OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · Uma das principais funções da literatura é...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
LEITURA DE CONTOS EM SALA DE AULA Autora: Serli Rech Moleta1
Orientadora: Profª Drª Regina Chicoski2
RESUMO O presente artigo é o resultado das atividades desenvolvidas no PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional) ofertado pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná. O objetivo deste artigo consiste em relatar uma experiência de ensino com a utilização de contos em sala de aula, como ferramenta metodológica para promoção da leitura, realizada com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, do Colégio Estadual Francisco Ramos oriundos da agricultura familiar e fumicultores do município de Guamiranga – PR, no ano de 2014. Para a realização deste trabalho foram selecionados os contos, O caso do Bolinho (2005) de Tatiana Belinky, ilustrado por Michio Yamashita; O cão dos Baskerville (1996), de autoria de Sir Arthur Conan Doyle, Chapeuzinho Vermelho (2013) dos Irmãos Grimm e Chapeuzinho Amarelo (2011) de Chico Buarque de Holanda, ilustrado por Ziraldo. O amparo teórico está em autores que discutem leitura, literatura, entre eles: AMARILHA (2001), CHARMEAUX (1997), SILVA (1994) e outros. PALAVRAS-CHAVE: Leitura; Literatura; Contos.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo é resultado de um trabalho realizado com leitura de contos,
em sala de aula, com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental do Colégio Estadual
Francisco Ramos oriundos da agricultura familiar e fumicultores do município de
Guamiranga/PR.
É comum ouvirmos nas escolas que os alunos demonstram cada vez menos
interesse em ler. Os resultados de avaliações nacionais têm revelado que de uma
maneira geral, no Brasil, há uma proporção significativa de analfabetos funcionais,
com grande déficit na compreensão da leitura. Numa tentativa de promover a leitura
em sala de aula, a escolha por contos foi uma tentativa de promover a leitura entre
os educandos de forma significativa. Com isso o papel do professor e sua prática 1 Especialista em Processo do Ensino-Aprendizagem da Língua Portuguesa – Faculdade de Educação São Luís/Jaboticabal e Ensino e Formação de Recursos Humanos para Educação Básica – UNICENTRO/Prudentópolis. Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, Professora da Rede Estadual de Ensino do Colégio Estadual Francisco Ramos – Guamiranga/PR. 2 Doutora em Teoria Literária e Literatura Comparada pela UNESP e Docente do Departamento de Letras da UNICENTRO/Irati.
pedagógica são fundamentais no processo de ensino e aprendizagem.
Este estudo caracteriza-se numa abordagem qualitativa, com revisão
bibliográfica, visando alcançar os objetivos propostos, tendo como fonte de
referência, livros específicos sobre o tema em foco, pois “a pesquisa bibliográfica é
desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e
artigos científicos” (GIL, 1996, p. 48) e aplicação em sala de aula.
A leitura precisa ser urgentemente promovida e incentivada, pelo fato de que
o meio social atual exige dos indivíduos uma visão ampla e um conhecimento geral
de vários assuntos. Assim, a leitura pode ser vista como a porta de entrada para a
vivência em sociedade. Quando nascemos, iniciamos imediatamente a nossa
comunicação, pois necessitamos manter contato com a família e com a sociedade
num modo geral. Um dos primeiros mecanismos de interação, de comunicação é a
fala, a criança começa a comunicar-se através de sílabas e pequenas palavras.
Percebemos, então, que o sujeito é um ser formado através da linguagem, o
que o torna apto ao discurso, somente através da leitura crítica e aprofundada, o
aluno é capaz de enxergar o que está implícito, aprendendo assim a real
proporcionalidade dos textos. Pela inserção na formação social, os indivíduos vão
ampliando seu vocabulário para se comunicar e se expressar melhor.
Muitas são as formas existentes para se motivar e entusiasmar os alunos para
uma prática de leitura consciente e crítica no ambiente escolar, cabendo assim, ao
educador, adequar suas aulas à melhor forma de aprendizagem. A leitura é uma
fonte inesgotável de conhecimentos e informações o que permite aos alunos ter um
contato com um mundo repleto de imaginação e criatividade por meio dela.
Analisando a leitura numa perspectiva discursiva, entendemo-la como uma
prática social, formada por indivíduos que interagem num mesmo contexto, desta
forma, não podemos analisá-la de maneira individual. Em se tratando das aulas de
Língua Portuguesa, cabe ao professor mediar à aquisição da leitura, de modo que
venha a contribuir para o desenvolvimento de leitores críticos e ativos, isso porque
ler não se resume em decifrar o que está escrito nos livros, mas interpretar as ideias
que o autor expressa e associá-las à realidade vivencial de cada um.
O aprendizado da leitura deve ocorrer pelo prazer que é despertado no aluno,
de interagir com a diversidade de textos para expressar seu jeito de ser, pensar e
agir, uma vez que a Educação, em Língua Portuguesa, deve capacitar os indivíduos
para que, por meio dela, realizem o ato comunicativo, exercendo sua função social.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE CONTOS
O grande desafio da escola hoje é a busca por metodologias que possibilitem
o acesso e a garantia de educação a todos os indivíduos aprendendo
diferentemente, de acordo com suas possibilidades e habilidades.
Segundo Cadermatori (1987) a escola deve incentivar os educandos a
despertarem o entusiasmo pela leitura. Para a autora:
A literatura propicia uma reorganização das percepções do mundo e, desse modo possibilita uma ordenação das experiências existenciais. A convivência com textos literários provoca a formação de novos padrões e o desenvolvimento do senso crítico (CADERMATORI 1987, p. 19).
Nota-se que alguns educandos, muitas vezes, lêem apenas por obrigação,
porque o professor mandou e verifica-se que é crescente o número de alunos que
demonstram desinteresse pelo ato da leitura. Já, a leitura prazerosa desenvolve nos
indivíduos a criticidade e os tornam ativos e participativos no meio social. Segundo CUNHA (1991, p. 09) é verdade que no meio escolar: “entre
televisão, música, teatro e esporte, a leitura ocupa sempre um dos dois últimos
lugares na preferência dos alunos”. Diante disso, percebemos o grande papel que o
meio escolar precisa desempenhar para mudar esta realidade, mostrando que o
indivíduo pode aprender, ensinar, pensar, criar, recriar e fazer a leitura de mundo,
interagindo com os textos, expressando seu jeito de ser e agir. De acordo com
CHARMEAUX: “Ensinar a leitura, principalmente, é colocar em funcionamento um
comportamento ativo, vigilante, de construção inteligente de significados” (1997, p.
88). É nessa dimensão dialógica, discursiva que a leitura deve ser proposta e
experimentada, é um processo que implica uma leitura crítica, que precisa de uma
resposta do leitor elaborando significados.
Assim, o leitor ideal é aquele que possui capacidade de entrar no universo do
autor e confrontá-lo com a sua realidade, com o seu universo, desta forma a escola
precisa favorecer oportunidades para que se realize a leitura crítica, transformando
desta forma o ato da leitura, sendo que “o acesso ao ler significa ter acesso à escola
e nela obter os conhecimentos necessários à participação no mundo da escrita”
(SILVA, 1994, p. 29).
LUCKESI coloca que “as atitudes positivas do educador levam o indivíduo
não só uma maior independência interna e autoconfiança, bem como contribui para
desenvolver suas habilidades e conhecer as próprias características e seus próprios
limites” (1994, p. 25).
Para Silva:
[...] a prática de leitura é um princípio da cidadania, ou seja, o leitor cidadão, pelas diferentes práticas da leitura, pode ficar sabendo quais são as suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz (p. 24, 2005).
A leitura requer a compreensão das esferas discursivas, na qual os textos são
produzidos e circulam, assim também o leitor precisa compreender as intenções
presentes nestes discursos. Fazer uma leitura crítica, onde o leitor consiga fazer
relações entre o discurso a ele apresentado e o contexto social no qual vive.
Toda educação verdadeiramente comprometida com o exercício da cidadania,
precisa criar condições para o desenvolvimento e a capacidade do ato de ler. Por
que são os textos que favorecem a reflexão, a imaginação e levam o indivíduo a
uma participação mais ativa na sociedade.
Assim sendo, não pode haver leitura significativa sem produção de sentidos,
porque ler no real sentido da palavra é uma atividade diretamente relacionada à
construção de sentidos. Neste sentido, o leitor que apenas reproduz o que leu, sem
interpretar, não consegue transformar em conhecimento a informação obtida,
ocorrendo assim, apenas uma leitura mecânica, sem nenhuma contribuição efetiva.
Cada tipo de texto é produzido a partir de diferentes intenções: informar,
convencer, seduzir, entreter, criticar, instruir, etc. com o objetivo de levar o leitor a
perceber estas diferenças, respeitando assim, suas especificidades, fazendo com
que este, desenvolva um olhar indagador ante ao tema, não aceitando como pronto
e buscando explicações e informações que o auxiliem na construção de novos
conhecimentos.
A construção do conhecimento na escola se dá a partir da interação com a
realidade, com o cotidiano, por meio de pesquisas, de experiências, de troca de
ideias e da leitura de textos, formando um aluno com plena capacidade de utilizar
diferentes linguagens como forma de expressão, bem como diversas fontes de
informação da aquisição de conhecimento. Como se pode observar, os textos são
uma fonte riquíssima de trabalho em quaisquer áreas do conhecimento, sendo
importante trabalhar a diversidade de textos sendo eles: jornalísticos, informativos,
literários, científicos, históricos, entre outros.
Na leitura dos diversos tipos de textos, o aluno vai estabelecendo sentido a
partir das marcas próprias de cada texto, da discussão dos conteúdos e de acordo
com a sua experiência de leitura e visão de mundo. Nesse enfoque, o texto
apresenta várias possibilidades de interpretação e não apenas uma resposta que é a
interpretação do professor ou do livro didático. Cabe ressaltar que existe também a
“leitura errada” isto é, aquela em que o leitor não percebe as pistas que o levariam a
depreender o sentido do texto.
Nesse sentido, Orlandi nos diz que:
Em relação a um mesmo texto, há leituras possíveis hoje e que não seriam em outras épocas. Isso nos mostra que a ação do contexto abrange mais do que fatores imediatos de comunicação, em sua situação momentânea (ORLANDI, 1987, p. 22).
Pode-se perceber então que a leitura é uma prática social, a qual reflete seu
tempo e se caracteriza sócio-historicamente. Assim, ler é importante para todo o
sujeito, por isso, a importância de se fazer um trabalho contínuo com a leitura e
incentivar os educandos a manterem essa prática no seu dia a dia.
Uma das principais funções da literatura é permitir que o leitor se desenvolva
na sua totalidade, como indivíduo que imagina, cria, recria, enxerga o real, pensa e
repensa seu universo, seu mundo particular. Mas existem outras funções que estão
interligadas: se a literatura nos ensina a perceber e a reorganizar o mundo, também
propicia aos educandos na melhora do vocabulário, melhor desempenho ortográfico,
compreensão das diversas áreas do conhecimento, desenvolvimento da criatividade
e criticidade, introspecção por meio da leitura de mundo, questionamento sobre
diversos problemas, apresentado nas entrelinhas dos textos literários. De acordo
com Moraes:
Contar histórias e brincar com a linguagem é potencialmente, ao menos, uma necessidade e uma capacidades, vinculadas àquela necessidade vital de fantasia de que nos fala Gaston Bachelard, e às não menos vitais necessidades de expressar-se e comunicar-se...! (MORAES, 1982, p.41)
O ato de ler não se restringe somente ao ato de interpretar e aceitar a opinião
que nela está presente, o ato de ler, não é decifrar sinais gráficos, mas o sentido que
é dado àquilo que se lê.
3 METODOLOGIA, ESTRATÉGIAS DE AÇÃO E RESULTADOS OBTIDOS
Expostos os referenciais teóricos que embasaram este estudo, busca-se
agora relatar o trabalho de implementação pedagógica desenvolvido no 1º semestre
de 2014, no Colégio Estadual Francisco Ramos – Ensino Fundamental e Médio, no
município de Guamiranga, com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, conforme
dito anteriormente. Ao todo foram 32 aulas, que ocorreram nas terças e sextas-
feiras. O material pedagógico de apoio para implementação do projeto foi produzido
pela pesquisadora como consta no Caderno Didático Pedagógico construído no ano
de 2013, intitulado de “Leitura, Fonte de Conhecimento: O aprendizado da leitura
através de Contos”.
Para o desenvolvimento da proposta foram selecionados alguns contos, com
o intuito de promover a leitura em sala de aula por meio do conto literário e
incentivar a prática desses textos, despertando o gosto e o entusiasmo pelo ato de
ler. Acreditando que é por meio da leitura que construímos o processo de
apropriação do conhecimento, estabelecemos vínculos informativos, selecionamos
informações, assimilamos conceitos, reestruturamos nosso pensamento e elegemos
valores para nossa conduta social.
Uma das alternativas para a formação de leitores competentes é a
democratização do acesso aos diferentes suportes da linguagem escrita. A
diversidade de textos literários possibilita o leitor ampliar sua gama de
conhecimentos não sendo meramente decodificador passivo de códigos, o leitor
torna-se um ser que interage com a diversidade de textos, estabelecendo relações
entre seus conhecimentos prévios e aquilo que lê, para então construir novos
conhecimentos.
A leitura permite o estímulo à participação ativa do leitor à medida que
desenvolve sua capacidade de reflexão crítica, demonstrando contínua ampliação de
sua competência de interpretar dados e fatos, relacionando-os e elaborando
hipóteses explicativas.
A aplicabilidade das atividades teve o intuito de incentivar a prática da leitura,
despertando o gosto e o entusiasmo pelo ato de ler, visto que, os contos de
aventura, suspense e de fadas são atrativos por suas histórias prazerosas e
linguagem acessível. Nesse sentido, buscou-se proporcionar aos educandos
oportunidades de ler no real sentido da palavra, ou seja, ler, compreender e
interpretar o que leu.
O trabalho foi iniciado com um questionamento aos alunos acerca do que eles
entendem por contos. Partindo dos conhecimentos prévios, foram trabalhados
alguns conceitos referentes a contos, abordando também sobre as características do
conto, sua estrutura, o tempo, o espaço, a temática, os personagens e o mecanismo
de construção do conto.
O primeiro conto trabalhado foi O caso do Bolinho (2005) de Tatiana Belinky,
ilustrado por Michio Yamashita. Iniciei o trabalho com a contação do conto, depois
realizei a leitura em voz alta, pois o ato de contar histórias é uma das principais
metodologias para adentrar o aluno no mundo da leitura. O contar nos dá recursos
sonoros e visuais que aumentam o apelo narrativo, prendendo a atenção do aluno
que se vê envolvido pelo som, pelo movimento de quem está a narrar a história.
Depois de ouvirem o conto, realizamos leitura silenciosa, leitura coletiva,
declamação dos versos presentes no conto e criamos uma melodia para esses
versos. Após ensaiamos e cantamos a música. Houve participação dos alunos,
teceram perguntas acerca do conto. O conto motivou os alunos a participarem com
alegria, tornando assim a aula descontraída e alegre. Também criaram paródias a
partir dos versos de Belinky e dramatizaram o conto, atividade que despertou a
criatividade dos alunos.
Na sequência, apostando no suspense, foi selecionado o conto O cão dos
Baskerville (1996), de autoria de Sir Arthur Conan Doyle. O trabalho foi iniciado
verificando com o grupo se eles apreciam esse tipo de leitura. Antes de narrar a
história, foi preparado um cenário atrativo com música de suspense, voz com
entonação característica, a turma ficou fascinada pela narração, pelo clima de
suspense. Durante o processo, hipóteses foram conduzidas para instigar a
imaginação criativa dos alunos. Foi utilizado como um instrumento de avaliação uma
caixinha mágica com questões pautadas no conto. Todos os alunos participaram
motivados respondendo, questionando e opinando sobre as questões. A avaliação
formativa tem uma concepção pedagógica que o aprender é um longo processo por
meio do qual o aluno vai reelaborando seu conhecimento a partir de atividades que
executa, pois a função da avaliação formativa é controlar com o propósito de
fornecer dados para o aperfeiçoamento do processo de ensino – aprendizagem.
Jorba e Sanmarti explicam melhor essa questão:
Pode-se dizer, pois, que a avaliação formativa destaca a regulação das atuações pedagógicas e, portanto, interessa-se fundamentalmente mais pelos procedimentos das tarefas do que pelos resultados. Em resumo, a avaliação formativa persegue os seguintes objetivos: a regulação pedagógica, a gestão dos erros e a consolidação dos êxitos (JORBA & SANMARTI In BALLESTER, 2003, p. 30).
Em suma, avaliar é analisar todo o processo de ensino-aprendizagem,
observar quais são as necessidades específicas de cada aluno, assumir a função
diagnóstica, com os propósitos de detectar dificuldades específicas de
aprendizagem. O professor tem que ter uma análise crítica dos instrumentos a
serem utilizados na avaliação. Ter a avaliação como instrumento auxiliar de
aprendizagem e não classificatória.
Em continuidade à proposta de implementação do Projeto Leitura, Fonte de
conhecimento: O aprendizado da leitura através de Contos, foi trabalhado com o
gênero Contos de fadas. Os Contos de fadas são também contos de encantamento,
cujos enredos possuem fatos extraordinários e inverossímeis, tais como aparições,
sortilégios, magias, etc, portanto, devido à importância desse gênero literário, optei
também por desenvolver essa arte em meu trabalho de implementação pedagógica.
Os temas abordados pelos contos de fadas são de cunho cotidiano, muito
próximos do dia-a-dia das pessoas, como: o amor, o ódio, a tristeza, a decepção, as
perdas materiais e emocionais. Talvez por isso, esses contos vencem os séculos e
continuam sendo contados e recontados.
Como os contos de fadas são de origem popular, não há autoria definida e
sim compiladores, ou seja, pessoas que pesquisaram, reuniram e publicaram esses
contos. A percepção de que há uma ideologia tendenciosa nos contos de fadas não
deve afastá-lo do ambiente educacional, mas deve provocar, principalmente por
parte dos professores, uma leitura mais crítica em relação a estes e outros textos
trabalhados nas escolas. Não se pode deixar de citar que os contos de fadas são
textos que, a exemplo de qualquer outro enunciado, carrega intencionalidade e
exemplaridade.
Optamos por trabalhar com o Conto Chapeuzinho Vermelho (GRIMM, 2013) e
Chapeuzinho Amarelo (BUARQUE, 2011). Várias versões do clássico Chapeuzinho
Vermelho foram apresentadas com o objetivo de levar os alunos a perceberem as
diferenças entre os contos, qual mensagem está implícita tanto no discurso verbal
quanto no não-verbal.
Depois, os próprios alunos contaram as versões que conheciam de
Chapeuzinho Vermelho, contrapondo com o conto Chapeuzinho Amarelo, suas
releituras já com uma compreensão mais refinada de cada conto, as mensagens
implícitas existentes em cada um deles e os aspectos que os diferenciam. Foi
possível estabelecer um diálogo em sala de aula, questionamentos levantados,
análises realizadas e estímulo a criticidade dos alunos. O clássico Chapeuzinho
Vermelho remete ao poder supremo do lobo sobre os personagens, onde todos
temiam a sua presença e Chico Buarque de Holanda no reconto Chapeuzinho
Amarelo, suscita o imaginário do leitor de maneira a libertar os medos e dificuldades
cotidianas. Esse texto nos mostra que a insegurança foi desaparecendo à medida
que a personagem principal enfrentava seus medos, até eles serem eliminados, o
que acabou tornando-a criativa, corajosa e audaciosa por sua superação.
O gênero literário Conto tem em sua essência um componente dramático, um
só conflito, ação. É objetivo, concreto, linear e narrado, principalmente, em 3ª
pessoa. Os elementos imaginativos conferem o caráter estético desse gênero
contrapondo-se ao realismo, talvez sendo essa junção que os torna encantadores,
fantásticos, estimulantes de ler e de ouvir. A imaginação somada à realidade através
de metáforas, o diálogo direto que permite uma comunicação imediata entre o leitor
e o conto, propicia a verossimilhança.
A literariedade de um texto se refere, em essência, à função estética das
palavras e ao poder de transformação ficcional que essas palavras carregam, ou
seja, um texto não literário comunica e um texto literário comunica estética e
ficcionalmente.
A leitura vai, portanto, além do texto, seja ele qual for e começa antes do
contato com ele. O leitor assume um papel atuante, deixa de ser mero decodificador
ou receptor passivo. E o contexto geral em que ele atua, as pessoas com quem
convive, passa a ter influência apreciável em seu desempenho na leitura, ou seja, o
papel e a função pedagógica exercida pelo professor mediante o processo de ensino
e aprendizagem para a leitura reflexiva e questionadora.
Dando continuidade aos trabalhos, de maneira a motivar e instigar a liberdade
criativa, expressão, coordenação motora e sensorial dos alunos, a turma foi dividida
em 03 (três) grupos, para que analisassem, refletissem sobre o projeto
implementado. Desta forma, cada grupo deveria representar os contos trabalhados
de acordo com suas avaliações e percepções. Cada grupo escolheu uma
modalidade para representar, entre elas: desenhos, recortes, colagens e reconto. A
representação das imagens verbais e visuais propiciaram momentos significativos
de interlocução, capazes de suscitar a criatividade dos alunos.
Ao término das 32 aulas, com o intuito de avaliar se as atividades
diversificadas, lúdicas, corroboraram para que eles lessem com maior prazer os
contos e compreendessem o que estavam lendo, efetuamos um diálogo onde as
respostas e interação dos alunos foram gravadas para facilitar a sistematização
desse trabalho.
O diálogo realizado teve como objetivo, aproximar os alunos, trazê-los
intimamente para a discussão, valorizá-los como atores sociais munidos de sua
historicidade, ouvir atentamente suas argumentações, questionamentos, e nós
professores exercemos a função de problematizar, instigar, levá-los a coerência
desse saber.
No intuito de avaliar o processo de implementação pedagógica e melhor
perceber o posicionamento dos alunos em relação ao trabalho com contos, numa
turma de 23 alunos selecionei os depoimentos de cinco alunos, que serão
identificados como: aluno A, aluno B, aluno C, aluno D e aluno E.
Iniciei nosso diálogo fazendo uma retrospectiva de todas as atividades
realizadas por meio do projeto, retomando e relembrando de alguns momentos
marcantes e dinâmicos desse processo, os alunos contribuíram e teceram
comentários.
Ao perguntar se já tinham tido contato com a leitura de contos antes do
projeto, o Aluno A respondeu [Sic]: Até então não gostava de ler é que a leitura não
me interessava. 08 (oito) alunos concordaram com o posicionamento do aluno A. Os
alunos B C D responderam [Sic]: já tive contato com contos e este projeto despertou
ainda mais o gosto por ler. Mediante essa resposta 07 (sete) alunos foram
coniventes timidamente com essa última resposta. Já o aluno E negou-se a
responder junto com seus 03 (três) colegas, esses alunos não demonstraram
interesse no desenvolvimento do projeto, onde a metodologia aplicada não os atraiu
o suficiente para instigá-los para o ato de ler.
Quando indaguei sobre a concepção de leitura deles após o projeto, o
aluno A disse: Não imaginava o quanto era bom ler e o quanto a leitura é fascinante.
Cinco alunos concordaram com essa afirmação. Para o aluno B: A leitura é algo
bom, gostoso de se fazer. Para o aluno C: A leitura é algo mágico, um mundo cheio
de descobertas. Somente o aluno E mostrou-se apático perante a pergunta.
Durante o projeto, como já mencionado, foram trabalhados os contos: O
Caso do Bolinho, O Cão de Baskerville, Chapeuzinho Vermelho e Chapeuzinho
Amarelo. Ao lançar a terceira pergunta: “Qual conto vocês mais apreciaram?” Os
alunos A, C e D responderam que: O Caso do Bolinho foi o mais interessante e
atrativo. O aluno B afirmou: gostei mais da comparação do Chapeuzinho Vermelho e
Chapeuzinho Amarelo. O aluno E não muito participativo, disse: “me interessei pelo
conto de suspense, o Conto: Cão dos Baskerville”. Não considero o aluno E
desinteressado pelas atividades, não o avalio de forma negativa, pois nem todos
podem se identificar com tudo o que se apresenta. Ao menos ele se identificou com
um dos contos trabalhados, O Cão de Baskerville.
Durante a quarta pergunta foi questionado se eles gostariam que fosse
inserido nas aulas de Língua Portuguesa um momento destinado para leitura de
contos. Todos foram unânimes e concordaram com a fala do aluno A: “gostamos
muito, o tema é interessante pra nossas aulas e pra nossa vida”. Mesmo os alunos
mais introvertidos, que demonstraram apatia em determinadas atividades, foram
positivos nessa resposta, ou seja, eles se sensibilizaram com a proposta.
A quinta e última pergunta foi: O projeto contribuiu para a vida escolar de
vocês? O aluno A respondeu: “Sim, contribuiu, o projeto me despertou o interesse
pela leitura”. O aluno C comentou que: “além de aprender, a leitura é algo bom, a
gente aprende coisas novas”. O aluno D concordou com a afirmação do aluno C. O
aluno E não respondeu a pergunta, ficando em silêncio quando questionado.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho desenvolvido, desde seu planejamento, elaboração do Caderno
Didático Pedagógico e a implementação das ações em sala de aula, com alunos do
6º ano do Ensino Fundamental serviu para repensar a prática docente. Muitas vezes
os alunos são acusados de não gostar de ler, mas o que se percebe é que se o
professor propiciar condições favoráveis, estratégias interessantes para promover a
leitura em sala de aula, os alunos reagem positivamente, pois a escola é o lócus
para promover este processo de forma efetiva.
O objetivo principal dessa intervenção pedagógica foi “promover a leitura em
sala de aula por meio do conto literário”. No decorrer do processo os objetivos foram
alcançados, pois a partir do momento que se tem uma proposta planejada, com
metas bem estabelecidas, os resultados acontecem.
Os resultados obtidos revelam a importância do planejamento das aulas. Com
o planejamento e detalhamento de ações conseguimos perceber os progressos e os
objetivos que foram sendo alcançados. As diversas formas de se avaliar o processo
a cada atividade implementada, propicia ao professor e aos alunos perceber a
posição em relação à situação em que se encontram.
A participação no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) foi uma
grande oportunidade de retomar os estudos de forma mais intensa, aprofundando
meus conhecimentos científicos, atualizando-me com novas produções, pesquisas,
contato com estudos recentes sobre Literatura. A interação com outros colegas
professores, a troca de conhecimentos foram essenciais nesse processo. Vale
salientar também, o contato com docentes plenamente capacitados que nos guiaram
e orientaram nesses 02 (dois) anos de capacitação, em especial à minha orientadora
que me direcionou para o melhor caminho a ser percorrido, a indicação de leituras,
referências teóricas, correções precisas nos mínimos detalhes, fazendo que a cada
correção pudesse buscar novas fontes que enriquecesse o referido trabalho.
Afirmo também que, durante todo o período de realização do PDE, fui muito
bem acolhida e auxiliada pela Direção, equipe pedagógica, professores e pela
equipe administrativa do Colégio Estadual Francisco Ramos, município de
Guamiranga/PR, se não fosse o apoio de todos eles, não seria possível a conclusão
exitosa deste trabalho. E não poderia me esquecer dos alunos do 6º ano do Ensino
fundamental, eles foram essenciais nesse processo de pesquisa e implementação
do projeto.
Este artigo tem como objetivo ser um subsídio complementar à disposição
dos professores sobre a o processo de ensino e aprendizagem da leitura por meio
de contos. De fato, através dos contos podem-se descobrir novos lugares, se
reinventar através do tempo e espaço, outras formas de ser e agir. Por isso, durante
o desenvolvimento do projeto, devido à diversidade de contos trabalhados, a
dinâmica com qual foram aplicadas às atividades, propiciou aos alunos uma
interpretação mais apurada em relação às mensagens implícitas nos contos e não
de forma superficial.
Do exposto conclui-se que, a implementação pedagógica realizada, despertou
nos alunos o gosto pela leitura, a curiosidade e a busca por novos gêneros literários.
Nesses termos o professor deve questionar o seu papel e sua função social
como agente transformador da sociedade. É preciso ressignificar a prática
pedagógica sendo que é uma atividade humana, real, objetiva, procurando meios
onde possamos aproximar nossos alunos para as discussões atuais, levá-los a
participar ativamente nas atividades em sala de aula. É necessário romper com
paradigmas arraigados numa proposta conservadora, onde “adestra-se” os alunos
às concepções ideológicas e políticas da sociedade vigente, portanto a intervenção
pedagógica descrita, neste artigo, contribuiu para que os alunos começassem a
estreitar laços afetivos com os livros. AMARILHA (2001) diz que a arte de contar e,
por que não, ouvir histórias parece ter dado lugar a certas práticas no cotidiano das
pessoas. Em nome de uma cultura voltada à tecnologia, os nossos adolescentes não
mais vivenciam este momento prazeroso e de suma importância para o intelecto e
para a formação humana.
5 REFERÊNCIAS AMARILHA, M. Estão mortas as fadas? Literatura infantil e Prática Pedagógica. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
BALLESTER, Margarita [et al]. A Função Pedagógica da Avaliação. In: Avaliação como apoio à aprendizagem. Trad. Valério Campos. Porto Alegre: Artmed, 2003.
BELINKY, Tatiana. O caso do Bolinho. São Paulo: Editora Moderna, 2005.
BUARQUE, C. Chapeuzinho Amarelo. Rio de janeiro: José Olympio, 2011.
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CUNHA, N. H. S. Brinquedo, desafio e descoberta, subsídios para utilização e confecção de brinquedos – Brasília: FAE, 1991.
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