Os Primeiros Trabalhos Com Drosophila Melanogaster

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    O S PRIMEIROS TRABALHOS COMD ROSOPHILA MELANOGASTER

    Objetivos1. Analisar o experimento de Morgan (1910) com o

    mutante white de Drosophila melanogaster .2. Comparar os resultados de Morgan (1910) com

    os de Doncaster e Reynor (1906).3. Discutir as hipteses de Morgan para explicar os

    resultados dos experimentos com o mutante

    white .4. Explicar herana ligada ao sexo com base na

    teoria cromossmica da herana.

    Nona aula(T9)

    Texto adaptado de:MOORE, J. A. Science as a Way of Knowing -Genetics.Amer. Zool. v. 26: p. 583-747, 1986.

    O MUTANTE DE OLHO BRANCO

    A mais famosa mosca na histria da Cincia um macho da espcieDrosophila melanogaster ,a mosca-da-banana, ou mosca-do-vinagre[inadequadamente chamada de mosca-das-frutas](Fig. 24).

    Este indivduo tornou-se famoso porque tinhaolhos brancos e no vermelhos como as moscasda sua espcie, mas to importante quanto istofoi o fato dele ter aparecido na Sala 613 doSchermerhorn Hallna Columbia University, na

    primavera de 1910. Esta era a Sala das Moscas,o laboratrio de Thomas Hunt Morgan e de umnotvel grupo de jovens estudantes. Abaixo, no

    mesmo edifcio, ficava o laboratrio de EdmundB. Wilson, que estava terminando a sua srie deartigos intitulada -Studies on Chromosomes.

    A mosca escolheu o momento e o lugarexatos para prolongar a sua vida curta e alcanara imortalidade. Morgan conta essa histria daseguinte forma: Em uma linhagem deDroso-phila[melanogaster ] que estava sendo acompa-nhada por aproximadamente um ano, aps umconsidervel nmero de geraes, apareceu ummacho de olhos brancos. As moscas selvagenstm olhos vermelho-brilhantes.

    O macho de olhos brancos, cruzado com suasirms de olhos vermelhos, produziu 1237 descendentes de olhos vermelhos e 3 machos deolhos brancos na gerao F 1 o aparecimentodesses trs machos de olhos brancos(F 1) (devidoevidentemente a novas alteraes) ser ignoradona presente comunicao.

    Os indivduos da gerao F1, cruzados entresi, produziram:

    2459 fmeas de olhos vermelhos,1011 machos de olhos vermelhos,782 machos de olhos brancos.

    No apareceu fmea alguma de olhosbrancos. O novo [estado do]carter mostrouser, portanto, limitado ao sexo masculino no

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    Figura 24.Imagos deDrosophila melanogaster :macho, esquerda, e fmea, direita.

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    sentido de que ele foi transmitido apenas doav para os netos. Mas o experimento a seguir mostra que o[estado do]carter no incompa-tvel com o sexo feminino.

    O[mesmo]macho de olhos brancos (mutante)foi, posteriormente, cruzado com algumas de

    suas filhas(F 1), e produziu:129 fmeas de olhos vermelhos,132 machos de olhos vermelhos,88 fmeas de olhos brancos,86 machos de olhos brancos.

    Os resultados mostram que o novo[estadodo]carter, olhos brancos, pode ser transmitidopara as fmeas por meio de cruzamentosadequados e, conseqentemente, no limitadoa um dos sexos. Ser discutido que as quatro

    classes de indivduos ocorrem aproximadamenteem nmeros iguais (25 %). Vejamos o que sepode concluir com base nesses resultados.

    O cruzamento original de um macho de olhosbrancos com fmeas de olhos vermelhos originouem F2 uma proporo de 4,3 moscas de olhosvermelhos para 1 de olhos brancos. Tal resultadopoderia ser aceito como uma proporo de 3 para1, uma vez que parecia evidente que os indivduosde olhos brancos eram menos viveis do queaqueles de olhos vermelhos (como se pode verno ltimo cruzamento de fmeas F1 com o ma-cho de olhos brancos).

    Mas interpretar este resultado como uma tpicaproporo 3 para 1 em F2 seria um exagero, umavez que a distribuio do carter olhos brancosentre fmeas e machos no era o esperado em umtpico cruzamento mendeliano. Convm lembrarque na gerao F2 do cruzamento original no haviafmeas de olhos brancos. Esta associao dehereditariedade com sexo indicava que a hiptesede Sutton poderia ser submetida a um teste crtico.Vejamos quais foram as explicaes de Morgan.

    A PRIMEIRAHIPTESE DE MORGANUma Hiptese para Explicar os Resultados

    - Os resultados que acabamos de descrever podem ser explicados pela seguinte hiptese.Admita que todos os espermatozides do machode olhos brancos possuam o fatorwhiteW;que metade dos espermatozides possua um fator sexual X e que a outra metade no possuaeste fator, i.e., o macho heterozigtico quantoao sexo. Assim a representao para o macho

    WWX, e para os dois tipos de espermato-zides: WX - W.

    Admita que todos os vulos da fmea de olhosvermelhos possuam o fatorred- R; e que todosos vulos (aps a reduo) carreguem cada um,apenas um fator X, a representao para a fmea

    de olhos vermelhos ser RRXX e para seus vulosser RX - RX. interessante notar como Morgan indicou os

    gentipos dos indivduos e dos gametas. Ele ima-ginou os fatores genticos e os cromossomos[ele usou o termo fator sexual X] como se fossemfenmenos independentes. Em nosso esquema,substitumos a simbologia originalmente usadapor Morgan, ou seja, R para o alelo para olhosvermelhos e W para o alelo para olhos brancos,

    pelo esquema mendeliano de smbolos maisculose minsculos para alelos dominantes e recessivos.Assim, foi usado o smbolowpara o alelo condi-cionante de olhos brancos eW para o alelo quecondiciona olhos vermelhos. Outro ponto paraser notado que Morgan admitiu que o machotinha apenas um cromossomo sexual (X), ou seja,eraX0, conforme havia sido determinado, incor-retamente, por Stevens. (Fig. 25)

    Alguns anos mais tarde, verificou-se que o ma-cho de D. melanogaster tem tambm umcromossomoY.

    red X whiteW W X X

    X

    P1

    F2

    Fentipos

    Fentipos egentipos

    Gentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    w w X

    W X w X w

    red

    red

    W w X X W w X

    W X

    w

    W X

    w XW W X X

    W w X X W w X

    w w X

    red

    red red

    white

    Gametas

    Figura 25.Primeira hiptese de Morgan para explicara herana do estado olhos brancos do carter cor dosolhos emDrosophila melanogaster .

    83

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    A figura 25 mostra a hiptese de Morgan paraos resultados do primeiro cruzamento do machode olhosbrancos com uma fmea de olhosvermelhos. O esquema concorda com os dados,ou seja, prev que a gerao F1 seja constitudaexclusivamente por fmeas e machos com olhos

    vermelhos. Continuando em F2, a hiptese prevque todas as fmeas tero olhos vermelhos e quemetade dos machos ter olhos vermelhos emetade, olhos brancos. No de se surpreenderque as previses da hiptese tenham sido verifi-cadas. Afinal de contas, as observaes foramfeitas antes da hiptese ter sido formulada e noteria sentido propor uma hiptese que no expli-casse os resultados j em mos.

    Porm, a hiptese s explicaria os dados se

    fosse feita uma restrio essencial. Observe osindivduos F1. Note que na formao dos gametasfemininos, metade mostrada como tendo rece-bido o fatorW juntamente com um X, e metadecomo tendo recebido o fatorw com um X. Ahiptese, entretanto, requer uma situao bemdiferente para os machos F1. Os machos somostrados como sendoWwX. Esperar-se-ia, por-tanto, quatro classes de gametas:W X, wX, W (ouW 0) ew(ouw0). Morgan reconheceu somenteduas classes de espermatozides:W X e w. Eleexplica essa sua restrio da seguinte maneira:

    necessrio admitir ... que quando as duasclasses de espermatozides so formadas pelomacho F 1 de olhos vermelhos (WwX), W e X [sempre]vo juntos - de outro modo os resultadosno seriam os obtidos. Esse ponto importante nopode ser amplamente discutido nessa comunicao.

    O TESTE DAPRIMEIRAHIPTESE

    O valor de uma hiptese no consiste apenasem explicar os fatos, mas tambm na suacapacidade de prever o que acontecer emsituaes novas. Morgan fez quatro testes de suahiptese.1. Se o gentipo dos machos de olhos brancos

    wwX e o das fmeas de olhos brancos wwXX,sua descendncia deveria ser constitudasomente de machos de olhos brancos e fmeasde olhos brancos A representao diagram-

    tica deste cruzamento segundo a hiptese deMorgan est mostrada no item1da figura 26.O cruzamento foi feito e os resultados obtidosestavam de acordo com as previses.

    2. As fmeas F2 de olhos vermelhos do primeirocruzamento (Fig. 25), apesar de serem todas

    Xwhitew w X X

    X

    P1 FentiposGentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    w w X

    w X w X w

    w w X X w w X

    1.

    red X whiteW W X X

    X

    P1 FentiposGentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    w w X

    W X w X w

    red

    red W w X X W w X

    2.

    white

    white white

    X

    F1 Fentipos egentipos

    P1 FentiposGentipos

    red

    W w X X w w X

    w X

    w

    W X

    w XW w X X

    w w X X W w X

    w w X

    red

    red

    white

    Gametas

    3.white

    white

    Xwhitew w X X

    X

    P1 FentiposGentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    W w X

    w X W X w

    W w X X w w X

    4.red

    red white

    Figura 26.Representao esquemtica dos testes daprimeira hiptese de Morgan para explicar a heranado estado olhos brancos do carter cor dos olhos emDrosophila melanogaster .

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    idnticas na aparncia, deviam ter doisgentipos,WW XX eWwXX. Se vrias dessasfmeas fossem cruzadas individualmente commachos de olhos brancos, seriam esperados doistipos de resultado como se pode ver nos itens2e3da figura 26. Aproximadamente metade doscruzamentos deveria resultar em descendnciaapenas com olhos vermelhos, enquanto a outrametade deveria produzir moscas de olhos ver-melhos e de olhos brancos, tanto machos quantofmeas. Esses cruzamentos foram feitos e osresultados previstos foram obtidos.

    3. Esperava-se que o gentipo das fmeas F1 docruzamento original (Fig. 25) fosseWwXX.Nesse caso, o cruzamento dessas fmeas comum macho de olhos brancos daria os mesmos

    resultados mostrados no item3 da figura 26.Novamente o cruzamento foi feito e osresultados previstos foram obtidos.

    4. A hiptese exigia que os machos F1 originais(Fig. 25) fossemWwX. Se esses machosfossem cruzados com fmeas de olhos brancos,a previso seria a obteno de fmeas de olhosvermelhos e machos de olhos brancos, comomostrado no item4da figura 26. Os cruzamen-tos foram feitos e a previso verificada. Maisuma vez, entretanto, a hiptese exigia um tipono-usual de meiose nos machosWwX: o fatorW deveria estar sempre associado ao X, paraformar espermatozidesW X; no poderiahaver espermatozideswX nesses machos.

    VERDADEIRO, ACIMA DEQUALQUERSUSPEITA?

    Das hipteses levantadas no incio da Gentica,com exceo da de Mendel, poucas foram toexaustivamente testadas como essa. Quase tudoda primeira hiptese de Morgan estava baseadoem princpios genticos bem estabelecidos: domi-nncia e recessividade, segregao e comporta-mento dos cromossomos sexuais. Suas quatrodedues eram explcitas e crticas. Em cada umdos casos os experimentos efetuados para testaras dedues forneceram os resultados esperadosnas previses.

    Para se ter certeza, aquela premissa sobre aespermatognese dos machosWwX deveria ser

    esclarecida, porm, por volta de 1910, seu colegaWilson e outros citologistas j haviam registradoa ocorrncia de comportamentos inesperados decertos cromossomos durante a meiose. Por isto,

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    no havia razoa priori para excluir a hipteseda associao apenas do fator dominante W (masnunca do recessivo w) com o X, na meiose dosmachos heterozigticos da gerao F1do primeirocruzamento.

    Morgan publicou uma outra descoberta que

    era difcil de explicar: Um fato ainda maissurpreendente aconteceu quando uma fmea deolhos brancos foi cruzada com um macho selva-gem (de olhos vermelhos), isto , com um indi-vduo de uma linhagem diferente. A previso(antes da realizao dos experimentos) era deque tanto machos quanto fmeas selvagenstivessem apenas o fator para olhos vermelhos eno o fator para olhos brancos; porm, os experi-mentos mostraram que todos os machos de linha-

    gens selvagens deveriam ser heterozigticos paraolhos vermelhos e todas as fmeas selvagens,homozigticas para aquele[estado do]carter.Deste modo, quando uma fmea de olhos brancos cruzada com um macho de olhos vermelhos,todos os descendentes do sexo femininoapresentam olhos vermelhos, enquanto que todosdo sexo masclino apresentam olhos brancos.

    Estes resultados apresentavam uma dificul-dade. Se todos os machos de uma populaonatural eram heterozigticos quanto a esses alelospara cor dos olhos, seria de se esperar que nume-rosas moscas de olhos brancos estivessempresentes nas populaes naturais e nas culturasde laboratrio. No entanto, Morgan j estavacriandoD. melanogaster por muitos meses enunca tinha observado tal fato. Morgan tenta umaexplicao para esse fato nos seguintes termos:At o momento eu no encontrei evidnciaalguma do aparecimento de mutantes de olhosbrancos. possvel que este fenmeno estejarelacionado com fertilizao seletiva.H muitos pontos interessantes a respeito destafamosa publicao que deu incio linha depesquisa que revolucionou a Gentica. O maisintrigante reside no fato do porqu Morgan nofoi capaz de perceber, inicialmente, que os resul-tados poderiam ser explicados simplesmente assu-mindo que os alelos para cor dos olhos fossemparte integrante do cromossomo X. Em vez dissoele tratou o problema quase como se fosse um

    cruza-mento dibrido.Em 1910, seguramente Morgan ainda tinhamuitas dvidas sobre a hiptese de Sutton mas,no teria ele discutido seus resultados com seu

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    colega Wilson ? G. E. Allen (1978, p.153) estimaque o macho de olhos brancos tenha sido desco-berto por volta de janeiro de 1910, quando osexperimentos foram feitos. O trabalho foi termi-nado em 7 de julho de 1910, aps Morgan terido para Woods Hole, e foi publicado no nmero

    de 22 de julho de 1910 da revistaScience. de grande interesse pedaggico o fato dessetrabalho ter sido escrito em uma forma quecorresponde viso popular do mtodo cient-fico. Primeiro, h as observaes de um fen-meno natural, neste caso os resultados dos cruza-mentos envolvendo a estranha mosca com olhosbrancos recm-surgida. Em seguida, formuladauma hiptese. Finalmente, so feitas dedues apartir da hiptese, e estas so testadas.

    Admite-se que os resultados dos testes apiema hiptese, de modo que o cientista prosseguepara os prximos problemas. Estas etapas soraramente mencionadas em publicaes detrabalhos cientficos, embora alguma coisa seme-lhante ao mtodo cientfico esteja acontecendona cabea do pesquisador. O trabalho de Morgande 1910 incomum neste aspecto porque estespassos esto explicitados no trabalho publicado.

    A SEGUNDAHIPTESE DE MORGANLevou somente um ano para Morgan perceber

    que a sua primeira hiptese para explicar a heran-a, limitada ao sexo, da cor dos olhos tinha falhasfundamentais. Outros mutantes deD. melanogaster haviam sido encontrados e eram herdados damesma maneira que o alelowhitepara cor dosolhos. Os resultados foram anunciados pelaprimeira vez em uma aula pblica ministradano Laboratrio de Biologia Marinha de Woods

    Hole, no estado de Massachusetts, em 7 de julhode 1911. A nova hiptese era mais simples: aoinvs de pensar em alelos limitados ao sexo comosendo associados aos fatores sexuais (primeirahiptese) porque no pensar neles como sendoparte do cromossomo X? Morgan props umasegunda explicao para seus resultados daseguinte maneira: Os experimentos comD.melanogaster me permitiram tirar duasconcluses: Primeira,que a herana limitadaao sexo pode ser explicada admitindo-se queum dos fatores que determinam um carterlimitado ao sexo transportado pelos mesmoscromossomos que transportam o fator para

    feminidade ; Segunda, que a associao observada na transmisso de certas caracters-ticas devida proximidade, nos cromossomos,das substncias qumicas (fatores) que soessenciais produo daquelas caractersticas .

    Portanto, se admitirmos que o alelo recessivo

    para olhos brancos e o alelo dominante para olhosvermelhos so parte do cromossomo X, osresultados de todos os cruzamentos podem serexplicados pela distribuio do cromossomo Xna meiose e na fertilizao. Seria, ento, desneces-srio invocar pressupostos, tais como o alelo wno sendo capaz de se associar com o X na meiosede machosWwX ou que todos os machos fossemobrigatoriamente heterozigticos.

    A segunda hiptese de Morgan foi submetida

    a todos os testes possveis e pde ser aceita, acimade qualquer suspeita, como verdadeira. A figura27 mostra como ela explica a herana dos olhosbrancos. Esta figura no mostra o cromossomoY pois s alguns anos mais tarde se verificou queo macho deD. melanogaster era XY e no X0.

    A NO-OBVIEDADE DO BVIOMais uma vez ns encontramos um exemplo

    do bvio no sendo to bvio assim. Deve-selembrar da observao feita por Thomas HenryHuxley quando o conceito de seleo naturaltornou-se claro para ele:My reflection, when I first made myself master of the central idea of the Origin[ele se refere ao livro Origem dasespcies de Charles Darwin e idia de seleonatural]was: How extremely stupid not havethought of that.

    Morgan fazia suas pesquisas noZoology De-partment , onde sete anos antes Sutton havia

    sugerido que os genes deviam ser partes doscromossomos. Seu colega E. B. Wilson tinhacontinuado a trabalhar no paradigma suttoniano.Entretanto, Morgan no estava convencido deque os cromossomos representassem a base fsicada hereditariedade e no iria aceitar essa hipteseat que seus prprios experimentos o conven-cessem. De fato, ele tinha uma opinio bastantecrtica sobre as explicaes que os geneticistasdavam para os resultados obtidos em experi-mentos genticos. Em janeiro de 1909, o anoanterior publicao de seu primeiro trabalhosobre a mosca de olhos brancos, ele disse oseguinte em uma conferncia naAmerican Breed-

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    red X white XW XW

    X

    P1

    F2

    Fentipos

    Fentipos egentipos

    Gentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    red

    red

    red

    red

    red

    white

    Gametas

    Xw

    XW Xw

    XW Xw XW

    Xw

    XW

    XW XW Xw

    XW XW Xw

    XW

    red Xwhite

    Xw

    Xw

    X

    P1

    F2

    Fentipos

    Fentipos egentipos

    Gentipos

    Gametas

    F1 FentiposGentipos

    red

    red

    red

    white

    Gametas

    XW

    Xw XW

    XW Xw Xw

    Xw

    XW

    Xw

    Xw Xw

    XW Xw Xw

    XW

    Figura 27.Representao esquemtica da segundahiptese de Morgan para explicar a herana do estadoolhos brancos do carter cor dos olhos emDroso-phila melanogaster .

    white

    white

    ers Association: Na interpretao moderna domendelismo, os fatos esto sendo convertidos emfatores uma grande velocidade. Se apenas umfator no explicar os fatos, propem-se a existn-cia de dois; se estes so insuficientes, a explica-o pode, s vezes, ser atribuda a trs. O grande

    malabarismo, que s vezes se torna necessriopara explicar os resultados obtidos, se elaboradocom muita ingenuidade, pode nos levar a crer que, como geralmente ocorre, os resultadospossam ser muito bem explicados porque ainterpretao foi feita exatamente para explic-los. Ns partimos dos fatos para chegarmos aosfatores, e ento, como em um passe de mgica,explicamos os fatos pelos mesmos fatores quecriamos para explic-los. Eu no posso seno

    temer que estejamos desenvolvendo uma espciede ritual Mendeliano, por meio do qual procu-ramos explicar os fatos excepcionais dasheranas alternativas.Esta era a opinio dealgum que em poucos anos iria ser reconhecidocomo o Expoente da Gentica de nosso sculo e que certamente seria o ltimo dos eminentesgeneticistas a estudar a hereditariedade acima donvel molecular.

    Em 1909, Morgan, juntamente com muitosoutros, ainda tinha problemas com a noo depureza dos gametas. Ele continua seu seminrionaAmerican Breeders Associationnos seguintestermos: Eu gostaria de chamar a ateno paracertas implicaes sobre o fato de que, comoatualmente se admite, os fatores (s vezes consi-derados como sendo os prprios caracteres ouainda unidade-carter) so separados, nacondio de seus alelomorfos, nas clulas germi-nativas dos hbridos. Por exemplo, uma plantaalta de ervilha cruzada com uma an produzapenas plantas altas na primeira gerao, quequando cruzadas entre si produzem 3 plantasaltas para cada planta an. Estes fatos so real-mente surpreendentes. Mendel chamou a atenode que estes resultados numricos poderiam ser explicados se admitirmos que as plantas hbridasproduzam dois tipos de clulas germinativas, asprodutoras de plantas altas e aquelas produtorasde plantas baixas. A simplicidade da explicao,sua ampla aplicabilidade e aquilo que eu chama-

    ria de probabilidade intrnsica, sugere estainterpretao a todos aqueles que tm pesquisadoproblemas semelhantes de hereditariedade. Apartir desta suposio que surgiu a hiptese

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    moderna dos fatores. A grande estatura dasplantas altas devida a um fator para altura, ea pequena estatura das ans se deve a um fator para o nanismo e quando estes fatores se encon-tram no hbrido, o fator para alta estatura predo-mina. At agora temos feito pouco alm de reafir-

    mar o ponto de vista de Mendel. Porm, quandovoltamos s clulas germinativas do hbridoavanamos um pouco mais. Ns admitimos queo fator para grande estatura e aquele parananismo se separam em clulas distintas apsterem convivido por inmeras geraes de clu-las sem terem influenciado um ao outro. Ns osconsideramos como entidades que apresentamum antagonismo curioso, de tal forma quequando a oportunidade aparece, eles se afastam

    e partem para o seus vrios caminhos. Para mimparece que exatamente neste ponto que nscorremos o risco de negligenciar outras possibili-dades que permitam produzir, do mesmo modo,os dois tipos de clulas necessrias interpre-tao mendeliana.

    Morgan props ento um mecanismo alterna-tivo bastante vago que revela sua formao bsicacomo embriologista. Ele reconheceu um elementode pr-formao na hiptese dos geneticistas. Asua hiptese envolvia estados alternativos deestabilidade, condies locais, mudanas noequilbrio e interao entre cromossomos hom-logos. Isto parece no ser do carter de Morgan uma pessoa que insistia sempre na experimen-tao como o caminho adequado compreenso.Ele estava rejeitando uma hiptese que era muitomais fcil de ser experimentalmente verificada emfavor de uma pura especulao.

    Mas Morgan no tinha uma mente completa-mente fechada. Aps rejeitar a hiptese, em 1909,que a segregao dos fatores (alelos) nos cruza-mentos mendelianos poderia ser explicada pelasegregao dos cromossomos na meiose, eletornou-se o mais forte defensor da hiptese deque o mendelismo tinha suas explicaes nocomportamento dos cromossomos.

    A SALA DAS MOSCAS

    Na dcada iniciada em 1911, uma sala doZo-

    ology Department da Columbia University ,detamanho mdio, ocupada por Morgan e seusalunos, tornou-se o centro mundial da Gentica.Ele tinha vindo para aColumbia Universityem

    1904 como um embriologista. Em 1911, Morgan(1866-1945) estava com 45 anos. Durante essadcada ele teve trs colaboradores muito prxi-mos, seus ex-estudantes: Sturtevant, Bridges eMuller. Alfred Henry Sturtevant (1891-1970) iriareceber seu ttulo de doutor em 1914 com um

    trabalho no qual ele utilizou dados de ligaognica para construir o primeiro mapa de umcromossomo. Herman Joseph Muller (1890-1967) recebeu seu ttulo de doutor em 1915 comum estudo que esclarecia definitivamente o fen-meno da permutao. Calvin Blackman Bridges(1889-1938) recebeu seu ttulo de doutor em1916 com um trabalho clssico sobre no-disjuno, amplamente aceito como a prova finale conclusiva de que os genes so partes dos

    cromossomos. Bilogos vinham de todas aspartes do mundo para visitar ou para fazer pes-quisa na Sala das Moscas.

    A base para todas estas descobertas foi amosca-da-banana,D. melanogaster . Essa espcieparece ser uma imigrante, originria do leste dafrica e como uma espcie domstica fre-qentemente encontrada em residncias, merca-dos e depsitos de lixo onde quer que existamfrutas maduras. Ela tambm se espalhou porcertos ambientes naturais e, em algumas reas, a espcie mais abundante do gnero.

    Morgan comeou a usarD. melanogaster porque no conseguiu obter recursos para fazerexperimentos com mamferos.D. melanogaster podia ser criada em grande nmero com alimentosbaratos, de incio com bananas, em vidros de leitepequenos, que Morgan aparentemente trazia desua casa. Alguns outros laboratrios estavamusandoD. melanogaster naquela poca (G. E.Allen, 1975a) e tem havido muita especulaosobre onde Morgan obteve os estoques de suasfamosas moscas. No h razo para acreditar quetenha havido apenas uma fonte. Quando eu eraestudante naColumbia Universityna dcada de1930, dizia-se que a fonte das moscas havia sidoum abacaxi colocado do lado de fora da janelado laboratrio de Morgan. A descoberta do ma-cho de olhoswhitefoi creditada a Calvin Bridges.Naquela poca ele era um estudante de graduaonoCollegeda Columbia University, contratado

    para lavar os vidros usados nos experimentos comas moscas. Um pouco antes de lavar um deles,Bridges reparou que havia uma mosca de olhosbrancos. Shine e Wrobel (1976) fazem uma

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    interessante discusso sobre a possvel origem domacho de olhos brancos, mas foram incapazesde chegar a qualquer concluso definitiva.

    Morgan no comeou a trabalhar comD.melanogaster com o intuito de estender o mende-lismo para este pequeno inseto. Ao contrrio, ele

    estava mais interessado em problemas evolutivos,especialmente numa questo polmica naquelapoca a da variao contnuaversusvariaodescontnua. Ele tinha especial interesse em testara hiptese da mutao de De Vries (1901-1903,1906) e percebeu que uma espcie com ciclo devida curto, fcil de ser criada, e com numerosadescendncia iria servir para os seus propsitos.

    No intervalo de tempo entre as primeiras publi-caes (1910) sobre a mosca de olhoswhitee o

    trabalho de Bridges em 1916 sobre no-disjuno,foram estabelecidos os fundamentos da genticade D. melanogaster e os conceitos bsicosessenciais nesse campo do conhecimento foramcompletados tudo acontecendo na Sala dasMoscas. Os trabalhos realizados no laboratriode Morgan forneceram a evidncia crtica, acimade qualquer suspeita, para que o paradigmasuttoniano pudesse ser aceito como verdadeiro.Em seu livro, publicado em 1965, Sturtevant dum depoimento pessoal daqueles dias memor-veis. De 1916 at 1953 a maior parte do trabalho

    em Gentica pode ser classificado como umacincia normal que deu acabamento conceitualao paradigma. Sturtevant (1965) d um depoi-mento pessoal daqueles dias memorveis. Nsdiscutiremos, a seguir, alguns dos tratados queforam produzidos na Sala das Moscas.

    A COLEO DE MUTANTESCalvin Bridges lembrado como a pessoa na

    Sala das Moscas com maior capacidade dedetectar novos mutantes. O grupo de pesquisa-dores, sob a liderana de Morgan, em poucotempo tinha dezenas de mutantes para seremusados em seus experimentos. Algum poderiaperguntar Para que estudar tantos mutantes?

    Uma vez estabelecido que o esquema mende-

    liano funcionava para os alelos nos autossomose, com modificao, para os alelos no cromos-somo X, porque acumular um nmero crescentede confirmaes? A resposta simples: os alelosmutantes poderiam ser usados como sondas paraobteno de mais informaes sobre a base fsicada herana, isto , sobre a relao entre genes ecromossomos, a localizao dos genes, a elabo-rao de mapas de ligao gnica de cada cromos-somo e vrias alteraes estruturais dos cromos-somos em si.

    PARTEA : REVENDO CONCEITOS BSICOSPreencha os espaos em branco nas frasesnumeradas de 1 a 12 usando o termo maisapropriado dentre os arrolados abaixo :(a) autossomo

    (b) cromossomos sexuais(c) herana ligada ao sexo(d) herana com expresso limitada ao sexo(e) mutante(f) pr-formao(g) mutao(h) dominncia(i) recessividade(j) herana holndrica(k) codominncia(l) dominncia incompleta ou ausncia dedominncia.

    1. O processo pelo qual ocorre uma alteraoherdvel de um gene denominado ( ).

    EXERCCIOS2. A teoria da ( ), atualmente desacreditada,

    afirma que cada clula germinativa contm umorganismo do seu tipo j completamenteformado e que o desenvolvimento resultaapenas no aumento do seu tamanho.

    3. ( ) o fenmeno pelo qual um alelo im-pede a manifestao de outro alelo de ummesmo gene.

    4. ( ) um gene modificado, uma clula ouum organismo que porta alterao produzidapor uma mutao.

    5. ( ) qualquer cromossomo que no os sexuais.

    6.Os cromossomos relacionados com adeterminao do sexo de um indivduo sodenominados ( ).

    7. A expresso de um caracterstica (porexemplo, produo de ovos ou de leite ) restrita apenas um dos sexos denominada ( ).

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    8.Os genes localizados exclusivamente nocromossomo Y seguem um padro de heranadenominado ( ).

    9. ( ) o fenmeno pelo qual um alelo no semanifesta fenotipicamente, porm mantm asua individualidade.

    10. Os genes localizados no cromossomo Xseguem um padro de herana denominado ( ).

    11. ( ) a situao em que ambos alelos deum indivduo heterozigtico se manifestamigualmente no fentipo, por exemplo, o queocorre nos grupos sangneos do sistema MN.

    12. ( ) a condio na qual o indivduoheterozigtico tem um fentipo intermedirioentre os dos dois homozigticos que lhe deramorigem, por exemplo, o que ocorre com a cor

    da semente em certas variedades de trigo.

    PARTEB : LIGANDO CONCEITOS E FATOSUtilize as alternativas abaixo para responder squestes 13 e 15.(a) herana ligada ao sexo recessiva.(b) herana autossmica recessiva.(c) herana ligada ao sexo dominante.(d) herana autossmica dominante.

    13. Nos cruzamentos entre drosfilas fmeasde asas curtas com machos de asas longas,todos os descendentes machos apresentaramasas curtas e todas as fmeas, asas longas.Um cruzamento recproco (fmea de asaslongas com machos de asas curtas) produziuapenas descendentes de asas longas, tantomachos como fmeas. Esses resultadossugerem a hiptese de que o estado de carterasas curtas siga um padro de ( ).

    14. Carneiros pretos cruzados com ovelhas

    brancas produziram apenas descendentesbrancos, de ambos os sexos. Alguns cruzamen-tos recprocos produziram apenas machos efmeas brancos: enquanto outros produzirammetade da descendncia branca e metadepreta, de ambos os sexos. Esses resultadospermitem levantar a hiptese de que o estadode carter cor preta da l em carneiros segueum padro de ( ).

    15. Um homem afetado por certa doena casa-se com uma mulher no-afetada. Eles tm oito

    filhos (quatro meninas e quatro meninos); todasas meninas tm a doena do pai, mas nenhumdos meninos a tem. Trata-se provavelmente de

    uma caso de ( ).

    16. Um homem heterozigtico para um parde alelos autossmicos Bb e portador de umalelo recessivo d ligado ao cromossomo X. Queproporo de seus espermatozides ser bd ?a. zero. c. 1/4. e . 1/16.

    b. 1/2. d. 1/8.

    PARTEC : QUESTES PARA PENSAR E DISCUTIR

    17. Qual a proproo fenotpica esperadaentre os descendentes do cruzamento de fmeasde drosfila de olhos vermelho-claros com ma-chos de olhos vermelho-escuros, sabendo-se queo fentipo destas fmeas determinado por umalelo recessivo ligado ao sexo?

    18. De acordo com a hiptese de Sutton (teoriacromossmica da herana), como deveriam secomportar na meiose os genes localizados em ummesmo cromossomo?

    19. Por que os resultados de Morgan nos cruza-mentos com o mutante white no puderam serinterpretados como um caso de monoibridismotpico?

    20. Qual foi a primeira hiptese proposta porMorgan para explicar a herana do sexo e da

    cor dos olhos em Drosophila melanogaster ?21. O que levou Morgan a substituir a sua primeirahiptese para explicar a herana ligada ao sexo?

    22. Em camundongos, um alelo dominante B,ligado ao sexo, responsvel pelo fentipo cauda curta e retorcida , enquanto seu alelo recessivo b, responsvel pelo fentipo cauda longa e reta .Se uma fmea de cauda longa cruzada comum macho de cauda curta, que proporofenotpica deve ser esperada na gerao F 1?

    23. Na espcie humana, o alelo recessivo eligado ao sexo ( d ) produz um tipo de daltonismo(cegueira s cores vermelho-verde). Umamulher de viso normal, cujo pai era daltnico,casa-se com um homem daltnico.a) Quais so os gentipos possveis da medo homem daltnico?b) Qual a probabilidade de o primeiro descen-dente desse casal ser daltnico?c) Que porcentagem de daltonismo podemosprever entre as filhas nascidas deste casal?d) De todos os descendentes deste casal (semconsiderarmos o sexo) que proporo provavel-mente ter viso normal?

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    24. O alelo m (miniature ) que determina asascurtas em Drosophila melanogaster recessivoe ligado ao sexo. Seu alelo dominante + deter-mina a formao de asas longas. Que propor-es fenotpicas podemos prever nos seguintescruzamentos: a)macho de asas curtas com fmea de asascurtas. b)fmea de asas curtas com macho de asaslongas. c) fmea de asas longas (homozigtica) commacho de asas curtas. d)fmea de asas longas (heterozigtica) commacho de asas longas. e) fmea de asas longas (heterozigtica) commacho de asas curtas.

    25. Em galinceos, o alelo dominante B , que ligado ao sexo, produz penas com padrobarrado. O seu alelo recessivo b , em homozi-gose produz penas de cor uniforme. O aleloautossmico dominante R produz crista comforma rosa e seu alelo recessivo r , produz crista

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    com forma simples, quando em homozigose.Uma fmea de penas barradas, homozigticapara crista com forma rosa cruzada com ummacho de penas de cor uniforme e crista comforma simples. Qual a proporo fenotpicaesperada na gerao F 1?

    26. A distrofia muscular Duchenne ligada aosexo e geralmente s afeta os homens. Adoena se manifesta na infncia e as vtimasperdem progressivamente os movimentos dosmembros e morrem antes da adolescncia.a) Qual a probabilidade de uma mulher cujoirmo sofre de Duchenne ter um descendentedo sexo masculino afetado?b) Supondo que o tio materno de uma pessoateve Duchenne, qual a probabilidade de essapessoa ter recebido o alelo causador daenfermidade?c) Suponha que o tio paterno de uma pessoateve a doena, qual a probabilidade de essapessoa ter recebido o alelo causador daenfermidade?