Os 5 Ps Da Estrategia

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Os 5 Ps da Estratégia Henry Mintzberg (*) A natureza humana insiste em uma definição para todos os conceitos. Mas a palavra estratégia há muito tem sido usada implicitamente de várias maneiras, mesmo que tenha sido definida tradicionalmente em apenas uma. O reconhecimento explícito de múltiplas definições pode ajudar as pessoas a manobrar pensamentos através deste difícil campo. Assim sendo, cinco definições de estratégia estão sendo apresentadas aqui como plano, pretexto, padrão, posição e perspectiva após o que alguns de seus inter-relacionamentos são considerados. A Estratégia Como Plano Para qualquer um que você pergunte, estratégia é um plano algum tipo de curso de ação conscientemente engendrado, uma diretriz (ou conjunto de diretrizes) para lidar com uma determinada situação. Uma criança tem uma “estratégia” para pular uma cerca, uma corporação tem uma estratégia para dominar um mercado. Por esta definição, as estratégias têm duas características essenciais: são preparadas previamente às ações para as quais se aplicam e são desenvolvidas consciente e deliberadamente. Uma série de definições, em uma variedade de campos de ação, reforça este ponto de vista. Por exemplo: Na área militar: a estratégia trata do “planejamento do plano de guerra, moldando as campanhas e, dentro destas, tomando decisões sobre os engajamentos individuais” (Von Clausewitz, 1976:177); Na teoria de jogos: a estratégia é “um plano completo que especifica quais opções serão feitas [pelo jogador] em cada situação possível” (von Newman e Morgenstern, 1944:79); Na administração: “A estratégia é um plano unificado, abrangente e integrado... com a finalidade de assegurar que os objetivos básicos do empreendimento sejam alcançados” (Glueck, 1980:9). Como planos, as estratégias podem ser genéricas ou específicas. Existe um uso para a palavra no sentido específico que precisa ser identificado aqui. Como plano, uma estratégia pode ser um pretexto, também, e realmente apenas uma “manobra” específica com a finalidade de enganar o concorrente ou competidor. O garoto poderá usar a cerca como pretexto para atrair um marginal para seu quintal, onde seu Dobermann aguarda os intrusos. Da mesma forma, uma empresa talvez ameace expandir a capacidade da fábrica para desencorajar um concorrente de construir uma nova fábrica. Aqui, a estratégia real (isto é, como plano, a intenção real) é a ameaça, não a expansão em si, e como tal é um pretexto, um blefe. Com efeito, existe uma literatura em expansão no campo da administração estratégica, assim como no processo geral de negociação, que encara a estratégia desta maneira e, assim, enfoca sua atenção nos seus aspectos mais dinâmicos e competitivos. Por exemplo, em seu famoso livro, Competitive Strategy, Porter (1980) dedica um capítulo a “Sinais de Mercado” (incluindo uma discussão sobre os efeitos de anunciar as manobras, o uso de “marca de confronto” e o uso de ameaças de processos antitruste particulares) e outro capítulo intitulado “Manobras Competitivas” (incluindo ações de preempção contra a reação da concorrência). E Schelling (1980) dedica a maior parte de seu famoso livro, The Strategy of Conflict, ao tópico de pretextos para iludir os rivais em uma situação competitiva ou de negociação.

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In: MINTZBERG, Henry e QUINN, James Brian. O processo da estratégia. 3a. Ed. Porto Alegre: Bookman 2001.

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  • Os 5 Ps da Estratgia Henry Mintzberg (*)

    A natureza humana insiste em uma definio para todos os conceitos. Mas a palavra

    estratgia h muito tem sido usada implicitamente de vrias maneiras, mesmo que tenha sido

    definida tradicionalmente em apenas uma. O reconhecimento explcito de mltiplas definies

    pode ajudar as pessoas a manobrar pensamentos atravs deste difcil campo. Assim sendo,

    cinco definies de estratgia esto sendo apresentadas aqui como plano, pretexto, padro, posio e perspectiva aps o que alguns de seus inter-relacionamentos so considerados.

    A Estratgia Como Plano

    Para qualquer um que voc pergunte, estratgia um plano algum tipo de curso de ao conscientemente engendrado, uma diretriz (ou conjunto de diretrizes) para lidar com

    uma determinada situao. Uma criana tem uma estratgia para pular uma cerca, uma corporao tem uma estratgia para dominar um mercado. Por esta definio, as estratgias

    tm duas caractersticas essenciais: so preparadas previamente s aes para as quais se

    aplicam e so desenvolvidas consciente e deliberadamente. Uma srie de definies, em uma

    variedade de campos de ao, refora este ponto de vista. Por exemplo:

    Na rea militar: a estratgia trata do planejamento do plano de guerra, moldando as campanhas e, dentro destas, tomando decises sobre os engajamentos

    individuais (Von Clausewitz, 1976:177); Na teoria de jogos: a estratgia um plano completo que especifica quais

    opes sero feitas [pelo jogador] em cada situao possvel (von Newman e Morgenstern, 1944:79);

    Na administrao: A estratgia um plano unificado, abrangente e integrado... com a finalidade de assegurar que os objetivos bsicos do empreendimento sejam

    alcanados (Glueck, 1980:9).

    Como planos, as estratgias podem ser genricas ou especficas. Existe um uso para a

    palavra no sentido especfico que precisa ser identificado aqui. Como plano, uma estratgia

    pode ser um pretexto, tambm, e realmente apenas uma manobra especfica com a finalidade de enganar o concorrente ou competidor. O garoto poder usar a cerca como

    pretexto para atrair um marginal para seu quintal, onde seu Dobermann aguarda os intrusos.

    Da mesma forma, uma empresa talvez ameace expandir a capacidade da fbrica para

    desencorajar um concorrente de construir uma nova fbrica. Aqui, a estratgia real (isto ,

    como plano, a inteno real) a ameaa, no a expanso em si, e como tal um pretexto, um

    blefe.

    Com efeito, existe uma literatura em expanso no campo da administrao estratgica,

    assim como no processo geral de negociao, que encara a estratgia desta maneira e, assim,

    enfoca sua ateno nos seus aspectos mais dinmicos e competitivos. Por exemplo, em seu

    famoso livro, Competitive Strategy, Porter (1980) dedica um captulo a Sinais de Mercado (incluindo uma discusso sobre os efeitos de anunciar as manobras, o uso de marca de confronto e o uso de ameaas de processos antitruste particulares) e outro captulo intitulado Manobras Competitivas (incluindo aes de preempo contra a reao da concorrncia). E Schelling (1980) dedica a maior parte de seu famoso livro, The Strategy of Conflict, ao tpico

    de pretextos para iludir os rivais em uma situao competitiva ou de negociao.

  • A Estratgia Como Padro

    Mas se as estratgias podem ser pretendidas (seja como planos gerais ou pretextos

    especficos), certamente tambm podem ser realizadas. Em outras palavras, definir a

    estratgia como plano no suficiente; precisamos tambm de uma definio que abranja o

    comportamento resultante. Assim, prope-se uma terceira definio: a estratgia um

    padro especificamente um padro em um fluxo de aes (Mintzberg e Waters, 1985). Por esta definio, quando Picasso pintou em azul durante algum tempo, isso era uma estratgia,

    assim como foi o comportamento da Ford Motor Company quando Henry Ford ofereceu seu

    Modelo T somente na cor preta. Em outras palavras, por esta definio, a estratgia

    consistncia no comportamento, quer seja pretendida ou no.

    Isso pode parecer uma definio estranha para uma palavra que esteve to ligada ao livre

    arbtrio (strategos, em grego, a arte do general do exrcito [Evered 1983]). Mas a questo que, conquanto quase ningum defina estratgia desta forma, muitas pessoas parecem us-la

    vez por outra. Veja esta citao de um executivo de negcios: Aos poucos, as abordagens bem-sucedidas se fundem em um padro de ao que se torna nossa estratgia. Certamente

    no temos uma estratgia geral para isto (citado em Quinn, 1980:35). Este comentrio inconsistente apenas se nos restringirmos a uma definio de estratgia: o que esse homem

    parece dizer que sua empresa tem a estratgia como padro, mas no como plano.

    Considere, ainda, este comentrio na revista Business Week sobre uma joint venture entre a

    General Motors e a Toyota:

    O provvel negcio da Toyota talvez seja altamente significativo porque outro exemplo

    de como a estratgia da GM se resume em fazer um pouco de tudo, at que o mercado decida

    para onde vai. (Business Week, 31 de outubro de 1983).

    Um jornalista inferiu um padro no comportamento de uma empresa e o rotulou de

    estratgia.

    A questo que toda vez que um jornalista atribui uma estratgia a uma empresa ou a

    um governo, e toda vez que um gerente faz a mesma coisa com relao a um concorrente ou

    mesmo cpula de sua prpria firma, essas pessoas esto implicitamente definindo a

    estratgia como padro em ao isto , inferindo consistncia de comportamento e rotulando-a de estratgia. Isso pode, claro, ir mais alm e atribuir inteno a essa

    consistncia isto , presumir que existe um plano por trs do padro. Porm, isso uma suposio que poder provar-se falsa.

    Assim, as definies de estratgia como plano e como padro podem ser bem

    independentes uma da outra: os planos podem no ser atingidos, enquanto que os padres

    podero surgir sem suspeita. Para parafrasear Hume, as estratgias podero resultar de atos

    humanos, mas no de designs humanos (veja Majone, 1976-77). Se rotularmos a primeira

    definio como estratgia pretendida e a segunda como realizada, conforme mostra a Figura

    1, poderemos distinguir estratgias deliberadas, nas quais as intenes que existiam

    anteriormente foram realizadas, de estratgias IemergentesI, nas quais os padres se

    desenvolveram na ausncia de intenes ou a despeito delas (que no foram realizadas).

    Para que uma estratgia seja realmente deliberada isto , para que um padro tenha sido pretendido exatamente conforme realizado de supor que tenha originado de uma ordem de grande importncia. Intenes precisas devem ter sido estabelecidas de antemo

    pela liderana da organizao; essas intenes devem ter sido aceitas por todos como se

    originaram e, em seguida, realizadas sem a interferncia das foras polticas, tecnolgicas ou

    de mercado. Da mesma forma, uma estratgia realmente emergente tambm uma ordem

  • importante, exigindo consistncia nas aes sem qualquer sugesto de inteno. (Nenhuma

    consistncia significa estratgia-zero, ou pelo menos estratgia no-realizada). No entanto,

    algumas estratgias chegam perto o suficiente de qualquer uma das formas, enquanto outras provavelmente a maioria permanecem no continuum que existe entre os dois, refletindo aspectos deliberados bem como emergentes. A Tabela 1 relaciona vrios tipos de estratgias

    ao longo desse continuum.

    ESTRATGIAS SOBRE O QU?

    Rotular estratgias como planos ou padres ainda pede uma questo bsica: estratgias

    sobre o qu? Muitos escritores respondem ao discutir o desenvolvimento de recursos, mas a

    questo permanece: quais recursos e para que finalidade? Qualquer militar pode reduzir o

    nmero de pregos em suas botas, ou uma empresa pode pr em prtica um padro de

    marketing somente com produtos pintados de preto, mas isso mal atende ao imponente rtulo

    de estratgia. Ou ser que sim? Como a palavra nos foi herdada dos militares, estratgia refere-se a coisas

    importantes, tticas aos detalhes (mais formalmente, a ttica nos ensina o uso de foras armadas no engajamento, estratgia, o uso do engajamento para o objetivo da guerra, von Clausewitz, 1976:128). Pregos nas botas e cor dos carros so certamente detalhes. O problema

    que em retrospecto os detalhes podem s vezes se provar estratgias. Mesmo na rea militar: Por falta de um Prego, a Bota se perdeu; por falta de uma Bota, o Cavalo se perdeu..., e assim por diante o cavaleiro e o general perderam a batalha, tudo por falta de Cuidados com o Prego de uma Bota (Franklin, 1977:280). Na verdade, um dos motivos pelos quais Henry Ford perdeu sua batalha contra a General Motors foi que ele se recusou a pintar

    seus carros em uma cor que no fosse preta.

    Rumelt (1979) assinala que as estratgias de uma determinada pessoa so as tticas de outra o que estratgico depende de onde voc est situado. Depende tambm de quando voc se situa; o que parece ser ttico hoje pode provar-se estratgico amanh. A questo que

    rtulos no devem ser usados para inferir que algumas questes so inevitavelmente mais

    importantes que outros. Existem ocasies em que vantajoso gerenciar os detalhes e deixar

    que as estratgias surjam por si. H um bom motivo para referir-se s questes como

    relativamente estratgicas, em outras palavras, relativamente importantes em algum contexto, seja como pretendido antes de agir ou como pretendido depois disso. Da mesma

    forma, a resposta pergunta estratgias sobre o qu? a seguinte: em potencial sobre

    qualquer coisa sobre produtos e processos, clientes e cidados, responsabilidades sociais e auto-interesses, controle e cor.

    Dois aspectos do contedo das estratgias devem, entretanto, ser individualizados

    porque so de particular interesse.

    A Estratgia Como Posio

    A quarta definio que a estratgia uma posio especificamente, uma maneira de colocar a organizao no que os tericos da organizao gostam de chamar de ambiente. Por esta definio, a estratgia se torna a fora de mediao ou harmonizao, segundo Hofer e Shendel, (1978:4) entre a organizao e o ambiente, isto , entre os contextos interno e externo. Em termos ecolgicos, a estratgia se torna um nicho; em termos econmicos, um local que gera aluguel (isto , retornos por [estar em] local exclusivo (Bowman, 1974:47); em termos administrativos, de maneira formal, um domnio do

  • mercado de produtos (Thompson, 1967), o local no ambiente no qual os recursos esto

    concentrados.

    Note que esta definio de estratgia pode ser compatvel com uma ou com todas as

    definies precedentes; uma posio pode ser pr-selecionada e pretendida atravs de um

    plano (ou trama) e/ou pode ser alcanada, at mesmo encontrada, atravs de um padro de

    comportamento.

    Do ponto de vista da teoria militar e de jogos sobre estratgia, a posio geralmente

    usada no contexto do que chamado de jogo de duas pessoas, mais conhecido nos negcios como concorrncia frontal (na qual as tramas so especialmente comuns). A definio de

    estratgia como posio, entretanto, permite-nos abrir implicitamente o conceito por completo

    aos chamados jogos de n pessoas (isto , muitos jogadores), e alm disso. Em outras palavras,

    conquanto a posio possa sempre ser definida com relao a um nico competidor

    (literalmente assim tambm na rea militar), onde a posio se torna o local da batalha, pode

    tambm ser definida no contexto de uma srie de competidores ou simplesmente com relao

    a mercados ou ao ambiente como um todo. Todavia, a estratgia como posio pode se

    estender tambm alm da concorrncia, quer seja ela econmica ou no. De fato, qual o

    significado da palavra nicho se no uma posio a ser ocupada para evitar a concorrncia? Desta forma, podemos nos transportar da definio empregada pelo General Ulysses Grant na

    dcada de 1860 Estratgia o posicionamento dos recursos nossa disposio de maneira que apresente a maior probabilidade de derrotar o inimigo, - para a do Professor Richard Rumelt na dcada de 80 Estratgia criar situaes para retornos econmicos e descobrir maneira de sustent-las (Rumelt, 1982), - isto , qualquer posio vivel, quer seja ou no diretamente competitiva.

    Astley e Fombrun (1983), com efeito, assumem o passo lgico seguinte ao introduzirem

    a idia de estratgias coletivas, ou seja, a estratgia procurada para promover a cooperao entre as organizaes, at mesmo provveis concorrentes (equivalente em biologia a animais

    reunindo-se em grupos em busca de proteo). Tais estratgias podem estender-se de providncias informais e discusses a dispositivos formais, como diretorias interligadas, joint

    ventures e fuses (p. 577). Realmente, se consideradas sob um ngulo ligeiramente diferente, essas providncias podem, s vezes, ser descritas como estratgias polticas, isto , estratgias

    para subverter foras legtimas da concorrncia.

    A Estratgia Como Perspectiva

    Enquanto a quarta definio de estratgia olha para fora, procurando posicionar a

    organizao no ambiente, a quinta olha para dentro, na verdade para dentro da cabea dos

    estrategistas, coletivamente, mas com uma viso mais ampla. Aqui, a estratgia uma

    perspectiva, seu contedo consistindo no apenas de uma posio escolhida, mas de uma

    maneira enraizada de ver o mundo. H organizaes que priorizam o marketing e constroem

    toda uma ideologia em torno disto (uma IBM, por exemplo); a Hewlett-Packard desenvolveu

    o maneira H-P. com base em sua cultura de engenharia, enquanto a rede McDonalds se tornou famosa pela sua nfase em qualidade, servio e asseio.

    A estratgia, neste particular, para a organizao o que a personalidade para o

    indivduo. De fato, um dos mais antigos e influentes escritores sobre estratgia (pelo menos,

    pelo fato de suas idias terem sido refletidas em escritores mais populares) foi Philip Selznick

    (1957:47), que escreveu sobre o carter de uma organizao comprometimentos distintos e integrados s maneiras de agir e reagir nela embutidos. Uma srie de conceitos de outros campos tambm capta esta idia; antroplogos se referem cultura de uma sociedade e os socilogos, sua ideologia; os tericos militares falam da grandiosa estratgia dos

  • exrcitos, enquanto tericos da administrao tm usado termos como teoria dos negcios e sua fora impelente (Drucker, 1974; Tregoe e Zimmerman, 1980); os alemes, talvez, tenham captado a idia melhor com sua palavra Weltanschauung, literalmente viso mundial, significando intuio coletiva sobre como o mundo funciona.

    A quinta definio sugere, acima de tudo, que a estratgia um conceito. Isso representa

    uma implicao importante, ou seja, que todas as estratgias so abstraes que existem

    apenas na mente das pessoas interessadas. importante lembrar que ningum jamais viu uma

    estratgia ou tocou nela; toda estratgia uma inveno, uma quimera na imaginao das

    pessoas, quer tenha sido concebida como uma inteno para regular o comportamento antes

    que acontea ou inferida como padres para descrever um comportamento j ocorrido.

    O que de primordial importncia sobre esta quinta definio, todavia, que a

    perspectiva compartilhada. Conforme o inferido nas palavras Weltanschauung, cultura e

    ideologia (com relao a uma sociedade), mas no a palavra personalidade, a estratgia uma

    perspectiva compartilhada pelos membros de uma organizao atravs de suas intenes e/ou

    pelas suas aes. Na realidade, quando estamos falando de estratgia neste contexto, estamos

    entrando no campo da mente coletiva indivduos unidos pelo pensamento comum e/ou comportamento. Uma questo principal no estudo da formao da estratgia se torna,

    portanto, como interpretar essa mente coletiva compreender como as intenes se difundem atravs do sistema chamado organizao para se tornarem compartilhadas e como as aes

    passam a ser exercidas em uma base coletiva e, no entanto, consistente.

    Inter-Relacionando os Ps

    Conforme sugerido anteriormente, a estratgia, tanto como perspectiva quanto posio,

    pode ser compatvel como plano e/ou padro. Na realidade, porm, a relao entre essas duas

    definies pode ser mais envolvente. Por exemplo, conquanto alguns considerem a

    perspectiva como um plano (Lapierre, 1980, descreve as estratgias como sonhos em busca da realidade), outros a descrevem como dando margem a planos (por exemplo, como posies e/ou padres em algum tipo de hierarquia implcita). Mas o conceito de estratgia

    emergente que um padro pode emergir e ser reconhecido de modo a provocar um plano

    formal, talvez dentro de uma perspectiva geral.

    Podemos perguntas como surge a perspectiva em primeiro lugar. Talvez atravs de

    experincias anteriores: a organizao tentou vrios expedientes em seus anos de formao e,

    aos poucos, consolidou uma perspectiva em torno do que funcionava. Em outras palavras, as

    organizaes aparentemente desenvolveram carter, assim como as pessoas desenvolveram personalidade ao interagir com o mundo medida que encontram esse carter atravs de suas habilidades inatas e pendores naturais. Desta forma, o padro pode tambm dar margem

    perspectiva. Assim tambm o caso da posio. Testemunhe a discusso de Perrow

    (1970:161) sobre a dedicao dos homens de algodo e os homens da seda do setor txtil, pessoas que desenvolveram uma dedicao quase religiosa s fibras que produziam.

    Independentemente de como apaream, entretanto, existe um motivo para acreditar que,

    conquanto os planos e as posies possam ser dispensveis, as perspectivas so imutveis

    (Brunsson, 1982). Em outras palavras, uma vez estabelecidas, as perspectivas se tornam

    difceis de serem alteradas. Com efeito, a perspectiva poder tornar-se to profundamente

    enraizada no comportamento de uma organizao que as crenas associadas podem tornar-se

    subconscientes nas mentes de seus membros. Quando isso acontece, a perspectiva pode vir a

    se parecer mais como padro do que plano em outras palavras, ver-se- que estar mais presente na consistncia dos comportamentos do que na articulao das intenes.

  • claro que, se a perspectiva imutvel, a mudana no plano e na posio dentro da

    perspectiva facilmente comparvel mudana de perspectiva. Neste particular,

    interessante notar o caso de Egg McMuffin. Esse produto, quando novo o breakfast americano em uma broa , foi uma mudana estratgica para a rede McDonalds? Apresentado nas classes do MBA, essa questo dilacerante (ou pelo menos dilacerante para o

    estmago) provocou, inevitavelmente, debates acalorados. Os proponentes (geralmente

    simpatizantes do fast food) argumentam que naturalmente foi: trouxe o McDonalds para um novo mercado, o do caf da manh, estendendo o uso das instalaes existentes. Os oponentes

    retucam que isso bobagem, nada mudou a no ser alguns ingredientes: era a mesma

    papinha em uma embalagem diferente. Os dois lados, claro, esto certos e errados. Tudo depende de como voc define estratgia. As posies mudaram; as perspectivas

    permaneceram as mesmas. Com efeito e esta a questo a posio poderia ser alterada facilmente porque era compatvel com a perspectiva existente. Egg McMuffin McDonalds puro, no apenas no produto e na embalagem, como tambm na produo e na divulgao.

    Imagine, porm, uma mudana na posio da McDonalds que exigisse uma mudana de perspectiva digamos, introduzir um jantar luz de velas com atendimento personalizado (seu McDonalds la Orange preparado a pedido) para atrair os consumidores de fim de noite. No precisamos dizer mais nada, a no ser talvez rotular isso de sndrome do Egg McMuffin.

    A Necessidade de Ecletismo na Definio

    Conquanto existam vrios relacionamentos entre as vrias definies, nenhum

    relacionamento isolado nem qualquer definio nica, no que diz respeito ao assunto,

    assumem precedncia sobre os demais. De algumas maneiras, essas definies competem (no

    sentido de que podem se revezar entre si) mas, talvez de maneira mais importante, elas se

    complementam. Nem todos os planos se tornam padres e tampouco nem todos os padres

    que se desenvolvem so planejados; algumas tramas so menos que posies, contudo, so

    menos que perspectivas. Cada definio acrescenta elementos importantes nossa

    compreenso de estratgia e, com efeito, encoraja-nos a encarar questes fundamentais sobre

    as organizaes em geral.

    Como plano, a estratgia trata de como os lderes tentam estabelecer orientao para as

    organizaes, para direcion-las em determinados modos de atuao. A estratgia como plano

    tambm levanta a questo fundamental de percepo como as intenes so concebidas no crebro humano em primeiro lugar, e, na realidade, o que as intenes realmente significam.

    O caminho para o inferno neste campo pode ser pavimentado por aqueles que aceitam as

    intenes declaradas pelo seu valor de face. Ao estudar a estratgia como plano, precisamos

    de certa maneira entrar na mente dos estrategistas para descobrir o que realmente est sendo

    intencionado.

    Como pretexto, a estratgia nos leva para o reino da concorrncia direta, no qual

    ameaas e estratagemas e uma srie de outras manobras so empregados para obter vantagens.

    Isso coloca o processo de formao da estratgia em seu palco mais dinmico, com manobras

    provocando contramanobras e assim por diante. Ironicamente, no entanto, a estratgia em si

    um conceito enraizado no na mudana, mas na estabilidade em planos e em padres estabelecidos. Como, ento, reconhecer as idias dinmicas da estratgia como pretexto com

    as idias estticas da estratgia como padro e outras formas de planos?

    Como padro, a estratgia enfoca a ao, lembrando-nos de que o conceito vazio se

    no levar em conta o comportamento. A estratgia como padro tambm introduz a idia de

    convergncia, a realizao de consistncia no comportamento de uma organizao. Como

  • que se forma essa consistncia e de onde vem? Estratgia realizada, quando considerada ao

    lado de estratgia pretendida, encoraja-nos a considerar a idia de que a estratgia pode

    emergir assim como ser deliberadamente imposta.

    Como posio, ela encoraja-nos a visualizar as organizaes em seu ambiente

    competitivo como encontram suas posies e como se protegem a fim de enfrentar a concorrncia, evit-la ou subvert-la. Isso nos permite pensar nas organizaes em termos

    ecolgicos, como organismos em nichos que lutam pela sobrevivncia em um mundo de

    hostilidades e de incertezas, assim como simbioses.

    Finalmente, como perspectiva, a estratgia levanta questes intrigantes sobre intenes e

    comportamentos no contexto coletivo. Se definirmos a organizao como ao coletiva na

    busca de uma misso comum (uma maneira fantasiosa de dizer que um grupo de pessoas sob

    um rtulo em comum seja a General Motors ou a Academia de Esttica Luigi de alguma forma, encontra um meio de cooperar na produo de produtos especficos e servios), ento a

    estratgia como perspectiva levanta a questo de como as intenes se difundem atravs de

    um grupo de pessoas para se tornar compartilhada como normas e valores, e como padres de

    comportamento se tornam profundamente integradas no grupo.

    Desse modo, a estratgia no apenas uma idia de como lidar com um inimigo em um

    ambiente de concorrncia ou de mercado, como tratado em grande parte da literatura e em

    seu uso popular. Isso tambm nos leva s questes mais fundamentais sobre organizaes

    como instrumentos para percepo coletiva e ao.

    Para concluir, grande parte da confuso neste campo advm de usos contraditrios e

    indevidos do termo estratgia. Ao explicar detalhadamente e pelo uso das vrias definies,

    poderemos evitar parte dessa confuso e, desta forma, enriquece nossa habilidade de

    compreender e administrar os processos pelos quais as estratgias se formam.

  • Tabela 1: Vrios tipos de estratgia indo da perspectiva deliberada at aos processos emergentes.

    Estratgia Planejada: intenes precisas so formuladas e

    articuladas por uma liderana central e apoiadas por controles

    formais para garantir sua implementao livre de surpresas em um

    ambiente benigno, controlvel ou previsvel (para assegurar que no

    haja distoro de intenes); essas estratgias so altamente

    deliberadas.

    Estratgia de Processo: a liderana controla os aspectos processuais da

    estratgia (quem admitido e, portanto, tem a oportunidade de influenciar a

    estratgia, com quais estruturas intrnsecas vai trabalhar, etc.), deixando o

    contexto da estratgia em si para outros; as estratgias so outra vez

    parcialmente deliberadas (relativamente ao processo) e parcialmente

    emergentes (no que se refere ao contedo) e deliberadamente emergentes.

    Estratgia Empresarial: as intenes existem como a viso

    pessoal e no-articulada de um nico lder e so, portanto, adaptveis

    a novas oportunidades; a organizao est sob o controle pessoal do

    lder e colocada em um nicho protegido de seu ambiente; essas

    estratgias so relativamente deliberadas, mas podem ser tambm

    emergentes.

    Estratgia Desconectada: os membros das subunidades, pouco ligados

    ao resto da organizao, produzem padres nos fluxos de suas prprias aes,

    na ausncia de ou em contradio direta das intenes comuns ou centrais da

    organizao como um todo; as estratgias podem ser deliberadas para aqueles

    que as originam.

    Estratgia Ideolgica: as intenes existem como a viso

    coletiva de todos os membros da organizao, controladas atravs de

    fortes normas compartilhadas; a organizao , muitas vezes,

    reagente vis--vis seu ambiente; essas estratgias so relativamente

    deliberadas.

    Estratgia de Consenso: atravs de ajuste mtuo, vrios membros

    convergem em padres que permeiam a organizao na ausncia de intenes

    centrais ou comuns; essas estratgias so um tanto emergentes em sua

    natureza.

    Estratgia Guarda-Chuva: uma liderana com controle parcial

    das aes da organizao define metas estratgicas ou limites dentro

    dos quais os outros precisam agir (por exemplo, que todos os novos

    produtos devam ter preos altos na vanguarda tecnolgica, embora o

    que esses produtos devam ficar por conta da emergncia); como

    conseqncia, as estratgias so parcialmente deliberadas (as

    fronteiras) e parcialmente emergentes (seus padres intrnsecos); essa

    estratgia tambm pode ser chamada de deliberadamente emergente,

    na medida em que a liderana permite propositalmente a outros a

    flexibilidade de manobra e de formar padres dentro de suas

    fronteiras.

    Estratgia Imposta: o ambiente externo dita padres em aes, ou

    atravs de uma imposio direta (digamos, por um proprietrio externo ou por

    um cliente exigente) ou atravs de preempo implcita ou ainda pelo

    cerceamento das opes da empresa (como em uma grande empresa area

    que precisa operar com aeronaves grandes apenas para se manter vivel);

    essas estratgias so organizacionalmente emergentes, embora possam ser

    interiorizadas e tornadas deliberadas.

    (*)In: MINTZBERG, Henry e QUINN, James Brian. O processo da estratgia. 3a. Ed. Porto Alegre: Bookman 2001.