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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

AGROTÓXICO E SAÚDE - Ampliando o conhecimento no âmbito escolar.

Autor: Clodoaldo Candido Ferreira 1

Orientadora: Luciana Paula Grégio d’Arce Rodrigues2

Resumo: Esse artigo trata-se de atividades pedagógicas aplicadas e desenvolvidas na escola

abordando questões referentes aos agrotóxicos e seus perigos a saúde, especificamente aos

trabalhadores rurais e moradores do entorno de áreas de produção agrícola, que estão expostos ao

perigo e o uso abusivo e incorreto desses produtos nas lavouras, a influência de empresas ligadas ao

agronegócio e a responsabilidade dos aplicadores. Esse trabalho foi desenvolvido a partir de diversas

atividades dentro e fora da escola; (questionários, pesquisas, entrevistas, coleta de dados, visita de

campo, palestras) realizadas com jovens estudantes do Ensino Médio do Colégio de Nova Santa

Rosa PR. São atividades pedagógicas com metodologias diversificadas no sentido de transmitir

conhecimentos e provocar reflexões, para o desenvolvimento de ações, atitudes e comportamentos

para o enfrentamento dessa grande problemática vivenciada por muitas pessoas.

Palavras-chaves: Agrotóxico e saúde, Perigo dos agrotóxicos, Uso abusivo dos

agrotóxicos, Agronegócio e agrotóxicos, Intoxicações, Cultivo de alimentos

orgânicos.

Introdução:

O uso de agrotóxicos e sua relação com os malefícios à saúde humana é

uma problemática bastante discutida na atualidade, principalmente por

ambientalistas e ONGs, na defesa e conservação do meio ambiente e da saúde

humana. O uso incorreto e abusivo desses produtos químicos põe em risco o meio

ambiente, a saúde das pessoas, principalmente dos agricultores e suas famílias.

Diante desse contexto e problemática, é de fundamental importância a

realização de estudos e pesquisas sobre os efeitos nocivos dos agrotóxicos à saúde

humana no espaço escolar. O espaço escolar é reconhecido como lugar de

construção de conhecimentos, permitindo que professores e alunos interpretem as

relações cotidianas no contexto social.

“As problemáticas atuais que envolvem a escola são, em grande medida, oriundas das transformações que a sociedade contemporânea vivencia; nesse sentido, estas transformações, refletem-se nas diversas interações que ocorrem no contexto da escola, sobretudo no espaço da sala de aula, e têm tornado cada vez mais complexa a natureza das relações que se estabelecem no cotidiano escolar.” (SILVA, 20012, p. 85).

1Pós-Graduação em Ciências Morfofisiológicas. Professor de Ciências do Colégio Estadual do Campo

Santa Rita D´Oeste e Biologia do Colégio Estadual Mal. Gaspar Dutra. 2Professora Doutora em Genética da UNIOESTE, Campos de Cascavel.

De acordo com a DCE de Biologia, “entende-se escola como o espaço do

confronto e diálogos entre os conhecimentos sistematizados e os conhecimentos do

cotidiano popular” (DCE, 2008, p. 21).

O estudo dessa temática foi realizado com alunos do Ensino Médio do

período vespertino, do Colégio Estadual Marechal Gaspar Dutra de Nova Santa

Rosa - PR, grande parte dos alunos são filhos de agricultores e muitos residem no

campo, dependendo principalmente da agricultura para sua subsistência.

O objetivo desse trabalho foi sensibilizar e orientar os alunos e a

comunidade escolar sobre os perigos e danos que agrotóxicos podem causar a

saúde das pessoas e promover ações que efetivamente contribuam para o

enfrentamento dessa problemática a partir do desenvolvimento de atividades

pedagógicas na escola, esclarecer os alunos com relação ao uso de agrotóxicos e a

saúde humana. Isso se deu através do uso de questionários, pesquisas, vídeos,

interpretações e produções de textos, análises de textos e figuras, visitas a campo e

palestras.

Quando o trabalho foi apresentado aos professores, gestores, à equipe

pedagógica e funcionários do estabelecimento de ensino, os professores e demais

presentes acharam a proposta de trabalho muito interessante e de grande

importância, apoiaram e incentivaram o desenvolvimento das atividades propostas,

pois a temática e a problemática levantada condizem com a realidade vivenciada por

eles no Município de Nova Santa Rosa. Disseram ainda, que o manejo e uso de

agrotóxico é realmente intenso. Alguns professores relataram que além de tratores,

vem ocorrendo pulverizações através de aviões e que essa prática tem aumentado

nesses últimos anos.

As atividades didático-pedagógicas foram realizadas ao longo do ano letivo,

com a participação inicial de 60 alunos pertencentes a duas turmas do período

vespertino.

O que os alunos já sabem sobre isso? O conhecimento prévio

O uso de agrotóxicos é uma realidade vivenciada diariamente pela famílias

dos alunos do município de Nova Santa Rosa, expostos ao contato direto ou indireto

desses produtos tóxicos. Tais vivências desses jovens contribuíram para o bom

desenvolvimento e realização das atividades. A partir de seus conhecimentos

adquiridos (senso comum), foram desenvolvidas atividades para averiguar o grau de

seus conhecimentos prévios, na sequência foram desenvolvidas atividades alusivas

ao conhecimento cientifico.

Vasconcellos (1992), diz que:

“O primeiro passo [...] do educador, enquanto articulador do processo de ensino-aprendizagem, deverá ser no sentido de conhecer sua realidade, ou seja, conhecer a realidade com a qual vai trabalhar. Para isto, inicialmente o professor tem que aprender com seus alunos. Uma educação significativa deve partir das condições concretas de existência e para isto, o educador, enquanto articulador e coordenador do processo, precisa ter um bom conhecimento da realidade com a qual vai trabalhar: alunos, escola, comunidade, sociedade, assim como a ciência que vai ministrar.”

Antecedendo as demais atividades, foi aplicado um questionário, no sentido

de averiguar o conhecimento prévio de cada aluno, quais seriam os seus saberes já

adquiridos através de suas experiências vividas com relação à temática agrotóxico.

Além disso, o questionário gerou informações importantes para o

desenvolvimento desse trabalho, servindo como base norteadora para

desenvolvimento de outras metodologias, as quais possibilitaram a construção do

conhecimento científico dos alunos em outros momentos.

Analisando o questionário inicial verificou-se que a problemática em questão

está presente no cotidiano dos alunos, sendo que cerca de 50% desses jovens são

filhos de agricultores. Ficou evidente que a maioria deles são conscientes dos

perigos dos agrotóxicos à saúde dos trabalhadores e das pessoas que convivem

nessas regiões agrícolas, e que defensivos agrícolas podem causar intoxicações e

morte das pessoas, além de fazer mau ao meio ambiente; nascentes, rios, lençol

freático, animais, etc. Para os alunos, em geral, os agricultores deveriam se proteger

dos agrotóxicos durante seu manuseio e aplicação, usando proteções adequadas.

Entretanto, os alunos reconheceram que não existem meios que garantam aos

agricultores uma proteção eficiente, mesmo usando o EPI (Equipamento de

Proteção Individual). Eles relataram ter visto, mesmo sendo o uso de EPI obrigatório,

agricultores trabalhando sem fazer uso do mesmo, muitas vezes devido ao fato de

serem sufocantes. Quando perguntado se conheceram alguma pessoa que se

intoxicou, vários disseram ter visto. Durante a mesma aula, um aluno relatou que

alguém de sua família morreu com suspeita de intoxicação por agrotóxico, mas

segundo ele nada foi registrado.

Segundo Londres (2011, p. 25), vários são os relatos de pessoas que

desenvolveram sérias doenças provocadas pelos agrotóxicos, em muitas delas a

morte, casos de abortos, nascimento de bebês com deficiências (defeitos

congênitos), devido ao contato de seus pais com agrotóxicos, ou mesmo durante a

gestação. Pessoas que vivem próximos a lavouras onde o uso de agrotóxicos é

intenso e sem controle, a contaminação se dá através do ar devido a pulverização

desses produtos químicos. Aviões e tratores que pulverizam áreas próximas das

regiões urbanas intensificando ainda mais esse problema. Para Kugler (2012):

“Milhares de casos de contaminação são registrados todos os anos pelo

Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, gerido pela

Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pelo Sistema de Notificações em

Vigilância Sanitária, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

Mas, segundo a Organização Mundial da Saúde, para cada 50 quadros de

intoxicação por agrotóxico no mundo, apenas 1 é notificado”.

Os alunos na grande maioria demonstraram interesse e preocupação diante

dos questionamentos, responderam com seriedade e muita reflexão, levando a

perceber a existência de certo grau de conhecimento adquirido ao longo de suas

vivências.

Por outro lado, os alunos demonstraram desconhecimentos sobre várias

outras questões sobre os agrotóxicos, a grande maioria mostrou desconhecer, por

exemplo, a situação real do Brasil com relação aos agrotóxicos, no que se refere ao

uso e comercialização dos mesmos a nível nacional e mundial. Um exemplo disso, é

que a grande maioria não sabia que Brasil é o maior consumidor mundial de

agrotóxicos, conforme diz o Ministério do Meio Ambiente: “O Brasil é o maior

consumidor de produtos agrotóxicos no mundo” (BRASIL, 2014).

Outros exemplos de desconhecimento da maioria observados nos

questionamentos foram os seguintes:

-Países que mais consomem agrotóxicos em suas lavouras;

- Agronegócio;

-A história da origem e desenvolvimento dos agrotóxicos;

-O procedimento da tríplice lavagem das embalagens dos agrotóxicos;

-A Revolução Verde na agricultura;

-Empresas que fabricam agrotóxicos

-Empresas que fornecem agrotóxico na região

Assim, pode-se dizer que o uso de questionários inicial para avaliar

conhecimento prévio foi de grande relevância, os alunos deram suas opiniões e

conceitos baseado nos seus saberes adquiridos de acordo com suas realidades

vivenciadas, onde estão inseridos, seja na convivência familiar ou social, no campo

ou na cidade. O questionário possibilitou a coleta de informações sobre grau de

conhecimento adquiridos da turma com relação à temática, suas limitações de

conhecimentos, além de provocar reflexões e curiosidade sobre o tema:

Quando o professor define seus objetivos, estrutura os conteúdos, conceitos e conhece os seus alunos, fica mais fácil perceber e criar condições para que ocorra de fato uma aprendizagem significativa. (...) pois é o momento no qual se pode organizar o conhecimento e o pensamento do aluno, a partir de atividade de aprendizagem (CASTELLAR, 2005, p. 220).

Entrevista: É Interagindo que se aprende!

Os alunos entrevistaram 38 agricultores do município de Nova Santa Rosa,

na maioria pequenos agricultores que possuem de 2 a 12 hectares de terra cultivada

e outros de 20 a 67 hectares. As lavouras mais cultivadas nessas propriedades são

a de soja e do milho.

As perguntas foram elaboradas pelos alunos com o intuito de saber o

conhecimento dos agricultores em relação ao uso de agrotóxico e os perigos à

saúde. Pelas respostas dadas pelos agricultores, percebeu-se que no que concerne

ao uso de agrotóxico, as respostas são diversificadas, variando desde a sua

aplicabilidade para a cultura, bem quanto ao seu uso e em que quantidade. Alguns

relatam que durante uma safra a aplicação de agrotóxicos no milho varia de uma a

seis vezes, enquanto na soja três a sete vezes, para alguns usavam menos devido

ao seu poder aquisitivo, sendo o alto preço dos agrotóxicos fator limitante, tornando

o uso somente quando extremamente necessário.

Outra questão discutida com os alunos foi a resposta dos agricultores quanto

à instrução por parte de agrônomos ou técnicos agrícolas. A grande parte dos

agricultores acata orientações desses profissionais, que na maioria das vezes,

seguem os receituários agronômicos.

Os agricultores demonstraram preocupação e consciência dos efeitos

nocivos dos agrotóxicos para as pessoas, rios, nascentes, animais, ar, lençol freático

e plantas frutíferas. Porém, não deram nenhum indicativo de outras formas de

controle de pragas, e afirmaram que se não utilizar o agrotóxico, não produzem e,

consequentemente, não têm lucro. Disseram que ele é um “mal necessário”, que

não existe outro meio para atingir alta produtividade:

“Todos nos sabemos que é necessário usar agrotóxicos, sabemos também

que é um mal que muitas vezes usado sem o acompanhamento devido, por

isso prejudica o meio ambiente e a saúde humana, mas podemos amenizar

um pouco isso se usarmos com moderação e quando for estritamente

necessário, é o que eu acho”. (Ipsis literis - agricultor entrevistado).

A entrevista possibilitou aos alunos uma integração participativa entre escola

e comunidade. Eles perceberam de perto a realidade dos agricultores,

demonstrando que o ensino-aprendizagem também ocorre fora da sala de aula,

como uma forma inovadora de aprender e ao mesmo tempo desafiadora.

“Cabe a escola e a cada comunidade encontrar os mecanismos práticos mais apropriados a essa integração, em função das condições locais. Percebemos que a escola precisa ser parceira da comunidade. É do trabalho conjunto que alcançaremos bons frutos. Ela só vai ganhar com isso, pois o terreno fértil da escola é a comunidade.” (ASSUMPÇÃO et al., 2005, P. 31).

Com esta abordagem, as discussões e a socializações dos conhecimentos

obtidos são compartilhados, expondo a experiência e as opiniões dos entrevistados,

cumprindo com o objetivo dessa atividade, no sentido de ampliar e levar novos

conhecimentos aos alunos com relação aos perigos no uso de agrotóxicos. O

contato direto com o agricultor e sua realidade vivenciada foi uma experiência única

para muitos alunos. Entenderam que a problemática discutida é real, está presente

no dia a dia das pessoas, principalmente dos trabalhadores rurais.

Os alunos se envolveram de forma efetiva na atividade proposta, as

entrevistas foram realizadas com sucesso e os resultados foram socializados com os

demais colegas de sala de aula e com o professor.

Charge e agrotóxico: A crítica nas entrelinhas

Os estudos continuaram com o uso de charges obtidas de sites de buscas.

Nesta atividade, as questões de análise das charges foram de livre interpretação,

respondidas individualmente. Porém, foram abertas para dificuldades e dúvidas, o

que possibilitou interações entre professor-aluno, discussões importantes na

interpretação das várias leituras das “entrelinhas” para compreensão das charges,

relacionando-a no contexto social mais próximo à realidade vivenciada.

“As charges [...], através de suas características humorísticas e sátiras, [...] promovem uma visão mais crítica dos problemas vigentes na sociedade na qual os alunos estão inseridos. Desperta ainda o interesse dos alunos e a sua capacidade de interpretação, através dos elementos ditos e não ditos, ampliando a socialização do conhecimento e o sucesso do processo de ensino e aprendizagem.” (ALVES, PEREIRA E CABRAL, 2013, p. 430).

As charges oportunizaram a interpretação de assuntos que fazem parte de

dia-a-dia dos alunos. De forma crítica e criativa, as significações e os pontos de vista

estavam contidos no texto não verbal. As charges são carregadas de leituras reais

que traduzem sentimentos de indignação, revolta e sensibilização diante dos

acontecimentos, os quais são compartilhados entre os estudantes.

a) b)

Figura 1: Charges adotadas como ferramenta de ensino.

Fonte: a) Charge disponível em: http://chargeaclasse.blogspot.com.br/2012/07/agrotoxico-para-cartilha.html. Acesso em: 09 set. 2013. b) Charge disponível em: http://kdimagens.com/imagem/agrotoxico-veneno-1273. Acesso em: 19 set. 2013.

As charges demonstraram criticamente ligações do uso abusivo de

agrotóxicos às lavouras, aos animais, ao meio ambiente, aos alimentos, e inclusive,

ao leite materno.

Foi importante essa análise de charges, pois o senso comum dos alunos não

imaginava que o leite materno continha veneno. Entretanto, Palma (2011) corrobora

essa idéia, pois em um estudo realizado no município de Lucas do Rio Verde – MT, o

autor demonstrou que todas as amostras de leite materno coletadas entre a 3ª e a

8ª semana após o parto apresentaram pelo menos um tipo de agrotóxico, sendo que

em 85% das amostras foram detectados mais de um tipo de agrotóxico.

As produções e discussões dos estudantes em alguns momentos se deram

de forma polêmica e admiradora, ao saberem que nem mesmo os bebês ou crianças

estão livres de serem contaminadas com agrotóxicos. Ficou claro diante disso e de

outras questões problematizadoras demonstradas nas charges, o desconhecimento

por parte de muitos alunos do quanto o agrotóxico é perigoso. Esse momento levou

os mesmos a refletirem, principalmente, sobre os alimentos consumidos e a água

que ingerem, alternativas ou possibilidades de uma alimentação ou de um ambiente

mais saudável.

Através dessa atividade foram alcançados os objetivos previstos, não serviu

apenas como meio de avaliação, mas principalmente como um meio de

aprendizagem, levando à compreensão da temática no contexto social.

Visita a campo: É possível cultivar sem agrotóxicos?

Após várias atividades e reflexões, discussões em sala de aula, viu-se a

necessidade e importância de levar os alunos a conhecer meios (modelo)

alternativos de cultivo de alimentos sem o uso de agrotóxicos (orgânico) com ênfase

a uma melhor qualidade de vida aliada à produção de alimentos saudáveis. Sendo

assim, os alunos visitaram pequenas propriedades de cultivo de hortaliças e videiras

orgânicas.

Com apoio do CAPA (Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor) do município

de Marechal Candido Rondon - PR, foi organizada uma visita a duas propriedades

com produção orgânica. As visitas foram realizadas com acompanhamento e

orientação de profissionais (agrônomo e técnica) que orientaram e coordenaram a

visita.

Na primeira propriedade reside uma família que depende da renda dessa

produção para sobreviver. Os alunos entenderam e perceberam as dificuldades e

limitações enfrentadas pelos trabalhos na agricultura familiar orgânica. Observaram

o contraste, sendo o trabalho árduo inicialmente, mas gratificante ao longo do

tempo, advindo pelo benefício de produtos saudáveis sem nenhuma aplicação de

agrotóxico. Observaram que mesmo com todos os cuidados, uma quantidade

mínima de agrotóxico sempre vai haver nesses alimentos, devido à deriva dos

agrotóxicos aplicados pela vizinhança, mesmo com o feitio de barreiras naturais para

impedir esse contato através do ar. Entenderam assim que o enfrentamento por

alimentos saudáveis e sem agrotóxico é bem maior do que simplesmente produzir.

“Os alimentos orgânicos possuem menores níveis de resíduos de pesticidas ou, simplesmente, não contêm quantidades detectáveis de tais resíduos. Porém, a escassez de dados sobre a presença de resíduos de pesticidas em alimentos produzidos organicamente não permite conclusões definitivas para estabelecer alguma diferença entre alimentos orgânicos e convencionais.” (BORGUINI; TORRES, 2006, p. 72).

Com o auxílio do agrônomo, os alunos observaram a propriedade cercada

por matas nativas e outras que foram plantadas. Entenderam, então, sua finalidade

no sentido de proteção perante os agrotóxicos oriundos (deriva) de outras

propriedades. Compreenderam a importância das barreiras de proteção natural, com

plantio de vegetais, como exemplo, as bananeiras, capins, e arbustos. É importante

ressaltar que, segundo a proprietária, essas barreiras nem sempre garantem uma

proteção eficaz. Às vezes é preciso conscientizar os vizinhos do problema, evitando

as pulverizações próximas ou quando se tem muito vento.

O agrônomo ressaltou aos alunos a possibilidade da produção de orgânicos

em grandes extensões de terra (grandes propriedades). Destacou, ainda, que um

dos grandes fatores que impedem o cultivo de orgânicos em grande escala é o

trabalho árduo, e, além disso, que o lucro não é imediato. Ficou esclarecido que o

consumo e a produção de alimentos orgânicos vêm aumentando a cada ano,

pessoas mais instruídas e conscientes dos benefícios dos alimentos orgânicos

procuram tais produtos com mais frequência nos mercados. Porém, se percebe que

a maior parte das pessoas consome o convencional devido (entre outras razões) a

sua maior disponibilidade e menor preço.

“O produto orgânico brasileiro, ainda é percebido pela maioria dos consumidores como alimento saudável, sem a utilização de agrotóxicos. Fazem parte deste grupo, os consumidores que além de perceberem os

benefícios dos orgânicos, são menos sensíveis aos preços que podem alcançar mais de 100% do valor do similar convencional. Em sua maioria, possuem alto grau de instrução, geralmente com nível superior e são predominantemente da classe média. São indivíduos preocupados com a segurança e qualidade dos produtos.” (IPD orgânicos, 2011, p. 15).

Em outra visita, dessa vez em uma propriedade de plantio de uvas

orgânicas, também pequena, o proprietário explicou para os alunos a importância e

o prazer de viver e conviver com a natureza, uma vez que sua casa é cercada de

muita vegetação. Quando tudo isso é preservado e conservado da melhor forma

possível, nada se perde, “tudo é aproveitado”. Os alunos aprenderam os meios de

controle natural das pragas e adubação e mais, de novo, sobre a importância da

conservação das barreiras naturais.

Os encaminhamentos dessa visita trouxeram as possibilidades e alternativas

que pareciam inexistentes para muitos alunos e agricultores nas primeiras

discussões e entrevistas realizadas. Foi muito importante, pois os alunos

entenderam que é possível uma produção agrícola livre de agrotóxicos, alternativa

não indicada pelos agrônomos ou técnicos. Isso trouxe indagações e discussõe

sobre as possibilidades de produzir novas áreas sem o consumo de agrotóxicos, e

também sobre a falta de apoio e divulgação por parte do governo e de cooperativas

que se vêem atrelados ao agronegócio.

A Diretriz Curricular Estadual de Biologia (Paraná, 2008) propõe que "o

currículo da Educação Básica ofereça ao estudante, a formação necessária para o

enfrentamento com vistas à transformação da realidade social." Para Freire “o aluno

quando compreende sua realidade, pode levantar hipótese sobre o desafio dessa

realidade. Assim, poderá transformá-la e, com seu trabalho, criar um mundo próprio:

seu eu e suas circunstâncias. ”(Freire, 1983 apud DANTAS, 2012, p. 19).

Considerações finais

As atividades pedagógicas realizadas possibilitaram diversas formas de

interações e relações de conhecimentos do senso comum ao científico, o

conhecimento da realidade inserida nas práticas sociais e a integração entre escola

e comunidade.

Pela observação dos aspectos analisados nesse trabalho, o conhecimento

comum é algo de fato presente nas relações cotidianas da escola, inclusive na

prática pedagógica, portanto, a busca e a compreensão do conhecimento científico

se fazem necessários para a construção do mundo e transformação social. Nesse

sentido, as atividades científicas propostas na sala de aula e no campo trouxeram

reflexões aos estudantes sobre as práticas sociais problematizadoras, gerando,

sobretudo, conhecimentos e ações que foram importantes para o enfrentamento da

problematização discutida.

As diversas formas metodológicas de atividades instigaram e possibilitaram

aos estudantes a buscar diferentes meios de informações para aprendizagem e

conhecimento.

Por fim os alunos relataram a importância das atividades enfatizadas e sua

contribuição efetiva na compreensão das realidades sociais vivenciadas.

Conclui-se que os objetivos desse trabalho foram alcançados, pois houve,

com certeza, a ampliação do conhecimento sobre os perigos dos agrotóxicos aos

agricultores e à comunidade em geral, em um contexto da realidade social onde

todos estão inseridos.

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