Os Conceitos Língua Materna, Segunda Língua e Língua Estrangeira

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    Revista Contingentia, 2006,Vol. 1, novembro 2006. 0110 1 Revista Contingentia ISSN 1980-7589

    Os conceitos Lngua Materna, Sgunda Lnguae Lngua Estrangeira e os falantes de lnguasalctones minoritrias no Sul do Brasil

    Karen Pupp Spinass

    As linguist, we always have to deal with terms like First, Second andForeign Languages, but many times we dont notice, how peculiars they areand how specific and difficult are their definitions. In Brazil, we have

    peculiar situations of immigrant languages, which are spoken in somegroups of people in some communities in their day-by-day. There is muchcontroversy related to the denomination we give to these linguisticvarieties, what concerns its status and its relationship with the otherneighbor or concurrent varieties.

    In this paper, we intend to discuss theoretically the terms above,

    transporting the denomination and its application to the reality of somebilingual communities from Rio Grande do Sul, in which people speakminority languages of Germanic origins. On the basis of empirical tests, weaim to give here a profile of the socio linguistic situation of these minorityvarieties what concerns its speakers, the foreign language teachers(specially of the High-German) and the community in general.

    Keywords: immigrant language, minority language, linguistic contact, bilingualism

    1 Introduo

    Como lingistas, confrontamo-nos freqentemente com os conceitos LnguaMaterna, Segunda Lngua e Lngua Estrangeira, muitas vezes sem nos darmos conta,de quo peculiares so esses termos e de quo especficas e difceis so suasdefinies. A eles esto ligados outros tantos conceitos e pressupostos, como aprpria definio do que lngua e a reflexo metodolgica do ensino de umalngua.

    Temos, no Brasil, situaes peculiares de lnguas de imigrao, que so faladaspor determinados grupos de pessoas em determinadas comunidades no seu dia-a-dia.H ainda controvrsia em relao denominao que se d a essas variedadeslingsticas, no que diz respeito ao seu status e no que diz respeito sua relao comoutras variedades lingsticas vizinhas, ou mesmo, concorrentes.

    Pretendemos, nesse artigo, comentar os conceitos acima citados, aplicando realidade de comunidades bilnges do Rio Grande do Sul onde se falam variantesalctones de base germnica. Com base em testes empricos feitos com alunosbilnges de escolas da regio, aliados s observaes e constataes que puderamser feitas ao longo das pesquisas de doutorado da autora, visamos a dar um breve

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Letras, Avenida Bento Gonalves 9500,

    91540-000 Porto Alegre, RS; Brasil. Fax: 0055 51 3308 7303; Tel: 0055 51 3308 6709; e-mail:

    [email protected]

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    perfi l da situao sociolingstica dessas variedades minoritrias no que concerneaos seus falantes, aos professores do alemo-padro e comunidade em geral. Paratanto dividimos o texto em 3 partes, a saber:

    1 - A motivao para reflexes sobre esse tema2 - A questo histrica das lnguas alctones no que diz respeito sua aquisiopor parte de falantes3 - Os conceitos tericos propriamente ditos e sua aplicabilidade

    2 Motivao

    Em minha tese de doutorado, publicada sob o ttulo Deutsch als Fremdsprache inBrasilien: Eine Studie ber kontextabhngige unterschiedliche Lernersprachen undmuttersprachliche Interferenzen1, foi trabalhado, de forma geral, o aprendizadoescolar do alemo como lngua estrangeira no Brasil. Especificamente, contudo,procurou-se questionar a influncia da lngua materna, o que apontou para asdiferenas no processo de aprendizado em regies e contextos diferentes no Brasil.Problemas lingsticos na lngua-alvo de alunos de certas regies do sul do Brasil sediferenciavam, consideravelmente, dos problemas apresentados por alunos de outrasregies do pas.

    Procuramos, a partir disso, pesquisar essas questes da interlngua, comparando aproduo de alunos de duas escolas selecionadas do estado do Rio Grande do Sul Colgio Teutnia, em Teutnia, e o Instituto de Educao Ivoti, em Ivoti) e dealunos de uma escola na cidade do Rio de Janeiro (Colgio Cruzeiro). A diferenabsica que se pde perceber entre esses dois contextos pesquisados e entre os doistipos de alunos analisados, o fato de que os alunos do Rio Grande do Sul eram, emsua maioria, bilnges, ou seja, alm do portugus, eles possuiam uma outra lnguamaterna. Tnhamos como foco, ento, averiguar at que ponto a(s) lngua(s)materna(s) realmente influencia(m) o processo de aprendizado, tendo tambm nacomparao um fator metodolgico.

    Foram realizados testes empricos e entrevistas2 nas trs escolas que, apesar de

    estarem em contextos diferentes, apresentavam caractersticas bem semelhantes. Astrs oferecem o alemo-padro como primeira lngua estrangeira no currculoobrigatrio na maioria das vezes j a partir do jardim da infncia. Alm disso,todas essas trs instituies privadas tm um grande nmero de alunos e so escolasmuito bem consideradas em seus contextos especficos. Seus professores tiveramuma formao semelhante e utilizavam na poca das pesquisas o mesmo materialescolar (Wer, Wie, Was) sendo o mtodo tambm semelhante (mtodocomunicativo com perguntas indutivas, nfase na gramtica, aulas alternando entre oportugus e o alemo...).

    Todos os alunos analisados so brasileiros e comearam a aprender oHochdeutsch (alemo-padro) na escola, sem manter qualquer outro contato com

    essa variedade da lngua fora da escola e nem ter ido Alemanha. Eles declararamainda gostar de aprender a lngua, por diferentes motivos.O nico fator, que primeira vista pde ser analisado como diferena entre as trs

    ecolas, foi a situao bilnge desses alunos das escolas do Rio Grande do Sul.Enquanto os alunos do contexto do Rio de Janeiro possuiam apenas o portuguscomo lngua materna, os alunos entrevistados no contexto sulino falavam alm doportugus, uma variante lingstica de base germnica, chamada cientificamente,entre outros, de hunsrckisch3.

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    Durante as pesquisas empricas e tericas, porm, vimo-nos confrontados muitasvezes com uma questo apontada por autores e estudiosos em geral: Seria o Alemouma Lngua Estrangeira para esses alunos do Sul do Brasil? A questo despertou-nos a ateno, por at mesmo ns j termos tido essa viso, reavivando em ns asconhecidas crenas a respeito dos falantes de hunsrckisch no contexto do ensino dealemo-padro, onde se acredita que eles seriam melhores professores, por seremfalantes nativos. A hiptese, muitas vezes, era de que o alemo-padro seria, se no

    Lngua Materna, no mximo uma Segunda Lngua.Entretanto, algo parecia no se adequar nesse ponto de vista. Procuramos, ento,

    cconceitos e argumentos para tentar classificar as lnguas em questo no contextocitado. Estudamos o processo de variao lingstica sofrido pela lngua minoritriacitada, pesquisamos e analisamos os conceitos tericos Lngua Materna, SegundaLngua e Lngua Estrangeira e buscamos, tambm na histria, indcios relevantespara uma melhor definio dos papis exercidos pelas lnguas.

    Por isso, antes ainda dos conceitos tericos, gostaramos de enfocar, rapidamente,a questo histrica.

    3 Resumo Histrico

    No necessrio que nos aprofundemos muito na questo histrica, mas interessante dar uma pequena visualizada no processo sofrido pelas lnguas deimigrao no Brasil, para contextualiz-las.

    J sabido que alemes de vrias regies emigraram para o Brasil no sculo XIXem busca de uma vida melhor, e, a grande maioria, sem intenso de retorno. 4Todoum processo evolutivo, porm, teve de ser percorrido, sobretudo no que diz respeitos comunidades rurais, at que houvesse uma integrao de fato na sociedadebrasileira.5O isolamento foi uma realidade no incio desse processo, atpor no haveroutros grupos de pessoas em torno das regies onde eram assentados.

    Como os prprios imigrantes organizavam sua estrutura social, ou seja, escolas,igrejas, casas de comrcio, clubes..., dificilmente a lngua portuguesa entrava na

    colnia, no aparecendo muitas vezes nem na escola, j que o professor era um doscolonos. Da mesma forma, os cultos religiosos nas comunidades eram em alemo, jque o pastor tambm era um dos imigrantes ou um alemo vindo especialmente paraisso.6Eles praticamente no precisavam sair da colnia, pois tinham tudo o que elesprecisavam para a vida dentro dessa ilha lingstica.

    Especialmente na primeira fase, as colnias eram semelhantes a ilhas. Essarealidade contribuiu para que as variedades lingsticas alems se desenvolvessemde maneira forte e se mantivessem presentes nas comunidades, embora no houvessemais, por parte da grande maioria, nenhuma ligao com a Alemanha.

    Os moradores dessas comunidades, porm, geralmente no vinham dos mesmoslugares no territrio alemo. Havia entre eles prussianos, pomeranos, austracos,

    suos, renanos, bvaros etc, que trouxeram consigo seus respectivos dialetos, queentraram em contato entre si. Apesar da existncia de um alemo-padrorelativamente bem dissiminado, as variaes lingsticas de uma regio para a outraeram muito grandes.

    Em comunidades linguisticamente heterogneas que eram em maior nmero , avariante da maioria geralmente se impunha. Nas regies das escolas pesquisadas, foiesse o caso. A maioria dos imigrantes que colonizaram Teutnia e Ivoti vinha daregio mais pobre da Alemanha naquela poca, a regio do Hunsrck, e sua lngua

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    materna era o dialeto francnio-renano.7 Todos os moradores dessas colniasestudadas, mesmo provenientes de outras regies, passavam a falar o dialte emquesto por imposio (natural) da maioria.

    Alm dessa primeira interseo de elementos lingsticos, inevitvel devido aocontato de dialetos, as lnguas chegadas no Brasil passaram ainda por mais trsoutros fenmenos: os emprstimos da lngua local e de outras lnguas de imigrantes,os estrangeirismos adotados e, sobretudo, o processo de variao natural a todas s

    lnguas vivas em seu desenvolvimento ao longo dos anos que se diferiu daevoluo das mesmas variantes em solo alemo, vide o portugus brasileiro e oportugus europeu.

    O resultado proveniente desse tipo de processo, que se deu no s nascomunidades de base de hunsrckisch, mas tambm em comunidades de base dowestfaliano, do pomerano etc, so as variantes dialetais locais, as tambm chamadaslnguas mistas, de base germnica, mas genuinamente brasileiras.

    No grupo de pesquisa ESCRITHU, da Universidade Federal do Rio Grande doSul, que prev fundamentos para uma escrita do hunsrckisch falado no Sul doBrasil, temos discutido tambm essa questo: no se pode negar a origem, a basegermnica que o hunsrckisch, o westfaliano e o pomerano, por exemplo, trazem emseu corpus. Por isso, em se tratando de corpus, elas so lnguas alems, ou nomnimo, como dissemos, de base germnica. Todavia, no se pode negar tambm ofato histrico de que, se no tivesse havido a imigrao, todo esse processo no teriasido possvel. Ele s ocorreu dessa forma, porque foi em solo brasileiro, sob ascondies descritas, com emprstimos do portugus etc. Por esse ponto de vista, ouseja, do ponto de vista histrico, essas variedades so brasileiras tanto que deveroconstar no Livro das Lnguas do Brasil, livro que visa a registrar as lnguasbrasileiras, que constituem patrimnio imaterial brasileiro como essas de basegermnica.8

    Concluindo, portanto, que hunsrckisch e alemo-padro no seriam apesar dontimo parentesco e da inegvel base a mesma lngua, como classific-las nocontexto dos falantes?

    4 Os conceitosDiferentemente dos conceitos Segunda Lngua e Lngua Estrangeira, o

    conceito Lngua Materna tratado, pela maioria dos autores, como umadenominao um tanto bvia. Esse deve ser realmente de mais fcil denominaoque os outros, porm pouco se encontram definies para o termo. Uma descriosimples e direta, contudo antiga, encontrada nas pesquisas foi a de MUES (1970) nolivro Sprache: Was ist das? (Lngua: o que isso?): Muttersprache ist dieSprache, die jeder Mensch als erste lernt und die somit die Grundlage seinesMenschwerdens ist.

    Essa definio um tanto antiga e, por isso, cheia de lacunas, mas apresenta dois

    fatores importantes: a justaposio com o conceito Primeira Lngua e o fatoridentitrio que carrega a pessoa se identifica de alguma forma com a LnguaMaterna. A aquisio da Primeira Lngua, ou da Lngua Materna, uma parteintegrante da formao do conhecimento de mundo do indivduo, pois junto competncia lingstica se adquirem tambm os valores pessoais e socias. A LnguaMaterna caracteriza, geralmente, a origem e usada, na maioria das vezes, no dia-a-dia.

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    A Lngua Materna, ou a Primeira Lngua (L1) no , necessariamente, a lngua dame, nem a primeira lngua que se aprende. To pouco trata-se de apenas umalngua. Normalmente a lngua que aprendemos primeiro e em casa, atravs do pais,e tambm freqentemente a lngua da comunidade. Entretanto, muitos outrosaspectos lingsticos e no-lingsticos esto ligados definio. A lngua dos paispode no ser a lngua da comunidade, e, ao aprender as duas, o indivduo passa a termais de uma L1 (caso de bilingismo). Uma criana pode, portanto, adquirir uma

    lngua que no falada em casa, e ambas valem como L1.A ttulo de ilustrao: uma criana nasce e cresce na Alemanha, filha de um

    francs com uma colombiana. Se com cada um dos pais ela se comunica nas suaslnguas respectivas, e na creche, na rua, com os amigos e vizinhos o alemo alngua diria, essa criana tem, claramente, trs lnguas maternas: francs, espanhole alemo. A ordem, nesse caso, no interessa muito, pois ... auch eine leichteVersptung bei dem Erwerb einer Sprache bis in das 2. und 3. Lebensjahr gilt nochals gleichzeitiger Erwerb, denn die relative Versptung wird in der Regel raschaufgeholt.

    De forma geral, contudo, a caracterizao de uma Lngua Materna como tal s sed se combinarmos vrios fatores e todos eles forem levados em considerao: alngua da me, a lngua do pai, a lngua dos outros familiares, a lngua dacomunidade, a lngua adquirida por primeiro, a lngua com a qual se estabelece umarelao afetiva, a lngua do dia-a-dia, a lngua predominante na sociedade, a demelhor status para o indivduo, a que ele melhor domina, lngua com a qual ele sesente mais a vontade... Todos esses so aspectos decisivos para definir uma L1como tal.

    Se a criana citada acima, agora com 5 anos de idade, se muda para a Inglaterra ecomea a adquirir o ingls para poder cominicar-se bem e integrar-se, enquanto eleestiver na Inglaterra, teramos um caso de Segunda Lngua.

    A L1 caracterizada pelo fato de que a criana a aprende scheinbar mhelos,allmhlich und automatisch im Einklang mit der geistigen und krperlichenEntwicklung erwirbt. A aquisio de uma Segunta Lngua (L2 ou SL ), por sua

    vez, se d, quando o indivduo j domina em parte ou totalmente a(s) sua(s) L1, ouseja, quando ele j est em um estgio avanado da aquisio de sua LnguaMaterna.

    Segundo uma velha teoria neurolingstica, defendida e difundida principalmentepor LENNEBERG (1967) , deve haver um determinado espao temporal, no qual aaquisio ocorre de forma mais fcil e mais eficaz. O chamado perodo crtico(critical period) estaria ligado ao desenvolvimento do crebro e ao processo delateralizao. O seu encerramento seria tambm o encerramento desse perodo.Durante esse perodo, qualquer lngua adquirida teria o status de L1.

    A teoria, no entanto, no se comprovou, pois no se conseguiu demonstrar queseria mais fcil aprender uma lngua de forma geral antes da puberdade, nem

    determinar quando comearia e quando terminaria o perodo crtico.Afirma-se, de forma geral, que lnguas adquiridas ainda cedo so dominadascomo L1 mas desde que aquelas desempenhem uma funo semelhante desta. Sea criana citada acima, que aprendeu o ingls como Segunda Lngua na Inglaterrapassa muitos anos no pas ou seja, a lngua desempenha mais do que um papel deintegrao social e se torna uma lngua diria, importante para se viver, detentora decaractercticas identitrias, e o indivduo a domina como um nativo , embora tenha

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    havido originalmente um processo de aquisio de SL, temos agora um caso delngua materna. Ou seja, o status de uma lngua pode, ocasionalmente, se modificar.

    sabido, que uma segunda lngua no necessariamente uma segunda, no sentidode que haver uma terceira, uma quarta, e assim por diante. Segunda est paraoutra que no a primeira (a materna), e a ordem de aquisio se torna irrelevante desde que no se trate de mais uma L1. Dependendo de como a lngua foi adquirida,ela pode ser classificada de uma forma ou de outra.

    Diferenciando, porm, do conceito de Lngua Estrangeira (LE), uma SegundaLngua uma no-primeira-lngua que adquirida sob a necessidade decomunicao e dentro de um processo de socializao. A situao tem que serfavorvel: um novo meio, um contato mais intensivo com uma nova lngua que sejaimportante para a comunicao e para a integrao social. Para o domnio de uma SL exigido que a comunicao seja diria e que a lngua desempenhe um papel naintegrao em sociedade.

    A aquisio de uma Segunda Lngua e a aquisio de uma Lngua Estrangeira(LE) se assemelham no fato de serem desenvolvidas por indivduos que j possuemhabilidades lingsticas de fala, isto , por algum que possui outros pressupostoscognitivos e de organizao do pensamento que aqueles usados para a aquisio daL1. Uma diferenciao entre essas duas formas de aquisio de lngua no-maternabaseia-se fundamentalmente no j citado papel ou funo da SL na cultura dofalante.

    Do contrrio, no processo de aprendizado de uma LE no se estabelece umcontato to grande ou to intenso com a mesma. A grande diferena que a LE noserve necessariamente comunicao e, a partir disso, no fundamental para aintegrao, enquanto a SL desempenha um papel at mesmo vital numa sociedade:Im Gegensatz zur Fremdsprache ist eine Zweitsprache unmittelbar kommunikativrelevant und spielt bei der Erlangung, Aufrechterhaltung oder Vernderung derIdentitt der Sprecher eine Rolle.

    Tambm ELLIS (1986 e 1994) defende o ponto de vista de que a diferenciaono deve estar em fatores psicolingsticos, mas sim em sociolingsticos. Segundo

    ele, o processo de aquisio de uma Segunda Lngua ocorre quando the languageplays an institutional and social role in the community, enquanto a de uma LnguaEstrangeira in settings where the language plays no major role in the communityand is primarily learnt only in the classroom. Numa segunda lngua se possui umamaior competncia e uma maior performance, pois o meio ou a situao exige issodo falante o aprendiz de lngua estrangeira dificilmente precisa chegar a esse nvelde conhecimento.

    No existe, na verdade, uma receita para a diferenciao entre Primeira Lngua,Segunda Lngua e Lngua Estrangeira. O status de uma lngua tambm pode variarcom o tempo, necessrio apenas estabelecer uma outra relao com ela. Se acriana citada antes, que aprendeu o ingls como SL na Inglaterra, muda para

    Portugal e a lngua anglo-saxnica perde a importncia na sua vida, a criana perdeessa relao bsica com ela e ela pode se tornar, com o passar do tempo, uma LnguaEstrangeira se no for completamente esquecida. Da mesma forma, at mesmo oalemo, que fora uma L1, pode sofrer esse fenmeno.

    5- ConclusoComo, portanto, a diferenciao no absoluta, cada caso deve ser avaliado como

    um caso. Para essa comunicao, procuramos dar as definies para achar a

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    classificao mais apropriada para o alemo-padro nas comunidades bilnges doSul. Para alguns pode parecer j bem claro, mas eu queria, apesar da possvel claradistino, entrar na discusso conceitual, para que a especulao pudesse serclareada tambm luz da teoria. Embora se possa querer argumentar que os alunosaprendem alemo para se integrarem melhor, para se comunicarem na colnia, temosque lembrar que o alemo-padro oferecido nas escolas no representa uma forma desocializao, de integrao ou de comunicao, j que o alemo-padro no

    garantia para a comunicao sem problemas no hunrckisch, tanto para entenderquanto para se expressar. um pouco como aprender o holands para entender oalemo, ou como aprender o espanhol para se integrar na sociedade brasileira.

    O termo Segunda Lngua, raramente abordado, muitas vezes visto de formadeturpada. O conceito no envolve a proximidade ou a semelhana lingstica entreos idiomas, mas sim os fatores vistos acima.

    A partir da teoria podemos concluir, ento, que o alemo-padro ensinado nasescolas se trata, portanto, de uma Lngua Estrangeira, e como tal deve ser encaradapor alunos e professores.

    Notas

    1PUPP SPINASS, Karen.Deutsch als Fremdsprache in Brasilien: Eine Studieber kontextabhngige unterschiedliche Lernersprachen und muttersprachliche

    Interferenzen. Berlin, Peter Lang, 2005. O ttulo em portugus seria Alemocomo lngua estrangeira no Brasil: um estudo sobre diferentes interlnguas emdiferentes contextos e as inteferncias da lngua materna.2As entrevistas deveriam levantar informaes sobre o perfil do aluno e suaatitude em relao lngua alem e s aulas; os testes visavama averiguar seusconhecimentos lingsticos orais e escritos (nas quatro habilidades) emHochdeutsch (alemo-padro), para que pudssemos traar as interlnguas dosdiferentes contextos.3Mais sobre o tema vide ZIEGLER, Arne.Deutsche Sprache in Brasilien:Untersuchungen zum Sprachwandel und zum Sprachgebrauch der

    deutschstmmigen Brasilianer in Rio Grande do Sul. Essen, Die blaue Eule,1996; ALTENHOFEN, Clo Vilson.Hunsrckisch in Rio Grande do Sul: ein

    Beitrag zur Beschreibung einer deutschbrasilianischen Dialektvariett im

    Kontakt mit dem Portugiesischen. Stuttgart, Steiner, 1996; TORNQUIST, IngridMargareda. Das hon ich von meiner Mama - zu Sprache und ethischenKonzepten unter Deutschstmmigen in Rio Grande do Sul. Uppsala, Ume,1997; PUPP SPINASS (2005).4Vide SEYFERTH, Giralda. A Identidade teuto-brasileira numa perspectivahistrica. In: Mauch, Cludia / Vasconcellos, Naira (Org.) Os alemes no sul

    do Brasil. Canoas, Ed. ULBRA, 1994, p. 16.5Vide PUPP SPINASS, Karen.A incluso e a excluso lingstica nahistria da imigrao alem e as conseqncias para o aprendizado de DaF

    por bilnges na atualidade. Anais do IX Seminrio Nacional de Pesquisadoresda Histria das Comunidades Teuto-Brasileiras. (no prelo)6Vide NEUMANN, Gerson Roberto.A Muttersprache (lngua materna) naobra de Wilhelm Rotermund e Balduno Rambo e a construo de uma

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    identidade cultural hbrida no Brasil.Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, 2000.(Dissertao de Mestrado).7Teutnia tambm fora colonizada ricamente por imigrantes oriundos daWestflia. Entretanto, eles representam um grupo mais isolado, que ocupou umadeterminada rea de Teutnia que hoje o municpio de Westflia. Nos atuais

    bairros de Teutnia se fala, predominantemente o hunsrckisch.8Estima-se que haja cerca de 180 lnguas indgenas (autctones) e mais de 30lnguas de imigrao (alctones) no Brasil. Esse dado to importante levou aComisso de Educao e Cultura da Cmara dos Deputados Federais,

    juntamente com o IPHAN (Instituto do Patrimnio Histrico e ArtsticoNacional) e o IPOL (Instituto de Investigao de Polticas Lingsticas), aidealizar um registro das lnguas brasileiras, ainda em elaborao.