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Inhumas, ano 4, n. 15, jan. 2016

ISSN 2316-8102

ARTE CARNAL

Orlan

Orlan representada na ilustração da artista Veridiana Scarpelli

para a décima quinta edição da eRevista Performatus

performatus.net

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Definição

A Arte Carnal é um trabalho de autorretrato no sentido clássico, mas que

utiliza meios tecnológicos atuais. Ela oscila entre desfiguração e refiguração.

Sua inscrição na carne deve-se às novas possibilidades que nossa época começa

a oferecer. O corpo torna-se um “ready-made modificado”, já que ele não é mais

este ready-made ideal em que basta pôr uma assinatura.

Distinção

Diferente da Body Art, a Arte Carnal não deseja a dor, não a busca como

fonte de purificação, não a concebe como Redenção. A Arte Carnal não está

interessada no resultado plástico final, mas na operação-cirúrgico-performance

e no corpo modificado, que se tornou objeto de debate público.

Ateísmo

Acima de tudo, a Arte Carnal não é herdeira da tradição cristã, contra a

qual ela luta! Ela revela a negação cristã do “corpo-prazer” e expõe suas falhas

frente às descobertas científicas.

A Arte Carnal não é tampouco herdeira de alguma hagiografia permeada

de decapitações e de outros martírios; ela acrescenta ao invés de remover,

aumenta as faculdades ao invés de reduzi-las. A Arte Carnal não pretende ser

automutilação.

A Arte Carnal transforma o corpo em linguagem e inverte o princípio

cristão do verbo feito carne em favor da carne feita verbo; apenas a voz de Orlan

permanecerá inalterada, a artista trabalha com a representação.

A Arte Carnal considera anacrônico e ridículo o famoso “em dor darás à

luz”. Como Artaud, ela rejeita o julgamento de Deus; temos hoje em dia a

epidural e várias outras anestesias e analgésicos. Viva a morfina! Abaixo a dor!

Percepção

A partir de agora posso observar meu próprio corpo aberto sem sofrer!...

Posso observar-me até às entranhas: novo estágio do espelho. “Eu posso ver o

coração do meu amante, e o seu design esplêndido não tem nada a ver com a

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insipidez simbólica habitualmente desenhada.”

– Querida, eu amo o teu baço, amo o teu fígado, adoro o teu pâncreas, e a

linha do teu fêmur me excita.

Liberdade

A Arte Carnal afirma a liberdade individual do artista e, nesse sentido,

ela também luta contra os preconceitos e ditames; é por essa razão que ela se

insere no social, na mídia (onde causa escândalo por desafiar as ideias

estabelecidas) e irá até mesmo ao tribunal.

Esclarecimento

A Arte Carnal não é contra a cirurgia estética, mas contra as

padronizações que ela promove e que se gravam particularmente na carne

feminina, mas também na masculina. A Arte Carnal é necessariamente

feminista. A Arte Carnal interessa-se tanto pela cirurgia estética como também

pelas técnicas mais avançadas da medicina e da biologia que questionam o

estatuto do corpo e levantam problemas éticos.

Estilo

A Arte Carnal ama o barroco e a paródia, o grotesco e os estilos

desprezados, pois a Arte Carnal opõe-se às pressões sociais exercidas seja sobre

o corpo humano, seja sobre o corpo das obras de arte.

A Arte Carnal é antiformalista e anticonformista.

PARA CITAR ESTE TEXTO

ORLAN. “Arte Carnal”. eRevista Performatus, Inhumas, ano 4, n. 15, jan.

2016. ISSN: 2316-8102.

Tradução do francês para o português de Fernando L. Costa

Revisão ortográfica de Marcio Honorio de Godoy

© 2016 eRevista Performatus e autora