ôNibus literário

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Araçatuba Da Redação [email protected] T rês horas. Esse era o tem- po total aproximado que crianças e adolescentes de 14 bairros de Araçatuba parti- cipantes do Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infan- til) “perdiam” diariamente em conhecimento durante cada via- gem de uma hora e meia realiza- da para chegar até a escola e re- tornarem para suas casas ao fi- nal do dia. Desde o início deste ano, po- rém, a realidade é outra. O proje- to “Viajando na Leitura”, criado pela educadora social Jeacqueline Beatriz Gohl Ianner, que acompa- nha as crianças em sua jornada diária de viagens, transformou o ônibus em um agradável veículo de transporte com um espaço in- terno, onde imaginação, interação e segurança se unem para garantir a todos momentos ricos em aprendizado, integração e entretenimento. Jeaqueline conta que por ser um percurso longo, as crianças e os adolescentes ficavam agitados por não terem nenhuma ativida- de para desenvolver. “Isso fazia com que eles se movimentassem dentro do ônibus e não dava pa- ra segurar, afinal eles têm muita energia”. Com o desafio de manter os pequenos passageiros tranquilos e em segurança, aproveitando ain- da o tempo da viagem, a educa- dora trouxe o mundo da literatu- ra e informação para dentro do veículo. Para selecionar os materiais que integrariam o acervo do “Via- jando na Leitura”, foi realizada uma consulta juntos aos estudan- tes para identificar suas preferên- cias literárias. “Não impusemos nada. Colocamos coisas diferen- tes que pudessem chamar a aten- ção deles e os interessasse. Nosso objetivo é mantê-los em seguran- ça e integrá-los”, explica. ESTRUTURA Entre as produções estão li- vros de fábulas de Esopo, recor- tes de revistas e jornais, livros de pano confeccionados pelos pró- prios alunos, além de textos reti- rados da internet durante a ofici- na de inclusão digital realizada no programa. Para comportar as obras, fo- ram fixados em cada banco do ônibus porta-livros. Por já terem lugares fixos no veículo, os estu- dantes deixam em suas sacolas as obras e textos que lerão durante a viagem. Jeaqueline relata que desde a criação do projeto os alunos permanecem sentados durante to- do o trajeto. “A mudança de comportamento na viagem foi radical. Agora, a maioria fi- ca concentrada na lei- tura que começou a se tornar um há- bito na vida deles”. A edu- cadora afir- ma que o próximo passo se- a compra de dis- positi- vos de jogos portá- teis. “Te- mos que inovar sempre, apresentar coisas lúdi- cas e praze- rosas para eles, a fim de que interajam uns com os outros e aprendam cada vez mais”, conclui. Apesar de ser um projeto re- cente, os resultados já são visíveis na nova postura adquirida pelas crianças e adolescentes, segundo o coor- dena- dor do Peti em Araçatuba, o psicólogo Edson Neves Terra Junior. Para ele, “Viajando na Leitu- ra” proporcionou aos alunos o de- senvolvimento do hábito e fluên- cia na leitura e acelerou o proces- so de alfabetização, além de for- necer condições para que elas ad- quiram de forma autônoma o co- nhecimento. “Ficamos receosas deles não aceitarem, entretanto, nos surpreendemos com o envolvi- mento. É algo que tem dado muito certo. Agora, é analisar to- do o cenário e fazermos readaptações, apresentando sem- pre novidades”, destaca. Terra afirma que o projeto também está aberto para receber doações de livros ou materiais atrativos para as crianças. Os doa- dores interessados em conhecer a atividade também poderão acom- panhar uma viagem e fazer a en- trega das obras pessoalmente. O Peti está situado na rua Florêncio de Abreu, 931, no Jar- dim Alvorada. O telefone de con- tato é o 3608-7270. PROGRAMA Criado pelo Ministério de Desenvolvimento Social, o Peti é um programa do governo fe- deral que atende atualmente 820 mil crianças e adolescentes com idades entre 6 e 15 anos afastadas do trabalho infantil em mais de 3,5 mil municípios. No período contrário ao que estão na escola, os estudan- tes permanecem no programa onde têm acesso à escola for- mal, saúde, alimentação, espor- te, lazer, cultura e profissionalização, além de con- vivência familiar e comunitária nas oficinas voltadas para os pais e a comunidade em geral. EDUCAÇÃO Viagem Linha, agulha, pano, caneta e muita criatividade. Estes são os materiais e ferramentas emprega- dos pelos participantes do Peti (Programa de Erradicação do Tra- balho Infantil) em Araçatuba para a criação dos livros de pano dispo- nibilizados no projeto “Viajando na Leitura”. Durante as aulas nas ofici- nas integradas “Bordado” e “Arte e Educação”, os estudantes ideali- zam as histórias dos livros e criam as imagens dos persona- gens e cenário no pano. O resulta- do pode ser visualizado em obras lúdicas e próximas da realidade. De acordo com a monitora da oficina “Arte e Educação”, Ma- risa Santos Silva, o trabalho des- pertou nos alunos o interesse pela leitura e criou uma nova relação dos estudantes com os livros. “Agora eles têm preocupa- ção no cuidado porque se sentem donos dos livros. Além disso, o li- vro de pano desenvolve o sentido do tato na criança e consequente- mente o carinho pelo objeto. No papel a obra não é deles, agora no pano sim, e é inclusive motivo de orgulho para eles”, conta. Todo o conteúdo do livro é inspirado nas coleções literárias que os alunos leem como as fábu- las de Esopo. Com os textos sim- plificados, todas as histórias têm ao final uma moral que propõe ao leitor uma reflexão e melhora ou mudança de comportamento. BRINCADEIRA Ao mesmo tempo em que aprendem com os ensinamentos de cada história, os alunos tam- bém se divertem. Empolgada, a estudante Hillary Beatriz Rozen- do da Silva, de 9 anos, diz que o grande atrativo do ônibus é aliar a brincadeira com o estudo. "O que mais gostei foi de poder estudar lá também. É mui- to legal. Durante a viagem eu até brinco de escolinha lendo os livrinhos e contando as histórias para as minhas amigas", diz. Assim como para os de- mais colegas de viagem, os "livri- nhos de pano" é a preferência unânime de leitura para Luis Da- vi dos Santos, 11. O jovem que se considera "super agitado" afir- ma ter aprovado a ideia que ago- ra o mantém concentrado. "Os livrinhos são bem le- gais, gosto das histórias e do momento que estamos cons- truindo eles. Sentimos que são de verdade e nosso".BN Valdivo Pereira/Folha da Região - 26/04/2011 Música clássica MUDANÇA Alunos se concentram na leitura durante o trajeto da escola para a casa; eles ainda confeccionam os próprios livros e mostram com- portamento diferente desde que prática foi adotada literária Alunos idealizam histórias e criam imagem e cenário no pano Projeto do Peti leva o mundo da literatura para dentro do ônibus que transporta crianças e adolescentes; objetivo é transformar a leitura em hábito Com 25 anos de TV Cultura e 24 à frente do Prelúdio, pro- grama de calouros de música erudita, o maestro Júlio Meda- glia foi demitido pelo presiden- te da emissora, João Sayad. Decepcionado, diz que TV passa por desmonte. C3 C1 Araçatuba, quinta-feira, 28 de abril de 2011

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Araçatuba

Da Redação

[email protected]

Três horas. Esse era o tem-po total aproximado quecrianças e adolescentes

de 14 bairros de Araçatuba parti-cipantes do Peti (Programa deErradicação do Trabalho Infan-til) “perdiam” diariamente emconhecimento durante cada via-gem de uma hora e meia realiza-da para chegar até a escola e re-tornarem para suas casas ao fi-nal do dia.

Desde o início deste ano, po-rém, a realidade é outra. O proje-to “Viajando na Leitura”, criadopela educadora social JeacquelineBeatriz Gohl Ianner, que acompa-nha as crianças em sua jornadadiária de viagens, transformou oônibus em um agradável veículode transporte com um espaço in-te rno , onde imag inação ,interação e segurança se unempara garantir a todos momentosricos em aprendizado, integraçãoe entretenimento.

Jeaqueline conta que por serum percurso longo, as crianças eos adolescentes ficavam agitadospor não terem nenhuma ativida-de para desenvolver. “Isso faziacom que eles se movimentassemdentro do ônibus e não dava pa-ra segurar, afinal eles têm muita

energia”.Com o desafio de manter os

pequenos passageiros tranquilos eem segurança, aproveitando ain-da o tempo da viagem, a educa-dora trouxe o mundo da literatu-ra e informação para dentro doveículo.

Para selecionar os materiaisque integrariam o acervo do “Via-jando na Leitura”, foi realizadauma consulta juntos aos estudan-tes para identificar suas preferên-cias literárias. “Não impusemosnada. Colocamos coisas diferen-tes que pudessem chamar a aten-ção deles e os interessasse. Nossoobjetivo é mantê-los em seguran-ça e integrá-los”, explica.

ESTRUTURAEntre as produções estão li-

vros de fábulas de Esopo, recor-tes de revistas e jornais, livros depano confeccionados pelos pró-prios alunos, além de textos reti-rados da internet durante a ofici-na de inclusão digital realizadano programa.

Para comportar as obras, fo-ram fixados em cada banco doônibus porta-livros. Por já teremlugares fixos no veículo, os estu-dantes deixam em suas sacolas asobras e textos que lerão durantea viagem.

Jeaqueline relata que desdea criação do projeto os alunos

permanecem sentados durante to-do o trajeto. “A mudança decomportamento na viagem foiradical. Agora, a maioria fi-ca concentrada na lei-tura que começou ase tornar um há-bito na vidadeles”.

A edu-cadora afir-ma que opróximopasso se-r á acomprade dis-po s i t i -vos dej o g o sp o r t á -teis. “Te-mos quei n o v a rs e m p r e ,apresentarcoisas lúdi-cas e praze-r o s a s pa r aeles, a fim deque interajam unscom os outros eaprendam cada vezmais”, conclui.

Apesar de ser um projeto re-cente, os resultados já são visíveisna nova postura adquirida pelascrianças e adolescentes, segundo o

coor-d e n a -dor do Petiem Araçatuba,o psicólogo EdsonNeves Terra Junior.

Para ele, “Viajando na Leitu-ra” proporcionou aos alunos o de-senvolvimento do hábito e fluên-cia na leitura e acelerou o proces-so de alfabetização, além de for-necer condições para que elas ad-quiram de forma autônoma o co-nhecimento.

“Ficamos receosas delesnão aceitarem, entretanto, nossurpreendemos com o envolvi-mento. É algo que tem dadomuito certo. Agora, é analisar to-do o cenár io e fazermosreadaptações, apresentando sem-pre novidades”, destaca.

Terra afirma que o projetotambém está aberto para receberdoações de livros ou materiaisatrativos para as crianças. Os doa-dores interessados em conhecer aatividade também poderão acom-panhar uma viagem e fazer a en-trega das obras pessoalmente.

O Peti está situado na ruaFlorêncio de Abreu, 931, no Jar-dim Alvorada. O telefone de con-tato é o 3608-7270.

PROGRAMACriado pelo Ministério de

Desenvolvimento Social, o Peti

é um programa do governo fe-deral que atende atualmente820 mil crianças e adolescentescom idades entre 6 e 15 anosafastadas do trabalho infantilem mais de 3,5 mil municípios.

No período contrário aoque estão na escola, os estudan-tes permanecem no programaonde têm acesso à escola for-mal, saúde, alimentação, espor-t e , l a z e r , c u l t u r a eprofissionalização, além de con-vivência familiar e comunitárianas oficinas voltadas para ospais e a comunidade em geral.

EDUCAÇÃO

Viagem

Linha, agulha, pano, canetae muita criatividade. Estes são osmateriais e ferramentas emprega-dos pelos participantes do Peti(Programa de Erradicação do Tra-balho Infantil) em Araçatuba paraa criação dos livros de pano dispo-nibilizados no projeto “Viajandona Leitura”.

Durante as aulas nas ofici-nas integradas “Bordado” e “Artee Educação”, os estudantes ideali-zam as histórias dos livros ecriam as imagens dos persona-gens e cenário no pano. O resulta-do pode ser visualizado em obraslúdicas e próximas da realidade.

De acordo com a monitorada oficina “Arte e Educação”, Ma-risa Santos Silva, o trabalho des-pertou nos alunos o interesse pelaleitura e criou uma nova relaçãodos estudantes com os livros.

“Agora eles têm preocupa-ção no cuidado porque se sentemdonos dos livros. Além disso, o li-vro de pano desenvolve o sentidodo tato na criança e consequente-mente o carinho pelo objeto. Nopapel a obra não é deles, agorano pano sim, e é inclusive motivode orgulho para eles”, conta.

Todo o conteúdo do livro éinspirado nas coleções literáriasque os alunos leem como as fábu-las de Esopo. Com os textos sim-plificados, todas as histórias têmao final uma moral que propõe aoleitor uma reflexão e melhora oumudança de comportamento.

BRINCADEIRAAo mesmo tempo em que

aprendem com os ensinamentosde cada história, os alunos tam-bém se divertem. Empolgada, a

estudante Hillary Beatriz Rozen-do da Silva, de 9 anos, diz que ogrande atrativo do ônibus é aliara brincadeira com o estudo.

"O que mais gostei foi depoder estudar lá também. É mui-to legal. Durante a viagem euaté brinco de escolinha lendo oslivrinhos e contando as históriaspara as minhas amigas", diz.

Assim como para os de-mais colegas de viagem, os "livri-nhos de pano" é a preferênciaunânime de leitura para Luis Da-vi dos Santos, 11. O jovem quese considera "super agitado" afir-ma ter aprovado a ideia que ago-ra o mantém concentrado.

"Os livrinhos são bem le-gais, gosto das histórias e domomento que estamos cons-truindo eles. Sentimos que sãode verdade e nosso".BN

Valdivo Pereira/Folha da Região - 26/04/2011

Música clássica

MUDANÇA Alunos se

concentram na leitura durante

o trajeto da escola para a casa;

eles ainda confeccionam os

próprios livros e mostram com-

portamento diferente

desde que prática foi adotada

literária

Alunos idealizam histórias ecriamimagemecenárionopano

Projeto do Peti leva o mundo da literatura para dentro do ônibus quetransporta crianças e adolescentes; objetivo é transformar a leitura em hábito

Com 25 anos de TV Culturae 24 à frente do Prelúdio, pro-grama de calouros de músicaerudita, o maestro Júlio Meda-glia foi demitido pelo presiden-te da emissora, João Sayad.Decepcionado, diz que TVpassa por desmonte. C3

C1 Araçatuba, quinta-feira, 28 de abril de 2011