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159-192 - 2010 Os jesuítas em questão 1 : Apreciações contrastantes: Camões e Luís de Granada José Eduardo Franco 2 Bem se sabe que o estilo de Deus Nosso Senhor é fazer doces as águas com sal e alumiar os olhos com o barro e sarar as chagas com massa de figos e multiplicar os filhos de Israel com as perseguições do Faraó e o povo cristão com as perseguições dos tiranos. Antes, a sua mais comum maneira de proceder é usar meios dos adversários para fazer os seus feitos, como usou a venda de José com a qual os seus irmãos queriam desfazer os seus sonhos. E assim parece que nisto há-de vir a consumar-se esta nova contradição. Ainda que estejam a abatê-los, Deus permitirá que [os Jesuítas] andem mais humildes, mais religiosos, mais exemplares, mais prudentes e mais devotos e melhor acreditados no mundo”. Frei Luís de Granada RESUMO: No século de Camões, os Jesuítas apareceram como uma ordem dinâmica com características e metodologias missionárias inovadoras. A ascensão fulgurante da Ordem de 1 Conferência proferida no Colóquio Internacional sobre “Frei Luís de Granada e o seu tempo”, realizado no dia 17 e 18 de dezembro de 2004 na Academia Portuguesa de História, para assinalar os 500 anos do nascimento deste grande dominicano ibérico. 2 Universidade de Lisboa.

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Os jesuítas em questão1: Apreciações contrastantes: Camões e Luís de

Granada

José Eduardo Franco2

“Bem se sabe que o estilo de Deus Nosso Senhor é fazer doces as águas com sal e alumiar os olhos com o barro e sarar as chagas com massa de figos e multiplicar os filhos de Israel com as perseguições do Faraó e o povo cristão com as perseguições dos tiranos. Antes, a sua mais comum maneira de proceder é usar meios dos adversários para fazer os seus feitos, como usou a venda de José com a qual os seus irmãos queriam desfazer os seus sonhos. E assim parece que nisto há-de vir a consumar-se esta nova contradição. Ainda que estejam a abatê-los, Deus permitirá que [os Jesuítas] andem mais humildes, mais religiosos, mais exemplares, mais prudentes e mais devotos e melhor acreditados no mundo”.

Frei Luís de Granada

RESUMO: No século de Camões, os Jesuítas apareceram como uma ordem dinâmica com características e metodologias missionárias inovadoras. A ascensão fulgurante da Ordem de 1 Conferência proferida no Colóquio Internacional sobre “Frei Luís de Granada e o

seu tempo”, realizado no dia 17 e 18 de dezembro de 2004 na Academia Portuguesa de História, para assinalar os 500 anos do nascimento deste grande dominicano ibérico.

2 Universidade de Lisboa.

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Santo Inácio deu origem a apreciações contrastantes em torno do perfil, dos fins e dos modos de ação da Companhia Jesus. Este artigo pretende problematizar o significado da emergência do antijesuitismo no século XVI e analisar, em destaque, dois posicionamentos afirmados por duas figuras da intelectualidade e da espiritualidade ibérica: Luís Camões e Luís de Granada.

PALAVRAS-CHAVES: Jesuítas; Antijesuitismo; Mito; Luís de Camões; Luís de Granada; Dominicanos.

Considerações preliminares

s ordens religiosas constituíram na modernidade um dos pólos de polêmica mais apetecidos dentro e fora

da Igreja. A Ordem de Santo Inácio foi uma dessas ordens que mais polémicas suscitaram desde o momento da sua fundação em 1640.

A implantação da Companhia de Jesus na Europa como em Portugal foi alvo, desde a sua gênese, do desenvolvimento de um verdadeiro movimento de crítica e de oposição à natureza e aos modos de ação desta nova ordem religiosa. Se neste processo de contestação antijesuítica, vários dominicanos desempenharam um papel muito ativo, tornando-se referência inspiradora do antijesuitismo internacional, também não faltaram outros Frades Pregadores que, com a mesma intensidade, entraram em cena para defender e apoiar o projeto espiritual e de apostolado da Ordem de Inácio de Loyola.

Mas, de fato, mais célebres ficaram os dominicanos detratores dos Jesuítas (o que levou imprecisamente à sedimentação da imagem de que toda a Ordem de São

A

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Domingos era geralmente hostil à Ordem de Santo Inácio, sendo a sua principal concorrente dentro da Igreja em todos os espaços da sua intervenção pastoral) do que aqueles Filhos de São Domingos que lhe manifestaram simpatia e lhe ofereceram o seu auxílio. A expansão fulgurante da Companhia de Jesus na Época Moderna gerou duas correntes de longa duração que se antagonizaram desde o seu nascimento na apreciação da natureza e modus procedendi desta ordem religiosa. Com efeito, esta ordem despoletou tanto o filojesuitismo mais devoto, como o antijesuitismo mais hostil dentro e fora da Igreja Católica. Ambas estas correntes surgiram primeiramente no seio da própria Igreja e ambas se tornaram transversais às diferentes instituições eclesiais3.

Críticas dos Dominicanos aos Jesuítas

Um dos pioneiros mais destacados do antijesuitismo católico foi o dominicano espanhol Melchior Cano. A propaganda antijesuítica deste eminente teólogo e futuro bispo de Canárias, tanto no Concílio de Trento como em Salamanca e Valladolid tiveram uma enorme repercussão. Ele inaugurou a primeira grande etapa histórica de hostilidade aos Padres da Companhia, fase que denominamos de antijesuitismo institucional. Frei Melchior Cano4 revelou-se um antijesuíta

3 Cf. FRANCO, José Eduardo. Mythe Jésuite au Portugal (XVIe-XXe siècles). Thèse

de doctorat – École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, 2004, p. 7 e ss. 4 Este professor de Salamanca procurou fazer com que os Jesuítas fossem cúmplices

do iluminismo místico que grassava na Península Ibérica. A opinião de Cano contra os Jesuítas subiu em crescendo desde 1542, atingindo o grau mais acentuado em 1555. Quando escreve a sua obra De locis theologicis não deixa de referir-se-lhes indirectamente, ao falar das “pessoas que, manejando e citando todos os dias Baptista de Crema, Henrique Herp, João Tulero e outros da mesma farinha, não percebem os seus erros, o seu espírito e a sua intenção”. Melchior Cano, De locis

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militante e obsessivo. Este dominicano representava uma corrente conservadora que procurava garantir um certo imobilismo na orgânica estrutural e funcional da vida religiosa clássica, que o ideário e as novidades organizacionais consagradas na aprovação pelo Papa Paulo III (em 1540) da nova Ordem dos Jesuítas faziam estremecer e pareciam por em causa in extremis.

A Companhia de Jesus entrou em Espanha cinco anos depois de ter chegado a Portugal logo em 1540. A chegada dos Inacianos ao país vizinho foi facilitada por uma carta de apresentação do Rei de Portugal, D. João III, levada, no dia 17 de março de 1545, à corte de Filipe II pelos Jesuítas António Araoz e Pedro Fabre. Nesta altura já pululava muita confusão a respeito da denominação dos Padres Jesuítas e da natureza da sua ordem. Conta o Pe. Araoz que “alguns nos chamam os iniguistas, outros papistas, outros apóstolos, outros teatinos e reformados”5. Mas mais grave do que esta confusão foi o embate crítico que algumas personalidades célebres protagonizaram. Embora os Jesuítas tivessem angariado a simpatia de importantes personalidades da cena sociopolítica do tempo, como foi o caso, desde logo, do Duque de Gandia, os

theologicis, Vol. I, Salamanca, 1563, p. 442.; cf. Idem, Tratado de la victoria de si mesmo y ansi mismo una institucion de fray Domingo de Sito a loor del nombre de Dios, Toledo, 1551; e Juan Belda Plans, Los lugares teologicos de Melchior Cano en los comentarios a la ‘Suma’, Pamplona, 1982. Devemos, todavia, notar que a hostilidade de Frei Melchior Cano contra os Jesuítas não é uma questão meramente pessoal, mas reflete o ambiente que vigorava no meio inquisitorial espanhol, como nos meios conservadores de Roma. Os alertas em relação à Companhia de Jesus podem ser detectados mesmo nos círculos da corte de Carlos V, não faltando pregadores que apodassem os Jesuítas de inovadores perigosos e hipócritas que iriam ter o mesmo destino dos hereges alemães. Boehmer refere na sua história dos Jesuítas que “trois puissances s’opposaient à la marche victorieuse des Jésuites: la royauté espagnole, le haute clergé, les Dominicains”. H. Boehmer. Les Jésuites. Introd. e notes par Gabriel Menod, Paris, 1910, p. 87.

5 Apud ASTRAIN, António. Historia de la Compañía de Jesús en la asistencia de España. Tomo I, Madrid, 1912, Tomo II, p. 247-248.

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opositores que se levantam contra eles não foram de menos peso, como foi o caso de Juan Martinez Siliceo, recém-nomeado arcebispo de Toledo e Primaz de Espanha, que desconfiava destes apóstolos, chegando ao ponto de qualificá-los de heréticos e de emitir uma proibição que os impedia de pregar e administrar os sacramentos na sua diocese.

Em Espanha e em Portugal, como um pouco por todo o lado, os Padres da Companhia, encontram tanto os seus melhores recomendadores como os seus mais apaixonados e radicais opositores. Por exemplo, se em Saragoça, receberam o apoio sincero do prior dos Dominicanos, tiveram como críticos mais acérrimos uma série de religiosos de hábito carmelita, franciscano e agostinho, acrescendo ainda neste rol alguns membros do clero secular.

Mas foi em Salamanca que os Jesuítas sofreram o pior revés até então experimentado. O cardeal Francisco de Mendonza, Bispo da Cúria, insistiu muito com o fundador dos Jesuítas para que promovesse a abertura de um colégio da Companhia junto da mais antiga universidade de Espanha. Foi precisamente aqui onde os educadores jesuítas foram mais mal recebidos em toda a Península Ibérica, tendo sido a oposição liderada por Melchior Cano que alimentava a convicção de que estes auto-denominados companheiros de Jesus eram sim os verdadeiros precursores do Anticristo. Este teólogo dominicano lançou a suspeita sobre o comportamento sócio-pastoral dos iniguistas, duvidou da autenticidade do seu Instituto enquanto ordem religiosa, questionou severamente a ortodoxia da sua doutrina, como já tinha feito em Trento atacando Laynez6. Frei Cano pregou na Quaresma de 1548 um virulento sermão de sabor apocalíptico no púlpito da universidade. Temendo, de 6 Diogo Laynez participou como perito no Concílio de Trento entre agosto de 1562 e

finais de 1563.

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forma delirante, a aproximação do fim dos tempos, elege como uma das pragas da Cristandade a visão curta de alguns prelados que, com o intuito mesquinho de agradar a algumas almas piedosas, davam a sua caução para o estabelecimento de novas ordens que não observavam normas rígidas à maneira tradicional. E concretiza, visando diretamente o girofilismo dos Jesuítas, vituperando as ordens cujos membros andam para a frente e para trás nas ruas como qualquer pessoa. Ordens que albergavam pessoas relaxadas, que não trabalhavam, que não eram intransigentes, que não procuravam a mortificação do corpo, que procuravam permissão para dizerem as suas orações à margem do Breviário Romano7. Acrescenta a estas invectivas a acusação de hipocrisia e lança um aviso profético, em que afirma condicionalmente que se estes homens continuassem a ser tolerados, tudo o que era sagrado seria arruinado, enfeitiçado, desacreditado e conduzido até às portas do inferno pelos Jesuítas. Além disto, insinuou gravemente uma suspeita moral contra estes, ao referir-se maliciosamente àqueles homens que “tiram prazer das conversas familiares com as mulheres e vão frequentemente à casa delas com o pretexto de convertê-las, de ajudá-las e orientá-las para uma vida mais perfeita”8.

Estas críticas gravíssimas lançadas contra os Jesuítas, inscrevem-se num dos paradigmas mais extremos que tipificaram as diversas acusações feitas contra a Ordem: o paradigma apocalíptico. O uso de figuras simbólicas do último livro da Bíblia, interpretadas normalmente para anunciar a chegada do fim dos tempos e das catástrofes a este inerentes que afetariam a Igreja e a Humanidade em geral, tempo escatológico

7 Ibidem, Tomo I, cap. VIII, e Tomo II, Cap. V. 8 Apud RAHNER, Hugo. Ignace de Loyola et les Femmes de son temps. Paris. 1964,

p. 31.

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que deveria ser precedido por uma degeneração moral dos homens e das instituições sem precedentes9.

O antijesuitismo velado de Camões

Na década de 70 do século XVI a Companhia de Jesus estava plenamente implementada em Portugal e as suas estruturas organizativas e formativas já estavam habilitadas a preparar e enviar regularmente missionários para os principais pontos do império ultramarino português. Na metrópole tinham alargado de forma significativa o número das suas casas, residências, colégios e obras de assistência. Na corte exerciam uma importante influência religiosa com inevitável ascendência sobre os destinos políticos do reino, decorrente da estima que granjearam da parte da família real. Dois irmãos de sangue, Martim da Câmara e o jesuíta Luís da Câmara tornaram-se perceptores do rei D. Sebastião (1557-1578)10. Esta consolidação de um posicionamento privilegiado da Companhia junto de poder político contribuiu para acentuar a crítica a esta ascensão dos Jesuítas na esfera eclesial e política portuguesa, com a agravante da situação social, econômica e administrativa do reino e do ultramar revelar sintomas crescentes de crise.

9 Sobre a temática do fim dos tempos ver, entre muitas outras, as seguintes obras:

GOULD, Stephan Jay, et alii. O fim dos tempos. Lisboa: 1999; SCHWARTZ, Hillel. Os Finais de Século, Lisboa: 1992; CLIBERT, Jean-Paul. História do Fim do Mundo. Mem Martins: Europa-América 1995; FRANCO, José Eduardo; FERNANDES, José Manuel. O mito do milênio. Lisboa: 1999; e Fin(s) de siècle(s): Actes du Colloque tenu le mars 1998 à l’université Jean Moulin-Lyon, Paris, 1999.

10 Sobre o papel dos confessores jesuítas na corte portuguesa ver o estudo de João Francisco Marques. “Confesseurs des princes. Les Jésuites à la cour de Portugal”, In: GIARD, L.; VAUCELLES, L. (éd.). Jésuites à l’âge baroque. Grenoble: 1996, p. 213-228.

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Neste contexto, são de destacar as censuras, ainda que veladas de algum modo porque não é apontado diretamente o nome dos Jesuítas, do grande épico da literatura portuguesa moderna, Luís de Camões11. As suas alfinetadas que ficaram patentes em algumas instâncias d’Os Lusíadas (a grande obra épica da cultura portuguesa que canta a era dourada dos Descobrimentos, editada já na fase crepuscular daquela gesta portuguesa, no ano de 1572) podem ser reveladoras de uma opinião desfavorável que emergia em alguns setores intelectuais, religiosos e políticos metropolitanos e ultramarinos. Ainda que tenha sido controversa, na história crítica da literatura portuguesa, o reconhecimento da aplicação destas passagens crítica aos Jesuítas12, nós

11 Regressado do reino vindo do Oriente em 1571, onde tinha redigido o mais

emblemático poema da nacionalidade portuguesa. 12 Os historiadores e os críticos de literatura que professavam um antijesuitismo

militante, como é o caso de Faria de Castro (Les Jésuites et le Camões sous le Roi Sébastien, Lisbonne, 1903), de Theófilo Braga (Camões – época e vida, Porto, 1907) e de José Maria Rodrigues que advogou que “as alusões não podiam ser mais certeiras” (Albino Forjaz de Sampaio (dir.), História da Literatura Portuguesa Ilustrada, Vol. II, Paris, 1929-1942, p. 349), enfatizaram esta crítica como sendo indubitavelmente dirigidas aos Jesuítas por parte do épico português, extraindo daí ilações para fins ideológico-polémicos no plano da apreciação da história da literatura portuguesa. Do terreno contrário, os apologistas da Companhia procuraram contraminar esta tese, minimizando a possibilidade de Luís de Camões pretender atingir estes religiosos. Num artigo publicado na revista Brotéria, Domingos Maurício avoca em favor desta última tese as boas relações do poeta com a família dos confessores jesuítas da corte, os irmãos Câmara, tanto mais que o escrivão da puridade, à data do falecimento do poeta, ordenou que fosse lavrada uma lápide em mármore com um epitáfio muito honroso para o poeta, cujo texto foi panegírico encomendado ao jesuíta Mateus Cardoso. GOMES DOS SANTOS, Domingos Maurício. “Camões e os Jesuítas. A propósito duma nova edição dos Lusíadas”, in Brotéria, Vol. 9, Outubro, 1929, p. 288-310. Este conceituado historiador jesuíta procura rebater apologeticamente mais precisamente a edição crítica dos Lusíadas editada em Lisboa em 1921, da responsabilidade de José Maria Rodrigues. Deixando de lado os confrontos apologéticos do passado e os interesses ideológico-institucionais que as motivavam, pensamos que estas razões conjecturais não são absolutamente conclusivas do fato de Camões não querer visar os Padres da Companhia, pois a sua liberdade crítica provocada pela desilusão em relação à deriva presente do império português não se media, tendo em conta o

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perfilhamos a hipótese que considera serem aqui visados os religiosos da Companhia de Jesus, na linha do que defendem especialistas como António José Saraiva13. Pensamos estar perante um caso emblemático de manifestação de antijesuitismo, perscrutável nos silêncios, ausências e omissões da literatura e da história. Com efeito, o objetivo desta dissertação não é tanto o estudo da realidade dos Jesuítas em si-mesma (Ding an dich, a coisa em si, de acordo com a terminologia kantiana), mas é mais a forma como ela foi sendo percepcionada pelos seus críticos e adversários, tanto nas apreciações diretas como nos silêncios dos textos.

Não deixando, desde logo, de ser estranho que o poeta ao cantar o extraordinário contributo de Portugal para que o mundo “Conheça pela armas quanto excede/A Lei de Cristo à lei de Mafamede”, tenha omitido qualquer referência à notória acção dos missionários Jesuítas no Oriente que conhecia muito bem, em particular a obra de evangelização de grande visibilidade operada por Francisco Xavier que falecera com fama de santidade em 155214. Este célebre jesuíta tinha sido sepultado em Goa com aparatosas honras públicas, cidade em que Camões residia naquele tempo. Nesta omissão possivelmente intencional, não será totalmente injustificado

plano global da obra, pelas complacências das amizades. Mais ainda, nesta crítica o poeta poderia pretender visar não só os jesuítas próximos do rei, mas também outros eclesiásticos que orbitavam à volta do poder real. Portanto, podemos até admitir tratar-se não de um antijesuitismo específico, mas de uma crítica aos conselheiros religiosos em geral, em que os jesuítas também eram necessariamente englobados. O que não quer dizer também que todos os Jesuítas estivessem necessariamente englobados enquanto instituição nesta vituperação do poeta. Todavia, é uma hipótese em aberto que se deve respeitar e nunca descurar no plano sempre inconcluso da investigação histórica.

13 Cf. SARAIVA, António José. “Introdução” In Os Lusíadas de Luís de Camões. Porto. 1978, p. 9-48.

14 Sobre a vida e a obra de São Francisco Xavier ver BROU, Alexandre. Saint François Xavier. Conditions et methodes de son apostolat. Bruxelles, 1925.

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apontar alguma menor simpatia pelos missionários Jesuítas, tanto mais que à ação lendária do Apóstolo São Tomé na Índia dedica um número desmesurado, no quadro da economia da sua obra épica, de onze estrofes. E antes em várias estrofes de alguns cantos não deixa de tecer críticas magoadas que muito provavelmente visam os, então, bem posicionados Padres Jesuítas, também enquadradas no âmbito de uma crítica mais geral aos sintomas de crise e de afrouxamento da vitalidade que fez a grandeza do império português:

“E vós outros que os nomes usurpais15 De mandados de Deus, como Tomé, Dizei: se sois mandados, como estais Sem irdes a pregar a Santa Fé? Olhai, que, se sois sal e vos danais Na pátria, onde profeta ninguém é, Com que se salgarão, em nossos dias, (Infiéis deixo) tantas heresias?”16

O poeta indicia aqui um dos tópicos que se tornarão característicos da argumentação que estruturará o mito jesuíta. A

15 Recorde-se que o nome dado à Ordem fundada por Santo Inácio, Companhia de

Jesus, também não tinha sido uma questão pacífica desde o início. O fato desta Ordem utilizar o nome de Jesus para a sua auto-nomeação era visto por alguns dos seus críticos como uma arrogante usurpação. O próprio Papa Sixto IV (1585-1590), que não lhe agradava o fato de uma ordem religiosa ser nomeada com o nome sagrado do fundador do Cristianismo, chegou a extremos de ordenar ao Geral Cláudio Aquaviva a alteração da denominação oficial da Ordem dos Jesuítas. Todavia, a morte deste pontífice, ocorrida no decorrer do processo de alteração do nome, acabou por inviabilizar a promulgação do decreto pontifício que oficializaria a referida mudança de denominação. Gregório XIV (1590-1591), após o pontificado ainda mais breve do seu antecessor Urbano VII (1590) acabou por manter a nomeação, emitindo até um pronunciamento oficial que confirmava o nome original desta ordem religiosa. Cf. BANGERT, William, S.J.. História da Companhia de Jesus. Porto: São Paulo: 1985, p. 128.

16 Luís de Camões. Op. cit., Canto X, Estrof. 119.

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usurpação dos nomes, que nesta versão plural pode englobar o nome de Jesus dado à Companhia, e o nome de Apóstolos17 (“mandados de Deus”), por que eram vulgarmente conhecidos. Os Jesuítas que tinham vindo para o reino com o objetivo fundamental de se dedicarem ao trabalho missionário no ultramar, estavam implantados de forma já muito visível na “Pátria onde profeta ninguém é”, apesar de estarem a desenvolver simultaneamente uma importante atividade missionária ad gentes. Talvez a desilusão perante o estado debilitado o império e de um certo obnubilamento da antiga glória da corte portuguesa, sobre a qual pairavam algumas nuvens de incerteza, tenha desencadeado estas censuras aos membros de uma Ordem que, em poucos anos, tinham alcançado uma influência extraordinária na sociedade e na cabeça da monarquia. Camões disfere nos últimos versos da estrofe 85 do canto VII uma invectiva contundente aos conselheiros reais, onde estavam englobados certamente os Jesuítas (os irmãos Martim e Luís Câmara), na referência ao “hábito honesto e grave”:

“Nem, Camenas, também cuideis que cante Quem, com hábito honesto e grave, veio, Por contentar o rei no ofício novo, A despir e roubar o próprio povo”18.

17 Chegou até nós documentada uma passagem atribuída ao poeta, na qual também muito

provavelmente este se refere aos Jesuítas, utilizando esta palavra em voga para designá-los. Nesta carta que escreve a um amigo, presumivelmente em 1543, Camões reporta-se depreciativamente a certo tipo de mulher lisboeta do seu tempo, as ditas devotas e beatas que orbitavam em torno dos conventos e das igrejas: “Outras damas há que ainda que não sejam tão fermosas como Helena são altivas como são umas beatas de São Domingos e outras que conversam os Apóstolos. Estas se geraram de viúvas honestas e casadas que têm maridos no Cabo Verde”. “Carta de Camões a hum seu amigo”, BNL, Secção de reservados, cód. 8571, fl. 28.

18 Luís de Camões. Op. cit., Canto VII, Estrof. 85.

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Esta invectiva é complementada com a denúncia da ambição encoberta sob “um pobre e humilde manto” que dificilmente deixará neste caso de ser o de religioso:

“Nem tão pouco direi que tome tanto Em grosso a consciência limpa e certa, Que se enleve num pobre e humilde manto, Onde a ambição acaso anda encoberta”19.

O rei D. Sebastião era um monarca muito jovem, adolescente ainda, em quem o povo português depositava uma forte esperança política, depois de uma sucessão de mortes de herdeiros legítimos, os vários filhos de D. João III. Portugal depositava neste rei a expectativa de salvaguarda da independência do reino e do regresso das gestas gloriosas do passado recente. Donde a preocupação bem patente com a saúde, a educação e o casamento do rei, cujas negociações se prorrogaram indefinidamente20. D. Sebastião, a quem Camões21 via como um dom de Deus para o reino, começa a governar Portugal aos 14 anos, no ano de 1568. As apreciações do poeta

19 Ibidem, Canto VIII, Estrof. 55. 20 Sobre o reinado de D. Sebastião ver BARATA, Maria do Rosário Themudo Barata.

“D. Sebastião”. In: MEDINA, João (dir.). História de Portugal. Op. cit., Vol. VI, p. 201-226. Sobre o sebastianismo, corrente de messianismo patriótico que a morte deste rei veio gerar e de que Camões é um proto-inspirador ou o áugure, ver MEDINA, João. “O sebastianismo – exame crítico dum mito português”. In: Ibidem, p. 251-386.

21 Segundo Diogo Ramada Curto, Luís de Camões, Diogo do Couto, Manuel Severim de Faria, D. Francisco Manuel de Melo e Padre António Vieira (e nós acrescentaríamos outra figura interessante e original que se integra justamente nesta reflexão, Fernando Oliveira) são figuras representativas de um processo de questionamento da identidade nacional, que fazem parte de um “primeiro tempo de intensidade exemplar na reflexão sobre a nação”, que segundo este autor se situa entre a década de 1570 e os anos de 1620”. CURTO, Diogo Ramada. “Cultura escrita e práticas de identidade”. In: BETHENCOURT, Francisco;CHAUDHURI, Kirti (dirs.). História da expansão Portuguesa. Vol. 2. [Lisboa], 1998, p. 450.

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não deixam de fazer transparecer as intrigas que fervilhavam entre os conselheiros para obter a primazia em termos de influência, a que nos referiremos mais pormenorizadamente no próximo capítulo. Neste contexto, Camões certamente deixa transparecer a opinião antijesuítica de então, em especial nestes versos que aponta contra “aqueles que devem à pobreza/Amor divino”:

“Vê que aqueles que devem à pobreza Amor divino, e ao povo caridade Amam somente mandos e riqueza Simulando justiça e integridade Da feia tirania e da aspereza Fazem direito e vã severidade. Leis em favor do povo só perecem”22.

Numa conjuntura difícil, em que um rei inexperiente e pouco firme estava no seu poder, estas críticas denotam o sentimento público perante um monarca fraco, em que os conselheiros têm o papel mais relevante. Se o autor, como nos parece de fato, faz eco das polêmicas antijesuíticas e visa os Padres da Companhia nestes versos épicos, estes constituem um forte sintoma de que o antijesuitismo começa a ganhar expressão cultural23, resvalando já para acentuar um dos seus temas que serão dos mais privilegiados e mais glosados, a demanda 22 Luís de Camões. Op. cit., Canto IX, Estrof. 28. 23 Deste antijesuitismo manifestado através das ausências e silêncios da literatura e da

história pode ser também revelador a obra do cronista português de Filipe II, Nunes de Leão. Na sua famosa Descrição do Reino de Portugal, escrita depois de mais de meio século de missionação inaciana nas missões do Padroado Português, este historiador nomeia e elogia a gesta heróica dos mártires dominicanos como uma página gloriosa da evangelização portuguesa, enquanto que silencia ou obnubila a ação dos missionários jesuítas que já tinham adquirido grande notoriedade. Cf. LEÃO, Duarte Nunes de. Descrição do Reino de Portugal. Em Lisboa, 1610, p. 398 e ss.

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jesuítica de poder político e econômico. E assim temos aqui consubstanciado literariamente uma primeira avaliação da Companhia típica comparativamente àquelas que se verificavam no antijesuitismo internacional. Luís de Camões denuncia a ambição encapotada de poder e cobiça de riqueza, a hipocrisia moral e a bajulação dos poderosos, a austeridade de governo e a opressão da população. Cada vez mais se hão-de encontrar o desenvolvimento destes tópicos estruturantes da difusão da imagem negra da Companhia de Jesus pelo movimento antijesuítico que crescia em espiral. O que é, portanto, pertinente é que constatamos, nestas estrofes camonianas, a presença condensada das grandes invectivas que estruturarão a imagem mítica dos Jesuítas.

Frei Luís de Granada: devoto e defensor dos

Jesuítas

Se Melchior Cano ficou na história como o paradigma do dominicano antijesuíta militante, nas suas antípodas devemos situar um não menos célebre e influente filho de São Domingos, Frei Luís de Granada (1504-1588)24 que se revelou um simpatizante e promotor da expansão da Companhia de Jesus em Portugal.

Ao apoio, que se veio a revelar incondicional manifestado por Luís de Granada à afirmação dos Jesuítas mais 24 A maior especialista portuguesa no estudo desta figura considera que “Frei Luís de

Granada foi talvez no Portugal da segunda metade de Quinhentos o homem de Igreja que, com maior sabedoria e persistência, empenhamento e qualidade intelectual, se entregou à divulgação de um programa ascético que mais longos e diversificadas vias cobriu”. RODRIGUES, Maria Idalina Cobra Pereira Resina. Frei Luís de Granada e a literatura de espiritualidade em Portugal (1554-1632), Dissertação de Doutoramento em Filologia Românica apresentada à Universidade de Lisboa, Texto Policopiado, Lisboa, 1976, p. 401.

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sensivelmente no final da década de 40 do século XVI, não são alheias preocupações espirituais, pastorais comuns a ambas as partes, na linha da aposta do incremento da piedade individual a partir do ângulo de uma transformação profunda do coração e da conversão do homem a partir da sua interioridade mais funda. A perspectiva da reforma da Igreja deste dominicano coincidia com a corrente que pugnava pela renovação do catolicismo, da qual Inácio de Loyola se tornou um dos mais ativos e influentes representantes. O seu método de incremento da piedade cristã proposto na sua obra intitulada Exercícios Espirituais25 tornou-se um paradigma da nova espiritualidade reformista tridentina e pós-tridentina, com um forte acento individualizante.

Na esteira da chamada Devotio Moderna, o fundador dos Jesuítas propõe nesta obra26, que servirá de manual fundamental

25 Para uma edição comentada desta obra ver LOYOLA, Ignace de. Exercices

Spirituels. Textos definidos em 1548, traduzidos e comentados por Jean-Claude Guy. Paris: 1962. A metodologia de educação e aprofundamento espiritual codificada nos célebres Exercícios Espirituais criados e ministrados por Santo Inácio, sendo depois instituídos até aos dias de hoje como prática fundamental da espiritualidade jesuíta, marca, por excelência paradigmática, a espiritualidade típica da Companhia de Jesus. Sobre esta catecismo inaciano de metodologia espiritual, ver, entre outras obras, a análise de BARTHES, Roland. Sade, Fourier, Loyola. Paris: 1971, p. 49 e ss.; e os estudos clássicos de BROU, Alexandre. Les Exercices Spirituels de Saint Ignace de Loyola. Paris: 1922; e Idem. La spiritualité de S. Ignace. Paris: 1928; bem como bibliografia mais actualizada sobre o assunto: GRAMERO, Jesús M.. Espiritualidade ignaciana. Madrid: 1987; e RAHNER, Hugo. La Genèse des ‘Excercices’. Paris: 1989; P. Begheyn, K. Bogart. “A Bibliography on Spiritual Exercices”. In Studies Spirituality Jesuits. 23, p. 10-68, 1991.

26 Este manual de crescimento espiritual escrito em Manresa por Santo Inácio foi inspirado no Livro de Exercícios para a Vida Espiritual (1515) do Abade Cisneros, sendo também de não descurar nestes textos a forte influência do movimento religioso flamengo que ficou conhecido pelo nome de devotio moderna, que teve como obra paradigmática a Imitatio Christi de Thomas Kempis lido pelo fundador dos Jesuítas antes de elaborar este método fundante da espiritualidade inaciana. A metodologia pedagógica inaciana de incremento da devoção cristã incorpora certamente elementos da tradição do misticismo popular espanhol, que desde a Baixa Idade Média tinha sido enriquecida com contributos da cultura muçulmana. Denota-se esta influência pelas similaridades entre os métodos propostos por Santo

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de preparação espiritual para os membros da Companhia de Jesus e para os seus círculos de influência, um caminho de aperfeiçoamento interior de forte pendor cristológico. Através da meditação contemplativa dos mistérios da vida de Jesus Cristo, nomeadamente os passos da sua paixão, morte e ressurreição, através da oração mental nas suas várias etapas, pretendia-se realizar uma operação de movimento interior que conduzisse a vontade do homem ao encontro da vontade de Deus. Estimulava-se o exercício da razão para promover o entendimento das verdades da fé, e, paralelamente, incrementava-se o exercício da imaginação para despertar afetos e direcioná-los para a contemplação da humanidade e divindade de Cristo, de modo a recentrar a existência no labor pelo amor e pela maior glória de Deus.

Estas linhas fortes da espiritualidade inaciana podemos ver espelhadas de algum modo nos escritos espirituais de Frei Luís de Granada, o homem da “espiritualidade interior”, mormente no Libro de la oración y meditación27, que se revelaram, segundo afere Silva Dias, “índices preciosos de Orientação seguida pelo pietismo português”28.

Uma das primeiras facetas e façanhas conhecidas da relação de Luís de Granada com a Companhia pode verificar-se nos posicionamentos apologéticos deste dominicano contra a

Inácio e os do sufismo. Tanto um como outro dão relevo à relação entre o diretor espiritual e o seu discípulo como ajuda para o aprofundamento do seu autoconhecimento e para abrir vias de transformação interior. Com efeito, os Exercícios Espirituais comportam estratégias que remontam a Ramón Lull (1235-1315), que tinha sido influenciado por Abenmasarra, um dos mestres sufis da Península Ibérica. Desta influência da espiritualidade islâmica destilada na tradição mística espanhola o antijesuitismo extrairá mais tarde argumentos para atacar a Companhia de Jesus, acusando-a de ter uma origem muçulmana. Cf. PEERS, E. Allison. Studies of the spanish mystics. 2ª ed.. New York: 1951, p. 4 e ss.

27 Cf. Maria Idalina Cobra Pereira Resina Rodrigues. Op. cit. , p. 1039-1040. 28 DIAS, Sebastião da Silva. Correntes do sentimento religioso em Portugal (séculos

XVI a XVIII). Tomo I. Lisboa: 1960, p. 103.

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onda de contestação à natureza e à pastoral dos jovens jesuítas liderada por importantes seus confrades em Espanha. A correspondência trocada com figuras de topo do governo dos Jesuítas, nomeadamente com Inácio de Loyola, permite-nos surpreender o parecer de Granada sobre a perseguição propagandística de que os Jesuítas estavam a ser alvo. Precioso testemunho dos sentimentos de Granada é a carta de 1556 escrita para manifestar aos responsáveis da Companhia a sua discordância em relação às denúncias cerradas que Melchior Cano29 e seus apaniguados dominicanos estavam a lançar contra os inacianos recém instalados em Valladolid. Frei Luís de Granada procura animar os Padres da Companhia, colocando em paralelo estas perseguições com aquelas que tinham sofrido os primeiros cristãos. Assim como eles, os Jesuítas deveriam suportar humildemente e com paciência estas vicissitudes, pois na sua perseverança Deus iria timbrar com o selo da perenidade esta obra que seria sua. E este era o modo de proceder divino para com os seus seguidores mais queridos, tal como aconteceu com diversos casos paradigmáticos narrados nas Sagradas Escrituras. E propõe esta meditação como graça de encorajamento: “Porque assim como com louvores, quando não são demasiados, cresce a virtude, assim também com as tribulações desenvolve-se a fortaleza. Alegre-se V. R. pelo facto

29 Assim como Inácio de Loyola e o grupo fundador da Companhia de Jesus foram

associados ao grupo dos Alumbrados espanhóis e ao erasmismo considerados heréticos, também Frei Luís de Granada chegou a ser considerado suspeito e acusado na Inquisição por alguns dos seus confrades, nomeadamente por Frei Cano e por Frei Alonso de la Fuente. Foram entendidas de forma suspeitosa as suas propostas de ascese e de alargamento das práticas de santidade, oração e piedade ao universo laical do catolicismo, práticas que antes estavam reservadas apenas aos religiosos como exercício de perfeição estritamente eclesiástica. Recorde-se que o seu Livro da Oração chegou a ser colocado no Index espanhol em 1559 no término do seu quadriênio como Superior Provincial dos Dominicanos portugueses.

Cf. Ibidem, pp. 739-740; e cf. Sebastião da Silva Dias, op. cit., p. 166.

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da Companhia proceder da mesma forma que a primitiva Igreja; e o que será de Roma quando lhe faltar Cartago!”

Depois desta legitimação retórica da Ordem de Santo Inácio reconhecida como obra de Deus através do estabelecimento de um paralelismo com o modelo arquétipo configurado nas comunidades cristãs primitivas, Luís de Granada manifesta o desejo de que o Santo Ofício deveria agir contra os caluniadores da Companhia: “E não teria por inconveniente que por parte do Conselho da Inquisição se colocasse em silêncio a pessoa que escandaliza o povo, criticando um instituo aprovado pela Igreja e apelidando de Anticristo a quem não pode provar que sejam hereges, pois tais haviam de ser os que esse nome mereciam”30.

Esta defesa é feita em sintonia plena com a opinião de um outro seu célebre homem de Igreja do seu tempo, mestre e amigo de Granada, São João de Ávila, conhecido pelo cognome de Apóstolo de Andaluzia. Este grande pregador escreveu também por essa altura a D. António de Córdoba para dilucidar objeções levantadas sobre a Companhia devido à má fama que se espalhava contra esta em Salamanca:

“As objeções que Vossa Mercê me escreve colocadas por algumas pessoas me parecem muito fracas; mas não vejo por que razão digam que não conhecem que regra nem que ordem seguem, sendo notório que estudam nas universidades e rezam e doutrinam a grandes e pequenos indiferentemente, e têm vida tão sem segurança nem haveres, que parecem terem grande claridade e, por isso, grande verdade. Não os diminui o fato de serem gente nova, porque se isto bastara para condenar, quantas coisas boas já teriam sido condenadas?”31

30 “Cartas de Santo Ignacio”, Tomo II, p. 554, antologiadas por P. Juan Isérn. San

Ignacio y su obra en el siglo de oro de la literatura castellana (1516-1700). Buenos Aires: 1924, p. 37.

31 Ibidem, pp. 14-15. Recorde-se que já no ano de 1542, quando o grupo de doze jesuítas formados pelo valenciano Diogo Mirão, pelos castelhanos Francisco de

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Além do título de defensor da Companhia de Jesus, Frei Luís de Granada merece o título justo de seu recomendador, e um dos mais valiosos que muito contribuiu para facilitar o processo de expansão e de credibilização dos Jesuítas junto das elites do poder e da cultura em Portugal. Merece especial destaque o papel influente deste dominicano muito ouvido e respeitado junto do Cardeal Infante D. Henrique para permitir a fixação dos Jesuítas em Évora e a colocação da Companhia à cabeça do colégio que se veio a denominar Colégio do Espírito Santo, que o Cardeal tinha mandado começar a edificar na capital da sua diocese eborense. Como encarece o historiador jesuíta Francisco Rodrigues, sempre com adjetivos encomiásticos à vida e à figura de Granada, “para esta determinação não pouco valeram com o cardeal as palavras amigas do santo dominicano Frei Luís de Granada que desde aqueles princípios se mostrou extremamente afeiçoado à

Vilanova e Francisco Rojas, pelos franceses Pôncio Cogordon e Francisco Onfroy, pelos italianos Ângelo Paradisi, Isidoro Bellini, Martim Pezzano e Jacobo Romano, e pelos portugueses Manuel Godinho, Manuel Fernandes e António Cardoso, liderado pelo fundador português Simão Rodrigues, se dirigiam à novel cidade universitária de Coimbra a fim de instituírem um colégio perto da universidade portuguesa já pairavam, na opinião da época, conceitos diversos e algo difusos, outros confusos sobre a nova Ordem que se tinha instalado em Lisboa. Dada a atitude de pobreza, modéstia e forma simples de trajar dos primeiros jesuítas chegados a Portugal, que contrastava com a habitual atitude ostensiva e com o luxo com que vestia o clero, os novos religiosos começaram por ser apelidados pelo povo com o nome desprezível de “idiotas”. Por seu lado, a chegada e fixação do grupo fundador do colégio dos Jesuítas em Coimbra foi marcada pela desconfiança e pelo murmúrio da parte do clero e do povo em geral. Além de fazerem parte de uma Ordem desconhecida, eram na sua maioria estrangeiros e de tenra idade, tendo apenas um a ordenação sacerdotal. Já desde Lisboa que se divulgava a fama do nome com que eram apelidados: os apóstolos. O povo perplexo em razão das dúvidas levantadas por parte do clero local escarnecia destes religiosos tão jovens, enquanto os estudantes coimbrãos evitavam travar contacto com eles, pois os seus professores suspeitavam da ortodoxia da sua doutrina. Assim, crescia a murmuração em torno destes estrangeiros tidos dos idiotas, aos quais lhe foi dado um outro cognome ainda mais depreciativo pelos moradores de Coimbra, o de franchinotes, isto é, estrangeiros europeus.

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Companhia e abertamente confessava que não diferia de seus religiosos, senão no hábito”32. Em Évora, Frei Luís acompanhou o desenvolvimento do ensino dos Jesuítas no colégio e na Universidade, marcando presença nas celebrações importantes e aceitando pregar em dias festivos na capela dos Jesuítas.

Certamente este pregador dominicano teve um papel de fundo na mudança de opinião do Cardeal Infante em relação à Ordem de Santo Inácio, ao ter passado de uma atitude cultivada de relutante suspeita para uma posição de total apoio. Esta que foi uma das maiores figuras da Igreja portuguesa de Quinhentos, tornou-se depois de D. João III, um dos maiores patrocinadores de sempre dos Jesuítas. A influência de Granada na transformação dos sentimentos de D. Henrique é, aliás, claramente reconhecida pelo primeiro cronista da Companhia em Portugal, Baltazar Teles, que salienta a ação deste provincial dos Dominicanos, em paralelo com a do Infante D. Luís, no sentido de esbater as dúvidas e até a aversão votada pelo futuro cardeal-rei na primeira década da presença dos Jesuítas em terras lusitanas. Convencido por estas influentes figuras e pela evidência assinalada dos frutos da ação missionária, educativa e espiritual dos Jesuítas, “deu por mui satisfeito dos procedimentos da Companhia, mas tratou logo de a ter junto de si para consolação sua e ajuda espiritual: de suas ovelhas, dando-lhe colégio magnífico com rendas e rendendo-lhe o coração tributário com amor”33. A Companhia de Jesus, pela boca deste seu cronista, sente-se profundamente agradecida a Frei Luís, pois ele não só apoiou como fez muito para modificar a opinião negativa do Cardeal Infante e com ele de outras pessoas importantes do seu tempo em relação a esta ordem: 32 RODRIGUES, Francisco. História da Companhia de Jesus na Assistência de

Portugal. Tomo I. Porto: 1931, p. 574. 33 TELES, Baltazar. Chronica da Companhia de Jesus na Província de Portugal. Vol.

I. Lisboa: 1645, p. 512.

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“Ajudou também muito a mudar pensamentos sinistros, que de nós tinham a santa conversação e boas advertências, que neste particular lhe dava o mui religioso Padre Frei Luís de Granada, da sagrada Ordem dos Pregadores, a quem devemos eternas obrigações”34.

Luís de Granada assumiu a refutação de alguns detratores dos Jesuítas que os diminuíam pelo fato de muitos jovens formados nos seus colégios terem optado por seguir vida regular noutras ordens religiosas que não a Companhia. Considera este dominicano que este resultado não deve ser objeto de depreciação mas de encômio, na medida em que é vantagem para a Igreja: “ainda que a Companhia não fizesse outro serviço a Nosso Senhor senão povoar as ordens religiosas de pessoas de espírito e letras, era muito assinalado o serviço que lhe fazia”35.

Luís de Granada desempenhou um papel pacificador em outros conflitos e disputas que envolveram a Companhia de Jesus. Merece especial destaque o seu aconselhamento junto da corte para resolver o diferendo entre a Universidade de Coimbra e o Colégio das Artes em torno do provimento econômico deste por aquela instituição acadêmica36.

Por seu lado, com os Jesuítas Luís de Granada trabalhou concertadamente para procurar a pacificação das relações encrespadas entre elementos da família real na corte portuguesa, a saber, entre a rainha D. Catarina, D. Henrique e D. Sebastião37.

Aliás, a partir da década de 50 deparamo-nos com uma crescente proximidade e convivência mútua entre Granada e

34 Ibidem, p. 486. 35 Francisco Rodrigues, op. cit., p. 491. 36 Ibidem, Tomo II, Vol. II, p. 203. 37 Sobre a resolução deste problema político ver os pormenores em Ibidem, p. 285 e ss.

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alguns Padres e comunidades da Companhia. Podemos constatar isto mesmo nos testemunhos documentais e também na admiração e apoio recíproco. Ele de fato trabalhou em conjunto com alguns jesuítas ao serviço da Corte e da Igreja. Podemos destacar a título de exemplo a intervenção pedida a Luís de Granada para o aperfeiçoamento de alguns manuais manuscritos usados pelos Jesuítas na catequese das crianças, os quais tinham sido elaborados de acordo com o método divulgado pelo Padre Pedro Parra da Província de Aragão. Esta metodologia simples tinha a peculiaridade de convidar as crianças pelas ruas para a aprendizagem da doutrina com uma campainha e organizá-las em procissão e encaminhá-las para a igreja ao som de cânticos. Na igreja eram-lhes ministrada a doutrina através do recurso ao método dialogal com perguntas e respostas simples entre o mestre e os meninos38. Estas estratégias catequéticas foram objeto de crítica por parte de alguns eclesiásticos por suspeita de incorreções doutrinais, tanto mais que não tinham sido apresentadas aos bispos e ao Inquisidor Geral para a obtenção das devidas outorgações e aprovações. A fim de calar os críticos, os Jesuítas procuraram emendar este método naquilo que ele poderia induzir em suspeita, com a ajuda “da autoridade e ciência de Frei Luís de Granada”39.

O devotado afeto de Luís de Granada pela Companhia de Jesus não deixa de causar espanto aos próprios Jesuítas e de ser devidamente assinalado por eles como um caso notável, dado que estes contavam entre os seus principais adversários dentro da Igreja vários dominicanos importantes. Logo em 1551, pesando o já referido apoio oferecido por este dominicano com fama de santidade à implantação dos Jesuítas em Évora, o Pe. Melchior Carneiro, responsável da comunidade instaladora dos

38 Cf. Maria Idalina Cobra Pereira Resina Rodrigues, op. cit., pp. 760-761. 39 Francisco Rodrigues, op. cit., Tomo I, Vol. I, p. 459.

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inacianos naquela cidade, evidenciou numa carta dirigida ao seu Superior Geral, Inácio de Loyola, o fato de Frei Luís “amar muito a Companhia”, justificando esta enfatizada admiração, por ser caso singular e raro, com este aposto adversativo: “ainda que frade de São Domingos”40.

Efetivamente Luís de Granada mostrou razões de sobra para merecer os títulos de admirador, defensor e recomendador indefectível da Companhia de Jesus, a quem esta muito deveu para garantir a sua afirmação no primeiro século da sua implantação em Portugal. Até mesmo chegou a revelar-se um bom encaminhador de vocações para as filheiras da Ordem de Santo Inácio, como se pode depreender em alguma da sua correspondência que chegou até nós41.

Pois, para além de tudo isto, aquele respeitado dominicano já na sua velhice escreveu, em 1581, ao conhecido secretário de Inácio de Loyola, o Pe. Pedro de Ribadeneyra, exaltando os bons resultados apostólicos conseguidos pelos Jesuítas em várias partes do globo, e vendo em tal sucesso o sinal de que esta ordem jovem era abençoada e querida por Deus. Aqui podemos subentender uma espécie de regozijo pelo acerto de Frei Luís na aposta que fez com o patrocínio dado intensivamente a esta Ordem tão contestada desde o seu nascimento: “Foi para mim mui grande caridade e consolação receber carta de quem há quarenta e um anos que está na Companhia, por parecer tão antigo como ela, e assim terá as coroas de Nosso Senhor: uma de sua pessoa; e outra de ter ajudado a fundar uma ordem que expandit palmites suas usque

40 CARNEIRO, Melchior. “Carta a Santo Inácio de Loyola”. Évora, 10 de novembro

de 1551. In: Epistolae Mixtae ex variis Europae locis ab anno 1537 ad 1556 scriptae, Tomus secundus, Madrid, 1898-1901, pp. 619-621.

41 Cf. “Carta al Padre Pedro de Ribadeneyra”, Lisboa, 22 de Júlio de 1581. In GRANADA, Fray Luís de. Obras completas. Edición y nota crítica de Álvaro Huerga. Vol. XIX. Madrid: 1998, p. 80.

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ad mare et usque ad flumen propagines eius. E alegra-se ainda mais com a notícia da redação, por parte do seu correspondente jesuíta, da biografia de Inácio de Loyola, que seria publicada dois anos mais tarde42, em quem vê o merecimento da santidade do Fundador em tão copiosos frutos: “Folgo muito que ponha Vossa Reverência em língua comum a vida de seu Padre, e há dias que desejava isto, para que se conhecesse a traça e a ordem das obras de Deus, a qual se viu na da Companhia, a qual de tão humildes princípios e tantas contradições chegou em pouco tempo ao cume em que a pôs Deus, o autor e fautor da Companhia, porque desta maneira crescem as coisas em que ele põe as suas mãos”.

Granada, em plena comunhão de sentimentos com os Jesuítas, faz assim a confirmação da inspiração divina pela averiguação das obras apostólicas o projeto da Companhia de Jesus. Canoniza assim os criadores e os apóstolos desta Ordem, colocando-os no podium exemplar dos primeiros cristãos, que os grandes mentores da reforma católica e protestante moderna tomavam habitualmente por modelo inspirador para obra de renovação do cristianismo. Há claramente uma preocupação de afirmar o valor, a legitimidade e o sucesso do projeto dos Jesuítas perante o movimento antijesuítico. De fato, o antijesuitismo continuava a crescer ruidosamente por toda a Europa dentro e fora da Igreja manifestando desconfiança e justificando o sucesso fulgurante da Companhia com razões menos nobres e menos divinas. Este dominicano continua na mesma epístola dirigida ao biógrafo de Santo Inácio, defendendo que a vida do Fundador dos Jesuítas ultrapassou em feitos e sacrifícios outros homens célebres da Igreja Antiga e Medieval. A obra por ele criada e expandida confirma pelos seus resultados educacionais e espirituais a canonicidade e justeza da 42 Cf.RIBADENEYRA, Pedro de. Vita del P. Ignacio de Loyola. Madrid: 1583.

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natureza inovadora - mas muito criticada - do seu instituto enquanto ordem religiosa com a mesma dignidade das ordens clássicas: “Quanto ao que Vossa Reverência pergunta, eu não sei mais do que Vossa Reverência pode ter lido na História de Santo António, e na Vida de nosso Padre, que escreveu Susio nas vidas do mês de Agosto: porque em ambos os lugares se escreve que, empreendida a confirmação da sua ordem, enviou os seus companheiros a pregar por diversas partes, e então não podia ter coro, mas tendo conventos e numerosos religiosos, logo tinham coro”43.

Mais tarde, dois anos antes da sua morte, Granada agradece efusivamente a recepção de um exemplar da biografia de Santo Inácio oferecido pelo seu autor. A grandeza da vida do Fundador dos Jesuítas engrandece-se ainda mais na expansão da Companhia que Frei Luís enaltece como sendo um instrumento de Deus em favor da exaltação da Fé Católica em várias frentes da ação apostólica, e acredita que ainda muito fará esta ordem pela restauração do catolicismo na frente prosélita antiprotestante: “Recebi de Vossa Paternidade juntamente com a mercê que me faz de um presente tão gracioso como foi a Vida del P. Ignacio, vertida em Latim para que todas as nações estrangeiras de França e Alemanha vejam este conselho de Nosso Senhor de ter tomado um soldado para fundador de uma religião que em breve espaço se estendeu por todas as regiões do mundo com tão grande fruto das partes onde tem chegado. E também acredito que não menos fruto há-de fazer com Inglaterra, onde há muitos católicos escondidos”44.

43 “Carta al Padre Pedro de Ribadeneyra”. Lisboa, 22 de Julho de 1581, in op. cit., p. 79. 44 “Carta al Padre Pedro de Ribadeneyra”. Lisboa, Setembro de 1586, in Ibidem, p. 153.

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Tão intensa é a expressão da sua admiração e afeto pela Companhia de Jesus que Frei Luís de Granada pode ser considerado um jesuíta de coração, sem prejuízo da sua fidelidade à Ordem Dominicana. Entre esta e a Ordem dos Jesuítas ele não via duas ordens rivais mas duas ordens irmãs, em plena comunhão de objetivos e de sentimentos apostólicos. Numa carta dirigida a Cláudio Aquaviva, Superior Geral da Companhia, Frei Luís confessa sentir-se filho desta nova ordem e não esconde a sua extraordinária devoção em relação à mesma: “Não creio que estranhará Vossa Reverendíssima Paternidade escrever-lhe sem eu o haver visto nem servido, pois penso que saberá quão antigo filho sou dessa santa Companhia; e isto me levou em parte a escrever as histórias de duas vidas: uma, do padre mestre Ávila, que foi tão devoto desse santo instituto, o qual tenho agora em mãos a ponto de acabar, movido a isto por persuasão do mui reverendo padre Diego De Guzmán, que reside em Nápoles; a outra é a do sereníssimo e cristianíssimo Cardeal D. Henrique, que foi rei de Portugal, nosso senhor, que foi devotíssimo dessa santa Companhia e favorecedor de suas casas e colégios e que fundou o insigne colégio de Évora”45.

Esta admiração extrema de Frei Luís de Granada pela obra desenvolvida pelos Jesuítas não deve ser avaliada no quadro de uma lógica clubística, ou seja, não deve ser entendida como uma traição ou desconsideração pela sua ordem de pertença oficial, os Dominicanos. Granada era acima de tudo um homem de Igreja e o êxito do plano salvífico de Deus para história catolicamente entendido era a sua preocupação e empenho primeiro. Donde a sua admiração por uma ordem jovem e dinâmica que, no horizonte combativo da Reforma Católica, respondia com eficácia aos desafios da evangelização

45 “Carta al Revdmo. Padre General de la Compañía de Jesús”. Lisboa, 3 Diciembre

1586, in Ibidem, p. 154.

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numa época em que as relações entre os povos e culturas se começavam a globalizar e em que a Igreja era confrontada com fracturas e divisões na velha cristandade europeia que ele como apóstolo desejava reparar.

Portanto, a simpatia demonstrada por Granada em relação à Companhia de Jesus deve ser compreendida numa lógica de sensus ecclesia, isto é, no quadro do projeto da reforma e da expansão universal da Igreja da época pós-tridentina. Esta sintonia de sentimentos e de comunhão de objetivos reflete-se não só na epistolografia trocada com os Jesuítas, mas até na tratadística granadiana. Tal podemos surpreender n’ O Breve Tratado… de la manera que se podrá proponer la doctrina… a los nuevos infieles, em que Frei Luís de Granada reflete sobre a importância prioritária de evangelização dos novos povos encontrados pelo ibéricos no decurso das suas viagens marítimas. Neste pequeno tratado missionário tece um elogio às ordens religiosas que se têm dedicado à tarefa da evangelização ad gentes, dando particular ênfase ao elogio do trabalho missionário desenvolvido pelos Padres da Companhia nos espaços extra-europeus46. Mais uma vez aqui coincidem as preocupações e a hierarquia das prioridades pastorais de Granada com o ideário e a ação da Companhia de Jesus consagrados constitucionalmente e realizados à escala plantaria, oferecendo à Igreja uma universalidade nunca vista.

Recepção e influência de Luís de Granada na

pastoral e na espiritualidade inaciana

46 Cf. GRANADA, Fray Luís. “Introducción del Simbolo de la Fé”. In Obras de Fray

Luis de Granada de la Orden de Santo Domingo. Edición critica y completa por Fray Justo Cuervo de la misma Orden. Vol. IX. Madrid: 1906, p. 430.

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Se os Jesuítas mereceram a admiração e a cooperação do dominicano Luís de Granada, também souberam fazer jus ao apoio recebido por esta figura marcante da espiritualidade de Quinhentos. Reconheceram e agradeceram esta especial afeição e generosidade deste ideólogo da espiritualidade ibérica da modernidade. Esta reciprocidade de sentimentos não só se verificou no plano das palavras bonitas ditas e escritas. O exemplo de vida, as propostas de pedagogia da fé e de incremento da piedade individual, as orientações pastorais e parenéticas codificadas nos tratados e na retórica de Luís de Granada foram bem acolhidas e seguidas pelos pastoralistas e autores espirituais da Companhia de Jesus, à semelhança do que aconteceu em muitos outros círculos eclesiásticos, como anota Idalina Resina Rodrigues: “era altamente apreciado nas esferas eclesiásticas (…), um homem que a história e a tradição retiveram como paradigma das qualidades cristãs, um pregador da palavra que o povo frequentava com assiduidade, um mentor de agrupamentos religiosos conhecidos pelo alto nível da sua espiritualidade, um apóstolo da Igreja para quem os contactos humanos sempre significaram oportunidades de anunciar o Evangelho. Natural era, pois, que uma influência direta generalizada a tantos setores da comunidade cristã tendesse a uma contemplação através do acesso à obra literária” 47.

De fato, os Jesuítas não foram indiferentes a esta influência, antes a promoveram com assinalável frequência. Dadas as relações mantidas com muitas figuras influentes das ordens religiosas e da Igreja em geral, muitos cronistas regulares referem-se a Granada com generosos encômios. Os cronistas da Companhia não destoaram deste consensual louvor da vida e da

47 Maria Idalina Cobra Pereira Resina Rodrigues, op. cit., p. 675.

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obra deste que é considerado um dos maiores dominicanos do seu tempo e um dos maiores escritores de espiritualidade católica do século XVI. Baltazar Teles, seguido por outros cronistas jesuítas conhecidos como António Franco, é um daqueles que não lhe poupa adjetivos engrandecedores das suas virtudes no passo em que se refere a uma apreciação feita por Granada a um pregador jesuíta: “Mas bem se deixa ver nestes louvores alheios a humildade própria deste excelentíssimo varão, o Padre Luís de Granada, pois é certa que nas suas admiráveis pregações em Portugal e com seus doutíssimos livros em toda a cristandade tem feito tanto fruto e convertido tantas almas ao céu, que com muita razão o Sumo Pontífice Gregório décimo tertio, de feliz memória, disse dele, que tinha feito maiores milagres na Igreja de Deus, do que se alumiara cegos e ressuscitara mortos”48.

A boa apreciação das linhas espiritualidade renovadora de Luís de Granada pela Companhia e a sua incorporação de propostas granadianas de caminhada espiritual são assinaladas pelo testemunho deixado por Luís de Muñoz: “Liam as suas obras publicamente nos refeitórios muitas vezes no ano, repetiam-se continuamente até acabar-se, sem admitir outra lição que a interrompesse. Não há cela de particular religioso em que o Padre Frei Luís de Granada não seja inquilino; e encarregam a todos que as leiam frequentemente. E sua lição espiritual de cada dia, e muitos não lêm outro livro, porque lhe parece que nele o têm todo. Dão-no aos noviços para que o leiam; põem-lhes nas mãos aos que se recolhem nos colégios a fazer exercícios de Santo Inácio: meio pelo qual se têm

48 TELES, Baltazar. Op. cit., Vol. I, p. 533; cf. FRANCO, António. Imagem de

virtude em o noviciado da Companhia de Jesus no Real Collegio do Espírito Santo de Evora do Reyno de Portugal. Lisboa: 1714, p. 54; e MUÑOZ, Luís de. Vida y virtudes del venerable varon el Padre Maestro Fray Luís de Granda. Madrid: 1782, p. 467-468.

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melhorado muitas almas, emendando-se vidas, convertendo-se a Deus inumeráveis homens, e obrando-se grandes maravilhas. Aconselham a todos com quem tratam que estudem nestes livros celestiais pelo grande proveito que tinham experimentado os confessores”49.

No princípio da década de 80 do século XVI, um missionário da Companhia no Oriente em carta ao Geral Aquaviva alertava para as carência de instrumentos de formação no Colégio dos Jesuítas em Goa, entre os quais destaca a falta dos livros de Frei Luís de Granada50.

Podemos, por fim, evocar alguns testemunhos documentados da presença da doutrina, métodos e orientações espirituais granadianos em obras de autores Jesuítas. Verificamos a referência às propostas de caminhada espiritual de Luís de Granada em alguns estatutos de confrarias laicais organizadas pelos Padres da Companhia. Exemplo disto são os estatutos da Confraria da Caridade fundada no Oriente pelos missionários inacianos, cujo fim principal era a promoção do crescimento espiritual e moral dos leigos que se associavam. Neles escreve o jesuíta que estabelece estatutariamente a confraria em 1586: “O muito reverendo Frei Luís de Granada, nas anotações que fez sobre o 4º capítulo de S. João Clímaco, escreve que havia visto por experiência algumas mulheres casadas que, por sofrerem com muita paciência a seus maridos, ásperos e mal acondicionados, subiram a um mui alto grau de perfeição mais do que ninguém pode crer”51. O articulado dos referidos estatutos convidam os sócios da confraria a fazerem

49 Ibidem, p. 467-468. 50 Maria Idalina Cobra Pereira Resina Rodrigues, op. cit., p. 786. 51 WICKI, Joseph (ed.). Documenta Indica. Romae, 1950, Vol. XI, p. 118.

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leituras piedosas, em particular o Livro de la oración y meditación do referido dominicano52.

António Franco referencia, na sua “Évora ilustrada”, que os professores jesuítas, entre quais, o doutor em Teologia Melchior Lobato, lente da cadeira de Noa na universidade eborense utilizava as obras granadianas na preparação das suas aulas53.

A meditação metódica e a promoção de uma espiritualidade anti-formalista generalizada a todos os que se diziam cristãos eram vetores de um projeto de renovação eclesial pela transformação individual e interior que os Inacianos assumiram como prioridade pastoral, e no que encontravam uma sólida fundamentação na produção escrita de Granada54.

Conclusões

O posicionamento de Frei Luís de Granada em relação à Companhia de Jesus é revelador de que a sociedade do seu tempo não pode ser abordada nem entendida em compartimentos estanques. A admiração e o apoio manifestados por este dominicano à Ordem de Santo Inácio no seu processo de implantação e expansão em Portugal, contra a opinião de importantes confrades seus, é paradigmática das porosidades e proximidades de afetos que eram transversais às diferentes ordens e grupos de influência.

52 Ibidem, p. 123. 53 Cf. FRANCO, António. Évora Ilustrada. Pref. e org. de Armando de Gusmão. Évora: 1945, p. 237. 54 Cf. Maria Idalina Cobra Pereira Resina Rodrigues. Op. cit., p. 41 e ss.

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Com efeito, a compreensão dos conflitos e dos movimentos sociais e institucionais em concorrência precisa de ultrapassar a visão simplificada da arrumação das lutas de interesse e de ideias em blocos institucionais fechados. Ou seja, não podemos aceitar uma visão que coloque, de um lado, Dominicanos e outras ordens clássicas em bloco contra a concorrência dos Jesuítas em ascensão, do outro. A realidade histórica é mais complexa. Em vez de uma existência conflitual em blocos separados e bem definidos, a problemática da relação confronto versus admiração ou simpatia pelos Jesuítas devem ser estudados a partir de correntes de espiritualidade e de ideários/preocupações eclesiais e sociais diferentes.

Estas correntes não se identificavam ipso facto e de forma estanque com esta ou aquela ordem na totalidade do sentir dos seus membros, embora umas se identificassem mais do que outras. Mas muitas vezes eram movimentos transversais às várias ordens católicas e às várias esferas de influência da Igreja Católica. Por isso, esta transversalidade dava origem a conflitualidades críticas dentro das próprias ordens, como foi o caso paradigmático da acusação de Melchior Cano ao seu confrade Luís de Granada. Donde brotavam as relações de hostilidade ou de promoção mútua.

O ideário espiritual proposto por Frei Luís de Granada e a sua relação com a Companhia de Jesus, e a forma como, neste percurso, enfrentou e pensou os problemas da Igreja do seu tempo, à luz de um caminho de conversão bem arquitetado, resultam da percepção aguda de um sociedade em transformação acelerada. Uma transformação provocada pela revolução moderna da mundividência medieval e da iminência de fraturação de uma cristandade assente na unificação total da existência pelo sentido religioso.

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Frei Luís de Granada empenha a sua vida na reforma da Igreja e das suas instituições partindo da reforma dos corações e do recentrar da alma em Deus através de uma proposta de conversão de pendor eminentemente cristológico. Contra uma corrente mais conservadora do ponto de vista institucional e clerical, ele defendia o alargamento dos caminhos de piedade e de perfeição cristã ao universo laical, como resposta à desafecção provocada pela emergência de uma sociedade que iniciava uma experiência de secularização que se iria revelar cada vez mais crescente. Defendia a disponibilização de bens espirituais e a proposta de um tirocínio espiritual por toda Igreja, o que antes estaria apenas reservado aos eclesiásticos e religiosos.

Nesta etapa da história do ocidente cristão, que podemos denominar a época do proto-secularização, a leitura granadiana dos sinais dos tempos e as preocupações desta resultantes coincidiam com a percepção e as propostas do ideário inaciano consagrado constitucionalmente na fundação da Companhia de Jesus. Luís de Granada, a corrente reformadora que ele representava e os Jesuítas comungavam da mesma visão sobre o modo de afrontar dos dramas da Igreja de Quinhentos e sobre as formas de responder aos desafios levantados à Fé Cristã no quadro emergente da modernidade marcada pela revolução da mundividência teológica medieval.

ABSTRACT: In Camões Century, the Jesuits emerge as a new dynamic religious order with missionary characteristics e methodologies revolutionary. The fulgurate rising of Saint Ignacio’s Order give birth to contrasting appreciations round the profile, aims e modes of proceeding of the Society of Jesus. This article pretends to bring up the issue of the meaning that ant Jesuitism emergence had in the Sixteen Century and analyse two

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leading positions firmed by two figures of Iberian intellectuality and spirituality: Luís de Camões and Luís de Granada.

KEY WORDS: Jesuits, ant Jesuitism, Myth, Luís de Camões, Luís de Granada, Dominicanes.

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R E S E N H A S

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