Os Diversos Conteúdos da Fé - Jamil Ibrahim Iskandar

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RÉPLICA À CONFERÊNCIA DO PROF. DR. ESTEVE JAULENT INTITULADA "RELIGIÃO E CULTURA SEGUNDO O PENSAMENTO LULIANO"20 de setembro de 2010 no – II CONGRESSO INTERNACIONALDE INTERCULTURALIDADE – SÃO PAULO

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    RPLICA CONFERNCIA DO PROF. DR. ESTEVE JAULENT

    INTITULADA RELIGIO E CULTURA SEGUNDO O

    PENSAMENTO LULIANO

    20 de setembro de 2010 no II CONGRESSO INTERNACIONAL

    DE INTERCULTURALIDADE SO PAULO

    Jamil Ibrahim Iskandar1

    Os diversos contedos da F e o apelo compreenso da inteligncia. F e Razo.

    A abordagem aqui ser a de um paralelo entre as propostas

    de Raimundo Llio e alguns princpios da doutrina islmica, haja

    vista que Llio conheceu o Isl e pretendeu avidamente converter,

    alm de outros, os muulmanos infiis ao cristianismo. certo que

    no o fazia pela fora bruta mas, pela fora do dilogo e da

    argumentao. Para tanto, aprendeu o rabe e escreveu algumas

    obras nesse idioma, como por exemplo, O Lber Contemplationis,

    que foi escrito primeiramente em rabe e depois traduzido ao

    catalo.

    Em conseqncia de uma viso que teve em 1265, tornou-se

    tercirio franciscano, dedicando mais ainda ao trabalho de 1 Professor de filosofia medieval rabe na Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP).

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    converso (dos muulmanos). Segundo Abdul Rahman Badawi2,

    Llio teria visto Jesus Cristo crucificado 5 vezes. Esta foi a viso

    que Llio teve.

    Uma lenda afirma que ele morreu apedrejado na Tunsia no

    ano de 1315, quando se encontrava l (pela segunda ou terceira)

    vez para fazer o seu trabalho de converso dos muulmanos.

    Gostaria de retomar a palavra infiis utilizada anteriormente

    de modo bastante breve porque este no o foco central desta

    rplica. Os muulmanos foram considerados infiis pelo fato de no

    acreditarem no que segue: Jesus o homem e deidade para que

    Deus seja participado por tudo quanto foi, tem sido e ser criado (cf.

    Els cent noms de Du). S participando de Deus, da humanidade e

    da divindade de Cristo, o mundo pode ser estabelecido em grande

    bondade. No poder ser humanizado se no for deificado pelo

    homem no qual Deus se faz homem. (pargrafo citado pelo prof.

    Esteve).

    Talvez este seja o elemento de maior discrdia entre

    muulmanos e cristos: a divindade do Profeta Jesus (Alaih

    Assalm que a paz seja com ele). Para os muulmanos, Jesus 2 Abdul Rahmn Badaw. Mawsu't al-Falsafa (Enciclopdia de Filosofia), 2. ed. vol. 2. Manshurt Zawii al-Qarbi. Qom, Ir : 2009, pp.281-287.

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    Cristo um dos mais importantes Profetas que foram enviados aos

    povos e no um homem deificado.

    Apesar disso, o Isl considera a religio Crist como

    monotesta.

    Deve-se ressaltar que Muhammad no foi apenas um profeta

    do Isl, mas o era para toda a humanidade. interessante notar

    que o Isl no veio para negar as outras religies, ao contrrio, veio

    para continuar a mensagem divina tanto do judasmo como do

    cristianismo para o mundo.

    Por outro lado, a religio muulmana no se ateve

    exclusivamente mensagem revelada que o Profeta Muhammad

    recebeu e est registrada no Alcoro Sagrado. Os muulmanos,

    sem impedimento algum, apelaram razo para entender esta

    mensagem. D-se, ento, um belo encontro: a razo contemplando

    a f. O belo aqui utilizado no mbito da lngua rabe com o

    sentido de bom. Uma coisa bela uma coisa boa porque pode

    trazer benefcios tanto existenciais como espirituais ao ser humano.

    E isto que aconteceu no incio do sculo XII: a Pennsula Arbica

    foi transformada radicalmente com o advento do Isl; eu diria com o

    advento da revelao (f) exigindo a razo.

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    O Isl, apresentou, assim, novos elementos espirituais

    e intelectuais (relativo ao intelecto) e, portanto, uma nova cultura.

    (filosofia, medicina, astronomia, matemtica, qumica, fsica, etc..).

    O prprio Alcoro, fonte da f islmica, convida o intelecto

    humano a compreend-lo.

    O elemento que gostaria de ressaltar a expresso luliana

    Cultura Humanizar ; a cultura foi o tema de hoje abordado pelo

    prof. Jaulent. Deixemos de lado o que foi tratado no congresso do

    ano passado em Andorra ao qual eu no estive presente.

    Llio afirma que s quem humaniza e age segundo o

    ordenamento divino pode ser chamado de homem. Por isso no h

    redundncia alguma na definio animal hominificans animal que

    humaniza. E a humanizao deve ser de si mesmo e de seu

    entorno, na linguagem luliana.

    Esta expresso tem um apelo f. Pelo menos num primeiro

    momento, sem uma atitude de f no h como acatar tal

    ordenamento. Se quisermos levar isto para a esfera agostiniana a

    famosa expresso Crer para entender. O ponto de partida a f.

    o Isl um religio e uma ordem social que tem como base

    fundamental os princpios revelados da religio. Portanto, cristos e

    muulmanos esto juntos nesta seara da f.

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    O Isl nasceu e se desenvolveu no conceito de mmah -

    comunidade e a comunidade tem o seu entrono: a pessoa, a

    outra pessoa, a natureza, o animais, vegetais, etc.

    Por outro lado, O Profeta Muhammad pregava um

    desenvolvimento poltico-econmico-social. Estes trs elementos

    tm sua orientao no Alcoro, o Livro Revelado; portanto, tm uma

    dimenso de ordenamento divino.

    Para o islamismo, por exemplo, religio e poltica no

    representam um dualismo ; o Livro Sagrado sugere como deve ser

    o relacionamento entre governante e governado.

    Cito aqui o exemplo proposto pelo filsofo Al-Farabi para o

    estabelecimento de uma cidade virtuoso (al-Madina al-Fdila)..

    Nesta obra ele admite a necessidade da religio neste tipo de

    cidade porque a religio a garantia que o homem tem para

    consecuo da felicidade. A felicidade que al-Farabi menciona

    no apenas a felicidade advinda do mundo material, mas e,

    sobretudo, aquela que promove uma boa qualidade de vida tanto

    material com espiritual; religiosa.

    O que o Isl prope desde o seu surgimento um dilogo

    constante entre a religio revelada no Alcoro e a razo humana,

    soberana.

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    Se humanizar cristianizar, eu diria que tambm humanizar

    islamizar. O islamismo no veio para negar as outras religies

    como j foi dito, mas para fazer parte delas. Se para Llio o

    mundo no estaria estabelecido em grande bondade se no fosse

    deificado por um homem em que Deus se fizesse homem, para o

    Isl esta grande bondade estabelecida no mundo j foi feita na

    prpria criao. Tanto a natureza como o homem so

    essencialmente bons e para evidenciar isto basta que o homem,

    por exemplo, cumpra a misso de conhecer a si mesmo, aos outros

    e natureza e neles perceber os sinais de Deus.

    Conhecendo-se poder praticar atos prprios e atos

    apropriados para utilizar uma linguagem luliana.

    Toda atividade humana, caso seja bem orientada, pode ser

    construtora do homem, afirma Llio. Se esta orientao for recebida

    de Deus, certamente o homem estar bem orientado. O Isl admite

    esta orientao recebida atravs de Suas Palavras Reveladas a

    Muhammad.

    O zakat, a doao cannica no isl um dos cinco princpios

    bsicos da religio para purificar o bem ganho.

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    O Evangelho afirma: Portanto, dai antes de esmola do que

    possus e tudo, para vs, ser puro (Lc. Ii, 41).

    Nos dois caso o purificar nada mais do que uma questo

    de ordenamento divino mas que, luz da razo, uma questo de

    justia e auxlio social que se transforma em benefcios para o ser-

    existir do outro quando a questo examinada luz da razo e no

    apenas uma crena cega.

    Em apenas trs sculos, o Isl transformou-se em novo centro

    da vida intelectual do mundo. E tudo isto comeou com uma atitude

    de f. Razo e f so complementares no Isl.