Os 25 mitos da pediatria

Conhecimentos inditos sobre o desenvolvimento biolgico esto a revolucionar os cuidados aos mais pequenos.

Vera Lcia Arreigoso

Msica na gravidez: No preciso nascer para ouvir. Hoje admite-se que o feto tem

capacidades auditivas a partir das 12 semanas e guarda memria dos sons aps o

nascimento. Recomenda-se a audio de sons graves porque tm um efeito calmante e a

msica clssica est entre os estilos adequados. Os ritmos binrios tm a vantagem

acrescida de se assemelharem ao batimento do corao da me. Uma curiosidade: a

cadncia com que as mes embalam igual ao seu ritmo cardaco e por isso que o beb

adormece mais facilmente.

Aleitamento: Evitar alimentos como laranjas, cebolas, leguminosas ou chocolates no

diminui as clicas no beb. A alimentao da mulher deve ser variada desde a gestao

porque est provado que o feto inicia o desenvolvimento das clulas sensveis ao sabor s

14 semanas. Todos so unnimes sobre os benefcios da amamentao exclusiva at aos

seis meses de vida do beb e provou-se que esto erradas as teorias sobre a fraca

qualidade do leite muito lquido ou que no escorre quando deitado num copo. O

aleitamento prioritrio e deve comear ainda na sala de partos.

Esterilizao: Ferver ou esterilizar biberes e tetinas no necessrio se os pais lavarem

frequentemente, e bem, as mos. As doenas infecciosas so menos frequentes e em

condies normais de habitabilidade e de higiene basta uma lavagem que elimine os

resduos.

Alimentos: um erro excluir alimentos como peixe, gema de ovo, carne de porco e

frutas nos primeiros tempos de vida. A seleco visava prevenir alergias, mas as

organizaes internacionais defendem que atrasar a diversificao alimentar, mesmo em

alrgicos, no traz benefcios. Outro erro antigo: no se deve obrigar a comer nem

negociar alimentos por alimentos - por exemplo, dar uma bolacha para compensar ter

comido sopa - e os legumes e frutas devem estar sempre na mesa porque a sua presena

influenciar a alimentao na vida adulta. No passado, os alimentos eram introduzidos

com o aparecimento dos dentes e agora so recomendados aos quatro meses, quando

no h amamentao.

Suplementos alimentares: Vitaminas para qu? A sociedade moderna caracteriza-se

pela abundncia e uma dieta equilibrada suficiente. A excepo, sobretudo no primeiro

ano de vida, a vitamina D, que geraes reforaram com 'colheradas' de leo de fgado

de bacalhau. A tradio tem sido recuperada sob outras formas: os cidos gordos so

decisivos na formao das membranas cerebrais e esto a ser redescobertos em leos de

peixes de profundidade.

Sono: No existe fundamento no medo de que os bebs deitados de costas podem

sufocar no caso de bolarem. Em situaes normais, o corpo humano est preparado para

evitar estas situaes. O medo levou muitos pais a deitarem os recm-nascidos de barriga

para baixo, mas hoje reprovvel e perigoso. mandatrio deitar os bebs de barriga

para cima, pelo menos, at aos seis meses. Depois, o prprio beb que escolhe a

posio mais confortvel. O sono solitrio foi estimulado por se acreditar que promovia a

autonomia, mas no est provado.

Morte sbita: 'Abafar' os bebs no o perigo principal. A morte de crianas saudveis

por razes inexplicveis continua a registar-se e estudos recentes tm evidenciado que

mais comum quando os pais so fumadores, em famlias monoparentais e quando o beb

deitado de barriga para baixo.

Choro: As lgrimas so mais do que fome ou fralda molhada. Descobriu-se que os bebs

so muito sensveis a estmulos e tambm precisam de aliviar a tenso. Ou seja, s vezes

basta deixar chorar um bocadinho para perceber a mensagem.

Banho: Esperar pela digesto para dar banho um mito. A gua utilizada est morna e

no existe choque trmico, responsvel pela congesto. Alm disso, o leite de fcil

digesto. O banho deve ser um prazer e a regra gua quanto baste e pouco produto de

limpeza', sobretudo com glicerina, porque seca e irrita a pele em demasia.

Pele: P de talco fora da lista. A limpeza exagerada inimiga da pele e um banho seguido

de uma loo hidratante suficiente. Na zona da fralda necessria parcimnia no uso de

toalhetes, pois limpam a sujidade, mas tambm podem arrastar a camada superficial da

pele. Quando a fralda s est molhada e no existe irritao no necessrio usar creme

ou pastas sob risco de provocar uma sensibilizao excessiva. E o p de talco est fora de

moda porque as partculas podem ser inaladas pelo beb.

Fralda: O uso precoce do bacio est fora de questo. Os pediatras esto a recuperar a

tradio de retirar a fralda s aos dois anos porque o controlo precoce do esfncter pode,

afinal, trazer problemas.

Botas ortopdicas: No vale a pena olhar para os ps antes dos dois anos. A ortopedia

moderna respeita as regras de crescimento do p e da marcha das crianas e qualquer

calado que faa alguma conteno interfere com a evoluo normal. ponto assente que

o exerccio e no o calado ortopdico ou formativo que cumpre a misso fisiolgica.

Sempre que possvel as crianas devem andar descalas e usar sapatos que protejam

apenas o tornozelo e o calcanhar.

Creche: A socializao, afinal, s comea aos trs anos. Na sociedade actual, mes e

avs trabalham e os bebs vo para a creche cada vez mais cedo. Contudo, a maioria dos

pediatras regressou ao passado para recomendar os cuidados dos avs at aos trs anos.

Argumentam que os ganhos de afecto compensam.

Febre: A temperatura no doena. A maioria das crianas faz quatro dias de febre e

no preciso baixar a temperatura de imediato como querem os pais dos nossos dias. Os

mdicos alertam que a febre muitas vezes um mecanismo de defesa do organismo e

que um sinal de serenidade a criana continuar a brincar.

Peso: Gordura no formosura. Cada beb tem o seu ritmo e as variaes nem sempre

so sinais de doena. Os pediatras afirmam que os pais modernos se preocupam em

excesso com o crescimento e recomendam que pesagem e medio s sejam feitas nas

consultas de rotina.

Tosse: Adeus ao xarope. Tossir uma forma do corpo para eliminar secrees e melhorar

a respirao. Trata-se de um sintoma e no de uma doena e nos primeiros anos de vida

no so recomendados inibidores.

Aerossis: So os grandes terapeutas do sculo XXI. Ajudam a respirar melhor, contudo,

os mdicos tm dvidas sobre o que os prximos avanos podem revelar sobre a sua

utilizao.

Ginstica respiratria: Comum na dcada de 90 revelou-se desnecessria. Era usada

para bronquiolites e hoje sabe-se que aumentam o cansao e as dificuldades de

respirao.

Remdios caseiros: Vivem-se tempos de medicao excessiva. As precaues sobre o

uso de remdios esto na ordem do dia e a regra recuperar remdios caseiros como o

xarope de cenoura e os preparados com mel.

Vacinas: O calendrio mudou. As crianas dos nossos dias so mais vacinadas - e dizem

os pediatras, esto mais protegidas - e j no preciso recomear do zero quando h

atrasos muito grandes.

Flor: As gotas outrora comuns foram trocadas pelos dentfricos. Actualmente,

promovida a lavagem cada vez mais precoce dos dentes, alis, logo que a dentio

aparece na vida do beb.

Brinquedos: Quantos mais, pior. As crianas precisam de estimular a imaginao e para

isso no podem ter muitos brinquedos para poderem explor-los ao mximo, dando-lhe

vrias utilizaes. Os pais devem guardar os presentes, optando pela distribuio ao longo

do ano.

Animais: Os eternos amigos esto de volta. Aps vrias teorias sobre o risco acrescido de

alergias, ces, gatos, pssaros e outros animais so desejveis para o desenvolvimento da

criana.

Desporto: O cloro no faz alergia. A prtica desportiva defendida para o

desenvolvimento psicomotor e a natao volta a liderar as preferncias. A qualidade da

gua das piscinas melhorou e os bebs podem nadar a partir do sexto ms de vida. S

preciso limpar o cloro com um banho abundante e dar bastante gua para minimizar a sua

presena no estmago.

Regras: O nus dos pais sobre a personalidade dos filhos est mitigado. Passou a ser

admitido que h crianas difceis que complicam a vida das famlias e que as regras so,

por isso, indispensveis. A negociao deve existir, mas sem rendio, em especial, dos

pais.

FUNDAMENTOS

Teses de mdicos portugueses

As orientaes da pediatria moderna so conhecidas em Portugal e esto adoptadas por

muitos especialistas. O Expresso ouviu alguns pediatras com trabalhos publicados nesta

rea e com funes em hospitais pblicos de referncia. Entre eles, o chefe do Servio de

Pediatria do Hospital de Cascais, Lus Pinheiro; o presidente do Colgio de Pediatria da

Ordem dos Mdicos, Anselmo da Costa; o neonatologista do Hospital de Santa Maria,

Antnio Simes de Azevedo; o presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria, Lus

Janurio, e o director da Pediatria Mdica do Hospital de Dona Estefnia, Gonalo Cordeiro

Ferreira.

Texto publicado na edio do Expresso de 06 de Dezembro 2009