC, realizada nas dependncias do CNE, em 17 de setembro de 2010. No dia 4 de outubro de 2010, a sugesto de resoluo destas Diretrizes foi discutida em audincia pblica convocada pela Cmara de Educao Bsica e realizada no CNE e contou com a participao de mais de 100 pessoas, entre educadores e representantes de entidades. Destaque-se que o mesmo documento foi enviado ao Conselho Nacional de Secretrios de Educao (CONSED) que, por sua vez, o encaminhou para as Secretarias Estaduais de Educao. 4

Foram recebidas diversas contribuies individuais e de associaes, dentre as quais se destaca o documento enviado pela Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao (ANPEd)1. Em 16 de fevereiro de 2011, o relator participou da reunio do CONSED com os Secretrios Estaduais de Educao, para informar sobre o andamento dos trabalhos de elaborao destas Diretrizes e solicitar a contribuio dos mesmos. importante considerar que este parecer est sendo elaborado na vigncia de um quadro de mudanas e propostas que afetam todo o sistema educacional e, particularmente, o Ensino Mdio, dentre as quais se destacam os seguintes exemplos: I os resultados da Conferncia Nacional da Educao Bsica (2008); II os 14 anos transcorridos de vigncia da LDB e as inmeras alteraes nela introduzidas por vrias leis, bem como a edio de outras que repercutem nos currculos da Educao Bsica, notadamente no do Ensino Mdio; III a aprovao do Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica e de Valorizao dos Profissionais da Educao Bsica (FUNDEB), regulado pela Lei n 11.494/2007, que fixa percentual de recursos a todas as etapas e modalidades da Educao Bsica; IV a criao do Conselho Tcnico Cientfico (CTC) da Educao Bsica, da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior do Ministrio da Educao (CAPES/MEC); V a formulao, aprovao e implantao das medidas expressas na Lei n 11.738/2008, que regulamenta o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistrio pblico da Educao Bsica; VI a implantao do Programa Nacional do Livro Didtico para o Ensino Mdio (PNLEM); VII a instituio da poltica nacional de formao de profissionais do magistrio da Educao Bsica (Decreto n 6.755/2009); VIII a aprovao do Parecer CNE/CEB n 9/2009 e da Resoluo CNE/CEB n 2/2009, que fixam as Diretrizes Nacionais para os Planos de Carreira e Remunerao dos Profissionais do Magistrio da Educao Bsica Pblica; IX a aprovao do Parecer CNE/CEB n 9/2010 e da Resoluo CNE/CEB n 5/2010, que fixam as Diretrizes Nacionais para os Planos de Carreira e Remunerao dos Funcionrios da Educao Bsica pblica; X o final da vigncia do Plano Nacional de Educao (PNE), bem como a mobilizao em torno da nova proposta do PNE para o perodo 2011-2020; XI as recentes avaliaes do PNE, sistematizadas pelo CNE, expressas no documento Subsdios para Elaborao do PNE: Consideraes Iniciais. Desafios para a Construo do PNE (Portaria CNE/CP n 10/2009); XII a realizao da Conferncia Nacional de Educao (CONAE), com tema central Construindo um Sistema Nacional Articulado de Educao: Plano Nacional de Educao: suas Diretrizes e Estratgias de Ao, visando construo do PNE 20112020; XII a relevante alterao na Constituio, pela promulgao da Emenda Constitucional n 59/2009, que, entre suas medidas, assegura Educao Bsica obrigatria e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, inclusive a sua oferta gratuita para todos os que a ela no tiveram acesso na idade prpria, assegura o atendimento ao estudante, em todas as etapas da Educao Bsica, mediante programas suplementares1

ANPED. Diretrizes curriculares nacionais para o Ensino Mdio: proposta de debate ao parecer, 2010.

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de material didtico-escolar, transporte, alimentao e assistncia sade, bem como reduz, anualmente, a partir do exerccio de 2009, o percentual da Desvinculao das Receitas da Unio incidente sobre os recursos destinados a manuteno e ao desenvolvimento do ensino; XII a homologao das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educao Bsica (Parecer CNE/CEB n 7/2010 e Resoluo CNE/CEB n 4/2010); XIV a aprovao do Parecer CNE/CEB n 8/2010, que estabelece normas para aplicao do inciso IX do art. 4 da Lei n 9.394/96 (LDB), que trata dos padres mnimos de qualidade de ensino para a Educao Bsica pblica; XV iniciativas relevantes, tanto na esfera federal, sobretudo com o Programa Ensino Mdio Inovador do MEC, como na esfera estadual e, mesmo, na municipal; XVI a consolidao de sistemas nacionais de avaliao, como o Sistema de Avaliao da Educao Bsica (SAEB) e o Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM); XVII a reformulao do ENEM e sua utilizao nos processos seletivos das Instituies de Educao Superior, visando democratizar as oportunidades de acesso a esse nvel de ensino, potencialmente induzindo a reestruturao dos currculos do Ensino Mdio; XVIII a criao do ndice de Desenvolvimento da Educao Bsica (IDEB) para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino, com base no desempenho do estudante em avaliaes do INEP e em taxas de aprovao; XIX a instituio do Programa Nacional de Direitos humanos (PNDH 3), o qual indica a implementao do Plano Nacional de Educao em Direitos humanos (PNEDH). XX o envio ao Congresso Nacional do Projeto de Lei que trata do novo Plano Nacional de Educao para o perodo de 2011-2020. expectativa que estas diretrizes possam se constituir num documento orientador dos sistemas de ensino e das escolas e que possam oferecer aos professores indicativos para a estruturao de um currculo para o Ensino Mdio que atenda as expectativas de uma escola de qualidade que garanta o acesso, a permanncia e o sucesso no processo de aprendizagem e constituio da cidadania. Desse modo, o grande desafio deste parecer consiste na incorporao das grandes mudanas em curso na sociedade contempornea, nas polticas educacionais brasileiras e em constituir um documento que sugira procedimentos que permitam a reviso do trabalho das escolas e dos sistemas de ensino, no sentido de garantir o direito educao, o acesso, a permanncia e o sucesso dos estudantes, com a melhoria da qualidade da educao para todos.2. Direito educao

2.1 Educao como direito social A educao, por meio da escolarizao, consolidou-se nas sociedades modernas como um direito social, ainda que no tenha sido universalizada. Concebida como forma de socializar as pessoas de acordo com valores e padres culturais e tico-morais da sociedade e como meio de difundir de forma sistemtica os conhecimentos cientficos construdos pela humanidade, a educao escolar reflete um direito e representa componente necessrio para o exerccio da cidadania e para as prticas sociais. No Brasil, constituem-se importantes instrumentos normativos relativos educao, alm da prpria Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 e da Lei n 9.394/96 6

(Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional), tambm a Lei n 10.172/2001 (Plano Nacional de Educao para 2001-2010), embora j tenha chegado ao final de seus dez anos de vigncia. No tocante Constituio Federal, lembra-se a importante alterao promovida pela Emenda Constitucional n 59/2009, que assegura Educao Bsica obrigatria e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, o que significa que, regularizado o fluxo escolar no Ensino Fundamental, o Ensino Mdio tambm estar includo na faixa de obrigatoriedade, constituindo-se em direito pblico subjetivo. Na LDB, destaca-se que o inciso VI do art. 10 determina que os Estados incumbirse-o de assegurar o Ensino Fundamental e oferecer, com prioridade, o Ensino Mdio a todos que o demandarem (Redao dada pela Lei n 12.061/2009). O PNE 2001-2010 apresentou diagnstico e estabeleceu diretrizes, objetivos e metas para todos os nveis e modalidades de ensino, para a formao e a valorizao do magistrio e para o financiamento e a gesto da educao. Para o Ensino Mdio, estabeleceu a meta de atender 100% da populao de 15 a 17 anos at 2011, e Diretrizes para o Ensino Mdio, que constituam pressupostos para serem considerados na definio de uma poltica pblica para essa etapa. Desde 2007, o Ministrio da Educao, vem implementando o Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), como uma estratgia complementar ao PNE no que se refere ao seu carter executivo e de posio poltica de governo. Com prioridade na Educao Bsica de qualidade, o PDE assume uma concepo sistmica da educao e o compromisso explcito com o atendimento aos grupos discriminados pela desigualdade educacional. Alm disso, prope envolver todos, pais, estudantes, professores e gestores, em iniciativas que busquem o sucesso e a permanncia na escola. Para a implementao dessas medidas, o PDE adotou como orientao estratgica a mobilizao dos agentes pblicos e da sociedade em geral, com vistas adeso ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educao, a ser viabilizado mediante programas e aes de assistncia tcnica e financeira aos Estados e Municpios. O Projeto de Lei que cria o novo PNE estabelece 20 metas a serem alcanadas pelo pas de 2011 a 2020. As metas voltadas diretamente ou que tm relao com o Ensino Mdio so: I Universalizar, at 2016, o atendimento escolar para toda a populao de 15 a 17 anos e elevar, at 2020, a taxa lquida de matrculas no Ensino Mdio para 85%, nesta faixa etria. II Universalizar, para a populao de 4 a 17 anos, o atendimento escolar aos estudantes com deficincia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotao na rede regular de ensino. III Oferecer educao em tempo integral em 50% das escolas pblicas de Educao Bsica. IV Atingir as mdias nacionais para o IDEB j previstas no Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE). V Elevar a escolaridade mdia da populao de 18 a 24 anos de modo a alcanar o mnimo de 12 anos de estudo para as populaes do campo, da regio de menor escolaridade no pas e dos 25% mais pobres, bem como igualar a escolaridade mdia entre negros e no negros, com vistas reduo da desigualdade educacional. VI Oferecer, no mnimo, 25% das matrculas da Educao de Jovens e Adultos na forma integrada Educao Profissional nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Mdio. VII Duplicar as matrculas da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio, asse7

gurando a qualidade da oferta. VIII Garantir, em regime de colaborao entre a Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios, que todos os professores da Educao Bsica possuam formao especfica de nvel superior, obtida em curso de licenciatura na rea de conhecimento em que atuam. IX Formar 50% dos professores da Educao Bsica em nvel de ps-graduao lato e stricto sensu, garantir a todos formao continuada em sua rea de atuao. X Valorizar o magistrio pblico da Educao Bsica a fim de aproximar o rendimento mdio do profissional do magistrio com mais de onze anos de escolaridade do rendimento mdio dos demais profissionais com escolaridade equivalente. XI Assegurar, no prazo de dois anos, a existncia de planos de carreira para os profissionais do magistrio em todos os sistemas de ensino. XII Garantir, mediante lei especfica aprovada no mbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, a nomeao comissionada de diretores de escola vinculada a critrios tcnicos de mrito e desempenho e participao da comunidade escolar. XIII Ampliar progressivamente o investimento pblico em educao at atingir, no mnimo, o patamar de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) do pas. 2.2 Educao com qualidade social O conceito de qualidade da educao uma construo histrica que assume diferentes significados em tempos e espaos diversos e tem relao com os lugares de onde falam os sujeitos, os grupos sociais a que pertencem, os interesses e os valores envolvidos, os projetos de sociedade em jogo (Parecer CNE/CEB n 7/2010). Conforme argumenta Campos (2008), para os movimentos sociais que reivindicavam a qualidade da educao entre os anos 70 e 80, ela estava muito presa s condies bsicas de funcionamento das escolas, porque seus participantes, pouco escolarizados, tinham dificuldade de perceber as nuanas dos projetos educativos que as instituies de ensino desenvolviam. Na dcada de 90, sob o argumento de que o Brasil investia muito na educao, porm gastava mal, prevaleceram preocupaes com a eficcia e a eficincia das escolas, e a ateno voltou-se, predominantemente, para os resultados por elas obtidos quanto ao rendimento dos estudantes. A qualidade priorizada somente nesses termos pode, contudo, deixar em segundo plano a superao das desigualdades educacionais. Outro conceito de qualidade passa, entretanto, a ser gestado por movimentos de renovao pedaggica, movimentos sociais, de profissionais e por grupos polticos: o da qualidade social da educao. Ela est associada s mobilizaes pelo direito educao, exigncia de participao e de democratizao e comprometida com a superao das desigualdades e injustias. A Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO), ao entender que a qualidade da educao tambm uma questo de direitos humanos, defende conceito semelhante (2008). Para alm da eficcia e da eficincia, advoga que a educao de qualidade, como um direito fundamental, deve ser antes de tudo relevante, pertinente e equitativa. A relevncia reporta-se promoo de aprendizagens significativas do ponto de vista das exigncias sociais e de desenvolvimento pessoal. A pertinncia refere-se possibilidade de atender s necessidades e s caractersticas dos estudantes de diversos contextos sociais e culturais e com diferentes capacidades e interesses. A educao escolar, comprometida com a igualdade de acesso ao conhecimento a todos e especialmente empenhada em garantir esse acesso aos grupos da populao em desvantagem na sociedade, uma educao com qualidade social e contribui para dirimir as 8

desigualdades historicamente produzidas, assegurando, assim, o ingresso, a permanncia e o sucesso de todos na escola, com a consequente reduo da evaso, da reteno e das distores de idade-ano/srie (Parecer CNE/CEB n 7/2010 e Resoluo CNE/CEB n 4/2010, que definem as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educao Bsica). Exige-se, pois, problematizar o desenho organizacional da instituio escolar que no tem conseguido responder s singularidades dos sujeitos que a compem. Torna-se inadivel trazer para o debate os princpios e as prticas de um processo de incluso social que garanta o acesso e considere a diversidade humana, social, cultural e econmica dos grupos historicamente excludos. Para que se conquiste a incluso social, a educao escolar deve fundamentar-se na tica e nos valores da liberdade, justia social, pluralidade, solidariedade e sustentabilidade, cuja finalidade o pleno desenvolvimento de seus sujeitos, nas dimenses individual e social de cidados conscientes de seus direitos e deveres, compromissados com a transformao social. Diante dessa concepo de educao, a escola uma organizao temporal, que deve ser menos rgida, segmentada e uniforme, a fim de que os estudantes, indistintamente, possam adequar seus tempos de aprendizagens de modo menos homogneo e idealizado. A escola, face s exigncias da Educao Bsica, precisa ser reinventada, ou seja, priorizar processos capazes de gerar sujeitos inventivos, participativos, cooperativos, preparados para diversificadas inseres sociais, polticas, culturais, laborais e, ao mesmo tempo, capazes de intervir e problematizar as formas de produo e de vida. A escola tem, diante de si, o desafio de sua prpria recriao, pois tudo que a ela se refere constitui-se como inveno: os rituais escolares so invenes de um determinado contexto sociocultural em movimento. A qualidade na escola exige o compromisso de todos os sujeitos do processo educativo para: I a ampliao da viso poltica expressa por meio de habilidades inovadoras, fundamentadas na capacidade para aplicar tcnicas e tecnologias orientadas pela tica e pela esttica; II a responsabilidade social, princpio educacional que norteia o conjunto de sujeitos comprometidos com o projeto que definem e assumem como expresso e busca da qualidade da escola, fruto do empenho de todos. Construir a qualidade social pressupe conhecimento dos interesses sociais da comunidade escolar para que seja possvel educar e cuidar mediante interao efetivada entre princpios e finalidades educacionais, objetivos, conhecimentos e concepes curriculares. Isso abarca mais que o exerccio poltico-pedaggico que se viabiliza mediante atuao de todos os sujeitos da comunidade educativa. Ou seja, efetiva-se no apenas mediante participao de todos os sujeitos da escola estudante, professor, tcnico, funcionrio, coordenador mas tambm, mediante aquisio e utilizao adequada dos objetos e espaos (laboratrios, equipamentos, mobilirio, salas-ambiente, biblioteca, videoteca, ateli, oficina, rea para prticas esportivas e culturais, entre outros) requeridos para responder ao projeto poltico-pedaggico pactuado, vinculados s condies/disponibilidades mnimas para se instaurar a primazia da aquisio e do desenvolvimento de hbitos investigatrios para construo do conhecimento. A escola de qualidade social adota como centralidade o dilogo, a colaborao, os sujeitos e as aprendizagens, o que pressupe, sem dvida, atendimento a requisitos tais como: I reviso das referncias conceituais quanto aos diferentes espaos e tempos educativos, abrangendo espaos sociais na escola e fora dela;

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II considerao sobre a incluso, a valorizao das diferenas e o atendimento pluralidade e diversidade cultural, resgatando e respeitando os direitos humanos, individuais e coletivos e as vrias manifestaes de cada comunidade; III foco no projeto poltico-pedaggico, no gosto pela aprendizagem, e na avaliao das aprendizagens como instrumento de contnua progresso dos estudantes; IV inter-relao entre organizao do currculo, do trabalho pedaggico e da jornada de trabalho do professor, tendo como foco a aprendizagem do estudante; V compatibilidade entre a proposta curricular e a infraestrutura, entendida como espao formativo dotado de efetiva disponibilidade de tempos para a sua utilizao e acessibilidade; VI integrao dos profissionais da educao, dos estudantes, das famlias e dos agentes da comunidade interessados na educao; VII valorizao dos profissionais da educao, com programa de formao continuada, critrios de acesso, permanncia, remunerao compatvel com a jornada de trabalho definida no projeto poltico-pedaggico; VIII realizao de parceria com rgos, tais como os de assistncia social, desenvolvimento e direitos humanos, cidadania, trabalho, cincia e tecnologia, lazer, esporte, turismo, cultura e arte, sade, meio ambiente; IX preparao dos profissionais da educao, gestores, professores, especialistas, tcnicos, monitores e outros. A qualidade social da educao brasileira uma conquista a ser construda coletivamente de forma negociada, pois significa algo que se concretiza a partir da qualidade da relao entre todos os sujeitos que nela atuam direta e indiretamente. Significa compreender que a educao um processo de produo e socializao da cultura da vida, no qual se constroem, se mantm e se transformam conhecimentos e valores. Produzir e socializar a cultura inclui garantir a presena dos sujeitos das aprendizagens na escola. Assim, a qualidade social da educao escolar supe encontrar alternativas polticas, administrativas e pedaggicas que garantam o acesso, a permanncia e o sucesso do indivduo no sistema escolar, no apenas pela reduo da evaso, da repetncia e da distoro idadeano/srie, mas tambm pelo aprendizado efetivo. 3. O Ensino Mdio no Brasil Em uma perspectiva histrica (UNESCO, 2009), verifica-se que foi a reforma educacional conhecida pelo nome do Ministro Francisco Campos, que regulamentou e organizou o ensino secundrio, alm do ensino profissional e comercial (Decreto no 18.890/31) que estabeleceu a modernizao do ensino secundrio nacional. Apesar de modernizadora, essa reforma no rompeu com a tradio de uma educao voltada para as elites e setores emergentes da classe mdia, pois foi concebida para conduzir seus estudantes para o ingresso nos cursos superiores. Em 1942, por iniciativa do Ministro Gustavo Capanema, foi institudo o conjunto das Leis Orgnicas da Educao Nacional, que configuraram a denominada Reforma Capanema: a) Lei orgnica do ensino secundrio, de 1942; b) Lei orgnica do ensino comercial, de 1943; c) Leis orgnicas do ensino primrio, de 1946. Nas leis orgnicas firmou-se o objetivo do ensino secundrio de formar as elites condutoras do pas, a par do ensino profissional, este mais voltado para as necessidades emergentes da economia industrial e da sociedade urbana. Nessa reforma, o ensino secundrio mantinha dois ciclos: o primeiro correspondia ao curso ginasial, com durao de 4 anos, destinado a fundamentos; o segundo correspondia aos cursos clssico e cientfico, com durao de 3 anos, com o objetivo de consolidar a educao 10

ministrada no ginasial. O ensino secundrio, de um lado, e o ensino profissional, de outro, no se comunicavam nem propiciavam circulao de estudos, o que veio a ocorrer na dcada seguinte. Em 1950, a equivalncia entre os estudos acadmicos e os profissionais foi uma mudana decisiva, comunicando os dois tipos de ensino. A Lei Federal n 1.076/50 permitiu que concluintes de cursos profissionais ingressassem em cursos superiores, desde que comprovassem nvel de conhecimento indispensvel realizao dos aludidos estudos. Na dcada seguinte, sobreveio a plena equivalncia entre os cursos, com a equiparao, para todos os efeitos, do ensino profissional ao ensino propedutico, efetivada pela primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei n 4.024/61). Novo momento decisivo ocorreu dez anos depois, com a promulgao da Lei no 5.692/71, que reformou a Lei n 4.024/61, no que se refere ao, ento, ensino de 1 e de 2 graus. Note-se que ocorreu aqui uma transposio do antigo ginasial, at ento considerado como fase inicial do ensino secundrio, para constituir-se na fase final do 1o grau de oito anos. Para o 2o grau (correspondente ao atual Ensino Mdio), a profissionalizao torna-se obrigatria, supostamente para eliminar o dualismo entre uma formao clssica e cientfica, preparadora para os estudos superiores e, outra, profissional (industrial, comercial e agrcola), alm do Curso Normal, destinado formao de professores para a primeira fase do 1o grau. A implantao generalizada da habilitao profissional trouxe, entre seus efeitos, sobretudo para o ensino pblico, a perda de identidade que o 2 grau passara a ter, seja a propedutica para o ensino superior, seja a de terminalidade profissional. Passada uma dcada, foi editada a Lei n 7.044/82, tornando facultativa essa profissionalizao no 2 grau. O mais novo momento decisivo veio com a atual lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB), a Lei Federal n 9.394/96, que ainda vem recebendo sucessivas alteraes e acrscimos. A LDB define o Ensino Mdio como uma etapa do nvel denominado Educao Bsica, constitudo pela Educao Infantil, pelo Ensino Fundamental e pelo Ensino Mdio, sendo este sua etapa final. Das alteraes ocorridas na LDB, destacam-se, aqui, as trazidas pela Lei n 11.741/2008, a qual redimensionou, institucionalizou e integrou as aes da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio, da Educao de Jovens e Adultos e da Educao Profissional e Tecnolgica. Foram alterados os artigos 37, 39, 41 e 42, e acrescido o Captulo II do Ttulo V com a Seo IV-A, denominada Da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio, e com os artigos 36-A, 36-B, 36-C e 36-D. Esta lei incorporou o essencial do Decreto n 5.154/2004, sobretudo, revalorizando a possibilidade do Ensino Mdio integrado com a Educao Profissional Tcnica, contrariamente ao que o Decreto n 2.208/97 anteriormente havia disposto. A LDB define como finalidades do Ensino Mdio a preparao para a continuidade dos estudos, a preparao bsica para o trabalho e o exerccio da cidadania. Determina, ainda, uma base nacional comum e uma parte diversificada para a organizao do currculo escolar. Na sequncia, foram formuladas as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio, em 1998, que destacam que as aes administrativas e pedaggicas dos sistemas de ensino e das escolas devem ser coerentes com princpios estticos, polticos e ticos, abrangendo a esttica da sensibilidade, a poltica da igualdade e a tica da identidade. Afirmam que as propostas pedaggicas devem ser orientadas por competncias bsicas, contedos e formas de tratamento dos contedos previstos pelas finalidades do Ensino Mdio. Os princpios pedaggicos da identidade, diversidade e autonomia, da interdisciplinaridade e da contextualizao so adotados como estruturadores dos currculos. A base nacional comum organiza-se, a partir de ento, em trs reas de conhecimento: Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias; Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias; e Cincias Humanas e suas Tecnologias. 11

Mesmo considerando o tratamento dado ao trabalho didtico-pedaggico, com as possibilidades de organizao do Ensino Mdio, tem-se a percepo que tal discusso no chegou s escolas, mantendo-se ateno extrema no tratamento de contedos sem a articulao com o contexto do estudante e com os demais componentes das reas de conhecimento e sem aproximar-se das finalidades propostas para a etapa de ensino, constantes na LDB. Foi observado em estudo promovido pela UNESCO, que incluiu estudos de caso em dois Estados, que os ditames legais e normativos e as concepes tericas, mesmo quando assumidas pelos rgos centrais de uma Secretaria Estadual de Educao, tm fraca ressonncia nas escolas e, at, pouca ou nenhuma, na atuao dos professores (UNESCO, 2009). O Parecer CNE/CEB n 7/2010 e a Resoluo CNE/CEB n 4/2010, que definem as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para Educao Bsica, especificamente quanto ao Ensino Mdio, reiteram que etapa final do processo formativo da Educao Bsica e indicam que deve ter uma base unitria sobre a qual podem se assentar possibilidades diversas. A definio e a gesto do currculo inscrevem-se em uma lgica que se dirige, predominantemente, aos jovens, considerando suas singularidades, que se situam em um tempo determinado. Os sistemas educativos devem prever currculos flexveis, com diferentes alternativas, para que os jovens tenham a oportunidade de escolher o percurso formativo que atenda seus interesses, necessidades e aspiraes, para que se assegure a permanncia dos jovens na escola, com proveito, at a concluso da Educao Bsica. 2 Pesquisas realizadas com estudantes mostram a necessidade de essa etapa educacional adotar procedimentos que guardem maior relao com o projeto de vida dos estudantes como forma de ampliao da permanncia e do sucesso dos mesmos na escola. Estas Diretrizes orientam-se no sentido do oferecimento de uma formao humana integral, evitando a orientao limitada da preparao para o vestibular e patrocinando um sonho de futuro para todos os estudantes do Ensino Mdio. Esta orientao visa construo de um Ensino Mdio que apresente uma unidade e que possa atender a diversidade mediante o oferecimento de diferentes formas de organizao curricular, o fortalecimento do projeto poltico pedaggico e a criao das condies para a necessria discusso sobre a organizao do trabalho pedaggico. 4. Os sujeitos/estudantes do Ensino Mdio 4.1 As juventudes Os estudantes do Ensino Mdio so predominantemente adolescentes e jovens. Segundo o Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE), so considerados jovens os sujeitos com idade compreendida entre os 15 e os 29 anos, ainda que a noo de juventude no possa ser reduzida a um recorte etrio (Brasil, 2006). Em consonncia com o CONJUVE, esta proposta de atualizao das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio concebe a juventude como condio scio-histrico-cultural de uma categoria de sujeitos que necessita ser considerada em suas mltiplas dimenses, com especificidades prprias que no esto2

A liberdade de diversificao e flexibilidade de currculos encontra respaldo nos princpios constitucionais, reafirmados na LDB, da liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber e do pluralismo de ideias e concepes pedaggicas (Constituio Federal 1988, art. 206, Incisos II e III; e art. 3, Incisos II e III da LDB), alm do previsto na organizao da educao nacional, na obrigatoriedade dos sistemas de ensino de assegurar progressivos graus de autonomia pedaggica a suas unidades escolares (LDB. art. 15).

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restritas s dimenses biolgica e etria, mas que se encontram articuladas com uma multiplicidade de atravessamentos sociais e culturais, produzindo mltiplas culturas juvenis ou muitas juventudes. Entender o jovem do Ensino Mdio dessa forma significa superar uma noo homogeneizante e naturalizada desse estudante, passando a perceb-lo como sujeito com valores, comportamentos, vises de mundo, interesses e necessidades singulares. Alm disso, deve-se tambm aceitar a existncia de pontos em comum que permitam trat-lo como uma categoria social. Destacam-se sua ansiedade em relao ao futuro, sua necessidade de se fazer ouvir e sua valorizao da sociabilidade. Alm das vivncias prprias da juventude, o jovem est inserido em processos que questionam e promovem sua preparao para assumir o papel de adulto, tanto no plano profissional quanto no social e no familiar. Pesquisas sugerem que, muito frequentemente, a juventude entendida como uma condio de transitoriedade, uma fase de transio para a vida adulta (Dayrell, 2003). Com isso, nega-se a importncia das aes de seu presente, produzindo-se um entendimento de que sua educao deva ser pensada com base nesse vir a ser. Reduzem-se, assim, as possibilidades de se fazer da escola um espao de formao para a vida hoje vivida, o que pode acabar relegando-a a uma obrigao enfadonha. Muitos jovens, principalmente os oriundos de famlias pobres, vivenciam uma relao paradoxal com a escola. Ao mesmo tempo em que reconhecem seu papel fundamental no que se refere empregabilidade, no conseguem atribuir-lhe um sentido imediato (Sposito, 2005). Vivem ansiosos por uma escola que lhes proporcione chances mnimas de trabalho e que se relacione com suas experincias presentes. Alm de uma etapa marcada pela transitoriedade, outra forma recorrente de representar a juventude v-la como um tempo de liberdade, de experimentao e irresponsabilidade (Dayrell, 2003). Essas duas maneiras de representar a juventude como um vir a ser e como um tempo de liberdade mostram-se distantes da realidade da maioria dos jovens brasileiros. Para esses, o trabalho no se situa no futuro, j fazendo parte de suas preocupaes presentes. Uma pesquisa realizada com jovens de vrias regies brasileiras, moradores de zonas urbanas de cidades pequenas e capitais, bem como da zona rural, constatou que 60% dos entrevistados frequentavam escolas. Contudo, 75% deles j estavam inseridos ou buscando insero no mundo do trabalho (Sposito, 2005). Ou seja, o mundo do trabalho parece estar mais presente na vida desses sujeitos do que a escola. Muitos jovens abandonam a escola ao conseguir emprego, alegando falta de tempo. Todavia, possvel que, se os jovens atribussem um sentido mais vivo e uma maior importncia sua escolarizao, uma parcela maior continuasse frequentando as aulas, mesmo depois de empregados. O desencaixe entre a escola e os jovens no deve ser visto como decorrente, nem de uma suposta incompetncia da instituio, nem de um suposto desinteresse dos estudantes. As anlises se tornam produtivas medida que enfoquem a relao entre os sujeitos e a escola no mbito de um quadro mais amplo, considerando as transformaes sociais em curso. Essas transformaes esto produzindo sujeitos com estilos de vida, valores e prticas sociais que os tornam muito distintos das geraes anteriores (Dayrell, 2007). Entender tal processo de transformao relevante para a compreenso das dificuldades hoje constatadas nas relaes entre os jovens e a escola. Possivelmente, um dos aspectos indispensveis a essas anlises a compreenso da constituio da juventude. A formao dos indivduos hoje atravessada por um nmero crescente de elementos. Se antes ela se produzia, dominantemente, no espao circunscrito pela famlia, pela escola e pela igreja, em meio a uma razovel homogeneidade de valores, muitas outras instituies, hoje, participam desse jogo, apresentando formas de ser e de viver heterogneas. 13

A identidade juvenil determinada para alm de uma idade biolgica ou psicolgica, mas situa-se em processo de contnua transformao individual e coletiva, a partir do que se reconhece que o sujeito do Ensino Mdio constitudo e constituinte da ordem social, ao mesmo tempo em que, como demonstram os comportamentos juvenis, preservam autonomia relativa quanto a essa ordem. Segundo Dayrell, a juventude parte de um processo mais amplo de constituio de sujeitos, mas que tem especificidades que marcam a vida de cada um. A juventude constitui um momento determinado, mas no se reduz a uma passagem; ela assume uma importncia em si mesma. Todo esse processo influenciado pelo meio social concreto no qual se desenvolve e pela qualidade das trocas que este proporciona. (2003). Zibas, ao analisar as relaes entre juventude e oferta educacional observa que a ampliao do acesso ao Ensino Mdio, nos ltimos 15 anos, no veio acompanhada de polticas capazes de dar sustentao com qualidade a essa ampliao. Entre 1995 e 2005, os sistemas de ensino estaduais receberam mais de 4 milhes de jovens no Ensino Mdio, totalizando uma populao escolar de 9 milhes de indivduos (2009). diante de um pblico juvenil extremamente diverso, que traz para dentro da escola as contradies de uma sociedade que avana na incluso educacional sem transformar a estrutura social desigual mantendo acesso precrio sade, ao transporte, cultura e lazer, e ao trabalho que o novo Ensino Mdio se forja. As desigualdades sociais passam a tensionar a instituio escolar e a produzir novos conflitos (idem). Segundo Dayrell (2009), o censo de 2000 informa que 47,6% dos jovens da Regio Sudeste de 15 a 17 anos frequentavam o Ensino Mdio; no Nordeste apenas 19,9%; e a mdia nacional era de 35,7%. O autor assinala, com base em dados do IPEA (2008), que h uma frequncia lquida no Sul/Sudeste de 58%, contra 33,3% no Norte/Nordeste. Em que pese essa presena ser expressivamente maior na Regio Sul do pas, observa-se um quadro reiterado de desistncia da escola tambm nessa regio. Esse quadro parece se intensificar no Ensino Mdio, devido existncia de forte tenso na relao dos jovens com a escola (Correia e Matos, 2001; Dayrell, 2007; Krawczyk, 2009 apud Dayrell, 2009). Dentre os fatores relevantes a se considerar est a relao entre juventude, escola e trabalho. Ainda que no se parta, a priori, de que haja uma linearidade entre permanncia na escola e insero no emprego, as relaes entre escolarizao, formao profissional e gerao de independncia financeira por meio do ingresso no mundo do trabalho vm sendo tensionadas e reconfiguradas conforme sinalizam estudos acerca do emprego e do desemprego juvenil. O Brasil vive hoje um novo ciclo de desenvolvimento calcado na distribuio de renda que visa incluso de um grande contingente de pessoas no mercado consumidor. A sustentao desse ciclo e o estabelecimento de novos patamares de desenvolvimento requerem um aporte de trabalhadores qualificados em todos os nveis, o que implica na reestruturao da escola com vistas introduo de novos contedos e de novas metodologias de ensino capazes de promover a oferta de uma formao integral. Os jovens, atentos aos destinos do Pas, percebem essas modificaes e criam novas expectativas em relao s possibilidades de insero no mundo do trabalho e em relao ao papel da escola nos seus projetos de vida. Diante do exposto, torna-se premente que as escolas, ao desenvolverem seus projetos poltico-pedaggicos, se debrucem sobre questes que permitam ressignificar a instituio escolar diante de uma possvel fragilizao que essa instituio venha sofrendo, quando se trata do pblico alvo do Ensino Mdio, considerando, ainda, a necessidade de acolhimento de um sujeito que possui, dentre outras, as caractersticas apontadas anteriormente. Assim, sugerem-se questes como: Que caractersticas scio-econmico-culturais possuem os jovens que frequentam as escolas de Ensino Mdio? Que representaes a escola, seus professores e 14

dirigentes fazem dos estudantes? A escola conhece seus estudantes? Quais os pontos de proximidade e distanciamento entre os sujeitos das escolas (estudantes e professores particularmente)? Quais sentidos e significados esses jovens tm atribudo experincia escolar? Que relaes se podem observar entre jovens, escola e sociabilidade? Quais experincias os jovens constroem fora do espao escolar? Como os jovens interagem com a diversidade? Que representaes fazem diante de situaes que tm sido alvo de preconceito? Em que medida a cultura escolar instituda compe uma referncia simblica que se distancia/aproxima das expectativas dos estudantes? Que elementos da cultura juvenil so derivados da experincia escolar e contribuem para conferir identidade(s) ao jovem da contemporaneidade? Que articulaes existem entre os interesses pessoais, projetos de vida e experincia escolar? Que relaes se estabelecem entre esses planos e as experincias vividas na escola? Em que medida os sentidos atribudos experincia escolar motivam os jovens a elaborar projetos de futuro? Que expectativas so explicitadas pelos jovens diante da relao escola e trabalho? Que aspectos precisariam mudar na escola tendo em vista oferecer condies de incentivo ao retorno e permanncia para os que a abandonaram? Viabilizar as condies para que tais questes pautem as formulaes dos gestores e professores na discusso do seu cotidiano pode permitir novas formas de organizar a proposta de trabalho da escola na definio de seu projeto poltico-pedaggico. 4.2 Os estudantes do Ensino Mdio noturno O Ensino Mdio noturno tem estado ausente do conjunto de medidas acenadas para a melhoria da Educao Bsica. Estas Diretrizes definem que todas as escolas com Ensino Mdio, independentemente do horrio de funcionamento, sejam locais de incentivo, desafios, construo do conhecimento e transformao social. Para que esse objetivo seja alcanado, necessrio ter em mente as especificidades dos estudantes que compem a escola noturna, com suas caractersticas prprias. Em primeiro lugar, cabe destacar que a maioria dos estudantes do ensino noturno so adolescentes e jovens. Uma parte est dando continuidade aos estudos, sem interrupo, mesmo que j tenha tido alguma reprovao. Outra parte, no entanto, est retornando aos estudos depois de haver interrompido em determinado momento. Levantamentos especficos mostram que os estudantes do ensino noturno diferenciamse dos estudantes do ensino diurno, pois estes ltimos tm o estudo como principal atividade/interesse, enquanto os do noturno so, na sua maioria, trabalhadores antes de serem estudantes. Do ponto de vista das expectativas destes estudantes, uns objetivam prosseguir os estudos ingressando no ensino superior, enquanto outros pretendem manter ou retomar sua dedicao ao trabalho. O fato de muitos terem retornado aos estudos depois de t-los abandonado, um atestado de que acreditam no valor da escolarizao como uma forma de buscar melhores dias e um futuro melhor. Em geral so estudantes que, no tendo condio econmica favorvel, no tm acesso aos bens culturais e, como tal, esperam que a escola cumpra o papel de supridora dessas condies. No raras vezes, a escola noturna vista por esses estudantes trabalhadores como um locus privilegiado de socializao. Os que estudam e trabalham, em geral, enfrentam dificuldades para conciliar as duas tarefas. Todos tm conscincia de que as escolas noturnas convivem com maiores dificuldades do que as do perodo diurno e isso um fator de desestmulo. Segundo Arroyo (1986, in Togni e Carvalho, 2008), ao tratar do aluno (estudante)trabalhador, estamos nos referindo a um trabalhador que estuda, ou seja, jovens que, antes de serem estudantes, so trabalhadores e que dessa diferenciao, no deveria decorrer qualquer interpretao que indique uma valorizao diferente, por parte dos estudantes, da 15

escolarizao, mas sim, especificidades nas relaes estabelecidas na escola (Oliveira e Sousa, 2008). Desse modo, o enfrentamento das necessidades detectadas no ensino noturno passa, inicialmente, pelo reconhecimento da diversidade que caracteriza a escola e o corpo discente do ensino noturno para, em seguida, adequar seus procedimentos aos projetos definidos para a mesma. A prpria Constituio Federal, no inciso VI do art. 208, determina, de forma especial, a garantia da oferta do ensino noturno regular adequado s condies do educando. A LDB, no inciso VI do art. 4, reitera este mandamento como dever do Estado. Ainda a LDB, no 2 do art. 23, prescreve que o calendrio escolar dever adequar-se s peculiaridades locais, inclusive climticas e econmicas, a critrio do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o nmero de horas letivas previsto. Considerando, portanto, a situao e as circunstncias de vida dos estudantes trabalhadores do Ensino Mdio noturno, cabe indicar e possibilitar formas de oferta e organizao que sejam adequadas s condies desses educandos, de modo a permitir seu efetivo acesso, permanncia e sucesso nos estudos desta etapa da Educao Bsica. bice evidente a carga horria diria, a qual, se igual do curso diurno, no adequada para o estudante trabalhador, que j cumpriu longa jornada laboral. Este problema agravado em cidades maiores, nas quais as distncias e os deslocamentos do local de trabalho para a escola e desta para a morada impe acrscimo de sacrifcio, levando a atraso e perda de tempos escolares. Essa sobrecarga de horas no perodo noturno torna-se, sem dvida, causa de desestmulo e aproveitamento precrio que leva a uma deficiente formao e/ou reprovao, alm da reteno por faltas alm do limite legal e, no limite, de abandono dos estudos. Nesse sentido, com base no preceito constitucional e da LDB, e respeitados os mnimos previstos de durao e carga horria total, o projeto pedaggico deve atender com qualidade a singularidade destes sujeitos. 4.3 Os estudantes de Educao de Jovens e Adultos (EJA) O inciso I do art. 208 da Constituio Federal determina que o dever do Estado para com a educao efetivado mediante a garantia da Educao Bsica obrigatria e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele no tiverem acesso na idade prpria. A LDB, no inciso VII do art. 4, determina a oferta de educao escolar regular para jovens e adultos, com caractersticas e modalidades adequadas s suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se, aos que forem trabalhadores, as condies de acesso e permanncia na escola. O art. 37 traduz os fundamentos da EJA, ao atribuir ao poder pblico a responsabilidade de estimular e viabilizar o acesso e a permanncia do trabalhador na escola, mediante aes integradas e complementares entre si e mediante oferta de cursos gratuitos aos jovens e aos adultos, que no puderam efetuar os estudos na idade regular, proporcionando-lhes oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as caractersticas do alunado, seus interesses, condies de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. Esta responsabilidade deve ser prevista pelos sistemas educativos e por eles deve ser assumida, no mbito da atuao de cada sistema, observado o regime de colaborao e da ao redistributiva, definidos legalmente. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao e Jovens e Adultos esto expressas na Resoluo CNE/CEB n 1/2000, fundamentada no Parecer CNE/CEB n 11/2000, sendo que o Parecer CNE/CEB n 6/2010 e a Resoluo CNE/CEB n 3/2010 instituem Diretrizes Operacionais para a Educao de Jovens e Adultos (EJA) nos aspectos relativos durao dos cursos e idade mnima para ingresso nos cursos de EJA; idade mnima 16

e certificao nos exames de EJA; e Educao de Jovens e Adultos desenvolvida por meio da Educao a Distancia. Indicam, igualmente, que mantm os princpios, objetivos e diretrizes formulados no Parecer CNE/CEB n 11/2000. Sendo os jovens e adultos que estudam na EJA, no geral trabalhadores, cabem as consideraes anteriores sobre os estudantes do Ensino Mdio noturno, uma vez que esta modalidade , majoritariamente, oferecida nesse perodo. Assim, deve especificar uma organizao curricular e metodolgica que pode incluir ampliao da durao do curso, com reduo da carga horria diria e da anual, garantindo o mnimo total de 1.200 horas. A aproximao entre a EJA Ensino Mdio e a Educao Profissional, materializase, sobretudo, no Programa Nacional de Integrao da Educao Profissional com a Educao Bsica na Modalidade de Educao de Jovens e Adultos (PROEJA), institudo pelo Decreto n 5.840/2006. A proposta pedaggica do PROEJA alia direitos fundamentais de jovens e adultos, educao e trabalho. tambm fundamentada no conceito de educao continuada, na valorizao das experincias do indivduo e na formao de qualidade pressuposta nos marcos da educao integral. 4.4 Os estudantes indgenas, do campo e quilombolas O Ensino Mdio, assim como as demais etapas da Educao Bsica, assumem diferentes modalidades quando destinadas a contingentes da populao com caractersticas diversificadas, como , principalmente, o caso dos povos indgenas, do campo e quilombolas. O art. 78 da LDB se detm na oferta da Educao Escolar Indgena. Da confluncia dos princpios e direitos desta educao, traduzidos no respeito sociodiversidade; na interculturalidade; no direito de uso de suas lnguas maternas e de processos prprios de aprendizagem, na articulao entre os saberes indgenas e os conhecimentos tcnicocientficos com os princpios da formao integral, visando atuao cidad no mundo do trabalho, da sustentabilidade socioambiental e do respeito diversidade dos sujeitos, surge a possibilidade de uma educao indgena que possa contribuir para a reflexo e construo de alternativas de gerenciamento autnomo de seus territrios, de sustentao econmica, de segurana alimentar, de sade, de atendimento s necessidades cotidianas, entre outros. Esta modalidade tem Diretrizes prprias institudas pela Resoluo CNE/CEB n 3/99, que fixou Diretrizes Nacionais para o Funcionamento das Escolas Indgenas, com base no Parecer CNE/CEB n 14/99, A escola desta modalidade tem uma realidade singular, inscrita na territorialidade, em processos de afirmao de identidades tnicas, produo e (re)significao de crenas, lnguas e tradies culturais. Em funo de suas especificidades requer normas e ordenamentos jurdicos prprios em respeito aos diferentes povos, como afirmado no Parecer CNE/CEB n 14/99: Na estruturao e no funcionamento das escolas indgenas reconhecida sua condio de escolas com normas e ordenamento jurdico prprios, com ensino intercultural e bilngue, visando valorizao plena das culturas dos povos indgenas e a afirmao e manuteno de sua diversidade tnica. A escola indgena, portanto, visando cumprir sua especificidade, alicerada em princpios comunitrios, bilngues e/ou multilngues e interculturais, requer formao especfica de seu quadro docente, observados os princpios constitucionais, a base nacional comum e os princpios que orientam a Educao Bsica brasileira (artigos 5, 9, 10, 11, e inciso VIII do art. 4 da LDB), como destacado no Parecer CNE/CEB n 7/2010, de Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educao Bsica. A educao ofertada populao rural no Brasil tem sido objeto de estudos e de reivindicaes de organizaes sociais h muito tempo. O art. 28 da LDB estabelece o direito dos povos do campo a uma oferta de ensino adequada sua diversidade sociocultural. , pois, a partir dos parmetros poltico-pedaggicos prprios que se busca refletir sobre a Educao 17

do Campo. As Diretrizes Operacionais para a Educao Bsica nas Escolas do Campo esto orientadas pelo Parecer CNE/CEB n 36/2001, pela Resoluo CNE/CEB n 1/2002, pelo Parecer CNE/CEB n 3/2008 e pela Resoluo CNE/CEB n 2/2008. Esta modalidade da Educao Bsica e, portanto, do Ensino Mdio, est prevista no art. 28 da LDB, definindo, para atendimento da populao do campo, adaptaes necessrias s peculiaridades da vida rural e de cada regio, com orientaes referentes a contedos curriculares e metodologias apropriadas s reais necessidades e interesses dos estudantes da zona rural; organizao escolar prpria, incluindo adequao do calendrio escolar as fases do ciclo agrcola e as condies climticas; e adequao natureza do trabalho na zona rural. As propostas pedaggicas das escolas do campo com oferta de Ensino Mdio devem, portanto, ter flexibilidade para contemplar a diversidade do meio, em seus mltiplos aspectos, observados os princpios constitucionais, a base nacional comum e os princpios que orientam a Educao Bsica brasileira. Especificidades prprias, similarmente, tem a educao destinada aos quilombolas, desenvolvida em unidades educacionais inscritas em suas terras e cultura, requerendo pedagogia prpria em respeito especificidade tnico-cultural de cada comunidade e formao especfica de seu quadro docente. A Cmara de Educao Bsica do CNE instituiu Comisso para a elaborao de Diretrizes Curriculares especficas para esta modalidade (Portaria CNE/CEB n 5/2010). 4.5 Os estudantes da Educao Especial Como modalidade transversal a todos os nveis, etapas e modalidades de ensino a Educao Especial deve estar prevista no projeto poltico-pedaggico da instituio de ensino. O Ensino Mdio de pessoas com deficincia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotao3 segue, pois, os princpios e orientaes expressos nos atos normativos da Educao Especial, o que implica assegurar igualdade de condies para o acesso e permanncia na escola e o atendimento educacional especializado na rede regular de ensino. Conforme expresso no texto da Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia e de seu Protocolo Facultativo4, a deficincia um conceito em evoluo, resultante da interao entre pessoas com deficincia e as barreiras devidas s atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participao dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Considerando o respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as prprias escolhas e o entendimento da diversidade dos educandos com necessidades educacionais especiais, as instituies de ensino no podem restringir o acesso ao Ensino Mdio por motivo de deficincia. Tal discriminao configura violao da dignidade e do valor inerentes ao ser humano. Cabe assim s instituies de ensino garantir a transversalidade das aes da Educao Especial no Ensino Mdio, assim como promover a quebra de barreiras fsicas, de comunicao e de informao que possam restringir a participao e a aprendizagem dos educandos.

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Resoluo CNE/CEB n 4/2009. A Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia foi assinada em Nova Iorque, em 30/3/2007, e ratificada pelo Brasil pelo Decreto Legislativo n 186/2008 e Decreto Executivo n 6.949/2009 (no Congresso Nacional, por ter recebido trs quintos dos votos dos membros da Cmara e do Senado, em dois turnos, qurum qualificado, passou a ter status de norma constitucional).

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Nesse sentido, faz-se necessrio organizar processos de avaliao adequados s singularidades dos educandos, incluindo as possibilidades de dilatamento de prazo para concluso da formao e complementao do atendimento. Para o atendimento desses objetivos, devem as escolas definir formas inclusivas de atendimento de seus estudantes, devendo os sistemas de ensino dar o necessrio apoio para a implantao de salas de recursos multifuncionais; a formao continuada de professores para o atendimento educacional especializado e a formao de gestores, educadores e demais profissionais da escola para a educao inclusiva; a adequao arquitetnica de prdios escolares e a elaborao, produo e distribuio de recursos educacionais para a acessibilidade, bem como a estruturao de ncleos de acessibilidade com vistas implementao e integrao das diferentes aes institucionais de incluso de forma a prover condies para o desenvolvimento acadmico dos educandos, propiciando sua plena e efetiva participao e incluso na sociedade. 5. Pressupostos e fundamentos para um Ensino Mdio de qualidade social 5.1 Trabalho, cincia, tecnologia e cultura: dimenses da formao humana O trabalho conceituado, na sua perspectiva ontolgica de transformao da natureza, como realizao inerente ao ser humano e como mediao no processo de produo da sua existncia. Essa dimenso do trabalho , assim, o ponto de partida para a produo de conhecimentos e de cultura pelos grupos sociais. O carter teleolgico da interveno humana sobre o meio material, isto , a capacidade de ter conscincia de suas necessidades e de projetar meios para satisfaz-las, diferencia o ser humano dos outros animais, uma vez que estes no distinguem a sua atividade vital de si mesmos, enquanto o homem faz da sua atividade vital um objeto de sua vontade e conscincia. Os animais podem reproduzir, mas o fazem somente para si mesmos; o homem reproduz toda a natureza, porm de modo transformador, o que tanto lhe atesta quanto lhe confere liberdade e universalidade. Desta forma, produz conhecimentos que, sistematizados sob o crivo social e por um processo histrico, constitui a cincia. Nesses termos, compreende-se o conhecimento como uma produo do pensamento pela qual se apreende e se representam as relaes que constituem e estruturam a realidade. Apreender e determinar essas relaes exige um mtodo, que parte do concreto emprico forma como a realidade se manifesta e, mediante uma determinao mais precisa atravs da anlise, chega a relaes gerais que so determinantes do fenmeno estudado. A compreenso do real como totalidade exige que se conheam as partes e as relaes entre elas, o que nos leva a constituir sees tematizadas da realidade. Quando essas relaes so arrancadas de seu contexto originrio e ordenadas, tem-se a teoria. A teoria, ento, o real elevado ao plano do pensamento. Sendo assim, qualquer fenmeno que sempre existiu como fora natural s se constitui em conhecimento quando o ser humano dela se apropria tornando-a fora produtiva para si. Por exemplo, a descarga eltrica, os raios, a eletricidade esttica como fenmenos naturais sempre existiram, mas no so conhecimentos enquanto o ser humano no se apropria desses fenmenos conceitualmente, formulando teorias que potencializam o avano das foras produtivas. A cincia, portanto, que pode ser conceituada como conjunto de conhecimentos sistematizados, produzidos socialmente ao longo da histria, na busca da compreenso e transformao da natureza e da sociedade, se expressa na forma de conceitos representativos das relaes de foras determinadas e apreendidas da realidade. O conhecimento de uma seo da realidade concreta ou a realidade concreta tematizada constitui os campos da cincia, que so as disciplinas cientficas. Conhecimentos assim produzidos e legitimados socialmente 19

ao longo da histria so resultados de um processo empreendido pela humanidade na busca da compreenso e transformao dos fenmenos naturais e sociais. Nesse sentido, a cincia conforma conceitos e mtodos cuja objetividade permite a transmisso para diferentes geraes, ao mesmo tempo em que podem ser questionados e superados historicamente, no movimento permanente de construo de novos conhecimentos. A extenso das capacidades humanas, mediante a apropriao de conhecimentos como fora produtiva, sintetiza o conceito de tecnologia aqui expresso. Pode ser conceituada como transformao da cincia em fora produtiva ou mediao do conhecimento cientfico e a produo, marcada desde sua origem pelas relaes sociais que a levaram a ser produzida. O desenvolvimento da tecnologia visa satisfao de necessidades que a humanidade se coloca, o que nos leva a perceber que a tecnologia uma extenso das capacidades humanas. A partir do nascimento da cincia moderna, pode-se definir a tecnologia, ento, como mediao entre conhecimento cientfico (apreenso e desvelamento do real) e produo (interveno no real). Entende-se cultura como o resultado do esforo coletivo tendo em vista conservar a vida humana e consolidar uma organizao produtiva da sociedade, do qual resulta a produo de expresses materiais, smbolos, representaes e significados que correspondem a valores ticos e estticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade. Por essa perspectiva, a cultura deve ser compreendida no seu sentido mais ampliado possvel, ou seja, como a articulao entre o conjunto de representaes e comportamentos e o processo dinmico de socializao, constituindo o modo de vida de uma populao determinada. Uma formao integral, portanto, no somente possibilita o acesso a conhecimentos cientficos, mas tambm promove a reflexo crtica sobre os padres culturais que se constituem normas de conduta de um grupo social, assim como a apropriao de referncias e tendncias que se manifestam em tempos e espaos histricos, os quais expressam concepes, problemas, crises e potenciais de uma sociedade, que se v traduzida e/ou questionada nas suas manifestaes. Assim, evidencia-se a unicidade entre as dimenses cientfico-tecnolgico-cultural, a partir da compreenso do trabalho em seu sentido ontolgico. O princpio da unidade entre pensamento e ao correlato busca intencional da convergncia entre teoria e prtica na ao humana. A relao entre teoria e prtica se impe, assim, no apenas como princpio metodolgico inerente ao ato de planejar as aes, mas, fundamentalmente, como princpio epistemolgico, isto , princpio orientador do modo como se compreende a ao humana de conhecer uma determinada realidade e intervir sobre ela no sentido de transform-la. A unidade entre pensamento e ao est na base da capacidade humana de produzir sua existncia. na atividade orientada pela mediao entre pensamento e ao que se produzem as mais diversas prticas que compem a produo de nossa vida material e imaterial: o trabalho, a cincia, a tecnologia e a cultura. Por essa razo trabalho, cincia, tecnologia e cultura so institudos como base da proposta e do desenvolvimento curricular no Ensino Mdio de modo a inserir o contexto escolar no dilogo permanente com a necessidade de compreenso de que estes campos no se produzem independentemente da sociedade, e possuem a marca da sua condio histricocultural.

5.2 Trabalho como princpio educativo 20

A concepo do trabalho como princpio educativo a base para a organizao e desenvolvimento curricular em seus objetivos, contedos e mtodos. Considerar o trabalho como princpio educativo equivale a dizer que o ser humano produtor de sua realidade e, por isto, dela se apropria e pode transform-la. Equivale a dizer, ainda, que sujeito de sua histria e de sua realidade. Em sntese, o trabalho a primeira mediao entre o homem e a realidade material e social. O trabalho tambm se constitui como prtica econmica porque garante a existncia, produzindo riquezas e satisfazendo necessidades. Na base da construo de um projeto de formao est a compreenso do trabalho no seu duplo sentido ontolgico e histrico. Pelo primeiro sentido, o trabalho princpio educativo medida que proporciona a compreenso do processo histrico de produo cientfica e tecnolgica, como conhecimentos desenvolvidos e apropriados socialmente para a transformao das condies naturais da vida e a ampliao das capacidades, das potencialidades e dos sentidos humanos. O trabalho, no sentido ontolgico, princpio e organiza a base unitria do Ensino Mdio. Pelo segundo sentido, o trabalho princpio educativo na medida em que coloca exigncias especficas para o processo educacional, visando participao direta dos membros da sociedade no trabalho socialmente produtivo. Com este sentido, conquanto tambm organize a base unitria, fundamenta e justifica a formao especfica para o exerccio de profisses, estas entendidas como forma contratual socialmente reconhecida, do processo de compra e venda da fora de trabalho. Como razo da formao especfica, o trabalho aqui se configura tambm como contexto. Do ponto de vista organizacional, essa relao deve integrar em um mesmo currculo a formao plena do educando, possibilitando construes intelectuais mais complexas; a apropriao de conceitos necessrios para a interveno consciente na realidade e a compreenso do processo histrico de construo do conhecimento. 5.3 Pesquisa como princpio pedaggico A produo acelerada de conhecimentos, caracterstica deste novo sculo, traz para as escolas o desafio de fazer com que esses novos conhecimentos sejam socializados de modo a promover a elevao do nvel geral de educao da populao. O impacto das novas tecnologias sobre as escolas afeta tanto os meios a serem utilizados nas instituies educativas, quanto os elementos do processo educativo, tais como a valorizao da ideia da instituio escolar como centro do conhecimento; a transformao das infraestruturas; a modificao dos papeis do professor e do aluno; a influncia sobre os modelos de organizao e gesto; o surgimento de novas figuras e instituies no contexto educativo; e a influncia sobre metodologias, estratgias e instrumentos de avaliao. O aumento exponencial da gerao de conhecimentos tem, tambm, como consequncia que a instituio escolar deixa de ser o nico centro de gerao de informaes. A ela se juntam outras instituies, movimentos e aes culturais, pblicas e privadas, alm da importncia que vo adquirindo na sociedade os meios de comunicao como criadores e portadores de informao e de contedos desenvolvidos fora do mbito escolar. Apesar da importncia que ganham esses novos mecanismos de aquisio de informaes, importante destacar que informao no pode ser confundida com conhecimento. O fato dessas novas tecnologias se aproximarem da escola, onde os alunos, s vezes, chegam com muitas informaes, refora o papel dos professores no tocante s formas de sistematizao dos contedos e de estabelecimento de valores. Uma consequncia imediata da sociedade de informao que a sobrevivncia nesse ambiente requer o aprendizado contnuo ao longo de toda a vida. Esse novo modo de ser 21

requer que o aluno, para alm de adquirir determinadas informaes e desenvolver habilidades para realizar certas tarefas, deve aprender a aprender, para continuar aprendendo. Essas novas exigncias requerem um novo comportamento dos professores que devem deixar de ser transmissores de conhecimentos para serem mediadores, facilitadores da aquisio de conhecimentos; devem estimular a realizao de pesquisas, a produo de conhecimentos e o trabalho em grupo. Essa transformao necessria pode ser traduzida pela adoo da pesquisa como princpio pedaggico. necessrio que a pesquisa como princpio pedaggico esteja presente em toda a educao escolar dos que vivem/vivero do prprio trabalho. Ela instiga o estudante no sentido da curiosidade em direo ao mundo que o cerca, gera inquietude, possibilitando que o estudante possa ser protagonista na busca de informaes e de saberes, quer sejam do senso comum, escolares ou cientficos. Essa atitude de inquietao diante da realidade potencializada pela pesquisa, quando despertada no Ensino Mdio, contribui para que o sujeito possa, individual e coletivamente, formular questes de investigao e buscar respostas em um processo autnomo de (re)construo de conhecimentos. Nesse sentido, a relevncia no est no fornecimento pelo docente de informaes, as quais, na atualidade, so encontradas, no mais das vezes e de forma ampla e diversificada, fora das aulas e, mesmo, da escola. O relevante o desenvolvimento da capacidade de pesquisa, para que os estudantes busquem e (re)construam conhecimentos. A pesquisa escolar, motivada e orientada pelos professores, implica na identificao de uma dvida ou problema, na seleo de informaes de fontes confiveis, na interpretao e elaborao dessas informaes e na organizao e relato sobre o conhecimento adquirido. Muito alm do conhecimento e da utilizao de equipamentos e materiais, a prtica de pesquisa propicia o desenvolvimento da atitude cientfica, o que significa contribuir, entre outros aspectos, para o desenvolvimento de condies de, ao longo da vida, interpretar, analisar, criticar, refletir, rejeitar idias fechadas, aprender, buscar solues e propor alternativas, potencializadas pela investigao e pela responsabilidade tica assumida diante das questes polticas, sociais, culturais e econmicas. A pesquisa, associada ao desenvolvimento de projetos contextualizados e interdisciplinares/articuladores de saberes, ganha maior significado para os estudantes. Se a pesquisa e os projetos objetivarem, tambm, conhecimentos para atuao na comunidade, tero maior relevncia, alm de seu forte sentido tico-social. fundamental que a pesquisa esteja orientada por esse sentido tico, de modo a potencializar uma concepo de investigao cientfica que motiva e orienta projetos de ao visando melhoria da coletividade e ao bem comum. A pesquisa, como princpio pedaggico, pode, assim, propiciar a participao do estudante tanto na prtica pedaggica quanto colaborar para o relacionamento entre a escola e a comunidade.5.4 Direitos humanos como princpio norteador

As escolas, assim como outras instituies sociais, tm um papel fundamental a desempenhar na garantia do respeito aos direitos humanos. Este respeito constitui irrevogvel princpio nacional, pois nossa Constituio, j no seu prembulo, declara a instituio de um Estado Democrtico, destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Entre os princpios fundamentais do pas, consagra o fundamento da dignidade da pessoa humana; os objetivos de construir uma sociedade livre, 22

justa e solidria, de garantir o desenvolvimento nacional, de erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir as desigualdades sociais e regionais, e de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, etnia, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao; alm de consagrar o princpio da prevalncia dos direitos humanos nas suas relaes internacionais. A Constituio estabelece, ainda, os direitos e garantias fundamentais, afirmando, discriminadamente, os direitos e deveres individuais e coletivos. Aps sua promulgao em 1988, novos textos legais, documentos, programas e projetos vm materializando a defesa e promoo dos direitos humanos. So exemplos os Programas Nacional5, Estaduais e Municipais de Direitos Humanos, o Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA), o Estatuto do Idoso, a Conveno Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia (que tem status constitucional), as leis de combate discriminao racial e tortura, bem como as recomendaes das Conferncias Nacionais de Direitos Humanos. Estas iniciativas e medidas so fundamentadas em vrios instrumentos internacionais dos quais o Brasil signatrio, sob a inspirao da Declarao Universal de Direitos Humanos, de 1948. Compreender a relao indissocivel entre democracia e respeito aos direitos humanos implica no compromisso do Estado brasileiro, no campo cultural e educacional, de promover seu aprendizado em todos os nveis e modalidades de ensino. Os direitos humanos na educao encontram-se presentes como princpio internacional, no s nas Resolues da ONU acerca da Dcada da Educao em direitos humanos, como no Programa Mundial de Educao em Direitos Humanos. Conclama-se a responsabilidade coletiva de todos os pases a dar centralidade Educao em direitos humanos na legislao geral e especfica, na estrutura da poltica e planos educacionais, e nas diretrizes e programas de educao. Educar para os direitos humanos, como parte do direito educao, significa fomentar processos que contribuam para a construo da cidadania, do conhecimento dos direitos fundamentais, do respeito pluralidade e diversidade de nacionalidade, etnia, gnero, classe social, cultura, crena religiosa, orientao sexual e opo poltica, ou qualquer outra diferena, combatendo e eliminando toda forma de discriminao. Os direitos humanos, como princpio que norteia o desenvolvimento de competncias, com conhecimentos e atitudes de afirmao dos sujeitos de direitos e de respeito aos demais, desenvolvem a capacidade de aes e reflexes prprias para a promoo e proteo da universalidade, da indivisibilidade e da interdependncia dos direitos e da reparao de todas as suas violaes. Em um contexto democrtico, nos diversos nveis, etapas e modalidades, imprescindvel propiciar espaos educativos em que a cultura de direitos humanos perpasse todas as prticas desenvolvidas no ambiente escolar, tais como o currculo, a formao inicial e continuada dos profissionais da educao, o projeto poltico-pedaggico, os materiais didtico-pedaggicos, o modelo de gesto, e a avaliao, conforme indica o Plano Nacional de Educao em Direitos Humanos (PNEDH). nesse sentido que a implementao deste Plano prescrita pelo Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3), institudo pelo Decreto n 7.037/2009.6 Para isso, a escola tem um papel fundamental, devendo a Educao em direitos humanos ser norteadora da Educao Bsica e, portanto, do Ensino Mdio. 5.5 Sustentabilidade ambiental como meta universal5

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O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) est institudo pelo Decreto n 7.037/2009. O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) tem, como uma das diretrizes do Eixo Orientador V: Educao e Cultura em Direitos Humanos, a efetivao da Poltica Nacional de Educao em Direitos Humanos para fortalecer cultura de direitos, sendo seu Objetivo Estratgico I, a implementao do Plano Nacional de Educao em Direitos Humanos (PNEDH).

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O compromisso com a qualidade da educao no sculo XXI, em momento marcado pela ocorrncia de diversos desastres ambientais, amplia a necessidade dos educadores de compreender a complexa multicausalidade da crise ambiental contempornea e de contribuir para a preveno de seus efeitos deletrios e para o enfrentamento das mudanas socioambientais globais. Esta necessidade e decorrentes preocupaes so universais. Tais questes despertam o interesse das juventudes de todos os meios sociais, culturais, tnicos e econmicos, pois apontam para uma cidadania responsvel com a construo de um presente e um futuro sustentveis, sadios e socialmente justos. No Ensino Mdio h, portanto, condies para se criar uma educao cidad, responsvel, crtica e participativa, que possibilita a tomada de decises transformadoras a partir do meio ambiente no qual as pessoas se inserem, em um processo educacional que supera a dissociao sociedade/natureza. No contexto internacional significativa a atuao da Organizao das Naes Unidas (ONU), da qual o Brasil protagonista destacado. Ressalta-se, nesse mbito, o Tratado de Educao Ambiental para Sociedades Sustentveis e Responsabilidade Global, 1992, elaborado na Conferncia das Naes Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio92). Esse documento enfatiza a Educao Ambiental como instrumento de transformao social e poltica, comprometido com a mudana social, rompendo com o modelo desenvolvimentista e inaugurando o paradigma de sociedades sustentveis. Na Cpula do Milnio, promovida em setembro de 2000 pela ONU, 189 pases, incluindo o Brasil, estabeleceram os Objetivos de Desenvolvimento do Milnio (ODM), com o compromisso de colocar em prtica aes para que sejam alcanados at 2015. Um dos objetivos o de Qualidade de Vida e Respeito ao Meio Ambiente, visando inserir os princpios do desenvolvimento sustentvel nas polticas e nos programas nacionais, e reverter a perda de recursos ambientais. A mesma ONU instituiu o perodo de 2005 a 2014 como a Dcada da Educao para o Desenvolvimento Sustentvel, indicando uma nova identidade para a Educao, como condio indispensvel para a sustentabilidade, promovendo o cuidado com a comunidade de vida, a integridade dos ecossistemas, a justia econmica, a equidade social e de gnero, o dilogo para a convivncia e a paz. Estas preocupaes universais tm crescente repercusso no Brasil, que, institucionalmente, possui um Ministrio especfico no Governo Federal, secundado por Secretarias e rgos nos Estados e em Municpios. No contexto nacional, a Educao Ambiental est amparada pela Constituio Federal e pela Lei n 9.795/99, que dispe sobre a Educao Ambiental e institui a Poltica Nacional de Educao Ambiental (PNEA), bem como pela legislao dos demais entes federativos. A PNEA entende por esta educao os processos por meio dos quais o indivduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competncias voltadas para a conservao do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. Entre os objetivos fundamentais da Educao Ambiental, esto o desenvolvimento de uma compreenso integrada do meio ambiente em suas mltiplas e complexas relaes, e o incentivo participao individual e coletiva, permanente e responsvel, na preservao do equilbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparvel do exerccio da cidadania. E preceitua que ela componente essencial e permanente da educao nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os nveis e modalidades do processo educativo, seja formal ou no formal. Na educao formal e, portanto, tambm no Ensino Mdio, deve ser desenvolvida como uma prtica educativa integrada, contnua e permanente sem que constitua componente curricular especfico. 24

6. Desafios do Ensino Mdio preciso reconhecer que a escola se constitui no principal espao de acesso ao conhecimento sistematizado, tal como ele foi produzido pela humanidade ao longo dos anos. Assegurar essa possibilidade, garantindo a oferta de educao de qualidade para toda a populao, crucial para que a possibilidade da transformao social seja concretizada. Neste sentido, a educao escolar, embora no tenha autonomia para, por si mesma, mudar a sociedade, importante estratgia de transformao, uma vez que a incluso na sociedade contempornea no se d sem o domnio de determinados conhecimentos que devem ser assegurados a todos. Com a perspectiva de um imenso contingente de adolescentes, jovens e adultos que se diferenciam por condies de existncia e perspectivas de futuro desiguais, que o Ensino Mdio deve trabalhar. Est em jogo a recriao da escola que, embora no possa por si s resolver as desigualdades sociais, pode ampliar as condies de incluso social, ao possibilitar o acesso cincia, tecnologia, cultura e ao trabalho. O desenvolvimento cientfico e tecnolgico acelerado impe escola um novo posicionamento de vivncia e convivncia com os conhecimentos capaz de acompanhar sua produo acelerada. A apropriao de conhecimentos cientficos se efetiva por prticas experimentais, com contextualizao que relacione os conhecimentos com a vida, em oposio a metodologias pouco ou nada ativas e sem significado para os estudantes. Estas metodologias estabelecem relao expositiva e transmissivista que no coloca os estudantes em situao de vida real, de fazer, de elaborar. Por outro lado, tecnologias da informao e comunicao modificaram e continuam modificando o comportamento das pessoas e essas mudanas devem ser incorporadas e processadas pela escola para evitar uma nova forma de excluso, a digital. De acordo com Silva (2005), privilegiar a dimenso cognitiva no pode secundarizar outras dimenses da formao, como, por exemplo, as dimenses fsica, social e afetiva. Desse modo, pensar uma educao escolar capaz de realizar a educao em sua plenitude, implica em refletir sobre as prticas pedaggicas j consolidadas e problematiz-las no sentido de produzir a incorporao das mltiplas dimenses de realizao do humano como uma das grandes finalidades da escolarizao bsica. Como fundamento dessa necessidade podemos recorrer, por exemplo, a um dos grandes pensadores dos processos cognitivos, Henry Wallon, e apreender, a partir dele, essa natureza multidimensional implicada nas relaes de ensinar e aprender. Segundo Wallon (apud Silva, 2005), para que a aprendizagem ocorra, um conjunto de condies necessita estar satisfeito: a emoo, a imitao, a motricidade e o socius, isto , a condio da interao social. Esses quatro elementos, marcados por uma estreita interdependncia, geram a possibilidade de que cada um de ns possa se apropriar dos elementos culturais, objeto de nossa formao. Na ausncia de qualquer um deles, esse processo ocorre de forma limitada. Do mesmo modo, assim como a dimenso emocional-afetiva foi, historicamente, tratad