PARECER DA CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS A CRIMINALIZAÇÃO DO ... · um processo marcado pela...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
FACULDADE DE DIREITO E CIÊNCIAS DO ESTADO
PARECER DA CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS
A CRIMINALIZAÇÃO DO PIXO E SEUS IMPACTOS
SOBRE O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO
BELO HORIZONTE
NOVEMBRO/2015
CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS DA UFMG
PARECER DA CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS
A CRIMINALIZAÇÃO DO PIXO E SEUS IMPACTOS
SOBRE O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Parecer apresentado pelo programa de pesquisa e
extensão Clínica de Direitos Humanos da UFMG ao
programa de pesquisa e extensão Cidade e
Alteridade, ambos vinculados à Faculdade de Direito
e Ciências do Estado da UFMG, em relação à
manifestação do pixo no contexto urbano e sua
criminalização para anexação à ação judicial do caso
“Os Piores de Belô”.
BELO HORIZONTE
NOVEMBRO/2015
PARECER DA CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS
A CRIMINALIZAÇÃO DO PIXO E SEUS IMPACTOS
SOBRE O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Clínica de Direitos Humanos da UFMG: Camila Silva Nicácio (Coordenadora).
Equipe: Amanda Naves Drummond; Ana Luiza Bongiovani Batista de Souza
Figueiredo; Andressa Freitas Martins; Bárbara Moreira Carvalho; Eliana Moreira
de Lacerda; Fernanda Cristina Moura; Gabriel Benjamim de Carvalho; Gabriel
Oliveira Vilela; João Vitor Silva Miranda; José Henrique Pires; Júlia Silva Vidal;
Leandro Monteiro Oliveira Pinho; Letícia Soares Peixoto Aleixo; Lucas Parreira
Álvares; Luíza Born Mendanha; Luiza Machado de Oliveira Menezes; Marina
Agapito Soares; Odélio Porto Junior; Paula Gomes de Magalhães; Raissa Lott
Caldeira da Cunha; Ramila Cerqueira Mól; Sophia Pires Bastos; Thais Muchon
Schainberg.
Projetos Vinculados:
Diverso - Direitos e Diversidades: Marcelo Maciel Ramos (Coordenador).
Observatório pela Qualidade da Lei: Fabiana de Menezes Soares (Coordenadora).
BELO HORIZONTE
NOVEMBRO/2015
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Clínica de Direitos Humanos da UFMG – CdH/UFMG
Sumário Considerandos ............................................................................................................. 4
1. O Pixo como Expressão Artística ........................................................................... 4
1.1 O Pixo e a Cidade ............................................................................................... 8
1.2 Uma estética própria ......................................................................................... 12
1.3 A cidade polifônica – multiculturalismo ........................................................... 13
1.4 Do Pixo como Ato Político ............................................................................... 14
1.5 Dos Direitos Contemporâneos .......................................................................... 15
2. O Pixo como liberdade de expressão .................................................................... 19
2.1 O pixo como elemento comunicativo ................................................................ 19
2.2 Do instituto da liberdade de expressão .............................................................. 21
3. Da ponderação de Direitos e Pixação ................................................................... 22
3.1 Da Colisão de Direitos Fundamentais ............................................................... 23
3.2 Do Controle de Convencionalidade ................................................................... 25
3.3 Dos Parâmetros de Direito Internacional ........................................................... 26
3.4 Da Aplicação dos parâmetros nacionais e internacionais quando da colisão de
direitos no caso da Pixação ..................................................................................... 28
4. O Pixo pelo Direito Penal ...................................................................................... 31
4.1 Tolerância Zero, Movimento Respeito por BH .................................................. 31
4.2 Pixo e o Ordenamento Urbano .......................................................................... 34
4.3 Uma análise sobre a criminalização do Pixo a partir dos Princípios Penais do
Direito Penal Constitucional e do Direito Penal Mínimo ......................................... 35
4.3.1 Subsidiariedade ......................................................................................... 36
4.3.2 Fragmentariedade ...................................................................................... 37
4.3.3 Proporcionalidade ..................................................................................... 37
4.3.4 Razoabilidade ............................................................................................ 38
4.3.5 Princípio do respeito pelas autonomias culturais ........................................ 38
5. Considerações Finais ............................................................................................. 39
Referências Bibliográficas ........................................................................................ 41
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Considerandos
Considerando o pixo enquanto expressão artística, política e social;
Considerando que as expressões artísticas, políticas e sociais estão protegidas pelo
direito à liberdade de expressão;
Considerando que em caso de conflito aparente de princípios é necessária a realização
de ponderação entre estes;
Considerando os parâmetros internacionais para a aplicação e restrição do direito à
liberdade de expressão;
Considerando que o Direito Penal deve ser utilizado apenas como último recurso na
sociedade;
Considerando a criminalização da pixação no ordenamento jurídico brasileiro;
Considerando a quantidade de casos de pixadores que vêm sendo tratada pelo direito
penal, em especial os casos que chegam até a Divisão de Assistência Judiciária da
Faculdade de Direito da UFMG;
A Clínica de Direitos Humanos da UFMG vem apresentar o parecer que segue.
1. O Pixo como Expressão Artística
A equalização de lugares, segundo a socióloga brasileira Ana Clara Ribeiro, é
um processo marcado pela força da imagem e termina por empobrecer o “(...) diálogo
criador e criativo entre gerações e culturas” (2004, p.98), interditando, dessa forma,
encontros intersubjetivos.
Para a autora, a intervenção nas relações entre imagem e lugar tendem a
controlar a experiência urbana e inseri-las em circuitos que interessam à indústria da
imagem, à promoção imobiliária e à indústria farmacêutica. Desse modo, há a
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construção de tentativas de padronização do imaginário urbano, que pressionam a busca
por novos conteúdos para a urbanidade.
A manipulação estratégica da imagem fragiliza a apreensão da totalidade de
perspectivas e vivências existentes, acentuando o arbitrário que distingue o poder
simbólico das outras espécies de poder (RIBEIRO, 2007, p. 113).
Na cidade contemporânea, o espaço fabricado sofre um aparente alisamento das
superfícies, naturalizando o “clean”, o que implica a impossibilidade de reconhecimento
dos rastros de memória, seja nas pessoalidades, ou na produção do ambiente urbano da
casa ou do lugar.
Em razão disso, deflagra-se um processo no qual o preservacionismo cede à
padronização, à negação da ação das marcas do tempo (e das pessoas), e oferece-se
apenas à contemplação.
Como efeito da equalização ou homogeneização de lugares, fabrica-se um
espaço que não suporta a pluralidade cultural e de expressões diversas. Não há espaço
para o novo, a não ser que este seja previsível (como a moda) e nele não haja
possibilidade de contaminação ou composição de elementos fundamentais dos
processos subjetivos.
O modelo econômico adotado pelos países ocidentais ou ocidentalizados
impacta na dinâmica atual da produção do espaço. Aludido modelo transforma lugares
em espaços de passagem, e não de encontro. Esvazia-se, assim, a pluralidade dos usos,
subvertendo-o em espetáculo, mudança que vem por meio da revitalização, tantas vezes
agenciada pelo fetichismo da cultura e pela equalização de lugares (RIBEIRO, 2007).
Segundo a psicóloga social Maria Luísa Nogueira, o processo de alteração
mercadológica da dinâmica espacial culmina na desvalorização e revalorização dos
lugares e memórias, a partir das exigências de natureza global da hegemonia do capital
financeiro (NOGUEIRA apud RIBEIRO, 2007).
Uma forte característica da atualidade é o esvaziamento do espaço público, o
enfraquecimento da importância da ação coletiva como forma de enfrentamento de
problemas comuns, bem como a fragilização de vários dos movimentos estético-urbanos
que tiveram importância fundamental na construção da história social brasileira.
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Simultaneamente, lidamos com uma extrema valorização da intimidade
individual, vivida no espaço da vida privada, em consonância com o protecionismo
exacerbado aos padrões de vida convencionados, reiterados e ratificados por
hegemonias dominantes. O viver social se reduz ao cumprimento das normas formais
instituídas na sociedade, tendo-se em mente que o desconforto produzido deve ser
tratado e penalizado no âmbito das experiências de cada indivíduo.
Os grupos sociais, que têm os seus privilégios e interesses reforçados pelo
presente contexto social, buscam criar dispositivos de toda ordem para mantê-los.
Muitas vezes, a jurisprudência faz-se um desses dispositivos, legitimando e
instrumentalizando essa lógica.
O coletivo, ou seja, o espaço público, configura-se enquanto local de exercício
da inteligência criativa, locus em que as relações sociais produzem limites e
possibilidades para desvendamento e afirmação da singularidade de cada pessoa.
Dessa forma, questiona-se como a jurisprudência atual pode contribuir para a
construção de espaços públicos em que floresçam oportunidades coletivas de crítica da
vida social e da pessoalidade de cada um, com o intuito de garantir melhores condições
para a democratização e para a harmonia do convívio humano.
As diversas culturas juvenis e as novas perspectivas de ativismo de marca
contra-hegemônica também desafiam as ideias convencionais de participação. Sabe-se
que as vias institucionais são comumente alienígenas aos universos e linguagens
juvenis. Escutar e compreender as demandas e os desejos dos jovens não é
habitualmente a proposta da maioria das instituições políticas e sociais que, de alguma
maneira, lidam com esse público.
Aqui se inscreve, por exemplo, a intolerância aos pixadores em Belo Horizonte,
indicando para o despreparo e a falta de sensibilidade da máquina estatal para lidar com
esse fenômeno. Ao invés de políticas inclusivas, tem-se escandalosa política de
repressão policial somada às medidas desproporcionais alicerceadas na criminalização.
A pixação é tanto um sintoma quanto um modo de expressão, mesmo que seja
juridicamente considerada como um ato ilícito. Não se pode incorrer no reducionismo
de tomar o pixo como uma questão de “poluição visual”.
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É necessário que o pixo seja visto sob uma ótica que retrate sua complexidade de
significados, sentido e usos; lutas contra as formas de dominação ética, social e
religiosa; contra as formas de exploração que separam as pessoas daquilo que elas
produzem; ou contra aquilo que liga a pessoa a si mesma e a submete aos outros (lutas
contra a sujeição, contra as formas de subjetivação e submissão); de apropriação
simbólica e resposta ao mundo em que vivemos.
Demanda-se, então, uma política pública que possa lidar, sem o recurso à
criminalização, com esse contingente de jovens que encontram na pixação um meio de
afirmação, de desenho territorial, construção de novos mapas e itinerários nas urbes e,
porque não, de lirismo.
Grafites Urbanos (pixação e grafite) são, na forma como são exercidos e no comportamento libertário de seus agentes, uma linguagem, além de artística,
também política, que constrói novas significações dentro do espaço urbano e
público. (PENNACHIN, 2003, p. 5)
Historicamente, a pixação moderna emerge como mensageira política e
existencialista para, em seguida, desenhar contornos entrelaçados com as realidades
urbanas. Possui características de construção de itinerários e marcação de territórios
desde os anos 70.
A função criativa da pixação nas interações com os grandes centros urbanos é
considerada, para alguns, como arte interpelativa e reflexiva (característica presente em
muitas obras de arte consagradas). Os registros espalhados por todos os cantos das
grandes cidades podem ser lidos como um modo de enunciação dos esquecidos, de
reconhecimento de um modo outro/novo de habitar a cidade e de inscrição social.
Desse modo, a pixação insere fissuras nas sensibilidades urbanas e reivindica um
lugar social, uma autonomia. Neste aspecto, é cabível pontuar as resistências e seus
limites, no cenário da relação entre corpo, arquitetura e a apropriação simbólica do
espaço herdado (RIBEIRO, 2007).
Com a rebeldia e ousadia características, trata-se de uma forma de expressão e
denúncia da desigual situação de ocupação dos espaços públicos no país, que muito se
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encontram imersos na epidemia estética da publicidade das cidades ocidentalizadas
neste século.
A pixação, em sua polimorfia, representa também uma linguagem
comunicacional alternativa, capaz de sinalizar protestos de grupos oprimidos e ainda
como uma maneira de afirmar a própria existência dos que pixam, que se fazem existir
via insígnias, e colabora na construção de um sentimento de pertença social. Essa
perspectiva contrapõe-se à cidade que habitualmente é crivada pelo conflito, pela
impessoalidade e força. Desse modo, o significado das coisas, das memórias, das
pessoas, depende das possibilidades de apreensão dos lugares, do sentimento de
pertença a estes.
A questão da vida urbana tem íntima relação com a vivência cultural. Os afetos
que são produzidos em sensações e sentimentos originam diferentes usos do espaço da
cidade, a partir de nossas perspectivas e experiências singulares. “Outros lugares”, não
somente circunscritos a espaços geográficos, como também a tudo que nos cerca e do
qual nos diferenciamos, são referências para o próprio reconhecimento. Por isso, a
dimensão imaginária e afetiva da cidade é também tecida de pluralidade.
A existência inelutável do plano da alteridade que define a natureza das cidades
como heterogênicas nos faz pensar na diversidade de possibilidades de ocupação dos
espaços públicos. Esse movimento em direção a outro olhar sobre a cultura faz-nos
pensar medidas alternativas ao âmbito penal.
1.1 O Pixo e a Cidade
Pode-se compreender o território urbano como um espaço de expressão cultural
dinâmico, que é reescrito constantemente, por meio das mais diversas atividades. No
caso da pixação, há uma participação mais expressiva de jovens de periferia na busca
pela expressão individual, pelo pertencimento a um grupo e também pela presença em
espaços públicos.
A discussão sobre pixo como expressão comunicativa, política e artística é
importante para entender os movimentos e apropriações urbanas que configuram os
cenários das metrópoles modernas.
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Assim como qualquer peça e atividade artística legitimada pelos circuitos
comerciais e críticos, a pixação deve ser percebida em suas características próprias
como produto cultural e artístico oriundo de grupos sociais principalmente periféricos.
Essa legitimidade, que ainda não aparece no sistema jurídico e legal, já está
definida em âmbitos de curadorias e conhecimentos do mundo da arte. Faz-se
necessário que, assim como nos circuitos de arte contemporânea, bem como nos estudos
e pesquisas acadêmicas, o pixo seja lido como expressão legítima de comunicação e
política.
A dimensão artística do pixo começou a ser intensamente discutida a partir da
28º Bienal de São Paulo que ocorreu em 2008. Conforme argumentam as pesquisadoras
do departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais:
A visibilidade e as controvérsias provocadas pelas pixações de 2008
reverberaram no mundo artístico e os pixadores começaram a ser convidados
para participar de diferentes eventos. O primeiro desses convites veio em
julho de 2009: Djan Ivson (o Cripta) foi convidado pela Fundação Cartier, em Paris, a participar de uma retrospectiva mundial sobre o grafite intitulada
“Nascido nas ruas – Grafite”. A participação de Djan envolvia a exposição de
sua coleção de “folhinhas” com a assinatura de diversos pixadores, além da
pixação da fachada do prédio em que ocorria o evento, em que o pixador teve
liberdade para atuar da forma que desejasse. (MARQUES; OLIVEIRA, 2014,
p. 73)
O evento de 2008 desencadeou no Brasil uma série de discussões sobre o pixo.
O que fez com que essa modalidade entrasse de vez no mundo das artes foi o ato de
aproximadamente 40 pessoas que ingressaram na Bienal de São Paulo como visitantes e
pixaram as paredes e as pilastras de um andar do prédio que havia sido deixado vazio.
Na ocasião, uma série de debates estendeu-se de modo a discutir os limites da
arte. Os desdobramentos, embora apresentando dissensos de vozes sobre a legitimidade
artística do pixo, resultaram no convite feito pela curadoria da 29ª Bienal de São Paulo a
pixadores para participarem do evento.
Em 2012, outros pixadores foram convidados a participar da Bienal de Berlim
com o propósito de desenvolver um workshop de pixo para os participantes do evento.
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Com isso, percebemos a adesão de pessoas e grupos legitimados no mercado da arte em
relação ao pixo.
Em consonância com essa visão sobre o pixo como expressão artística, o
documentarista João Wainer, que produziu o filme “Pixo”, argumenta em prol de uma
comparação entre os pixadores e grandes artistas legitimados:
Mas não é só porque acho pixo bonito que digo que é arte. Acho que quem
nasce pobre na favela é programado pelo sistema pra ficar quieto, e quando
ele deixa de lado o lugar que lhe foi destinado e se expressa através de um
rap cheio de raiva ou de uma pixação de 20 metros num viaduto, ele faz
exatamente o que grandes artistas contemporâneos fizeram com suas obras:
estão incomodando. E a sensação de incômodo é o princípio ativo de toda
arte que se preze. (MEDEIROS apud WAINER, 2006, p. 16)
Em análise ao comentário, observa-se que um dos problemas da legitimação do
pixo como arte decorre do fato de que o senso comum relaciona essa prática à
criminalidade e à marginalidade. Todavia, nas práticas cotidianas e nos próprios signos
espalhados pelas cidades, mais do que relacionado à criminalidade, o pixo está
relacionado a um aparato maior de técnicas e saberes da arte de rua.
É importante contextualizar o pixo em uma rede de outras atividades a fim de
perceber como essa modalidade artística faz parte de um conjunto maior, que se entende
como arte de rua: skate, grafite, parkour, o hip-hop, o rap etc. Articuladas, essas
experiências do sensível têm como suporte a cidade e estão atreladas a culturas de
resistência de narrativas a construções hegemônicas.
Sobre esse quadro geral em que se insere a pixação, destaca-se a colocação da
pesquisadora Pallamin, ao dizer que “a arte urbana é enfocada enquanto um modo de
construção social dos espaços públicos, uma via de produção simbólica da cidade,
expondo e mediando suas conflitantes relações sociais”. (2000, p. 13).
Dessa forma, entrevê-se a produção de significados sobre a cidade através das
práticas de pixação, que desvelam as desigualdades sociais que marcam territórios,
arquiteturas, bem como um conjunto de gostos e sensibilidades estéticas.
Dentro dessa seara da arte de rua, a interseção e confusão nas separações de
grafite e pixo são complexas. Enquanto o grafite é regulado constitucionalmente, o pixo
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possui um caráter de ilegalidade. Ambos têm um aspecto transgressor e usam da mesma
ferramenta de trabalho: o spray aerossol.
Não é estabelecida uma diferença estética ou valorativa entre grafite e pixação,
no entanto, é certo que a sociedade em geral, e o Estado em particular, veem com mais
benevolência as obras produzidas por grafiteiros do que as realizadas por pixadores.
Sendo assim, a forma popular de perceber as mais variadas maneiras de intervir
na estética da cidade é, em geral, baseada em uma dicotomia simplista: grafite é tudo
que é belo e reluzente; pixo é o monocromático que suja.
Na diferenciação de grafite e pixo, o que ocorreu foi que, pelo ludismo do
primeiro em detrimento do monocromatismo do segundo, o grafite foi mais rapidamente
incorporado ao mercado das artes.
Sobre tal questão, a pesquisadora Pennachin (2011) afirma que o grafite passou a
ser cada vez reconhecido em sua dimensão artística, enquanto o pixo segue rotulado
como ato de vandalismo.
Pelo exposto, percebe-se que as práticas do pixo e do grafite contêm
similaridades em suas origens e ambas atuam por meio de uma reapropriação estética da
cidade. É dissonante que no ordenamento jurídico brasileiro ambas sejam tratadas de
forma distinta. A legislação estaria, nesse contexto, reproduzindo consensos estéticos
que buscam respaldo no conservadorismo de classes sociais dominantes.
A cidade contemporânea é percebida como um espaço de fluxos
comunicacionais, que podem ser transformados pela interação dos sujeitos e por novas
práticas culturais. No entanto, não se deve perder de vista que os espaços urbanos não
são acessados da mesma forma pelos distintos grupos sociais. Isso, antes de contribuir
para uma coexistência intercultural no sentido de uma celebração harmônica da
diversidade, favorece o aparecimento de novos conflitos, separando o que é
institucionalizado do que é condenável, sujo, impuro.
Portanto, faz-se necessário reconhecer que a dicotomia criada entre o limpo e o
sujo; o belo e o feio, está assentada em construtos sociais e históricos de reprodução de
hierarquias sociais e manutenção de interesses hegemônicos.
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Seja, talvez, pela contestação do branco dos muros, e, igualmente, da
manutenção das hierarquias sociais, que o pixo encontra resistência diante de parte da
sociedade e das instituições. No entanto, cabe ao Direito reconhecer essa expressão
artística como potência de voz e visibilidades para aqueles que há anos vêm sendo
marginalizados na sociedade brasileira.
A produção artística, historicamente, associou-se aos pressupostos estéticos
valorativos que estão fortemente vinculados a um ideal do que é belo. O belo, em um
processo cultural, social e histórico, se construiu com bases em padrões e criações de
povos e grupos específicos que tinham legitimidade de organizar esses padrões. Nesse
movimento, naturalizou-se o belo como o conjunto estético que reflete valores
eurocêntricos.
O pixo, ao fugir de determinadas lógicas imagéticas, perde no senso comum sua
beleza e valor estético. Define-se que a lisura das paredes e o branco do muro contêm
em si traços do belo que o pixo não tem.
1.2 Uma estética própria
Um dos argumentos utilizados para questionar o status artístico do pixo reside
no fato de que uma parte da população não entende o conteúdo das mensagens.
Esse conteúdo pode resumir-se muitas vezes à assinatura do pixador e ao
símbolo do grupo. Porém, nem por isso deve ser negado ao pixo o status de arte, uma
vez que não é apenas pela dificuldade de leitura do espectador que obras de arte são
desacreditadas.
Além disso, o pixo traz, como uma das contribuições para a arte contemporânea,
a estilização dos traços que formam uma caligrafia específica sobre a paisagem urbana.
A caligrafia da pixação é composta por traços retos que formam diversas arestas em
uma forma homogeneizadora. Massimo Canevacci (1993) pesquisador de dinâmicas
urbanas, usa a expressão “árabe-gótico” para definir as escritas dos pixadores.
Essas letras têm uma aproximação aos rabiscos próprios da verdadeira escrita
árabe, com sua exigência quase exagerada de entrelaçamentos que constroem cifras,
bordados, heras; e também à seriedade do alfabeto gótico, feito de signos convexos e
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côncavos, de ângulos agudos, de improvisadas acelerações, com subidas e descidas dos
signos.
Ainda sobre a caligrafia do pixo, o pesquisador Tristan Manco (2005) evidencia
que os pixadores utilizam uma caligrafia que tem influências das tipografias usadas nas
capas de álbum de rock n’ roll e ainda vestígios das fontes de OldEnglish utilizadas por
grupos latino-americanos de Los Angeles desde a década de 1930.
É inevitável, portanto, reconhecer que ali contém uma quantidade de saberes e
conhecimento próprios desses grupos de pixadores. Os demais moradores das cidades,
mesmo que não entendam o conteúdo e os significados dos pixos, não estão isolados da
experiência visual que essas manifestações propiciam, vez que o pixo preenche e
compõe a paisagem urbana das metrópoles brasileiras.
1.3 A cidade polifônica – multiculturalismo
Entender que o pixo tem história, estética e envolve uma apropriação da cidade
por parte de alguns agentes sociais evidencia a necessidade de reconhecê-lo, sem
depreciações valorativas e elitismos culturais, como expressão artística legítima.
Negar ao pixo o caráter artístico é “apagar” novamente grupos estigmatizados
socialmente. No ambiente urbano, onde diversas experiências coexistem, faz-se
necessário reconhecer o pixo a partir de um olhar multicultural que enxergue essas
práticas como artísticas inseridas no âmbito da arte de rua e da cultura popular.
A pixação é um elemento comunicativo importante que preenche a cidade,
possibilitando uma interação simbólica e comunicativa entre os agentes sociais que
circulam no meio urbano. Argumenta-se em prol de uma cidade polifônica, na qual
coexistam diferentes culturas, respeitando-se os espaços de trocas simbólicas e a cultura
periférica.
O multiculturalismo pressupõe a coexistência e a interlocução de diversas
formas de fazer, ser e viver as experiências artísticas. Evita-se, dessa forma, a criação e
manutenção de dicotomias que ditam o belo e o feio; o limpo e o sujo; o legal e o ilegal.
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Dissolvidas e relativizadas essas dicotomias, torna-se palpável que pintar
paredes não destrói coisa alguma e sim reconstrói significados, redes e subjetivações do
espaço através da produção de imagens.
1.4 Do Pixo como Ato Político
Para entender o pixo como uma manifestação política, faz-se necessário analisar
sua origem, principalmente no contexto brasileiro. A partir do documentário Pixo
(2009), do diretor João Wainer, encontra-se na fala do fotógrafo Choque essa
experiência:
A primeira pixação no Brasil é a pixação política contra a ditadura que
começou na década de 60, que era o típico ‘abaixo a ditadura’ e onde o cunho
era só político, não tinha a preocupação estética com as letras, era uma estética legível para qualquer alfabetizado ler. Depois da pixação da ditadura,
que é a pixação política, vieram as pixações poéticas que como o próprio
nome diz são frases poéticas. No começo da década de 80, sendo um
desdobramento do movimento punk, que também era pixação de cunho
político, vem a pixação de São Paulo que é um pouco mais focado no ego no
pixador. O precursor foi o ‘cão fila Km 26’, que não foi um pixador como a
gente conhece hoje em dia, ele era dono de um canil que vendia cão fila e
saiu espalhando pela cidade inteira essa pixação ‘cão fila Km 26’. (CHOQUE
in WAINER, 2009).
Aludido entendimento é importante para perceber a identidade de "ser pixador",
partilhada por quem praticava em sua origem e quem pratica atualmente. Dessa forma,
observa-se que a pixação nem sempre tem um discurso político explícito ou
externalizado; mas é sempre voltada para o diálogo com algum grupo social.
Assim, o pixo se configura como uma intervenção artística urbana que
possibilita ao pixador intervir ativamente na cidade, em seu cotidiano urbano, e a
transformar a realidade em que se vive.
Esse instrumento de ação dá-se pela tensão causada por essa manifestação,
primeiramente por ser constitutivamente não autorizada e muitas vezes ilegível a quem
não está inserido no meio, o que caracteriza uma linguagem transgressora própria dos
grupos.
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Contudo, essa estética do pixo, não compreendida por alguns, constitui a
identidade cultural e artística compartilhada pelos pixadores, que participam de
encontros e dividem experiências e suas "assinaturas".
Salienta-se, ainda, quanto à questão do reconhecimento e da memória dos
pixadores, que frequentemente outros pixadores reconhecidos ou já falecidos são
homenageados. Além disso, tem-se a importância de "não atropelar" - passar em cima
da intervenção do outro -, sendo tal conduta considerada um grande desrespeito e
ofensa.
Dessa forma, luta-se para permanecer na história da cidade, não uma história
oficial de monumentos e personagens consagrados, mas a história da pixação,
majoritariamente de jovens marginalizados e de suas relações de sociabilidade no
contexto metropolitano (PEREIRA, 2012). Nesse sentido é uma frase consagrada entre
os pixadores: "quem não é visto, não é lembrado".
Posto isso, é possível afirmar que o pixo deve ser tratado não somente como
expressão artística, mas igualmente como ato político, que compreende, além da
emissão direta de opinião política, o posicionamento como sujeito ativo na realidade
social em que se está inserido. O filósofo francês Rancière afirma o ato polít ico como
sendo:
(…) tornar-se um sujeito político está ligado à subversão das expectativas
que os nomes e lugares dados pela ordem policial criam sobre os indivíduos.
Os “sem-parte” desejam mostrar que existem, para além dos nomes e
atributos que lhes foram atribuídos pela ordem policial, outros nomes que os
identificam como capazes de desenvolver habilidades que vão além daquelas
que geralmente lhes são designadas. (1996, p. 119).
Dessa forma, o pixo se traduz como uma ferramenta de transformação social,
ligada à subversão, não só do que é esperado desses agentes, mas à subversão do
próprio espaço público.
1.5 Dos Direitos Contemporâneos
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Relativamente aos direitos em foco, no Brasil, a Constituição da República de
1988 é ordenada prioritariamente pelo princípio da igualdade e proíbe a discriminação
de qualquer natureza, o que se explicita nos artigos 3º e 5º:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais
e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades
fundamentais;
Tais mandamentos constitucionais denotam uma grande preocupação do
legislador constituinte com a promoção do conceito de igualdade, considerando-a como
direito fundamental em que se baseia o Estado Democrático de Direito brasileiro.
Na esteira da igualdade segue-se a liberdade, outro direito fundamental explícito
em nossa Constituição, que o confere como valor amplo, do pleno direito de ir vir até o
direito de expressar ideias, interpretações e manifestações intelectuais de toda ordem,
defesa à violação da dignidade e à honra da pessoa.
É o que se verifica no artigo 5º da Constituição da República, incisos IV, IX e X,
no capítulo que trata especificamente sobre os direitos e deveres individuais e coletivos:
IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX- é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independente de censura ou licença;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;
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O texto constitucional confere, ainda, no artigo 220 do capítulo sobre
comunicação social, o direito a manifestações políticas, ideológicas e artísticas,
impedindo sua restrição e vedando a censura de qualquer natureza.
A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o
disposto na Constituição no sentido de ser “vedada toda e qualquer censura de natureza
política, ideológica e artística”.
A proteção constitucional à liberdade de expressão, após o obscuro período
ditatorial em nosso país, pode ser considerada uma lição ainda em aprendizagem.
Embora seja símbolo de maturidade, consciência e responsabilidade objetiva e
necessária do Poder Legislativo brasileiro face às amarras político-ideológicas do
período imediatamente anterior, ela não cobre com seu manto todos os setores da
sociedade.
Ao contrário, as classes populares e menos abastadas são dura e
desproporcionalmente reprimidas nas periferias do nosso país. A repressão é certa
quando indivíduos ou grupos manifestam compreensão de mundo diferenciada,
indignação frente às políticas públicas adotadas, ou, simplesmente, quando buscam
identificação com agrupamentos afins. A repressão é prática tão comum que se corre o
risco da sua legitimação, especialmente após 2013. Tanto a praticada para manter o
controle, inibindo manifestações contrárias à ideologia prevalecente nas estruturas do
poder estatal, como a praticada em forma de retaliação com fins “preventivos”. Tal
reflexão converge para opinião de Eliane Brum em artigo publicado no Jornal “El Pais”
no mês de Janeiro de 2015, quando analisou os sentidos ou os objetivos da repressão
perpetrada pelo Estado a manifestantes contrários ao aumento das passagens, que
reivindicavam transporte público de qualidade. Nesse artigo ela denuncia a repressão
nas periferias: “Na semana passada, o repórter André Caramante mostrou que a PM
paulista matou 816 pessoas entre janeiro e novembro de 2014. É a maior letalidade dos
últimos 10 anos”.
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Aponta no mesmo sentido a reportagem de dezembro 2014 da revista “Carta
Capital” quando entrevistou Átila Roque - diretor da Anistia Internacional - analisando
dados de 2012:
Entre jovens brancos, com idade entre 16 a 29 anos, há uma redução na taxa
de homicídio da ordem de 33%. Quando considerarmos os homicídios de
jovens negros, na mesma faixa de idade, é como se olhássemos para um
espelho invertido. A partir disso, quando olhamos a linha de crescimento de
homicídios no Brasil, a conclusão imediata é que o crescimento das mortes
está muito sustentado na morte do jovem negro.
Diante da constatação da realidade do Estado contemporâneo brasileiro, e ainda,
da inegável condição social da maioria dos pixadores - geralmente moradores das
periferias –, torna-se necessário reconhecer a vulnerabilidade do grupo e defender seu
direito de livre expressão.
Além disso, é preciso entender o que querem os pixadores, ou, ampliando-se
mais o questionamento, entender o que querem as minorias políticas com suas
manifestações incompreendidas pela sociedade e reprimidas pelo Estado.
Atualmente, há, no Brasil, um apelo generalizado das minorias políticas, que
também buscam por liberdade de expressão, direitos plenos e pela dignidade prometida
pelo Estado Democrático de Direito. Há um enérgico clamor pela igualdade entre
homens, mulheres, etnias, classes sociais por direitos que não se efetivaram por uma
série de motivos, dentre eles, a desigualdade na distribuição de poder e renda e a
perpetuação de mecanismos de exclusão visíveis ou não.
O exercício do poder político pelas minorias no Brasil, apesar de ainda
insuficiente para promover mudanças substantivas na sociedade campeã da
desigualdade mundial, tem colocado em xeque a “ordem natural das coisas”,
considerada como tal a perversa expectativa de que o dominador domine e que o
dominado se resigne à dominação.
O direito à livre expressão é evocado pelas minorias, sendo tema recorrente nas
rodas de conversas informais, nas redes sociais e até na mais alta Corte do nosso
Judiciário, sendo o caso das biografias não autorizadas o exemplo mais importante.
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Após longo processo de acirradas discussões e trocas de acusações públicas
entre os envolvidos, o Supremo Tribunal Federal, no dia 10 de junho de 2015, decidiu
em sentido democrático: permitiu a publicação de biográficas não autorizadas, mas
resguardou o direito de indenização por danos morais por parte do biografado. Como
saldo final, no entanto, restou configurado, sem qualquer dúvida, o pleno direito à
liberdade de expressão.
É nesse sentido que se interpreta o voto da relatora da ADIN, a ministra Cármen
Lúcia. Para defender a plena liberdade de expressão, um dos recursos utilizados pela
ministra foi o trecho de uma conhecida cantiga de roda que diz: “cala a boca já morreu,
quem manda em minha boca sou eu”.
Portanto, para que se possa falar realmente em garantia de liberdade de
expressão no Brasil, há que se ampliar o público que a tem como direito efetivo.
Necessário interromper a repressão desmedida aos pixadores e buscar entender suas
motivações.
Ora, pixar corresponde a uma ação concreta e essa ação pode ser analisada por
variadas matizes de interpretação, mas, certamente, nunca como crime, pois o que ela
traduz são facetas positivas e necessárias ao bem estar dos indivíduos: arte, cultura,
identidade grupal, sociabilidade.
2. Do Pixo como liberdade de expressão
2.1 O pixo como elemento comunicativo
Transpondo as noções estéticas e políticas para uma análise prática do pixo,
deve-se entender a dinâmica da produção de subjetividades nas relações interpessoais,
para assim haver uma conclusão sobre a validade de se considerar o pixo como um ato
de liberdade de expressão.
A questão mais problemática em relação à mensagem que se pretende
transmitir a partir do pixo é justamente o uso de insígnias pouco inteligíveis à maioria
da população que compartilha do espaço urbano. Trazer o pixo à redoma da liberdade
de expressão torna intrínseca a necessidade de uma análise das diferentes formas de se
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comunicar e construção de sujeitos a partir destas. Não é interessante aqui evidenciar o
caráter artístico ou político da prática, já que estes foram amplamente abordados no item
1 deste texto. Portanto, será esmiuçado o processo linguístico e comunicativo que
pressupõe a pixação, bem como as consequências dessa comunicação.
Izabel Dias Melo, intérprete de Rancière, entende que a experiência é
pressuposto para a construção de um sujeito. A ação de um sujeito dentro de uma
estrutura definida, necessariamente, traz um elemento novo a um todo constituído,
causando uma quebra de conjuntura que, em seguida, será moldada a essas novas
realidades. Para que esse processo de interlocução se dê de forma completa, é necessária
a definição de um contexto previamente firmado, bem como a manifestação de
compreensão. Ora, não se pode estabelecer comunicação sem que ambos interlocutores
estejam inseridos em uma simbologia comum. Esse pano de fundo compartilhado, no
entanto, não é suficiente: deve haver uma movimentação direcionada para ultrapassar a
barreira da individualidade e fazer com que as subjetividades se toquem. O elemento
definidor desses dois pressupostos é justamente a experiência – que será, para Ranciére,
o próprio sistema de interlocução (2009).
Essa concepção de construção subjetiva é capaz de explicar, do mesmo modo,
a interação entre o semelhante e o distinto. O pixo se estabelece, aqui, como a
manifestação de compreensão necessária para a designação de um diálogo: pode ser
fator de identidade entre um grupo de pixadores e também objeto de rejeição entre
aqueles que não pertencem a esse grupo. O desentendimento, nesse momento, também é
trabalhado por Ranciére:
Por desentendimento entenderemos um tipo determinado de situação da
palavra: aquela em que um dos interlocutores ao mesmo tempo entende e não
entende o que diz o outro. O desentendimento não é o conflito entre aquele
que diz branco e aquele que diz preto. É o conflito entre aquele que diz
branco e aquele que diz branco mas não entende a mesma coisa, ou não
entende de modo algum que o outro diz a mesma coisa com o nome de
brancura. (...) O desentendimento não é de modo algum o desconhecimento.
Não é tampouco um mal entendido produzido pela imprecisão das palavras
(RANCIÈRE apud MELO, 2009, p. 46).
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Assim, é possível compreender melhor o processo de rejeição ao pixo a partir
do não-reconhecimento das insígnias utilizadas. Essa negação à estética comum à
pixação faz parte de um pano de fundo que resiste em absorver o novo elemento da
intersubjetividade. Mas será que a própria renúncia à compreensão não poderia
significar o próprio reconhecimento dessa investida?
Segundo Ranciére, não existiria desentendimento nesse caso. A comunicação
é estabelecida a partir da própria presença do desenho nas paredes da cidade. Não se
torna necessário decifrar os códigos utilizados pelos pixadores, pois a função do traço é
simplesmente estar ali. A partir disso, a manifestação de um novo elemento completa o
processo de interlocução, inserindo uma nova concepção ao contexto previamente
estabelecido - o próprio incômodo despertado pela pixação é prova de que há a quebra
dessa conjuntura.
Assim, verifica-se que não há dúvidas sobre o caráter comunicativo do pixo, o
que configura uma manifestação de pensamento, encoberta pelo direito à liberdade de
expressão.
2.2 Do instituto da liberdade de expressão
Para entender como a liberdade de expressão se apresenta frente aos debates
sociais, deve-se atentar, primeiramente, ao processo de consolidação desse princípio no
paradigma moderno e qual a sua importância frente a outros valores que se transpassam
na ponderação de princípios em um caso concreto.
A concepção de liberdade de expressão está intrinsecamente relacionada à noção
- sempre datada - de dignidade humana. Por esse caminho, poder-se-á compreender as
modificações da noção de liberdade a partir do paradigma de Estado.
No Estado Liberal, percebe-se um movimento de libertação burguesa da
consciência absolutista de Estado no século XVIII, que possuía forte intervenção dos
dogmas de conduta cristãos e, ainda, impunha ambiente hostil para o desenvolvimento
do comércio entre as cidades.
A partir disso, a noção de liberdade e dignidade humana para a classe burguesa,
que se torna hegemônica, compreende a consolidação de direitos negativos, ou seja, o
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que se torna essencial para a vivência em sociedade naquele momento é a não
intervenção do Estado nas questões de escolha individual. Assim, a liberdade de
expressão para difusão das ideias liberais é ponto chave para o entendimento desse
paradigma de Estado.
No entanto, após a decorrência de crises econômicas cíclicas e a movimentação
organizada de classes subalternas, há de se perceber um novo entendimento acerca das
noções de dignidade humana e liberdade, no sentido de evocar novamente o Estado
como provedor de vida digna àqueles marginalizados pela padronização de conduta
moderna. Portanto, dá-se início ao paradigma social de Estado, que, dentro do âmbito da
liberdade de expressão, procura restringir manifestações de ódio que contribuam para
manter a condição de subalternidade de alguns setores sociais. Percebemos, então, que a
noção de primazia pelos direitos negativos de liberdade se torna ineficaz, construindo
um novo entendimento de dignidade humana, que irá atingir diretamente a liberdade de
expressão dentro da vida em sociedade.
Contemporaneamente, – embasada na concepção de um Estado Democrático de
Direito - a ideia de liberdade de expressão em casos concretos só se torna completa a
partir da ponderação de outros princípios que podem, porventura, estar envolvidos. Por
isso é que se faz tão complexa uma análise conceitual rígida em relação a esse princípio.
A liberdade de expressão deve ser garantida a todos em qualquer forma e conteúdo,
desde que contribua para o exercício de uma autodeterminação individual ou de classe,
sem propagar ideias que vão de encontro às garantias de direitos humanos.
3. Da ponderação de Direitos e Pixação
Considerando o exposto, verifica-se que o pixo, enquanto manifestação política,
artística, cultural e/ou social, está amparado pelo direito à liberdade. Contudo, não se
intenta defender a liberdade de expressão como direito absoluto sob um paradigma
liberal. Dentro de um Estado Democrático de Direito, a liberdade deve ser limitada
quando em choque com os demais direitos humanos.
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3.1 Da Colisão de Direitos Fundamentais
Quando da ocorrência de colisão entre direitos fundamentais, aplica-se a máxima
da proporcionalidade para fins de compatibilização dos bens, valores e interesses
envolvidos no conflito (ALEXY, 1997).
A harmonia entre os direitos fundamentais compreende a aplicação da
proporcionalidade, posto que os direitos consolidados na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 representam um conjunto axiológico, plural e antagônico,
cujos princípios possuem alto potencial conflituoso.
A máxima da proporcionalidade não possui dispositivo expresso na Carta
Magna. Entretanto, é pacífico entre os doutrinadores que aludido postulado pertence de
maneira implícita ao Estado Democrático de Direito e à unidade da Constituição
brasileira, se constituindo como tal em decorrência do princípio do devido processo
legal.
Nesse viés, assegura Gilmar Ferreira Mendes (2001, p.13):
(...) Essa decisão parece consolidar o desenvolvimento do princípio da proporcionalidade como postulado constitucional autônomo que tem a sua
sede material na disposição constitucional sobre o devido processo legal (art.
5º, inciso LIV).
A aplicação da máxima da proporcionalidade nos casos de colisão entre direitos
decorre do caráter principiológico inerente às normas de direito fundamental.
Isso posto, segundo a teoria dos princípios de Robert Alexy, a obrigatoriedade
de aplicação das normas fundamentais está condicionada às possibilidades fáticas e
jurídicas existentes no caso concreto, sendo viável o seu cumprimento em diferentes
graus. A máxima da proporcionalidade é expressa pelo conjunto de três máximas
parciais: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
A adequação diz respeito à adoção de medidas que promovam determinado fim,
ou seja, tem-se inadequação quando ocorre obstrução de um princípio sem a promoção
de outro. A necessidade, por sua vez, faz um juízo comparativo, exigindo a utilização de
medidas que causem menores interferências ao princípio restringido. Já a
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proporcionalidade em sentido estrito, que, para Robert Alexy, corresponde ao mandado
de ponderação, exige que se analise se a importância do princípio fomentado pelo meio
escolhido é suficientemente grande para justificar a intensidade da restrição ao princípio
contraposto.
Com efeito, o postulado da proporcionalidade é ao mesmo tempo critério de
ponderação para resolver conflitos aparentes entre princípios, bem como limite à
restrição de direitos fundamentais. Gilmar Ferreira Mendes não delimita somente uma
linha de raciocínio para a aplicação da proporcionalidade, apresentando mais de um
fundamento para a sua validade:
Cuida-se de aferir a compatibilidade da lei com os fins constitucionalmente
previstos ou de constatar a observância do princípio da proporcionalidade
(Verhältnismässigkeitsprinzip), isto é, de se proceder à censura sobre a
adequação (Geeignetheit) e a necessidade (Erforderlichkeit) do ato
legislativo. (...) A violação ao princípio da proporcionalidade ou da proibição
de excesso (Verhältnismässigkeitsprinzip; Übermassverbot), que se revela
mediante contraditoriedade, incongruência, e irrazoabilidade ou inadequação
entre meios e fins (FERREIRA MENDES, 2001, p. 1)
A colisão entre os direitos à liberdade de expressão, artigo 5º, IX, CR e artigo 13
da Convenção Interamericana de Direitos Humanos; à propriedade privada artigo 5º,
XXII, CR e artigo 21 da Convenção; e ao meio ambiente, artigo 225, CR, deve ser
pensada a partir da máxima da proporcionalidade e da ponderação de direitos,
buscando-se a adoção de medidas razoáveis que promovam determinado princípio em
detrimento de outro, sempre em acordo com as singularidades do caso concreto que se
impõe.
Para auxiliar a aplicação da máxima da proporcionalidade no caso concreto,
conta-se com o auxílio dos parâmetros de Direito Internacional, em especial o
entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
3.2 Do Controle de Convencionalidade
Salienta-se a ingerência dos acordos internacionais no âmbito interno do país. O
Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do Recurso Extraordinário nº. 349.703-1,
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concebeu aos tratados internacionais sobre direitos humanos anteriores (TIDH) ao § 3º
do art. 5º da Constituição Federal a classificação de norma supralegal. Defendida por
Gilmar Mendes, a supralegalidade confere aos TIDH um patamar acima das leis,
todavia abaixo da Constituição Federal (MENDES, 2001, p. 660).
Como cláusulas pétreas, tem-se no Brasil, além das garantias e direitos
fundamentais, o princípio federativo, razão pela qual os normativos constitucionais não
podem sujeitar-se plenamente aos regramentos internacionais. Desse modo, uma
harmonia entre os princípios faz-se necessária a fim de evitar colisões normativas do
direito interno com o internacional.
Com isso, os tratados concernentes aos direitos humanos, ao passo que abordam
os mesmos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição da República,
visando evitar aludida colisão, são dotados da característica supralegal.
Analisando os direitos humanos sob a ótica jusnaturalista - na qual a ideia de
uma cadeia de valores jurídicos e morais é superior às ordens constitucionais postas -,
em consonância com o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais
brasileiras que tratam dos direitos e garantias fundamentais, tem-se que os TIDH
possuem aplicabilidade imediata (SILVA, 2012). Essa propositura é prevista pelo §1º
do artigo 5º da Constituição Federal, in verbis: § 1º As normas definidoras dos direitos e
garantias fundamentais têm aplicação imediata. (BRASIL, 1988).
Não obstante, nos dizeres de Piovesan:
Se as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais demandam
aplicação imediata e se, por sua vez, os tratados internacionais de direitos
humanos têm por objeto justamente a definição de direitos e garantias,
conclui-se que estas normas merecem aplicação imediata. (PIOVESAN,
2011, p. 94).
Com a Emenda Constitucional n. 45/04, que versa sobre a possibilidade dos
TIDH se equivalerem às emendas constitucionais, o direito brasileiro sofreu um
acréscimo constitucional de um novo tipo de controle normativo, o da
convencionalidade das leis (MAZOULLI, 2015). A observância do controle normativo
de convencionalidade das leis busca a compatibilização normativa interna com as
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previsões dos TIDH, uma vez que são similares ao controle de constitucionalidade ou
de legalidade, porém com enfoque nos atos condizentes a aludidos tratados. Destarte,
uma vez que tratados sobre direitos humanos podem ser paradigma de controle das
normas infraconstitucionais no Brasil, nota-se que o Brasil não pode violar os tratados
de que é signatário (COLGANO, 2015).
3.3 Dos Parâmetros de Direito Internacional
Com o intuito de sistematizar e consolidar as interpretações e parâmetros
interamericanos do artigo 13 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, a
Relatoria especial para a liberdade de expressão produziu o Marco Jurídico
Interamericano do Direito à Liberdade de Expressão. Tal documento estabelece os
parâmetros para que as limitações a esse direito fundamental sejam legítimas e não
consideradas violações aos Direitos Humanos (OEA, 2010, p. 10).
De acordo com esse documento, a liberdade de expressão deve proteger, a
princípio, todas as formas de discurso, independentemente de sua adaptação à sociedade
e ao Estado. Tal presunção geral de cobertura deve existir em função da obrigação de
neutralidade do Estado perante as formas de expressão. Assim, não podem existir
pessoas, grupos ou meios de expressão excluídos a priori do debate público.
O mesmo documento internacional deixa claro que deve ser protegida não só a
divulgação de informações consideradas inofensivas ou indiferentes, mas também as
expressões cujo conteúdo ou a forma de alguma maneira ofendam, choquem, inquietem
ou perturbem o Estado ou algum setor da população. Ao trazer tal entendimento para a
questão da pixação é possível perceber que por mais que esta possa chocar ou inquietar
parte da sociedade, este não pode ser o único fundamento para a sua criminalização
(OEA, 2010, p. 10).
Nesse mesmo sentido, entendeu o Supremo Tribunal Federal em decisão na
ADPF 187, na qual reafirmou o caráter contramajoritário dos direitos fundamentais e
estabeleceu que:
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O sentido de fundamentalidade de que se reveste essa liberdade pública
permite afirmar que as minorias também titularizam, sem qualquer exclusão
ou limitação, o direito de reunião, cujo exercício mostra-se essencial à
propagação de suas idéias, de seus pleitos e de suas reivindicações, sendo
completamente irrelevantes, para efeito de sua plena fruição, quaisquer
resistências, por maiores que sejam, que a coletividade oponha às opiniões
manifestadas pelos grupos minoritários, ainda que desagradáveis, atrevidas,
insuportáveis, chocantes, audaciosas ou impopulares (STF, 2011, p. 22).
Vale ressaltar ainda que o Marco Jurídico Interamericano do Direito à Liberdade
de Expressão estabelece que as limitações não podem ser discriminatórias nem produzir
efeitos discriminatórios (OEA, 2010, p. 32). De acordo com a Declaración de Principios
Sobre Libertad de Expresión:
Toda persona tiene el derecho a buscar, recibir y difundir información y
opiniones libremente en los términos que estipula el artículo 13 de la
Convención Americana sobre Derechos Humanos. Todas las personas deben
contar con igualdad de oportunidades para recibir, buscar e impartir
información por cualquier medio de comunicación sin discriminación, por
ningún motivo, inclusive los de raza, color, religión, sexo, idioma, opiniones
políticas o de cualquier otra índole, origen nacional o social, posición
económica, nacimiento o cualquier otra condición social (Comisión
Interamericana de Derechos Humanos, 2000).
Vale atentar também para o fato de que as expressões com caráter político
possuem maior proteção na Convenção Interamericana de Direitos Humanos devido a
sua essencialidade no debate democrático na sociedade. Assim, o Estado deve abster-se
com maior rigor de estabelecer limitações a essas formas de expressão (OEA, 2010, p.
11). Além disso, as expressões que possuem elemento essencial à identidade cultural
daqueles que a manifestam também gozam de maior proteção, mais uma vez devendo o
Estado ser cuidadoso nas suas limitações (OEA, 2010, p. 19 e 34).
Como explicitado anteriormente, as formas de manifestação enquadradas como
pixo possuem não apenas o caráter político, mas também são importantes na identidade
cultural do grupo que a praticam. Assim, a limitação da liberdade de expressão no caso
das pixações é ainda mais problemática, vez que os parâmetros internacionais assinalam
para uma maior abstenção do Estado nessas situações. Portanto, se a limitação da
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liberdade de expressão, no que tange ao pixo, não se adequava nem mesmo aos
parâmetros utilizados para todas as formas de manifestação, menos ainda se adequa aos
rígidos parâmetros estabelecidos para os casos de expressões dotadas de maior proteção.
3.4 Da Aplicação dos parâmetros nacionais e internacionais quando da colisão de
direitos no caso da Pixação
É importante destacar que qualquer limitação ao direito à liberdade de expressão
deve ser sempre excepcional para que pessoas, grupos, ideias ou meios de expressão
não fiquem excluídos a priori do debate público. Assim, qualquer forma de limitação
deve ter a sua necessidade, adequação e proporcionalidade demonstradas, ideias
basilares da ponderação de princípios.
No mesmo sentido, de acordo com o Marco Jurídico Interamericano do Direito à
Liberdade de Expressão, a jurisprudência interamericana tem exigido três condições
básicas para que o direito em questão seja limitado:
(1) la limitación debe haber sido definida en forma precisa y clara a través
de una ley formal y material, (2) la limitación debe estar orientada al logro
de objetivos imperiosos autorizados por la Convención Americana, y (3) la limitación debe ser necesaria en una sociedad democrática para el logro de
los fines imperiosos que se buscan; estrictamente proporcionada a la
finalidad perseguida; e idónea para lograr el objetivo imperioso que
pretende lograr (OEA, 2010, p. 24).
Os objetivos legítimos mencionados no Marco Interamericano devem ser
entendidos enquanto a máxima parcial da adequação estabelecida na teoria da
proporcionalidade de Alexy. Segundo a Convenção Interamericana de Direitos
Humanos, da qual o Brasil é signatário, os objetivos legítimos para a restrição da
liberdade de expressão restringem-se a) ao respeito dos direitos e da reputação das
demais pessoas; b) à proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou
da moral públicas.
No caso do pixo, não há, a priori, uma ofensa à honra ou à reputação de alguém
para que a responsabilização ulterior se aplique. Contudo, poder-se-ia falar em um
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desrespeito ao direito de propriedade do dono do imóvel pixado, caso em que seria
verificada a adequação da restrição ao pixo com a finalidade de proteção desse
patrimônio. Contudo, a necessidade e a proporcionalidade devem ainda ser analisadas.
No Brasil, a proibição da pixação visa tanto à proteção do bem jurídico
patrimonial - quando o ato se refere ao crime de dano ao patrimônio, art. 163 CP/40 -,
quanto ao meio ambiente - quando aquele é enquadrado no próprio tipo da pixação (art.
65, Lei 9605/98 – Lei de crimes ambientais).
No entanto, como supracitado, a definição de um ambiente urbano saudável
baseia-se em uma noção de direito à cidade construída por poucos e para poucos,
desconsiderando a lógica do conceito de cidade presente no ordenamento jurídico
brasileiro.
Além disso, ressalta-se que essa proteção ao meio ambiente não se encaixa na
ideia de proteção da ordem pública ou da moralidade pública, vez que para que haja
uma ofensa a estas é necessária a ocorrência de uma perturbação grave e objetivamente
verificável das condições básicas para o funcionamento das condições democráticas.
Qualquer interpretação mais ampla da ideia de ordem pública, “abriría un campo
inadmisible a la arbitrariedad y restringiría de raíz la libertad de expresión que forma
parte integral del orden público protegido por la Convención Americana”1. Dessa
forma, apenas a proteção da propriedade se adéqua aos objetivos autorizados pela
Convenção Interamericana.
Contudo, o direito à propriedade, assim como os outros princípios do direito,
deve ser analisado de forma conjunta com os outros pressupostos do Estado
Democrático de Direito. No Direito Civil Brasileiro, desde 1942, o fim social da
propriedade é assegurado no ordenamento por meio do Decreto Lei nº 4.657: Lei de
Introdução ao Código Civil Brasileiro, que instituía no seu art. 5º que: “Na aplicação da
lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.
Em 2010, através da Lei nº 12.376, a vigência do texto foi ampliada para todas as
normas do Direito Brasileiro, não só o Código Civil. Dessa forma, fica evidente que o
1 Ibidem.p. 29
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princípio do direito à propriedade não é absoluto. Conforme descreve o Professor
Camilo de Lelis C. Barbosa e o Juiz do Trabalho Rodolfo Pamplona Filho:
Fixou-se, desde então, que o direito de propriedade é o direito conferido a
determinada pessoa de usar, gozar e dispor da coisa, além de poder reavê-la das mãos de quem injustamente a possua. Os Códigos Civis ocidentais, de
maneira quase que uniforme, adotam esses critérios de fixação dos direitos do
proprietário. Como se mencionou, os direitos de uso (jus utendi), gozo ou
fruição (jus fruendi), e disposição (jus abutendi, ou mais precisamente, jus
disponendi), têm origem romana e, além da origem gramatical, possuem, por
assim dizer, uma gênese espiritual. Isso porque não se emprestava à
propriedade caráter absoluto, subordinando-se essa aos interesses maiores do
Estado e/ou da sociedade, conforme já informava Clóvis Beviláqua (2007).
Nota-se que o direito à propriedade deve ser ponderado com os princípios da
liberdade de expressão e da liberdade de ir e vir. Assim, a limitação da liberdade de
expressão para a proteção da propriedade não pode se dar a qualquer custo devendo
respeitar a necessidade e a proporcionalidade, vez que tanto a máxima da
proporcionalidade, segundo Robert Alexy, quanto o Marco Jurídico Interamericano do
Direito à Liberdade de Expressão estabelecem esses parâmetros para a limitação de
direitos fundamentais.
Posto isso, tem-se que a utilização do Direito Penal não deve ser considerada
necessária ou proporcional para tratar a pixação. Ainda que se entenda legítima a
proibição do pixo, não é necessária a utilização do Direito Penal para tratar a questão. A
simples responsabilidade civil seria suficiente para reparar o direito daquele que teve a
sua propriedade lesada. Além disso, a aplicação de penas restritivas de liberdade não é
proporcional ao dano causado pela pixação.
Ressalta-se que a jurisprudência interamericana se consolidou no sentido de que
qualquer responsabilização ulterior pela divulgação de ideias e informações deve
ocorrer na esfera cível, para que o direito penal seja utilizado efetivamente como última
ratio.
4. Do Pixo pelo Direito Penal
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4.1 Tolerância Zero, Movimento Respeito por BH
"Janelas Quebradas" é o nome da teoria criada por James Q. Wilson e George
L. Kelling, em 1982, e desenvolvida por George L. Kelling e Catherine M. Coles no
livro Fixing Broken Windows: Restoring Order and Reducing Crime In Our
Communities, publicado em 1996. Vastamente difundida e financiada por meio de think
tankers neoliberais como o Manhattan Institute e o Heritage Foundation, a teoria das
janelas quebradas pressupõe que os pequenos crimes são a principal causa dos crimes
mais graves, ou, nas palavras de Wacquant (1999, p. 25), "é lutando passo a passo
contra os pequenos distúrbios cotidianos que se faz recuar as grandes patologias
criminais". Nos anos noventa, essa teoria serviu de inspiração para a criação da Política
de Tolerância Zero, baseada numa intervenção rigorosa do direito penal, adotando-se
um direito penal máximo, em que os menores crimes são tratados com severidade, ou
seja:
enfatizando o combate ativo e agressivo de pequenas infrações - a grande
maioria, quando muito, meros atos desviantes, como estudados na
criminologia - contra a qualidade de vida, como pichação, urinar nas ruas,
beber em público, catar papel, mendicância e prostituição. (COUTINHO;
CARVALHO, 2003)
A dinâmica criminal observada no Estados Unidos nos anos sessenta sustenta
algumas das lógicas de como a sociedade brasileira tem convivido, na atualidade, com a
criminalidade urbana. Cria-se um alvo, um "bode expiatório", que são, em escandalosa
proporção, populações pobres e que sofrem diversas configurações de marginalização e
vulnerabilidade. As teias que sustentam a criminalidade, ou o que é considerado oposto
à ordem social vigente, são ignoradas. Assim, surgem instrumentos de resposta às
estatísticas penais com ideologias e/ou métodos que primam essencialmente por uma
atmosfera social “limpa”. Reduz-se o bem-estar social como sinônimo de ordem nas
ruas - Teoria da Janelas Quebradas.
Coutinho e Carvalho, no artigo “Teoria das Janelas Quebradas: e se a pedra vem
de dentro?”, constatam que no período de 1991 para 1996 houve uma considerável
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queda no índice de crimes em New York, sendo a taxa de homicídios, por exemplo,
reduzida em 51%. De forma apressada, a redução constatada é erroneamente associada à
política de Tolerância Zero e o seu suposto sucesso. Nas palavras de Wacquant, o êxito
é atribuído “mesmo com a dita queda tendo precedido em três anos à implementação
dessa tática policial e sendo observada também em cidades que não a aplicam, como
Boston, Chicago ou San Diego”. Ainda:
O número de assassinatos em Nova York já caíra pela metade entre o pico de 1990 e 1994, de aproximadamente 2.300 para menos de 1.200, e o dos
atentados contra o patrimônio em 25%. A mesma queda brutal da
criminalidade é observada também no Canadá a partir de 1990, sem que seja
imputável a qualquer inovação policial. (WACQUANT, 1999, p. 105)
Além disso, o enunciado sucesso da Tolerância Zero descarta o fato de que na
década de noventa nos Estados Unidos tenha havido uma ascensão econômica
considerável para diversas classes sociais, fator que está intimamente relacionado como
um dos principais para a redução de criminalidade no país. A título de comparação, na
mesma época a cidade de San Diego obteve resultados similares com menor número de
prisões, de policiais e de queixas contra a polícia; já em New York, as prisões
aumentaram junto com os policiais e as queixas contra a polícia da cidade.
Os efeitos multissintomáticos oriundos de um discurso em prol do direito penal
máximo ecoam de diferentes formas na sociedade brasileira contemporânea. É muito
atual, no Brasil, um discurso que deposita no direito penal a crença de curador para
todas as feridas abertas nos lares e ruas brasileiras. Contextualmente, muitas vezes
parece haver um extensivo combate a quaisquer tipos de comportamentos tidos como
antissociais - delituosos - pelos vigentes parâmetros de classificação. Essa concepção de
“ordenamento e a correta utilização do espaço urbano”2 muitas vezes resulta numa
aplicação acrítica do direito penal, fazendo com que as responsabilizações legais
aplicáveis sejam desproporcionais, até mesmo apresentando doses extras de
intolerância.
2 Termos extraídos de nota da Prefeitura de Belo Horizonte, MG, referindo-se ao “Movimento Respeito
por BH”. Para acessar o texto na íntegra, acesse: < http://migre.me/qOdnN >.
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A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), em Minas Gerais, é um dos órgãos
públicos que fazem eco às ideias da teoria das Janelas Quebradas e seus segmentos,
como a política de Tolerância Zero. De acordo com as informações extraídas do site da
PBH, referindo-se ao Movimento Respeito por BH:
Uma das aplicações mais conhecidas e exitosas da Teoria das Janelas
quebradas ocorreram em Nova York (EUA), na gestão do Prefeito Rudolph
Giuliani, em 1994, que implantou a política de ‘Tolerância Zero’. A
estratégia consistiu em criar comunidades limpas e ordenadas, não
permitindo quaisquer transgressões à lei e às normas de convivência urbana,
por mínimas que fossem resultando na substancial redução de todos os
índices de criminalidade da cidade. (Acessado em 15/07/15)
Existe uma lógica muito perversa por trás desses tipos de projetos políticos,
principalmente por dois fatores: um deles, como já havíamos dito, é o fato de serem
criados alvos que carregarão a culpa dos crimes mais graves que assolam a comunidade.
Essa situação é muito bem ilustrada em uma propaganda publicitária espalhada pela
cidade de Belo Horizonte na qual se identifica um pixador e uma notificação ao lado: “a
violência começa por onde menos se espera”.
Outro fator perverso é que, nessa análise rasa de qual é a origem do crime, as
questões sociais são ocultadas e, consequentemente, a responsabilidade do governo em
se empenhar para cumprir com diversas demandas, ressaltadas na Constituição Federal
do Brasil e importantes para a diminuição da criminalidade, passam a ser esquecidas.
Seguindo esse raciocínio, argumenta Loïc Wacquant:
Esse tema proporciona aos políticos de cada um dos países importadores a
oportunidade de dar ares de ‘modernidade’ à paradoxal pirueta retórica que
lhes permite reafirmar com pouco prejuízo a determinação do Estado em
punir os ‘distúrbios’ e, ao mesmo tempo, isentar esse mesmo Estado de suas
responsabilidades na gênese social e econômica da insegurança para chamar
à responsabilidade individual os habitantes das zonas ‘incivilizadas’. (1999,
p. 19)
4.2 Pixo e o Ordenamento Urbano
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Com a Lei Nº 9.605/98 o bem jurídico tutelado na pixação passa a ser o meio
ambiente. Contudo, no caso do pixo a lei é dúbia quanto ao fato de qual é o dano
efetivo, já que o dano ao meio ambiente nesse caso é um conceito de subjetiva e difícil
demonstração. Se há intenção da legislação em preservar uma pretensa uniformidade
estética urbana, o mesmo parâmetro deveria ser aplicado às diversas propagandas
publicitárias que se encontram na cidade, como outdoors estáticos ou eletrônicos,
cartazes, pinturas em murais, entre outros meios. Pode-se chegar, inclusive, ao extremo
de um cidadão não poder dispor de sua propriedade da forma que lhe convenha
esteticamente caso destoe de um pretenso padrão urbano. Assim, podemos questionar
qual seria a eficácia dos atuais dispositivos penais para lidar com a questão do pixo, já
que sua lógica júridica de dano ao meio ambiente deveria também ser aplicada aos casos
de propaganda.
Exemplo da dificuldade de definição do conceito de dano ao meio ambiente se
encontra claramente em jurisprudência do TJMG. Em Apelação criminal
1.0024.11.031213-9/001 destacamos seguinte trecho:
Ademais, os reflexos negativos desta conduta são percebidos tanto
pelo ponto de vista ambiental, como pelo ponto de vista patrimonial.
Contudo, o que mais choca não é somente o desrespeito pelo patrimônio alheio ou a poluição visual (...) as pichações atuais mais se
assemelham a atos de vandalismo gratuito contra o ordenamento
urbano das cidades, ou então danos egoísticos à propriedade alheia.
Nele fica claro a falta de eficácia da ideia de dano ao meio ambiente pois a
Procuradoria, apesar de basear a acusação na Lei de Crimes Ambientais,
simultaneamente apresenta o pixo como questão de dano patrimonial. É evidente que
não é possível se valer das duas argumentações conjuntamente. Se o dano é ao meio
ambiente, por quê citar dano ao patrimônio reiteradamente?
4.3 Uma análise sobre a criminalização do Pixo a partir dos Princípios Penais do
Direito Penal Constitucional e do Direito Penal Mínimo
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Parte-se do pressuposto de que a Constituição da República define diversos
princípios e direitos que direcionam sua aplicação à limitação do poder punitivo e à
garantia dos direitos. Ainda, defende-se que os direitos humanos devem ser o objeto e o
limite do Direito Penal (BARATTA, 2003), o qual deve ser considerado como último
recurso possível de ser utilizado. Considera-se, em especial, o reconhecimento do
fracasso do sistema prisional em atender a suas funções declaradas: contenção da
criminalidade; ressocialização do condenado; defesa dos principais interesses dos
indivíduos e da comunidade. Ao contrário, a prisão, na prática, funciona como meio de
controle, administração de indivíduos e de naturalização e reprodução das desigualdades
na sociedade.
O presente parecer rejeita quaisquer das funções positivas e negativas, gerais e
especiais que ainda hoje permanecem atribuídas à pena. A criminalização de práticas
como a da pixação, como diversos estudos sociológicos e estatísticos demonstram
(ANITUA, 2007, p. 798), não promove efeito dissuasório. Ao contrário, é possível que
tal medida estimule a prática, visto que a literatura que analisa o fenômeno do pixo
indica que parte dos pixadores cometem o ato também instigados pela violação à lei, o
que promoveria o caráter de rebeldia e transgressão da atividade.
Adota-se no presente parecer o ponto de vista da teoria agnóstica da pena, sendo
considerada esta, portanto, puro ato político de força estatal, o qual pode e deve ser
controlado e limitado ao máximo possível, tendo como objetivo evitar a vingança no
âmbito privado e controlar o arbítrio das agências de controle estatais. Nos termos de
Zaffaroni: “Si el sistema penal es un mero hecho de poder, la pena no puede pretender
ninguna racionalidad, es decir, que no puede explicarse más que como una
manifestación de ese poder” (1998, p. 209).
Vários estudos já realizados no Brasil explicitam claramente o caráter seletivo de
nosso sistema penal (BRASIL, 2015, p.15). Tal seletividade se dá desde a formulação
das leis e a escolha dos bens jurídicos que serão objeto da tutela penal, intensificando-se
a partir de um saber-fazer policial informal que faz com que a persecução das agências
de controle atinja, majoritariamente, negros, jovens e de baixa escolaridade. Essa
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dinâmica promove uma aplicação desigual de regras e procedimentos judiciais a pessoas
com essas características.
Como diversas análises do fenômeno da pixação já identificaram (CALDEIRA,
2012), grande parte das pessoas envolvidas nessa cultura são provenientes de famílias
com menor poder aquisitivo e, em boa proporção, negras. Dessa forma, é claramente
perceptível a utilização do Direito Penal como método de dominação e controle
disciplinar de uma classe.
Considerando a necessidade de limitação e regulação do arbítrio que envolve a
utilização do Direito Penal, analisamos a questão da pixação tendo como pressupostos
os princípios de limitação funcional de um Direito Penal que se pretenda mínimo, de
utilização como ultima ratio e garantidor dos direitos de seus “clientes”, inspirados
pelos estudos dos penalistas brasileiros e estrangeiros - como os italianos Alessandro
Baratta e Luigi Ferrajoli, bem como o novo ministro da Corte Interamericana de
Direitos Humanos, Eugenio Raúl Zaffaroni.
Na análise dos diversos princípios e pressupostos que circundam (ou deveriam
circundar) o Direito Penal, observamos que a criminalização do pixo, mais
especificamente, a prática penal e processual penal aplicada no processo envolvendo o
grupo “Piores de Belô”, viola diversos desses princípios. Conflita também, com
princípios constitucionais explícitos e implícitos, senão vejamos:
4.3.1 Subsidiariedade
O princípio nos orienta que existem modos de intervenção não penais mais aptos
a responder à questão da pixação de modo mais efetivo e razoável, no âmbito cível e
administrativo. Verifica-se, ainda, ampla possibilidade de levar esse tipo de conflito
para o âmbito privado, não sendo, em muitos casos, necessária a atuação do Ministério
Público. O princípio do primado da vítima indica a possibilidade desse caminho,
voltado especialmente à restituição, mediação e compensação de eventuais danos
causados, em casos em que a pixação se deu em propriedades particulares.
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4.3.2 Fragmentariedade
A tutela penal deve-se voltar apenas aos bens jurídicos mais importantes e às
lesões efetivas aos mesmos de modo pontual, lógica que é quebrada no caso do pixo.
Como já desenvolvido e problematizado anteriormente no presente parecer, o
bem jurídico “lesado” pela prática do pixo é de difícil caracterização e de identificação
pouco intuitiva: atualmente, a lei identifica que é o meio ambiente, mais
especificamente o ordenamento urbano. Anteriormente, se identificava que o bem
jurídico lesado seria o patrimônio. Independente da interpretação adotada, consideramos
que o pixo não representa uma agressão grave, visto que ele, em regra, não inutiliza o
local “pixado”. Na maioria das vezes, apresenta impacto somente patrimonial, por uma
eventual desvalorização do imóvel e um incômodo no senso estético – incômodo esse,
altamente subjetivo e variável - de parte da população. A criminalização de condutas de
pequeno e difuso potencial ofensivo, dentre as quais a pixação se encontra, vai
claramente de encontro à principiologia de um Direito Penal fragmentário e pontual.
4.3.3 Proporcionalidade
Em seu aspecto abstrato: somente graves lesões a bens jurídicos devem ser
passíveis de tutela penal, e esta deve ser proporcional à lesão causada. A “lesão”
promovida pelo pixo - a qual já é de controvertida caracterização - certamente não é de
gravidade suficiente de modo a ser necessária a tutela penal como resposta.
Concretamente, há um alto custo social da utilização da criminalização da pixação,
especialmente quando se consideram seus impactos nas vidas das pessoas
criminalizadas e de suas famílias. Mesmo dentro da dinâmica penal, verificam-se
diversas possibilidades de mitigação, como suspensão condicional e penas alternativas.
4.3.4 Razoabilidade
Fortemente interligada com o princípio da proporcionalidade, evidencia-se, a
partir da argumentação aqui realizada, o quão desarrazoado é a utilização do Direito
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Penal, - a qual leva, por sua dinâmica de funcionamento, a uma punição de efetiva
privação de liberdade - bem como o enfoque da atuação das agências de controle e da
Administração Pública no combate a condutas de pequeno, difuso e controverso
potencial ofensivo. Ainda, a criminalização autoriza uma atuação ostensiva e
frequentemente violenta das instâncias de controle, momento no qual ocorre a mais
violenta e forte intervenção estatal junto aos pixadores, o que aumenta a desproporção
da resposta.
4.3.5 Princípio do respeito pelas autonomias culturais
Em um direito penal orientado para o respeito aos direitos humanos e informado
pela Criminologia Cultural, há de se considerar a percepção específica da realidade e
dos valores das minorias étnicas e dos grupos que representam culturas diferenciadas
dentro de determinada sociedade (OXLEY DA ROCHA, 2015) – como é o caso da
cultura do pixo. Dessa concepção, deriva a importância de um ulterior limite funcional
da lei penal, que pode ser enunciado como a falta de uma condição necessária para a
criminalização de certos comportamentos, quando esses podem ser considerados como
normais em subculturas delimitadas, o que é evidente na cultura do pixo e diversas
outras, altamente marginalizadas em nossa sociedade. Emerge a importância de se
adotar uma concepção multicultural de Direitos Humanos, nos termos de Boaventura de
Sousa Santos.
Como já explicitado, a pixação não é uma atividade que se organiza ou tem sua
dinâmica mediada e voltada a uma lógica estritamente individual, mas é geralmente um
movimento feito por grupos – regionais ou de interesses - que se organizam em prol
dessa atividade. Considerando essa característica sui generis, é natural e esperado que o
pixo seja uma prática coletiva. Dessa forma, ao se acusar o grupo de pixadores “Piores
de Belô” criminalmente por pixação e por organização criminosa, é promovida uma
dupla criminalização do ato de pixar, visto que essa dinâmica se constitui
espontaneamente e quase sempre como atividade grupal.
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Com essa praxe, se utiliza um artifício dogmático para que haja uma enorme
tendência a criminalizar duplamente uma única conduta, o que implica: aumento de suas
penas; inviabilização de medidas cautelares alternativas; e abertura de espaços para
medidas desnecessárias e invasivas durante o processo penal - como a inserção de
tornozeleiras eletrônicas a quem cometeu crime com pena de detenção e a utilização
ostensiva do instituto da prisão preventiva. A utilização de tal instrumento para
acusados do cometimento de um crime, cuja pena máxima é de um ano, associado à
problemática acusação de formação de quadrilha, é um exemplo de como a
criminalização abre um perigoso espaço para o arbítrio estatal. Todos esses elementos
tornam, assim, a criminalização da pixação ainda mais desproporcional e desarrazoada,
ferindo princípios basilares do Direito Penal Constitucional.
A argumentação aqui realizada ultrapassa uma mera aplicação fria e literal da
lei. Ao contrário, por defender o reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 65 da
Lei 9.605/98, que lesa e vai ao sentido oposto de outros princípios centrais de nosso
ordenamento jurídico e de uma ordem democrática, a análise possui caráter jurídico-
político e busca uma interpretação sistemática desse dispositivo. Todavia, são
proposições que guardam profunda consonância com o texto constitucional, os
princípios e valores explicitados na Carta Magna. Uma legislação que se pretenda de
acordo com a Constituição necessita ter como objeto e limite os direitos humanos lá
consagrados e garantidos, controlando e limitando o arbítrio estatal e dando especial
atenção à liberdade e à dignidade da pessoa humana.
5. Considerações Finais
O presente parecer coloca em cheque a utilização do espaço urbano como
neutro e uniformizante, que se conserva limpo das marcas de identidade emergentes à
medida em que deixa de ser espaço de convivência para se tornar mero local de
passagem. Aqui, pretende-se resgatar a ideia de construção de subjetividades a partir da
identificação com o espaço e da própria construção deste, questionando padrões
estéticos e sociais. O pixo se mostra como grande ruptura na equalização da cidade,
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emergindo como manifestação artística e política, buscando ocupar espaços e dar vozes
àqueles que se incomodam com o branco dos muros.
Nesse sentido é que se entende o pixo como manifestação legítima de liberdade
de expressão, uma vez que questiona a lógica de produção da cidade e se faz reconhecer
como elemento estranho à padronização do espaço. O pixo se constitui como elemento
comunicativo de uma nova lógica de cidade, estabelecendo um canal de diálogo não só
entre os próprios pixadores, mas também entre aqueles alheios à prática.
É a partir desse pensamento que se deve questionar a criminalização do pixo,
disposta na Lei nº 9.605/98 de crimes ambientais. Sopesados os princípios em conflito
no caso concreto, entende-se que o pixo não oferece dano ambiental a ponto de ser
suprimida a liberdade de se manifestar nas paredes da cidade. A Clínica de Direitos
Humanos constata que a tipificação da prática não obedece aos princípios
constitucionais da proporcionalidade e da subsidiariedade. Ainda, reproduz uma lógica
contrária à ideia de Direito Penal como ultima ratio, ao tornar ilícitas condutas de baixa
gravidade. Isso traz como consequência a criminalização de produções culturais
marginalizadas, conferindo caráter político à empreitada de combate a essas práticas.
Portanto, a Clínica de Direitos Humanos considera desproporcional a
criminalização do pixo, entendendo que o dano ao ordenamento público não se encaixa
na ideia de proteção ao meio ambiente. Ainda assim, a perturbação à ordem não se
justifica como causa para a supressão de liberdades no caso do pixo. Contudo, entende-
se que a sanção em esfera civil pelo dano à propriedade privada é cabível como resposta
estatal à prática do pixo. Este princípio, no entanto, não deve ser tratado como absoluto,
já que a propriedade privada tem reconhecida na Constituição Federal a sua função
social. Assim, é preciso que haja uma ponderação de princípios em casos concretos para
aplicação de responsabilidade civil nos casos de pixação.
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WAINER, João. Pixo. Produção: WAINER, João; OLIVEIRA, Roberto T.; Roteiro:
WAINER, João; Produtora: Sindicato Paralelo Filmes. Duração: 61 minutos. 2009