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17/02/2016 “Os Direitos Sociais como Direitos Fundamentais: contributo para um balanço aos vinte anos da Constituição Federal de 1988” uma análise | Art… http://fps3000.jusbrasil.com.br/artigos/231716826/osdireitossociaiscomodireitosfundamentaiscontributoparaumbalancoaosvinteanosdaconstitu… 1/3 “Os Direitos Sociais como Direitos Fundamentais: contributo para um balanço aos vinte anos da Constituição Federal de 1988” uma análise | Artigos JusBrasil 5Considerações iniciais A vinculação dos direitos sociais ao ordenamento jurídico brasileiro diretamente no texto constitucional , dandolhes o status de direitos fundamentais, é assunto extremamente polêmico, dada a dificuldade decorrente de se viabilizálos de forma efetiva. Tal situação ocorre devido às controvérsias a respeito da forma e conteúdo que uma Constituição deveria ter, enquanto texto normativo e direcionador da realidade brasileira. Uma reflexão a esse respeito, pois, se faz necessária. Direitos sociais e o objetivo do Constituinte Num exame superficial do conteúdo do texto constitucional verificase que o objetivo do legislador foi, além de caracterizar os direitos sociais, definir as obrigações do aparato estatal e delinear os rumos que poderiam ser tomados pela nação. Neste contexto, destacamos a ênfase no contorno de direitos sociais positivos (prestacionais) quanto objetivos (defensivos), ainda que seja relativamente confusa sua classificação. Uma vez que procuramos entender qual a definição de direitos sociais adequada ao perfil constitucional brasileiro, percebese que é necessário que se respeite a vontade do Constituinte, na medida em que os direitos sociais se constituem como compensação necessária pelas desigualdades presentes na sociedade. Justificamos tal consideração pelo fato de que também são sociais direitos que asseguram a liberdade ou a proteção de bens jurídicos, reservandoos para segmentos da sociedade consideravelmente mais vulneráveis por motivos de ordem social e econômica; caso, por exemplo, dos direitos dos trabalhadores, mesclados aos direitos humanos e fundamentais em inúmeras situações constatadas na História humana, bem como outros direitos que são alçados à condição de cláusulas constitucionais, como os oriundos de tratados internacionais (ainda que seja apenas tratado como norma supralegal). O regime jurídicoconstitucional dos direitos fundamentais sociais e sua aplicabilidade Para entender a importância dos direitos sociais enquanto direitos fundamentais e a necessidade de sua aplicação como direitos constitucionais se faz necessário entender que os direitos fundamentais somente podem ter esse status graças ao privilégio a eles concedido no contexto constitucional. Não podem ser negociados pela atividade parlamentar, nem contestados dentro de um ordenamento jurídico; antes, porém, são preservados de mudanças, pela existência em nossa ordem constitucional das “cláusulas pétreas”, imutáveis por definição. Ainda que se tente esvaziar tal significado jurídico, seja pela expressão literal ou pela interpretação sistemática e teleológica do

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5Considerações iniciaisA vinculação dos direitos sociais ao ordenamento jurídico brasileiro diretamente no textoconstitucional, dando­lhes o status de direitos fundamentais, é assunto extremamente polêmico,dada a dificuldade decorrente de se viabilizá­los de forma efetiva. Tal situação ocorre devido àscontrovérsias a respeito da forma e conteúdo que uma Constituição deveria ter, enquanto textonormativo e direcionador da realidade brasileira.

Uma reflexão a esse respeito, pois, se faz necessária.

Direitos sociais e o objetivo do ConstituinteNum exame superficial do conteúdo do texto constitucional verifica­se que o objetivo do legisladorfoi, além de caracterizar os direitos sociais, definir as obrigações do aparato estatal e delinear osrumos que poderiam ser tomados pela nação. Neste contexto, destacamos a ênfase no contorno dedireitos sociais positivos (prestacionais) quanto objetivos (defensivos), ainda que seja relativamenteconfusa sua classificação.

Uma vez que procuramos entender qual a definição de direitos sociais adequada ao perfilconstitucional brasileiro, percebe­se que é necessário que se respeite a vontade do Constituinte, namedida em que os direitos sociais se constituem como compensação necessária pelasdesigualdades presentes na sociedade. Justificamos tal consideração pelo fato de que também sãosociais direitos que asseguram a liberdade ou a proteção de bens jurídicos, reservando­os parasegmentos da sociedade consideravelmente mais vulneráveis por motivos de ordem social eeconômica; caso, por exemplo, dos direitos dos trabalhadores, mesclados aos direitos humanos efundamentais em inúmeras situações constatadas na História humana, bem como outros direitosque são alçados à condição de cláusulas constitucionais, como os oriundos de tratadosinternacionais (ainda que seja apenas tratado como norma supralegal).

O regime jurídico­constitucional dos direitos fundamentais sociais e sua aplicabilidadePara entender a importância dos direitos sociais enquanto direitos fundamentais e a necessidade desua aplicação como direitos constitucionais se faz necessário entender que os direitos fundamentaissomente podem ter esse status graças ao privilégio a eles concedido no contexto constitucional.

Não podem ser negociados pela atividade parlamentar, nem contestados dentro de umordenamento jurídico; antes, porém, são preservados de mudanças, pela existência em nossaordem constitucional das “cláusulas pétreas”, imutáveis por definição. Ainda que se tente esvaziar talsignificado jurídico, seja pela expressão literal ou pela interpretação sistemática e teleológica do

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texto, chegaremos à mesma conclusão, da importância desses dispositivos e da necessidade demantê­los intactos dentro de nosso ordenamento jurídico.

E como podemos incluir os direitos sociais nessa singular categoria? Através da forte linha que uneos direitos previstos no artigo 5º e os que estão descritos nos artigos 6º e 7º, visto que os direitosrelativos à coletividade são também, na essência, direitos individuais, e que, portanto, tambémpoderiam ser agrupados nas categorias de direitos fundamentais preservados pelo statusconstitucional de “cláusula pétrea”.

Apenas através de uma interpretação sistemática seria possível encontrar resposta satisfatória parase definir quais dispositivos constitucionais são realmente imutáveis. Desde o preâmbulo do textoconstitucional, aliás, se coloca grande ênfase nos direitos sociais como objetivo permanente denosso Estado, ao lado dos direitos individuais, e que entre os objetivos do Estado Democrático deDireito constituído em 88 se encontram a cidadania, a soberania e, com igual relevância, a dignidadeda pessoa humana. Por essas observações já seria possível considerar que o Estado daí formado é,na sua essência, social, daí podermos afirmar a existência de direitos fundamentais sociais,equiparados aos direitos fundamentais individuais no seu status constitucional de “cláusula pétrea”.

Outro aspecto relevante diz respeito aos direitos individuais que são fruto de expressão coletiva,como os direitos ao voto, saúde, assistência social e tantos outros que são coletivos e individuais aomesmo tempo. Acrescente­se, ainda, que não se pode obrigar a carta constitucional a tratar direitosde formas distintas, principalmente pela natureza do Estado que se quis construir em 1988, decunho fortemente social.

Ressalte­se que o objetivo da transformação das cláusulas sociais da Constituição em cláusulaspétreas obedece a causa das mais nobres, a saber, impedir a destruição dos elementos essenciaisda carta constitucional, e garantir que as decisões tomadas pelo Constituinte sejam levadas em seucaráter mais evidente. Querer que os direitos sociais sejam passíveis de discussão é,principalmente, uma agressão ao princípio da dignidade humana, que é base do Estado brasileiro ede seu ordenamento constitucional.

Direitos sociais como direitos exigíveisFala­se, entre os juristas, que uma Constituição deve ser acima de tudo possível de ser executada.É a chamada “reserva do possível”, que indiretamente tem sido usada como ataque ao caráterfundamental dos direitos sociais pela necessidade de sua efetivação.

Esse aspecto é verdadeiro. Mas também é verdadeiro o fato de que os direitos, sejam elessubjetivos ou objetivos, tem um determinado custo para a sociedade – e, da mesma forma que osdireitos sociais, os individuais também se convertem em prestação obrigatória para o Estado.Observe­se, também, que a relevância dos direitos prestacionais torna seu custo amortizável para oEstado, na medida em que ocorre retorno econômico efetivo na consolidação de direitos sociaispara o cidadão.

Outro aspecto relevante diz respeito aos limites dos direitos sociais, que é definida pela própria

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“reserva do possível”, a saber, só se deve dar direitos no limite do que o Estado pode cumprir. Nãoobstante a necessidade de se manter o equilíbrio econômico e a capacidade real do Estado cumprirseus objetivos, vale dizer que a “reserva do possível”, ao mesmo tempo em que impõe limites aosdireitos fundamentais, também os assegura, já que há um limite mínimo e um limite máximo para aprestação do serviço ao cidadão.

Devido às grandes dificuldades em se manter um gerenciamento efetivo das demandas econômicasoriundas de direitos sociais, é mister que se desenvolvam mecanismos adequados para gerir, deforma democrática, o orçamento público e a administração das políticas públicas em geral, na esferaadministrativa ou legislativa. Faz­se necessário, ainda, dar condições para a efetivação das tutelascoletivas, proporcionando tratamento mais isonômico e racional a esse sistema, e eliminandoeventuais hipóteses casuísticas ou de insegurança que dão impacto no sistema de políticas públicas;é de suma importância, ainda, que se garanta o cumprimento dos princípios da moralidade eeficiência no trato com a coisa pública, bem como a publicidade e transparência dos atos de Estado.

Utiliza­se a “reserva do possível” como argumentação para inibir a aplicação dos direitos sociais;esquecem­se, contudo, de dizer que é obrigação do Estado garantir sua existência, assim como dosdireitos fundamentais como um todo. A própria existência de um mínimo necessário para garantir asobrevivência do indivíduo já é, por si só, argumento para que se procure garantir a “produtividade”dessa reserva.

De tal forma que o possível, em última instância, tem que se submeter às exigências do textoconstitucional, e não o contrário.

Considerações finaisA evolução do Brasil em termos constitucionais desde 1988 tem revelado que, tanto na doutrinaquanto na jurisprudência, estamos construindo uma prática jurisdicional comprometida com osdireitos sociais fundamentais e a garantia de um regime jurídico­constitucional compatível com essarealidade. Este fenômeno está se dando pela equiparação dos direitos sociais aos direitosfundamentais aos direitos sociais, ainda que eventuais objeções estejam sendo consideradas, e pelatutela constitucional cada vez mais evidente dos direitos fundamentais sociais, necessária para aconstrução de uma sociedade que tem a cidadania como base, e para o delinear de umordenamento jurídico comprometido com esse tema.