Pacta (8ª EDIÇÃO)

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TAMBÉM NESTA EDIÇÃO Os protestos na Turquia Sino / Myanmar Relations Amidst Political Changes in Myanmar EDIÇÃO Nº8 // DEZEMBRO 2013 GLOBALIZAÇÃO ENTREVISTA COM NELSON AMBROGIO, CEO DA BAYER PORTUGAL

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1

TAMBÉM NESTA EDIÇÃO

Os protestos na Turquia

Sino / Myanmar Relations Amidst Political

Changes in Myanmar

EDIÇÃO Nº8 // DEZEMBRO 2013

GLOBALIZAÇÃO ENTREVISTA COM NELSON AMBROGIO,

CEO DA BAYER PORTUGAL

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2

FICHA

TÉCNICA

Coordenadora do Pelouro de Investigação do NERI

Anna Momotova

Coordenação da PACTA

Inês Eusébio

João Terrenas

Joana Ribeiro

Redes Sociais

Filipa Bastos

Luís Rodrigues

Sofia Ramos

Design

Inês Eusébio

Revisão

Anna Momotova

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3

Está iniciado mais um ano lectivo, um ano lectivo que se

espera de muito esforço, trabalho e de muito sucesso, como tal

impõe-se uma série de apresentações e felicitações. O Núcleo de

Estudantes de Relações Internacionais, que tenho a honra e o

privilégio de presidir, apresenta a sua revista, a PACTA.

Depois de um ano de onde a PACTA surgiu em formato

revista, a actual equipa, que engloba elementos que faziam parte

da antiga equipa e novos colaboradores, apresenta-se tendo em

vista a continuar e a melhorar o trabalho já efectuado e que é

certo, deixou as expectativas elevadas. Expectativas essas que

certamente estarão à altura do trabalho que o nosso Núcleo vem

apresentando nos passados mandatos. A mesma qualidade na

informação, no conteúdo das análises e na elaboração das

edições são a imagem de marca desta equipa e desta revista.

Uma segunda nota, não menos importante, também é

necessária. Uma palavra de felicitação e desejo de todo o

sucesso aos novos alunos da licenciatura em Relações

Internacionais. Que o ISCSP e este curso sejam para vocês casa,

fonte de aprendizagem académica e na relação com os outros.

Por último, agradeço a todos os alunos que confiaram

nesta equipa que elegeram para os representar enquanto alunos

de Relações Internacionais, a todos vós o meu muito obrigado.

Agradeço ainda a todos os alunos desta grande equipa que

diariamente se esforçam para que o nosso Núcleo funcione, em

que a PACTA, assim como a simulação do G20 dos dias 6 e 7 do

mês passado, são apenas alguns dos projectos que

desenvolvemos para alargar as competências e o conhecimento

dos alunos do nosso curso e de toda a comunidade académica.

Saudações de um ano pleno de sucessos,

O Presidente do Núcleo de Estudantes de Relações Internacionais,

Miguel Brito

EDITORIAL

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4

5 Os protestos na Turquia

Dra. Isabel David

8 O concurso de acesso à carreira diplomática: algumas

notas

Dr. Nuno Canas Mendes

16 Globalização

Entrevista com Nelson Ambrogio, Ceo da Bayer Portugal

24 Sino Myanmar Relations amidst Political Changes in Myanmar PhD Bill Chou

31 Ex Lege: “A importância da escrita na expansão do Direito”

Dr. António Pinto Pereira

34 Cadernos do Tiaguistão: “Não se atacam aliados”

Dr. Tiago Ferreira Lopes

37 Recensão crítica: ‘Risk’, Deborah Lupton

Dra. Maria Ferreira

39 Experiência: voluntariado no Cambodja

Isabel Alves

sUMÁRIO

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OS PROTESTOS NA TURQUIA

DRA. ISABEL DAVID [email protected]

PROFESSORA AUXILIAR NO ISCSP

Os protestos que começaram

em Istambul no final de Maio a

propósito da destruição de um dos

últimos espaços verdes em Istambul,

o parque Gezi, e que continuam

ainda, tomando formas

diversificadas por todo o país,

constituíram uma surpresa no

panorama político e social turco

pela sua dimensão. De facto, o país

tem registado, nos últimos anos, um

crescimento económico

impressionante, apenas suplantado

pelo chinês, com uma melhoria

acentuada dos níveis de vida na

última década, marcada pelo

predomínio político do Partido da

Justiça e do Desenvolvimento (AKP).

Inicialmente destinados a

preservar o parque, os protestos

rapidamente se transformaram numa

contestação mais alargada ao

referido domínio do AKP, unindo

grupos improváveis:

secularistas,grupos LGBT,

muçulmanos anticapitalistas,

muçulmanos revolucionários,

Alevitas, Curdos, Kemalistas,

feministas. Ora, as manifestações na

Turquia não são um fenómeno de

hoje, tendo lugar frequentemente. A

amplitude dos protestos desde Gezi,

contudo, adquiriu uma repercussão

inusitada, para a qual muito

contribuiu a violenta reacção do

governo, que ordenou a sua

repressão imediata, traduzida na

violência policial. De facto, a

actuação policial mereceu várias

críticas vindas da União Europeia e

dos Estados Unidos, que

consideraram desproporcional o uso

da força e, também, o uso de

componentes químicos perigosos

para a saúde nos canhões de água

apontados aos manifestantes. O

Primeiro Ministro turco, Recep

Tayyip Erdogan, deu o tom,

qualificando os manifestantes de

çapulcu – vândalos.

Na verdade, os protestos têm

uma ampla fonte. Alguns sectores

protestam contra aquilo que

entendem ser a crescente

corrupção do partido no poder,

intimamente ligado à construção

civil, que tem movido muito do

crescimento do país, por entre

acusações a favorecimentos de

cariz pessoal (caso, por exemplo,

da entrega de várias empreitadas

ao genro do Primeiro Ministro). Um

outro grupo contesta aquilo que

considera como um ataque ao cariz

laico do Estado, instituído pelo “Pai

dos Turcos”, Atatürk, atributo que

surge na Constituição como

“irrevogável”. Outros grupos, como

os Alevitas (que têm sido

massacrados ao longo da história

turca), reclamam maior tolerância

para com a sua religião,

considerando o laicismo como um

dado “inegociável”. Os muçulmanos

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6

anticapitalistas, liderados

por Recep Eliaçik,

opõem-se ao que

consideram ser o “falso

Islão” do AKP, ligado ao

mercado e ao

capitalismo, advogando

um Islão tolerante. Os

Curdos reivindicam a

continuação do processo

de paz, assim como o

reconhecimento da sua

especificidade e dos seus direitos

no país.

Os protestos adquiriram

diversas e inovadoras formas, casos

do “standing man”, um artista turco

distinguido com um prémio de

liberdade de expressão e direitos

humanos na Alemanha, ou da

pintura de escadarias de rua com

as cores do arco-íris. O parque

Gezi foi transformado, durante

algumas semanas, num centro

cultural, que incluía uma biblioteca.

A própria palavra “çapulcu” foi

apropriada pelos manifestantes para

se transformar no verbo “çapulling”,

um neologismo saído das ruas.

A importância e as

implicações dos protestos são de

grande alcance. Com efeito, os

acontecimentos deitaram por terra

a ideia de que o AKP é o feitor da

democracia no país, ideia com que

havia chegado ao poder em 2002.

Nesta altura, o partido apresentava-

se aos eleitores com um programa

centrista, tolerante e democrático,

prometendo pôr termo ao

autoritarismo kemalista que ditava o

rumo do país desde 1923. Para tal,

ancorou o processo de

democratização à adesão à União

Europeia e aos respectivos critérios

de Copenhaga. Desde 2007, os

progressos neste caminho são

lentos, tendo o último capítulo sido

aberto em 2010. Em consequência

dos protestos, a União remeteu

para Outubro novas conversações.

Ao mesmo tempo, Erdogan

condenou violentamente as críticas

internacionais aos protestos,

chegando a afirmar que a Alemanha

estava por detrás dos

acontecimentos, por invejar o nível

de desenvolvimento da Turquia. O

Primeiro Ministro insinuou também

que os judeus estariam na origem

dos protestos e, mais recentemente,

acusou o principal partido da

oposição, o Partido Republicano do

Povo (CHP), fundado por Atatürk.

Dentro do AKP houve

também cisões importantes: a que

opõe o Primeiro Ministro ao

Presidente da República, Abdullah

Gül, que condenou o excessivo uso

da força para reprimir os protestos.

Por detrás da ruptura estão

também as eleições presidenciais

que terão lugar em 2014: o

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7

Presidente pretende recandidatar-se,

enquanto Erdogan há muito

ambiciona o cargo. Nos media

turcos, fala-se na criação de um

novo partido em torno de Gül, a

formar-se entre dissidentes do AKP.

Se antes dos protestos Gül era

mais popular junto da população

turca, essa simpatia reforçou-se

agora, debilitando-se provavelmente

de forma irremediável a possível

candidatura de Erdogan. Ainda para

mais, está em processo de

aprovação uma nova Constituição,

na qual Erdogan pretende ver

consagrado um regime

presidencialista.

Um outro desenvolvimento

muito relevante prende-se com a

perda de uma base de apoio

importante para o AKP: o

movimento Gülen. Fethullah Gülen é

um líder religioso turco exilado nos

EUA com peso decisivo na política

e na economia turcas. O movimento

congrega cerca de 10% a 15% da

população turca, movimentando-se

activamente nas esferas da

sociedade civil e na economia. Nos

últimos dez anos, os membros

haviam sistematicamente apoiado o

partido, mas, na sequência dos

protestos desencadeados a

propósito do parque Gezi, aquele

líder religioso condenou a reacção

do governo, optando pela cisão

com o AKP.

Também em 2014 terão lugar

eleições locais. De acordo com as

últimas sondagens, o AKP desceu

nas intenções de voto, pese embora

o facto de manter uma liderança

muito confortável de quase 20

pontos percentuais. Na verdade, a

debilidade dos principais partidos

da oposição, o CHP (que é

prejudicado pelo facto de ter

implantado no país um processo de

secularização radical, no passado, e

de, ainda hoje, não articular um

programa coerente, pese embora a

sua recente viragem para a social-

democracia) e o MHP (Partido de

Acção Nacionalista, virulentamente

nacionalista, opondo-se à

concessão de quaisquer direitos às

minorias do país) apenas reforça o

poder do AKP.

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O concurso de acesso à carreira diplomática: algumas notas

Este texto tem por base um artigo em co-autoria com Armando Marques

Guedes, “‘O tempo e as réplicas’. Formas de recrutamento de diplomatas: os

concursos de acesso à carreira”, in Cultura, Revista de História e Teoria das

Ideias, n.º 23 (2006).

DR. NUNO CANAS MENDES [email protected]

PROFESSOR AUXILIAR NO ISCSP

A carreira diplomática tem

constituído uma das saídas

profissionais mais procuradas pelos

detentores de um grau académico

em Relações Internacionais, em

Portugal. Tal tem sucedido com

êxito, como mostram as estatísticas,

dado que o número de diplomatas

oriundos nesta área tem vindo a

aumentar desde que ela ganhou se

firmou na Universidade portuguesa

nos alvores dos anos 80. O

Instituto Superior de Ciências

Sociais e Políticas em particular deu

um contributo importante para o

acentuar desta tendência, tendo

inclusivamente vários dos seus

licenciados ficado muito bem

classificados nos concursos, nalguns

casos mesmo em 1.º lugar. O

objectivo deste artigo é apresentar

algumas reflexões acerca da

natureza do concurso de acesso à

‘carreira’ no que toca ao perfil

sociológico dos candidatos, aos

critérios apriorísticos de admissão,

não-académicos e académicos e

por último à formação académica

dos admitidos. Tentar-se-á uma

brevíssima abordagem histórica. Os

resultados são bastante curiosos.

Comecemos por fazer uma

breve contextualização dos reflexos

das muitas mudanças sócio-políticas

ocorridas em Portugal nos últimos

quarenta anos, e que não puderam

deixar de ter consequências no que

ao corpo diplomático diz respeito.

Basta começar por uma

constatação quantitativa: com efeito,

“a carreira” cresceu, passou a

incluir um número muito maior de

diplomatas e, consequentemente, o

acesso sofreu por essa via

transformações sérias, muitas delas

com um inevitável alcance

qualitativo. A imagem que ainda

durante a década de 20 do século

passado vigorava de “um mundo

fechado, de díficil acesso e,

sobretudo, numericamente muito

diminuto”1, ia de maneira inexorável

ficando mais distante.

Já no decénio de 60 do

século XX – durante a obstinada

luta pela defesa do Império e as

pressões que isto determinava ao

nível dos serviços do Estado –

1Org. António José Telo (2001), António de

Faria, Cosmos, Lisboa: p. 26.

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9

começara a notar-se a necessidade

de um alargamento. As

consequências? Se é possível

reconhecer, através de uma leitura

ainda que superficial do Anuário

Diplomático, a persistência de

algumas dinastias de diplomatas,

também não deixa de ser notório

pela via dessa mesma leitura que a

base social do recrutamento passou

desde então a ser muitíssimo mais

ampla – se quisermos mais

democrática – e torna-se patente

que houve, no que às origens

sociais diz respeito, uma deslocação

do centro de gravidade no sentido

“descendente”, predominando, no

lugar até aí ocupado pela classe

alta e média-alta, um determinado

segmento sócio-profissional: o da

classe média do sector terciário. Os

anos 70 e os seguintes, embora

com especificidades próprias, em

linhas gerais apenas vieram

confirmar uma tendência que vinha

de trás.

Esta mudança é, já o

mencionámos, um sinal das

significativas alterações que a

estrutura da sociedade portuguesa

sofreu desde os anos 60,

acompanhando o desenvolvimento

económico desde então registado, e

que teve como marco político 1974.

Muito há que o prenunciava. O

aumento da escolaridade e,

consequentemente, do número de

licenciados tem aqui um reflexo

deste processo paretiano de

substituição das elites. Antes de

1974, a percentagem da população

portuguesa habilitada com um curso

superior era ínfima e as suas

origens sociais “monótonas”; a

partir desta data o número de

candidatos passou a ser muito

superior, tal como os seus lugares

sociais de “extração”. Acresce que

as transformações sofridas na

política externa portuguesa e em

particular a integração europeia

exigiam mais recursos humanos e,

consequentemente, mais vagas na

carreira diplomática, e havia que

procurar novas fontes aonde ir

buscá-los.

Neste sentido, a conotação

aristocrática do privilégio, se bem

que ainda de alguma maneira

presente, foi-se esbatendo. As

bases, como se viu, foram

alargadas e, deste modo, a

meritocracia tinha uma maior

probabilidade de se impor. Como

tivemos a oportunidade de

confirmar nalgum detalhe no que

diz respeito à mecânica inicial do

processo, sucede, porém, que “a

carreira” conservou, internamente,

numerosos traços de imobilismo e

sobretudo não abriu

verdadeiramente mão da faculdade

de dosear, a seu bel-talante,

privilégio e meritocracia. Entre

muitas outros exemplos, também

nesse plano se estabeleceram

rotinas no Ministério. E, apesar da

crescente e indesmentível abertura

democrática genérica, “a carreira”

tem sempre de maneira admirável

conseguido desequilibrar a balança

de forma a assegurar a sua própria

perenidade enquanto corpo2.

2 Uma rápida nota sociológica, desta feita

apontada para uma problematização maior do

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10

Os concursos preenchem

nisso um papel essencial, em todos

os sentidos do termo, um papel

primordial, aliás, no dispositivo

complexo que garante tal

capacidade efectiva de reprodução

sem turbulências. O órgão-chave

nessa intrusão dinâmica, chame-se-

lhe assim, é contudo a entidade

corporativa para tal deliberadamente

desenhada, o Conselho Diplomático

do Ministério, uma criação bem no

espírito do Estado Novo3. Uma

entidade que perdurou – e em

muitos sentidos se viu reforçada –

depois da revolução democrática de

1974. E uma entidade cujo papel

generalizado na consolidação

interna relativamente ao exterior e

termo “cunha” que tão genérica e acriticamente

tem sido usado, com todo o empobrecimento

analítico que tal significa. Como seria decerto

de esperar, o “privilégio” a que temos vindo a

aludir foi desde sempre alterando a sua

definição e o seu ponto de aplicação:

designadamente, se de início fazia referência às

elites tradicionais portuguesas, depressa

começou, com o Estado Novo, a mesclar esse

critério com outros, mais político-ideológicos

(nomeadamente, senão a pertença à União

Nacional, em todo o caso uma adesão tácita ao

seu programa político geral). A natureza

“endogâmica” tão característica de regimes

corporativos rapidamente veio acrescentar uma

demão, ao introduzir o ingrediente

“hereditariedade” (doravante num sentido mais

atido à família nuclear e suas extensões

imediatas) ao rol de critérios usados: os célebres

“filhos dos diplomatas”, que lhes começaram a

“suceder” (tal como, aliás, noutros corpos sócio-

profissionais), em processos quasi-dinásticos de

“substituição passiva” de lideranças. Mais

recentemente, o que não constituirá surpresa,

teve luagr outra alteração: lobbies como os

partidos políticos democráticos e associações

mais ou menos confessionais (ora em sentido

religioso, ora no laico) vieram-se acrescentar à

mélange. 3 As respectivas competências, composição e

funcionamento estão regulamentadas nos art.os

8 e 9, capítulo II, secção I, do decreto-lei n.º

40-A/98, de 27 de Fevereiro.

cuja operação no que apelidámos a

reprodução simples do Ministério

nos parece evidente.

Mesmo sem entrar em

grandes pormenores, vale a pena

aprofundar um pouco este ponto. O

Conselho Diplomático tem sido

essencial para a coesão interna do

Ministério; o papel que tem tido ao

esbater tensões intestinas pela via

de uma criação de

interdependências orgânicas não

pode ser subestimado. Vislumbrar o

seu funcionamento em mais termos

amplos é contudo decerto instrutivo.

A sua intervenção, ainda que se

prolongue por todo o percurso da

vida do diplomata, tem-se revelado

como decisiva logo na fase inicial

de inevitáveis pressões para uma

abertura do Ministério ao exterior. É

certo que, por norma, o Conselho

não se intromete directamente na

admissão de canditatos ao

Ministério. Mas age com enorme

eficácia na fase imediatamente

posterior. Toda a progressão na

hierarquia diplomático-profissional

está vinculada às suas decisões, e

se a regra geral de promoção é,

formalmente, a do “mérito”4, as

suas regras de funcionamento são

contudo definidas por regulamento

interno, pelo que é sempre a

“Casa” ela mesma que define os

critérios que na prática presidem às

referidas decisões – em resultado

institucionalizando-se no processo.

4 Decreto-lei n.º 40-A/98, de 27 de Fevereiro,

art.º 17.

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11

Os critérios apriorísticos de

ingresso: género e formação

académica:

Um dos aspectos essenciais

dos concursos de acesso à carreira

diplomática que deve ab initio ser

focado prende-se com o perfil

exigido aos candidatos para a

respectiva admissão no Ministério

dos Negócios Estrangeiros. Tais

perfis variaram bastante ao longo

do tempo, mas não de maneira

uniforme. Vale a pena apurar estas

variações nalgum pormenor.

Para simplificar, optemos por

classificar os critérios utilizados

para permitir os ingressos como

não-académicos e académicos, o

que, como iremos ter a

oportunidade de verificar, dá em

todo o caso corpo a um contraste

pertinente. Relativamente aos

primeiros, os não-académicos, o

ponto mais óbvio é o de que

alguns dos pré-requisitos de início

exigidos sofreram ao longo do

tempo uma evolução significativa,

mas sempre num sentido de alguma

forma comum: durante a I República

e o Estado Novo, só podiam

candidatar-se à carreira diplomática

indivíduos do sexo masculino, de

nacionalidade portuguesa, com

idade compreendida entre os 21 e

os 35 anos de idade, dotados de

“robustez física” – para poderem,

por exemplo, “afrontar qualquer

clima”, especificava a lei-orgânica

de 1929 –, e aptos a cumprir as

condições requeridas para qualquer

emprego no Estado, o que incluía

uma declaração de anti-comunismo,

uma garantia escrita de fidelidade à

ordem constitucional e um

compromisso de honra de que não

pertenciam a “associações secretas”

(leia-se Maçonaria).

Note-se que estas últimas

condições definidas no diploma de

1939 se foram esbatendo com o

tempo, desaparecendo a última em

1968 e mantendo-se as duas

primeiras em versões mitigadas.

Durante a vigência do marcelismo,

no regulamento de 1972, já não se

encontram referências deste tipo,

ou pelo menos sobrava pouco mais

do que o seu rasto residual.

Basta aprofundar um pouco

para constatar que a direcção

genérica das mudanças tem sido

assaz uniforme e regular: tratou-se,

antes do mais, de um processo,

levado a cabo com uns poucos de

avanços e recuos, de uma certa

homogeneização democrática,

chame-se-lhe assim. O modus

faciendi do processo tem sido

interessante. O que foi sendo

conseguido, foi-o, curiosamente, por

meio de uma simplificação, por

exclusão de partes: por uma

eliminação sucessiva das excepções

e dos critérios-limite avulsos em

que, neste como noutros âmbitos, o

regime autoritário se tornara exímio.

Num plano macro, o andar da

carruagem é com efeito tão nítido

que salta de imediato à vista. O

profiling inicial, que tinha como

óbvio intuito garantir a execução

das preferências do regime sob as

vestes formais de um processo

enxuto de selecção, viu-se assim,

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12

como que por defeito, pouco a

pouco substituído por um

mecanismo cada vez mais aberto e

“equitativo”.

Outra inflexão essencial, que

vai claramente no mesmo sentido e

cujo impacto não pode ser

subestimado, diz respeito ao facto

de se terem apresentado, pela

primeira vez, candidaturas de

mulheres no concurso aberto em

Novembro de 1974. As leis

orgânicas de 1939 e 1966,

especificavam que só poderiam

concorrer indivíduos do sexo

masculino, respectivamente nos

artigos 83 e 25. Em 1966, numa

orgânica elaborada sob a batuta do

então Secretário-Geral José Luís

Archer, o Ministério tentou (com a

cumplicidade de Franco Nogueira)

abrir o acesso ao sexo feminino.

Depois de insistir em ver o projecto

o Presidente do Conselho, Salazar,

devolveu-o, com uma interpolação

manuscrita: “do sexo masculino”5.

Seriam precisos mais sete

anos e a sua ausência para que

isso mudasse. Com efeito, na lei

orgânica publicada em 1974, na

nova redacção do revisto artigo 25,

foram omitidas as referências não

só às licenciaturas de acesso como

ao género. A mudança começou –

ainda que lentamente – a produzir

efeitos. Vistas as coisas em

contexto, não foi, apenas, um abrir

de portas, até então trancadas, a

mais de metade da população; em

5Agradece-se ao Embaixador Pedro Ribeiro de

Menezes esta magnífica e muitíssimo reveladora

petite histoire.

paralelo com o que teve lugar em

muitos outros domínios, tratou-se

de uma inovação que ia no sentido

genérico da assunção de um papel

crescente das mulheres no Estado e

na vida pública geral. E foi uma

mudança eficaz, já que nesta como

noutras áreas, o crescimento foi em

resultado explosivo. Se em 1979 o

número de mulheres admitidas –

doze – representava só 4,1% do

quadro de 290 diplomatas, volvidas

duas décadas, em 2000, este

número decuplicou, representando

então 22,5% dos funcionários,

numa tendência que continua a

acentuar-se. A título de exemplo,

refira-se que no concurso de 2005,

nas 30 vagas disponíveis, o número

de mulheres admitidas à categoria

de adido de embaixada foi

claramente superior ao de homens.

Com efeito (e de novo numa réplica

tardia daquilo que desde há muitos

anos se verifica nas Universidades

portuguesas), ingressaram como

adidos de embaixada mais mulheres

do que homens: doze do género

masculino e dezoito do feminino.

Em 2013, das 20 vagas preenchidas

só uma coube ao sexo feminino, o

que parece ser um dado contra-

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13

corrente e decerto não indicia

nenhuma tendência.

Pormenorizar mais os nossos

pontos de aplicação permite-nos

resolver melhor imagens, ainda em

planos macro. Efectivamente, outras

inflexões houve que importa

sublinhar, dado o impacto que

tiveram. O perfil exigido aos

candidatos a diplomatas foi sendo

alterado também noutras direcções,

as quais, se não significaram

necessariamente uma

democratização, em todo o caso

soletraram uma maior abertura

geral do acervo de pré-requisitos.

No que diz respeito à formação

académica que habilitava os

candidatos, os regimes pós-28 de

Maio introduziram uma mudança

qualitativa importante face ao que

era praticado até então, e que

consistiu na menção aos cursos

obrigatórios que habilitavam os

candidatos ao concurso.

A lei-orgânica de 1929, por

exemplo, indicava qualquer dos

cursos de Direito das Faculdades

de Lisboa e de Coimbra, bem como

o curso diplomático e consular dos

Institutos Superiores de Comércio

de Lisboa e do Porto. A preferência

pelo Direito foi dando lugar a um

alargamento, ainda que estreito, do

leque de licenciaturas admitidas.

Assim, no regulamento de 1939,

davam acesso à carreira

diplomática as licenciaturas em

Direito, Ciências Histórico-Filosóficas

ou Ciências Económico-Financeiras.

No regulamento de 1968, verificou-

se um alargamento do número de

licenciaturas, de três para seis:

Direito, Filosofia, Economia, História,

Finanças, Altos Estudos

Ultramarinos. A grande viragem

surgiu no regulamento de 1972, em

cujos termos foram pela primeira

vez admitidos a concurso quaisquer

licenciados, indiscriminadamente,

fosse qual fosse o curso que

tivessem frequentado e concluído

com êxito6.

Sem qualquer organicismo,

note-se que esses processos gerais

de flexibilização constituiram um

acquis que se foi sedimentando

sem grandes recuos. Esta maior

abertura em várias frentes, tal como

as alterações mais propriamente

“democráticas” a que antes fizemos

alusão, vieram para ficar; desde

1972, todos os regulamentos

exarados têm reproduzido esta

última inovação “ecuménica”

introduzida no fim do período

marcelista7, tal como têm mantido

6 Registe-se, porém, que o decreto-lei n.º 40994,

de 9.2.1957, no seu artigo único, já admitia a

concurso os licenciados com qualquer curso

superior professado numa universidade

portuguesa. Tal medida veio a ser alterada pela

decreto-lei n.º 47331, de 23.11.1966, que no seu

art.º 25 limita novamente as licenciaturas de

acesso a Direito, História, Filosofia, Economia,

Finanças e as conferidas pelo Instituto Superior

de Ciências Sociais e Política Ultramarina

(ISCSPU). Finalmente, o decreto-lei 136/72, de

8.4, repõe, no seu art.º 1, o disposto no citado

decreto-lei de 1957. 7 Seria interessante apurar, por meio de um

estudo sociológico minimamente aprofundado,

se esse alargamento de âmbito da aceitabilidade

de formação não terá correspondido, ainda que

tão-só de maneira parcial, às dinâmicas de

mudança que, em paralelo, foram ocorrendo

entre os membros das elites sociais e políticas

nacionais no que toca às selecções e

preferências de cursos universitários a

frequentar.

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14

as outras que pusémos em

evidência.

Perfil académico dos admitidos

Existem dois estudos – da

autoria de Pedro Aires de Oliveira8

e de Ana Leal de Faria9- que

ensaiaram levantamentos de dados

que permitem retirar ilacções sobre

as propensões e as mudanças, quer

no perfil de admissão quer no perfil

dos admitidos. Vejamo-los um a um.

Pedro Aires de Oliveira considerou

o intervalo de anos 1926-1973 e

apoiou-se nas informações

constantes dos anuários

diplomáticos para este período.

Apurou que, durante este quase

meio século, o Direito aparecia na

dianteira, com larga vantagem

(63%), seguido dos cursos da área

das Humanidades (com prevalência

para Histórico-Filosóficas, presume-

se), com 16% e as Ciências

Económicas, com 14%10. Os

restantes cursos apresentavam um

valor puramente residual. Mais

ainda: concluíu que, em termos

geográficos, a maioria dos

admitidos provinha de

8 Pedro Aires de Oliveira – O Corpo

Diplomático e o Regime Autoritário,

Análise Social, vol. XLI, n.º 178, 2006.

9 Ana Leal de Faria, “Sociologia dos

‘negociadores’, Perfil intelectual e social dos

diplomatas portugueses (1640-1750)”, Negócios

Estrangeiros 10. 10 Como explica Pedro Aires de Oliveira,

art.cit., pp. 156-157, “os indivíduos formados no

ISCEF ingressaram no MNE sobretudo nas

décadas de 30 e 40: a partir de finais da década

de 50, os salários do sector privado tornaram-se

mais atraentes para os economistas que, de

resto, também passaram a ser mais solicitados

por outros departamentos ministeriais e

organismos públicos”.

estabelecimentos de ensino superior

em Lisboa.

Estes são dados que uma

perspectiva de mais longa duração

parece confirmar. Ana Leal de Faria,

baseada no Anuário Diplomático de

2000, verificou que uma

percentagem superior a 50% (52,4%

para ser mais exacto) dos

funcionários diplomáticos era

formado em Direito; 18% tinha

formação em Relações

Internacionais e Ciência Política (e

destes 76% eram oriundos do

ISCSP); seguiam-se, com 17,1%, os

licenciados em Letras e Ciências

Sociais e Humanas, sobretudo em

História e Filosofia; em quarto lugar,

e a uma distância considerável,

surgia, compreendendo apenas 5,8%

dos adidos de embaixada, a

licenciatura em Economia. Outras

formações ou graus académicos

superiores tinham também um valor

meramente residual. A grande

maioria (79,8%) dos admitidos, no

seguimento, aliás, do que fora o

caso nas duas gerações intermédias

do século XX sobre as quais Aires

Oliveira se debruçou, concluiu os

seus estudos em Lisboa.

A inclusão de dados mais

recentes do que aqueles

contabilizados por estes dois

autores permite-nos dar um passo

em frente. O contingente de jovens

adidos que tomou posse em 2005

não terá contribuído para alterar

significativamente este panorama

genérico. Verificou-se, no entanto,

que de entre os trinta aprovados, o

contingente maior foi o de

Page 15: Pacta (8ª EDIÇÃO)

15

licenciados em Relações

Internacionais, com onze

representantes, seguindo-se-lhe o

dos formados em Direito, com nove,

e o ainda menor agrupamento dos

licenciados, seis no total, em

Ciência Política; apenas três dos

adidos aprovados tinham formação

em áreas de Economia e Gestão; o

lugar remanescente foi atribuído a

um licenciado em Línguas e

Literaturas Modernas. Uma análise

de relance para os concursos de

2006, 2008 e 2012 permitirá

aperceber alterações pouco

significativas. A título meramente

ilustrativo, refira-se que o 1.º

classificado deste último concurso é

um licenciado em Relações

Internacionais pelo ISCSP.

Num rápido comentário

marginal, parece pois verificar-se um

decréscimo nas licenciaturas

“clássicas” de acesso. Tal poderá

prenunciar que, a médio prazo, a

distribuição típica nas formações de

base dos diplomatas do Ministério,

e designadamente a primazia do

Direito poderá vir a dar lugar à

afirmação de uma formação

académica hegemónica – uma

formação sobretudo em Relações

Internacionais criada no início da

década de 80 do século XX, com a

finalidade, entre outras, de fornecer

candidatos à carreira diplomática.

Não temos, porém, para já, maneira

de o confirmar ou infirmar: o futuro

o dirá.

Page 16: Pacta (8ª EDIÇÃO)

16

GLOBALIZAÇÃO: ENTREVISTA A NELSON AMBROGIO

Num mundo cada vez mais

globalizado, onde um evento

ocorrido em determinado sitio pode

afectar cada vez mais pessoas e

sociedades distantes e no qual a

mobilidade é cada vez maior,

optamos por falar com o Dr. Nelson

Ambrogio, que nos mostrou o lado

vivenciado por quem integra uma

organização global.

1. Tendo em conta que o tema

principal desta entrevista é a

globalização, como é ser um

uruguaio em Portugal a trabalhar

numa empresa alemã?

Pensei em começar com o

exemplo da minha casa. Como bem

comentou, eu sou uruguaio mas

também tenho nacionalidade italiana

porque os meus avós emigraram no

começo do século passado, a

minha mulher é mexicana, a nossa

primeira filha nasceu no México, a

segunda nasceu na Alemanha, a

terceira nasceu no Brasil e dentro

de algumas semanas teremos um

filho português. Temos amigos que

dizem que nos parecemos com as

Nações Unidas. Voltando à

pergunta, eu diria que é cada vez

mais habitual, cada vez há mais

mobilidade das pessoas, cada vez

há mais oportunidades de

desenvolvimento que as empresas

oferecem para fazer carreiras

internacionais. Neste sentido, o

grupo Bayer, que tem

aproximadamente cento e dez mil

colaboradores em todo o mundo,

oferece também possibilidades de

desenvolvimento internacionais, o

que é algo bom para os

colaboradores que acham

interessante esse tipo de

oportunidades, e é muito bom para

a companhia também porque

oferece uma diversidade muito

interessante, ajudando-a a adaptar-

se melhor às necessidades de cada

mercado.

2. Tendo ocupado o cargo de

diretor na unidade de General

Medicine na Bayer HealthCare Brasil,

como encarou a mudança de um

país em desenvolvimento

pertencente aos BRIC para um país

desenvolvido que se encontra numa

grave crise económica e financeira?

Nesse sentido, acho que a principal

palavra é flexibilidade. Quando

estive no Brasil, (os últimos três

anos antes de se mudar para

Portugal) o país estava a crescer

muito, muito mais do que cresce

neste momento. Por outro lado,

para mim a palavra crise não é

uma palavra nova porque tendo

vivido e trabalhado na América

Latina já estava de certa forma

habituado a lidar com a mesma.

Quando há uma mudança (neste

caso para Portugal) penso que o

mais importante é perceber qual é

a realidade do país para poder

aproveitar algumas das

aprendizagens dos outros países no

Por Joana Ribeiro e Filipa Bastos

Page 17: Pacta (8ª EDIÇÃO)

17

novo porque muitas vezes há muito

mais semelhanças entre eles do

que nós poderíamos imaginar,

independentemente das regiões ou

da fase de crescimento ou de não

crescimento. Sobre a crise em

Portugal, estamos a ver nos últimos

meses, ou pelo menos

recentemente, alguns sinais

macroeconómicos positivos, o que é

bastante bom. Do ponto de vista da

Bayer temos uma equipa que está

completamente comprometida, muito

profissional, e temos muito bons

produtos que oferecem soluções

para necessidades não atendidas.

Neste momento acho que a

prioridade é tentar navegar da

melhor forma possível nestes

tempos mais turbulentos para

tentarmos sair reforçados da crise.

3. Os valores do grupo Bayer

reúnem-se na palavra LIFE, que em

português significa vida, e cujo

acrónimo significa liderança,

integridade, flexibilidade e eficácia.

Como é que a Bayer consegue

utilizar os seus recursos da melhor

forma possível, não descurando a

filosofia LIFE neste contexto de

crise económica?

Eu diria que o momento em que os

valores mais se aplicam são em

tempos de crise ou de adversidade,

então agora, mais do que nunca,

aplicamos os nossos valores. O que

significam concretamente nesta

situação as palavras LIFE (liderança,

integridade, flexibilidade e

eficiência). Liderança significa

ficarmos focados nas nossas

prioridades estratégicas e ficarmos

também optimistas, não entrarmos

numa espiral negativa e de

frustração porque neste momento

temos que tentar aproveitar as

oportunidades que possam existir.

Integridade significa zelar pelos

nossos colaboradores, obviamente

numa fase em que não é só

complicado para a companhia mas

também para as famílias, e procurar

equilibrar as necessidades ou

resultados de curto prazo com os

resultados esperados a longo prazo.

Sobre a flexibilidade, talvez seja a

palavra que temos que exercitar

mais nesta fase já que basicamente

estamos a ver um Portugal hoje

muito diferente do Portugal que

tínhamos antes. Então flexibilidade

significa entender como está a

mudar o país e como temos que

nos adaptar para continuarmos a

ter sucesso neste mercado. A última

palavra é eficiência. É fundamental

gerir os nossos recursos com

inteligência, tentar otimizar o que

possa ser otimizado e focarmo-nos

nas atividades que realmente

aportam valor. Os valores LIFE

aplicam-se nesta fase e são a

Page 18: Pacta (8ª EDIÇÃO)

18

nossa guia para aplicar em

qualquer tipo de mercado, de

situação, e que todos os

colaboradores devem ter como base

para o seu dia-a-dia.

4. Qual é a influência da

sustentabilidade e da

responsabilidade social na

competitividade da empresa a nível

internacional?

A sustentabilidade faz parte da

nossa estratégia corporativa e

basicamente o foco da mesma para

a Bayer significa, primeiramente,

práticas de negócio responsáveis,

guiadas pelo nosso código de

compliance, e também ao mesmo

tempo a inovação, porque é através

da inovação que vamos conseguir

garantir um equilíbrio entre o

benefício económico, o benefício

ecológico e o benefício social. No

que respeita à responsabilidade

social, assumimos a nossa

responsabilidade obviamente e

temos uma serie de iniciativas a

nível global mas também muitas

delas em Portugal. Podemos ilustrar

as últimas com exemplos como uma

parceria que temos com a UNESCO

chamada “Química entre nós” e que

tem como objectivo despertar o

interesse das crianças, dos mais

novos, pelas ciências. É uma

parceria que já tem tradição e que

continuámos este ano. Outro

exemplo seria uma iniciativa que

surgiu proactivamente de dois

colaboradores da Bayer que se

juntaram e formaram um grupo

chamado Núcleo de Ação Social. É

um grupo de colaboradores que se

envolve em atividades para

melhorar a qualidade de vida e a

situação de pessoas que

atravessam um momento mais

complicado. Recentemente este

grupo recebeu um prémio da nossa

casa mãe, um reconhecimento pelo

seu trabalho, pelas suas ideias, e

graças a esse apoio conseguimos

apoiar recentemente a Casa Lilás

da organização Novo Futuro. Fomos

lá, eu e vários colaboradores da

Bayer, pintámos a casa e fizemos

algumas reformas. Penso que isso

mostra que a responsabilidade

social não é algo que somente

temos em brochuras mas que

realmente estamos a tentar

procurar viver no dia-a-dia.

5. Como consegue a Bayer triunfar

e permanecer relevante num

mercado globalizado e cada vez

mais competitivo, sem descurar os

princípios éticos que são

indissociáveis a uma empresa que

atua na área da saúde e onde a

concorrência poderá interferir com

estes mesmos princípios,

nomeadamente no que toca aos

ensaios clínicos?

Aqui voltaria ao tema da

sustentabilidade e das práticas

responsáveis de negócio. Nós,

Bayer, temos um código de

compliance que faz parte da nossa

política de sustentabilidade que se

aplica a todos os colaboradores

mundialmente e também a todas as

áreas, envolvendo também os

ensaios clínicos mencionados na

Page 19: Pacta (8ª EDIÇÃO)

19

pergunta. A Bayer tem globalmente

uma história de mais 150 anos

(neste ano estamos a comemorar

os 150 anos da sua existência) e

isso só é possível se tivermos uma

estratégia de sustentabilidade por

trás, o que só é possível através da

compliance.

6. Ao juntarmos as palavras saúde

e globalização pensamos

inevitavelmente na significante

melhoria que a globalização veio

permitir ao nível de vida global.

Contudo, África, grande parte da

Ásia e da América Latina ainda têm

um considerável caminho a

percorrer face aos cuidados de

saúde e ao Índice de

Desenvolvimento Humano quando

comparados com a Europa ou a

América do Norte. Quais são para

si os principais obstáculos a uma

verdadeira “globalização da saúde”?

Primeiramente, eu diria que temos

que ter bastante cuidado com as

generalizações. Será que dá para

falarmos de uma América Latina ou

de um Brasil? Dentro de um país

podem existir realidades muito

diferentes, entre as grandes capitais

e as regiões um pouco mais

remotas. Isso para mim ficou

claríssimo no Brasil. Também

quando falamos da América do

Norte e da Europa, remetemo-nos

para situações bastante diferentes.

Ou até mesmo dentro da própria

Europa temos situações divergentes.

Muitas vezes ouvimos falar sobre os

países da Europa do Norte e da

Europa do Sul. Portanto as

generalizações são complicadas e

temos que ter cuidado. Se olharmos

por exemplo para a situação de

Portugal, temos claramente uma

situação de acesso aos

medicamentos que é diferente da

situação de acesso de outros

países da União Europeia. Sabemos

que temos demoras bastante

prolongadas para as

comparticipações e isso implica que

a população portuguesa não tenha

o mesmo acesso a medicamentos

que outros países da Europa.

Mesmo assim, é verdade que

existem mais de dois mil milhões

de pessoas que estão numa

situação de atendimento de saúde

inferior ao que deveriam receber.

Mais de dois mil milhões de

pessoas sem um atendimento de

saúde adequado é um problema

que dificilmente possa ser resolvido

somente por um único ator, tem

que ser um esforço conjunto entre

diferentes organizações, e

obviamente a Bayer está a

colaborar com as mesmas para

tentar aportar o que importa nesse

sentido.

7. Revelando um grande

crescimento, qual é a importância

da região económica da

Ásia/Pacífico para o futuro desta

multinacional alemã nos mercados

internacionais?

A região da Ásia/Pacífico neste

momento representa para a Bayer

22% do negócio global. Ou seja,

22% das vendas globais (dados de

2012 que estão publicados) foram

nesta região. O crescimento foi de

Page 20: Pacta (8ª EDIÇÃO)

20

dois dígitos, sendo uma região que

está, claramente, a crescer. É a

terceira região em vendas da Bayer;

a primeira é a Europa, a segunda é

a América do Norte. Se o

crescimento continuar desta forma,

mais tarde ou mais cedo a

Ásia/Pacífico será a segunda região

porque já está bastante perto das

vendas da América do Norte. Para

o futuro a importância continuará

evidentemente a ser bastante alta e

esperamos e acreditamos que os

mercados nos quais participamos,

principalmente na saúde humana,

na saúde animal e também na

proteção das plantas continuarão a

crescer. Portanto, a nossa presença

continuará a expandir-se.

8. Tendo em conta a delicada

situação do continente africano, em

especial na área subsariana, quais

são as políticas mais relevantes da

Bayer em relação à saúde?

Este ano comemoramos 150 anos

globalmente sendo que em Portugal

já temos mais de 100 anos e em

África já temos quase 100 anos.

Portanto, temos uma presença há

bastante tempo com companhias

com presença desde Casablanca

até à Cidade do Cabo. Estamos

assim presentes em todo o

continente africano. Além de termos

a presença das nossas subsidiárias

também estamos envolvidos noutros

programas com organizações

justamente para tentar apoiar o

acesso à saúde da população

africana. Um exemplo disto seria, na

minha opinião, a iniciativa de

planeamento familiar. A Bayer é

líder mundial na anticoncepção e

há mais de 50 anos que está a

trabalhar junto com outras

organizações em temas de

planeamento familiar para África

que não têm somente a ver com

facilitar o acesso ao medicamento

mas também com trabalhar na

educação das pessoas e na

consciencialização do que significa

a saúde sexual e reprodutiva.

Somente com o medicamento e

com a educação é que as

iniciativas podem ser sustentáveis.

9. De que forma é que uma

multinacional como a Bayer pode e

pretende influenciar o mercado

português?

O nosso lema ou a nossa missão é

Bayer, Science for a Better Life, ou

Bayer, Ciência para uma Vida

Melhor. Então como pretendemos

influenciar o mercado português? Eu

diria que guiados pelo nosso lema.

Através da ciência, através da

inovação e trazendo soluções para

os portugueses. Basicamente

Page 21: Pacta (8ª EDIÇÃO)

21

fazendo o que esta no nosso ADN,

ou seja, inovando. Se inovarmos

estaremos a traçar novos produtos

em áreas terapêuticas, como

estamos a traçar neste momento

com a cardiologia, a oftalmologia, a

oncologia e a saúde da mulher.

Esta é a melhor forma que temos,

na minha opinião, para influenciar

positivamente o mercado português

e traçar soluções para os

portugueses e portuguesas.

10. Considerando uma situação

hipotética em que era desenvolvido

um fármaco que deixava o ser

humano imune a todas as doenças,

existira, na sua opinião, alguma

farmacêutica que aceitasse vender

este produto a um preço acessível

a uma escala global?

As empresas finalmente são

pessoas e estão feitas por pessoas

e todos nós temos a nossa família

e os nossos entes queridos. Logo,

como é óbvio, todos nós

gostaríamos de ter um produto

desse tipo porque estaríamos a

ajudar ao mesmo tempo todos os

nossos entes queridos, todas as

nossas famílias. Sim, claro, seria

algo muito bom para todos termos

um produto desse tipo. Voltando ao

que comentava na pergunta

anterior, poderíamos falar de

missão cumprida ao possuirmos

esse produto uma vez que teria

sido o resultado da ciência para

uma vida melhor, logo o nosso

lema seria aplicado. Até lá, teremos

de continuar como até agora,

pesquisando bastante,

desenvolvendo novos produtos e

tentando ajudar a população com

novas soluções.

11. Teria logo de início um preço

acessível ou seria uma coisa a

longo prazo, que de início estaria

apenas disponível para uma elite?

Quando é aprovado um produto

farmacêutico do ponto de vista da

segurança e eficácia, também é

aprovado pelas autoridades

competentes o preço desse produto.

Para o definir entram em avaliação

vários elementos, como por

exemplo, quais são as opções

disponíveis, a fármaco-economia,

temas de acesso, então seria muito

difícil neste momento afirmar qual

poderia ser o preço de um produto

com esta característica. Seria

especular já demais.

CURRÍCULO (também disponível em http://linkd.in/1etWdVJ)

Nelson Ambrogio

Managing Director at Bayer Portugal S.A.

[email protected]

Page 22: Pacta (8ª EDIÇÃO)

22

Experiência Profissional

Managing Director at Bayer

August 2012 - Present

Managing Director at Bayer Portugal S.A., Bayer HealthCare

Representative and Country Division Head Bayer HealthCare

Pharmaceuticals

Head of Business Unit General Medicine Brazil at Bayer HealthCare

May 2010 - August 2012

Therapeutic areas: Cardiovascular, Men's Health, Anti-Infectives. Based in

Sao Paulo, Brazil.

Executive Board Support Strategy & Human Resources at Bayer AG

August 2007 - May 2010

Assistant to Group Board of Manager Member in charge of Strategy &

Human Resources and responsible for the Regions Americas, Africa and

Middle East. Based in Leverkusen, Germany.

Marketing & Sales Operations Region Latin America/ Canada at Bayer Schering

Pharma

2006-2007

Business Development & Licensing, Market Research, Sales Force

Effectiveness, Pricing, Promotional Materials. Based in Mexico City,

Mexico.

Head of Strategy, Business Development and Marketing Services Region Latin

America/ Canada at Schering

2002-2006

Based in Mexico City, Mexico.

Product Manager Dermatology at Schering Uruguaya S.A.

January 2000 - December 2001

Based in Montevideo, Uruguay.

Sales Representative at Schering Uruguaya S.A.

August 1998 - December 199

Page 23: Pacta (8ª EDIÇÃO)

23

Formação Académica

Business School Sao Paulo

MBA, Executive MBA, 2011-2012

Executive MBA at Business School Sao Paulo, part of Laureate

International Universities, International Module at Sawyer Business

School - Suffolk University, Boston - USA.

Zeit- Stiftung

Global Governance, 2009

Bucerius Summer School on Global Governance, organized by the Zeit-

Stiftung Ebelin und Gerd Bucerius in cooperation with the Heinz Nixdorf

Stiftung. Hamburg, Berlin, Paderborn.

INSEAD

Competitive Strategy, 2008

Competitive Strategy Programme held at INSEAD, Fontainebleu, France in

2008.

Universidad del Valle de México

BA, Business Administration, 2003-2006

German-Uruguayan Chamber of Commerce

Diploma, International Sales & Marketing, 1996-1998

Page 24: Pacta (8ª EDIÇÃO)

24

PhD BILL CHOU

ASSOCIATE PROFESSOR | DEPARTMENT OF GOVERNMENT AND PUBLIC ADMINISTRATION

UNIVERSITY OF MACAU | CHINA

Introduction

China’s huge population, large

territory, and tremendous economic

and military prowess have produced

immense impact on the international

community and are of many

countries’ concern. This isparticularly

true to China’s neighbouring

countries. The paper is to study the

relations between China and

Myanmar. Amidst political

democratization in Myanmar, the

populace has become increasingly

assertive. Foreign capital and

influence are increasingly present in

the country. The political leadership

of Myanmar is skillful at making use

of these changes to counterbalance

the impact of China and maintain

its sovereignty and regime stability.

Strategic Values of China to

Myanmar

China is essential for Myanmar

to cushion the damages of Western

economic sanctions. China is

Myanmar’s largest trading partner. In

2010, the bilateral trade was worth

US$ 4.44 billion, 68.6% higher than

that in 2008. China is also

Myanmar’s major sources of foreign

direct investment, official

development aids, and military

assistance. China invested more

than US$ 14 billion in Myanmar’s

fiscal year of 2010/11 (April-March),

or 70% of the total foreign direct

investment. This was a substantial

rise from US$ 300 million a year

before (“Insight: As Myanmar

opens”2012). In the industry of

resource extraction, Chinese capital

accounted for over 90% of the

foreign capital. Between 1991 and

2005, Bank of China and The

Export-Import Bank of China

provided Myanmar with credits worth

US$ 1 billion (Sun 2012a; Zhao

2011, 256-259). Owing to the

significance of Chinese capital to

Myanmar, Myanmar set up “The

Leading Committee for

PromotingEconomic Cooperation

between the Union of Myanmar and

the People'sRepublic of China” in

1996. The Committee was chaired

by the Junta Secretary General Khin

Nyunt (Tin 2003, 203).

SINO MYANMAR RELATIONS AMIDST POLITICAL CHANGES IN MYANMAR

Page 25: Pacta (8ª EDIÇÃO)

25

Meanwhile, China is instrumental

for Myanmar to fend off Western

censure. In 2007, US sponsored a

resolution to UN Security Council in

an attempt of condemning Myanmar

on its human right record. Joined

by Russia, China cast a vote to

veto the resolution (Department of

Public Information, United Nations

Security Council, 2007). This echoes

China’s conventional, non-

interference approach to the

domestic affairs of foreign countries,

but conflicts with Western advocacy

of right to intervene with any

countries which fail to protect their

own citizens.

Strategic Values of Myanmar to

China

Myanmar is a gateway for China

to revive its southwest silk road

from Yunnan to Bangladesh, India

and the West, as well as a bulwark

against U.S. encroachment from

Southeast Asia. It has abundant

natural resources and exports

substantial oil, natural gas, and

timber to resource-hungry Chinese

economy. China is able to import oil

from Middle East and bypass the

pirate-ridden Malacca Strait

controlled by the US and its allies

(Shee 2002).

Page 26: Pacta (8ª EDIÇÃO)

26

Besides that, the state security

in southwest China is contingent on

Myanmar’s political, economic and

social stability. Yunnan province has

long been plagued by the armed

conflicts between Myanmar

government and its ethnic minorities.

The conflicts sometimes cause

exodus of Myanmar refugees who

seek haven from China. The

economic hardship on the side of

Myanmar forced the Myanmar

peasants to rely on opium poppy

growing and accentuated China’s

drug problem. The weak governance

in Myanmar’s borderlands resulted

in cross-border problems of illegal

timbering, casinos, prostitutions, and

spread of AIDS. Out of security

consideration, China has a vested

interest on Myanmar political

stability and economic prosperity

(Zhao 2011).

Myanmar’s potential to ease the

threat to China’s energy security

attracted China to invest

substantially on the infrastructure

related to transportation and

energy. China participated in such

construction projects as the port of

Sittwe on Myanmar’s west coast, a

road link between Yunnan and Bay

of Bengal, an oil pipeline from

Rakhine State of Myanmar to

Yunnan, and several dams for

hydroelectric power along Irrawaddy

River.

Political Changes in Myanmar and

the Implications to Sino-Myanmar

Relations

Myanmar has been plagued by

disastrous economic policies and

Western economic sanctions. In

2007, many people protested

against a substantial rise in patrol

price and inflation. The government

was worried that keeping the

oppressive rule would lead to even

more protests. After the civilian

government led by President Thein

Sein took office in 2010, the

government gradually lifted the

restrictions on political and civic

freedoms: Nobel Peace Prize

Laureate Aung San Suu Kyi and

most other political dissidents were

released from house arrest or jails.

Press censorship was lessened.

Country-wide human right

commission was set up. Privatization

of state-owned enterprises was sped

up. Legislation on foreign direct

investment was drafted to step up

the economic reform and liberalize

the economy. Cabinet was reshuffled

to replace reform-minded ministers

and deputy ministers for the

hardliners who opposed further

political and economic reforms.

Ceasefire agreements were signed

with armed ethnic groups to

enhance national security and

improve the business environment.

The central bank abolished the fixed

currency system. Multiple exchange

rates for the currency kyat were

unified to encourage trade and

Page 27: Pacta (8ª EDIÇÃO)

27

foreign direct investment. A

generally fair and unrigged by-

election was held in 2012. With

greater civic liberty, the opposition

party National League for

Democracy led by Aung San Suu

Kyi swept 43 out of the 44 seats

contested in the by-election (“India

Plays Catch-Up” 2012).

The political changes posed new

challenges to China’s status in

Myanmar. In the past, China

benefited from Western economic

sanctions on Myanmar. Without the

competition of Western capital,

Chinese enterprises and workers

were able to fill the gap. The strong

presence of Chinese capital and

people fuelled anti-Chinese

sentiments. Both Myanmar

government and people were

suspicious of China’s intention of

sending armed patrols outside its

borders down the Mekong Rivers

after 13 Chinese sailors were killed

in Thailand in 2011. Lots of

Myanmar people complained that

Chinese businessmen made fortunes

by marking up their exports to

Myanmar and paying bribery to

collaborate with Myanmar officials

on various ventures. In large

construction, Chinese contractors

may hire Chinese, not local workers,

and use made-in-China but not

local raw materials. The average

Myanmar people benefited little from

the Chinese business activities. Anti-

Chinese sentiments could have been

easily suppressed if Myanmar had

remained military dictatorship. The

recent democratization has allowed

greater freedom of association and

led to the formation of NGOs. Some

Myanmar NGOs were aggrieved with

Chinese enterprises’ construction of

irrigation and hydroelectric projects,

oil and natural gaspipelines, and

roads which have displaced

residents, affected their ways of

lives, and destroyed the

environment with little or no

compensation in return. They

organized residents to protest

against these projects. The Chinese

side usually claimed that

compensation had been paid to the

affected residents. Nevertheless,

much of the money was believed to

be embezzled by corrupt officials

(Sun 2012b).

Worst of all, when China dealt

with Myanmar (and other countries),

it only made deals at government

level. It seldom engaged the NGOs

in other countries. Therefore it often

failed to consider public opinions in

other countries on the policies of

Chinese governments and activities

of Chinese firms and people. The

political change in Myanmar

pressured the government to be

more sensitive to public opinions.

The ignorance of Myanmar’s public

opinions eventually backfired: In

face of public resentment against

the Chinese-funded Myitsone dam

project with a price tag of US$3.6

billion, Myanmar government halted

the project altogether in 2011

Page 28: Pacta (8ª EDIÇÃO)

28

(“Relations with Myanmar, 2012;

Fuller, 2011). In the city of

Mandalay – the cultural and

religious centre of Mandalay –

Chinese businesses and people were

prominent. The strong presence of

Chinese billboards, characters, and

other cultural symbols raised the

eyebrows of local people. Some

Chinese shops were forced by

Myanmar officials to remove their

Chinese signs (“Insight: As Myanmar

opens”2012; Spegele 2011).

The political changes in

Myanmar may also weaken China’s

leverage on Myanmar through the

return of Western political and

economic influences. Myanmar was

the only Southeast Asian country

that is closed to US. The US

tightened long-standing economic

sanctions after 2003 Depayin

Incident in which opposition leader

Aung San Suu Kyi and their

supporters were attacked by thugs

suspected to be sponsored by the

military junta. The US stepped up

its economic sanctions after the

violent crackdown on anti-

government protest in Yangon in

September 2007. These sanctions

produced little progress in

undermining the military junta or

improving the people’s livelihood. US

policy community on Myanmar

affairs has been called upon to

rethink its policy (Holliday 2005).

Democratization in Myanmar

and its improved human right

conditions opened up a window for

the US to start dialogue with the

government. In 2011, US Secretary

of State Hillary Clinton paid a visit

to Myanmar, being the highest

ranking US officials visiting the

country in more than 50 years.

Later on, US resumed sending its

ambassador to Myanmar and

allowed US enterprises to invest in

Myanmar (Blanchard 2012). The ice-

breaking visit of Hillary Clinton was

followed by other Western leaders.

British Prime Minister David Cameron

visited Myanmar. Soon afterwards,

European Council suspended

economic sanctions on Myanmar

while the sanctions on arm trade

remained. Agricultural assistance

worth 150 million Euro was offered

(Wang 2012; Zhang 2012). The

renewed contacts of Western

countries with Myanmar may affect

the belief of the Chinese leaders

that Myanmar is China’s bulwark

against Western encirclement from

its south west.

China’s interests in Myanmar are

also challenged by India. India has

close historical relations with

Myanmar. British India oversaw

Burma before the two countries’

independence. Indian entrepreneurs,

professionals, and public

administrators once played

significant roles in Burmese

economy, professions, and public

administration. However, Indian’s

historical dominance did not sit

comfortably with Myanmar’s

nationalistic sentiments. Their

Page 29: Pacta (8ª EDIÇÃO)

29

relations were strained by

Myanmar’s dismal human right

record. In addition, India was

annoyed by Myanmar indifference to

the rebel guerillas from Manipur

state in the northeast India. These

rebels took refuge in the forests of

northern Myanmar to flee Indian

army’s attack. In order to pressure

Myanmar for hardening its policies

towards these rebels, India once

provided assistance to the armed

ethnic groups in Myanmar and

followed the Western countries to

impose economic sanctions

(Egreteau 2008).

In 1991, India started to turn its

attention to Southeast Asia under

its “Look East Policy” in a bid to

jump on the bandwagon of the

growing Southeast Asian economies.

Myanmar was India’s gateway to this

region. Out of the economic motive,

India invested in the construction of

railway, port facilities to improve the

land transportation between the two

countries. Besides, India participated

in hydropower projects and

exploration of oil, gas,

timber, and precious

stones (Egreteau

2008). In May 2012,

Indian Prime Minister

Manmohan Singh

visited Myanmar to

sign 12 agreements on

agriculture, cultural

exchange, information

technology, and civil

aviation. Meanwhile,

India would provide Myanmar with

credits of US$ 500 million (Prime

Minister’s Office 2012).

In order not to depend too

much on China for weapon supply,

Myanmar diversifies its sources of

weapon procurement to Russia,

Israel, and Singapore. Myanmar

brought in other countries and

regional organizations to

counterbalance China. Energy

projects were signed with India,

Thailand, and South Korea. In June

1997, Bangladesh, India, Sri Lanka,

and Thailand formed a regional

organization called Bangladesh,

India, Sri Lanka, and Thailand

Economic Cooperation (BIST-EC).

Myanmar attended their first plenary

meeting as an observer. In

December 1997, Myanmar joined

BIST-EC which was then renamed

BIMST-EC (Bangladesh, India,

Myanmar, Sri Lanka, and Thailand

Economic Cooperation). With the

admission Bhutan and Nepal as new

member countries, BIMST-EC was

renamed Bay of Bengal Initiative for

Page 30: Pacta (8ª EDIÇÃO)

30

MultiSectoral Technical and

Economic Cooperation (BIMSTEC) in

2004. BIMSTEC agreed to establish

a free trade area among the

member countries to stimulate

trade, commerce, and investment.

Moreover, it identified 13 areas of

cooperation, namely trade and

investment, transport and

communication, energy, tourism,

technology, fisheries, agriculture,

public health, poverty alleviation,

counter-terrorism and transnational

crime, environment and natural

disaster management, culture, and

people to people contact. Myanmar

took the lead in energy and

agriculture cooperation (The Halal

Science Center, Chulalongkorn

University 2008).

Concluding Remarks

China and Myanmar are tied with

each other by strategic

considerations. China looks at

Myanmar’s natural resources and

geographical positions and Myanmar

is reliant on China’s support for

fighting Western isolation, supplying

weapons, and developing the

economy. The political changes in

Myanmar and the increasing civic

liberty allow Myanmar leadership to

reach out the leaders of Western

countries (such as US and UK) and

other democracies (such as India

and Japan).

In comparison to US and

China, Myanmar is a small nation.

Instead of hopelessly taking side

between the Western World and

China, Myanmar’s political leadership

is successful in balancing the two

camps. Furthermore, Myanmar is

proactive in engaging other

Southeast and South Asian

countries. By providing competing

forces with interests at stake in

Myanmar, Myanmar’s political

leadership is able to maintain their

sovereignty and independence.

Page 31: Pacta (8ª EDIÇÃO)

31

DR.ANTÓNIO PINTO PEREIRA

PROFESSOR AUXILIAR NO ISCSP

INVESTIGADOR E MEMBRO INTEGRADO DO INSTITUTO DO ORIENTE

Meus queridos amigos, “Ex Lege”é a coluna, com contornos jurídicos, que me

disponibilizei apresentar com caráter regular na Revista Pacta, já prestigiada e em sólido

plano de crescimento, num notável esforço do Núcleo de Estudantes de Relações

Internacionais do ISCSP, a quem por isso presto a minha sincera homenagem.

Neste primeiro artigo vamos fazer uma incursão à antiguidade clássica, porta de

entrada de tantos ensinamentos para o Homem, tendo-me lembrado de escrever o

presente artigo sobre:

“A importância da escrita na expansão do Direito”

1. Imaginemo-nos num tempo

remotamente distante em que eram

variadas e muito dispersas as

civilizações (normalmente conflituantes

entre si) e, por essa razão, exerciam

diminuta importância, estritamente

localizada à escala da igualmente

esparsa dimensão de cada povo. Em

consequência, era pequena a influência

dos exemplos jurídicos mais antigos nas

civilizações posteriores.

Foi o advento da nova escrita,

desenvolvida a partir dos fenícios, que

permite uma expansão homogénea do

Direito num mundo então cada vez mais

interligado. Até essa altura os dois

sistemas dominantes eram (1) a escrita

cuneiforme suméria e (2) os hieróglifos

egípcios:

— O sumério foi a primeira

língua escrita conhecida. O seu sistema

de escrita chamava-se cuneiformepor

utilizar certos tipos de escrita feitos com

auxílio de objetos em forma de “cunha”.

Inicialmente a escrita representava

formas do mundo (pictogramas),que

eram gravadas em tabuletas de argila,

primeiro em sequências verticais e

depois horizontais e da esquerda para a

direita.A escrita cuneiforme foi adotada

subsequentemente pelos acadianos,

babilónicos, elamitas, hititas e assírios e

adaptada para escreveremnos seus

próprios idiomas; foi extensamente

usada na Mesopotâmia durante

aproximadamente 3 mil anos, apesar da

natureza silábica do manuscrito (como

foi estabelecido pelos sumérios) não ser

intuitiva aos que falavam os idiomas

semíticos.

— O sistema hieroglífico

assentava em hieróglifos, termo

originário de duas palavras gregas:

ἱερός (hierós) "sagrado", e γλύφειν

(glýphein) "escrita", e era cada um dos

sinais da escrita de antigas civilizações

EX LEGE: “A IMPORTÂNCIA DA ESCRITA NA EXPANSÃO DO DIREITO”

Page 32: Pacta (8ª EDIÇÃO)

32

usada pelos egípcios, pelos hititas e

pelos maias.Além disso, era uma

linguagem hermética e enigmática,

apenas conhecida pelos sacerdotes, os

membros da realeza, os altos cargos e os

escribas, que sabiam a arte oculta de ler

e de escrever esses sinais "sagrados".A

escrita hieroglífica constitui

provavelmente o mais antigo sistema

organizado de escrita no mundo, e era

vocacionada principalmente para

inscrições formais nas paredes dos

templos e nos túmulos.Os hieróglifos

foram usados durante um período de

3.500 anos para escrever a antiga língua

do povo egípcio.

2. É neste contexto evolutivo

que surge a Fenícia (em fenício:

, Knaˁn; em hebraico: כנען, Kna'an;

em grego antigo: Φοινίκη, Phoiníkē;

em latim: Phœnicia; em árabe:

يا ق ي ن ي uma antigacivilização cujo ,(ف

epicentro se localizava no norte da

antiga Canaã, ao longo das regiões

litorais dos atuais Líbano, Síria e norte

de Israel. A civilização fenícia foi uma

cultura comercial marítima

empreendedora que se espalhou por

todo o mar mediterrâneo durante o

período situado entre 1500 a.C. e 300

a.C.

Os fenícios foram a primeira

sociedade a fazer uso extenso, ao nível

estadual, do alfabeto. Mas a sua

principal conquista deve-se a uma razão

puramente pragmática: os fenícios

precisavam de um veículo de

comunicação que facilitasse as relações

de comércio entre os povos. Na

realidade, o sistema cuneiforme sumério

e os hieróglifos egípcios na altura em

uso eram muito pouco práticos, já que

dispunham de milhares de ícones e de

símbolos muito variados. Tornava-se

uma enorme perda de tempo para esse

povo, conhecido pela sua vastíssima

atividade de comércio marítimo,

desenvolver os seus negócios do dia-a-

dia, por implicarem enorme volume de

registo de cargas e de destinos, de

embarcações e de mantimentos, de

marinheiros e de armamento, em várias

línguas diferentes. Daí que os fenícios

tenham desenvolvido um novo sistema

de anotação, usando um simples

alfabeto (o alfabeto fenício), com vinte

e duas letras. Assim como o alfabeto

árabe e o hebraico, o alfabeto fenício

contrasta com os sistemas anteriores por

não ter símbolos e por representar sons

de vogais; cada símbolo representa uma

consoante, ao passo que as vogais

precisavam de ser deduzidas no

contexto de cada palavra.

3. O idioma fenício, que

pertence ao grupo canaanita da família

linguística semita, cedo se tornou a base

de toda a língua moderna ocidental e

oriental, adotada inicialmente pelos

vizinhos dos fenícios e depois alargada

a todos os países com quem

negociavam, entre os quais os hebreus

(razão pela qual a escrita hebraica é

virtualmente semelhante à fenícia),

tendo influenciado os alfabetos

aramaico, hebraico e arábico, bem como

diversos outros, desde o Norte de África

e Europa, onde foi adotado pelos

antigos gregos, que o passaram aos

etruscos, que por sua vez o repassaram

aos romanos.

É essa expansão devida a um

sistema de escrita mais ou menos

uniforme e acessível aos diferentes

povos, transformado num veículo

comum de disseminação do

conhecimento, que os romanos utilizam

ao longo do vasto território que integra

o seu império. E é também assim que a

escrita fenícia permite a expansão dos

sólidos institutos jurídicos a partir do

período áureo do Imperium Romanum.

Page 33: Pacta (8ª EDIÇÃO)

33

DR.TIAGO FERREIRA LOPES

INVESTIGADOR DO INSTITUTO DO ORIENTE

No século XVI os Kumyks, terceiro

grupo étnico com maior densidade

populacional no Daguestão

(República da Federação da Rússia

localizada no Distrito Federal do

Cáucaso Norte), constituíram a sua

primeira estrutura de poder: o

Shamkhalato de Tarki. O

Shamkhalato de Tarki provou, desde

logo, ser um adversário de peso

contra os intentos do Império Persa

e do Império Russo apesar de ter

uma população inferior a 300.000

habitantes.

Tarki, que contava somente

com a ferocidade dos seus

soldados e com as várias

peculiaridades morfológicas do

território, conseguiu vencer batalhas

contra os Impérios (Russo e Persa),

contra os khanatos, khaganatos,

principados e reinos circundantes. A

sua rede de contactos era vasta

mas o Shamkhal, líder do

Shamkhalato, sabia que contactos e

aliados são coisas distintas e, por

isso, votou-se ao isolamento no seu

palácio.

A resiliência de Tarki levou a

que o cristianizado Reino da Ibéria

(Geórgia Oriental) pedisse auxílio ao

Czar do Norte. A delegação que

procurou a ajuda do Império Russo

em 1586 não podia saber que dois

séculos depois o “Tratado de

Georgievski” (1783) assinalaria o

princípio do fim da independência. E

o amigo do Norte, o protector de

longa data, tornar-se-ia suserano no

século seguinte. A Ibéria ficou

serena. Não se atacam aliados!

A chegada dos Russos

empurrou Tarki para uma aliança

com a Pérsia Safávida. A derrota da

Pérsia frente aos Russos levaria o

Shamkhal a jurar lealdade a

Petersburgo em 1803. Anos depois

o Shamkhalato seria dissolvido e

transformado em província. Os

Circasses, a Ocidente, também

começaram por se aliar (via

matrimónio) ao Império do Norte e

acabaram por ser conquistados pelo

aliado.

É curioso, de resto, como

não raras vezes o Aliado se torna

no problema. Em política não é

novo que o Aliado apenas o é

enquanto servir os seus interesses.

Portugal e a Inglaterra viveram essa

tensão ao longo da sua História

Diplomática. Não foram poucos os

momentos em que Sua Majestade

da Ilha atacou descaradamente os

interesses da Lusitânia e os

Lusitanos, muitas das vezes, apenas

CADERNOS DO TIAGUISTÃO: “NÃO SE ATACAM ALIADOS”

Page 34: Pacta (8ª EDIÇÃO)

34

puderam sorrir… Afinal, Não se

atacam aliados!

Na Pérsia, quando o Trono

do Pavão mostrava sinais de

fraqueza, os Estados Unidos da

América decidiram apoiar a

sublevação contra um Primeiro-

Ministro eleito abrindo caminho a

uma Revolução que instaurou uma

República Teocrática. O aliado dos

EUA passou a inimigo mortal. Os

EUA ficaram sem saber o que fazer,

porque se é verdade que Não se

atacam aliados o que fazer a ex-

aliados?

No Afeganistão os mesmos

EUA, cuja noção de lealdade é tão

consistente como gelo no deserto,

apoiaram um Osama para combater

os “Vermelhos”. Deram-lhe armas,

dinheiro, treino, condições e depois,

muitos anos depois, lançaram-se

numa luta contra esse mesmo

Osama porque esse Osama os

atacara! Isto sabendo Osama que

não se atacam aliados, porque

aliado ferido é pior do que

“socialite” que não faz capa de

revista…

Os EUA têm, de resto, um

claro problema com os seus

aliados, como acontecera com o

Império Russo. O aliado passa a

inimigo, com a mesma velocidade

com que viaja o som. Ao perder o

aliado iraniano, os EUA voltaram-se

para o Iraque e apertaram a mão a

um tal de Hussein. O mesmo

Hussein seria feito cidadão

honorário de Detroit que, ironia dos

tempos, declarou bancarrota

recentemente. Falta agora dinheiro

em Detroit, mas há muito que já

faltava moralidade nos EUA…

O aliado Hussein, o tal que

controlava o Iraque contra o Irão (o

mesmo que passou de aliado a ex-

aliado com uma mãozinha dos

EUA), passou a inimigo terrível e em

2003 teve mesmo que se despoletar

uma guerra. Não se atacam aliados,

a não ser que se demonizem os

mesmos; que se inventem

narrativas; que se criem argumentos

para autoconsumo e para

satisfação de uns contra o bem-

estar (e a vida!) de muitos.

Voltemos ao Afeganistão.

Portanto, os EUA apoiaram o

Osama contra a “Ameaça

Vermelha”. O Osama atacou os

EUA. Os EUA transformaram um

aliado, mais um, em inimigo mortal!

Os EUA tentaram caçar o Osama. E

quando outro Hussein, de primeiro

nome Barack, chegou à liderança

dos EUA, Osama foi capturado e

morto. Mas claro que Não se

atacam aliados, a não ser quando

é mesmo preciso!

No Leste Europeu a Moldova,

a Ucrânia e a Bielorrússia

descobrem agora que por vezes o

aliado não tem que materializar o

ataque, para atacar na mesma. A

tentativa de olhar para Bruxelas

deixou Moscovo nervosa. Os avisos

têm sido muitos. Moscovo sabe,

claro que sabe, que não se atacam

aliados. Mas também sabe que

aliado mais fraco não é aliado

(ideia que subentende uma paridade

de forças) e por isso nada do que

está a ser feito é um ataque…

Page 35: Pacta (8ª EDIÇÃO)

35

É talvez por não se atacarem

aliados que a China e a Rússia

dançam juntas no Conselho de

Segurança da ONU. As mesmas

aliadas com assuntos por resolver

na Sibéria e na fronteira com a

Mongólia. As mesmas aliadas que

se enfrentam diplomática e

financeiramente na Ásia Central

para reconstruir e projectar poder.

Mas até ao momento mantém-se

tudo sereno, já que Não se atacam

aliados!

No espaço de Bruxelas, na

Casa dos 28 (ou dos 27+1 como

prefere o Reino Unido), não se

atacam aliados. Antes

regulamentam-se relações,

modificam-se condições, aumentam-

se pressões, vendem-se ilusões,

criam-se situações mas não se

atacam aliados. Nenhum dos 27+1

vale mais do que os outros, mas

uns são mais iguais do que outros.

E assim não se atacam aliados,

porque não existem aliados para

atacar!

No cantinho da Ibéria

Peninsular não se atacam aliados,

mas atacam-se as pretensões dos

aliados. E assim ventos de Castela

dizem ao mundo que os intentos

marítimos de Lisboa não são sérios

e muito menos são legítimos. As

mesmas vozes que falam de

irmandade e de união fraterna luso-

espanhola, clamam pelo fracasso

dos planos de Lisboa. Mas, como

todos sabemos, não se atacam

aliados. Já parentes e enteados…

Não se atacam aliados,

porque não há aliados. Há sorrisos,

apertos de mão, flashes, canetas

MontBlanc, assinaturas de “coisas”,

garrafas de champanhe, mais

sorrisos, promessas com a

consistência de sorvete derretido

mas não há aliados. Há o aliar de

planos, de objectivos comuns. Há o

circunstancialismo da amizade

formalizada pela diplomacia, mas

não há aliados. Há juras de

fidelidade, quase como um

Cavaleiro medieval a uma donzela,

mas não há aliados. E é este não

haver aliados, com a seriedade e

dignidade que o vocábulo impõe,

que nos explica a

contemporaneidade.

Page 36: Pacta (8ª EDIÇÃO)

36

DRA. MARIA FERREIRA

PROFESSORA AUXILIAR NO ISCSP

O conceito de risco tem

vindo a assumir uma

importância fundamental

no contexto politológico

doméstico e global. Neste

sentido, a obra ‘Risk’ de

Deborah Lupton constitui

uma preciosa

contribuição para a

teorização sobre o

referido conceito. Lupton

considera o conceito de

risco como um produto

da modernidade. Com

efeito, a necessidade e vontade humanas

de controlar as condições da sua existência

derivam da percepção de que o risco não

deve ser naturalizado e articulado com o

destino ou a vontade divinas. A

necessidade de dominar a contingência da

condição humana e de dotar de ordem a

realidade social conduziu as sociedades

modernas ao desenvolvimento de

estratégias de controlo do risco.

A tentativa de reduzir a

contingência inerente à existência humana

está directamente articulada com a

secularização das sociedades e com a

progressiva racionalização das tecnologias

de governação dos estados modernos. A

modernidade marca a industrialização das

sociedades e a afirmação do liberalismo

económico e do liberalismo político. A

generalização da ideia de que a

legitimidade dos aparelhos políticos advém

do contrato social e o desenvolvimento de

técnicas de controlo quantitativo e

qualitativo dos fluxos populacionais conduz

à personificação e socialização do risco.

Instrumentos como a estatística, o cálculo

de probabilidades, a epidemiologia ou os

estudos demográficos populacionais foram

criados e pensados com o objectivo de

controlar as características da população e

isolar potenciais factores de risco. Neste

contexto, a articulação entre o controlo do

risco e a governamentalização das

sociedades torna-se essencial. O risco

passa a ser perspectivado como um factor

passível de ser antecipado, evitado ou os

seus efeitos minimizados. As expectativas

geradas no seio das sociedades modernas,

bem como a progressiva racionalização dos

aparelhos governativos e a sofisticação das

políticas públicas vieram exigir o controlo

dos factores de risco e de incerteza. Se a

pré-modernidade assumia o risco como

uma condição natural da vida humana e

social, a modernidade passou a considerar

tanto o risco como a incerteza como

entidades objetivas e ontologicamente

invariáveis. A essencialização do risco e a

reificação do mesmo como um dado

objetivo passível de medição e de controlo

caracteriza a perspetiva racionalista e

científico-cognitiva sobre o risco e a

incerteza nas sociedades contemporâneas.

Todavia, a pós-modernidade, e

como Lupton discute exaustivamente, traz

a desconstrução das perspetivas

racionalistas sobre o risco. As abordagens

construtivistas e pós-estruturalistas,

características da pós-modernidade, não

tratam o risco como um dado objetivo, mas

sim como uma construção social ou uma

tecnologia de governo. Estas abordagens

recusam o racionalismo e positivismo

inerentes à cristalização do risco como um

fato objetivo e salientam de que forma o

risco depende de considerações culturais

RECENSÃO CRÍTICA: ‘RISK’, DEBORAH LUPTON

Page 37: Pacta (8ª EDIÇÃO)

37

coletivas e de vontades de poder.

Considerar o risco de uma perspetiva

cultural ou pós-estruturalista permite-nos

desconstruir tanto as premissas

subjacentes às políticas públicas internas

como as premissas que se encontram

subjacentes à política externa dos estados

e, de uma forma mais geral, à política

internacional. Por que razão as ameaças à

segurança dos estados são representadas

como excecionalmente graves e passíveis

de legitimar a securitização do ambiente

internacional e as ameaças à segurança

humana dos indivíduos são negligenciadas

e tratadas como hierarquicamente

inferiores? Qual o interesse dos estados na

promoção de comportamentos e hábitos

sociais de prevenção absoluta do risco? De

que forma o risco se tornou uma

tecnologia de poder e de governo capaz de

disciplinar e determinar as políticas

migratórias dos estados através da

definição de grupos biopolíticos de risco. A

resposta a estas questões exige uma leitura

atenta da literatura disponível sobre o

conceito de risco, bem como uma

discussão politológica profunda sobre o

mesmo conceito.

Segue-nos no

facebook:

www.facebook.com/PACTARI

Page 38: Pacta (8ª EDIÇÃO)

38

POR ISABEL ALVES

Esta história – a

minha história – começou

com o blogue pessoal DA

pessoa que me inspirou com a

sua experiência e que me

levou a conhecer o mundo

que é a AIESEC.

Mas o que é a AIESEC? “A

AIESEC é uma organização

sem fins lucrativos, global,

não política, independente

gerida por estudantes e

recém-licenciados do ensino

superior.”

Comecemos então. A AIESEC proporciona

estágios internacionais de voluntariado e

profissional, como também os programas

team member e team leader. Eu optei pelo

estágio de voluntariado, que foi sempre o

que quis fazer, mas nunca soube

como.Candidatei-me em Fevereiro de 2012

para viajar em Julho. A experiência na

AIESEC começa na sessão de

esclarecimento, seguindo-se do processo

de selecção que consiste na dinâmica de

grupo, no teste de inglês, na review board

(entrevista) e na OPS (fim-de-semana com a

AIESEC). Se passares a todos estes passos,

podes começar logo a procurar o teu

estágio, que o encontrarás na base de

dados. Como já nada é de graça, a AIESEC

tem um custo e a viagem fica por tua conta,

sem nenhuns apoios ou bolsas (mas vale a

pena!).

Podes-te inscrever num dos vários

recrutamentos que acontecem ao longo do

ano no websitewww.aiesec.pt

Falando da minha experiência,

bem, foi fantástica e foram talvez as

melhores seis semanas da minha vida! Eu

fui para Siem Reap, no Camboja, dar aulas

de inglês a crianças órfãs e pobres numa

ONG. Na AIESEC, preparam-nos para o

choque cultural, mas nunca sempre é

suficiente, porque entramos numa cultura

completamente oposta da nossa, à qual

não estamos habituados. Lembro-me de

esperar uma hora no aeroporto, e chegar a

pessoa responsável para me levar à casa

onde iria ficar de scooter, e eu tinha uma

mala de porão cheia de donativos, uma

mala pesadíssima às costas e ainda uma

mala de mão! Foi um começo em cheio!

Chorei tanto nos primeiros dias porque não

estava habituada à comida e tinha imensa

fome, estava longe de casa, o meu cartão

de crédito não funcionava, nem a internet e

nem o telemóvel, e tinha de atravessar

estradas de trânsito caóticas de bicicleta.

Após uma semana, já estava instalada e

tudo a funcionar (quase) bem. Acordava

EXPERIÊNCIA: VOLUNTARIADO NO CAMBOJA

Page 39: Pacta (8ª EDIÇÃO)

39

sempre cedo para dar aulas, tinha de as

preparar pois não tinha nenhum programa

para seguir, brincava com as crianças e

trabalhava no meu projecto de recolha de

fundos para a escola. Na casa onde fiquei,

partilhava quarto e vivia com pessoas da

China, da Bélgica, da Suíça, dos EUA, de

Singapura, etc., e é uma experiência

maravilhosa conhecer tantas pessoas com

culturas diferentes, para além das amizades

que se fazem e das pessoas que se

conhecem ao viajar pelo país! Eu tentava

viajar sempre ao fim-de-semana, ao estilo

dos backpackers, e lembro-me de ficar em

hostels por dois dólares à noite. Houve uma

vez que fiquei num bungalow, em Ratanikiri

no Nordeste do Camboja, e de ter visto

uma aranha do tamanho da minha mão,

que julgo ter sido uma tarântula, bem junto

à minha mala!

As crianças às quais dava aulas

viviam com quase nada, mas eram tão

alegres, e foi essencialmente o que aprendi,

que podemos ser felizes com pouco, o

importante é estarmos rodeados de

pessoas que nos fazem feliz. Como não

tinham nada, decidi colocar um pouco de

empreendedorismo social jovem e criar um

projecto de recolha de fundos e com esse

dinheiro, que foi mais do que sequer

esperava, comprei armários, material

escolar e imensos livros, coisas que não

tinham na escola pela falta de fundos. Era

uma escola para brincar quase. Lancei a

campanha via facebook e enviei e-mails

para várias pessoas, de forma a que

chegasse a todos.

Hoje, lembro-me de negociar com

os tuc-tucs drivers; de chorar com a comida

picante; de sofrer com os mosquitos; de

dançar na areia da ilha de Koh Rong; de

sentir o mundo nas minhas mãos quando

abraçava as crianças; da menina que queria

vender-me uma pulseira e disse para

jogarmos à pedra, papel, tesoura, para lhe

poder comprar uma pulseira; de fazer

viagens de 10h de autocarro; de comer o

melhor gelado da minha vida; do amok; do

cheiro dos mercados; dos sons “Hellô

Laidiiiiiiiiiiiii, you want scarve? Good price

for youuu!”; dos fruit shakes de maracujá;

do mangustão; da festa de aniversário que

preparámos para as crianças; do dia de

praia com elas; e de conhecer pessoas tão

inspiradoras. Podem considerar alguns

destes momentos não tão agradáveis, mas

vejo que foram momentos inesquecíveis e

que cresci imenso como pessoa. Não foram

só eles que aprenderam com as minhas

aulas, como também aprendi o que é viver

de modo simples, adaptarmo-nos para

superar as dificuldades, sempre com um

sorriso na cara.

Aconselho vivamente esta

experiência, e como a revista não é só para

este artigo, se estiverem interessados no

meu relato de voluntariado mais detalhado,

visitem o meu blogue

www.dovestamiavaligia.wordpress.com,

aqui e no facebook!

Com a AIESEC, podes fazer voluntariado em

mais de 110 países!