Organizacao Escolar 1207

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  • 6 PerodoOrganizao Escolar

    Ana Maria Borges de Sousa Terezinha Maria Cardoso

    Roseli Zen Cerny

    Florianpolis, 2013.

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  • Governo Federal

    Presidente da Repblica: Dilma Vana Rousseff Ministro de Educao: Aloizio MercadanteUniversidade Aberta do Brasil (UAB)

    Universidade Federal de Santa Catarina

    Reitora: Roselane NeckelVice-reitora: Lcia Helena Martins PachecoPr-reitora de Ensino de Graduao: Roselane Ftima CamposPr-reitora de Ps-Graduao: Joana Maria PedroPr-reitor de Pesquisa: Jamil AssreuyPr-reitor de Extenso: Edison da RosaPr-reitor de Planejamento e Oramento: Beatriz Augusto de Paiva Pr-reitor de Administrao: Antnio Carlos Montezuma BritoPr-reitora de Assuntos Estudantis: Lauro Francisco Mattei Diretor do Centro de Comunicao e Expresso: Felcio Wessling MargottiDiretor do Centro de Cincias da Educao: Nestor Manoel Habkost

    Curso de Licenciatura em Letras-Espanhol na Modalidade a DistnciaDiretor Unidade de Ensino: Felcio Wessling MargottiChefe do Departamento: Silvana de GaspariCoordenadoras de Curso: Vera Regina de Aquino Vieira Maria Jos Damiani Costa Coordenadora de Tutoria: Raquel Carolina Souza Ferraz DEly

    Projeto Grfico

    Coordenao: Luiz Salomo Ribas GomezEquipe: Gabriela Medved Vieira Pricila Cristina da SilvaAdaptao: Laura Martins Rodrigues

    Comisso Editorial

    Adriana Kuerten DellagnelloMaria Jos Damiani CostaMeta Elisabeth ZipserVera Regina de Aquino VieiraLiliana Reales

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  • Equipe de Desenvolvimento de Materiais

    1 edio (2008)

    Laboratrio de Novas Tecnologias - LANTEC/CED

    Coordenao Geral: Andrea LapaCoordenao Pedaggica: Roseli Zen CernyCoordenao Material Impresso e Hipermdia: Thiago Rocha Oliveira, Laura Martins RodriguesDiagramao: Ana Flvia Maestri, Gabriel NietscheIlustraes: Maiara Ario, Gustavo Apocalypse, Rafael Naravan Kienen, Tarik AssisReviso gramatical: Arlindo Rodrigues da SilvaCoordenao de Design Instrucional: Vanessa Gonzaga NunesDesign Instrucional: Luiziane Silva Rosa

    2 edio (2011)

    Laboratrio Multimdia/CCE - Material Impresso e Hipermdia

    Coordenao: Ane GirondiDiagramao: Letcia Beatriz Folster, Grasiele Fernandes HoffmannSuperviso do AVEA: Mara Tonelli SantosDesign Instrucional: Paula Balbis GarciaReviso: Rosangela Santos de SouzaIlustrao: Lucas de Abreu

    Copyright@2013, Universidade Federal de Santa Catarina/LLE/CCE/UFSC. Nenhuma parte deste material poder ser comercializada, reproduzida, transmitida e gravada sem a prvia autoriza-o, por escrito, da Universidade Federal de Santa Catarina.

    Ficha catalogrfica

    S725s Sousa, Ana Maria Borges de 6. perodo : organizao escolar / Ana Maria Borges de Sousa, Terezinha Maria Cardoso, Roseli Zen Cerny. 2. ed. - Florianpolis : UFSC/CCE/DLLE, 2013. 192 p. : il., grfs, tabs.

    ISBN: 978-85-61483-29-6

    1. Lngua espanhola Estudo e ensino. I. Cardoso, Terezinha Maria. II. Cerny, Roseli Zen. III. Ttulo. IV. Sexto perodo.

    CDU: 806.0

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  • Sumrio

    Unidade A - Escola e Cultura ....................... 13

    1 Gesto da escola .............................................................151.1 Gesto X Administrao ...................................................................151.2 Por uma gesto democrtica ..........................................................181.4 A Gesto da Escola Pedaggica e Administrativa ................221.5 Por uma Gesto do Cuidado na Escola ........................................24Resumo .............................................................................................. 26

    2 Para que escola? ............................................................292.1 Cultura Escolar e Cultura da Escola ...............................................292. 2 Um pouco da histria... ...................................................................322.3 A Escola no Brasil .................................................................................342.4 LDBEN n 9.394/96 .............................................................................402.5 Aspectos inovadores da nova LDBEN .........................................402.6 Desdobramento e complementaes da LDBEN ...................412.7 O lugar da arquitetura na cultura escolar e na cultura da escola .............................................................................................................42Resumo .............................................................................................. 47

    3 Significaes sociais da escola ......................................493.1 Viso funcionalista da escola .........................................................503.2 Viso Estruturalista ou burocrtica da escola ...........................503.3 Viso reprodutivista da escola .......................................................513.4 A escola como um lugar de resistncia ......................................533.5 A escola como um espao sociocultural ...................................54Resumo .............................................................................................. 56

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  • Unidade B - Sujeitos e Contextos ............... 59

    4 Educao e complexidade ............................................614.1 Educao e Complexidade na Escolarizao ...........................654.2 Saberes Indispensveis para uma Educao Complexa ......69Resumo ............................................................................................. 76

    5 Educao e Diversidade ...............................................795.1 O que podemos nomear como diversidade? ...........................805.2 Educao, escola e diversidades ...................................................835.3 Conviver nas e com as diversidades: um aprendizado essencial .......................................................................................................86Resumo ............................................................................................. 88

    6 Educao do campo ......................................................896.1 Da Escola Rural Escola do Campo .............................................916.2 Desafios e perspectivas para a escola do campo ...................96Resumo .............................................................................................. 98

    7 Os sujeitos que produzem o cotidiano da escola ........997.1 Os educadores .....................................................................................997.2 Os educandos ...................................................................................1137.3 A equipe administrativa e pedaggica ...................................1177.4 Arranjos familiares ..........................................................................1217.5 Prerrogativas de um grupo de convivncia: os sujeitos da escola ..........................................................................................................124Resumo ........................................................................................... 128

    Dica de leitura .................................................................129

    Unidade C - Cotidiano .................................131

    8 Tempos e espaos na organizao escolar ..................1338.1 Os Espaos/Tempos do Cotidiano Escolar .............................1348.2 Festas, Comemoraes: suspenso da rotina nas escolas 144

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  • Resumo ............................................................................................ 146

    9 Currculo e avaliao .................................................1479.1 A propsito da avaliao ...............................................................1479.2 Por uma avaliao formativa ........................................................1509.3 O currculo ..........................................................................................1579.4 Avaliao e Currculo: o cotidiano em ao ............................160Resumo ............................................................................................ 163

    10 O projeto poltico-pedaggico como articulador da organizao escolar .......................................................165

    10.1 A gesto do cuidado na construo do projeto poltico-pedaggico ..............................................................................................16610.2 O Projeto, o Poltico e o Pedaggico: uma trade indissocivel .............................................................................................17010.3 Enfoques indispensveis do projeto poltico-pedaggico ...17110.4 Demandas inseparveis dos pressupostos terico-metodolgicos do PPP .........................................................................17310.5 A Organizao do processo ......................................................17510.6 Reflexes das prticas cotidianas na elaborao do projeto poltico-pedaggico .............................................................................178Resumo ........................................................................................... 181

    Referncias ......................................................................183

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  • ApresentaoCaros educadores em formao,

    A memria sociocultural que guardamos da escola e da sua organizao

    faz distintas referncias sobre a sua importncia na formao de um povo

    e na construo de uma nao. Essas referncias so constitudas, por um

    lado, de certas concepes e prticas das quais podemos nos orgulhar

    como educadores em formao, mas, por outro, de concepes e prticas

    das quais preferiramos no lembrar, porque trazem consigo inmeras

    experincias de desqualificao dos sujeitos e dos aspectos pedaggicos

    que do sentido e significado existncia da escola.

    Como ressalta Luis Carlos Restrepo, no seu livro O Direito Ternura (1998),

    aprendemos que a afetividade e a ternura, por exemplo, no podem adentrar

    o palcio do conhecimento porque so dimenses sem importncia para

    a formao humana. Essa aprendizagem est vinculada formao dos

    professores que foram, e ainda so, ensinados a atuar como autnticos

    marechais de campo, seja no momento de enunciar sua verdade ou quando

    se apresentam a qualificar a aprendizagem. (p. 14). Desde as primeiras fases

    escolares, esses professores reproduzem, no processo de aprendizagem

    das crianas, saberes de guerra que buscam, de modo incansvel, acessar o

    conhecimento com neutralidade e sem emoes, porque acreditam que

    necessrio um domnio absoluto sobre o objeto de conhecimento para que

    este possa ser considerado cientfico.

    Orientados por esse modelo de conhecimento, os professores aprenderam a

    estudar as diversas formas de vida atravs da vivisseco e do dissecamento de

    animais. Ou seja, toda a interao com a vida que nos rodeia passa pela sua

    destruio, como se a nica coisa dos outros da qual pudssemos nos apropriar

    fosse seu cadver. (p. 14). Essa cincia, que constituiu a nossa formao

    como professores, em geral, privilegiou esquemas alienados da dinmica

    vital e, com isso, nos fez acreditar que s possvel o conhecimento do outro

    decompondo-o, uma vez detido o movimento, metodologia que aplicamos

    diariamente tanto na pesquisa biolgica, fsica, como na social, estendendo-a,

    alm disso, vida afetiva e nossa relao com os outros. (p. 14). Isso evidencia

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  • nosso equvoco como civilizao, convencidos de que a ausncia da ternura

    nas relaes educativas garantia para a gerao de conhecimentos objetivos.

    Neste modelo epistemolgico, permaneceu ausente a afetividade simultnea

    nas relaes interpessoais, porque este lugar foi ocupado pelo que Restrepo

    chamou de afetividade plana e definida do guerreiro, a qual prepara as pessoas

    para que sejam subordinadas a domnios homogeneizadores e a enunciados

    abstratos, que reduzem a multiplicidade da vida.

    Nesse sentido, as verdades blicas ocuparam os lugares das verdades da ternura.

    Inspirado em Habermas, o autor lembra que o conhecimento um corpo de

    prticas e enunciados transpassados por uma diversidade de interesses que

    vo desde o af de domnio instrumental, at o fomento da emancipao e

    da liberdade. (p. 15). Constitudo tambm por ausncias, esse modelo de

    escola deixou de reconhecer a importncia das experincias emocionais na

    modulao dos processos de aprendizagem e, por isso, no tornou possvel

    compreender a aventura pedaggica como uma busca ininterrupta e afetiva

    de figuras de conhecimento e no s de um universo intelectual.

    A arquitetura escolar, de algum modo, acompanhou esse modelo

    epistemolgico e construiu espaos fsicos cuja organizao se apresenta

    fragmentada, inspirada que foi no modelo panptico da vigilncia e do

    controle. A ausncia da esttica, do belo, do aconchego, do cuidado nas

    relaes, a hierarquizao das prticas de mando e obedincia, os jogos

    de cumplicidade, os individualismos exacerbados so algumas amostras do

    endurecimento da escola e dos saberes ali ensinados.

    Paradoxalmente, essa mesma escola contribuiu de modo decisivo para

    o avano das cincias e das tecnologias, que possibilitaram a criao de

    artefatos para tornar a vida social mais dinmica. Esses artefatos ajudaram

    a curar enfermidades, a partir da descoberta de novos medicamentos;

    favoreceram as comunicaes a distncia com os sistemas de informao;

    socializaram os imaginrios coletivos, especialmente, atravs do mundo

    miditico; promoveram o acesso ao belo, ao esttico; estimularam as

    insurgncias e resistncias; proporcionaram a participao nas leituras de

    mundos, ainda que distantes das realidades locais.

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  • Essa experincia mostra que a educao e a escola so lugares sociais

    onde processos de morte se encontram, ainda que conflituosamente, com

    experincias de expanso da vida. Nesse sentido, no possvel falar de

    uma e de outra no singular. Elas so a mais viva expresso da diversidade

    que constitui a vida em todas as suas manifestaes, portanto, so sempre

    e em qualquer contexto, ethos de mltiplas possibilidades. A organizao

    que escola e educao encarnam constituda deste paradoxo. Ou seja,

    h movimento indissocivel entre ordem-desordem-e-nova-organizao,

    que se nutre de um caos criativo em que as transgresses e as sujeies

    ensinam tanto a liberdade quanto o aprisionamento a padres e condutas.

    Nesse continuum, forjam-se identidades sociais balizadas por rigidez e por

    gestos de ternura e acolhimento.

    Conscientes disso, trazemos um olhar poltico-pedaggico que privilegia

    esses paradoxos. Apresentamos, ento, uma compreenso de escola que

    capaz de produzir cultura tanto quanto de se banhar na cultura produzida

    pela sociedade, uma escola com singularidades, com identidade, feita de

    pessoas, sujeitos socioculturais e histricos, que carregam para o convvio

    cotidiano na escola suas experincias e vivncias, sejam elas sacrificiais

    ou aquelas s quais chamamos de erticas, ou seja, onde as relaes so

    guiadas pelo prazer do fazer junto, pela alegria do encontro, pela liberdade

    da troca e da criao, pelo tempo da escuta sensvel.

    Morin nos ensina, no livro Amor, poesia, sabedoria (1999, p. 66), que as grandes

    linhas da sabedoria se encontram na vontade de assumir as dialgicas humanas,

    de sapiens-demens, de prosa-poesia, afinal, a vida um tecido mesclado

    ou alternativo de prosa e de poesia, onde as atividades prticas, as tcnicas,

    do feio prosa, j que a poesia o que nos insere num estado segundo:

    primeiramente, a poesia em si mesma, depois a msica, a dana, o gozo e,

    claro, o amor. A poesia a esttica da vida ou a vida mesma com suas poesias,

    na qual a sabedoria vai sendo incorporada por meio dos ritos de celebraes,

    do trabalho coletivo, das cerimnias de meditao e de adorao aos quatro

    elementos que formam a matria primordial: o ar, a gua, o fogo e a terra.

    Desse modo, pensamos uma organizao escolar que reconhece a educao

    numa base epistemolgica que vamos denominar biocntrica. Nela, a vida

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  • contm e est contida no movimento do cosmos e cada unidade parte e todo

    de uma mesma dinmica que se interliga, se complementa e se desorganiza

    para se reorganizar, num processo contnuo de interaes. A escola nosso

    exemplo dessa compreenso: parte da sociedade, que parte do planeta,

    que parte do universo. Em unidade constituem uma abrangncia relacional

    onde a explicao de um se faz na e pela vinculao com o outro.

    O estar e o reconhecer com o outro, o aceitar a sua legitimidade, o

    fundamento tico que vai transversalizar cada uma das explicaes

    que construmos sobre os aspectos da organizao escolar e seus

    desdobramentos didtico-pedaggicos. Nossa inteno que a organizao

    da escola se d atravs de prticas e que estas afirmem as identidades de

    todos os sujeitos como unidades csmicas que trazem consigo a capacidade

    de valorizar o sagrado que est contido na vida, promovendo o contato

    amoroso de estima entre os diferentes segmentos da comunidade escolar,

    aquele que nutre e preserva a nossa humanidade. Nosso desejo que a

    organizao escolar forje espaos-tempos para os encontros e sentimentos

    profundos de pertencimento que podem despertar nas pessoas o SER na

    presena do outro, o reconhecer o outro como um SI mesmo, referenciados

    no direito vida em sua mais ampla acepo.

    essa compreenso de educao, de escola e de organizao escolar que

    queremos compartilhar, de forma crtica e criativa, com vocs. Acreditamos

    que suas experincias e memrias escolares possam se somar s reflexes

    que fomos capazes de elaborar, num esforo conjunto de juntar nossas

    singularidades, nossos estilos de escrita, nossos dissensos e consensos,

    como pessoas e como pesquisadoras responsveis pela criao artesanal

    deste caderno.

    Recebam o nosso abrao afetivo,

    As autoras

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  • Unidade AEscola e Cultura

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  • Gesto da escola

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    Captulo 01

    1 Gesto da escola

    Nosso objetivo neste captulo ser discutir a gesto da escola, compreen-dendo os aspectos envolvidos nesta atividade. Aprofundaremos essa dis-cusso com a perspectiva da gesto democrtica e da gesto do cuidado.

    1.1 Gesto X Administrao

    Quando falamos em gesto, facilmente relacionamos esse termo administrao. Mas h distino no uso de um termo ou de outro? O termo gesto educacional tem sido utilizado por alguns estudiosos como sinnimo de administrao escolar; outros autores fazem uma clara distino entre os termos gesto e administrao (BORDIGNON; GRACINDO, 2000). Essa diferena de concepo est aliada ao entendimento que se d ao termo gesto. Se gesto for compreendida como processo poltico administrativo, necessrio abord-lo a partir dos conceitos de gesto dos sistemas educacionais. A concepo de gesto educacional supera e relativiza o conceito de administrao escolar, embora no o despreze, porque a administrao constitui uma das dimenses da gesto escolar. Almeida nos auxilia a refletir sobre o significado de gesto ao considerar que

    [...] mais abrangente, democrtico e transformador, percebe a escola

    como um espao de conflitos, de relaes interpessoais, de emergncia

    e de alternncia de lideranas, de negociaes entre interesses coletivos

    e projetos pessoais, em busca de consensos provisrios sobre suas

    necessidades, desejos e utopias, identificados na construo do projeto

    da escola. (2006, p. 103).

    Ao adotarmos a perspectiva da gesto educacional, partimos da premissa de que os sistemas educacionais, independentemente do nvel ou da modalidade de educao que discutam, diferenciam-se de outras instituies em vrios aspectos, em especial, na particularidade

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  • Organizao Escolar

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    do trabalho pedaggico. Tais sistemas distanciam-se em muito de organizaes empresariais e, por esse motivo, as instituies educacionais no podem ser compreendidas e estudadas somente a partir de teorias advindas da administrao de empresas. Visto sob este ngulo, o sistema de educao uma organizao na qual o aluno entendido como cliente, os docentes so considerados fornecedores: as instituies educacionais funcionariam, portanto, como empresas. Nesta perspectiva, adota-se a postura gerencialista: cobranas para o aumento de produtividade, a massificao dos profissionais que atuam na escola, a falta de dilogo e de um processo decisrio compartilhado. A posio por ns assumida contraria a perspectiva gerencialista na educao ao entender que a escola,

    [...] uma das nicas instituies para cujo produto no existem padres

    definidos de qualidade. Isso talvez se deva extrema complexidade que

    envolve a avaliao de sua qualidade. Diferentemente de outros bens

    e servios cujo consumo se d de forma mais ou menos definida no

    tempo e no espao, podendo-se aferir imediatamente sua qualidade,

    os efeitos da educao sobre o indivduo se estendem, s vezes, por

    toda sua vida, acarretando a extenso de sua avaliao por todo esse

    perodo. por isso que, na escola, a garantia de um bom produto s se

    pode dar garantindo-se o bom processo (PARO, 1998, p. 303).

    Assim, entende-se que o trabalho pedaggico envolve o trabalho com o conhecimento e o saber, e o saber no se apresenta neste processo como algo que possa ser separado dele; ele se apresenta tambm como objeto de trabalho [...] O saber no pode ser expropriado do trabalhador sob pena de descaracterizar-se o prprio processo pedaggico. (PARO, 1996, p. 15). Trabalhar com o saber envolve atitudes generosas, envolve partilhar e compartilhar cotidianamente todas as aes e conhecimentos dela advindos.

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  • Gesto da escola

    17

    Captulo 01

    Figura 1. O trabalho pedaggico

    Concordamos, at aqui, que vamos trabalhar com o conceito de gesto, ento vamos procurar compreender como se constituem os modelos de gesto da escola. Para isso, vamos recorrer ao professor Lima (1996, p. 8) que faz uma reflexo sobre os modelos tericos propondo uma distino de trs tipos:

    a. Os modelos juridicamente consagrados: so embasados em princpios e orientaes jurdicas e expressos atravs de suportes oficiais. Modelos assim consagram os princpios e orientaes que juridicamente constituem-se referncias essenciais, na organizao e administrao do sistema escolar, sendo orientados a partir das polticas de estado ou de governo por exemplo, a LDB, os decretos e portarias. So forjados a partir da cultura da escola.

    b. Os modelos de orientao para ao: so os modelos tericos de referncia, regras concretas. Traam estruturas, do lugar a formas, permitem a ao, conferindo-lhe sentido por referncia a um quadro global mais ou menos formalizado. Esses modelos so aqueles sistematizados teoricamente. Por exemplo, quando a escola faz a opo de adotar o modelo administrativo, escolhe o terico como referncia.

    Este conceito ser discutido no captulo 2.

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  • Organizao Escolar

    18

    c. Os modelos praticados: como o prprio nome anuncia, so plurais e diversificados e correspondem s regras efetivamente praticadas no interior da instituio escolar. o que efetivamente acontece no cotidiano da escola. Esse modelo reflete a cultura escolar.

    Compreender a gesto como um modelo terico assumir o seu carter geral e potencial, no necessariamente dependentes da ao e das prticas organizacionais efetivamente realizadas, mas abrir um leque de possibilidades. Do contrrio, apenas estaria inscrito nos textos oficiais, um modelo de gesto teria uma espcie de vida vegetativa (LIMA, 1996, p. 17). O modelo a ser adotado pela escola no se furta dos modelos juridicamente consagrados, pois a instituio educativa segue parmetros legais e normativos, a exemplo das leis e decretos, nem tampouco do modelo de orientao para ao que comporta as prticas institudas.

    A partir desse entendimento, propomos como alternativa de reflexo a gesto democrtica. Nessa perspectiva, a gesto escolar s tem existncia na e pela ao dos sujeitos que produzem o cotidiano da escola e, neste sentido, encontra-se sempre em processo de criao e de recriao, em estruturao. A gesto democrtica por natureza plural, diversificada, dinmica e vinculada produo e reproduo de diferentes regras, construdas e reconstrudas por todos os sujeitos envolvidos.

    1.2 Por uma gesto democrtica

    Figura 2. Gesto democrtica

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  • Gesto da escola

    19

    Captulo 01

    Ao falarmos de gesto democrtica caracterizamos esse processo no apenas como um procedimento tcnico, mas como uma ao poltica. O professor Fernando Almeida observa que a palavra gesto um termo que se tornou to banalizado que acabamos esquecendo o seu mais importante significado. Historicamente, ela tem sido identificada com poder e controle e o gestor, em muitos casos, assemelha-se ao burocrata e controlador de procedimentos da instituio. Ao contrrio desta marca histrica, podemos retomar o sentido de gesto a partir de sua etimologia, que traz as ideias de gestar, gerir, gesto, gerar, gestao, gerenciar significa dar a vida, alimentar, proteger, fazer crescer, at o momento de dar luz. Trata-se da acepo dar vida. Assim, nesse sentido em que a boa gesto de uma escola d vida a algo novo e bom (ALMEIDA, 2005, p. 68). Para o nosso estudo, vamos adotar o conceito que compreende gesto

    [...] pela forma de se comprometer com o todo de um empreendimento:

    responsabilidade, capacidade de observao e descrio diagnstica,

    anlise e sntese, tomada de deciso - conjunta e solitria comunica-

    o, democracia, memria, identidade e utopia: articulao de pessoas

    e projetos em torno de algo chamado vida: gerar, gestar,.organizao,

    generoso ato de viver (ALMEIDA, 2005, p. 68).

    O gestor, na sua prtica, constri conhecimento, adquire novas habilidades e competncias, reconstri sua experincia e aumenta o grau de compreenso sobre a realidade em que vive, gerando novos significados. Os significados so arquitetados no dilogo com sua equipe, com sua comunidade e com o projeto de seu pas. Nesta abordagem, a concepo de gesto enfatiza a prxis humana, considerando que os sujeitos se constituem socialmente. medida que desenvolvem suas produes, os sujeitos se transformam, produzem sua realidade e so transformados por ela (ALMEIDA, 2006, p. 26).

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  • Organizao Escolar

    20

    1.3 Gesto democrtica da escola e participao

    A escola pode ser organizada de forma democrtica ou autoritria. Podemos definir uma escola democrtica como mais aberta participao da comunidade escolar. Seu contraponto a escola autoritria (gerencialista), na qual a participao no incentivada. Para compreender melhor as duas perspectivas, veja o quadro abaixo:

    CAMPOS, Roselane de F.; SCHEIBE, Leda. O trabalho do gestor na escola: dimen-ses, relaes, conflitos, formas de atuao. Disponvel em: . Acesso em: .

    Gerencialista Democrtica

    nfase na questo tcnica da gesto: supe que a eficincia sustenta-se no bom uso dos recursos tcnicos, tais como controles estatsticos, padronizaes e ranqueamento, etc.

    nfase na dimenso poltico pedaggica da gesto: baseia-se na indissociabilidade dos meios/finalidades; nesse sentido, pressupe que as tcnicas subordinam-se s dimenses poltico-pedaggicas da gesto.

    Gesto centrada na pessoa do diretor; nfase na sua liderana para mobilizar sinergias da comunidade escolar.

    Gesto centrada nos colegiados da escola: conselho de escola, grmios estudantis e outras formas de organizao.

    Gesto participativa significa a comunidade colaborando com a escola, no necessariamente deliberando sobre os seus rumos; a participao fica associada resoluo de problemas, ocorrendo de modo pontual e assistemtico.

    Gesto participativa significa, aqui, a comunidade escolar participa efetivamente da escola, discutindo e decidindo coletivamente seus rumos; a participao ocorre de forma sistemtica, por meio dos rgos colegiados ou por via direta.

    Pressupe autonomia e responsabilizao individualizada, com consequncias para professores e diretores pelos resultados do desempenho dos alunos e da escola.

    Pressupe autonomia e corresponsabilizao pelos resultados da aprendizagem dos alunos e da unidade escolar.

    Procura atingir metas de eficincia e eficcia previamente definidas em planos estratgicos, acordo, etc.

    Procura atingir a qualidade socialmente referenciada da educao; suas metas e objetivos devem expressar no apenas resultados quantitativos, mas, sobretudo, qualitativos.

    Considera a competitividade entre as escolas como o principal fator para alavancar a qualidade das mesmas; estimulam o ranqueamento das escolas, prmios por desempenho, etc.

    Considera que a qualidade da educao se conquista com medidas efetivas em prol da autonomia, da gesto democrtica, do financiamento pblico e da formao de professores.

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    Captulo 01

    Os diversos modos de compreender a escola esto relacionados ao lugar social em que os sujeitos se encontram. Nessa diversidade de con-cepes h aspectos similares, como, por exemplo, aqueles que preveem estruturas de administraes hierrquicas e burocrticas e reconhecem apenas papis predeterminados nos regimentos escolares: as vises fun-cionalista, estruturalista e mesmo aquelas fundamentadas nas teorias marxianas, como a viso reprodutivista. Os estabelecimentos escolares que tm sua filosofia pautada nessas concepes ensejam prticas au-toritrias, ainda que desejem introduzir processos de maior abertura participao. Eles tm dificuldades de reconhecer, nos seus afazeres, a legitimidade dos acordos e das negociaes firmados com diferentes segmentos escolares. A democracia, nesses casos, nomeia formas legais e institucionalizadas que funcionam como rtulo.

    Assim, uma escola pode ter na sua organizao interna tempos e espaos como a Associao de Familiares e Professores, o Conselho Escolar, o Grmio Estudantil, que indicam a participao coletiva, mas consideram a importncia da presena ativa dos sujeitos apenas nos espaos formais, cuja participao no incentivada e as deliberaes e encaminhamentos no so levados em conta nas tomadas de decises pedaggicas e administrativas da escola.

    Os processos democrticos, nos ensina Werle (2003, p. 24), no devem ser, simplesmente, um aspecto conceitual ou um direito assegurado por lei, mas sim algo que deve ser desenvolvido e construdo como prtica pela comunidade. A democracia aprendida por meio do exerccio e da vivncia de processos e espaos participativos. Nesse caso, os espaos-tempos estruturados podem no apenas figurar no organograma e/ou fazer parte da estrutura burocrtica da escola, mas antes devem ser lugares de prtica, aprendizagem e desenvolvimento de valores e conhecimentos que efetivam a formao de cidados, isto , sujeitos-polticos capazes e dispostos a participar do processo polticodemocrtico. (WERLE, 2003, p.23).

    A democracia praticada e aprendida medida que a cultura da escola proporciona espaos e tempos de aprendizagem das

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    igualdades e das diferenas, do discordar sem deslegitimar o outro por sua posio contrria. Para isso, preciso flexibilizar a tomada de decises, retardando-a caso se faa necessrio. A participao ativa tem visibilidade quando, na escola, se garante s pessoas a troca de ideias e o aprendizado de lidar com suas diferenas. Os espaos-tempos do cotidiano escolar, estruturados ou no, consolidam-se no processo mesmo onde constroem como lugar de conversa, de negociao, acordo e discusso, onde a participao deve prevalecer sobre a necessidade de decidir. (WERLE, 2003, p. 27).

    1.4 A Gesto da Escola Pedaggica e Administrativa

    Quando falamos de organizao escolar, pensamos logo em uma escola funcionando sem problemas, sem conflitos. Cada coisa em seu lugar e no seu tempo. Estudantes nas salas de aula, motivados, trabalhando nas atividades propostas pelos educadores, conversando somente sobre o trabalho e levantando a mo para pedir a palavra. Docentes nas salas, propondo atividades criativas que motivam os educandos a trabalhar, atendendo a cada um que solicita, explicando a matria tantas e quantas vezes forem necessrias. O processo de ensinar e aprender acontecendo sem percalos, sem rupturas. A escola cumprindo a sua funo de socializar o conhecimento historicamente construdo pela humanidade, formando crianas e jovens cidados capazes de participar ativa e criticamente da sociedade.

    Entretanto, a escola feita de pessoas, uma multido que convive diariamente, ou a cada turno, nos estabelecimentos de ensino. Conforme o tamanho e a localizao, as escolas trabalham concomitantemente com os diferentes nveis de ensino: Educao Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Mdio e, s vezes, Educao de Jovens e Adultos (EJA). Nesse caso, convivem pessoas em fases de desenvolvimento diferenciadas: as crianas da Educao Infantil so diferentes das crianas dos anos iniciais do Ensino Fundamental, que so diferentes dos adolescentes e jovens dos anos finais do Ensino Fundamental, que so diferentes dos jovens do Ensino Mdio,

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    Captulo 01

    que so diferentes daqueles que frequentam a EJA. Todos tm aspiraes e preocupaes diferenciadas. De outro lado, tambm esto nesse mesmo espao os adultos (professores, pedagogos, funcionrios tcnicos e de servios gerais) vivendo ciclos diferentes da profisso. H os adultos mais jovens e os adultos mais velhos, alguns cansados e outros com o vigor de quem se inicia na carreira. Todos aprendem com todos.

    Olhando a escola por esse prisma, podemos entend-la como uma microssociedade. Para viver nela preciso construir a convivncia social e afetiva capazes de pensar formas de encaminhar as decises coletivas, que podem ter fundamentos autoritrios ou democrticos.

    Se pensarmos na organizao da escola como ao administrativa, no deixaremos espao para as aprendizagens, levaremos em conta apenas o organograma, as regras de conduta, a obedincia ao nmero de dias letivos previstos na legislao, a quantidade de reunies propostas no calendrio escolar enviado pelos rgos gestores. Deixaremos de pensar nas necessidades das pessoas que compem a comunidade escolar e nas questes elencadas como prioritrias no projeto poltico-pedaggico.

    Se pensarmos no projeto poltico-pedaggico como sntese din-mica da gesto democrtica da escola, as pessoas tero prioridade sobre os procedimentos. Levar-se-o em conta suas necessidades culturais e pessoais, a pluralidade de concepes, as singularidades manifestas no processo de ensinar e aprender, as temporalidades, bem como a incor-porao de linguagens pedaggicas, crticas e motivadoras que apresen-tem referncias sobre os princpios organizativos e os critrios tico-polticos mais gerais da sociedade (ASSMAN, 2000, p. 210).

    Nessa escola, o tempo-espao da convivialidade privilegiado como uma experincia pedaggica de importante valor na forma-o de homens e mulheres solidrios. Aprende-se a participar dos dilemas e das conquistas sem que sejam exigidos resultados a priori. Nesses pressupostos, est implicada a viso que a escola tem do pro-cesso de formao para aperfeioar a hominizao e a humanizao de todos os seus integrantes.

    Figura 3. Convivncia social e

    afetiva

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    1.5 Por uma Gesto do Cuidado na Escola

    A Gesto do Cuidado entendida a partir de uma perspectiva transdisciplinar, protetiva, ecolgica, tica e esttica, que considera a vida como permanente sacralidade viva para sustentar, terica e metodologicamente, todos os processos pedaggicos. Portanto, uma modalidade de Gesto e de Cuidado que respeita as especificidades inerentes aos organismos vivos, tais como o ritmo, o mpeto, as emoes e sentimentos endgenos; que reconhece as instituies, e de maneira singular a escola, como lugar social do cuidado, para assegurar a cada criatura humana o pleno desenvolvimento e a sua integridade.

    Nesse sentido, a Gesto tem uma compreenso de polticas pblicas que no se pautam pelo estado de exceo (da falta), mas do direito, no opera na lgica do dever-ser, que em geral, despossui a populao infanto-juvenil de seu reconhecimento como legtimo ser-no-mundo (Maffesoli, 1996). uma Gesto que acontece como poltica de afetos, particularmente, porque se orienta para tornar viveis os corpos: da infncia pobre, marginalizada; das sexualidades das meninas-mulheres e dos meninos-homens das camadas populares; que se organiza pelo entrelaamento das suas legitimidades, recusando o controle e a anulao das diferenas.

    O Cuidado, por sua vez, se expressa no movimento de congruncia entre corporeidade e cognoscibilidade, porque se realiza em um espao de potencializao da vida: o nicho vital (Asmann, 1999).

    Uma escola que se pauta na gesto do cuidado:

    Reconhece, terica e praticamente, crianas, adolescentes, jo-vens e adultos que se encontram imersos em contextos de vio-lncias, a partir de suas necessidades vitais.

    Compreende as violncias como fenmenos complexos, que no se pode explicar pelo olhar binrio de causa e efeito.

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    Captulo 01

    Desconstri poltica, pedaggica e afetivamente as concepes patriarcais, adultocntricas e segregacionistas, que se revelam nos processos escolares e no escolares e que produzem procedimentos carregados de outras violncias.

    Dedica uma escuta sensvel s falas dos sujeitos, viabilizando a expresso de sua histria a partir dos lugares em que se encontram.

    Irradia, a partir da escola para o seu entorno, um trabalho qualificado de enfrentamento e recusa de todas as formas de violncias.

    Produz materiais didticos que problematizam as questes de gnero, sexualidades, etnias, raa, os preconceitos e atitudes que produzem violncias dentro e fora da escola.

    Trabalha criticamente para superar os discursos:

    a. Jurdico-normativo: orientado pela homogeneizao, pelo legalismo, pelas convenes adultocrticas que apostam em procedimentos nem sempre pertinente aos interesses dos sujeitos. Norteado por um modelo que se julga senhor das decises e que se nutre de um poder-dominao (Foucault, 1995), tem dimenso judicativa, racionalista e atua sobre aquilo que considera como menoridade do social, guiado por um ethos da virilidade, das regras predominantes. Este discurso oportuniza a produo de outras violncias, entre as quais: os modelos de avaliao da aprendizagem; as concepes que pautam a organizao escolar; a evaso e a culpabilizao isolada do sujeito; os referenciamentos ao outro como no legtimo em seu contexto.

    b. Mdico-patolgico: regulado pelas ideias do higienismo, de modo mais visvel por aquelas que historicamente legitimaram as prticas eurocntricas de assepsia social e geraram isolamentos em instituies criadas para tomar posse da corporalidade do outro. o discurso-prtica, proprietrio das certezas que decompem o outro para dele saber e consolidar a patologia social da pobreza e da marginalidade.

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    O desafio reconhecer a escola como um lugar possvel de prote-o e emancipao dos sujeitos. Isto s ser possvel com a participao de todos os seus integrantes, portanto, a responsabilidade da gesto compartilhada e assumida pelo coletivo da escola.

    Resumo

    Neste primeiro captulo, abordamos a temtica da gesto escolar, iniciando pela distino dos termos administrao e gesto. Conclumos que o termo administrao traz uma concepo atrelada a uma viso

    c. Pedaggico-assistencialista: uma modalidade de discurso pastoral, salvacionista e seguidor de preceitos advindos especialmente do racionalismo judaico-cristo, que v o outro como digno de piedade. Em tese, esquarteja o sujeito separando-o de sua cultura e histria, de seu estar em convivncia com o outro. Sustenta-se na pseudoneutralidade dos acontecimentos, fecha os espaos para a dvida e mira os problemas do seu belvedere social; torna-se prescritivo, carregado de uma emotividade pura e sem estranhamento. Na maioria das vezes, se vale de veredictos econmicos, por exemplo, para produzir diagnsticos de encarceramento e marginalizao da pobreza por sua estrutura familiar.

    d. Indignao Intil: situado na vitimizao isolada do sujeito ou do adolescente, se orienta pela simples culpabilizao destes, enquanto se exclui, e aos demais, de qualquer responsabilidade social. Alega a impotncia para justificar sua indiferena. centrado na oralidade e na espetacularizao dos fatos, j que atribui menoridade ao outro pela coitadizao do mesmo. Mostra-se incapaz de empatia social e abona suas prticas com a retaliao formativa, alegando que o que observa no da sua rea de conhecimento e, por isso, nada pode fazer a no ser transferir a algum o possvel encaminhamento vislumbrado.

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    Captulo 01

    burocrtica de gesto. J a concepo de gesto educacional supera e relativiza o conceito de administrao escolar, embora no o despreze, porque a administrao constitui uma das dimenses da gesto escolar. Ao adotarmos essa perspectiva temos claro que os sistemas educacionais, independentemente do nvel ou da modalidade de educao em que atuam, diferenciam-se de outras instituies, em vrios aspectos, em especial, na particularidade do trabalho pedaggico.

    Na sequncia, procuramos compreender como se constitui o modelo de gesto na escola. Vimos que o modelo de gesto orientado pelas polticas de estado e de governo, pelos referenciais tericos sistematizados e pelas regras praticadas na instituio.

    Trouxemos a gesto democrtica como a perspectiva a ser seguida, conceituando-a a partir de sua etimologia, que traz as ideias de gestar, gerir, gesto, gerar, gestao, gerenciar, isto , dar a vida, alimentar, proteger, fazer crescer at o momento de dar luz. Nessa mesma perspectiva, apresentamos como alternativa a gesto do cuidado, entendida a partir de uma perspectiva transdisciplinar, protetiva, ecolgica, tica e esttica, que considera a vida como permanente sacralidade viva para sustentar, terica e metodologicamente, todos os processos pedaggicos.

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    Captulo 02

    2 Para que escola?

    Neste captulo, temos como objetivo apresentar os conceitos de Cultura Escolar e Cultura da Escola. Veremos que a Cultura Escolar precede o estabelecimento de ensino e a Cultura da Escola tecida cotidianamente, em razo das interaes sociais e afetivas que ocorrem no seu interior. Discutiremos aspectos relevantes da histria da Instituio Escolar, ressaltando as dimenses que compem o que aqui denominamos por Cultura Escolar. Trazemos, tambm, a dimenso da arquitetura escolar com o objetivo de refletir a arquitetura como expresso do projeto poltico-pedaggico da escola, como uma dimenso que expressa tanto a cultura escolar como a cultura da escola.

    2.1 Cultura Escolar e Cultura da Escola

    Aparentemente, todas as escolas se parecem. Ao passarmos, por exemplo, diante de um prdio da rede pblica de ensino, mesmo que nada o indique, temos a certeza de que ali funciona uma escola. muito raro no reconhecermos um prdio escolar. Mas ser que todas as esco-las so iguais?

    Figura 4. O prdio da escola

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    Pare e reflita. Procure lembrar das escolas nas quais voc j viven-ciou a experincia de estudante e/ou de professor(a). Troque informa-es com seus colegas de trabalho ou de grupo de estudo. O que as esco-las tm em comum? No que elas se diferenciam? Anote as semelhanas e diferenas e discuta com seus colegas e com o coordenador pedaggico.

    Se a concluso a qual voc chegou foi a de que todas as escolas pelas quais voc passou se parecem, tm mais elementos que as assemelham do que as diferenciam, sua concluso est correta. A esse movimento de similitude denominamos Cultura Escolar. A Cultura Escolar est to arraigada na compreenso que todos temos de Escola e da finalidade da educao escolar que temos imensa dificuldade em propor, aceitar e materializar aes que tragam mudanas significativas para esta Instituio.

    Entretanto, se a sua concluso foi a de que as escolas, apesar de se parecerem, possuem elementos que as diferenciam entre si, ela tambm est correta. Os estabelecimentos de ensino possuem identidade prpria, o que os torna singulares. A esse movimento de diferenciao denominamos Cultura da Escola. Esta compreende o cotidiano do estabelecimento de ensino, a multiplicidade de sentidos do qual ele produto e produtor, resultado do amlgama de trs dimenses, quais sejam: a dimenso da cultura escolar e das polticas de gesto da educao; a dimenso da cultura local do lugar em que est situado o estabelecimento de ensino; e a dimenso da subjetividade dos atores (histrica, social e culturalmente situados). De modo indissocivel, esto:

    A cultura escolar composta pelas diferentes significaes e finalidades que, ao longo da histria, foram atribudas escolarizao e pelas polticas pblicas para a educao nacional (Lei de Diretrizes e Bases para a Educao Nacional - LDBEN, Parmetros Curriculares Nacionais - PCNs) estadual e municipal, nas quais esto contemplados os documentos orientadores das aes administrativas e pedaggicas da escola, como por exemplo: os documentos do Ministrio da Educao e Cultura (MEC) para as Escolas Tcnicas Federais, as Propostas Curriculares e as Diretrizes produzidas pelas Secretarias de

    Jean-Claude Forquin, pesquisador francs, define

    cultura escolar como o conjunto dos contedos

    cognitivos e simblicos que, selecionados, organizados,

    normalizados, rotinizados, sob o efeito dos imperativos de didatizao, constituem habitualmente o objeto de

    uma transmisso deliberada no contexto das escolas. (FORQUIN, 1993, p. 167).

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    Captulo 02

    Educao dos Estados (para as escolas pblicas estaduais) e dos Municpios (para as escolas pblicas municipais), alm das diferentes Diretrizes produzidas pelas Instituies Privadas, que administram redes de escolas.

    O contexto histrico, social, econmico e cultural no qual o estabelecimento de ensino est situado, seja no campo ou na cidade, na metrpole ou em um municpio pequeno, no centro ou na periferia; a origem racial, tnica e religiosa das famlias da localidade.

    Os sujeitos que fazem o cotidiano da escola: educadores, alunos, familiares, gesto pedaggica e administrativa, funcionrios tcnico-administrativos (secretria, reprografia, bibliotecria, etc.) e de servios gerais (merendeiras, faxineiras, vigias, etc.). So eles que trazem para o interior do estabelecimento de ensino os significados (conflitos, disputas, embates, alianas) por eles tecidos a partir de suas histrias individuais e/ou coletivas e que do vida cultura da escola.

    Nesse sentido, a cultura da escola expressa caractersticas universais, reveladas nos imperativos da cultura escolar, que fazem com que a escola seja reconhecida como tal em qualquer lugar do mundo. Expressa, tambm, caractersticas referentes aos valores atribudos escola pela sociedade, em cujo contexto est inserida e, do mesmo modo, quelas trazidas pela subjetividade dos atores que nela se juntam. Portanto, no est dada a priori, mas se constri em virtude da trama de interaes que acontece no seu interior, no entrelaamento dessas trs dimenses. A cultura da escola expressa a singularidade do estabelecimento de ensino. Podemos tecer uma primeira compreenso da organizao escolar: nela encontramos permanncias, advindas da histria da instituio escolar, e transitoriedades referentes diversidade dos sujeitos (educadores, educandos, famlias) que tecem do cotidiano escolar e do contexto em que o estabelecimento de ensino se localiza.

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    2. 2 Um pouco da histria...

    Os seres humanos, ao longo de sua histria, desenvolveram e produziram grandes civilizaes. Nesse processo, foram confrontados com a necessidade de consagrar um lugar e um tempo difuso da aprendizagem e da cultura. Com o surgimento das cidades e da burguesia, nos sculos XI, XII e XIII, a ideia da escola se fortaleceu, voltada aos interesses e necessidades dessa nova classe em ascenso.

    Michel Lobrot, no livro Para que Serve a Escola? (1992), identifica a existncia de diferentes finalidades atribudas escola, conforme os perodos histricos:

    1. Perodo que inicia nos sculos VII e VIII da era crist e termina no fim do sculo XIV (Idade Mdia), no qual a escola tinha como finalidade exclusiva a transmisso da doutrina crist: seus dogmas, os textos sagrados, os grandes padres e telogos.

    2. Perodo clssico, que inicia no sculo XV com a inveno da imprensa e as grandes descobertas e se encerra no sculo XVIII, com a era das revolues. A finalidade religiosa no desaparece,

    Figura 5. A escola de Atenas, Rafael (1511) - Palcio do Vaticano, Roma

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    Captulo 02

    contudo sobreposta pela finalidade de socializao do indivduo. Se na Idade Mdia o fundamental era a salvao do homem no alm, na Idade Moderna, o importante a salvao do homem na terra. Os valores que a sociedade coloca em evidncia so aqueles exaltados pelo protestantismo tais como a civilidade, a decncia, a moderao, a honestidade, o trabalho, a adaptao social, a conformidade. nesse perodo que surge a escola no sentido em que a entendemos hoje, como um lugar de educao das crianas.

    3. Perodo tecnicista, que teve incio no sculo XVIII, deixou influncias que ainda marcam a educao contempornea. Durante a sua vigncia, a escola se volta para a cincia e a tcnica, abandonando os desgnios humanistas dos perodos anteriores, marcados pela transmisso da doutrina crist e pela socializao moral. A ideia de que a escola tem como finalidade a disseminao de saberes tcnicos e cientficos est ligada concepo da sociedade como sendo uma grande mquina. O perfeito funcionamento dessa mquina exige que cada indivduo ocupe seu lugar e trabalhe, o que implica aptides e capacidades adquiridas na escola entre elas a aprendizagem da leitura que constitui a base da alfabetizao. Desse modo, a escola assume um papel principal na socializao dos contedos cientficos e tcnicos e na incorporao dos valores da sociedade capitalista emergente.

    Antnio Nvoa (1991, p. 115), outro autor estudioso da escola, indica as seguintes diferenas essenciais entre as escolas da Idade Mdia e as escolas dos tempos modernos:

    a passagem de uma comunidade de mestres e alunos a um sistema de autoridade dos mestres sobre os alunos;

    a introduo de um regime disciplinar, baseado numa disciplina constante e orgnica, muito diferente da violncia de uma autoridade mal respeitada;

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    o abandono de uma concepo medieval indiferente idade dos alunos, em favor de uma organizao centrada sobre classes de idades bem definidas;

    a instaurao de procedimentos hierrquicos de controle do tempo e da atividade dos alunos, de utilizao do espao, etc.; a implantao de currculos escolares e de um sistema de pro-gresso dos estudos, onde o exame exerce um papel central.

    importante destacar que as experincias histricas de cada um desses perodos no se esgotam na mudana dos sculos. Elas tm extenso nos perodos seguintes, misturam-se com eles e se aperfeio-am, permanecendo, ainda hoje, impregnadas no nosso imaginrio sobre as finalidades da escola.

    2.3 A Escola no Brasil

    Figura 6. Crianas brincando no ptio da escola

    O processo de universalizar a escolarizao da populao brasileira muito recente. Enquanto na Europa a disseminao da ideia da

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    Captulo 02

    necessidade da escolarizao teve incio no sculo XVIII, no Brasil s ocorreu no incio no sculo XX, ganhando projeo com o processo de urbanizao e de desenvolvimento industrial, a partir dos anos 50.

    Tentativas de se legislar sobre a educao no territrio nacional, entretanto, j vinham sendo realizadas desde o perodo do Imprio. de 1827 a primeira Lei Nacional que objetivava regular a educao primria nos quesitos da gratuidade, do currculo e do salrio dos professores. Essa Lei durou oito anos. Com relao educao escolar primria, passaram-se cem anos at que uma Constituio Federal voltasse a mencionar a Educao Nacional, trazendo alguns princpios a serem observados em todo o territrio.

    Nem mesmo durante a Repblica, apesar da esperana de maior democratizao, a sociedade brasileira viu garantida em lei a gratuidade do ensino primrio. A educao era vista como uma virtude, um ato de

    Carlos Roberto Jamil Cury, no livro Medo Liberdade e compromisso democrtico: LDB e Plano Nacional da Educao, de 1997, traz alguns elementos para que reflitamos sobre esse descompromisso atvico para com o Ensino Fundamental:

    No Brasil, a Educao comea de cima para baixo, diz o autor.

    Inicialmente, para as elites, com o Ensino Superior. A educao bsica era dada por preceptores estrangeiros, professores para as primeiras letras, msica, etc.

    A educao popular no era de interesse do Estado e s aconte-cia, praticamente, nas capitais e nos centros comerciais maiores.

    No havia industrializao e o comrcio era incipiente com a extrao do pau-brasil, minrios, cana-de-acar e caf.

    O trabalho escravo era o suporte da produo nacional.

    Descompromisso atvico

    Refere-se s concepes e prticas inerentes educao escolar no Brasil, permeada por subjetividades e pela ideia da escola como dever e no como direito das pessoas e dever do Estado.

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    esforo individual e no como dever do Estado. A escolarizao somente se efetivava medida em que a populao procurava e pressionava o Estado para oferec-la. Contudo, num pas de analfabetos, coronelista e escravocrata, a busca pela sobrevivncia vinha em primeiro lugar. No imaginrio da populao brasileira estava a concepo de que frequentar a escola vinha em segundo lugar.

    Somente no alvorecer do sculo XX que a organizao da educao nacional surgiu como necessidade para o Estado brasileiro. A escolarizao da populao era condio indispensvel para a expanso industrial, quer do ponto de vista da qualificao da mo de obra, quer da formao de condutas necessrias ao convvio civilizado na cidade. Em funo do alargamento da escolarizao fez-se necessrio estruturar um sistema de educao nacional para legislar e organizar a expanso das redes de ensino nos Estados e Municpios da Federao.

    Assim, nos anos 30 do sculo passado, foi criado o Ministrio de Educao e de Sade Pblica e inaugurado o Conselho Nacional de Educao. Nessa mesma poca, surgiu o Movimento da Escola Nova, que defendia a educao fundamental massiva da populao brasileira como importante para a formao de uma identidade nacional. Com a contribuio tambm desse Movimento, na Constituio de 1934, a educao includa como direito do cidado, gratuita e obrigatria, sendo garantidos os recursos pblicos exclusivos para financi-la. O Golpe de 1937, conhecido como Estado Novo, no entanto, impediu a tramitao e a discusso dessa lei no Congresso Nacional. A educao voltava a ser uma funo complementar do Estado e as instituies privadas tiveram prioridade nos subsdios oriundos de recursos pblicos. Nesse contexto, foram criadas as Leis Orgnicas que passaram a regular a Educao Nacional: Ensino Secundrio, Ensino Comercial, Ensino Agrcola, Ensino Normal e Ensino Primrio.

    Com o retorno incipiente democracia, em 1946, so retomados os dispositivos de obrigatoriedade e gratuidade da educao nacional contemplados na Constituio de 1937 e no considerados pelo Estado

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    Captulo 02

    Novo. Legislar sobre a educao voltava a ser competncia privativa da Unio e, em 1961, depois de 15 anos de espera, o Brasil teve sua primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN): Lei n. 4.024. Essa LDBEN deu nfase Educao Fundamental e a questes do acesso escolaridade.

    Passados apenas dezoito anos de vida democrtica, o pas enfrentava uma nova ditadura, instaurada pelo Golpe Militar de 1964. Um novo modelo de desenvolvimento econmico baseado na concentrao de renda implantado. A LDBEN n 4.024/61 reformulada e em seu lugar editam-se as Leis n. 5.540/68 e n. 5.692/71. A primeira reorganiza a estrutura e o funcionamento do ensino universitrio com as seguintes inovaes:

    a. o perodo letivo passa a regime semestral;

    b. acaba-se a ctedra e criam-se os departamentos, para pulverizar a integrao entre as reas de conhecimento;

    c. terminam as turmas regulares que iniciavam e terminavam o curso juntas;

    d. inaugura-se a matrcula para todos, com garantia de vaga na disciplina e no horrio escolhidos para aqueles com melhor ndice de aproveitamento;

    e. a universidade passa a ser organizada com base no trip: ensino/pesquisa/extenso.

    Com relao Lei n. 5692/71, ateno especial foi dada ao Ensino Mdio profissionalizante, compulsrio e obrigatrio, que tinha como objetivo formar mo-de-obra para a sociedade civil, que reagiu compulsoriedade e universalidade do 2o grau. Em 1982, esta legislao foi modificada pela Lei n. 7.044/82, que acabou com a obrigatoriedade do Ensino de 2 grau.

    Ctedra

    Posto ocupado pelo professor titular da disciplina - pessoa reconhecida pelos estratos dominantes da sociedade como de notrio saber.

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    O anseio pela democratizao da sociedade brasileira, traduzido nas aes desencadeadas pelo movimento estudantil, pelas associaes de professores, sindicatos e pelo movimento diretas j, favorece o retorno democracia. Com ela, uma nova constituio e novos ordenamentos para a educao escolar. Em 1988, uma nova Constituio confirma a educao como um direito social e, mais, como um direito pblico subjetivo.

    Como direito pblico subjetivo, qualquer cidado pode exigir do Estado o cumprimento imediato do oferecimento regular de Escola de Ensino Fundamental. Com relao ao Ensino Mdio, a Constituio afirma que ele deve ser gratuito em estabelecimentos pblicos de ensino e progressivamente obrigatrio, com vistas universalizao do atendimento. Uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional elaborada: a Lei n. 9394/96.

    Como todo processo democrtico envolve mudanas, divergncia de ideias e contradies, os projetos de LDBEN tiveram processos de tramitao longos, lentos e extremamente polmicos, como aconteceu com a Lei n. 4.024/61. A atual LDBEN, n. 9394/96, tambm teve um longo percurso, de oito anos, desde o seu incio at ser sancionada.

    Como nos ensina Carlos Roberto Jamil Cury (1997, p.9), toda vez que

    um novo projeto de lei de Educao Nacional vier tona porque algo

    de muito significativo e problemtico est passando pelas foras sociais

    presentes em nossa sociedade. Por isso, ele, como sempre o foi, talvez

    no deixe de ser complexo e de difcil encaminhamento..

    Art. 6: So direitos sociais a educao, a sade, o trabalho, o lazer, a segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos desamparados, na forma desta Constituio. Art. 208: 1 O Acesso ao ensino obrigatrio e gratuito direito pblico subjetivo. 2 O no oferecimento do ensino obrigatrio pelo poder pblico, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.

    Diferente daqueles projetos feitos nos gabinetes do Exe-cutivo e impingido socie-

    dade pelas ditaduras, como foi o caso das Leis Orgnicas

    de 1937 e das LDBNs n. 5.540/64 e n. 5.692/71

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    Trazemos algumas questes, entre muitas outras, que so postas mesa em tempos de democracia, quando se discute e se organiza um projeto de LDBEN.

    4. A questo mais problemtica justamente o carter nacional e a complexidade advinda desse contexto. As mudanas pelas quais a sociedade brasileira passa tm implicado, quase sempre, mu-danas nas Diretrizes e Bases da Educao Nacional.

    5. Uma LDBEN polmica tambm por ser obrigada a contemplar na sua formulao aspectos relativos ao nosso modelo de colonizao, experincia da escravatura e ao extermnio quase absoluto da populao indgena. polmica, ainda, porque toca na nossa constituio como pas excludente e discriminatrio, com relao aos negros, aos caboclos, aos indgenas, aos migrantes, ao povo do campo e s classes subalternas urbanas.

    6. As disputas entre as modalidades de ensino pblico e privado. Aqui se colocam questes relacionadas ao financiamento pblico da educao no pas: a luta da sociedade civil para manter as verbas pblicas para o ensino pblico como forma de garantir a qualidade das condies de trabalho e de aprendizagem nas escolas; s formas de interveno do Estado ao legislar sobre escolas privadas, entre outras.

    7. Em relao s diretrizes curriculares nacionais: orientao de uma base comum do que deve ser ensinado em todo o territrio nacional.

    8. As questes suscitadas com o ensino religioso. Um Estado Leigo, moderno, deve abrir suas portas para o ensino religioso? Qual(ais) ensino(s)? Problemtica que mexe com a diversidade cultural e religiosa do Brasil.

    Diretrizes linha de orien-tao, norma de conduta = direo geral a seguir. Bases superfcie de apoio, funda-mento = alicerce do edifcio. EN = Educao Nacional.

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    2.4 LDBEN n 9.394/96

    Esta Lei, diferente das outras, nasce do Legislativo e no do Executivo. O Projeto inaugural foi um dos primeiros a dar entrada na Cmara e teve participao da sociedade civil com representatividade de diferentes organismos, entre associaes e entidades de classe. Para a formulao do texto, foram consultados especialistas, administradores e pesquisadores. Foram vrias as questes que atravessaram sua tramitao e atrasaram sua aprovao. Entre elas, a participao da sociedade civil organizada que disputou com o Congresso interesses e conflitos. Esses fatores contriburam para prolongar sua trajetria de discusso e aprovao, cuja tramitao durou cerca de oito anos.

    Outra questo diz respeito ao fato de o projeto no ter sido apoiado pelo executivo federal, pelos secretrios estaduais de educao e pelos segmentos ligados ao setor privado. Os principais problemas levantados para esse no apoio se relacionavam s acusaes de corporativismo, de excesso de regulamentao, de querer invadir a autonomia dos estados e de no propiciar a incorporao plena da jornada integral.

    Por outro lado, vrios dos parlamentares comprometidos com o projeto no conseguiram se reeleger para dar continuidade s suas ideias e alianas, o que trouxe dificuldades continuidade das discusses.

    2.5 Aspectos inovadores da nova LDBEN

    A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional trouxe algumas inovaes em relao s Leis que a precederam.

    O primeiro ponto inovador diz respeito mudana na estruturao dos nveis de ensino, que passou de trs nveis (Ensino de 1 Grau; Ensino de 2 grau e Ensino Superior) para dois: Educao Bsica, que compreende a Educao Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Mdio; e o Ensino Superior. Com relao Educao Bsica, destacamos a incluso da Educao Infantil e a extenso progressiva da

    Etapa final da educao b-sica, estabelece a preparao

    bsica para o trabalho for-mao tica, a autonomia, a

    cidadania e a compreenso dos fundamentos cientfico--tecnolgicos dos processos

    produtivos... (art. 35). O ensino mdio propedutico

    a uma possvel profissiona-lizao no mbito da for-

    mao superior ou tcnica, com cursos ps-mdios. Esse

    estgio da formao, alm do carter propedutico, tem o objetivo da terminalidade,

    ou seja, de assegurar aos estudantes a concluso da

    Educao Bsica.

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    obrigatoriedade do Ensino Mdio, como uma significativa conquista para a plena escolarizao da sociedade brasileira.

    Outro ponto se refere formao inicial e continuada dos professores, qual atribuda importncia fundamental para o projeto de Educao Nacional. Roselane Campos (2002) indica que o projeto de profissionalizao dos professores, proposto pelo Estado, est assentado em trs estratgias: a) novas referncias para a atuao dos docentes da educao bsica, centralizadas no estabelecimento de ensino; b) formao nica para todos, construda a partir do referencial de competncias; c) deslocamento da formao de professores da universidade para outras instncias educacionais voltadas exclusivamente para este fim, como os Institutos Superiores de Educao. Essa inovao, entretanto, vem sofrendo crticas por parte dos pesquisadores da educao, que apontam como possveis consequncias: o aprofundamento da concepo tcnico-instrumental na formao, a diversificao e diferenciao das instituies de formao, a expanso e privatizao do ensino superior, o aligeiramento da formao, entre outros aspectos.

    Alm dessas duas importantes inovaes propostas pela LDBEN, outras se agregam. Entre elas, citamos o acolhimento dado questo da diferena dos sujeitos, com dispositivos relacionados s comunidades indgenas, que apoiam sua cultura, e o bilinguismo; incluso escolar, dando importncia educao de jovens e adultos, por exemplo; incluso dos indivduos com necessidades especiais na escola regular.

    2.6 Desdobramento e complementaes da LDBEN

    A sociedade no esttica, est continuamente em transformao. Nesse sentido, as Diretrizes e Bases da Educao precisam acompanhar o fluxo das mudanas produzidas tanto pelas acomodaes ao modo de produo capitalista global como para atender as demandas das lutas sociais. Desse modo, no decurso da promulgao e implementao da LDBEN 9.394/96, complementaes legais e alteraes nos seus dispositivos foram efetivados:

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    Lei 10. 436/2002 prev a obrigatoriedade do ensino de Libras nos cursos de professores.

    Lei 10. 639/2003 inclui a Histria e Cultura Afro-Brasileira no Ensino Fundamental e Mdio

    Lei 11.114 de 2005 altera artigos 6 e 32 da LDB para tornar obrigatria a matrcula das crianas de seis anos de idade no ensino fundamental.

    Lei 11 274 de 2006 altera artigos 29, 30, 32 e 87 da LDB, ampliando a durao do ensino fundamental de 8 para 9 anos.

    Emenda Constitucional n 59 de 11 de novembro de 2009 amplia a obrigatoriedade e a gratuidade da educao bsica dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade.

    2.7 O lugar da arquitetura na cultura escolar e na cultura da escola

    A escola, na forma como a conhecemos um prdio escolar, com salas destinadas aos diferentes fazeres nasceu no sculo VII. Neste perodo, os jovens aristocratas que no tivessem herana, tinham duas escolhas de independncia: ir para o exrcito ou para a igreja. As escolas existentes tinham como papel principal dar a conhecer a doutrina crist eram os monastrios. Esses jovens no escolhiam o destino religioso por vocao ou vontade. Havia uma sobre-determinao dos genitores e da sociedade. Cabia, ento, instituio a vigilncia constante sobre esses jovens da uma arquitetura que levava em conta assegurar tanto o ato de vigiar quanto o de controlar, at a internalizao, pelos estudantes, de que estavam em permanente estado de vigilncia - o panptico.

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    Esse modelo caracterstico das antigas construes escolares. Pensemos numa escola religiosa, construda no incio do sculo no formato quadrado, com o ptio rodeado por salas o educando no tem sada, por onde ele andar poder ser visto.

    No sculo XV, com a inveno da imprensa, a finalidade religiosa fica em segundo plano e a escola se abre para a formao da aristocracia como um todo a ela tem a finalidade de socializao. Entretanto, o modelo arquitetnico continua baseado na vigilncia sobre os jovens, o que reafirma o papel principal da escola.

    No sculo XIX, a finalidade da escola muda: as necessidades da sociedade industrial requisita uma escola que ensine a cincia e a tcnica. Lentamente, a arquitetura da escola comea a modificar-se, chegando ao modelo de escola aberta que encontramos hoje. Mesmo nesse modelo arquitetnico aberto, a vigilncia e o cerceamento da movimentao das crianas e jovens ainda podem ser encontrados nos muros que cercam as escolas, nos vrios portes pelos quais o estudante tem de passar e no controle que exige que ele se identifique para poder ter acesso aos espaos fsicos da escola.

    O Panoptico de Bentham uma figura arquitetural para a vigilncia: na periferia uma construo em anel; no centro, uma torre vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construo perifrica dividida em celas com janelas para o interior e para o exterior: as primeiras correspondem s janelas da torre e as segundas permitem que a luz atravesse a cela de lado a lado. Tudo o que acontece no interior da cela, cada movimento, visvel a um vigia postado na torre central. (FOUCAULT, 1986, p. 177)

    Assista o filme: O Nome da Rosa. Ele pode ajud-los a entender esse tempo.

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    A escola vive, portanto, a ambiguidade de ser um lugar social moderno e, ao mesmo tempo, de valores antigos que foram conservados. Ou seja, nada na escola neutro, nem mesmo a sua arquitetura. Quando olhamos para uma escola devemos nos perguntar: esse prdio evidencia qual Projeto Poltico Pedaggico (PPP)?

    Vimos at aqui elementos da cultura escolar impressos na sua arquitetura. So eles que nos possibilitam reconhecer uma construo como um estabelecimento de ensino. Isso porque as escolas se assemelham na arquitetura.

    Os prdios escolares, independente da idade de sua construo, tm semelhanas: geralmente edificaes no formato de um U ou quadradas, com um ptio interno, na maioria das vezes descoberto, uma quadra e/ou um campo em um dos lados e, mais recentemente, com ginsios cobertos, com quadras polivalentes. Essa arquitetura denuncia uma concepo de escola como um lugar social de controle e vigilncia, de relaes hierarquizadas de mando e obedincia, de valorizao de determinados saberes em detrimento de outros.

    Por essa razo, a biblioteca, os laboratrios, as salas informatizadas, as salas de vdeo, por exemplo, so espaos adaptados e no fazem parte do projeto poltico-pedaggico da escola. Ou seja, no esto incorporados ao projeto arquitetnico porque no so considerados fundamentais como as salas de aula. O saber, nessa concepo, se realiza entre professor e aluno e se restringe ao ambiente da sala de aula. Estas tm uma arquitetura que obedece a um modelo padro: com janeles de um lado e a porta do lado oposto, prxima parede, onde fica o quadro de giz e a mesa do educador, voltada para o corredor interno.

    Alm desses lugares, pode haver outros que servem como depsito para material de limpeza, merenda ou, ainda, para guardar material didtico, principalmente, o de educao fsica, podendo tambm se destinar ao uso da equipe pedaggica, quando a escola conta com esses

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    profissionais no seu quadro funcional, algo cada vez mais raro. Nos fundos, esto localizados a cozinha e os banheiros. No lado em que se encontra o porto de entrada, esto, tambm, a secretaria, a sala dos dirigentes e dos educadores. Existem poucas variaes nesse aspecto arquitetnico das escolas, mas a base permanece a mesma e isso que nos permite reconhecer que ali existe uma escola. As escolas/empresas, tais como cursinhos pr-vestibulares e supletivos, constituem a exceo, uma vez que funcionam, nas grandes cidades, em prdios comerciais, para facilitar o acesso dos alunos/clientes.

    Contudo, um olhar mais arguto ao observar o cotidiano da escola pode nos indicar diferenciaes entre um estabelecimento de ensino e outro. Isso se d em vista dos diferentes significados que os sujeitos atribuem aos espaos construdos. Ou seja, os lugares so ocupados por indivduos que tm uma histria e uma cultura das quais decorrem concepes de mundo, de escola, de educador, de educando e da profisso docente, s vezes convergente, outras divergente. Nas escolas, os sujeitos se apropriam dos espaos e recriam novos sentidos e formas de sociabilidade.

    De escola para escola, conforme os sujeitos e as relaes que se estabelecem entre eles, o espao construdo ganha contornos, adereos, formas, usos e significados diferentes. Uma secretaria de escola , em princpio, igual em todas as escolas: localiza-se sempre entrada. Pode ter como funo o controle da chegada e da sada de visitantes, famlias, educandos, educadores e outros funcionrios. Com esse significado, geralmente o espao da secretaria tem um layout tpico: uma porta, logo em seguida um grande balco e, por trs dele, as mesinhas da secretria e suas auxiliares; aos fundos, uma porta que se abre para a sala da direo, que tambm pode localizar-se ao lado. Ou seja, quem quer que seja o visitante, este, antes de chegar direo da escola, passa pelo crivo dos funcionrios da secretaria.

    Tambm pode ter como funo o acolhimento, isto , receber e encaminhar as pessoas. Nesse caso, o espao da secretaria aberto, antes do balco h uma mesa e cadeiras para recepcionar os visitantes. A sala da direo se abre para esse espao, num estmulo ao intercmbio, conversa, escuta.

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    Assim como a secretaria, a outros espaos podem ser atribudos significados diferenciados: a sala dos especialistas tanto pode estar prxima ou junto secretaria, num significado de controle ou de acolhimento, quanto pode estar prxima s salas de aula, revelando um convvio mais ntimo com os educadores e educandos ou uma relao de controle ou de acolhimento das questes e conflitos inerentes ao processo de ensinar e aprender.

    As salas de aula podem manter o layout conhecido: quadro para giz, mesa do professor frente de carteiras enfileiradas cuja dinmica de ocupao determinada pelo educador, o nosso velho espelho de classe, separando os grupos de educandos conversadores , prximo da porta, para que o educador possa controlar a entrada e sada dos estudantes, e um armrio nos fundos. Podem, conforme a metodologia de ensino, haver uma outra organizao do espao: as carteiras em crculo, denotando a possibilidade do dilogo e do debate aberto, relativizando as hierarquias e possibilitando vez e voz a todos os participantes do processo de ensinar e aprender. Pode, tambm, ter as carteiras agrupadas (com quatro carteiras formando um grupo) indicando a compreenso de que a produo do conhecimento social e que a discusso em grupos possibilita uma maior compreenso de um determinado tema perspectiva sociointeracionista. A organizao espacial da sala de aula nos diz muito sobre a compreenso que o educador tem de ensinagem e de aprendizagem.

    As mesas do refeitrio podem ter mltiplos significados, tais como: lugar onde os educandos lancham e se integram; espao para os educadores trabalhar com aulas mais criativas, com a participao dos educandos, produzindo maquetes, desenhos, atividades artsticas, num dia de frio em que o sol se faz necessrio, ou em um dia de calor, quando uma brisa sempre bem-vinda; podem ser tambm lugar de recepo das famlias e de descanso das faxineiras e merendeiras. A biblioteca pode tambm ser ponto de encontro dos alunos, alm de lugar de guarda de livros e peridicos para leitura e pesquisa.

    Outros aspectos da arquitetura e do uso do espao fsico poderiam ainda ser relacionados, como a exposio das produes

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    Captulo 02

    de educandos e educadores nas paredes dos corredores e ptios das escolas, socializando a criatividade que emana do processo de ensinar e aprender; os banheiros, os jardins, entre outros, que evidenciam as novas significaes do espao pelos atores das escolas e que marcam a distino entre os estabelecimentos de ensino.

    Resumo

    Neste captulo, trouxemos a diferenciao entre Cultura Escolar e Cultura da Escola. A primeira diz respeito ao que se construiu em termos de concepes tericas e polticas sobre a Instituio Escolar, as quais fazem parte do imaginrio coletivo que temos com relao configurao de seu contedo curricular e arquitetnico. As escolas se assemelham no que diz respeito cultura escolar. A Cultura da Escola, por sua vez, se relaciona s singularidades que expressam identidades diferenciadas a cada estabelecimento de ensino. produzida no entrelaamento de mltiplos fatores, entre eles a dimenso da cultura escolar. Tambm fatores relacionados dimenso do contexto histrico, geogrfico, social e cultural da populao de seu entorno, alm daqueles relacionados s subjetividades dos atores que dela fazem parte. Enquanto a Cultura Escolar um a priori, isto , precede este ou aquele estabelecimento de ensino, a Cultura da Escola tecida cotidianamente, em virtude da trama das interaes sociais e afetivas que acontecem no seu interior, no entrelaamento das trs dimenses citadas: das concepes tericas e polticas sobre a Instituio Escolar; do contexto geogrfico, histrico, social e cultural e das subjetividades dos atores.

    Aprendemos um pouco da histria da Instituio Escolar, ou seja, vimos elementos que fazem parte do que denominamos Cultura Escolar. Os estudiosos da histria da educao identificam trs grandes perodos: o primeiro, em que a finalidade da escola se voltava exclusivamente transmisso do cristianismo e que perdurou, pelo menos, durante sete sculos; o segundo, denominado perodo clssico, em que a escola tinha como funo a socializao dos indivduos e que perdurou do sculo XV ao sculo XVIII; e um terceiro perodo, que tem incio no sculo

    Imaginrio coletivo

    Tecido por um conjunto de manifestaes culturais que so apropriadas pelos indiv-duos no processo mesmo de suas relaes sociais; essas manifestaes se configuram como valores, prticas, da-dos de realidade socialmente aceitos e incorporados como referncias para o pensar e o agir das pessoas.

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    XVIII e que ainda hoje vigora, denominado perodo tecnicista. Nesse ltimo, a finalidade da educao escolar se volta para a disseminao de saberes tcnicos e cientficos e tem incio a universalizao da escola. A escola que conhecemos hoje vem se construindo desse jeito h, pelo menos, 300 anos, desde o sculo XVIII. Comparada da Europa, a universalizao da escolarizao no Brasil tem, pelo menos, cem anos de atraso. A educao escolar da populao brasileira tornou-se necessidade somente nas dcadas iniciais do sculo XX, quando veio a representar condio indispensvel para a expanso industrial. Na Constituio de 1934, a educao includa como direito do cidado, gratuita e obrigatria, sendo garantidos recursos pblicos para financi-la. Nessa mesma dcada, criado o MINISTRIO DE EDUCAO E DE SADE PBLICA e inaugurado o Conselho Nacional de Educao. A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN), Lei n 4.024, de 1961 e tramitou pelo Congresso Nacional por um longo perodo. Com o golpe militar perpetrado nao em 1964, uma nova LDBEN foi estruturada, a Lei n 5.540/64, que legislava sobre o Ensino Superior, e a Lei n5.692/71, sobre o Ensino de 1 e 2 Graus. Com a volta da democracia, na dcada de 1980, uma nova LDBEN foi proposta e longamente discutida no Congresso Nacional, a Lei n 9.394/96, que hoje est em vigor.

    Tambm refletimos sobre a arquitetura escolar que conhecemos, a qual no tem sofrido grandes transformaes desde que nela foi incorporada a finalidade de transmisso dos saberes da tcnica e da cincia, no sculo XVIII. Ou seja, h pelo menos trezentos anos que essa escola na qual estudamos e pretendemos trabalhar no experimenta profundas modificaes. A arquitetura escolar expresso do projeto poltico-pedaggico da escola e vice-versa. O modo como os espaos so utilizados e organizados nos falam da compreenso de concepes de mundo, de conhecimento, de escola, de educador, de educando e da profisso docente, de ensinar e de aprender que tm os sujeitos (educadores, equipe pedaggica e administrativa) diretamente responsveis pela conduo da educao escolar.

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    Captulo 03

    3 Significaes sociais da escola

    Neste captulo, objetivamos identificar as matrizes tericas das principais concepes construdas sobre a funo da escola e refletir sobre as permanncias dessas concepes na Organizao Escolar.

    Este captulo tambm dedicado ao que denominamos de Cultura Escolar. Nele estudaremos as diferentes perspectivas que foram sendo construdas sobre as finalidades da escolarizao. Veremos distintas

    concepes, desde as mais tradicionais, que entendem a escola como uma instituio autnoma, sem qualquer determinao social, at aquelas que atribuem escola uma esfera de autonomia relativa, onde as resistncias so possveis. Estas formam a compreenso que temos sobre o porqu e o para que da educao escolar, os quais, no cotidiano da sua organizao, entram em conflito e impem limites ao seu projeto

    poltico-pedaggico. Nos autores clssicos da Sociologia, isto , nos fundadores desta rea do conhecimento Durkheim, Weber e Marx encontramos as matrizes tericas das diferentes formas de compreender e organizar a escola.

    Figura 8. As concepes de escola que temos

    Para mais informaes sobre a biografia desses impor-tantes socilogos clssicos, consulte o site: www.netsa-ber.com.br/biografias

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    3.1 Viso funcionalista da escola

    A teoria de Durkheim est na base da viso funcionalista da escola. Para essa perspectiva, a sociedade e a escola se assemelham a um organismo vivo. Tal como o corpo humano, composto de rgos que desempenham funes necessrias ao seu equilbrio, a escola tambm tem seus rgos que desempenham diferentes funes, cujo cumprimento imprescindvel para o seu funcionamento. Os regimentos escolares so bons exemplos dessa forma de conceber a escola. Neles, encontramos as funes: de aluno, de professor, de diretor, de especialista (supervisor escolar, orientador educacional, etc.), de secretrio, etc.; para cada uma destas funes se encontram descritos os direitos e os deveres, isto , qual o papel a ser desempenhado em cada uma delas. O correto desempenho dessas funes, ou seja, o cumprimento por cada indivduo com seus direitos e deveres fundamental para o funcionamento da escola, para que ela possa cumprir com sua funo de integrar os indivduos/estudantes sociedade.

    3.2 Viso Estruturalista ou burocrtica da escola

    Para Weber, burocracia sinnimo de organizao. Um sistema no qual a diviso do trabalho se d racionalmente, onde existe coerncia na relao entre os meios e os fins visados. A burocracia tem como caractersticas: o formalismo nas comunicaes; a existncia de normas e regulamentos escritos; a impessoalidade nas relaes; o recrutamento de quadros, baseado no mrito e na competncia tcnica e no em preferncias pessoais e polticas; a profissionalizao do funcionrio medida que a burocracia exige que ele seja um especialista e assalariado; a separao entre a propriedade e a administrao, isto , os administradores da burocracia no so seus donos; o planejamento numa previso do funcionamento. Contudo, o que melhor define essa perspectiva de organizao a presena de uma estrutura hierrquica de autoridade (no topo o diretor, na base os alunos e entre eles os especialistas, os professores e os demais funcionrios) e de uma diviso horizontal e vertical do trabalho que atende a uma racionalidade e busca a eficincia na organizao.

    Motta, no livro O que Burocracia, define burocracia como uma estrutura social

    na qual a direo das atividades coletivas fica a cargo de um aparelho

    impessoal hierarquicamente organizado, que deve agir

    segundo critrios impessoais e mtodos racionais.

    (MOTTA, 1988, p. 7)

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  • Significaes sociais da escola

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    Captulo 03

    Tambm o regimento escolar, nessa perspectiva, o melhor exemplo, nele se encontra uma diviso metdica do trabalho, traduzida em papis bem definidos, cujo desempenho se d de acordo com uma descrio precisa de direitos e deveres, que , entretanto, estabelecida e modificada pelos ocupantes dos nveis mais altos do prprio grupo (diretores, especialistas e professores). No regimento, encontram-se a estrutura e o funcionamento da escola. Portanto, no que se refere compreenso da organizao da escola, as vises funcionalista e estru-turalista se complementam.

    3.3 Viso reprodutivista da escola

    Tambm chamada de crtico-reprodutivista, essa perspectiva de olhar para a educao escolar recebeu essa denominao por fazer a crtica s teorias conservadoras (funcionalista e estruturalista) e afirmar, com base na teoria marxista, que a escola tem um papel fundamental na reproduo da ideologia burguesa, desmistificando a imagem da educao como um fator determinante de equalizao e de mobilidade social. No interior dessa perspectiva de olhar para a escola encontramos duas vertentes: aquelas que veem na escola a funo de reproduo social e aquelas que veem na escola a funo de reproduo cultural.

    Representando a abordagem da reproduo social, os franceses Baudelot & Establet, no livro La Escuela Capitalista (1986), argumentam que a escola nica, apregoada pelo Sistema de Ensino Francs, no existe. Em seu lugar, apresentam a escola dividida em duas redes: a rede SS (Secundrio Superior) que possibilita aos estudantes o prosseguimento dos estudos em nvel superior e a rede PP (Primrio Profissional), que profissionaliza os estudantes no lhes dando chance de prosseguimento dos estudos. A diviso em redes diferentes percorre o mesmo caminho da diviso de classes antagnicas na sociedade capitalista. Desse modo, para a rede SS vo os filhos da burguesia e para a rede PP os filhos das classes populares. Os estadunidenses Bowles & Gintis so tambm importantes autores dessa perspectiva. Na obra Schooling in Capitalist America (1976), argumentam haver correspondncia entre as relaes sociais que

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    administram a interao entre os indivduos no local de trabalho e as relaes sociais do sistema educativo. H uma estreita correspondncia entre a estrutura organizacional da escola e a estrutura de empregos: o papel reprodutor da instit