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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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PRECONCEITO ÉTNICO-RACIAL ENTRE OS ALUNOS DAS ESCOLAS

ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE CARAMBEÍ – PR - UM BREVE ENSAIO

Carlos Alberto Rodrigues de Souza

Marcio Jose Ornat

RESUMO

A escola tem grande responsabilidade na socialização dos seus alunos, principalmente quando estão

frequentando a Educação Básica, mas especificamente o Ensino Médio, onde as relações sociais com as

diferentes culturas estão expostas no seu convívio diário. Esse espaço privilegiado pode para alguns alunos um

dos poucos espaços que as diferenças podem ser percebidas de modo mais intenso e muitas vezes até cruel, onde

o estudante negro pode ser alvo de piadinhas que o colocam numa posição de ridicularizado em seu grupo social.

Desta forma percebe-se ao longo da história escola como local que de maneira prioritária deve-se propor aos

alunos do Ensino Médio, uma reflexão sobre o preconceito, discriminação e o racismo. Sendo assim, é preciso

compreender como ocorreu o processo de construção da identidade afro-brasileira, e desta forma se reconhece o

papel fundamental da escola nessa edificação, onde podem ser construídos os pilares desejáveis para superar os

desafios e/ou obstáculos. Nesse sentido devem estar inseridas nas discussões do contexto escolar as leis que

permeiam a promoção da igualdade entre os seres humanos dentre elas a 10.639/03, onde neste trabalho ela será

o eixo que vai nortear as discussões. A pesquisa foi aplicada através de um questionário quanti-qualitativo

referente ao preconceito étnico-racial. Foram escolhidas algumas das frases contidas na pesquisa para fazer as

análises da situação étnico-racial na escola idealizado neste breve ensaio. A reflexão de alguns dos resultados da

pesquisa aponta que os alunos das escolas estaduais do ensino médio do município de Carambeí, possuem

indicadores que foram percebidos nas respostas dos questionários que indicam que o preconceito étnico-racial

está presente. Percebe-se a escola como um ambiente onde ocorrem vários desdobramentos que podem acentuar

e/ou ensinar as pessoas a serem preconceituosas caso não haja interesses de professores e gestores em trabalhar o

que diz a Lei nº 10.639/03.

Palavras-chave: relações étnico-raciais. Afrodescendente. 10.639/03.

Professor PDE da Rede Estadual de Educação. Colégio Estadual Júlia Wanderley – Carambeí – Paraná

[email protected]

Artigo apresentado à SEED – Pr para ingresso ao terceiro nível da carreira do QPM e obtenção do Título de

Professor PDE Orientador PDE. Professor Doutor do Departamento de Geociências, Membro do GETE – Grupo de Estudos

Territoriais da Universidade Estadual de Ponta Grossa. [email protected]

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende debater de maneira geral a Educação das Relações

Étnico-raciais na Escola após a lei 10.639/03. Para realizar tal discussão o estudo será

estruturado em introdução, o desenvolvimento do trabalho e algumas considerações finais.

Traz-se como ideia central do texto a abordagem das questões étnico-raciais no

município de Carambeí tendo como pano de fundo o papel da educação no país para este

assunto, ou seja, como aqueles que regem a educação no país enfrentam tal questão tão

polêmica? E, ainda, quais são as ações afirmativas realizadas para esta questão?

Neste momento, faz-se necessário ter um entendimento de um conceito de ações

afirmativas, ou propriamente dito o seu significado. Existe consenso nos diversos ramos

científicos de uma definição de um conceito único para ações afirmativas?

Afinal qual é o significado? No campo das ciências humanas e sociais não há formas

de definir um conceito ímpar de ações afirmativas, pois cada um vem imbuído de ideias e

valores dos sujeitos que as define. Diante das diferentes explicações, esse texto se atenta para

a seguinte definição:

São medidas tomadas ou determinadas pelo Estado, espontânea ou

compulsoriamente, com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente

acumuladas, garantindo a igualdade de oportunidades e tratamento, bem

como de compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização,

decorrentes de motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros.

Portanto, as ações afirmativas visam combater os efeitos acumulados em

virtude das discriminações ocorridas no passado (SANTOS, 1999, p.25).

Apesar de muitos ignorarem ou não acreditarem, o racismo tem consequências

danosas na vida de um cidadão. Seus efeitos e mecanismos de reprodução têm impactado de

modo expressivo e perverso na sociedade brasileira. Segundo IPEA 2014, "as mazelas da

escravidão se disseminaram, criaram raízes e se transmutaram a ponto de funcionar como

meio eficiente de segregação em tempos de liberdade, alimentado e disfarçado pelo mito da

democracia racial".

Vivemos numa nova sociedade, onde se prega a igualdade e a democracia; com

ações afirmativas; com enfrentamentos de atitudes preconceituosas, discriminadoras e

racistas. Sem dúvidas são novos tempos, de novas conquistas, mas que ainda persistem

grandes desafios. Dentre estes desafios é justamente a compreensão da sociedade de que ainda

existem resquícios de práticas antigas e danosas em nosso meio social, que de forma

excludente agem na vida do negro.

Sendo assim, é preciso compreender como ocorreu o processo de construção da

identidade afro-brasileira, e desta forma se reconhece o papel fundamental da escola nessa

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edificação, onde podem ser construídos os pilares desejáveis para superar os desafios e/ou

obstáculos.

No âmbito educacional, buscando amenizar tal discriminação, essa luta ganhou força

com a modificação da Lei nº 9.394/96, a tão conhecida LDB - Lei de Diretrizes e Base da

Educação Brasileira por meio da inserção dos artigos 26-A e 79-B, referidos na Lei nº

10.639/2003, que torna obrigatório o ensino de História e cultura Afro-Brasileiras e Africanas

no Currículo oficial da Educação Básica e inclui no calendário escolar o dia 20 de novembro

como “Dia Nacional da Consciência Negra”. A Lei 10.639/03 que, em 2013, completou uma

década desde sua promulgação, é extremamente importante para a história das lutas

antirracistas e pela democratização do ensino.

Assim, nesta última década se percebe um esforço do Estado em implementar

políticas afirmativas que vem de encontro com as minorias e os interesses dos movimentos

sociais, principalmente o Movimento Social Negro, como foi o caso da lei 10.639/03, porém,

estas tem esbarrado justamente na ignorância e no preconceito de muitos.

Segundo publicação do Diário Oficial da União de 9 de janeiro de 2003:

Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida

dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B: Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e

particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-

Brasileira. § 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o

estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a

cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional,

resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e

política pertinentes à História do Brasil. § 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão

ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de

Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras. § 3o (VETADO)” Art. 79-A. (VETADO)” Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia

Nacional da Consciência Negra’.” Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

A educação formal sempre se constituiu em marco no panorama das reivindicações

do Movimento Social Negro na luta por uma sociedade mais justa e igualitária, e se consolida

como um direito social. Porém, a escola sempre teve dificuldades para trabalhar essas

diferenças como afirmam Moreira e Candau:

A escola sempre teve dificuldade em lidar com pluralidade e a diferença.

Tende a silenciá-las e neutralizá-las. Sente-se mais confortável com a

homogeneização e a padronização. No entanto, abrir espaços para a

diversidade, a diferença e para o cruzamento de culturas constitui o grande

desafio que está chamado a enfrentar. (MOREIRA; CANDAU, 2003, p. 161)

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Como expressa nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs), a educação escolar

corresponde a um espaço sociocultural e institucional responsável pelo trato pedagógico do

conhecimento e da cultura. Nesse sentido a educação deve contemplar a diversidade e o

reconhecimento das diferenças raciais. Por sua vez a escola como possuidora de um caráter

inter/multicultural, com seus sujeitos marcados de uma diversificada configuração identitária,

deve enfocar essa realidade de forma qualitativa.

Pensar a realidade da escola é pensar em sujeitos excluídos pela educação e pela

sociedade, essa modalidade social tem em sua história o atendimento a alunos jovens e

adultos trabalhadores, homossexuais, idosos, negros, subempregados, oprimidos e excluídos

social e racialmente, que estão lutando diariamente para encontrar seu lugar na sociedade.

O que é estabelecido pela Lei 10.639/2003, diz respeito a reposicionar o negro e as

relações raciais no mundo da educação no aspecto da formação humana. A lei incide não

somente sobre os conteúdos escolares, mas também em como são encaradas as relações

sociais existentes nos diversos momentos de interação e de formação que abrangem o

universo da educação. Compreender a proposta apresentada pela Lei de forma profunda,

realizando a leitura implícita é o grande desafio posto aos educadores. Daí a expectativa em

repensar como essa história deve ser contada, de modo que tais sujeitos sejam protagonistas

do seu conhecimento, das suas experiências e de sua cultura.

Envolve pensar na diversidade étnica do público que compõe esta modalidade de

ensino, re-significar o capital cultural de povos subalternizados pela etnia, raça, nível

socioeconômico, dentre outros. Assim, é importante desenvolver um currículo e um ambiente

escolar na perspectiva multicultural e com base no perfil dos sujeitos envolvidos.

A Lei nº 10.639/03 estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-

brasileiras e africanas nas escolas públicas e privadas do ensino fundamental e médio; o

Parecer do CNE/CP 03/2004 aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das

Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas; e

a Resolução CNE/CP 01/2004, detalha os direitos e as obrigações dos entes federados ante a

implementação da lei, juntos compõem um conjunto de dispositivos legais considerados como

indutores de uma política educacional voltada para a afirmação da diversidade cultural e da

concretização de uma educação das relações étnico-raciais nas escolas, desencadeada a partir

dos anos 2000.

Nesse mesmo contexto foi aprovado, em 2009, o Plano Nacional das Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de

História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Dessa forma, a efetivação de uma proposta

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curricular centrada no educando, deve compreender que os cidadãos têm história, participam

de lutas sociais, têm nome e rostos, gêneros, raças, etnias e gerações diferenciadas. O que

significa dizer que a educação precisa levar em conta as pessoas e os conhecimentos que estas

possuem.

O percurso de normatização decorrente da aprovação da Lei nº 10.639/03 deveria ser

mais conhecido pelos educadores das escolas públicas e privadas do país. Ele se insere em um

processo de luta pela superação do racismo na sociedade brasileira e tem como protagonistas

o Movimento Negro e os demais grupos e organizações participantes da luta antirracista, para

que se efetive na prática iniciativas e práticas de ações afirmativas na educação básica

brasileira, entendidas como uma forma de correção de desigualdades históricas que incidem

sobre a população negra em nosso país.

No início do século XXI, quando o Brasil revela avanços na implementação da

democracia e na superação das desigualdades sociais e raciais, é também um dever

democrático da educação escolar e das instituições públicas e privadas de ensino a execução

de ações, projetos, práticas, novos desenhos curriculares e novas posturas pedagógicas que

atendam ao preceito legal da educação como um direito social e incluam nesse contexto o

direito à diferença.

Para Munanga (2005):

Na verdade, o Brasil nos oferece a estranha imagem de um país de identidade

inconclusa, já que, ao longo da história de nossa formação, continuamos a

nos perguntar a todo momento sobre quem somos e, assim, o brasileiro, por

falta de conhecer melhor a sua história, acaba por não ter condições de se

identificar consigo mesmo. Na verdade, na escola é negado ao estudante o

conhecimento de uma história que efetivamente incorporasse a contribuição

dos diferentes estoques étnicos à formação de nossa identidade, com o

agravante de que a história parcial ali apresentada como exclusiva é aquela

dos vencedores, dos colonizadores ou, para precisar a afirmativa, história

celebratória das classes econômica e politicamente mais bem sucedidas. Isto

porque – e este é outro aspecto a ser considerado – a história transmitida na

escola privilegia apenas o registro escrito, quando se sabe que a história dos

grupos indígenas ou das comunidades negras rurais, como aliás também toda

e qualquer história local, é sempre um relato oral, que só pode ser transmitido

pelos mais velhos aos mais novos, através das gerações.

As ações pedagógicas voltadas para o cumprimento da Lei nº 10.639/03 e suas

formas de regulamentação se colocam nesse campo. Essa mudança não acontecerá somente

nas práticas e nas políticas, mas também no imaginário pedagógico e na sua relação com o

diverso, aqui, neste caso, representado pelo segmento negro da população. É nesse contexto

que a referida lei pode ser entendida como uma medida de ação afirmativa.

As ações afirmativas são políticas, projetos e práticas públicas e privadas que visam

à superação de desigualdades que atingem historicamente determinados grupos sociais, a

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saber: negros, mulheres, homossexuais, indígenas, pessoas com deficiência, entre outros. Tais

ações são passíveis de avaliação e têm caráter emergencial, sobretudo no momento em que

entram em vigor. Elas podem ser realizadas por meio de cotas, projetos, leis, planos de ação,

etc.

Por mais que o seu cumprimento ainda esteja aquém do esperado, é preciso

reconhecer que a sua aprovação tem causado impactos e inflexões na educação escolar

brasileira, como: ações do MEC e dos sistemas de ensino no que se refere à formação de

professores para a diversidade étnico-racial; novas perspectivas na pesquisa sobre relações

raciais, no Brasil; visibilidade à produção de intelectuais negros sobre as relações raciais em

nossa sociedade; inserção de docentes da educação básica e superior na temática africana e

afro-brasileira; ampliação da consciência dos educadores de que a questão étnico-racial diz

respeito a toda a sociedade brasileira, e não somente aos negros; e entendimento do trato

pedagógico e democrático da questão étnico-racial como um direito.

Ao fazer tal movimento, o Estado brasileiro, por meio de uma ação educacional, sai

do lugar da neutralidade estatal diante do racismo na educação escolar e na produção do

conhecimento e se coloca no lugar de um Estado democrático, que reconhece e respeita as

diferenças étnico-raciais e sabe da importância da sua intervenção na mudança positiva dessa

situação.

AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NAS ESCOLAS DE CARAMBEÍ – PR

A escola tem grande responsabilidade na socialização dos seus alunos,

principalmente quando estão frequentando a Educação Básica, mas especificamente o Ensino

Médio, onde as relações sociais com as diferentes culturas estão expostas no seu convívio

diário. Esse espaço privilegiado pode para alguns alunos um dos poucos espaços que as

diferenças podem ser percebidas de modo mais intenso e muitas vezes até cruel, onde o

estudante negro pode ser alvo de piadinhas que o colocam numa posição de ridicularizado em

seu grupo social. O preconceito étnico-racial praticado contra um afrodescendente é um ato

inescrupuloso.

Para isso pode-se se colocar que o preconceito é, segundo Teodoro, como:

A Forma mais comum e a mais frequente de expressão do racismo. É a forma

mais comum e a mais frequente porque se trata de um sentimento, ou de uma

ideia, apenas. Ele consiste na visão estereotipada de características

individuais ou grupais como correspondentes a valores negativos. As ideias

preconceituosas integram o sistema de valores culturais e são transmitidas

durante o processo de socialização da criança, através da educação familiar,

social ou formal, além de conhecimento em que se forme o estudante, no

campo das ciências humanas ou no campo das ciências exatas, em nível

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médio e superior de ensino, é fundamental que ele aprenda o significado dos

conceitos envolvidos na sistematização do racismo e reflita sobre alguns

exemplos de prática racista. Um indivíduo pode ser preconceituoso e não agir

de modo discriminatório ou racista, embora isto seja muito raro (TEODORO,

1996, p. 104).

Como enfrentamento dessas práticas preconceituosas os educadores devem propor

intervenções no Ensino Médio, em sala de aula, usando a leitura e a interdisciplinaridade para

refletir sobre questões ligadas à etnia e a raça negra. Essa ideia de trabalhar com temas

diretamente inseridos no cotidiano dos estudantes a fim de tornar a leitura mais interessante,

prazerosa, oferece espaço para a análise e reflexão, possibilitando, assim, aos jovens e até

mesmo há adultos pensarem, e argumentarem sobre as questões étnicas raciais, a grande

pluralidade e diversidade presente na sociedade e na escola. Com objetivos fundamentados na

convicção de que não se pode mais pensar no ensino brasileiro sem que sejam incluídos

projetos interdisciplinares de leitura nas escolas, em todos os níveis de ensino, e voltados à

discussão de temas sociais na luta pela igualdade.

As estratégias de combate ao racismo devem ser trabalhadas em todos os níveis e

modalidades de ensino, mas deve ter lugar privilegiado na Educação Básica, uma vez que o

preconceito racial é entendido como um problema cultural, de mentalidade, logo seu combate

passa a ser caracterizado como uma intervenção educativa e pedagógica.

Por tudo isso se pode dizer que as diferenças, são construções sociais, culturais,

políticas e identitárias. Aprendemos, desde criança, a olhar, identificar e reconhecer a

diversidade cultural e humana. Contudo, como estamos imersos em relações de poder e de

dominação política e cultural, nem sempre percebemos que aprendemos a classificar não

somente como uma forma de organizar a vida social, mas também como uma maneira de ver

as diferenças e as semelhanças de forma hierarquizada e dicotômica: perfeições e

imperfeições, beleza e feiura, inferiores e superiores. Esse olhar e essa forma de racionalidade

precisam ser superados, pois todos somos seres humanos.

Esse deverá ser um princípio de educação popular, inclusive, no Ensino Médio:

acreditar no ser humano, dando a ele possibilidades de apreender, refletir, atuar como um ser

pensante no mundo, habilitando-o para a capacidade de viver a diversidade fundada no

respeito aos seus direitos e aos direitos dos outros com competência e direcionamento para

gerir o seu futuro.

Então, acreditamos que a escola é capaz de transformar essa realidade, pois a esfera

educacional é um espaço estratégico para a construção de uma sociedade dinâmica, igualitária

e multirracial, além de ser geradora de oportunidades para a entrada no mundo do trabalho e

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poderoso instrumento de ascensão social, pelo caráter formativo. Possibilitando a

compreensão e reflexão crítica dos níveis de desigualdades que fazem parte do país.

O presente trabalho teve como base um estudo que foi realizado em âmbito Nacional

pela FIPE¹. Pretende-se abordar as ações discriminatórias e preconceituosas de cunho étnico-

racial em escolas estaduais que ofertam o ensino médio no município de Carambeí, que conta

com três escolas particulares, sendo que uma oferta o ensino médio; sete escolas municipais

com a educação infantil e o ensino fundamental – séries iniciais, quatro centros de educação

infantil, onde apenas um é de caráter filantrópico; e cinco escolas estaduais, todas ofertando o

ensino fundamental – séries finais e apenas uma não oferta o ensino médio.

Uma vez que este trabalho tem como foco os alunos do ensino médio, serão quatro as

escolas envolvidas na pesquisa, entre elas:

Colégio Estadual Zilda Arns;

Colégio Estadual Eurico Batista Rosas;

Colégio Estadual Carlos Ventura;

Colégio Estadual Júlia Wanderley.

A pesquisa foi aplicada através de um questionário quanti-qualitativo e, na última

escola em questão foi desenvolvida a ações referente ao preconceito étnico-racial pensado

junto a esta pesquisa. Foram escolhidas algumas das frases contidas na pesquisa para fazer as

análises da situação étnico-racial na escola idealizado neste breve ensaio.

Uma das afirmativas era se “o número de negro na escola é muito pequeno para se

preocupar com eles. Entre as faixas etárias pesquisadas se constatou que a faixa entre 15 a 17

são em números de indivíduos as que mais concentram pessoas que discordam, mas, é

também, nesta faixa etária que se apresentam um grande número de indivíduos que

concordam com a afirmativa. Outra observação que se destaca é que a medida que vai

aumentando a idade do entrevistado houve uma gradativa diminuição do pensamento

preconceituoso e racista, o qual pode ser constatado no gráfico a seguir.

Distribuição pela idade

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Infelizmente, a presença dos negros nas escolas ainda é pequena quando comparada

com a etnia branca. Mesmo se tratando de escolas públicas, aonde a vaga deveria ser ofertada

a todas as pessoas, sem distinção de cor, etnia e classe social, essa etnia ainda representa a

grande minoria nas escolas.

Ao verificarmos o gráfico Distribuição pela idade de acordo com as etnias/cor

consultadas, entre eles, fica evidenciado que os negros foram os que mais concordaram com a

afirmativa em questão, e os que menos concordaram foram os indígenas.

Comparativo conforme as principais etnias estudadas

Conforme o gráfico O número de negros na escola é muito pequeno para se

preocupar com eles todas as etnias entrevistadas discordaram dessa afirmação. Sendo a etnia

branca a que mais discordou e a etnia indígena a que menos discordou. Fica evidenciado que

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as pessoas não concordam com tal afirmação e, provavelmente, acreditem que a preocupação

deva ser de maneira igual para todos, independente da etnia.

Comparativo entre as escolas analisadas

O estudo realizou ainda uma comparação entre as quatro escolas analisadas.

Constatou-se que a escola número 3 foi a que apresentou um resultado acima da média, ou

seja, com a maior porcentagem de concordância sobre a questão de o número de negros na

escola é muito pequeno para se preocupar com eles. A escola de número 2 ficou bem abaixo

da média, ou seja, com a menor porcentagem de concordância sobre o tema abordado.

Distribuição por gênero

Ainda, no levantamento feito com a identidade de gênero masculino e feminino,

foram os homens que apresentaram maiores atitudes preconceituosas, onde é considerável o

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número de indivíduos que concordam com a afirmativa, assim como é pequeno o número de

pessoas do gênero masculino que discordam.

A afirmativa a seguir é se “os negros usam as cotas para ingressarem nas

universidades por que são menos inteligentes que os brancos”, na perspectiva das etnias/cor

branca e morena, em ambas o índice de discordância é de 4%; já os negros discordam 100% e

os indígenas concordam com a afirmativa em 33%.

Comparativo por etnias

Na distribuição por gênero mais uma vez as mulheres se mostraram, em sua maioria,

contrárias a afirmativa em questão e, inclusive, um número extremamente reduzido concordou

com essa frase.

Distribuição por gênero

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reflexão de alguns dos resultados da pesquisa aponta que os alunos das escolas

estaduais do ensino médio do município de Carambeí, possuem indicadores que foram

percebidos nas respostas dos questionários que indicam que o preconceito étnico-racial está

presente. Percebe-se a escola como um ambiente onde ocorrem vários desdobramentos que

podem acentuar e/ou ensinar as pessoas a serem preconceituosas caso não haja interesses de

professores e gestores em trabalhar o que diz a Lei nº 10.639/03.

Os resultados demonstram que é notório entre os educandos das escolas pesquisadas

a predisposição em discriminar ou dar conceitos sem ao menos conhecer a realidade e/ou a

história de vida de determinados grupos sociais, como é o caso dos negros. É de suma

importância observar que essas atitudes sempre resultam, além do constrangimento aos

indivíduos, o preconceito e a discriminação causam humilhação, agressões verbais podendo

até chegar a serem físicas simplesmente pelo fato destas pessoas serem negras. Não foram

raras os questionários em que os respondentes foram antagônicos e muitos criticaram em

alguns espaços algumas das frases, porém, em suas respostas se mostraram preconceituosos,

discriminadores e em alguns momentos racistas.

É importante relatar que alguns dos pesquisados sugeriram que as perguntas

elaboradas traziam algum trauma do pesquisador, pois, estes afirmam que o preconceito, a

discriminação e o racismo não existe mais da forma como foi apresentada na pesquisa.

Acredita-se que as marcas históricas carregadas pelo pesquisador inibiu algumas das respostas

que conotassem o preconceito, a discriminação e o racismo introjetado nestas pessoas.

Para melhor embasar o referido estudo buscou-se pensamento de Gomes (2005)

sobre o preconceito como sendo:

(...) um julgamento negativo e prévio dos membros de um grupo racial que

pertença, de uma etnia ou de uma religião ou de pessoas que ocupam outro

papel social significativo. Esse julgamento prévio apresenta como

característica principal a inflexibilidade, pois tende a ser mantido sem levar

em conta os fatos que o contestem. Trata-se do conceito ou opinião

formados antecipadamente, sem maior ponderação ou conhecimento dos

fatos. O preconceito inclui a relação entre pessoas e grupos humanos. Ele

inclui a concepção que o indivíduo tem de si mesmo e também do outro.

(GOMES, p.54)

Sendo assim, os professores devem reconhecer importância substancial do tema,

reforçado pela Lei nº 10639/03, não limitando o ensino da História e Cultura Afro-brasileira

às disciplinas de Educação Artística, Literatura e principalmente História Brasileira. Nesse

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caso, os professores das outras disciplinas e áreas de conhecimento devem sentir-se

igualmente responsáveis em abordar e se envolver no que diz respeito à Educação das

Relações étnico-raciais, pesquisando, acessando informações e trazendo contribuições

importantes.

Com a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana no

Brasil que sempre ensinado nas aulas de História e muito pouco nas aulas de Geografia, e

infelizmente esquecido pelas demais disciplinas, como escravidão negra africana passa a ter

outro enfoque.

Esta pauta começa sua construção muito antes da tal “política abolicionista” e, nos

dias de hoje com um olhar atencioso nos resultados estatísticos de pesquisas que trazem uma

visão panorâmica da situação das desigualdades raciais no país, muniu os/as interessados de

elementos para análise e interpretação desse complexo cenário que constitui a educação

brasileira.

A democracia racial configura-se na estrutura social brasileira como um mito, não no

sentido antropológico, mas sim como um mecanismo que aliena as relações sócio-históricas

reais da condição do negro na sociedade brasileira.

Os dados mais recentes, assim como os mais antigos, retiram as máscaras do

preconceito e da discriminação, possibilitando assim, instrumentalizar um olhar crítico sobre

as relações de desigualdades entre negros e brancos.

É necessário fazermos uma pergunta sobre o tema em questão, por que é importante

e necessário refletir sobre políticas de ações afirmativa para a comunidade negra? A realidade

histórico-social, político-econômica e educacional deste grupo étnico no Brasil foi marcada, e

ainda o é, por um conjunto de injustiças que excluem, desqualificam, desvalorizam numa

conjuntura de quase total eliminação e imobilidade na dinâmica da sociedade. Em nosso país

discutir sobre políticas de ações afirmativas no universo das políticas antirracistas são ainda

recentes e exigem cuidados significativos, pois, algumas interpretações podem desconsiderar

o processo político de lutas de quatro séculos contra a do preconceito e da discriminação.

Ao apresentar o significado das políticas de ação afirmativa e porque existem

algumas direcionadas à população negra, o objetivo é considerar e questioná-las no âmbito

das políticas educacionais referente à organização curricular. Nesse caso, especificamente às

alterações realizadas, em 2003, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei

9.394/1996) com o decreto de Lei 10.639/03.

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REFERÊNCIAS

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