Ortografando

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ORTOGRAFANDO COM O JOVEM DE FUTURO No ano de 2012, noventa e nove escolas da Rede Estadual de ensino de Mato Grosso do Sul foram contempladas com o Projeto Jovem de Futuro, uma tecnologia voltada para Gestão Escolar para Resultados. No início de 2013, novas escolas (noventa e sete), aderiram ao redesenho curricular. Finalizando em 197 escolas. As escolas participantes têm autonomia na definição de suas ações estratégicas e se comprometem a aumentar em 25 pontos a Proficiência Média da escola em Língua Portuguesa e Matemática, diminuir em 50% o percentual de alunos no Padrão de Desempenho BAIXO, na escala SAEB de Ensino Médio em três anos e reduzir em 40% os índices de evasão e abandono escolar dessa etapa de ensino. Este projeto reúne estratégias e metodologias que proporcionam às escolas de Ensino Médio um modelo de gestão abrangente e participativo, focado em resultados. As metodologias podem ser oferecidas de maneira independente, visando à intervenção em aspectos específicos da vida do jovem ou da realidade escolar. Acompanhadas de estratégias complementares de melhorias de resultados, fazendo assim uma reestruturação do Projeto Político Pedagógico das unidades escolares. A Secretaria de Estado de Educação, envolvida neste processo de construção pedagógica, oportunizará às escolas do referido projeto, a participação no concurso ORTOGRAFANDO. O Ortografando será desenvolvido com estudantes do Ensino Médio, com o objetivo de dinamizar e apropriar-se do processo de leitura e escrita, de acordo com as novas regras ortográficas da Língua Portuguesa.

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ORTOGRAFANDO COM O JOVEM DE FUTURO

No ano de 2012, noventa e nove escolas da Rede Estadual de ensino de Mato Grosso

do Sul foram contempladas com o Projeto Jovem de Futuro, uma tecnologia voltada para

Gestão Escolar para Resultados. No início de 2013, novas escolas (noventa e sete), aderiram

ao redesenho curricular. Finalizando em 197 escolas.

As escolas participantes têm autonomia na definição de suas ações estratégicas e se

comprometem a aumentar em 25 pontos a Proficiência Média da escola em Língua

Portuguesa e Matemática, diminuir em 50% o percentual de alunos no Padrão de

Desempenho BAIXO, na escala SAEB de Ensino Médio em três anos e reduzir em 40% os

índices de evasão e abandono escolar dessa etapa de ensino.

Este projeto reúne estratégias e metodologias que proporcionam às escolas de Ensino

Médio um modelo de gestão abrangente e participativo, focado em resultados. As

metodologias podem ser oferecidas de maneira independente, visando à intervenção em

aspectos específicos da vida do jovem ou da realidade escolar. Acompanhadas de estratégias

complementares de melhorias de resultados, fazendo assim uma reestruturação do Projeto

Político Pedagógico das unidades escolares.

A Secretaria de Estado de Educação, envolvida neste processo de construção

pedagógica, oportunizará às escolas do referido projeto, a participação no concurso

ORTOGRAFANDO.

O Ortografando será desenvolvido com estudantes do Ensino Médio, com o objetivo

de dinamizar e apropriar-se do processo de leitura e escrita, de acordo com as novas regras

ortográficas da Língua Portuguesa.

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REGULAMENTO DO ORTOGRAFANDO

1- Definição do Concurso

“Ortografando” será um concurso desenvolvido com alunos do EM, nas escolas

participantes do Programa Ensino Médio Inovador/ Jovem de Futuro.

2- Justificativa

A efetivação desse concurso contribuirá de forma positiva para a aprendizagem dos

alunos em Língua Portuguesa, uma vez que a educação é um processo que permeia

atividades que despertam a criatividade e a participação ativa dos alunos.

3- Objetivos

-Objetivo Geral

Dinamizar e apropriar-se ludicamente do processo ensino-aprendizagem, levando os

estudantes ao conhecimento das novas regras ortográficas da Língua Portuguesa.

4- Objetivos específicos

• Estimular nos estudantes o hábito de leitura e escrita;

• Ampliar os conhecimentos de grafia e escrita das palavras.

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4- Regras

O objetivo deste conjunto de regras é unificar o concurso, dando hipóteses iguais aos

educandos de todo o Ensino Médio das escolas participantes do referido projeto.

4.1 SOLETRAÇÃO

a- Todos os concorrentes deverão acompanhar a competição juntos. Ninguém poderá

falar com os concorrentes durante o evento;

b- A fonte de consulta será única, um dicionário de Língua Portuguesa atualizado de

acordo com as novas regras ortográficas. (Sugerimos um dicionário de Língua

Portuguesa que contenha o significado e a classificação das palavras);

c- Obrigatoriamente o estudante concorrente deverá:

1. Repetir a palavra dita;

2. Soletrar;

3. Repetir novamente a palavra – indicando que terminou a soletração;

4. Se o aluno errar alguma letra, acento, ou qualquer outro sinal gráfico como cedilha,

hífen, etc., a soletração será considerada errada;

5. Antes de iniciar a soletração, o aluno poderá pedir aos professores os seguintes

benefícios:

a. Classificação gramatical;

b. Definição;

c. Aplicação da palavra numa frase;

6. Depois de iniciada a soletração será proibida a correção de qualquer letra. O

estudante não poderá recomeçar a soletração;

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7. Se numa mesma rodada os estudantes concorrentes acertarem ou errarem a

soletração das suas palavras, uma nova rodada será iniciada;

5- Etapas do concurso

O concurso será realizado em 03 etapas:

1ª etapa- ESCOLA (AGOSTO) – Eliminatória realizada pela escola;

- Momento inicial: Eliminatória distinta entre 1ºs, 2ºs e 3ºs anos do Ensino Médio;

- Momento final: Eliminatória destacando dentre os três níveis do Ensino Médio, o

estudante que representará a escola; Prazo máximo para indicação do representante da

escola à SED: (2 DE. SETEMBRO).

2ª etapa - MUNICÍPIO (SETEMBRO/OUTUBRO) - Eliminatória realizada em

conjunto pelas escolas com o apoio da SED, no qual concorrerá o representante de cada

escola, sendo o estudante vencedor, representante do município;

3ª etapa – CAMPO GRANDE - SEMIFINAL E FINAL (29 de novembro) –

Eliminatória realizada em local determinado pela SED, sendo:

SEMI – FINAL : Período matutino ( Eliminatória que será dividida em 3 grupos, dos

quais sairá um vencedor de cada grupo que concorrerá na grande Final)

FINAL: Período Vespertino ( Eliminatória entre os três vencedores da SEMI-FINAL)

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ENCAMINHAMENTOS DO CONCURSO NA ESCOLA

OS PARTICIPANTES

Os participantes do concurso (um representante de cada série do Ensino Médio)

serão escolhidos de acordo com o Concurso realizado na escola,

(1ª Eliminatória), segundo critérios estabelecidos: Competição dentro de cada turma e

posteriormente entre turmas .

A BANCA

A organização da 1ª etapa da seletiva do concurso ORTOGRAFANDO COM O

Jovem de Fututro, ficará a cargo do Coordenador de Língua Portuguesa da escola.

Este, juntamente com o grupo gestor, promoverá a inscrição dos alunos, marcará as

datas e organizará a competição.

O concurso deve ser referendado por dois representantes do corpo docente da escola

(professores e/ou diretores) que, no dia da competição, supervisionarão a disputa na

condição de “juízes”.

LOCAL DA DISPUTA

A disputa deve acontecer nas dependências da própria escola, numa sala escolhida com

capacidade de alojar os concorrentes, seus responsáveis ( optativo) e os juízes.

A data da competição deve ser comunicada com antecedência aos participantes para que

tenham tempo hábil de se prepararem.

MATERIAL DE ESTUDO

- As novas regras ortográficas da Língua Portuguesa poderão ser estudadas com o

auxílio de um dicionário;

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- Para o estudo do ORTOGRAFANDO haverá a contextualização com as obras de

Clarice Lispector;

- As palavras para o ORTOGRAFANDO serão retiradas das obras indicadas de Clarice

Lispector e do dicionário. Lembrando que as palavras parônimas farão parte do

concurso.

Indicação/Sugestão das obras literárias/ Clarice Lispector

De amor e amizade – Crônicas para jovens

Hora da Estrela

A Paixão segundo GH

Demais textos

Os estudos poderão ter a orientação de professores e coordenadores de Língua

Portuguesa.

As eliminatórias realizadas na escola deverão obedecer a seguinte ordem:

primeiro, o melhor de cada classe, depois o melhor de cada série e finalmente o

classificado para a final no seu município.

Dependendo do número de participantes, o ideal é que sejam sorteados 4 alunos

de cada vez para disputar a soletração, principalmente na primeira fase (sala de aula).

Caberá à escola definir o local e a aula em que serão realizadas as eliminatórias.

O importante é que os alunos respeitem as regras e o tempo de apenas 2 minutos para

soletrar a palavra sorteada.

Para marcar o tempo de 2 minutos para a soletração, a escola deverá

providenciar um cronômetro ou um relógio, para que todos os participantes possam

visualizar.

Deverá ser realizado um sorteio para definir a ordem da soletração, para não haver

nenhum tipo de privilégio entre os candidatos.

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Idealização do Projeto

Erika Karla B. Costa

Gyslaine Menezes da Silveira

Elaboração do Projeto 2013

Lislaine Teixeira

Ozana Larock de Carvalho

Mirian Marth

Shirley Alzeman

Hevelin Leão

Mauro Cabral

Angela M. Pontes

Eliane Rodrigues

Adelaide Nunes

Deborah Baros

Ana Carolina Cruz

Maria Fátima Dias

Aline de Oliveira

Jair Alves

Kelli Cristina

Dilan Hugo

Glenda Souza

Cristiane Passos

Daniela B. Vital

Vanessa Oliva

Agnaldo Paulino

Johnny Mattos

Ricardo Agra

Airton S. Dias

Renata Paniagua

Márcia Andrea Pereira

Edineia Campos

Natalício Souza

Álvaro Gomes

Karilene Correa

Silvana Blanco

Lilian Herrera

Flávia Martins

Izanir Barolos

Andreia Abreu

Ana Maria Soares

Janis Costa

Uliana Santos

Letícia Oliveira

Terezinha Lange

Gabriella Menezes

Jéssica Fingler

Neide Calado

Maria Aparecida de Souza

Janaina Rodrigues

Erika Costa

Rosanne Kasai

Gyslaine Menezes

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COLETÂNEA

DE

TEXTOS

Clarice Lispector

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Das Vantagens de Ser Bobo

O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O

bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por

que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair

por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a ideia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão

sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os

vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O

bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um

desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o

aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco.

Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado

um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto

seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser

bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não

dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O

bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de

quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo

a célebre frase: "Até tu, Brutus?"

Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse

sido esperto não teria morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo

é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não

conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os

bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém

desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro,

com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem

por não nascer em Minas!

Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase

impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de

excesso de amor. E só o amor faz o bobo.

Clarice Lispector

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"Leia o texto abaixo e depois leia de baixo para cima"

Não te amo mais.

Estarei mentindo dizendo que

Ainda te quero como sempre quis.

Tenho certeza que

Nada foi em vão.

Sinto dentro de mim que

Você não significa nada.

Não poderia dizer jamais que

Alimento um grande amor.

Sinto cada vez mais que

Já te esqueci!

E jamais usarei a frase

EU TE AMO!

Sinto, mas tenho que dizer a verdade

É tarde demais...

Clarice Lispector

O sonho

Sonhe com aquilo que você quer ser,

porque você possui apenas uma vida

e nela só se tem uma chance

de fazer aquilo que quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.

Dificuldades para fazê-la forte.

Tristeza para fazê-la humana.

E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas.

Elas sabem fazer o melhor das oportunidades

que aparecem em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.

Para aqueles que se machucam

Para aqueles que buscam e tentam sempre.

E para aqueles que reconhecem

a importância das pessoas que passaram por suas vidas.

Clarice Lispector

Page 11: Ortografando

Há momentos na vida em que sentimos tanto

a falta de alguém que o que mais queremos

é tirar esta pessoa de nossos sonhos

e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.

Seja o que você quer ser,

porque você possui apenas uma vida

e nela só se tem uma chance

de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.

Dificuldades para fazê-la forte.

Tristeza para fazê-la humana.

E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes

não têm as melhores coisas.

Elas sabem fazer o melhor

das oportunidades que aparecem

em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.

Para aqueles que se machucam.

Para aqueles que buscam e tentam sempre.

E para aqueles que reconhecem

a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante

é baseado num passado intensamente vivido.

Você só terá sucesso na vida

quando perdoar os erros

e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar

duram uma eternidade.

A vida não é de se brincar

porque um belo dia se morre.

Clarice Lispector

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Sou os brinquedos que brinquei, as gírias que usei, os nervosos e felicidades que já

passei. Sou minha praia preferida, Garopaba, Maresias, Ipanema, sou os amores que

vivi, as conversas sérias que tive com meu pai: Eu sou o que me faz lembrar!!!

Sou a saudade que sinto, sou um sonho desfeito ao acaso, sou a infância que vivi, sou a

dor de não ter dado certo, sou o sorriso por tudo que conquistei, sou a emoção de um

trecho de livro, da cena de filme que me arrancou lágrimas: Eu sou o que me faz

chorar!!!

Sou a raiva de não ter alcançado, sou a impotência diante das injustiças que não posso

mudar, sou o desprezo pelo que os outros mentem, sou o desapontamento com o

governo, o ódio que isso tudo dá. Sou o que eu remo, sou o que eu não desisto, sou o

que eu luto, sou a indignação com o lixo jogado do carro, a ardência da revolta ao ver

um animal abandonado: Eu sou o que me corrói!!!

Eu sou o que eu luto, o que consigo gerar através de minhas verdades, sou os direitos

que tenho e os deveres a que me obrigo, sou a estrada por onde corro, sou o que ensino

e, sobretudo, o que aprendo: Eu sou o que eu pleiteio!!!

Eu não sou da forma como me visto, não sou da forma como me comporto, não sou o

que eu como, muito menos o que eu bebo. Não sou o que aparento ser:

EU SOU O QUE NINGUÉM VÊ!!!

Clarice lispector

Me definir é muito difícil.Às vezes pareço comum,às vezes singular.Sou bem

assim:metamorfose ambulante.Adolescente em crise.Crises.De tudo o que você

imaginar.O que mais valorizo no mundo?amigos.Os melhor sentimento?Felicidade.O

melhor verbo?amar.Conheço uma parte de uma frase,não sei o autor,mas ela define bem

quem sou:viver é tentar ser feliz.É o que faço:vivo.E sim,me considero uma pessoa

feliz,apesar de tudo.Depois de uma queda?Levanto e sigo em frente.Já desisti de contar

os mil e um foras que dou.Vivo em busca de muitas coisa,mas já possuo a principal

delas:a alegria.Uma companhia?Livros.Algo que te alegra?De novo os preciosíssimos

amigos.

Bom,termino as ridicularidades desta minha descrição breguíssima com uma pergunta

minha,e uma resposta fantástica,que se encaixa perfeitamente no meu caso.

Quem sou eu?

"Eu sou uma pergunta"

Clarice Lispector

FELICIDADE CLANDESTINA

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Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados.

Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não

bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o

que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.

Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um

livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por

cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que

vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e

"saudade". Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança,

chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos

imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com

calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a

que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.

Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa.

Como casualmente, informou-me que possuía As Reinações de Narizinho, de Monteiro

Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele,

comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu

passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria. Até o dia seguinte eu me

transformei na própria esperança da alegria: eu não vivia, eu nadava devagar num mar

suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente

correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou

entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra

menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas

em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando,

que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-

me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a

minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como

sempre e não caí nenhuma vez. Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da

filha do dono de livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta

de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro

ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais

tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com meu

coração batendo. E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo

indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a

adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando

mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando

danadamente que eu sofra. Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um

dia sequer. Ás vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só

veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a

olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados. Até que um dia,

quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa,

apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina

à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa,

entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o

fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e

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com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você

nem quis ler! E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser

a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de

perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao

vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma

para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o

livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo

tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia

de querer. Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na

mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre.

Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos,

comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco

importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo. Chegando em casa, não

comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois

abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei

ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro,

achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela

coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para

mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e

pudor em mim. Eu era uma rainha delicada. s vezes sentava-me na rede, balançando-me

com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina

com um livro: era uma mulher com o seu amante.

Clarice Lispector

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Restos do Carnaval

Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha

infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de

serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja,

atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o

outro ano. E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me

tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate.

Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas.

Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em

mim. Carnaval era meu, meu.

No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil,

nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da

noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se

divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para

durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando

difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo

me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me

tornava uma menina feliz.

E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de

encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma

espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu

de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito

só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu

susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.

Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em

casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para

enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a

vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três

dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça - eu mal podia

esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem

forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu

escapava da meninice.

Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia

acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de

uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa.

Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com os quais, suponho,

pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia

tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe

lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.

Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito.

E a mãe de minha amiga - talvez atendendo a meu mudo apelo, ao meu mudo desespero

de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel - resolveu fazer para mim

também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois,

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pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu

mesma.

Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada:

minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo; embaixo da fantasia usaríamos

combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse, pelo menos estaríamos de

algum modo vestidas. A ideia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos

pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de

vergonha - mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quando ao fato de minha fantasia

só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que

sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.

Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão

melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até

de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade.

Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu

me vesti de rosa.

Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto essa

não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É

impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os

cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge - minha mãe de súbito piorou muito de

saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um

remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa - mas o rosto ainda nu não tinha a

máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil - fui correndo, correndo,

perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros

me espantava.

Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-

me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido,

sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era

mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era

uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir

êxtase, às vezes começava a ficar alegre, mas com remorso lembrava-me do estado

grave de minha mãe e de novo eu morria.

Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela, é porque tanto

precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz,

esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura,

brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos já lisos de confete: por um instante

ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos,

considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma

rosa.

in "Felicidade Clandestina" - Ed. Rocco - Rio de Janeiro, 1998

Clarice Lispector

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A Solução

Chamava-se Almira e engordara demais. Alice era a sua maior amiga. Pelo menos era o

que dizia a todos com aflição, querendo compensar com a própria veemência a falta de

amizade que a outra lhe dedicava.

Alice era pensativa e sorria sem ouvi-la, continuando a batera máquina.

À medida que a amizade de Alice não existia, a amizade de Almira mais crescia.

Alice era de rosto oval e aveludado. O nariz de Almira brilhava sempre. Havia no rosto

de Almira uma avidez que nunca lhe ocorrera disfarçar: a mesma que tinha por comida,

seu contato mais direto com o mundo.

Por que Alice tolerava Almira, ninguém entendia. Ambas eram datilógrafas e colegas, o

que não explicava. Ambas lanchavam juntas, o que não explicava. Saíam do escritório à

mesma hora e esperavam condução na mesma fila. Almira sempre pajeando Alice. Esta,

distante e sonhadora, deixando-se adorar. Alice era pequena e delicada. Almira tinha o

rosto muito largo, amarelado e brilhante: com ela o batom não durava nos lábios, ela era

das que comem o batom sem querer.

Gostei tanto do programa da Rádio Ministério da Educação, dizia Almira procurando de

algum modo agradar. Mas Alice recebia tudo como se lhe fosse devido, inclusive a

ópera do Ministério da Educação.

Só a natureza de Almira era delicada. Com todo aquele corpanzil, podia perder uma

noite de sono por ter dito uma palavra menos bem dita. E um pedaço de chocolate podia

de repente ficar-lhe amargo na boca ao pensamento de que fora injusta. O que nunca lhe

faltava era chocolate na bolsa, e sustos pelo que pudesse ter feito. Não por bondade.

Eram talvez nervos frouxos num corpo frouxo.Na manhã do dia em que aconteceu,

Almira saiu para o trabalho correndo, ainda mastigando um pedaço de pão. Quando

chegou ao escritório, olhou para a mesa de Alice e não a viu. Uma hora depois esta

aparecia de olhos vermelhos. Não quis explicar nem respondeu às perguntas nervosas de

Almira. Almira quase chorava sobre a máquina.

Afinal, na hora do almoço, implorou a Alice que aceitasse almoçarem juntas, ela

pagaria.

Foi exatamente durante o almoço que se deu o fato.

Almira continuava a querer saber por que Alice viera atrasada e de olhos vermelhos.

Abatida, Alice mal respondia. Almira comia com avidez e insistia com os olhos cheios

de lágrimas.

— Sua gorda! disse Alice de repente, branca de raiva. Você não pode me deixarem

paz?!Almira engasgou-se com a comida, quis falar, começou a gaguejar. Dos lábios

macios de Alice haviam saído palavras que não conseguiam descer com a comida pela

garganta de Almira G. de Almeida.

— Você é uma chata e uma intrometida, rebentou de novo Alice. Quer saber o que

houve, não é? Pois vou lhe contar, sua chata: é que Zequinha foi embora para Porto

Alegre e não vai mais voltar! Agora está contente, sua gorda?

Na verdade Almira parecia ter engordado mais nos últimos momentos, e com comida

ainda parada na boca.

Foi então que Almira começou a despertar. E, como se fosse uma magra, pegou o garfo

e enfiou-o no pescoço de Alice. O restaurante, ao que se disse no jornal, levantou-se

como uma só pessoa. Mas a gorda, mesmo depois de feito o gesto, continuou sentada

olhando para o chão, sem ao menos olhar o sangue da outra.

Alice foi ao Pronto-Socorro, de onde saiu com curativos e os olhos ainda arregalados de

espanto. Almira foi presa em flagrante.

Page 18: Ortografando

Algumas pessoas observadoras disseram que naquela amizade bem que havia

dente de coelho. Outras, amigas da família, contaram que a avó de Almira, dona

Altamiranda, fora mulher muito esquisita. Ninguém se lembrou de que os elefantes, de

acordo com os estudiosos do assunto, são criaturas extremamente sensíveis, mesmo nas

grossas patas.

Na prisão Almira comportou-se com docilidade e alegria, talvez melancólica, mas

alegria mesmo. Fazia graças para as companheiras. Finalmente tinha companheiras.

Ficou encarregada da roupa suja, e dava-se muito bem com as guardiãs, que vez por

outra lhe arranjavam uma barra de chocolate. Exatamente como para um elefante no

circo.

Clarice Lispector

Page 19: Ortografando

"Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é possível fazer sentido.

Eu não: quero é uma verdade inventada".

"Renda-se como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece, como eu mergulhei.

Pergunte, sem querer a resposta, como estou perguntando. Não se preocupe em

"entender". Viver ultrapassa todo o entendimento."

"Escrevo porque encontro nisso um prazer que não consigo traduzir. Não sou

pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta a minha alma falando e cantando, às

vezes chorando"...

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em

nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está

querendo desabrochar de um modo ou de outro..."

"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que

sustenta nosso edifício inteiro".

"Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca

dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma

saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não

se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros."

"Eu sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo. (...) Sou

caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui

caleidoscopicamente registro.Sou um coração batendo no mundo."

"Aceitar-me plenamente? É violentar minha vida. Cada mudança, cada projeto novo

causa espanto:meu coração está espantado. É por isso que toda minha palavra tem um

coração onde circula sangue" (Um sopro de vida)

"...Respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim

em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de

viver."

..."Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige.

Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si

mesma."

"A harmonia secreta da desarmonia. Quero não o que está feito mas o que

tortuosamente ainda se faz."

..."Que minha solidão me sirva de companhia.

que eu tenha a coragem de me enfrentar.

que eu saiba ficar com o nada

e mesmo assim me sentir

como se estivesse plena de tudo."

Page 20: Ortografando

"...há impossibilidade de ser além do que se é -

no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio,

sou mais do que eu, quase normalmente -

tenho um corpo e tudo que eu fizer é continuação

de meu começo......

a única verdade é que vivo.

Sinceramente, eu vivo.

Quem sou?

Bem, isso já é demais..."

"E se me achar esquisita,

respeite também.

até eu fui obrigada a me respeitar".

"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas as vezes a

saudade é tão profunda que a presença é pouco: Quer-se absorve a outra pessoa toda.

Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais

urgentes que se tem na vida."

"É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é

capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo." (Das Vantagens de Ser Bobo)

"Chegando em casa não comecei a ler.

Fingia que não o tinha,

só para depois ter o susto de o ter.

Não era mais uma menina com um livro:

era uma mulher com seu amante."

"...

Se uma pessoa perguntar durante meia hora "eu", essa pessoa se esquece quem é. Outras

podem enlouquecer. É mais seguro não fazer jamais perguntas - porque nunca se atinge

o âmago de uma resposta. E porque a resposta traz em si outra pergunta."

"Que ninguém se engane: só se consegue a simplicidade através de muito trabalho."

"Não se pode falar de silêncio como se fala de neve. Não se pode dizer a ninguém como

se diria da neve: Sentiu o silêncio desta noite? Quem ouviu não diz."

"Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar

em contato...

Ou toca, ou não toca".

"O que é um espelho?

é o único material inventado que é natural.

Quem olha um espelho, quem consegue vê-lo sem se ver,

quem entende que a sua profundidade consiste em ele ser vazio

......esse alguém percebeu o seu mistério de coisa."

Page 21: Ortografando

"Sou uma filha da natureza:

quero pegar, sentir, tocar, ser.

E tudo isso já faz parte de um todo,

de um mistério.

Sou uma só... Sou um ser.

E deixo que você seja. Isso lhe assusta?

Creio que sim. Mas vale a pena.

Mesmo que doa. Dói só no começo."

" Não sei separar os fatos de mim,

e daí a dificuldade de qualquer precisão,

quando penso no passado."

"Estava permanentemente ocupada em querer e não querer ser o que eu era, não me

decidia por qual de mim, toda é que não podia ser; ter nascido era cheio de erros a

corrigir. Só tinha tempo de crescer. O que eu fazia para todos os lados, com uma falta de

graça que mais parecia o resultado de um erro de cálculo. Na minha pressa eu crescia

sem saber pra onde."

"Pois logo a mim, tão cheia de garras e sonhos,

coubera arrancar de seu coração a flecha farpada.

De chofre explicava-se para que eu nascera com mão dura,

e para que eu nascera sem nojo da dor.

Para que te servem essas unhas longas?

Para te arranhar de morte

e para arrancar os teus espinhos mortais,

responde o lobo do homem.

Para que te serve essa cruel boca de fome?

Para te morder e para soprar a fim

de que eu não te doa demais, meu amor,

já que tenho que te doer,

eu sou o lobo inevitável pois a vida me foi dada.

Para que te servem essas mãos que ardem e prendem?

Para ficarmos de mãos dadas

pois preciso tanto, tanto, tanto -

uivaram os lobos e olharam intimidados

as próprias garras antes de se aconchegarem

um no outro para amar e dormir. "

" Mas nem sempre é necessário tornar-se forte.

Temos que respeitar nossas fraquezas.

Então, são lágrimas suaves, de uma tristeza

legítima à qual temos direito.

Elas correm devagar e quando passam pelos

lábios sente-se aquele gosto pouco salgado,

produto de nossa DOR mais profunda.

Page 22: Ortografando

"Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão

mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige.

E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá

remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece..."

"Inútil querer me classificar,eu simplesmente escapulo não deixando. Gênero não me

pega mais."

"Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível,

é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador."

"Tão secreta é a verdadeira vida, que nem a mim, que morro dela, me pode ser confiada

a senha, morro sem saber de quê. E o segredo é tal que, somente se a missão

chegar a se cumprir é que, por um relance, percebo que nasci incumbida

- toda vida é uma missão secreta."

" Só se sente nos ouvidos

o próprio coração....

...Pois nós não fomos feitos

senão para o pequeno silêncio."

"Sou o que quero ser, porque possuo apenas uma vida e nela

só tenho uma chance de fazer o que quero.

Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce

dificuldades para fazê-la forte,

Tristeza para fazê-la humana e

esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas

elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos"

"Há um silêncio dentro de mim. E esse silêncio tem sido a fonte de minhas palavras."

" Não posso perder um minuto do tempo

que faz minha vida.

Amar os outros é a única salvação

individual que conheço :

ninguém estará perdido se der amor e

às vezes receber amor em troca."

" Escuta:eu te deixo ser. Deixa-me ser,então."

"Tenho várias caras. Uma é quase bonita, outra é quase feia. Sou um o quê? Um quase

tudo".

" Tudo tem que ser bem de leve para

eu não me assustar e não assustar os

que amo.

Pedem-me pouco, pedem-me quase nada.

Page 23: Ortografando

O terrível é que eu tenho muito para dar

e tenho que engolir esse muito e ainda

por cima dizer com delicadeza : obrigada

por receberem de mim um pouquinho de mim."

" Os espertos ganham dos outros , em compensação os bobos ganham a vida. "

"Fico com medo. Mas o coração bate.

O amor inexplicável faz o coração

bater mais depressa.

A garantia única é que eu nasci.

Tu és uma forma de ser eu,

e eu uma forma de te ser:

Eis os limites de minha possibilidade."

"Sou como você me vê

Posso ser leve como uma brisa,

ou forte como uma ventania,

depende de quando, e como você me vê passar" !

Clarice Lispector

Me entristeceu um pouco você não gostar do título "O Lustre".

Exatamente pelo que você não gostou,

pela pobreza dele, é que eu gosto.

Nunca consegui mesmo convencer você de que eu sou pobre...

Infelizmente, quanto mais pobre, com mais enfeites me enfeito.

No dia em que eu conseguir uma forma tão pobre como eu o sou por dentro,

em vez de carta,

você receberá uma caixinha cheia de pó de Clarice.

Eu escrevo simples.

Eu não enfeito.

Clarice Lispector