Os movimentos e as políticas educacionais: Por uma inclusão educacional bi…

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POR UMA INCLUSÃO EDUCACIONAL BILÍNGUE Lucyenne Matos da Costa

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Palestra da Prof. Dra Lucyenne Matos da Costa (UFES) 03/10/2012, manhã.

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POR UMA INCLUSÃO EDUCACIONAL BILÍNGUE

Lucyenne Matos da Costa

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Vivemos num tempo de perguntas fortes e de

respostas fracas.

As perguntas fortes são as que se dirigem não apenas às nossas opções de vida individual e colectiva, mas sobretudo às raízes, aos fundamentos que criaram o horizonte das possibilidades entre que é possível optar. São, por isso, perguntas que causam uma perplexidade especial.

Segunda Boaventura de Souza Santos…

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As respostas fracas são as que não conseguem

reduzir essa perplexidade e que, pelo contrário, a podem aumentar. As perguntas e as respostas variam de cultura para cultura, de região do mundo para região do mundo.

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Mas a discrepância entre a força das perguntas e a

fraqueza das respostas parece ser comum. Decorre da multiplicação em tempos recentes das zonas de contacto entre culturas, religiões, economias, sistemas sociais e políticos e formas de vida diferentes em resultado do que chamamos vulgarmente globalização.

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Pensar políticas educacionais tendo como foco os

movimentos surdos.

Os movimentos surdos de resistência

As narrativas como histórias contadas sobre esses movimentos.

As Narrativas Surdas

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São movimentos de resistência. Resistência a que? A

quem?

O que é a resistência surda?

As narrativas surdas como narrativas da inclusão: fundamental importância!!!

Como posso fazer inclusão educacional se nem sei quem estou “hospedando”?.

Os Movimentos Surdos

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Vivemos tempos de uma racionalidade

indolente, preguiçosa, que se considera única, exclusiva e que não se exercita para ver a riqueza inesgotável do mundo.

Essa racionalidade cria ausências por meio de uma monocultura do saber, monocultura do tempo linear, monocultura do monocultura da naturalização das diferenças, monocultura da escala dominante (global=hegemônico; local/particular=invisível) e uma monocultura do produtivismo capitalista.

A racionalidade e a representação surda

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Tradução é um processo intercultural, intersocial.

Utilizamos uma metáfora transgressora da tradução linguística: é traduzir saberes em outros saberes, traduzir práticas e sujeitos de uns aos outros, é buscar inteligibilidade sem “canibalização”, sem homogeneização (SANTOS, 2007, p. 39).

Assim, segundo Santos (2007)…

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Proponho traduzir, as narrativas surdas em

possibilidades políticas.

Que narrativas são essas que se colocam para nós?

Onde elas se localizam?

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Nós tínhamos que falar. A professora tinha um pedaço de

pau que batia em nossas mãos. Eu chorava muito com ela. Eu procurava a diretora da escola e ela dizia que a professora estava certa porque era coisa de macaco falar em sinais. As pessoas ficavam zombando dizendo que eu era macaca porque fazia sinais. Isso era muito ruim! Nas aulas de treino da fala, eu errava as palavras e a professora me beliscava. Uma vez chegou a apertar o meu nariz ao ponto de sangrar porque eu não consegui falar o “R”. Era uma coisa horrível! Mas nada de Português mesmo. Era um monte de palavras soltas.” (S. 38 anos)

1- A Supressão do uso da língua de sinais.

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“Eu vi uma situação uma vez que me chocou: a professora mandava a gente comer banana quando errávamos uma palavra. Não precisava comer a banana se por acaso acertássemos a palavra falada. Mas se errássemos... tinha que comer a banana. Era como se estivesse nos chamando de macacos. O surdo sofre mesmo. Isso foi na APAE”. (E. 23 anos)

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Eu larguei a escola porque ninguém agüentava as

atividades repetidas. Era sempre a mesma coisa. Todos os dias a mesma coisa, a mesma coisa... Eu me revoltei e não quis saber mais. A professora sempre ensinava: A-B-C-D, e no dia seguinte, A-B-C-D. Ai, horrível! As professoras velhas que ensinam a mesma coisa até hoje precisam sair. É preciso tirá-las de lá.

2- As práticas pedagógicas/clínicas na escola: o currículo e as práticas

rotineiras

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E de Matemática, era adição e subtração apenas. Só isso que se ensinava. Eu queria que também ensinassem multiplicação, divisão. Isso elas não davam para mim. Só a mesma coisa. Conteúdo de bebê.

“Não ensinavam nada de História, Geografia, Biologia. Nada. Sempre a mesma coisa. Apenas estudávamos Matemática e Português. Sempre. E só atividade infantilizada”. (L. 48 anos)

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“Os surdos que estudam na 5ª série, na escola de ouvintes,

tem a vantagem de passar de série e de aprender conteúdos não aprendidos na escola de surdos. Na escola de surdos, eles não aprendem porque ficam a mercê das loucuras orais das professoras. Não tem conteúdo. Inclusive, os surdos ficam sem acompanhamento. Mas tem o outro surdo. Não sei o que acontece com esta situação. Não sei o que é melhor ou pior. Eles são aprovados nas séries de 5ª a 8ª porque na aula de reforço na escola de surdos, os conteúdos são dados para eles copiarem e levar tudo bonito e pronto para outra escola. Continuam sem aprender”. (E. 50 anos)

3- A “escola dos ouvintes”: o movimento de inclusão atual

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“Saí um dia a escola de surdos depois da quarta série e fiquei só na escola de ouvintes sempre repetindo a quinta série. Três vezes. Onde estavam meus amigos surdos? Nós conversávamos escondido. Agora... não precisava mais. Ninguém me entendia! Então abandonei a escola dos ouvintes também. Fiquei triste e falei com minha mãe, reclamando: ‘Ah! Estudar para quê?” (C.32 anos)

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“Numa escola ouvinte, o surdo fica isolado. Só recebendo mensagens faladas sem ter contato em língua de sinais. Só se aprende com um amigo do lado, porque a gente copia tudo do amigo. O professor ouvinte é muito chato. Dá muito trabalho.” (L. 48 anos)

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Na escola dos surdos não tem conteúdo. Mas na escola dos

ouvintes tem conteúdo e não tem cultura surda. É preciso juntar os dois: conteúdo e cultura surda”. (S. 54 anos)

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“Meu sonho é uma escola com professores surdos,

com surdos aprendendo tudo em sinais. Com intérpretes também. As crianças precisam aprender sinais.” (C. 32 anos)

“Aprender o Português é tudo que quero. Português é muito importante para fazer provas, concursos. Eu queria uma escola onde os surdos aprendessem o Português tranquilamente. Sem problema algum.” (M. 38 anos)

4- As propostas educacionais dos narradores surdos

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Uma escola para mim tem que ter intérprete em todas as

disciplinas, e professores surdos. Os ouvintes atrapalham. Eu sonho com intérpretes... Nós entenderíamos mais rápido. Esse é o jeito do surdo. É melhor assim.” (C. 32 anos)

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Educação Bilíngue: apenas duas línguas...

Estamos lutando pelo que?

Educação Bilíngue como espaço de luta.

Um equívoco...

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A proposta de uma pedagogia blíngue no espaço educacional e

nas políticas municipais. A lei e o decreto.

Lei 10.436/02- as políticas linguísticas relacionadas à Língua de

Sinais, se instauram no Brasil por meio dessa lei. O decreto 5626/05 nos dá orientações sobre como produzir

políticas educacionais para que a escola se utilize dela a fim de garantir uma educação bilíngüe para os surdos.

.

A PRÁTICA DA INCLUSÃO BILÍNGUE: UMA PRÁTICA

EDUCACIONAL

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Práticas bilíngues: pensar as lutas, os conflitos e as

tensões como protagonistas de uma política educacional.

Uma política educacional bilíngue deve levar em conta os sujeitos surdos como protagonistas do processo.

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Atitude: capacidade do homem de elaboração de sua própria

subjetividade, de governar a si mesmo. E a isso, chama de ATITUDE. Não é apenas um trabalho político, mas estético.

Foucault denomina de contraconduta “[...] movimento tão específicos quanto esse poder pastoral, movimentos específicos que são resistências, insubmissões, algo que poderíamos chamar de revoltas específicas de conduta [...]. São movimentos que têm como objetivo outra conduta, isto é: querer ser conduzido de outro modo, por outros condutores e por outros pastores, para outros objetivos e para outras formas de salvação.” (FOUCAULT, 2008, p. 257).

Atitude e contraconduta

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Se pensarmos a nossa trajetória histórica, já fomos

“apenas” intérpretes em igrejas e acabávamos em associações. Éramos bons cristãos, familiares. Ou ainda, quando não familiares, simpatizantes com a causa surda por algum chamado de Deus, por alguma missão especial. Nosso trabalho sempre foi altamente relacionado a uma vivência pessoal com o sujeito surdo. Acabamos nos subjetivando, para o bem ou para o mal, a uma causa política, moral de defesa dos surdos.

Intelectual Específico

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Para pensar propostas bilíngues, é fundamental conhecer

princípios que são inegociáveis. Segundo Lopes e Guedes (2010), no primeiro plano, compreender o sujeito surdo como sujeito cultural, com sua língua, sua história (como já contamos aqui), seus anseios. Prestar atenção ao que o surdo diz é um passo importantíssimo para um bom projeto bilíngue. Compreender a concepção de inclusão do sistema que faz parte e sustentar a visão de surdos, identidades, línguas e culturas são fundamentais. Também é importante fazer uma distinção clara do que sejam as concepções utilizadas pelo sistema do qual o professor faz parte: a surdez como anormalidade ou o surdo como sujeito cultural. Afinal, é a partir do que pensamos que construímos e constituímos nossas práticas.

Pensando propostas bilíngues

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No planejamento das atividades que comporão o AEE, é

preciso que a escola (e não somente o professor que atuará no AEE ou o professor do aluno surdo), tenha maior clareza sobre os significados que a palavra inclusão possui na instituição. Além disso, é preciso que os professores tenham maior elementos teóricos para sustentar a visão de surdos, de identidade, de língua e de cultura surda – noções fundamentais para que um currículo possa ser construído com os surdos –. Também é importante que a escola seja capaz de fazer distinções entre concepções de educação de surdos baseadas em uma visão de anormalidade surda e concepções de educação de surdos baseadas na diferença cultural surda (LOPES; GUEDES, 2010).

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Todo o aluno surdo deve estar em companhia de outros surdos.

Surdos com experiências e níveis linguísticos e de aprendizagem diferentes estimulam o aprendizado uns dos outros.

Nem toda a experiência visual acarreta em aprendizado, mas todo o aprendizado surdo passa por uma experiência visual.

A convivência surda deve ser estimulada não somente em horários de trabalho previstos no AEE.

De preferência em cada turma seja matriculado mais de um aluno surdo.

Princípios para uma possível educação bilíngue

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A presença de professores ouvintes fluentes em LIBRAS e

de professores surdos na escola é fundamental para a realização de atividades com os alunos.

Ter na escola profissionais intérpretes de LIBRAS para mediar as aulas onde os alunos surdos tiverem incluídos.

Todos os professores devem ter clareza que ser surdo é uma questão de identidade linguística-cultural.

Ter um plano de difusão da LIBRAS na escola.

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A LIBRAS é a primeira língua dos alunos surdos, portanto deve

ser priorizado os espaços de convivência com ela. O Português em sua modalidade escrita é a segunda língua dos surdos brasileiros e como tal deve ser tratada na escola.

Todas as atividades com os alunos devem ser planejadas com antecedência para que providências em relação a construção visual do que será ensinado seja tomada.

Todas as atividades e as aulas planejadas pelos professores devem ser repassadas no mínimo um dia antes para o intérprete de LIBRAS.

Intérprete não é professor. Professor no momento que está em aula, não consegue ser

intérprete concomitantemente.

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É possível finalizar?

Como estão as nossas políticas denominadas inclusivas?

O que são os movimentos surdos nessa perspectiva?

Considerações Finais

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O Movimento surdo e a educação- relações intrínsecas.

Vivemos em uma atualidade fluida na educação dos surdos.

Saímos de uma condição (o surdo como deficiente) para ir ao encontro de outra: o surdo como sujeito cultural. Mas sempre oscilando. E essa mudança, cria espaços-tempos diferenciados na formação dos professores de surdos.

Passamos então a procurar os sujeitos professores conhecedores

da Língua de sinais e produtores de um saber importante. Porém, a língua de sinais passa a ser bandeira na política em que o movimento surdo defende para uma escola bilíngue de qualidade. E em meio a tantos movimentos, a pergunta: o que é uma educação bilíngue? Como formar professores bilíngues