Palestra subsec sp rs

16

description

Palestra do Sub Sec SP/RS, sobre a política brasileira do Ministério da Justiça, através da Senasp, para a segurança pública dos municípios, que ele proferiu em um seminário, em novembro de 2013.

Transcript of Palestra subsec sp rs

Page 1: Palestra subsec sp rs
Page 2: Palestra subsec sp rs
Page 3: Palestra subsec sp rs

1

PROTAGONISMO DOS MUNICÍPIOS NA CONSTRUÇÃO DE

UMA POLÍTICA CIDADÃ.

Juarez Pinheiro

Secretário Adjunto da SSP/RS

A Constituição Federal de 1988, conhecida também

como “Constituição Cidadã”, foi um marco no

constitucionalismo brasileiro e até mundial. Com o fim da

ditadura militar e a conseqüente redemocratização do país o

texto constitucional teve um avanço significativo na ampliação

dos direitos fundamentais e sociais. Entretanto, fruto da recente

ruptura com o período anterior as inovações na área da

segurança pública foram praticamente inexistentes. Com um

texto lacunoso e conservador, não houve aprofundamento

adequado na matéria.

O arranjo institucional determinado pela Carta Magna

estabeleceu no artigo 144 as competências para a gestão da

segurança pública. Segundo o dispositivo, “a segurança

pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é

exercida para a preservação da ordem pública e da

incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos

seguintes órgãos: polícia federal; polícia rodoviária federal;

Page 4: Palestra subsec sp rs

2

polícia ferroviária federal; polícias civis; polícias militares e

corpos de bombeiros militares”

Por anos a interpretação do referido dispositivo, já

deficiente e desatualizado, ainda foi interpretado de forma

restritiva, colocando a exclusividade da gestão da política de

segurança no rol de atribuições dos governos estaduais, com a

União ditando diretrizes gerais para uma agenda nacional.

Além disso, o texto constitucional praticamente restringe a

atuação dos municípios somente à constituição das Guardas

Municipais, destinadas à proteção de seus bens, serviços e

instalações, conforme §8 do mesmo artigo.

A partir dos anos 90, a realidade social do fenômeno

da violência obrigou uma reinterpretação das atribuições e

responsabilidades na área de segurança pública.

Considerando a complexidade de uma federação trina,

composta pela União, Estados-Membros e Municípios, ganhou

força entre os gestores públicos, instituições policiais,

acadêmicos e organizações sociais a idéia de que a

problemática deveria ter novos contornos, principalmente, no

que diz respeito à inclusão dos Municípios no contexto do

enfrentamento à violência.

O aumento da criminalidade tinha deixado de ser um

fenômeno exclusivo das capitais e regiões metropolitanas e se

estendido para o interior do país, atingindo cidades que até

então nunca tinham contemplado o problema como objeto de

suas políticas públicas.

Page 5: Palestra subsec sp rs

3

Assim, a idéia centralizadora da formulação e

execução de políticas de segurança, que propunha uma pauta

única, sem considerar a diversidade territorial, cultural e social

de cada localidade, cedeu ao entendimento de que o

Município, como unidade federativa mais próxima da

comunidade, pode e deve atuar na gestão local das questões

de segurança pública.

Naquela etapa da vida nacional uma das experiências

de maior sucesso, no âmbito da política municipal de

segurança pública, foi a do município de Diadema, localizado

na Região Metropolitana de São Paulo. Em 1999, a cidade

possuía a taxa mais alta de homicídio do Estado. Na época, a

prefeitura assumiu a responsabilidade e colocou a segurança

pública na pauta da agenda política. De início, incluiu-se no

planejamento do trabalho policial, através de reuniões

periódicas com as polícias civis e militares. Além disso,

começou a implementar uma série de ações voltadas ao

controle e prevenção da violência. Uma das mais emblemáticas

foi a criação da lei que obrigou o fechamento de bares às 23h,

evitando o comércio de bebidas alcoólicas durante a noite,

período no qual se concentravam os homicídios. Criou, ainda,

projetos de prevenção da violência entre adolescentes e

jovens, e outros direcionados aos crimes contra as mulheres.

Por meio da Secretaria Municipal de Defesa Social e seus

órgãos elaborou um Plano Municipal de Segurança Pública,

composto por 17 compromissos e ações das mais diversas

Page 6: Palestra subsec sp rs

4

áreas relacionadas à segurança pública – guarda municipal,

infra-estrutura urbana, promoção da cultura de paz,

desarmamento, articulação com as polícias, análise dos

indicadores criminais, produção de informações, entre outros.

Nos anos que se seguiram, houve uma queda

acentuada nos números de homicídios e uma melhoria geral da

segurança pública da cidade, demonstrando, de forma

inequívoca, o papel indutor que assume o município na política

de segurança local.

Já a partir dos anos 2000, com o início da discussão do

SUSP (Sistema Único de Segurança Pública), o debate que até

então estava restrito a alguns municípios, começou a tomar

ares institucionais.

Em primeiro lugar aprofundou-se a questão sobre a

indispensável necessidade de integração entre os entes

federados, que gerou a emergência dos Gabinetes de Gestão

Integrada dos Estados (GGI-E). Tal ferramenta buscou

congregar os diversos entes estatais responsáveis direta ou

indiretamente pelas questões de segurança pública, com o

objetivo de possibilitar o planejamento estratégico e sistêmico

dos programas, projetos e ações na área.

Paralelamente e conectado com esse processo,

desenvolveu-se uma nova concepção nas atribuições,

responsabilidades e estratégias no enfrentamento à violência.

Ficou evidenciado, àquela altura, que o enfrentamento à

criminalidade não era somente caso de polícia, mas também

Page 7: Palestra subsec sp rs

5

de polícia. A gestão na área sempre pendeu para um viés

repressivo, com foco direcionado somente para a reação, no

agir depois que o conflito já está instaurado. Entretanto,

percebeu-se, que essa política restritiva não surtia o efeito

desejado na diminuição dos índices e na sensação de

segurança da população. As ações policiais, por mais efetivas

e necessárias que fossem, atingiam um limite de atuação e

efetividade. Os fatores criminais estavam, portanto,

relacionados intrinsecamente com as mais diversas questões

sociais, da educação e saúde ao planejamento urbano da

cidade.

A partir daí, um novo conceito de enfrentamento à

violência foi sendo gerado, com uma atuação mais direcionada

à prevenção e às causas da violência. Aliados ao

enfrentamento tradicional e indispensável das polícias, projetos

sociais e de inclusão começaram a ser implementados,

objetivando, no médio e longo prazo, inverter essa dinâmica

criminal.

Dentro desse novo contexto emergiu o novo paradigma

na segurança pública. Em 2007, com a constituição do

PRONASCI (Programa Nacional de Segurança com

Cidadania), se aperfeiçoaram diretrizes que incorporaram a

perspectiva da prevenção como forma essencial e

complementar no enfrentamento da criminalidade e violência.

Por conseqüência, tal perspectiva se traduziu na inclusão do

papel ativo do ente federado município nas políticas de

Page 8: Palestra subsec sp rs

6

segurança. O projeto visou, sobretudo, priorizar a dimensão

local, no tocante à formulação de pautas e ações conjuntas que

atendessem as realidades dos municípios, assim como

promover a cultura de paz, a fim de implantar ações integradas

e de prevenção.

Para isso foi necessário renovar o conceito de

relacionamento entre polícia e comunidade, mudar a cultura do

aparato policial, e dotar as prefeituras de meios para produzir

políticas de segurança conjugadas a políticas sociais e

preventivas.

O PRONASCI, afora trazer propostas eficientes e

inovadoras para enfrentar a questão trouxe a “lume” a

necessidade de um grande debate nacional sobre a temática.

Mais do que isso. Propôs a mudança de paradigma para o

enfrentamento da violência e da criminalidade.

A Lei que instituiu o PRONASCI, aprovado de forma

unânime no Congresso Nacional, caracterizando-a como uma

“política de estado”, estabeleceu 2 (dois) focos fundamentais:

a) foco territorial: atuando prioritariamente em regiões

urbanas com altos índices de criminalidade e b) foco etário:

que tem como centro de sua atuação o jovem que se encontra

em situação infracional ou no caminho de situação infracional,

destacadamente os seguintes segmentos sociais da juventude:

adolescentes em conflito com a lei, jovens oriundos do serviço

militar obrigatório, jovens presos, jovens egressos do sistema

Page 9: Palestra subsec sp rs

7

penitenciário e jovens em situação de descontrole familiar

grave.

O novo paradigma de segurança pública consiste no

fortalecimento institucional do Estado para atuar

preventivamente. É uma nova concepção de atuação policial,

com o objetivo de fortalecer os laços comunitários e criar

condições para o acesso a políticas públicas e sociais.

A implementação deste novo paradigma de

segurança pública é uma necessidade, para garantir nossa

segurança jurídica e política. Apenas assim será possível

promover um programa de inclusão e recoesão social no país.

De ressaltar-se, que o novo paradigma tem, entre

outros, 02 (dois) marcos fundantes. Em primeiro lugar, articula

ações de segurança e ações de natureza sociais e preventivas,

atuando nas raízes socioculturais da violência e da

criminalidade, por meio do fortalecimento dos laços

comunitários e das parcerias com as famílias, sem abdicar das

estratégias de ordenamento social e repressão qualificada,

incluindo ações de capacitação dos operadores de segurança

pública e modernização das instituições policiais. Em segundo

lugar, fomenta uma agenda federativa compartilhada,

empoderando os municípios como protagonistas da temática.

Afinal é no município que as pessoas vivem, trabalham,

constituem suas famílias, etc.

Page 10: Palestra subsec sp rs

8

De outra banda, o novo paradigma da segurança

pública trás uma nova ferramenta de gestão. Essa ferramenta é

o Gabinete de Gestão Integrada Municipal – GGIM.

O GGIM, enquanto principal ferramenta de gestão

garante sua viabilidade operacional, reunindo o conjunto de

instituições que incide sobre a política de segurança no

município, promovendo ações conjuntas e sistêmicas de

prevenção e enfrentamento da violência e da criminalidade e

aumentando a percepção de segurança por parte da população

e a valorização dos servidores públicos que atuam na área de

segurança em todas as esferas.

A gestão integrada e a atuação em rede dos GGIM

permitem, de forma sistêmica, maior eficiência no

enfrentamento da violência e da criminalidade, uma vez que

evitam o isolamento e a fragmentação dos vários segmentos

que compõem a área da segurança pública.

O Colegiado Pleno, contando com o Prefeito como

Presidente, a participação das autoridades municipais

responsáveis pela segurança pública e defesa social, as

autoridades municipais responsáveis pelas ações sociais e

preventivas, bem como autoridades estaduais da área de

segurança que atuem no município: Polícia Civil, Polícia Militar

e Defesa Civil é a instância superior. Têm funções de

coordenação e deliberação, sendo responsável por decidir

quais ações e medidas serão adotadas para combater a

criminalidade e prevenir a violência.

Page 11: Palestra subsec sp rs

9

O GGIM rompe com a exclusividade da perspectiva

imediatista das ações policiais em resposta à crise e projeta

soluções com foco estratégico, de médio e longo prazo,

estabelecendo o planejamento efetivo da segurança,

configurado nos planos e programas locais.

RS na Paz

O Programa Estadual de Segurança Pública com

Cidadania – RS na PAZ recebe e compreende esta nova

estratégia de enfrentamento da violência e da criminalidade.

Estruturado em três eixos estratégicos (Prevenção,

Transversalidade e Gestão) inaugurou uma nova fase no

processo de consolidação de políticas de segurança baseadas

no princípio segundo o qual segurança pública não é sinônimo

de polícia. Essas políticas residem na percepção de que o

diálogo entre ações sociais e policiais é fundamental para a

redução dos índices de violência e da vulnerabilidade das

pessoas. O RS na PAZ é composto por 18 projetos e ações.

Essa intervenção estruturada nos processos de gestão

e ações voltadas para a segurança pública procurou evidenciar

a multisetorialidade da violência e criminalidade, e provocar

entre os diversos órgãos que incidem sobre a segurança

pública – agentes policiais e agentes sociais – a necessidade

de agregar suas várias contribuições para a tomada de

decisão, tanto no que se refere à constituição de diagnósticos,

quanto à identificação de demandas.

Page 12: Palestra subsec sp rs

10

Dessa forma, o município passou a assumir um papel

protagonista na tarefa de criar um ambiente de integração entre

as diferentes forças de segurança e a sociedade civil

organizada, passando pelas polícias Federal, Estadual e a

Guarda Municipal, além dos órgãos administrativos do

Município, Estado ou União.

Todavia, o leque aberto para a atuação do município se

mostra muito mais amplo. Além desse viés intermediador,

surgem diversas ações que o fazem indutor das políticas de

segurança pública, principalmente na área social, preventiva e

comunitária.

Exemplo de ações cabíveis ao ente federado

município no enfrentamento e prevenção à violência:

a) a instituição de um GGI-M, como nova ferramenta

de gestão, descentralizadora da macropolítica de

segurança, que opera por consenso e sem

hierarquia. Com representação estadual e

municipal, objetivando uma gestão integrada e

colegiada entre os diversos atores incorporados ao

processo de segurança pública municipal;

b) a criação de Coordenadoria Municipal de

Segurança Pública ou de Secretaria Municipal de

Segurança Pública, que viabilizem o planejamento,

implementação, monitoramento e avaliação de

ações, projetos e programas;

Page 13: Palestra subsec sp rs

11

c) a constituição de canais de comunicação entre a

população e as agências responsáveis pelo

provimento da segurança pública no nível local em

Municípios pequenos que não dispõem de

orçamento suficiente para manter a estrutura

administrativa de uma Secretaria ou

Coordenadoria;

d) a realização de fóruns itinerantes para discutir

segurança pública nas diversas regiões da cidade,

com a inclusão das organizações da sociedade

civil;

e) a elaboração de um diagnóstico preciso,

quantitativo e qualitativo, identificando os crimes

mais recorrentes e os fatores relacionados a eles;

f) criação de um observatório de segurança pública,

objetivando a produção de dados confiáveis para

elaborar um diagnóstico e traçar estratégias mais

eficientes;

g) a partir dele, a elaboração de um Plano Municipal

de Segurança Pública, com a priorização dos

problemas locais, formulando pautas e ações

conjuntas que atendam as realidades da cidade,

identificação dos recursos humanos, institucionais

e financeiros, planejamento a curto, médio e longo

prazo e definição das responsabilidades;

Page 14: Palestra subsec sp rs

12

h) criação e/ou fortalecimento das Guardas

Municipais, com um papel protagonista nas ações

de prevenção à violência, fortalecendo os laços

comunitários e de integração entre as forças de

segurança pública da cidade;

i) estabelecimento de uma boa rede de proteção

social, através da criação de projetos sociais de

saúde, esporte e lazer, bem como de

oportunidades sociais de educação e trabalho, que

visem reduzir os fatores que geralmente levam

cidadãos marginalizados a optar por uma vida

criminosa;

j) formulação de programas entre União, Estados e

Municípios para ressocialização, acolhimento e

reinserção social dos presos, egressos do sistema

prisional visando a redução da reincidência e

criminalidade;

k) fiscalização e adequação do ordenamento urbano,

loteamentos irregulares, espaços públicos seguros,

iluminação pública;

l) promoção de políticas de habitação, saneamento,

infra estrutura;

m) mobilização de toda a sociedade, fomentando

práticas democráticas e participativas com o fim de

produzir e disseminar a percepção de segurança

da população;

Page 15: Palestra subsec sp rs

13

n) utilização de tecnologias, câmeras de segurança,

áudio-monitoramento, cerca eletrônica, softwares

de gestão.;

o) desenvolvimento de uma política que promova uma

cultura de paz, mediante a implantação de ações

integradas de prevenção e enfrentamento da

violência e criminalidade.

O Governo do Estado, vertebrado pelo RS na PAZ,

com fundamento nas deliberações do 12º Congresso da ONU,

realizado no ano de 2010, que teve como título “Prevenção ao

Crime e Justiça Criminal”, bem como na literatura mais recente,

no que tange ao enfrentamento do fenômeno social da

violência, que caracteriza a sociedade pós-moderna está

buscando construir uma política de segurança pública cidadã,

fundada no fortalecimento institucional do Estado para atuar

preventivamente. Uma nova concepção de atuação policial,

estabelecendo laços de aproximação e parceria com a

população, sem nunca abdicar das necessárias estratégias de

repressão qualificada e combate à impunidade. Baseada no

aprofundamento das relações federativas inclui os municípios

como protagonistas de uma política que vise garantir o

exercício pleno da cidadania, com a integral garantia de direito.

Essa política se aperfeiçoa com a valorização dos profissionais

da segurança pública e do incremento de ferramentas

operacionais e tecnológicas, objetivando não só o

Page 16: Palestra subsec sp rs

14

enfrentamento à violência, mas, principalmente, a promoção de

uma cultura de paz.

Para que essa política de segurança pública cidadã

tenha total efetividade se faz cogente que os municípios, não

só a compreendam como também assumam de forma definitiva

seu papel protagonista, na temática da segurança pública, em

especial na área da prevenção.

Porto Alegre, 11 de novembro de 2013.