Os próximos fez dias na China serão cruciais · Se a China paralisou por 15 dias, uma semana do...

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Sem Opção Veículo: O Globo - Caderno: Economia - Seção: Não Especificado - Assunto: Economia - Página: 28 - Publicação: 02/02/20 URL Original: Os próximos fez dias na China serão cruciais ‘OS PRÓXIMOS DEZ DIAS NA CHINA SERÃO CRUCIAIS’ Especialista em economia chinesa compara crise do coronavírus à greve dos caminhoneiros no Brasil e vê possibilidade de rápida recuperação O Globo 2 Feb 2020 HENRIQUE GOMES BATISTA [email protected] SÃO PAULO EDILSON DANTAS Fabiana D’Atri. Para economista do Bradesco, é cedo para apontar impacto econômico permanente da crise na China Pelo que se sabe até agora, o impacto do coronavírus na economia chinesa tende a ser semelhante ao vivido pelo Brasil na greve de caminhoneiros de 2018: pontual e temporário. A avaliação é de Fabiana D’Atri, economista do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco e integrante do Conselho Empresarial Brasil-China, sobre o rápido avanço da epidemia que paralisou o país asiático e abalou mercados no mundo. Estudiosa da segunda maior economia do planeta, Fabiana admite que a suspensão de atividades econômicas na China por duas semanas pode reduzir o PIB do país em 1,5 ponto

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Veículo: O Globo - Caderno: Economia - Seção: Não Especificado - Assunto:Economia - Página: 28 - Publicação: 02/02/20URL Original:

Os próximos fez dias na China serão cruciais‘OS PRÓXIMOS DEZ DIAS NA CHINA SERÃO CRUCIAIS’Especialista em economia chinesa compara crise do coronavírus à greve doscaminhoneiros no Brasil e vê possibilidade de rápida recuperação

O Globo2 Feb 2020HENRIQUE GOMES BATISTA [email protected] SÃO PAULO

EDILSON DANTASFabiana D’Atri. Para economista do Bradesco, é cedo para apontar impacto econômico permanente da crise naChinaPelo que se sabe até agora, o impacto do coronavírus na economia chinesa tende a ser semelhante ao vivido pelo Brasil nagreve de caminhoneiros de 2018: pontual e temporário. A avaliação é de Fabiana D’Atri, economista do Departamento dePesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco e integrante do Conselho Empresarial Brasil-China, sobre o rápido avanço daepidemia que paralisou o país asiático e abalou mercados no mundo. Estudiosa da segunda maior economia do planeta, Fabianaadmite que a suspensão de atividades econômicas na China por duas semanas pode reduzir o PIB do país em 1,5 ponto

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percentual, mas acredita que isso será concentrado no primeirosemestre, compossibilidade de recuperação na segundam etadedo ano. Se o cenários e confirmar, o efeitos obre o Brasil, que tem na China seu maior parceiro comercial, também tende a serlimitado. Masa alta volatilidade dos preços das commoditie sedo dólar deve perdurar por um bom tempo, alerta a economista.Neste momento, qual a dimensão possível do impacto econômico desta epidemia do coronavírus na economia?Oque agente consegue ver, porora,éoimpac tona China. Estamos trabalhando com algo como uma perda de 1,5 pontopercentual do PIB, principalmente neste primeiro trimestre, mas também um pouco no segundo. Considerando que grande partedesta perda pode se recuperar no segundo semestre, isso levaria o PIB do anona China acrescer 5,6%, em vez da nossa previsãoanterior de 5,8%. Sabemos que o mercado tinha projeções diferentes, algumas mais pessimistas, masa maioria está indo nestadireção, inclusive tendo (a epidemia do) Sars (em 2003) como referência.E a economia global?Se a China paralisou por 15 dias, uma semana do feriado (do Ano Novo chinês) mais uma estendida, queéa informação quetemos agora, vai demandar menos do mundo neste período. Mas isso não significa que demandará menos lá na frente. Acadaqueda de 1,5 ponto percentual no PIB da China você tem uma retração de 0,3 ponto no do mundo. O peso do país é de 20% naeconomia global, mas temos que calibrar estes impactos. Uma coisa são os serviços internos, como ninguém te rido aorestaurante neste período. Quando avida retoma, não se compensa isso indo duas vezes seguidas ao restaurante. É algosemelhante a oque tivemos coma greve dos caminhoneiros no Brasil, em 2018. Mas quando falamos de produtoscomercializáveis e não de serviços, é possível recuperar depois. Parece muito cedo para imaginar que a China não retomará suaatividade de construção e de indústria este ano aponto de não demandar matérias-primas. Isso não deve ocorrer. A epidemiapode retirar algo do crescimento mundial do ano, masal gomais concentrado no primeiro trimestre. É justamente no momentoem que havia expectativa de retomada do crescimento (global) por causa do acordo comercial China-EUA. Agora isso pode serfrustrado ou postergado.E a cadeia mundial de produção baseada em insumos e produtos chineses?Você pode te rum período de descasamento, mas há estoques no mundo. O Brasil tem estoque da maior parte dos produtos quevêm da China, então isso é administrável. E, neste momento de isolamento, a China não está vendendo internamente. Par tedaprodução para o mercado doméstico pode ser direcionada para o global. Empresas de comércio internacional não estão vendomotivo de preocupação sobre disrupção de cadeias de fornecimento. Os impactos da China demandando e ofertando não devemser significativos.Há um inferno astral chinês? Houve a tensão com os EUA, a crise com Hong Kong, a febre suína e agora o coronavírus…Não gosto dessa abordagem. A China está com uma gestão de crise do coronavírus assertiva, pró-ativa e bastante transparente,se comparada a outros momentos. Derivações disso para questões geopolíticas são precipitadas.Qual a chance de o cenário ser pior que o projetado até agora?Como economista, não tenho capacidade de avaliar uma epidemia. O que vemos até agoraé que a morta lida deé mais baixaque ad oS ars. Oque assusta um pouco é que o Sars, em seu ciclo total, chegou a pouco mais de 5 mil infectados. Agora jáestamos falando de dez mil em período muito menor. Na época do Sars havia umgran decrescimento mundial. Agora, agrandeexpectativa do primeiro trimestre era a retoma dacoma redução da tensão entre China e EUA. Enquanto o número de casosestiverv ariando de um dia para o outro em velocidade razoável, a preocupação ainda será latente. Na medida em queobservarmos variações diárias (no número de casos) perdendoforça, virá a sensação de que o vírus está sendo contido. Ospróximos dez dias serão cruciais para recalibraras expectativas. Se o cenário piorar, aumentam as chances de impacto nascadeias internacionais e na demanda da China. Mas ainda não temos informações nesse sentido.Na comparação com o caso Sars, a economia agora é muito mais integrada…Sim. Em 2003, a China estava num momento recente de internacionalização, entre 2% e 3% do comércio global. Hoje estápróxima a 12%. O número de chineses circulando no mundo é muito maior. A participação do PIB chinês na economia mundialhoje é praticamente o dobro daquele período. A preocupação é muito maior agora. Mesmo assim, na epidemia do Sars, omercado reagiu, preços de commodities e bolsas caíram, mas se recuperaram em pouco tempo, mesmo na China.A epidemia está concentrada em províncias com grande peso econômico. Isso agrava as consequências econômicas?Há uma concentração na região deWu han. Umac ois aéo tratamento da epidemia, é preciso ver como a China vai trata risso.Outraéa paralisação do país. Ofer ia doénacional.É preciso vero todo.Wu han não tem uma participação tão relevante assim noPIB da China, cerca de 5%, mas é um ponto logístico importante na distribuição de mercadorias e pessoas. Isso dificulta aretomada e aumenta custos. Mas não se trata de uma região exportadora. Só 1% das exportações chinesas vêm de lá.Qual será o impacto para exportadores brasileiros, como o agronegócio?Se pensarmos que 15 dias de paralisação são administráveis, parece muito cedo para prever impactos no Brasil. O agronegóciobrasileiro está sendo muito mais impactado pela febre suína, pois há a expectativa de que o rebanho de porcos na China nãoserá reposto neste ano, e a demanda por proteína continua elevada.Oque pode te réu ma interrupção temporária em cadeiascomo as de construção, o que geraria menor demanda de minério de ferro, por exemplo. Mas 15 ou 20 dias, coma retomada lánafrente, parece pouco. Por ora, parece( um efeito) neutro, sendo necessário só fazer uma gestão de estoque e olhar o fluxo deembarques. É algo pontual, como a greve dos caminhoneiros no Brasil.Mas a China tem capacidade de reação muito maior que a do Brasil após a greve...Sim, o país é maior. Por outro lado, pode ser que o períododechoquesejamaisprolongado que a nossa greve.

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Como empresas e governos precisam se preparar para esta crise do coronavírus?O primeiro ponto é observar esta desaceleração global. Se a China cresce menos no primeiro trimestre, o mundo inteiro crescemenos. De fato, vamos ver uma retomada não tão vibrante ou uma frustração dela. Mas há outros impactos, como no preço dopetróleo, que influi em preços importantes, como odos combustíveis. O importante é saber separar oqueé pontual doqueépermanente. Por enquanto não temos qualquer evidência de impacto permanente.A volatilidade do mercado financeiro deve seguir em alta?Sim. Enquanto agente não souber o período de interrupção das atividades na China e até quando os casos da doençacontinuarão crescendo com vigor, haverá incerteza, e a volatilidade tende a ser mais alta.“Parece muito cedo para imaginar que a China não retomará sua atividade de construção e de indústria este ano a ponto de nãodemandar matérias-primas. Isso não deve ocorrer.”

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