Painel 72

48
PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 1 Nº 72 Junho/2012 Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas da Limpeza As MULHERES da Limpeza As MULHERES

description

Revista Painel 72

Transcript of Painel 72

Page 1: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 1

Nº 72 Junho/2012

Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas

Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas

da Limpeza

AsMULHERES

da Limpeza

AsMULHERES

Page 2: Painel 72

2 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 40 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Janeiro/2012

Acesse nossos sites:

JORNALISMO

31 anos de ensino de qualidade

Conceito 4 no Enade/MEC

3 mil metros quadrados de laboratórios

4 estrelas no Guia do Estudante em 2011, 2010 e 2009

Curso Premiado na Semana Estado de Jornalismo e Expocom

Convênios, parcerias e estágios em empresas de comunicação da região

Programas de Intercâmbio Internacional

Produção em jornal impresso, revista, rádio, televisão e internet

Informações: (19) 3124.1676

unimep.br/jornalismo

soureporter.com.br

jornalunimep.blogspot.com

É NA UNIMEPUnimep faz

UNIVERSIDADE• Adquire visão crítica e autonomia intelectual

• Tem oportunidade de estágio e inserção no mercado de trabalho

• Faz intercâmbios com universidades de 25 países

• Realiza pesquisa - produção de conhecimento

• Promove extensão - compromisso social e atendimentos à comunidade

• Dispõe de 80% de professores mestres e doutores

• Exerce inclusão e convivência com a diversidade

• Vive cultura e esporte

• Tem polo avançado de tecnologia

Com

. e M

kt •

Unim

ep

Mais que um diploma, a sua formação.

75 estrelas pelo Guia doEstudante da Editora Abril.

Graduação: • Bacharelado • Licenciatura • Tecnólogo

Pós-graduação:• Especialização• MBA • Mestrado• Doutorado

Aluna do 6º semestre de Filosofia.Está em sua segunda experiência em projetos deiniciação científica, na área da saúde.

Natália PukeUnimep Capacit

Centro de Capacitação Profissional e Corporativawww.unimep.br/capacit

www.unimep.br/unimep @unimep

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

Revista Painel_julho-agosto_2012- ver.2;1.ai 1 19/06/2012 10:39:25

Page 3: Painel 72

cArtA do EdItor

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 3

João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, conhecido

como João do Rio a partir de 1903, quando passou a escrever para

o jornal Gazeta de Notícias, nasceu no Rio de Janeiro no dia 5 de

agosto de 1881; morreu no dia 23 de junho de 1921. Como Paulo Barreto

teve sua obra reconhecida pela Academia Brasileira de Letras em 1910.

Jornalista, sempre olhava para o mundo com olhos encantados com o

movimento das ruas, com as ações dos homens, com as regras sociais e

com os costumes vivenciados em sua época. Cronista, escrevia sobre os

acontecimentos diários como um literato. Por isso, sua obra foi eternizada;

um trabalho histórico que permite entender a cultura da sociedade carioca.

Em vida escreveu centenas de crônicas, peças de teatro e traduziu

obras. Deixou um legado importante para estudantes de jornalismo, que

ao terem contato com sua obra se deliciam com as palavras usadas, com

a maneira como retrata uma cena cotidiana; emocionam-se com os senti-

mentos transmitidos nos textos. Oportunidade única ler João do Rio, um

aprendizado significativo para quem deseja ser jornalista.

E, inspirados em João do Rio, que os alunos do 7º. semestre de

Jornalismo da Unimep, deste primeiro semestre de 2012, produziram

as edições das revistas 72 e 73, com reportagens sobre o tema ‘rua’, na

perspectiva de transmitirem aos leitores da Painel o que vivenciam nas

ruas de suas cidades.

A proposta não foi imitar João do Rio, mesmo porque seria impossível,

mas perceber nesse jornalista como a rua é rica de histórias – para quem

sabe contar. Assim, as pautas foram produzidas a partir de percepções

jornalísticas dos próprios estudantes, que foram (literalmente) para as ruas

buscar seus personagens, captar as histórias, entender o que acontece

nesse cenário urbano, onde estão todos os tipos de pessoas, há vários

tipos de cheiros, barulhos, cores, possibilidades de comprar e vender,

alimentar-se, encontrar amigos.

A expectativa como produtores da Painel é que essas histórias narradas

nas reportagens que compreendem essa edição sejam apreciadas e apro-

vadas pelos leitores e que esses possam compartilhar os sentimentos, os

olhares, as sensações que os alunos tiveram ao ver a ‘rua’ como o palco

de suas matérias.

Boa leitura a todos!

Histórias que envolvem as ruas

ExpEdiEntE

Órgão Laboratorial do Curso de Jornalismo da Unimep

ReitorClóvis pinto de Castro

Diretor da Faculdade de Comunicação

Belarmino César Guimarães da Costa

Coordenador do Curso de Jornalismopaulo Roberto Botão

EditoraRosemary Bars Mendez

(MtB 16.694)

Editores Executivos Saulo de Assis

Ronald Gonçales

Editores AdjuntosSabrina Franzol, Rafaela

Gazetta e Cláudia Assêncio

RedatoresAngélyca paiva, Antônio Corazza, Caroline Solano, Flávia Ribeiro, Flávio Hussni, Felipe Abrahão,

Luiz Felipe Leite, Mariana neves, Michaella Frasson, Rafaela Gazetta

, Ronald Gonçales, Sabrina Franzol, Saulo de Assis, Valéria

Spinelli, Vladimir Catarino.

Diagramação e Arte Final Sérgio Silveira Campos

(Laboratório planej. Gráfico)

Foto de capa Mariana neves

Correspondência Faculdade de Comunicação

Campus taquaral, Rodovia do Açúcar, km 156 - Caixa postal 69

CEp 13.400-911 telefone: (19) 3124-1677

Page 4: Painel 72

4 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

Rafaela Gazetta

[email protected] Gonçales

[email protected] fRanzol

[email protected]

Quatro voluntários, 18 mo-radores de rua, um salão da comunidade São Judas tadeu,

da paróquia Santa isabel, e um amor incondicional com aqueles que são excluídos pela sociedade. O que eles têm em comum? A vontade de fazer a diferença!

Eles deixaram seus trabalhos e bala-das com os amigos para levar alimento, carinho e dignidade aos moradores de rua na cidade de Limeira, dentro da Missão Anjos da noite, uma casa de abrigos localizada na Rua Rubens Jamine, s/nº - Olga Veroni.

Albert Henrique neves, o Betinho, e William Semprebom, ambos com 23

AmOR E LUTA CONTRA O P RECONCEITO Em LImEIRA

anos, são os idealizadores da missão Anjos da noite: dois jovens que abdi-caram de suas vidas para se dedicarem integralmente ao projeto. Segundo eles, o intuito é amar essas pessoas que por algum motivo saíram de casa, se afastaram da sociedade e passaram a viver despercebidos e excluídos. O alimento, embora importante, não é o principal, quando se pensa na necessi-dade do amor, da oração, da paciência de entender outras realidades.

O projeto sobrevive de doações dos frequentadores da comunidade, de pessoas que conhecem a seriedade e a dedicação pelas quais o trabalho é desenvolvido e de empresas que contri-buem com verba. São servidas, por dia, cinco refeições e, em abril deste ano, 1658 serviços foram prestados, incluin-do os banhos e as próprias refeições.

na casa de abrigo, Betinho e Sem-prebom receberam a reportagem da revista Painel para uma conversa um tanto quanto emocionante. Era um pouco mais das 11h de um sábado ensolarado e, da cozinha, vinha um cheiro convidativo. Além de revela-rem as dificuldades que enfrentam, fizeram críticas ao governo, sobretudo às propostas assistencialistas, e à polí-cia, contaram suas histórias de vida, a vontade que já tiveram em desistir e

mISSãO

da

A mesma população que ajuda também critica e fica falando que a gente está sustentando vagabundos,

que a gente está alimentando

monstros

AnjosBetinho revela que parte da comunidade tem preconceito com o projeto, mas que isso não o desanima

Page 5: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 5

AmOR E LUTA CONTRA O P RECONCEITO Em LImEIRA

to só existe por causa desse incentivo: estar junto deles. dar comida muitas vezes é fácil, mas dar o abraço, o beijo, o carinho, chorar junto, dar o ouvido para que eles falem são os desafios. Quando a gente viu que o projeto estava crescendo, percebemos que precisava ficar maior. A moto já não dava mais. Então, fizemos uma vaqui-nha entre amigos e pedimos dinheiro nas ruas. Em dois dias, arrecadamos R$ 1,5 mil e compramos uma kombi. Ela é bem velhinha, do ano de 1975, mas foi a nossa alegria. Começamos a levar o nosso pessoal ao encontro dos moradores de ruas, nas praças, embai-xo de pontes, vielas e guetos, levando alimentos a eles. O nosso intuito é amá--los. O alimento é secundário; a oração é principal, mas o amor, de sentar ao lado, de perguntar como foi a semana, é o começo de qualquer diálogo. E eles abrem o coração, eles choram, a gente chora, a gente se abraça. não é que

mISSãO

abandonar tudo. Mas para eles, não há gratificação maior do que ver o sorriso no rosto daqueles que vivem nas sarjetas, sobre constantes efeitos do medo e da humilhação. Embarque com a Painel na experiência incrível da missão Anjos da noite e tente, ao menos durante alguns minutos, olhar para o mundo para muito além do que você é capaz de enxergar. É possível refletir e sentir emoções incríveis. PAINEL (P): Há quanto tempo existe a missão “Anjos da Noite” e quais são os objetivos?

William Semprebom (WS): O projeto existe há quatro anos, no qual temos esse trabalho de estar nas ruas, entregando alimentos, cobertas, cari-nho, amor: o material e o espiritual. E há um ano e meio a casa de acolhimen-to funciona, e podemos, então, receber os moradores de ruas. tudo começou quando vendo a dificuldade dos mo-radores de ruas da cidade, sentimos a vontade de iniciarmos algo. na época, tínhamos uma moto e saíamos com leite, roupa, pão, que a gente mesmo comprava, com dinheiro próprio. Às quintas-feiras, a gente ficava com eles nas ruas (moradores). E é muito especial, porque ficamos com eles, abraçamos, beijamos, ouvimos suas dificuldades e histórias. O nosso proje-

da

Eles não abrem a porta e,

muitas vezes, estão do outro lado dela, para fechar, porque trabalhar com

morador de rua não dá lucro, não dá voto e não tem verba

noite

semprebom relembra de várias histórias ao conversar com a Painel

Foto

s: R

onal

d G

onça

les

e Sa

brin

a Fr

anzo

l

Page 6: Painel 72

6 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

P: Como vocês mantêm a casa? Albert Neves (AN): É tudo doa-

ção. tudo. A prefeitura não ajuda a gente. Recebemos material da popu-lação, dos frequentadores da igreja, pessoas que conhecem o nosso traba-lho e algumas empresas que ajudam no financeiro. nós sempre queríamos fazer isso, mas nunca nos preocupa-mos com a parte burocrática. Agora, vemos que o projeto está crescendo. Quem recebe moradores de rua é só a gente. A prefeitura tem uma casa de acolhimento também, mas só recebe quem é de Limeira. Aqui não. A gente acolhe também quem não é da cidade. Já morou gente de Sergipe, Alagoas, Mato Grosso e Bahia. Até paraguaio e mexicano já passaram por aqui. A gente tem alimentos demais, nunca faltou. Houve vezes em que quase estava acabando, mas nunca ficamos sem. Servimos cinco refeições por dias: o café, o almoço, o café da tarde, o jantar e o lanche da noite. temos duas padarias que dão pães fresquinhos para o projeto todos os dias, às manhãs. E não são apenas os moradores que se alimentam na casa, o pessoal que não mora aqui também vem se alimentar junto aos moradores da casa e tomar banho. não moram aqui, mas são atendidos pelo projeto. Em abril deste ano, por exemplo, foram 1.658 serviços prestados, entre banhos e alimentações. não trabalhamos só com o pessoal nosso aqui, não. A gente também disponibiliza serviços aos moradores de rua de uma forma geral. nem todos os remédios a gente consegue de graça, às vezes, temos que comprar com dinheiro doado. Compramos, ainda, passagem para que alguns moradores de rua possam voltar à terra de origem. É um gasto muito grande, mas as pessoas entendem da necessidade do projeto e acreditam em nós, porque, como já dissemos, não temos a documentação completa, mas acreditam. As pessoas vêem, per-cebem que o trabalho é sério, vêem os resultados positivos, de pessoas que estavam nas ruas e hoje já retornaram à família ou estão empregados, então, para nós, é muito gratificante. trata-se

viu que a necessidade era tão grande e pedimos as chaves do salão a um dos presidentes da comunidade, dizendo que só iríamos cortar alguns cabelos e barbas de certos moradores de rua, mas não teve como, estava numa época de muito frio. por isso, deixamos que eles dormissem no salão e nós dormirmos junto deles no espaço. Quando o padre voltou, a gente falou: “olha, não teve jeito e, mesmo sem a sua autorização, já estamos acolhendo os moradores de rua”. Recebemos, então, a benção e o apoio do padre e, há um ano e meio, estamos aqui.

Hoje, o povo que mais nos ajuda é o povo pobre, que faz sua compra do mês, bate aqui e

oferece um pacote de arroz ou de

feijão

a sociedade exclui. Eles mesmos acabam se excluindo. não é 100% culpa da sociedade. Mas quando alguém da sociedade pergunta para eles “como você está”? e se interessa por eles, é como se eles tivessem um novo início.

P: Como abriram a casa? WS: O padre Valdinei Antonio

da Silva, que é muito amigo nosso, chegou até nós e disse: “Eu vou para Bahia e daqui a nove dias eu volto e então dou a resposta para vocês” (sobre o uso do salão da Co-munidade São Judas Tadeu, para ser o abrigo de moradores de rua). Só que, assim que ele foi viajar, a gente

Page 7: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 7

de um trabalho muito sério e a gente sempre prefere que, antes de ajudarem, as pessoas conheçam as atividades que desenvolvemos.

P: Quais são os planos? AN: Estamos correndo atrás de

documentos para que possamos virar uma Organização não Governamental (OnG). Conseguindo, vamos buscar um local nosso. Hoje, a igreja cede o espaço para desenvolvermos esse trabalho. Ela paga a força (conta de ele-tricidade) e a água. nossa preocupação é com a alimentação e com os gastos de manutenção. Mas até o final do ano, se deus quiser, a gente pretende ir para esse novo lugar, porque a igreja também tem os seus compromissos, como realizar alguns eventos no salão. Com a gente aqui, por exemplo, ela gasta cerca de R$ 800 mensais. Um advogado está cuidando da papelada da OnG para irmos ao nosso lugar próprio. pensamos até em irmos a algum sítio, mas existe um trabalho que é o de reintegração: é tirar da rua, providenciar documentação é já enca-minhar ao mercado, acreditamos que no sítio vai ficar difícil para nós. Então, vamos ficar em algum lugar dentro da cidade. Hoje, de 18, já temos 12 que estão trabalhando.

P: Qual é a maior dificuldade de se trabalhar com esse projeto? Vocês são muito jovens, começaram com 19 anos, e enquanto muitos jovens estão se divertindo e buscando ou-tros objetivos, vocês se voltam à ação social e voluntária, há preconceito? E a família, como encara? Ela apoia?

AN: A família apoia muito. A gente não encara nada como dificuldade, mas sim como desafio a ser superado, como as críticas. A mesma população que ajuda também critica e fica falando que a gente está sustentando vaga-bundos, que a gente está alimentando monstros, e outras coisas. As pessoas se esquecem que amanhã ou depois, os filhos ou elas mesmas podem chegar a estar nas ruas. Mas esses desafios são todos superados por meio de oração, tanto nossa quanto dos próprios mo-radores de rua. Aqui, o que a gente mais trabalha é com o espiritual. todos

os dias a gente frequenta as missas e os grupos de oração. A superação a gente vai conseguindo. não matamos só um leão por dia, mas dez. no co-meço, claro, foi um pouco difícil de suportar isso, né? Ficávamos um pouco desanimados, mas superamos na base da oração.

P: E os maiores prazeres do Anjos da Noite, quais são?

WS: É a sensibilidade do coração. no meu caso, por exemplo, fui

dependente químico e traficante, quase cheguei ao estágio de morar na rua também. E hoje, poder pegar e ter a sensibilidade, porque de certa forma, a gente trabalhando com eles vê a rocha que fica o coração, que fica empedrado mesmo, sabe? O coração deles se fecha de tal forma, envolvendo carência, falta de amor e dificuldades passadas em casa. Então, para você chegar onde ainda bate aquele coração, é preciso arrancar muita casca, até chegar lá no fundo. E quando você chega lá, você vê que parece uma criança, é uma pessoa muito doce, que só queria ser amada (uma lágrima es-corre, enquanto ele conversa com a reportagem). E é engraçado porque são dois jovens tentando ensinar aos senhores a voltarem a ser gente, a ser humanos (o mais novo atendido atualmente tem 30 anos). Quando você vê um sorriso deles, meu deus, é sinônimo de missão cumprida. desse jeito, sou uma pessoa muito feliz. A gente não tira nenhum cen-tavo doado pra gente. A gente come do que eles comem, bebe do que eles bebem, usamos roupas das que

Têm pessoas que dizem em alto e bom som que

gostariam de jogar uma bomba aqui dentro, colocar fogo em tudo, comprar uma

arma e metralhar todo mundo

Fotos: Ronald Gonçales e Sabrina Franzol

Page 8: Painel 72

8 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

WS: Eu vejo que se o poder público não colocasse tanto empecilho, seria muito melhor, porque portas se abri-riam. A gente não quer que ninguém faça, nós estamos aqui para fazer. Mas poderiam abrir algumas portas para nós, porque os governantes têm esse poder. Eles não abrem a porta e, muitas vezes, estão do outro lado dela, para fechar, porque trabalhar com morador de rua não dá lucro, não dá voto e não

eles recebem. A gente não tem um salário fixo. O Betinho (Albert) era encarregado e eu era vendedor. E largamos tudo para viver essa radi-calidade e esse amor, vivendo de um modo espiritual do jeito que Jesus quer. não tem amor maior do que quando você ouve de alguém algo como: “obrigado por você existir” (continua bastante emocionado). isso é o nosso maior prazer e a nossa maior alegria, ver o sorriso deles, às vezes um sorriso banguelo, de dente todo podre, às vezes comido pelo craque, pela cachaça ou pela velhice, mas que vale muito a pena.

P: Existem histórias curiosas que aconteceram na casa?

WS: tem uma especial, a do seu Jorge. Ele até deu uma entrevista para a EptV, dizendo que ele foi o morador de rua que mais andou no Brasil. Ele se orgulhava de contar isso para nós aqui. A gente teve que ensinar ele, por exemplo, que se deve fechar a porta ao ir ao banhei-ro. Ele ficou tanto tempo nas ruas que esqueceu que tinha que fechar a porta de um banheiro. E quando a gente encontrou ele morto, ele morreu dormindo, no dia anterior, eu havia dado um terço para ele e dito: “olha, seu Jorge, esse terço aqui é para o senhor rezar com a gente”. Então, ele respondeu assim: “nossa, agora com esse terço, vou poder sair daqui”. Eu ainda brin-quei com ele, falei que agora que ele estava bem, queria ir embora. Então, ele respondeu assim: “para de ser burro, eu não estou falando que quero ir embora daqui, estou falando que agora eu posso sair na calçada, com fé em deus, eu posso andar e rezar. daqui, eu só saio no caixão”. E, no outro dia, ele mor-reu, com o terço na mão.

AN: Um rapaz veio aqui uma vez, ficou uns cinco meses morando com a gente, aí ele começou a lavar a louça e me chamou na cozinha e disse que estava se sentindo digno. Questionei ele, que me respondeu: “porque estou lavando a louça”. Quer dizer, em casa, às vezes a

gente briga com a família porque não quer lavar uma louça e, para uns, isso é sinônimo de dignidade.

P: Quais são os maiores medos que os moradores de rua têm?

AN: Hoje, é a polícia. Eles não têm medo entre eles, não têm medo de la-drões. infelizmente, o problema hoje, está sendo a polícia. É claro que não temos só santos nas ruas, têm aqueles que querem bagunçar, roubar e usar drogas, mas a polícia não sabe ter o discernimento e já chega agredindo e batendo nos moradores de rua, muitas vezes sem diálogo ou conversa. Eles têm medo também de alguns vândalos, que têm algumas brincadeiras, como colocar fogo em moradores de rua e agredir um morador de rua, como se fosse um prazer para eles.

P: Quantas pessoas fazem parte desse projeto?

AN: Somos em quatro. Algumas pessoas até querem trabalhar como voluntá-rias, mas a gente incen-tiva que eles mesmos trabalhem entre si. por exemplo, tem o Louri-val, que é um excelente cozinheiro (o cheiro que vinha da cozinha foi aprovado pela reporta-gem) e cozinha aqui na casa. Aqui, tudo é muito bem organizado e são eles que são os responsáveis por isso. Eles que fazem a comida, lavam o banheiro, a louça, o chão e realizam a manutenção.

P: Vocês comentaram que não há o apoio do poder público, mas vocês já pediram ajuda?

AN: Sim, já pedimos. Hoje tem a rede social, onde nos reunimos uma vez por mês para buscar melhorias e apoio do poder público. A gente cobra um albergue para a cidade e uma partici-pação mais ativa junto às entidades. Os governantes nem sempre se interessam por esse assunto, sendo que é obrigação deles. A gente não quer reconhecimen-to, a gente faz esse trabalho por amor a essas pessoas e a deus, só que parece não ser interesse deles.

Page 9: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 9

tem verba. infelizmente, hoje, se um po-lítico vem aqui no Anjos da noite para dar uma caneta, ele mobiliza as redes de televisão para que possam vir até o espaço e vê-lo dando uma caneta, para que isso seja um ato de auge para ele. A gente não se importa muito com isso não, se algum político quiser usar esse projeto para dar uma caneta, para que sejam abertas as portas aqui em Limeira, estamos aqui. A gente quer ajudar.

P: Quantos moradores de rua exis-tem hoje em Limeira, de acordo com a pesquisa de vocês?

AN: Recentemente publicaram em um jornal que a cidade só tem 28 moradores de rua. Hoje, tem de 200 a 250 moradores de rua no município.

P: Quais resultados práticos vocês observam nesses quatro anos de Anjos da Noite?

AN: Há um mês, quatro pessoas voltaram às famílias. Se, de mil, a gente conseguir um, está ótimo. A intenção, claro, é trabalhar na recuperação de todos. Hoje, a estatística do dependente químico do Brasil, em cada 100, um se livra. Aqui, de cada dez, a gente tem conseguido dois. isso é maravilhoso.

P: Na rua moram pessoas de todas as idades?

W: Sim, moram, e a gente descobre cada caso. Às vezes, uma mãe jovem tem um filho, amiga-se com outro ra-paz, o padrasto bate no filho e a mãe prefere o namorado ao filho, que se revolta e vai à rua. São crianças, jovens, adultos e idosos.

P: Referente aos projetos assisten-cialistas adotados pelo governo do PT, vocês acham que são suficientes no combate à miséria?

AN: Eu discordo que esse tipo de bolsa seja dado para quem mora na rua. temos um morador aqui que recebe R$ 70 da bolsa-família. Esse valor, para a manutenção de uma pessoa não vai ajudar nunca. Quantas e quantas coisas em porcarias o governo gasta e para uma pessoa sobreviver ele dá R$ 70? não é suficiente, é pouco e discordo que o morador de rua receba esse benefício.

P: Pela experiência de vocês, como conseguiríamos viver em uma socie-dade mais igualitária?

WS: A gente ficou muito depen-dente do governo, né? tudo parte do governo. Eu creio que se tivesse um acompanhamento melhor do governo o povo não viveria na escuridão. É preciso que existam pessoas encar-regadas em ouvir o que o povo quer e precisa, para que levem aos gover-nantes. A gente vê nas favelas, alguns programas sociais que eles fazem, o

povo mais bem organizado é o de favela, lógico que excluindo certos problemas ligados ao tráfico de drogas, pois não existe favela, mas sim comunidade. Essa palavra vem de “comum” e “unidade”, ou seja, de uma forma só. Hoje, o povo que mais nos ajuda é o povo pobre, que faz sua compra do mês, bate aqui e oferece um pacote de arroz ou de feijão. Se o governo tivesse pessoas que pudessem nos acompanhar, os bairros e as comunidades seriam melhores.

P: Você falou de comunidade. A casa de abrigo coordenada por vocês está localizada no bairro Olga Veroni. Como a comunidade daqui reage a ela? Há preconceito?

WS: É bem dividido. Ainda existe algum preconceito por falta de conscientização. têm pessoas que passam por aqui e dizem em alto e bom som que gostariam de jogar uma bomba aqui dentro, co-locar fogo em tudo, comprar uma arma e metralhar todo mundo. É porque a pessoa nunca passou por uma situação dessa. Aliás, há pessoas que já passaram por uma situação assim e não deram valor. Mas existem pessoas que, por falta de consciência, de não saber o que é um morador de rua, passam aqui três horas da tarde, quando acabamos de rezar o terço da mise-ricórdia, e nós vamos buscar pães para o café da tarde, os moradores sentam lá fora para fumarem um cigarrinho, aí as pessoas passam e falam que são um bando de vagabundos, que têm que colocar esses caras para trabalhar, que não têm vergonha na cara e é por isso que vão para as ruas porque tem uns trouxas que dão comida, que ficam engordando porcos. Só que são pessoas que nunca quiseram pegar uma vassoura para ajudar, conhecer como é o nosso projeto, que é sério. por outro lado, algumas pessoas, que são, inclusive, da alta sociedade, chegam aqui e falam que um dia vão ajudar na limpeza. Quer dizer, não existem só pessoas

Às vezes, a gente briga com a

família porque não quer lavar uma louça e, para uns, isso é sinônimo de

dignidade

Page 10: Painel 72

10 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

que são pobres materialmente. tem gente que tem tanto dinheiro, mas é pobre no coração. tem gente que acolheu tão bem ao projeto que fala que se sairmos daqui, acabou a alegria do bairro, mas uns querem que saiamos daqui logo. tem gente que já saiu de dentro da sua casa para bater em morador do nosso abrigo. Só vê o próprio umbigo. É triste. na verdade, são essas pesso-as que precisam de ajuda e não os moradores de rua.

P: Já pensaram em desistir? AN: Sem dúvida. não adianta

a gente mascarar isso, porque se-ria uma mentira nossa. Há muita ingratidão, até mesmo por parte dos moradores de rua. Uma pessoa que você faz, faz e faz e enquanto é beneficiado, tudo bem, a partir do momento que a gente toma alguma atitude, que é regra da casa, para a melhora de vida dela, então fala que a gente está roubando aqui dentro. teve um morador de rua que me falou uma vez que eu ganhava R$ 10 mil para fazer esse trabalho e eu simplesmente dei risada. na mesma hora que é gratificante, tem hora

que dói demais. Só que hoje a gente já tem muita experiência com os morado-res de rua, então isso fortalece. Hoje, a gente não pensa mais em desistir, mas no começo.

P: Já houve ameaças a vocês? AN: não, da minha parte não.

Aconteceu, às vezes, devido ao fato de o morador de rua estar alcoolizado ou drogado, de um ou outro falar que vai matar a gente, mas sabemos que é um doente também, no outro dia nem se lem-bra mais. Então, houve sim, mas nesses momentos. Agora, conscientes, nunca.

P: O que esses anos todos, à frente desse projeto, modificaram na vida de vocês?

AN: para mim, a humildade, que eu sempre tive de tudo, pois a gente vive super bem em casa. Sempre tive uma

vida boa, nunca passei fome, pelo contrário, sempre me alimentei bem. Então, eu era um pouquinho orgulhoso, nunca fui de ligar para morador de rua. Mas a minha famí-lia sempre foi bastante humilde. O que me fez mudar foi ver as atitudes da minha família e esse projeto. Eu aprendi a ser mais humilde e saber que não posso criticar, que amanhã, com um deslize, uma depressão ou um problema familiar, posso chegar a essa situação também.

WS: Esse projeto me ajudou 100%, pois, como eu disse, eu era dependente químico (há sete anos ele deixou de usar drogas). Eu apren-di a lidar com meus pais e com os próprios moradores de rua. Antiga-mente, quando frequentava bailes e danceterias, eu voltada de madrugada e batia em moradores de rua, jogava lixo e agredia, por simples prazer, pela adrenalina do momento. E olha onde deus me colocou, para cuidar daqueles que um dia machuquei. Hoje meu objetivo é viver para cui-dar dos moradores de rua. Se fosse necessário dar a minha vida pela vida deles, daria sem medo.

Isso é o nosso maior prazer e a nossa

maior alegria: ver o sorriso deles

Page 11: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 11

13 BAteu AquelA fome? Fique atento à higiene para evitar

algum problema com sua saúde ao se alimentar nas ruas

16 X-tudo, X-sAlA, X-frAngo, mirtAdelA...

Seja qual for, é impossível resistir aos saborosos lanches preparados em trailers

19 ComérCio nAs ruAs Há vantagens e incertezas

para os ambulantes que invadem o asfalto a procura de consumidores

22 feirAs: A CulturA do interior

Conheça curiosidades e histórias desse trabalho que começa na madrugada e segue até o sol raiar

25 As ruAs e os seus AromAs Por aí, há cheiros bons e

desagradáveis que marcam os lugares

27 limPezA e orgAnizAção Profissionais trabalham duro

para que a sujeira vá para o lugar adequado: no lixo

30 BArulho de todos os tiPos Pelas ruas, carros de som,

vendedores e sirenes são alguns dos elementos sonoros que podem ser percebidos

32 A novA York BrAsileirA Rio Claro mantém tradição

de 120 anos e tem nomes numéricos nas ruas e avenidas

sum

ário

34 Confusão entre CiClistAs e motoristAs

Os dois vivem em clima tenso, mas especialista vê solução para um convívio harmonioso no trânsito. Quer saber como?

38 ABAndono e Amor Eles são deixados nas ruas e,

com sorte, podem parar numa residência e surpreender com muito carinho: os animais precisam de um lar

41 grAfite muros das ruas viram grandes

telas para quadros de artistas que, nem sempre, são reconhecidos

44 o Bom PAPo nA CAlçAdA Em Cordeirópolis, população

mantém tradição de conversar e brincar nas ruas

22 34

38

Page 12: Painel 72

oPINIÃo

12 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

saulo de assis

[email protected]

São paulo, 26 de maio. Centenas de mulheres se reúnem na Avenida paulista para protestar contra o machismo. É 2ª edição da Marcha das Vadias,

movimento mundial que surgiu no Canadá em 2011 contra o machismo e o estupro. A cena se repete em outras cidades do país, como Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte. na multidão, roupas curtas e seios à mostra fazem parte do protesto. Como palco, as ruas do país, que reuniram milhares de pessoas.

todas as manifestações que acontecem hoje têm como fator comum as ruas e avenidas de todo o mundo, palco democrático para reivindicar direitos e protestar contra diversas situações. É o caso de protestos como a Marcha da Maconha, parada Gay, Marcha contra Corrupção. Se hoje a população desfruta de liberdade para protestar sobre o que desejar, nem sempre foi assim. Em 1886, na cidade de Chicago, nos Estados Unidos, milhares de trabalhadores se reuniram para pedir a redução da jorna-da de trabalho para oito horas diárias. Esse movimento

culminou com uma greve geral nos EUA, que continuou nos dias seguintes com a morte de centenas de mani-festantes. tudo isso começou em um 1º de Maio, hoje comemorado mundialmente como dia do trabalhador.

não por acaso, os trabalhadores possuem atualmente condições melhores do que na época do manifesto. Muita história se passou em relação aos movimentos traba-lhistas desde 1886, e, entre os fatos, estão várias ações exigindo melhores condições de emprego e renda, como a greve de 1978 que reuniu grevistas em São Bernardo do Campo, exigindo a restituição das perdas salariais com a inflação, que na época diminuía sensivelmente o poder de compra do trabalhador.

Fatos como esse se repetem pelo país e pelo mundo com diversas intenções. Seja para exigir melhores condi-ções de vida, liberdade de expressão, mudança de leis ou de paradigmas sociais, manifestações como essa atraem os olhares da opinião pública. Em comum, todas essas reivindicações têm como cenário as ruas, que unem os manifestantes e garantem um palco democrático e livre de censura, fazendo com que as vias públicas carreguem um potencial único de transformação da sociedade.

Palco de manifestações

Cíntia tavaRes

[email protected]

Um sorriso. Um abraço. Um aperto de mão. Ex-pressões de sentimentos que ilustram, em casa, na praça, no parque, na rua, os desejos que um

cidadão nutre ao outro. O brasileiro é conhecido pela receptividade, pelo coração sempre aberto e disponível a utilizar o que possui em benefício de outras pessoas. Uma característica de quem tem os olhos nas dificuldades e nos desejos daqueles que o cercam.

porém, diante do advento da tecnologia e da profusão das comunicações, um público conhecido pelo carisma e otimismo, parece envolver-se ao individualismo. igno-rando as demonstrações de afeto e preferindo aliar-se a poucos e fiéis amigos. Esta é, em muitas ocasiões, a grande justificativa de uma parcela. A dificuldade em exercer a confiança. E neste contexto, como confiar nas pessoas que cruzam o nosso caminho nas ruas?

na cidade de piracicaba, a jornalista Alessandra

Fraga, decidiu, numa quinta-feira, 31 de maio, testar o afeto das pessoas na praça José Bonifácio. Alessandra interagiu com o público que passava pelo local utilizando um cartaz com os dizeres “preciso de um ABRAÇO”, e avaliou que a divergência de opiniões sobre o ato de ca-rinho chega a gerar estranhamento por parte das pessoas.

Alessandra havia enfrentado um dia complicado e foi para a rua expor o desejo por um dia melhor. Outras pessoas fazem da rua um palco para declarações, pedi-dos ou reivindicações. isso trás identidade à rua. Ela não é apenas um “caminho ladeado de casas ou muros nas povoações”, como descreve o dicionário da Língua portuguesa Michaelis. A rua é expressão viva do que chamamos de vida. Ela é inerente a este conjunto de pessoas e lugares. A rua é parte de tudo o que compõe a história da gente.

Um local disponível para reafirmar e projetar mudan-ças e conquistas. Ora, podemos dizer sim que ela é um caminho ladeado de casas, muros e instituições, mas a isso está anexada a existência do ser humano.

“mais amor, por favor”

Page 13: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 13

vladimiR CataRino

[email protected]

Correria, compromissos diversos e falta de tempo. Características tão comuns nos dias atuais, em

pleno século 21, refletem também na alimentação das pessoas. Sem a possibi-lidade de comer em casa, com a família, pelo menos durante a semana, muita gente opta por se alimentar na rua, no

PreoCuPAções PArA quem PreCisA Comer nA ruA

eConomiA e higiene:

CUIDADOS ImPORTANTES DEvEm SER TOmADOS PARA mANTER A SAúDE DO CORPO E DO BOLSO AO SE ALImENTAR FORA DE CASA

caminho pra escola ou pro trabalho. Cachorro-quente, pipoca, churros, amendoim e lanches diversos fazem parte deste cardápio, que pode ser ao mesmo tempo apetitoso e perigoso. percorrendo ruas e avenidas centrais de três das maiores cidades da região, Americana, piracicaba e Santa Bárbara d Oeste, a cena é muito comum: barra-cas improvisadas nas praças, carrinhos de formas variadas nas calçadas e mesas

e cadeiras dividindo espaço com pedes-tres e veículos. na clientela a variedade também é farta. Executivos, donas de casa, estudantes, homens e mulheres em busca de uma refeição rápida.

“Em semana de pagamento eu chego a vender 150 lanches num único dia. Como estou neste mesmo ponto desde 1990, meu carrinho virou tradi-ção. Quase uma parada obrigatória”, gaba-se Laurentino Faganelo, que ga-

Foto

s: v

ladi

mir

Cata

rino

Page 14: Painel 72

14 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

grandes. “Quem come na rua corre o risco de ingerir alimentos sem valor nutricional e que podem, inclusive, estar contaminados com alguma bac-téria”, alertou.

no caso das frituras, por exem-plo, o perigo são as toxinas liberadas pela reutilização do óleo. “no caso de pasteis, que são alimentos bastan-

rante o sustento da família, composta por seis integrantes, trabalhando de segunda a sábado, até oito horas da noite em cada jornada. p a r a u m cliente, o bancário danilo Zolezi, mes-mo a refeição não sendo a mais adequa-da, é suficiente para uma alimentação satisfatória. “nem se compara com a comida da mamãe, mas o “seu” tino capricha no x-egg”, confessa, revelando o apelido do lancheiro.

Mas não são somente os lanches que atraem os clientes para o comércio de rua. Em qualquer hora do dia é comum ver crianças e adultos saboreando pipo-cas, doces e chocolates, seja na praça José Bonifácio, em piracicaba, ou na Avenida Antonio Lobo, em Americana. no auge do verão, a água também se torna um artigo bastante procurado. “Vendo uns 200 saquinhos de pipoca por dia. Antes vendia até mais, mas agora parece que o povo está sem di-nheiro”, conta o aposentado Mário de Souza pio, que cobra o atrativo preço de R$ 0,20 por unidade vendida.

SAÚdE - no entanto, uma das principais preocupações é, ou pelo menos deveria ser, com a qualidade dos produtos vendidos nas ruas. Afinal, é visível que alguns cuidados básicos com a higiene e o manuseio de alimentos não são feitos de maneira

mais adequada. para o endocrinolo-gista Miguel Monteiro Balancim, que atua no programa Saúde da Família no município de Americana, os riscos são

Pão, carne, molhos, queijo e presunto. tradicional sanduíche, cada vez mais consumido por quem busca uma rápida refeição

Page 15: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 15

te consumidos, devemos prestar atenção na limpeza do ambiente e do óleo, além de escolher recheios com componentes mais simples, como queijo e tomate, que não estragam tão rápido”, lembrou Balancim.

Segundo a nutricionista paola Mussolin, que atua em um restaurante em Santa Bárbara d´Oeste, poucos alimentos vendidos nas ruas repõem as energias que o corpo precisa durante o dia. “Mesmo o sanduíche natural, teoricamente mais nutritivo, torna-se perigoso, graças à salmonela, uma bac-téria que causa intoxicação”, salientou.

para quem não tem alternativa, o ideal é tomar alguns cuidados básicos. “A pessoa deve escolher muito bem o

lugar onde vai comer. Além do

espaço higienizado, toda a operação do alimento

dever ser visível e longe de insetos, água parada e objetos sujos. Caso surjam dúvidas, o recomendado é não comer. Melhor ficar com fome do que correr riscos de problemas graves”, enfatiza a nutricionista.

BOLSO - não são somente a prati-cidade, o paladar ou os cuidados com a higiene que atraem os consumidores para a refeição nas ruas. Com o custo de vida em seguida elevação, o preço também é um atrativo de grande peso na escolha da comida. E ele também é bastante variado. pode-se gastar, por

exemplo, R$0,10 em um mini doce de leite ou R$ 12,00 num sanduíche de pernil. Um combo dos mais comuns, o tradicional salgado mais refrigerante custa, em média, R$ 5,00.

para se ter uma ideia de quão difun-dido é o hábito de comer nas ruas, de forma rápida, a revista britânica the Economist elaborou o índice Big Mac, que compara o preço do sanduíche em diversos países e é até utilizado para comparar o piB (produto interno Bruto) das nações. Como ilustração, a publicação mostra que, entre 28 de julho de 2011 (data da penúltima atualização do índice Big Mac) e 11 de janeiro de 2012 (última atualização), o Brasil continuou a registrar o quarto Big Mac mais caro do mundo entre os 37 países pesquisados. na ponta do lápis, é mais caro comer o sanduíche aqui (10,25 reais ou 5,68 dólares) do que nos Estados Unidos (4,20 dólares ou 7,57 reais).

O vendedor denis Willians de Sou-za percebe muito bem essa diferença. “no começo do ano passado eu até conseguia comer bem gastando R$ 10,00 em dois dias. Hoje esse valor já não é suficiente”, lamenta, enquanto aguarda a chegada do seu churrasqui-nho grego (carne de segunda dentro do pão francês). “Mesmo assim ainda compensa em comparação a um res-taurante convencional”.

Se quer evitar contratempos finan-ceiros, mesmo na hora de comprar um simples quibe, o consumidor deve seguir orientações comuns para qual-quer investimento, dadas pelo econo-mista Vitor dias polidoro, professor do Centro Salesiano de São paulo. “A pesquisa ainda é bem vinda. Se você come todos os dias em uma barraca que vende o lanche a R$ 5,50, sendo que em outra o preço do mesmo produto é R$ 6,00, vai economizar R$15,00 por mês, ou R$ 180,00 no ano, que pode pagar uma parcela do ipVA”, compara.

Com ou sem rigor no controle de qualidade, sem comprovados acrésci-mos nutricionais e ainda pesando na carteira, engana-se quem pensa que a rápida refeição nas ruas está perto de morrer. não enquanto houver um pastel quentinho com guaraná sendo oferecido na esquina mais próxima.

Foto

s: v

ladi

mir

Cata

rino

Presença de insetos no mesmo local de preparo dos alimentos pode ocasionar doenças graves aos consumidores

Page 16: Painel 72

16 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

Ronald Gonçales

[email protected]

É difícil encontrar alguém que não goste de qualquer um dos sabo-res deles por aí. pode ter salada,

catchup, mostarda, maionese, ovo (até de codorna), bacon, milho, ervilha ou – para os mais saudáveis – atum, frango e menos ingredientes gorduro-sos. Mas não há escapatória: a maioria das pessoas, em algum momento, quer abocanhar um apetitoso lanche. pode

ser cachorro-quente, x-bacon, x-tudo, x-salada ou natural, de manhã, tarde, noite ou madrugada.

A hora que a fome vem, a prati-cidade e a mistura gostosa - algumas exóticas - levam as pessoas, das mais diferentes idades, a correrem para o trailer mais próximo e escolherem, nos cardápios simples, a combinação predileta. A painel foi até as ruas de Limeira e conversou (sem experimen-tar nada) com dois profissionais que atuam nelas, para descobrir curiosida-

des, dificuldades e prazeres envolvidos nessa profissão.

para chegar ao primeiro trailer, o “Vini Lanches”, no bairro Egisto Ragazzo, é preciso subir uma avenida e logo no início dela já é possível sen-tir o cheiro convidativo do bacon na chapa. Vinicio Francisco e Eunice da Silva Francisco, que mantém o trailer há dois anos, são casados e sorridentes. pelo espaço, sete mesas espalhadas aguardando os clientes. “Mas aos fi-nais de semana, dobram-se as peças”, adianta Eunice. na chapa, cinco lan-ches sendo prensados. “Em um minuto, a gente conver-sa sobre sua

Mais catchup, por favorO CHEIRO CONvIDATIvO INvADE AS RUAS E REvELA DIFERENTES TIPOS DE LANCHES

Page 17: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 17

Mais catchup, por favorO CHEIRO CONvIDATIvO INvADE AS RUAS E REvELA DIFERENTES TIPOS DE LANCHES

matéria”, pede a proprietária.Um minuto, claro, duraram 15,

pelo menos. não porque eles demo-raram, mas enquanto a reportagem aguardava, novos pedidos eram feitos, pessoalmente e pelo telefone – uma espécie de “disque-lanches”. “Se o cliente pede, a gente leva o lanche até ele”, garante Eunice, enquanto Fran-cisco prosseguia no batente, prestando atenção na conversa.

terminados os lanches, uma trégua no trabalho. “pronto, agora a gente

pode conversar”, autoriza Francisco. “Já chegamos a vender 150 lanches em uma única noite”, gaba-se, enquanto oferece os inúmeros tipos deles (são 49, que variam de R$ 3 a R$ 11). de todos, o x-tudo, que custa R$ 10, é o que mais agrada os clientes.

O “Vini Lanches” funciona de terça a domingo. durante os dias da semana, das 19h até meia-noite, contando com

o trabalho, além dos proprietários, de mais um rapaz que cuida

das entregas dos pedidos. no sábado, porém,

outro funcionário é acionado e o lo-cal fica aberto até 3h30. “por aqui,

passa gente de todas as idades e, aos sábados, muitas pessoas que saem das baladas para se alimentarem”, afirma o simpático senhor.

Segundo ele, para abrir um trailer, existe burocracia excessiva e o maior problema apontado em se trabalhar na rua é a falta de segurança. “por outro lado, é muito bom poder fazer bem para as pessoas, através dos nossos lanches”, confessa.

Falta de segurança é problema também para Claudemir Vieira, pro-prietário do “Mir Lanches”, no Jardim Bandeirantes. Seu trailer, que completa 15 anos em junho, fica instalado em uma das ruas que contornam a praça Sérgio Otani. Quando a reportagem chegou, cerca de oito lanches eram feitos ao mesmo tempo e muitos pedi-dos – anotados por caneta, em papéis amarelos – aguardavam na fila.

no “Mir Lanches” existem 37 tipos de sabores. Em cada um deles, podem ser adicionados novos ingredientes para que o cliente seja servido de acor-do com o gosto particular, como catu-piry, azeitona preta, ovo, cebola picada temperada e outros. A lanchonete de rua funciona de terça a domingo, das 19h às 23h. Aos sábados, uma hora a mais no expediente.

Os lanches que mais saem são o x-bacon (R$ 9,5) e o inusitado “mir-tadela” (R$ 13) – os preços variam de R$3 a R$ 13. “O ‘mirtadela’ é um lan-che personalizado, adorado pelos fre-gueses. Ele pesa mais de meio quilo”, confessa o proprietário que também

vinicio e eunice preparando os lanches

mirtadela ao lado de um x-calabresa. A imagem já é convidativa, imaginem o delicioso cheiro?

Foto

s: R

onal

d G

onça

les

Page 18: Painel 72

18 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

elabora os lanches, ao lado de outros cinco funcionários. O aparentemente delicioso exagero é uma mistura de mortadela, ou melhor, muita morta-dela, com queijo, tomate e ovo.

Vieira, que enquanto trabalha, con-versa sobre política, tV e planos futuros, finaliza o papo dizendo que “os seus fieis clientes viraram parte da família”.

Taxas - Segundo o chefe do serviço de rendas mobiliárias de Limeira, Ed-son Roberto Ferrari, quem quiser abrir um trailer deve procurar a Empresa Fácil, da prefeitura, para tomar ciência da documentação ne-cessária. Ele explica que a Lei 4411/09 regulamenta a instalação de trailers no município.

Ferrari esclarece que, se o interessado está inscrito como Mi-cro Empreendedor in-dividual (MEi), há uma taxa anual de renovação, no valor de R$ 30, pois para a abertura do trailer não incide a taxa. Em caso de abertura através de empresa individual, o valor anual é cerca de R$ 310. Há, ainda, o valor mensal, chamado de “taxa de Uso e Ocupação do Solo”, aferido de acordo com o ta-manho do trailer, de R$ 64 a R$ 170. Ele afirma que a Vigilância Sanitária (Visa) fiscaliza a higiene dos produtos dos trailers.

A Revista Painel questionou Fer-rari sobre o número de trailers regis-trados em Limeira, mas a resposta foi que não havia condições de responder momentaneamente.

Riscos - A nutricionista e mestre em ciências dos alimentos, Rita de Cássia Furlan pecorali, explica que desde que o indivíduo mantenha como rotina há-bitos alimentares saudáveis, fugir uma vez por semana para abocanhar um lanche, não é considerada uma prática alimentar agressiva. “não podemos fazer deste consumo esporádico, uma prática frequente, porque aí sim pode-rão ser desencadeados danos físicos de maior intensidade”.

Questionada sobre o consumo

de lanches depois de baladas, prática peculiar atualmente, ela não hesita: “é preciso fugir de alimentos gordurosos e doces, assim, o repouso é bastante tranquilo e reconfortante”.

Rita alerta para o risco de quem substitui alguma refeição por lanches. “por mais saudável que possam ser, quando substituídos no almoço ou jantar, não se consegue suprir diaria-mente as necessidades nutricionais essenciais para o desejável desempenho das capacidades físicas e intelectuais”. A profissional chama a atenção para os agravos que podem surgir à saúde, dependendo dos ingredientes, da qua-lidade dos alimentos e das condições higiênico sanitárias do local e mani-pulador, como deficiências vitamíni-cas, irritações gástricas e intestinais, dislipidemias, obesidade, entre outras.

A atendente de locadora de dVd's, Larissa drago, 23 anos, se considera viciada em lanches e tem sofrido algumas consequências indesejáveis

no seu organismo. nos últimos dois meses, Larissa engordou quatro quilos. “Como lanches quase todos os dias. deixo de me alimentar corretamente várias vezes”, confessa. As justificativas são a preguiça de fazer comida e os dias corridos. “É mais prático”, argumenta. Ela diz apreciar qualquer lanche que tenha muito bacon. “Aliás, uma vez comi um que me causou intoxicação”, lembra a moça.

para Rita, muitas situações podem causar o vício aos lanches, entre elas: não ter convivido com práticas alimen-tares saudáveis, não sentar à mesa para fazer as refeições com os familiares, não ter horário fixo para refeições rotineiramente e maior praticidade e modismo – por ser uma refeição que pode ser feita com os amigos. “As atitudes para reverter esse vício depen-dem unicamente da forte necessidade a incorporação de hábitos alimentares mais saudáveis, uma melhor qualidade de vida e, por fim, sentir-se mais feliz”, conclui a nutricionista.

Com cuidados e sem vícios, não é preciso resistir à deliciosa mistura de ingredientes calóricos que fazem parte dos lanches encontrados nas ruas. pode ser x-tudo, x-bacon ou “mirtadela”. Afinal, saborear o sanduíche predile-to ao ar livre, com o céu estrelado, a família e os amigos, é uma ótima alternativa para aliviar o estresse de dias que parecem intermináveis. Bom apetite, com ou sem catchup!

Claudemir vieira no preparo de lanches. “mir lanches” completa 15 anos em 2012; no destaque,

as mortadelas na chapa para o “mirtadela”

Foto

s: R

onal

d G

onça

les

Page 19: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 19

miChaella fRasson

[email protected]

Acordar cedo e se preparar para ir ao trabalho são hábitos de muitos brasileiros, entretanto,

essa rotina não está na vida dos vende-dores ambulantes, que trabalham mais de oito horas por dia e não têm horário fixo. Com as sacolas prontas e arru-madas nos carros, esses profissionais devem ser criativos para conquistar os clientes diante de tanta concorrência.

Esses profissionais estão envolvi-dos numa das profissões mais antigas da humanidade: descendentes dos mascates, termo utilizado no Brasil na segunda metade do século xix, por se identificarem com os imigrantes turcos. Estes se dedicavam ao comércio de porta em porta. A origem da palavra vem do árabe El-Matrac, usada para identificar os portugueses, auxiliados pelos libaneses cristãos, dominaram a cidade de Mascate, localizada na península Arábica.

diferente dos imigrantes euro-peus, que se dedicavam ao cultivo da lavoura, os libaneses encontraram nas cidades a oportunidade para o comér-cio. Chamados na época de ‘turcos da prestação’, ganharam dinheiro suficiente para investir em confecção e indústria. O mascate ficou associado à imigração árabe no Brasil.

Atualmente, este trabalho é mais conhecido como vendedores ambu-lantes, por não terem ponto fixo para comercializar os diversos tipos de mercadorias que carregam em sacolas ou em caixas dispostas no porta-malas

A vANTAGEm DA FALTA DE COmPROmISSO E A INCERTEzA NAS vENDAS RONDAm A ROTINA DOS ANTIGOS mASCATES

como profissãoAmBulAnte

elza de souza vende balas para ajudar no orçamento familiar

Fotos: michaella Frasson

Page 20: Painel 72

20 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

do carro. Esses profissionais não têm um salário estável, nem direito à apo-sentadoria se não pagarem o inSS por conta própria.

porém, esse vendedor não é apenas aquele que está parado num ponto da rua e muitas vezes passa despercebido pelas pessoas: são ambulantes os ven-dedores de produtos por catálogos, que atuam de porta em porta, entre amigos e conhecidos. São aqueles que conseguem rendimento mensal com vendas de acessórios, roupas, perfumes e sapatos – normalmente conhecidas como sacoleiras ou representantes de vendas. Muitos deles atuam de maneira clandestina, sem registro de profissional liberal, mas em todos os municípios há leis que disciplinam o trabalho deles.

Em Rio Claro, por exemplo, há a lei de nº 4805/94, que determina o ambulante como pessoa física ou jurídica, regularmente matriculada na Administração Municipal, que exerça atividade comercial ou de prestação de serviços nas vias e logradouros públicos, sem estabelecimento fixo. O internacionalista e economista Marcelo

Wicher diz que esses vendedores são agentes capitalistas, característicos de economias emergentes. Comenta que parte dessa população não tem ensino superior e, dessa forma, o elevado índice de desemprego torna a prática do comércio de ambulantes um meio muito atrativo.

A vendedora e executiva da Avon, Gislaine Cristina dos Santos, exerce essa função há dois anos. Consciente que seu trabalho é equiparado ao mascate, carrega a responsabilidade de uma equipe de vendas, administrando reclamações, trocas e as próprias metas que tem de atingir. A relação com o cliente sempre é a melhor opção para manter este trabalho e render bons fru-tos, o que a executiva faz por telefone e pessoalmente. “É necessário ter boa comunicação, paciência, atender as pessoas e estar disponível em tempo integral para os vendedores e clientes”.

nem todos conseguem viver apenas com o comércio de ambulante, muitas vezes este trabalho vem complementar a renda familiar. É o caso da vendedora de balas Elza de Souza, que além de ter um trabalho fixo, exerce essa função

uma vez na semana, para garantir o sustento da família.

países emergentes são caracteriza-dos por altas taxas de juros e impostos altos, o que acaba prejudicando o empreendedorismo. Segundo Marcelo Wicher, “é notório que tal prática não é prevista no arcabouço legal dos países. Grande parte destes agentes não emite o comprovante fiscal, necessário para tri-butação e regularização das transações econômicas por parte do Estado, o que acaba tornando a prática do comércio dos ambulantes como informal e ilegal”.

As sócias Luci Justi e Suely Ferreira estão nesse ramo há três anos. Ven-dedoras de sapatos, elas têm clientes fixos e trabalham por indicação, e sem-pre que alguém deseja adquirir uma mercadoria, entra em contato com as comerciantes, que se dirigem ao local, conquistando mais um cliente. Antes de iniciar com a venda de calçados, elas vendiam roupas, porém perceberam que as clientes estavam mais interes-sadas em sapatos. “decidimos investir nessa área. Estamos trabalhando com a venda específica de sapatos há uns dois anos”, lembra.

há duas semanas neste ramo, rafael se adapta a rotina do comércio

Page 21: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 21

Este trabalho, como tantos outros, tem seu lado negativo, como a falta de segurança ou a ausência de rotina. Ou-tro fator é a dificuldade em cobrar os inadimplentes. “Considerando os dois anos que atuamos nesta área, de 100% das vendas, considere que tivemos uma perca de 20%”, declara Luci.

A atividade não tem regras e ho-rários fixos, entretanto tem aqueles que iniciam a rotina de trabalho às 6 horas da manhã, seguindo até às 18 horas, sem descanso, andando pelas ruas atrás de clientes. Quando chove, quem depende da rua para sobrevier, deixa de trabalhar.

O ambulante Gonçalo Cardoso da Silva vende guardanapo, pano de chão e toalha de mesa há seis anos, não tem cliente fixo e costuma trabalhar em bairros. Segundo ele, essa é uma garantia de venda maior. “Às vezes venho para o centro, mas aqui não ganho muito não, tem muita gente”.

A lei que prevalece em Rio Claro destaca que os interessados no co-mércio ambulante devem se inscrever no Cadastro Fiscal do Município e formular o pedido de licença, que será formalizada por meio de credencial própria, contendo dados pessoais, fotografia e o tipo de comércio.

Apesar da fiscalização, muitos ambulantes trabalham sem o registro e cadastro na prefeitura, correndo riscos de perderem toda mercadoria. “Levam tudo, até o carrinho”, relata um ambulante que não tem a licença.

Muitos ambulantes não têm conhe-cimento que existem lugares proibidos

pela legislação e uma vez se instalando provisoriamente neste espaço, correm o risco de serem autuados.

Segundo a lei, não são permiti-dos pontos de comércio ambulante localizado a menos de 200 metros de outro ambulante, defronte a guias rebaixadas, em área que se encontre monumentos tombados, em canteiros

das praças e dos jardins públicos, nas calçadas de largura padrão e meio ofício, defronte a portões de acesso e garagens, a menos de 50 metros de saídas dos prédios de estabelecimen-tos de ensino e cinema, a menos de 100 metros de estabelecimentos que comercializem o mesmo produto ou similares, a menos de 30 metros das esquinas das ruas e avenidas, a menos de 100 metros de hospitais, prédios públicos, templos religiosos e estabe-lecimentos bancários.

Apesar do trabalho incerto e das dificuldades, esses vendedores car-regam sonhos e almejam conquistar melhores condições de vida. Antônio, vendedor de meias a cinco anos, já teve uma loja que ficou para a esposa após a separação do casal. Mesmo assim, declara: “pretendo até o ano que vem montar outra loja”.

Mesmo com a concorrência, observa-se entre os vendedores am-bulantes um clima de coleguismo e companheirismo.

Ambulantes se instalam em locais que em muitas vezes dificulta a passagem das pessoas

As meias são os produtos mais comercializados pelos ambulantes

Fotos: michaella Frasson

Page 22: Painel 72

22 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

anGélyCa Paiva [email protected]

feliPe abRahão

[email protected]

A preferência por produtos fres-cos, mais saudáveis e o vínculo de amizade entre feirantes e

clientes ainda mantém as feiras livres como uma tradição em todo o país. Além de ser uma fonte de renda para inúmeras famílias, a feira proporciona momentos de lazer e de descontração.

Feirantes ocupados atrás das balan-ças, pessoas conversando sobre tudo e, ao mesmo tempo, o carrinho puxado cheio de frutas e legumes completam o cenário das rodinhas de amigos em volta da barraca do pastel. São cenas típicas das feiras.

Em Santa Bárbara d’Oeste, são 80 feirantes inscritos no setor de Fisca-lização, Obras e posturas (FOp) da prefeitura Municipal e dez feiras em diferentes bairros, número que, segun-do o departamento, vem se mantendo durante os últimos anos.

Já em Americana, houve um aumen-to no número de feirantes inscritos: em 2011 foram sete novos registros na Secretaria de Fiscalização de Abas-

tecimento e preço, enquanto nos três primeiros meses deste ano, foram três novos trabalhadores a apostarem em um mercado competitivo, porém afetivo.

Origem das feiras - Segundo o professor de história Altair Aiton Luiz Camargo, alguns historiadores apontam a origem das feiras livres no fim da Alta idade Média, durante o século ix, mas ela ganhou espaço e importância a partir do século xi, já na Baixa idade Média, graças a reunião de alguns fatores como o fim das invasões bárbaras e o renascimento comercial e urbano pós-Cruzadas.

O surgimento da burguesia nas ci-dades medievais reacende o comércio e, com ele, a circulação monetária. “Além das cidades (burgos), o comércio era realizado ao longo de extensas ro-tas de comércio que ligavam os pontos mais distantes da Europa, inclusive com o Oriente. Era principalmente nos cruzamentos de rotas comerciais que as feiras aconteciam. Estas também poderiam ser realizadas dentro ou fora das muralhas das cidades”, explica Camargo.

O professor ainda enaltece que é possível perceber traços marcantes

O TRABALHO COmEçA NA mADRUGADA E PRIvILEGIA A SOCIABILIDADE

é tambémfeirA

culturalespaço

uma cultura na feira são as senhoras com seus carrinhos para levar seus alimentos sem danificar

feira do zanaga é patrimônio sócio cultural, bastante movimentada e procurada nos domingos pela manha

Page 23: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 23

das distintas e ricas características da cultura local por meio dos produtos oferecidos nas diferentes formas de feiras livres espalhadas pelo Brasil.

de acordo com ele, a ligação da feira com a rua é emblemática, tendo em vista que a rua não serve apenas para permitir o trânsito de pessoas e veículos, mas é o espaço público pri-vilegiado da sociabilidade. “As feiras não tem a mera função de movimentar a economia local, o que não deixa de ser importante, mas é o espaço de circulação de pessoas e de propagação cultural”, completa.

A feira livre é um traço da cultura medieval presente nas ruas e configura--se em patrimônio histórico e cultural brasileiro. “É permanente em sua importância e crescimento em todo o Brasil contemporâneo e deve ser propagada como tradição de um povo que respeita suas raízes e, portanto, sua história”, conclui o professor.

Patrimônio - Em Americana, em uma das mais tradicionais feiras livres do município, localizada na Avenida Cecília Meirelles, no coração do bairro Antônio Zanaga, é visível o clima de harmonia entre os trabalhadores e seus clientes.

O vereador Luiz Antonio Crivelari (pSd) formulou em 2009 um projeto para a feira do bairro Zanaga ser trans-formada em patrimônio sócio-cultural, posteriormente aprovada por unanimi-dade pela Câmara dos Vereadores. Cri-velari explica os motivos, pelos quais, a feira pode ser considerada patrimônio cultural. “devido ao tempo, perma-nência e frequência. A longevidade da existência garante a estabilidade da permanência”, salientou.

O político diz ter escolhido a feira do Zanaga por atender solicitação de feirantes e usuários da feira. “por várias vezes tentaram mudá-la de local. A população resistiu”, lembra.

Wilson denanet Junior, que foi funcionário público durante 23 anos, é feirante e em sua barraca vende pro-dutos mineiros, em especial o queijo.

Wilson afirma que a vida de feirante não é nada fácil “Acordo todos os dias ainda de madrugada, não tenho sábado, domingo e feriado”.

O ex-funcionário público é a favor da lei criada pelo verea-dor Capitão Crivelari. “Foi uma forma da feira se estabelecer. Sou a favor de mais feiras tradicionais na cidade terem o mesmo apoio”, fala.

Já Rosângela Vicari, que está no meio dos feirantes há cinco anos, re-solveu abrir seu próprio negócio em Americana influenciada pelo marido que foi feirante quando morava em Santo André. Ela também vê com bons olhos a lei que estabeleceu a feira do Zanaga como patrimônio sócio cul-tural. “toda feira tradicional deveria receber esse tipo de apoio”.

na vizinha Santa Bárbara d’Oeste, as feiras de rua, assim como na cidade de Americana, são tratadas com muito carinho pelos feirantes. Apaixonada pelo que faz, Maria Aparecida de Souza Canteiro começou sua jornada ao lado do marido, Sérgio Aparecido Canteiro, na feira desde1982, venden-do laranjas.

O primeiro dia de trabalho não foi fácil. Maria tinha dificuldades para manusear a balança, que naquela época não era digital. “Meu marido preci-sou sair da banca, e eu não conseguia mexer na balança. tinha muita gente para atender, fiquei perdida”, relembra em meio a risos.

no mesmo ano, mudou a banca para a feira no bairro São Manoel, em Americana. nessa época, Maria, que ainda amamentava, costumava levar o filho pequeno. Grávida do segundo filho, em 1983, mudou-se para o litoral de São paulo e foi, nesse período, que ficou longe das feiras por seis meses.

de volta ao interior, recomeçou o trabalho nas feiras em Santa Bárbara d’Oeste. Maria recorda que durante todos esses anos contou com o apoio da mãe e de muitos amigos, como a amiga conhecida apenas por Geni, que trabalha com ela há mais de 20 anos. “Ela é muito especial, é uma grande amiga, já faz parte da família”, conta.

Os dias de Maria na feira são mar-cados por vários acontecimentos. Hou-ve momentos que a perua usada para buscar mercadoria quebrava e os ou-tros feirantes ajudavam a transportar a mercadoria; durante a madrugada, o que acalentava os ânimos era o café servido por Geni; além dos encontros com os amigos.

O trabalho árduo rendeu. da feira, Maria tirou o sustento dos três filhos e afirma que nunca lhes faltou nada. “no começo foi difícil, mas aos poucos, foi

A feirante maria concentrada em seu trabalho

Foto

s: F

elip

e Ab

rahã

o

Page 24: Painel 72

24 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

Divulgação na internet - A barraca de queijo, doce de leite, licor, farinha de milho, rapadura e salame pertence a dennis Moraes Scavacini.; para ele, a feira livre é uma tradição que precisa ser mantida e cada vez mais divulgada. por isso, faz um trabalho de divulgação das feiras de Santa Bárbara d´Oeste no site feiralivre.tv.br e do facebook/FeiraLivreSBO. Em março deste ano, chegou a transmitir ao vivo, por quatro horas, a feira localizada no centro da cidade, que acontece aos domingos.

por cinco anos, o técnico de infor-mática manteve uma lanhouse, mas decidiu mudar de ramo quando surgiu uma oportunidade de arrendar uma banca de queijos. Há oito meses, faz feiras em diferentes bairros da cidade, mesmo período que mantém o site. A

melhorando. Comemos de tudo, não nos falta nada”, afirma.

Rendeu-lhe também muitos ami-gos. Carinhosamente, cita nomes e bairros que marcaram a sua vida. “O bom dia do seu toninho me alegra. Os moradores do Mollon, Jardim Europa, Jardim pérola e do Centro estão no meu coração”, confessa.

no dia-a-dia, ela se diverte, conversa com os feirantes e clientes e se esquece das dificuldades. “Aprendo com as pessoas. É muito bom, a feira é minha vida!”, emociona-se. Maria é otimista e não acredita no fim das feiras. “Apesar dos muitos mercados, super e hipermer-cados, nossa feira jamais vai acabar”, aposta. Bem disposta, não pretende parar de trabalhar tão cedo. “Minha intenção é trabalhar mais 15 anos. não sei quando vou parar (risos)”.

Os filhos de Maria e Sérgio, Ri-cardo, Reinaldo, e Renato Aparecido Canteiro herdaram dos pais o talento e o gosto pelo trabalho nas feiras. “Estamos na feira desde pequenos, temos fregueses de muitos anos. pas-samos por épocas difíceis, mas temos espírito de luta, vontade de trabalhar. As mercadorias são boas, por isso acredito que a feira não vai acabar”, afirma Ricardo.

iniciativa de usar a internet para pro-mover as feiras foi bem aceita pelos feirantes. A ideia é que futuramente todos possam participar mostrando seu trabalho e revelando histórias de vida.

Scavacini diz que muita gente compara os preços da feira com os do mercado, mas garante que “a qualidade dos produtos da feira é melhor”. O feirante novato conta que, apesar do pouco tempo de trabalho, já fez muitas amizades. Sobre os amigos feirantes afirma serem pessoas “trabalhadoras e sensacionais”.

Em sua opinião, a melhor parte da feira é atender as pessoas. “Além de comprar, muitos param para conversar, até falam de seus problemas. Estamos sempre aprendendo, principalmente com os mais velhos”, completa.

os frequentadores das feiras sempre estão em busca da melhor qualidade e menor preço dos produtos

Fotos: Felipe Abrahão

Page 25: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 25

CaRoline solano

[email protected]

Cheiro é algo que chama a atenção de todos. desde pequenos as pessoas aprendem a identificar as coisas e até as pessoas por meio de seus perfumes. tudo tem

um cheiro, característico, único e marcante. O cheiro traz lembranças, saudades; remetem a momentos especiais, que marcaram a vida. não importa a intensidade, se é fraco, forte, bom ou ruim. O cheiro sempre remete aos mais diferentes sentidos, lembranças e sensações. E a cada saída para as ruas, as pessoas mergulham em aventuras marcadas por aromas encontrados em cada esquina que se passa.

O cheiro está em toda parte. Mas o lugar onde se pode encontrar os aromas diversificados, do agradável ao repulsivo, é nas ruas, onde estão os vendedores de espetinho, de pipoca, a senhora que vende cocada caseira, o do café da padaria até o suor do andarilho sentado na calçada pedindo dinheiro.

os AromAs remetem As PessoAs A diferentes e m o ç õ e s

dos PrAzerosos Aos que inComodAm

Cheiro: Ca

rolin

e So

lano

Page 26: Painel 72

26 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

passa-se pelo agradável, pelo ruim e estranho em poucos minutos. Lá estão os cheiros que aguçam não só o olfato, mas também identificam cada local ou pessoa, faz com que se volte no tempo, até aquele lugar, até aquela pessoa.

Além disso, cada cidade tem nas suas ruas cheiros característicos. Em Rio Claro, a principal avenida, tem um cheiro forte de esgoto. isso acontece porque o local está em cima de um antigo córrego que precisou ser cana-lizado para a construção da avenida. Com a canalização, esse odor fica mais forte, pois se concentra numa área abafada. “Esse cheiro incomoda e muito, em dias de calor fica prati-camente insuportável ficar dentro de casa por causa do mau cheiro”, diz Luiz Orlando Frasson que mora ao lado da Avenida Rio Claro há mais de 20 anos.

para tentar amenizar o cheiro, a prefeitura de Rio Claro planeja a implantação de tampas ecológicas nos bueiros da avenida. “Uma tampa com essas características está operando em caráter experimental em um dos buei-ros da avenida”, informou a assessoria da prefeitura. Outra medida futura é a instalação de um emissário que irá coletar o esgoto e o enviar diretamente para a estação de tratamento, retirando descarga do Córrego da Servidão, que passa embaixo da Avenida Visconde. A prefeitura garantiu que, com esse procedimento, “o córrego ficará ple-namente tratado e sem o mau cheiro”.

Outro ponto da cidade onde o

cheiro é o que mais chama a atenção é o bairro Bela Vista, onde fica uma fábrica de frango. Os moradores que conhecem o local, logo falam: “o Bela Vista? Sei, é o bairro que tem cheiro de frango depenado”. E é esse o cheiro que invade os arredores do bairro todos os dias pela manhã e no final da tarde. Algumas pessoas que moram próximo dessa fábrica já não se incomodam mais com o odor pouco agradável. “Moro aqui há mais de 15 anos e no começo o cheiro me inco-modava bastante. Hoje, nem percebo mais”, conta Maria Monteiro.

O gerente de produção da fábrica, Mauricio pedroso, explica que os dois principais fatores que causam mau cheiro são os frangos vivos, que ficam

no local antes do abate, armazenados em um galpão dentro dos caminhões. “dependendo da direção do vento o cheiro das aves vai na direção das ca-sas”, justifica. para abrandar o proble-ma, os funcionários usam ventiladores voltados para o chão com objetivo de manter o odor no próprio galpão. “A limpeza do local ajuda a amenizar ainda mais o cheiro das aves” afirma o gerente. Outro problema, reconhece, é o do tratamento da água usada para limpar os frangos abatidos. Segundo ele, “para não jogar a água suja com as penas e gorduras dos frangos dire-tamente no esgoto, há uma pequena estação de tratamento da água”.

Em Limeira, o cheiro que chama atenção é do bagaço da laranja pro-pagado pela fábrica de suco. “Adoro quando passo por aqui e sinto esse cheiro de suco de laranja”, comenta o químico Luis Moreira que frequen-temente passa pela cidade. O mesmo acontece em piracicaba, com a indús-tria de bolacha localizada no bairro Morumbi. Esses cheiros causam diver-gências de opiniões entre as pessoas que passam pelo local, e se encantam com o cheiro doce de bolacha recém--saída do forno, diferente com os mo-radores da região que sentem o aroma o dia inteiro até enjoar.

Mas um cheiro que domina as ruas de todas as cidades da região é o das queimadas das plantações de canas. A fumaça fina, que impregna e incomoda.

lixo acumulado nos bueiros ajuda a piorar cheiro que já é forte

local de armazenamento dos frangos antes do abate

Foto

s: C

arol

ine

Sola

no

Page 27: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 27

LImPOtudo

maRiana neves

[email protected]

Às vezes eles até parecem invisí-veis, mas é graças ao trabalho dos varredores de rua que as vias

se mantêm limpas. na capital ou no in-terior, em cidades grandes ou pequenas, em bairros ricos ou pobres, com chuva ou sol eles estão lá, esforçando-se para manter as ruas sem sujeiras.

Em Santa Bárbara d’Oeste, por vol-ta das 14h é possível avistar, já no final do bairro Residencial Furlan e também quase no fim do expediente, Vera Lúcia Francisco. Ao lado dela, um carrinho, e em suas mãos uma pá e uma vassoura. Há dois anos, de segunda a sexta-feira, das 7h às 16h, e aos sábados das 7h às 11h, são esses os companheiros de tra-balho da varredora de rua. Com eles, Vera já passou por diversas situações. “tem pessoa que pensa que a gente é o próprio lixo, e não que estamos ali para limpar o lixo”, comenta indignada.

ProfissionAis de l imPezA t r A B A l h A m d u r o P A r A deiXAr A CidAde orgAnizAdA m

aria

na N

eves

Page 28: Painel 72

28 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

nestor Campos, passam em frente das casas recolhendo material há quase 20 anos. “O pessoal já conhece e até separa pra gente sacolas com jornais, revistas e caixas de papelão”, diz a senhora de 71 anos. “E quando não nos conhecem a gente passa e dá uma olhada na lixeira e na calçada, pois sempre tem alguma coisa”, conclui.

Após juntarem por volta de 100 quilos de material reciclado no mês, o casal vende e, o dinheiro que consegue, cerca de R$ 200, ajuda nas despesas de casa. Eles são aposentados e não contam com a ajuda dos filhos.

O desrespeito e a falta de reconhe-cimento por parte dos moradores são constantes. Segundo ela, tais atitudes são mais comuns entre adolescentes e jovens; os mais velhos costumam tratá--los bem. “Uma vez o cachorrinho de uma menina veio correndo na minha direção para brincar comigo e ela disse, chamando o animal, ‘sai daí porque você não é desse nível. nessas horas o melhor que eu faço é deixar passar e fingir que não é comigo”, diz.

Se a sede e a vontade de ir ao ba-nheiro apertam o jeito é tocar a cam-panhia de alguma casa e torcer para que o morador seja bem legal, coisa que às vezes não acontece. “tem dias em que o sol está forte e recusam um copo d’água. Ou, querendo parecer bons, oferecem água da torneira ou da mangueira mesmo”, conta.

Mas existem algumas exceções, aqueles que reconhecem o árduo traba-lho e colaboram. Vera Lúcia já chegou a passar mal durante o expediente e uma senhora, que se tornou sua amiga ao longo desses dois anos, se ofereceu para levá-la ao médico e abriu as portas da casa para que ela pudesse descansar.

Em dias de chuva, o banheiro do parquinho de um bairro próximo é a saída. E é nesse parquinho, também, que os varredores do entorno guardam seus equipamentos no fim do dia.

Quando Claudimara Rogéria ter-mina de varrer sua área no bairro pela qual é responsável, ela vai até Vera auxilia-la. Há quatro anos trabalhando

como varredora de rua, Mara, como é conhecida, confessa ser um pouco mais “pavio curto” se a falta de respeito é exagerada. A orientação dos donos da empresa Forty, é que os funcionários limpem as ruas, já que a calçada é responsabilidade de cada morador. “E têm alguns que não entendem isso e mandam a gente limpar a calçada. Mas mandam com grosseria, como se tivéssemos a obrigação de fazer o serviço”, conta.

na hora do almoço, uma mesinha no quiosque ou a sombra de uma árvore é o que elas procuram para relaxar e fa-zer a refeição que, a esta hora do dia, já está fria na marmita dentro da mochila. Mas não têm outra opção. não há como esquentar. “não que seja gostoso, mas nós já acostumamos”, diz Vera.

depois do saco de lixo cheio, elas o amarram e colocam embaixo da lixeira de alguma residência, para diferenciar do lixo do morador, que utiliza a lixeira.

Quando o assunto é vaidade elas sorriem. Bota preta, calça compri-da, blusa de manga comprida, luva e chapéu integram o uniforme. E a empresa ainda fornece protetor solar, já que nessa ocupação o trabalho é ao ar livre. Agora, todo esse uniforme só faz parte delas até as 16h. “Assim que eu guardo as coisas no parquinho, eu aproveito e me troco. Coloco shorts, blusinha e rasteirinha e vou embora para minha casa”, afirma Vera, que não abre mão de passar batom e estar

sempre com as unhas bem feitas, devidamente esmal-tadas, e de preferência com cores chamativas – já que ela não usa luva o tempo todo.

Claudimara vai pelo mesmo caminho. “Esse tipo de roupa é só na hora do expediente, mesmo. de-pois e aos finais de semana eu costumo usar vestido e rasteirinha”.

Mas não são só os var-redores de rua que contri-buem com a limpeza das cidades. Catadores de papel e papelão também ajudam. dona Joaquina pereira de Sousa Campos e o marido,

o lixo é agrupado e depois colocado no saco, dentro do carrinho

vera revela que algumas pessoas tratam as varredoras de rua como lixo, sem respeitar a atividade que realizam

Page 29: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 29

pelas ruas da cidade também es-tão Wellington Aparecido da Costa e Luciano Joaquim dos Santos. Eles podem ser vistos durante as tardes e às noites, em cima de um caminhão de lixo. Wellington tem 20 anos e trabalha como lixeiro desde os 17. “parei de

estudar e tive que começar a trabalhar para ajudar em casa”, diz.

Em Santa Bárbara d’Oeste são quatro caminhões e cada veículo transporta quatro coletores de lixo. O serviço tem que ser rápido. passando

de casa em casa recolhendo os sacos, caixas e, às vezes, outros

materiais que podem até ser úteis para eles. “Uma vez

eu encontrei uma caixa de sapato com 38 relógios. Quando chegamos na coletora nós dividimos”, revela Luciano, com um sorriso tímido. Segundo eles, geralmente, coisas boas são encontradas

em bairros mais ricos, onde moradores acabam,

algumas vezes, dispensando objetos ainda em bom estado

de conservação.Com relação ao cheiro, eles

afirmam que é questão de costume. Os dois concordam que o odor é horrível, mas após 30 ou 40 dias de trabalho acabam se acostumando.

dentro do caminhão, o motorista conta com uma caixa de primeiros socorros para imprevistos como cair do veículo na hora da correria e torcer o tornozelo ou em caso de corte ao

pegar um saco de lixo que contenha vidro. Em situações mais complicadas, o funcionário é levado ao pronto So-corro mais próximo.

por serem todos homens, na hora do aperto não tem frescura. Eles urinam perto do caminhão mesmo. Wellington, que é um dos mais novos do grupo, confessa que pensa em voltar a estudar. Curso superior? Ele pensa em ser jornalista.

Auxílio urbano - para a urbanista Ana Carolina Oliveira, essas pessoas são essenciais. “Os profissionais da área de planejamento urbano poderiam até projetar a cidade perfeita, mas onde existem pessoas, exige-se limpeza e ma-nutenção. desta forma, o trabalho deles colabora e muito para manter a quali-dade de vida nos espaços públicos”, de-clara. “infelizmente a valorização destes ainda está longe do ideal. no caso dos catadores de papel principalmente, que ainda são trabalhadores em sua maioria informais”, conclui.

São mais de cinco mil coletores distribuídos nas 53 cidades abrangidas pelo Siemaco (Sindicato dos Empre-gados em Empresas de Asseio e Con-servação e trabalhadores na Limpeza Urbana e Áreas Verdes de piracicaba), entre elas Santa Bárbara d’Oeste.

Fotos: mariana Neves

vera lúcia trabalha oito horas por dia varrendo as ruas em santa Barbara d’oeste

Page 30: Painel 72

30 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

saulo de assis

[email protected]

no amanhecer do dia já se ouve o ronco dos motores das mo-tos, apressadas para entregar

os jornais. Logo depois, começam os primeiros carros e os ônibus com o som dos escapamentos. O dia vai passando e as buzinas começam a tocar: é o trânsito que aumenta, e a paciência dos motoristas que diminui. no meio disso tudo também são ouvidas sirenes, car-ros de som, vendedores ambulantes...quando percebe-se, está formada uma orquestra, que tem como palco as ruas.

para o músico Gabriel Mialchi, nas ruas podem surgir novos tipo de me-lodias, como alguns sons de fábricas: “existem fábricas, por exemplo, em que as máquinas trabalham em ritmos sincronizados e que formam, ainda que de forma estranha e arcaica, um ritmo que soa agradável aos ouvidos. Com-binando a fatores sonoros externos, podemos até acreditar que diariamente uma nova arte nasce nesse ambiente de trabalho”.

Mialchi ressalta também que os sons de cada lugar ajudam a trazer uma identidade ao local: “na China ou Índia, por exemplo, o número de ciclistas é muito maior, o que acres-centa uma sonoridade diferenciada. Já nos EUA ou Europa, os carros são mais modernos e apresentam sons de motores diferenciados, além, é claro, dos outros tipos de sons que mudam de lugar para lugar”.

dos que se utilizam de som nas ruas para atrair consumidores, estão comerciantes, que contratam carros

de som para divulgar lojas, produtos e serviços. Entre eles, está Wagner Coutinho, comerciante de Santa Bár-bara. para Coutinho, ainda vale a pena anunciar produtos em carros de som: “percebo que tem alguns clientes que me procuram e comentam que ouviram na rua falar da loja. para mim, é um jeito barato de anunciar meu negócio e que ainda atrai clientes”, comenta.

A sonoridade das ruas também é feita por vendedores ambulantes, com seus jargões, buzinas e até músicas feitas ou apropriadas para chamar a atenção do consumidor (quem não se lembra da música do caminhão do gás, a “Für Elise”, de Beethoven?). Entre esses comerciantes, está Rita do Santos, que há 20 anos vende pipoca nas ruas de Santa Bárbara: “Quando as pessoas escutam uma buzina diferente aqui no centro, já sabem que sou eu”, ressalta.

Os sons, sejam de carros ou vende-dores ambulantes, chamam a atenção de moradores de bairros, e já estão

até presentes no cotidiano dessas pessoas. tânia Martins, moradora do Jardim Laudissi, em Santa Bárbara, não é exatamente uma fã desse tipo de comércio. “Às vezes quero descansar no fim de semana e passa um carro com um som alto que incomoda, mas eu entendo que é um ganha-pão para muitas pessoas”.

CARROS DE SOm, vENDEDORES E SIRENES FORmAm OS ELEmENTOS DA SINFONIA REGIDA DIARIAmENTE PELAS RUAS DAS CIDADES

A orquestra

motocicletas emitem um som próximo a 120 decibéis, quase o dobro do limite aceito por lei

o empresário Wagner Coutinho é um dos que utiliza carros de som para promover sua loja: “tem alguns clientes que me procuram e comentam que ouviram na rua falar da loja”

Saulo de Assis

que nunca para

Page 31: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 31

que nunca para

tânia disse ainda que prefere não ser cliente desse tipo de comerciante. “não costumo comprar nada não. Como meu bairro é meio violento, acho melhor não ficar saindo de casa, mesmo quando é alguma coisa que preciso”. Já os carros de som tiram a paciência da moradora. “A música é muito alta, incomoda, não deixa a gente fazer nada. Acho que tem jeito muito melhor de chamar a atenção e respeitar os moradores”.

Mesmo com algum receio, outras donas-de-casa, como Marjori Kori-tiaki, da Vila Grego, em Santa Bárbara, não deixa de usar desse meio para comprar algum produto ou utilizar algum serviço. “Medo eu até tenho, mas quando eu preciso de alguma coisa e escuto passando, geralmente acabo comprando ou usando o serviço, que é mais fácil para mim, que não dirijo e fico sozinha em casa”.

Marjori conta que, entre os carros de som, sempre pede para o que con-serta panelas parar quando precisa. “O

moço que conserta panela, por exem-plo, eu conheço já faz alguns anos. Ele conserta bem algumas coisas, não só panela, coisa que é difícil de achar hoje”.

Já sobre os carros de som, a dona--de-casa não se importa, desde que eles não a atrapalhem. “Eu acho que eles até podem passar, desde que não incomodem a gente a ponto de não dar para usar o telefone ou conversar com alguém sem ter que gritar”, finalizou.

Atualmente, com a expansão do comércio eletrônico, estará esse tipo de comércio com os dias contatos? para a publicitária priscila prezzotto ainda existe espaço para os ambulantes, já que, segundo ela, “muitas pessoas, especialmente em cidades pequenas, ainda compram muitos produtos desses vendedores que passam de carros e até mesmo de carroças”, ressalta.

Sobre os motivos que levam pessoas a ainda usarem esse tipo de serviço, a publicitária explica que “esse público até conhece formas mais modernas de compra, como o comércio pela inter-

net, mas prefere comprar ainda com esses vendedores por terem criado uma relação de amizade com esse tipo de profissional”.

para prisci la, mesmo com a tecnologia e a modernidade, ainda haverá espaço para esse tipo de comércio. “pode ser reduzido pela expansão da tecnologia, mas algu-mas pessoas na faixa dos 30 anos já adquiriram esse hábito, na maioria das vezes por influência de pais e avós. Acho que ainda vai existir por um bom tempo”, finaliza.

Alta demais - Carros de som, mo-tos, ônibus, sirenes etc. Os diversos sons que são emitidos todos os dias nas ruas das cidades parecem fazer parte do cotidiano. Entretanto, ao analisar o nível de ruído permitido para a audição humana não ser prejudicada, fica claro que alguns sons são muito altos para uma pessoa.

Segundo a lei de limites sonoros, feita em maio de 1996 pelo Conama (Conselho nacional de Meio-Am-biente) com base em dados da ABnt (Associação Brasileira de normas técnicas), o nível aceitável de ruídos pode chegar, no máximo, a 70 decibéis. Em hospitais, varia entre 40 e 45 e nas zonas residenciais urbanas vai de 50 a 55. As regiões centrais de cidades podem ter uma variação de 60 a 65, e áreas industriais podem oscilar de 65 até no máximo 70 decibéis.

Segundo a ABnt, buzinas de carro têm uma intensidade sonora por volta de 110 dB (decibéis), 45 a mais que o recomendado, e motocicletas emi-tem um som próximo à 120 dB. As ruas, de maneira geral, emitem uma sonoridade que oscila entre 70 e 80 dB, superior ao recomendado pela associação para áreas movimentadas, como centros de cidades.

A otorrinolaringologista Mara Gândara, da Sociedade Brasileira de Otologia, alerta que “a exposição a sons intensos, agradáveis ou não, podem trazer como efeito a perda temporária de audição, além de outros feitos como zumbidos, deterioração do reconhecimento da fala, hiperacusia (intolerância a determinados sons), dores de cabeça, nervosismo”.

Div

ulga

ção

Page 32: Painel 72

32 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

flávio hussni

[email protected]

Como em uma partida de xadrez, é preciso lógica para encontrar o destino certo nas ruas de Rio

Claro, a Cidade Azul, também conheci-da por nova York do interior paulista que, a exemplo da metrópole norte americana, tem suas ruas organizadas igual a um tabuleiro.

O município segue o padrão nova--iorquino há mais de 120 anos, mas desde os primeiros anos de sua funda-ção, os nomes das ruas eram dados pe-los próprios moradores. Os vocábulos escolhidos assinalavam, por si só, os rumos. Assim, surgiu a Rua do Carmo, a Rua do Meio, a Rua das Flores, entre outras. Quando o trajeto levava a um determinado edifício público, recebia a denominação correspondente como a Rua do Hospital, Rua da Cadeia, Rua Municipal (por ser a Rua da Câmara) e todos os nomes eram mantidos pela administração da época.

Com a expansão da malha urbana, ocorreu o surgimento de novos bairros,

RIO CLARO mAntém TRADIçãO DE mAIS DE 120 ANOS Em POSSUIR NOmENCLATURA numéricANAS vIAS

fazendo com o sistema de tabuleiro de xadrez, devido ao relevo e à distância, fosse interrompido. Até hoje continua a regra da numeração que foi acrescida de letras dos bairros onde se encon-tram: Rua 17Mp (Mãe preta), Rua 16Jn (Jardim novo).

As que cortam a cidade em diagonal ou são vias de acesso receberam nomes como Avenida Visconde do Rio claro, Avenida Ulisses Guimarães, Avenida tancredo neves, Avenida dos Estudan-tes, entre outras.

Quem acreditava que os números das ruas e avenidas de Rio Claro fosse faci-litar a vida dos moradores e de pessoas que chegam ao município se engana. Ainda existe quem não sabe chegar a al-guns locais por não entender o processo de identificação das ruas e avenidas.

Morador há mais de 40 anos, o aposentado José Maria da Silva diz en-contrar até hoje dificuldades em andar nos bairros mais afastados do centro devido que as ruas e avenidas mudam constantemente de número sem sair dela. “Entrei em uma rua e quando cheguei ao seu final a numeração era outra e acabei me perdendo no bairro.

A nova Yorkpaulistana

Page 33: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 33

Se nem os moradores daqui conseguem identificar ruas e avenidas, imaginem a situação de quem está de passagem. O pessoal fica completamente perdido, o que é uma vergo-nha”, critica Silva.

Representante comer-cial no ramo alimentício de Limeira, pedro Henrique Ferraz sempre se confunde e se perde quando vem a Rio

Claro a trabalho e acaba pedindo informações. “por mais que as ruas sejam numeradas e fáceis para decorar, as pessoas que chegam de outros mu-nicípios, como no meu caso, sempre acabam se perdendo pelos bairros, entrando em ruas e avenidas que não conhecemos”, disse.

Outro problema que foi detectado por Ferraz foi à dificuldade de nave-gação no seu equipamento de GpS instalado no automóvel, uma vez que catálogo eletrônico de logradouros não reconhece o sistema “quadra--número”.

no decorrer dos anos, os nomes iam sendo trocados segundo as deter-minações da Câmara de Vereadores,

como por exemplo: a Rua direita em 1839 era a atual Rua Seis e em 1860 figurava como a Avenida três.

Em 1845 até 1870 surgiram ruas com nomes de santos da igreja Católica dados pelos vereadores da época em prova de respeito, como as ruas São Benedito, São José e São João. de 1870 a 1881, surgiram algumas ruas com nomes de pessoas devido à homenagem que a Câmara prestava aos heróicos da Guerra do paraguai e outros brasileiros considerados importantes na história como dr. Cesar, Visconde do Rio Claro, paissandu, Riachuelo, itororó, pedro ivo e tiradentes.

no ano de 1886, os nomes das ruas foram retirados e trocados por números pela resolução da Câmara de Vereadores, composta pelo presidente Manoel pessoa de Siqueira Campos e por mais seis vereadores em uma sessão extraordinária de 20 de dezembro de 1885, quando foi aprovada por unani-midade uma indicação da presidência. Com a nova nomenclatura, criaram-se também as avenidas que seriam desta-cadas do leste para oeste e as ruas no sentido de norte e sul.

na ata daquele dia foi definido

A avenida visconde do rio Claro é uma das vias de maior fluxo da cidade

que a Estação de Estrada de Ferro da paulista seria o ponto de partida das ruas e das avenidas, sendo todas as ruas verticais a ela denominadas de “Avenidas”, com os números ímpares para as que ficarem do lado esquerdo da então Rua do Comércio, que seria a Rua Um e, números pares para as que ficarem à direita.

Já as ruas transversais foram nume-radas na ordem em que se encontravam a partir do mesmo ponto – a Estação da paulista - e receberiam a designação de “Ruas”. O mesmo sistema numérico deveria ser adotado em relação aos largos e praças, mas até hoje continuam com os antigos nomes.

Em 28 de janeiro de 1886, a Câ-mara contratou o serviço de emplaca-mento no município por números no valor de dois mil réis ($ 2.000) cada placa de ferro que era esmaltada de azul com letras e números em branco e no tamanho de 32 x 12 centímetros.

O carteiro Oreste pavan comenta que não são os números que atra-palham a entrega das cartas, e sim os nomes de pessoas, endereços e o CEp errado que as pessoas colocam. “As pessoas colocam na carta, por exemplo, rua 1 e um número que não existe, mas pela nossa experiência as vezes sabemos qual é o endereço cor-reto. Falta as pessoas acrescentarem o complemento devido” afirma pavan.

A maior dificuldade que os carteiros enfrentam são nos bairros mais afastados do centro, as casas ou têm duas nume-rações, sendo uma na avenida e outra na rua, ou quando não têm nenhuma e dificulta para localizar a casa.

desta maneira, sempre terão pessoas, tanto de Rio Claro quanto de outros mu-nicípios, que irão se confundir e acabar se perdendo, mas o ideal é que todas as vias mantenham a sinalização adequada facilitando o deslocamento das pessoas.

A numeração das ruas é uma caracte-rística de Rio Claro e por ser muito prá-tico a nomenclatura numérica, a Câmara dos Vereadores até hoje nunca pensou em discutir a possibilidade de se alterar.

Fotos: Flávio Hussni

Page 34: Painel 72

34 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

CONTURBADA RELAçãO é CONTADA POR INTEGRANTES DOS DOIS LADOS. PARA ESPECIALISTAS, ExISTE SOLUçãO

CiClistAs e motoristAs

Campo de batalha entreCiClistAs e motoristAs

Campo de batalha entre

Page 35: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 35

luiz feliPe leite

[email protected]

Um combate urbano. Assim é definida a relação entre ciclistas e condutores de automóveis por

integrantes dos dois lados da batalha. As ruas das cidades de todo o país passaram de espaço comum a todos os meios de locomoção terrestres para um campo de guerra, onde o individualismo supera o bem coletivo. Existem várias propostas para solucionar este problema, cuja maio-ria delas tem algo em comum: a educação.

Para o taxista Daniel Spada Carrara, os conflitos no trânsito são comuns. O mesmo diz o jornalista Eduardo Guidini. Eles utilizam o carro diariamente para trabalhar. A opinião dos motoristas é seguida por dois ciclistas. A estudante Maria Camilla Lourenço afirma que não existe respeito entre as partes. Já o aposentado Germano Fossalussa defende mais precaução de todos os envolvidos no trânsito.

A opinião de especialistas também é parte desta reportagem. Os benefícios da bicicleta como meio de transporte são defendidos pelo professor de educação física da Unimep, Osvaldo Luiz Terezoni, enquanto o presidente da Federação Pau-lista de Mountain Bike Clayton Paloma-res diz que a única maneira de haver uma convivência sadia entre bicicletas e carros é por meio de infraestrutura de qualidade, de políticas preventivas e fiscalização ostensiva por parte do governo.

Há um ano agindo como taxista em Piracicaba (SP), Carrara vem de uma família de profissionais que atuam nas ruas, herdando a função do pai e do avô. “Acontecem vários problemas relacionados à estrutura das ruas. Mas um acidente só acontece quando uma das partes, seja motorista ou ciclista, fica desatenta”, explica.

Ainda segundo o taxista, o humor influencia muito o trânsito, pois uma crise pode afetar o desempenho dos mo-toristas e ciclistas nas ruas. “Se você está estressado, seja para chegar mais rápido a um destino ou por outro motivo, tende a ir mais rápido. Não podemos deixar

nossas emoções nos controlarem quando estamos na rua”, observa o taxista.

A função de um repórter é contar as histórias que acontecem por aí. Para isso, existe a necessidade de ele se locomover entre um ponto e outro da cidade. Às vezes, em várias ocasiões durante o dia, de carro. Esta é a realidade do jornalista Eduardo Guidini, repórter da EPTV em Piracicaba. “É difícil, pois precisamos estar o mais rápido possível nos locais onde os fatos acontecem”, diz.

Também conforme Guidini, muitos ciclistas trafegam em locais onde não deveriam, assim como muitos motoristas cometem ‘barbeiragens’ no trânsito. “As pessoas teêm que ser mais conscientes. As cidades em geral são complicadas. Falta mais educação para os motoristas e ciclistas”, afirma o jornalista.

Usando a bicicleta como meio de transporte há quase 70 anos, o aposen-tado Germano Fossalussa se acostumou com o ritmo da disputa com os veículos. Sem medo, o ex-funcionário da Central Elétrica Rioclarense usa o mesmo modelo há mais de três décadas. “Vou da minha casa ao centro, e de lá faço uma volta pela cidade. É uma boa aventura”, explica.

Seu Germano, como é conhecido nas ruas de Rio Claro (SP), nunca dirigiu. Sequer tentou adquirir uma carteira de habilitação. E ele não sente falta. “Gosto de andar de bicicleta, mas não posso ignorar o perigo ao qual estou correndo. Existe abuso de ambos os lados, tanto dos ciclistas quanto dos motoristas”, disse o aposentado.

A universitária Maria Camilla Lou-renço tem um tempo menor de ciclista em relação à Germano Fossalussa. Porém a estudante de Publicidade e Propaganda da Unimep utiliza a bicicleta como meio de transporte entre a sua casa e seu trabalho. “São quase três quilômetros. O trajeto fica mais longo, pois existem muitas subidas e descidas”, afirma.

Ainda segundo Maria Camilla, os conflitos entre as partes são constantes, com abusos tanto do lado dos ciclistas qaunto dos motoristas. “Na minha cidade, Rio Claro, existem ciclo faixas e já vi carros e motos utilizando-as. Assim como FP

mTB

– F

eder

ação

Pau

lista

de

mou

ntai

n Bi

ke

morrem no mundo cerca de 1,2 milhão de pessoas por ano em consequência dos

acidentes de trânsito

Luiz

Fel

ipe

Leite

Page 36: Painel 72

36 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

Em 2012, cerca de 40 milhões de automóveis trafegam nas ruas de todo o País, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Já a quantidade de ciclistas é razoavelmente menor. Da-dos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que apenas 7% da população brasileira (13,3 milhões) uti-liza a bicicleta como meio de transporte.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), morrem no mundo cerca de 1,2 milhão de pessoas por ano em con-sequência dos acidentes de trânsito. No Brasil, esta é a segunda principal causa de mortes, depois dos homicídios, entre pessoas do sexo masculino, com idades de 15 a 34 anos.

Para o presidente da Federação

vejo ciclistas irresponsáveis costurando no trânsito e desrespeitando as leis”, pontuou a universitária.

O uso da bicicleta como veículo de transporte é incentivado pelo professor Osvaldo Luiz Terezoni. Acadêmico da Unimep e da Esalq/USP, o uso da bicicle-ta precisa ser focada, em detrimento dos carros. Tudo por uma questão de saúde. “Usar bicicleta ajuda na questão cardio-vascular, resistência muscular, pulmonar, entre outras”, lembra.

Ainda segundo Terezoni, o uso do car-ro como transporte por um tempo extenso pode acarretar dificuldades físicas à longo prazo. “As articulações nas pernas e bra-ços podem ser afetadas, prejudicando a pessoa”, salienta o professor.

Soluções - Infraestrutura de qualida-de, políticas educacionais para prevenção e fiscalização ostensiva por parte do go-verno. Estes três tópicos são defendidos por Clayton Palomares, da Federação Paulista de Mountain Bike, como fun-damentais para solucionar o conflito entre ciclistas e motoristas. Desde que sejam aplicados de maneira paralela. “Se existem falhas, nas ruas em termos de estrutura, precisamos resolver, seja alargando as ruas ou outras intervenções urbanas. É preciso fazer política de trans-porte para pessoas, e não para veículos”, pontua Palomares.

Também segundo ele, em relação a educação, é preciso realizar campanhas de prevenção. “Em Rio Claro, a Fede-ração Paulista faz aulas com crianças, ensinando a respeitar as leis de trânsito. A conscientização precisa ser criada e incentivada desde cedo”, defende.

Citado por Palomares durante a en-trevista, um caso recente de campanha de educação no trânsito aconteceu em Brasília, conforme aponta o trabalho de conclusão de curso apresentado por Josivânia Ferreira dos Santos, na Uni-versidade de Brasília (UnB). No final da década de 1990, a capital do Brasil era a cidade conhecida por ser uma das mais violentas de todo o País, por acontecerem muitas mortes no trânsito. O número de atropelamentos na época representava respectivamente 49,8 e 47,3% da quantidade total de acidentes com morte no Distrito Federal. As pistas largas de Brasília favoreciam o abuso de

velocidade e dificultavam a travessia dos pedestres nas ruas.

Em 25 de julho de 1995, o governo do Distrito Federal criou o Programa de Segurança para o Trânsito, tendo como objetivo reduzir substancialmente os aci-dentes de trânsito no DF. Os princípios do programa consistiam em ações, dentre as quais se destacavam: coibir o excesso de velocidade, controlar o consumo de be-bidas alcoólicas, fazer cumprir as regras de trânsito, intensificar a educação no trânsito, melhorar as condições da malha viária, melhorar o atendimento médico no trânsito, manter o veículo em condições de segurança, normalizar o acompanha-mento estatístico no trânsito, priorizar a circulação de pedestres, ciclistas e do transporte coletivos nas vias urbanas.

Após o período de medidas, o De-tran solicitou uma pesquisa do instituto VoxPopuli, em dezembro de 1998, para avaliar a opinião da população a respei-to das mudanças no trânsito: 74% dos entrevistados afirmaram que a violência no trânsito de Brasília havia diminuído; 13% que continuou a mesma, 11% que aumentou e 2% que não sabiam ou não responderam.

O último quesito defendido por Clayton Palomares como fundamental para o conflito entre ciclistas e motoristas ser resolvido é uma fiscalização ostensiva por parte do Estado . “O poder público precisa ser firme nesta hora. Este conflito

A educação no trânsito é a saída para resolver o conflito entre motoristas e ciclistas

Fotos: FPmTB – Federação Paulista de mountain Bike

7% da populaçã o usa a bicicleta

Page 37: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 37

Paulista de Mountain Bike, diretor admi-nistrativo da Confederação Brasileira de Mountain Bike (CBMTB) e membro do Programa Bicicleta Brasil (PBB) do Mi-nistério das Cidades, Clayton Palomares, a atual situação no trânsito das cidades brasileiras é complicada, descrevendo-a como caótica. “As pessoas se sentem do-nas do espaço público tanto os ciclistas quanto os motoristas”, define.

Ainda segundo o diretor da CBMTB, falta respeito entre as partes e existe a necessidade de todos os personagens das ruas aprenderem a dividir o espaço urbano. “Não existe uma fórmula mági-ca, mas a possibilidade de aprendermos com modelos que deram certo em outros países”, explica.

7% da populaçã o usa a bicicleta

Apesar de disputarem o mesmo espaço nas ruas, o carro e a bicicleta nasceram no século xix, na Europa. Ambos evoluíram com o tempo, tor-nando-se os veículos mais conhecidos em todo o mundo.

A primeira bicicleta a possuir um sistema com corrente ligada às rodas foi projetada por H.J.Lawson, em 1874. Seu terceiro modelo, a “Bicyclette”, foi desenhado em 1879. Este veículo possuía maior estabilidade e segurança em relação ao anterior. Quatro anos depois, o inventor inglês John Kemp Starley projetou uma bi-cicleta semelhante as atuais. possuía

Eles nasceram no século XIXguidão, rodas de borracha, quadro, pedais e correntes. O veículo chegou ao Brasil em 1898.

Já o carro foi criado em 1886, na Alemanha, pelo inventor Karl Benz. O alemão, fundador da empresa Mercedes-Benz e considerado o pai do automóvel, introduziu o uso do motor de combustão interna a gasolina. Foi aí que foi considerada a viabilidade de um veículo que oferecesse condições maiores de comodidade, segurança e rapidez. O automóvel chegou ao Brasil cinco anos depois, importado por Al-berto Santos dumont, posteriormente conhecido como o pai da aviação.

consciente do cidadão, com atitudes e comportamentos de respeito consigo mesmo e com o próximo.

O Centro é direcionado para crianças de 5 a 11 anos de idade, que cursam do Jardim II ao 5º ano do ensino fundamen-tal. As aulas teóricas têm contexto de acordo com a faixa etária e trabalha temas como: sinalização, meios de transportes, segurança (uso obrigatório do cinto) e valorização e respeito à vida. A orientação sobre segurança no trânsito acontece com palestras, cartazes, fantoches, músicas, vídeos e aulas práticas de palestras.

Na parte prática, acompanhados de motoristas/monitores, os alunos partici-pam na minicidade de passeio (na con-dição de passageiros) nos minibugues e de caminhada de pedestre. No local tem uma minipista, com todas as sinalizações, placas indicativas e informativas, semá-foros e faixas de segurança.

Já em Santa Bárbara d´Oeste existe o programa Cidade Mirim, que busca ensinar as crianças a compreender as regras do trânsito. O município alega também desenvolver palestras com foco na educação para o trânsito. Além da Cidade Mirim, Santa Bárbara oferece aos alunos do ensino fundamental a disciplina de Educação para o Trânsito. Por meio de um convênio com a conces-sionária AutoBan, os alunos têm, uma vez por semana, aulas que conscientizam sobre a cidadania e respeito no trânsito. Também são promovidas blitz educativas no trânsito, com a distribuição de folhetos e orientações sobre segurança.

não é questão de disputa de egos, entre mo-toristas e ciclistas, mas sim de segurança pública. Vidas estão em jogo”, completa.

Algumas cidades da região também possuem programas educacionais para prevenção de mortes no trânsito. Em Piracicaba existe o Ciet (Centro Infantil para Educação no Trânsito), criado em setembro de 1996. O lugar desenvolve atividades de conscientização e humani-zação sobre as leis de trânsito, por meio de aulas teóricas e práticas.

Segundo informações oficiais dis-ponibilizadas no site da entidade, o Ciet visa desenvolver a importante tarefa de conduzir a nova geração para a formação

os especialistas defendem o uso da bicicleta como meio de transporte saudável

Luiz Felipe Leite

Page 38: Painel 72

38 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

flavia RibeiRo

[email protected]

“A nina apareceu no portão de casa, fiquei com dó da cari-nha dela pedindo um lar”,

conta o estudante de filosofia da Uni-mep Alexandre diniz, que recolheu três cachorros que apareceram no portão de sua casa. “Eu os adotei, pois não conse-guiria vê-los na rua passando fome, frio e sem um lar”, completa diniz que além da nina, adotou July e dog.

Em piracicaba, foram 117 casos de solicitação de recolhimento de animais realizados entre janeiro e março deste ano e 42 atendimentos a animais co-munitários. Ao todo, 49 animais foram doados segundo dados do site do canil de piracicaba, coordenado pelo Centro de Controle de Zoonoses.

Segundo Silvia turolla, advogada voluntária na OnG Vira Lata Vira Vida, não há mais condições para tirar animais da rua porque a maioria das instalações está lotada ou porque a solução não é abrigar o animal. “A Ong Vira Lata Vira Vida foi criada para

QUEm ADOTA Um ANImAL QUE FOI ABANDONADO PODE SE SURPREENDER COm O CARINHO RETRIBUíDO

zelar pela vida de aproximadamente 400 animais que viviam num abrigo particular na cidade de piracicaba. nossa meta é reduzir e limitar o nú-mero de abrigados para 200 e, assim abrir vaga para outros cães necessita-dos”, explica.

Após o cão ser retirado das ruas e levado ao abrigo, ele deve passar por uma quarentena, separado dos outros animais, para exames e tratamentos. nesse tempo ele passa por vacinações, castração, acompanhamento veteri-nário e após todo o procedimento é posto junto aos outros animais, mas é sempre necessário maior cuidado para que os demais não estranhem o novato na matilha. Silva esclarece que os animais podem permanecer num abri-go por tempo indeterminado. “tem animais idosos que ali nasceram. temos casos de ani-mais com 10 anos de abrigo que foram adotados, outros que fo-ram adotados ainda bebês. Uma vez que são abrigados pela OnG, ali permanecem até sua adoção”.

Adotou?

veterinário.leve ao

dog: Antes cão de rua,

hoje tem um lar

Alex

andr

e Di

niz

Page 39: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 39

Casos de maus tra-tos a animais domésticos, por outro lado, tornou-se frequente nos noticiários, como aconteceu com o cão Lobo, no dia 02 de novembro, em piraci-caba. O cão foi arras-

tado por cerca de um quilometro ao cair da caçamba da ca-minhonete dirigida

pelo próprio dono e abandonado no local

do acidente, resultando na morte do animal 14 dias

depois. O caso provocou comoção po-pular e foi levado a jurisdição. Segundo o Código penal, a pessoa que maltrata um animal doméstico, exótico ou silvestre, além da pena administrativa pode sofrer ação de natureza penal, prevista na lei 9.605/98, a Lei dos Crimes Ambientais.

de acordo com o site do Centro de Controle de Zoonoses, em pi-

racicaba foram atendidos até o mês de março 74 casos de maus tratos a animais. Segundo o ad-vogado Juliano Lago, “trata-se, infelizmente, de um crime de menor potencial ofensivo, por-tanto, sujeito aos benefícios da lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), que prevê a punição do agente com pena privativa de liberdade, ou seja, prisão”.

Alexandre diniz com dog e july

superlotação em ongs traz incentivo a adoção de cães para diminuir número de abandonos

Silvia Turolla

Alex

andr

e D

iniz

Page 40: Painel 72

40 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

gas e carrapatos. “Quando peguei a mais nova, nyna, ela estava infestada de carrapatos e alguns dias depois, desenvolveu Cinomose (doença con-tagiosa que atrofia os movimentos do animal). tive que criar um cercado para ela, além da compra de remé-dios”, lembra.

de acordo com informações do Centro de Controle de Zoonoses de piracicaba, na cidade foram realizadas

até o mês de março deste ano 311 castrações, 89 doses da vacina V10 e quádrupla felina.

Após o recolhimento de um animal de rua, deve-se tomar o cuidado de levá-lo ao veterinário para as devidas vacinas e exames para evitar compli-cações, tanto para a família que está adotando o animal quanto para ele próprio.

Com os animais que estão na rua, deve-se sempre tomar cuidado. Ainda segundo Zanfelício, estes animais estão mais expostos a doenças devido à falta de vacinação, vermifugação e de uma alimentação adequada. As fêmeas que não são castradas também enfrentam problemas durante o período do cio, pois acasalam com diversos machos diferentes e podem pegar uma doença transmitida durante o coito, fora as brigas dos machos que, por vezes, aca-bam em morte. Em casos de ataque, o cidadão deve procurar imediatamente ajuda médica. “Quando um animal de rua ataca uma pessoa, ela deve tentar manter o animal preso e entrar em con-tato com a zoonoses da cidade, além de procurar um posto de saúde para que a desinfecção do local seja feita e iniciar o protocolo de vacinas contra a raiva”, explica a veterinária Luciana Zanfelício.

Mas, maus tratos aos animais não é apenas judiar deles. A falta de cuida-dos básicos de higiene, alimentação e saúde também configura crime contra animais. É necessário dar banho, levar ao veterinário e, principalmente, dar muito carinho para o animal de esti-mação. para Alexandre diniz, o animal que é adotado é mais carinhoso e dócil. “Eu já tive uma cachorra comprada e essa era brava! Os cachorros adotados percebem que você os salvou da rua e lhes deu um lar. Eles gostam de brincar e ficar no colo. São obedientes quando necessário e retribuem todo carinho que recebem”, conta.

A veterinária Luciana Zanfelício, da OnG Vira Lata Vira Vida, alerta que a ausência de cuidados essências pode acarretar doenças graves. As principais doenças que um animal de rua pode manifestar é Sarna Sarcópti-ca e verminoses no geral. “deve -se to-mar cuidado com tVt (tumor Vené-reo transmitido), leptospirose, raiva, brucelose canina, tétano, tuberculose e hepatite, que podem ser transmitidas por cães e animais silvestres”, ensina.

Alexandre diniz lembra que, assim que os recolheu, levou-os ao veteriná-rio para checar se não havia nenhuma doença, tomar as vacinas necessárias e principalmente cuidados com pul-

Animais ficam felizes com carinho que recebem de pessoas que os tratam na rua

Fálvia Ribeiro

Silv

ia T

urol

la

Cães em ong à espera de adoção

Page 41: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 41

antonio CoRazza

[email protected]

não é só da arte clássica que resulta o belo. Mãos sobrepostas e en-trelaçadas, dedos que expressam

simbologias e se ligam uns aos outros como poderia também inspirar o dedo de deus tocando o homem nos afrescos de Michelangelo na Capela Sistina, do século xVi. A ligação, desta vez, não representa o homem como um ser divino, mas como aquele que, no século xxi, quebra tanto as barreiras físicas quanto as de comunicação, como no grafite de Eduardo Falcão, um dos escolhidos do Call Parade – evento idealizado pela toptrands junto da telefonica|Vivo em que orelhões foram transformados em obra de arte e integraram parte do cartão postal da cidade de São paulo. Os projetos selecionados foram para as ruas paulistas entre 20 de maio e 24 de junho.

O vALOR ARTíSTICO DO GRAFIFE é INCONTESTAvEL NA SOCIEDADE CONTEmPORâNEA E, DE CERTO, CONTINUARá A ExISTIR POR mUITO TEmPO

galeriaa céu aberto

grafite não é usado apenas para expor um sentimento. As ruas também são usadas como telas para quadros

Tony

Cor

azza

Page 42: Painel 72

42 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

E é da arte urbana que, em sua essência, remete às revoltas sociais, surge um quadro tão poético quanto e parece que isto está fazendo com que as pessoas mudem de ideia em relação ao valor do grafite enquanto arte. Reconhecendo o valor estético desse trabalho, a presidente dilma Rousseff sancionou a Lei 12.408, que descriminaliza o ato de grafitar e trata da proibição de comercialização de tintas sprays para menores de 18 anos. porém, caso o grafiteiro pego em flagrante não tiver autorização do proprietário do local pode levar pena de três meses a um ano. daí vem a polemica: grafite e pichação é arte ou depredação?

A pichação em outros países não se difere do grafite, pois elas ajudam a criar tipografias, letras e novos estilos de assinaturas, mas no Brasil, geralmente ao se usar o verbo pichar automaticamente liga-se à depreciação de patrimônio público/privado e, por isso, não é muito apoiado entre os grafiteiros. “A pichação é incontrolável e uma consequência das ideologias di-ferentes e revoltas sociais”, completa o estudante de psicologia danilo Ferrari.

Muitos acreditam que o grafite faz parte da arte contemporânea, mas o que poucos imaginam é que desde os primórdios do homem a parede era usada para a arte, para expressar o sentimento em relação aos deuses, como visto nas pinturas rupestres em todo mundo; do mesmo jeito que é usada para expressar-se em relação aos políticos e a sociedade hoje. “O grafite moderno começa em grandes centros urbanos como uma forma de expres-são. Artistas como Basquiat foram bastante importante para a história da arte, que também utilizaram do grafite como arte. Ao contrário da pichação que considero uma revolta sem causa. Sem grande expressão artística. O gra-fite realmente não é feito para quatro paredes. Ele tem todo um fundamento urbano, este é o problema dele como arte dentro de casa, pois perde o sen-tido”, diz o crítico e professor de arte Fernando Furquim de Campos.

Quando se conversa sobre grafite, muitas pessoas encaram como depre-dação do espaço público e pichação.

Mas a história não é exatamente essa, diz o grafiteiro Eduardo Falcão. “Gra-fite não é poluição visual, é como uma licença poética. nós usamos a rua para discutir e expressar uma ideia. não a venda de um produto ou serviço, mas algo que faça refletir,” pondera.

Grafite também pode expressar mensagens políticas e sociais, tudo por meio de um spray de tinta. dentro da cultura hip-hop, a arte evoluiu para-lelamente aos b-boying, rap e outros elementos da cultura musical ameri-cana. O grafite também é comum nas gangues urbanas que usam sua própria forma de escrita para marcar território ou para servir como um indicador do território pertencente ao grupo. “Grafite está na rua e a rua é onde as pessoas estão sendo o principal meio de comunicação. Cada grafiteiro e artista passam seu próprio sentimento. não é algo de reprodução em massa,” retruca Falcão.

Há estabelecimentos que contratam artistas para fazer a pintura externa do local para “valorizar a imagem e chamar a atenção”, assim como no muro do Cemitério da Saudade, em

Page 43: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 43

piracicaba. A prefeitura de piracicaba contratou vários artistas para a deco-ração do muro externo do local, que se tornou um ponto de atração para as pessoas que passaram a apreciar os desenhos ligados à cultura piracicaba-na. “Achei uma iniciativa muito boa da prefeitura e dos artistas colaborarem, e foi muito bom podermos estar em contato, trocando experiências, apren-dendo e se conhecendo melhor, já que nosso trabalho é individual, cada um no seu Studio,” completa Renata Andia Amalfi, um dos artistas que participa-ram da pintura do muro.

Ela explica que devido a esse pro-jeto, a prefeitura resolveu que todo o muro do cemitério irá ser tombado, o que é gratificante saber que sua arte es-tará conservada para sempre no local.

Mas se comparar grafite com quadros e esculturas que dependendo do artista valorizam dia após dia, a grafite pode se valorizar? na opinião de Carlos Almeida, sócio de uma ga-leria de arte na cidade de São paulo, “é muito difícil comercializar e colocar preço num grafite. O grafite é feito para rua e como uma forma de se expressar. pedir para alguém grafitar sua casa é estranho, pois o que você vai pedir para grafitar é muito particular e, caso mude da sua casa, a parede fica junto com ela. não acho que um grafite possa valorizar um imóvel, pelo contrário, pode des-valorizar caso seja necessário uma nova pintura”.

O grafiteiro não é um depreciador do espaço publico. Ele é um artista como qualquer outro, mas que usa do espaço público para ‘publicar’ sua arte. “Os grafiteiros estão respeitando muito o muro do cemitério, pois, arte é arte e acho que apesar de não entender muito sobre grafite, existem pessoas sérias e que fazem um bom trabalho”, completa Andia.

Um exemplo claro de valorização do grafite foram os pedaços restantes do antigo muro de Berlim, o qual ambos os lados (ocidental e oriental) foram pintados, com a leve diferença do lado ocidental ser colorido e do oriental preto e branco. Estes pedaços que hoje sabemos que são de artistas conhecidos como thierry noir e Keith Haring são vendidos por um preço muito alto e muito maior que um simples pedaço sem nada.

O grafite é uma forma de arte em rápido desenvolvimento enquanto também sujeito à proteção da própria lei que permite artistas com autoriza-ção a grafitarem locais públicos e cujo

valor é altamente contestado por críticos e marchands. É odiado

e ao mesmo tempo amado por muitas autoridades do

meio artístico.

Prefeitura piracicabana contrata artistas para a decoração muro de cemitério como forma de “valorização” do local; a esq., o grafite como meio de expressão politica e social. A voz do grafiteiro como a voz da rua; à dir., eduardo falcão na produção de seu orelhão para o Call parade

Fotos: Tony Corazza

Page 44: Painel 72

44 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

valéRia sPinelli [email protected]

O costume de sentar numa cal-çada em um fim de tarde não é mais comum em cidades

conurbadas, mas nos pequenos mu-nicípios essa cultura permanece. Os moradores se encontram para conver-sar, compartilhar momentos ou apenas passar algumas horas em companhia dos vizinhos, apenas para descontrair. As ruas dos bairros de Cordeirópolis são exemplos dessa tradição pela tranquilidade própria do município, permitindo que as pessoas andem pelas calçadas sem medo.

A cidade tem aproximadamente 19 mil habitantes, número insuficiente para lotar o estádio Barão de Serra negra de piracicaba, com capacidade para 26 mil pessoas. Mas cresce rapi-damente com a chegada de indústrias, sem perder características peculiares de uma província. Uma delas é a cultura de ‘sentar na calçada’. São adultos, jovens e idosos que aproveitam a calmaria das ruas para encontrar os amigos. Eles le-vam cadeiras, bancos ou simplesmente se sentam no chão e por lá ficam horas a fio, sempre após às 18hs.

Em Cordeirópolis, é comum os mo-radores se conhecerem pela ausência de um shopping, cinema e outras op-ções de lazer. Carla Marim, de apenas 21 anos, gosta de chegar em casa de-pois do trabalho e sentar com o grupo de amigas para bater papo, a fim de aproveitar o tempo de folga. “trabalho o dia inteiro em uma sala fechada, sem ver a luz do dia, sem saber se tem sol ou chove. Então, quando saio no fim da tarde, aproveito para sentar na calçada, vendo o tempo passar antes de correr para a faculdade”, afirma. Carla mora com a avó e o tio, e foi com eles que começou a apreciar o costume de ficar na calçada conversando.

para a aposentada Rosa Celote sentar na calçada com suas netas é um

A calçada como espaço de socializaçãomORADORES DE CORDEIRóPOLIS mAntém A TRADIçãO DE LEvAR CADEIRAS PARA AS RUAS, ONDE FICAm HORAS A FIO CONvERSANDO COm OS vIzINHOS

no Bairro vila Barbosa, em um domingo a tarde as vizinh as aproveitavam o belo dia de sol para conversar.

Para esses dois homens, o bate papo acontece mesmo em pé. já era um encontro mais rápido, sem muitos assuntos a conversar, mas mesmo assim a calçado foi o espaço para falar das novidades

Page 45: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 45

momento ímpar. Com a vida agitada das duas netas adolescentes, quando esse encontro acontece é hora de colocar o papo em dia. “Criei cinco filhos e participei por um bom tempo

na criação das minhas netas. Agora que elas seguiram outros caminhos, tenho que aproveitar o pouco tempo que tenho. Com essa idade, não consigo sair, então o que posso fazer é colocar a cadeira na calçada e conversar muito com elas”, relata.

no bairro Jardim progresso, o mo-vimento de crianças brincando na rua é intenso. Uma maneira encontrada pe-las mães para ficarem perto dos filhos foi ‘sentar na calçada’. Rosa daroz tem um filho de 15 anos que fica todos os dias, depois da escola, jogando futebol em frente à sua casa. Mas a mãe não se sente totalmente segura. “É uma rua movimentada, passam muitos carros e alguns em alta velocidade. Então tenho medo de acontecer um acidente. Fico vigiando e ao mesmo tempo passo o tempo conversando com as minhas vizinhas”, comenta.

Tradição – A cultura de se relacio-nar com as pessoas no espaço público passa pela colonização do Brasil. O historiador José Adinan Hortolan faz a analogia com o fato de portugal ser um país mediterrâneo, onde as relações so-ciais são mais abertas e as pessoas têm

mais contatos umas com as outras. “As influências africana e indígena também pesam da mesma forma que o processo de imigração italiano e espanhol que são dois países mediterrâneos”, frisa.

Morador em Cordeirópolis, Horto-lan historiciza a moradia brasileira com a existência da casa grande, da senzala ou das colônias dos imigrantes, casas coletivas onde moravam pais, filhos, tios, avós, primos ou pessoas sem parentesco, “Com isso, não havia muito espaço para individualidade e para a família, facili-tando a integração com outras pessoas, inclusive os vizinhos”, compara.

A história de Cordeirópolis é marcada pelas tradições italianas, pela imigração que ajudou a formar o município. Como a cidade não cresceu, isso ajudou a permanência dessa ten-dência: uma cidade pacata onde todos se conhecem.

Mas os moradores de Cordeirópo-lis têm muito com o que se preocupar, na opinião do delegado da cidade Willian Marchi. “Se comparada à situação da violência há alguns anos o resultado é triste, porque cresceu junto com o desenvolvimento da cidade”, avalia. porém, aponta, se relacionada a Rio Claro, uma das cidades com maior número de homicídios da região, segundo a Secretaria Estadual de Segu-rança pública, Cordeirópolis oferece segurança aos seus moradores. “Os números são excelentes. não temos crimes com violência à pessoa, como homicídios, estupros e latrocínios. Os crimes registrados como mais graves foram furtos em estabelecimentos comerciais, residências e cargas, mas todos sem vítimas”, explica.

Marchi atenta, porém, ao problema de usuários de drogas que furtam para sustentarem os vícios. “Em alguns bairros, como Jardim Eldorado e Jardim Cordei-ro, além da região central da antiga esta-ção, ocorrem índices elevados de crimes no ambiente doméstico, decorrentes da desestruturação familiar”, conclui.

Fotos: valéria Spinelli

em um dia de inverno muitas pessoas procuram o sol para se esquentar. A família killer de Cordeirópolis não fez diferente. Após um almoço de família, todos aproveitavam o restante do tempo juntos

A calçada como espaço de socialização

no Bairro vila Barbosa, em um domingo a tarde as vizinh as aproveitavam o belo dia de sol para conversar.

Page 46: Painel 72

ArtIgo

46 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

isRael aPaReCido Gonçalves *[email protected]

A rua é mais que um trajeto, que liga um lugar ao outro. Ela é um lugar de socialização, interação, contestação e de lazer das crianças e dos adul-

tos, que pode servir como um espaço para encontros, namoros, consumo de produtos e moradia. na rua, a violência urbana, as manifestações culturais e religiosas se expressam. por meio dela, também é possível ver as diversas relações sociais existentes em uma cidade (SpOSitO, 1993).

na história da humanidade, a rua, ou melhor, a trilha já foi motivo de muito medo. Em um breve re-sumo, pode-se dizer que no período da pré-História, o homem primitivo era nômade; na idade Média, a rua era um lugar de perigo, estrangeiros e bandoleiros eram as ameaças daqueles que arriscavam suas vidas pelos caminhos entre um feudo e outro (dUBY, 1999).

no ano passado, houve um grande exemplo de como a rua pode ser um lugar de excelência na crítica social. Esse movimento ficou conhecido como primave-ra Árabe. Os cidadãos anônimos de vários países árabes saíram às ruas, com bandeiras, carros e um pensamen-to: mudar a estrutura política do seu país. As mídias impressa, televisiva e on-line não foram omissas, pois mostraram os jovens nas ruas criticando o governo. também mostraram as atrocidades cometidas pelo Estado em resposta a essas manifestações.

Esses movimentos acabaram por depor três dita-dores. na tunísia, houve a queda de Zine El Abdique Ben Ali (há 25 anos no poder). no Egito, caiu Hosni Mubarak (há 30 anos no poder). Já na Líbia, após uma guerra civil, foi destituído e morto o ditador Muamar Kadafi (há 42 anos no poder). na continuidade do movimento, este ano também se iniciou com indivíduos anônimos nas ruas, mas agora o alvo é a Síria, hoje em uma guerra civil (SAntORO, 2011).

Constata-se que a atual crise na zona do Euro tam-bém levou vários manifestantes às ruas, com destaque para a Grécia. neste país, os trabalhadores ocuparam as ruas e praças literalmente. Muitos cidadãos gregos perderam tudo, até a casa, ou seja, a rua se tornou um lugar para se viver. na Espanha, o movimento “Os

indignados” ficou por dias nas ruas, protestando contra a política econômica do governo (RiCARdO & ALE-GRiA, 2011). no continente americano, o movimento “Ocupe Wall Street,” em nova York (EUA), fez uma crítica velada à onda neoliberal e a política econômica do presidente Barack Obama. Esses movimentos de-monstram que é na rua que mostramos como o Estado é omisso com sua população.

A história social e política do Brasil também pode ser vista pela perspectiva da rua. Há vários exemplos do uso da rua como uma forma de crítica social. no início do século xx, o movimento de maior proporção foi a greve de 1917, em que cerca de 50 mil trabalhadores saíram às ruas para protestar contra a opressão dos patrões. Outro marco é a passeata dos cem mil, realizada em 25 de junho de 1964, contra o Regime Militar. A passeata ocorreu na região da Cinelândia, na cidade do Rio de Janeiro (tEixEiRA, 2008). Com a redemocratização, em 1985, a rua torna-se um palco para reivindicar no-vos direitos, como a união civil entre homossexuais e movimentos em prol do meio ambiente.

diante de tudo isso é possível afirmar que a rua pode ser analisada como um meio de entender o processo histórico e de compreender a dinâmica das relações sociais na atualidade. A rua é uma conquista da socie-dade moderna e será o cenário de muitos movimentos, se houver consciência de cada um em relação ao poder que essas “manifestações” exercem perante uma nação.

Referências Bibliográficas

RiCARdO, José; ALEGRiA, Felipe. A Europa no epicentro da crise. Disponível em < http://www.pstu.org.br/internacional_materia.asp?id=13919&ida=0> Acessado em 20/05/2011.

dUBY, Georges. Ano 1000, ano 2000. na pista de nossos medos. São paulo: Editora UnESp, 1999.

SpOSitO, Marília pontes. A sociabilidade juvenil e a rua: novos conflitos e ação coletiva na cidade. Tempo Social; Rev. Sociol. USp, S. paulo, 5(1-2): 161-178, 1993

SAntORO, Maurício. As revoltas árabes e a democratização do Magreb e do oriente médio. Revista Ética e Filosofia Política – Nº 13 – Volume 2 – Junho de 2011

tEixEiRA, Evandro. 1968 Destinos 2008: passeata dos 100 mil. Ed. textual, 2008

* israel Aparecido gonçalves é graduado em história, especialista em sociologia (UFPR) e mestre em ciência política (UFSCar). é professor na rede particular do ensino médio e superior na área da sociologia, da história e de trabalho de conclusão de curso (TCC).

RUA COmO LUGAR DE CRíTICA SOCIAL

Page 47: Painel 72

PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012 4740 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Janeiro/2012

Acesse nossos sites:

JORNALISMO

31 anos de ensino de qualidade

Conceito 4 no Enade/MEC

3 mil metros quadrados de laboratórios

4 estrelas no Guia do Estudante em 2011, 2010 e 2009

Curso Premiado na Semana Estado de Jornalismo e Expocom

Convênios, parcerias e estágios em empresas de comunicação da região

Programas de Intercâmbio Internacional

Produção em jornal impresso, revista, rádio, televisão e internet

Informações: (19) 3124.1676

unimep.br/jornalismo

soureporter.com.br

jornalunimep.blogspot.com

É NA UNIMEP

Page 48: Painel 72

48 PAINEL CIÊNCIA & CULTURA • Junho/2012

Nº 72 Junho/2012

Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas

Muitas vezes, elas passam despercebidas pela população; enfrentam chuva e sol e encaram uma rotina pesada para que as ruas fiquem limpas

da Limpeza

AsMULHERES

da Limpeza

AsMULHERES