Oliviero Toscani e a relação entre suas peças e teoria da comunicação.
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES PÚBLICAS, PROPAGANDA E TURISMOTEORIA DA COMUNICAÇÃO
Prof. Vinícius
Oliviero Toscani e a relação entre suas peças e teoria da
comunicação.
Daniel Santa CruzNúmero USP - 6440451
Jean Michel Gallo Soldatelli Número USP - 6441052
SÃO PAULO, SETEMBRO/2008
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTESDEPARTAMENTO DE RELAÇÕES PÚBLICAS, PROPAGANDA E TURISMOTEORIA DA COMUNICAÇÃOProf. Vinícius
Oliviero Toscani e a relação entre suas peças e teoria da
comunicação.
Trabalho referente à disciplinade Teoria da Comunicação
do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo
da Escola de Comunicações e Artesda Universidade de São Paulo.
Orientado pelo professor Vinícius.Realizado pelos alunos
Jean Michel Gallo Soldatelli e Daniel Santa Cruz.
SÃO PAULO, SETEMBRO/2008
As fotos de Oliviero Toscani, utilizadas em campanhas publicitárias de
empresas como a Benetton possuem, fundamentalmente, o objetivo de chocar
e impressionar quem as vê. É uma forma de propaganda dirigida aos meios de
comunicação de massa; no entanto, as propagandas contendo suas fotos por
muitas vezes foram proibidas de serem veiculadas ou rejeitadas pelos meios
de comunicação, justamente devido ao seu potencial de chocar os públicos.
Dos veículos comumente utilizados, poucas revistas e jornais assumiram o
risco de mostrar esses anúncios, o outdoor e posteriormente a internet foram
os principais difusores de suas peças.
Os anúncios da Benetton, embora possuam pouco texto, expressam, em
sua imagem, toda a intenção de causar impacto pela polêmica que geram. Isso
comprova, portanto, o estudo de Watzlawick e Beavin que mostra que
aproximadamente 93% da comunicação é apreendida pela imagem, e apenas
7% pelas palavras: “O conceito mais amplo de letramento não desconsidera a
importância das palavras, mas aceita as outras formas de composição de
mundo...” 1. Em um mundo que se valoriza cada vez mais as imagens em
detrimento dos textos nas peças publicitárias, Toscani utilizou-se dessa
tendência para impactar o público com suas imagens polêmicas, porém não
deixa de lado frases de efeito e também utiliza o texto como suporte para sua
fotografia, explicando o contexto ao público, como na campanha feita em 2001
para o Ano Internacional dos Voluntários. Essa utilização de imagens como
ponto forte da divulgação e do “diálogo pouco convencional entre arte e 1 WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Jackson. Pragmática da comunicação humana. Cultrix: São Paulo, 1967.
publicidade” 2 é seu grande diferencial, principalmente para sua época,
podendo-se assemelhar seu trabalho na publicidade apenas com o de Barbara
Kruger 3.
Muitas de suas campanhas para Benetton principalmente fazem críticas
diretas, utiliza-se de uma imagem forte como meio de passar uma mensagem
mais forte ainda, como, por exemplo, na campanha que traz como assunto a
anorexia. Através dela, Toscani critica indiretamente os próprios meios de
comunicação de massa, freqüentemente associados com a criação e
imposição dos chamados padrões de beleza. Esses padrões levariam as
pessoas a se utilizarem de meios extremos para atingi-los, deixando de comer
por vários dias e correndo sérios riscos de morte.
Tanto a ideologia racista quanto o padrão de beleza socialmente aceito
são expressões da disseminação de idéias através dos meios de comunicação
de massa. Embora o racismo tenha sua origem na escravidão, foi através de
propagandas no regime nazista e no movimento do apartheid, por exemplo,
que ele encontrou, por assim dizer, pessoas que acreditassem nessas idéias e
as disseminassem. Por sua vez, os padrões de beleza, mesmo existindo desde
a antiguidade, só passaram a ser tão valorizados e “globalizados” depois da
criação dos veículos de comunicação de massa, como a televisão e o cinema.
2 SILVA, Vanessa R. de Lacerda E. Os Caminhos Entre a Arte e a Publicidade: da produção do discurso à construção do sentido – uma leitura das obras de Oliviero Toscani e Barbara Kruger.. Revista Espcom, número 1.
3 Artista norte-americana que utiliza de fotografias e colagens que tinha como base de suas obras as relações entre os gêneros e o consumo na sociedade capitalista.
E são temas como esses que Toscani utiliza em seus trabalhos
fotográficos: temas polêmicos, que, utilizando os meios de comunicação como
veículos, tendem a causar uma repulsa às idéias massificadas por eles. Essas
imagens acabam ficando na mente das pessoas que as vêem, geralmente
causando reações em seus complexos reptílicos, responsáveis por sensações
como medo e repulsa.
O coração, por si só, tornou-se um signo que representa a índole da
pessoa. Dessa maneira, ao colocar os corações no mesmo patamar, Toscani
utiliza-se desse signo para afirmar que a maldade e a bondade não são
intrínsecas a determinada etnia, como algumas ideologias procuram pregar,
ainda hoje.
Apesar disso, Toscani realiza uma campanha utilizando duas crianças,
uma negra e uma branca. A criança negra está com seus cabelos em forma de
chifres, e a criança branca possui cabelos louros que geram uma associação
automática aos anjos retratados em pinturas renascentistas. Essa campanha
teve grande repercussão, porque a associação da criança negra com o diabo e
da criança branca com um anjo vai de encontro a outros trabalhos de Toscani,
que procuram afirmar a igualdade entre as “raças”. É impossível saber, então,
qual foi a real intenção do fotógrafo ao criar essa campanha; pode ter sido
simplesmente a utilização de um estereótipo, ou mesmo a intenção pura e
simples de chocar pela contradição que apresenta.
Em outras campanhas, fica também patente essa impossibilidade de
saber qual a intenção de Toscani. Um exemplo disso é a foto na qual um padre
aparece beijando uma freira. Impossível dizer se a intenção do fotógrafo
italiano era criticar o celibato (ou mesmo a hipocrisia) ou simplesmente causar
um impacto nas pessoas. Porém, após receber o choque inicial vemos a cena
com outros olhos, mostrando o desejo de uma pessoa para a outra, desejo que
possuímos todos nós.
Para fazer uma crítica efetiva à sociedade, a primeira coisa que se deve
fazer é entendê-la, fazer uma análise profunda que possa revelar seus defeitos
e estereótipos para que possa usá-los. Assim como Morelli4 buscava os
menores detalhes para que pudesse fazer uma comparação minuciosa e definir
o autor da obra de arte, Toscani utiliza desta técnica para se aprofundar na
sociedade e ver seus defeitos sem conceitos prévios, assim consegue utilizar
os maiores envolvidos com esses defeitos para transmitir uma mensagem,
muitas vezes contra este defeito. Sua magia está exatamente em utilizar de
detalhes que muitas pessoas não se atrevem a conhecer (ou reconhecer) para
divulgar um problema, como na campanha em que utiliza o bumbum de um
bebê carimbada com os escritos “H.I.V. Positive” para expor a luta dos
soropositivos, ou quando dispõe apenas uma cruz judaica em meio a várias
cristãs, com um detalhe sutil que passa quase despercebido faz críticas
mesmo em um ponto sensível da sociedade.
No texto organizado por Eco e Sebeok é citado que “... para Freud os
detalhes são sintomas, para Sherlock Holmes são chaves de mistérios e para
Morelli são caracteres distintivos” 5. Entre as três definições, possivelmente a
4 WIND (1963. P. 32-51.) apud ECO e SEBEOK.5 ECO, Umberto; SEBEOK, Thomas A. O Signo de Três: Dupin, Holmes, Pierce. Editora Perspectiva.
primeira é a que mais se assemelha a ideologia do fotógrafo: ao ver problemas
da sociedade como o racismo ele enxerga e critica muito além: o racismo seria
apenas um sintoma de uma doença maior que engloba a intolerância, o
egoísmo e a hipocrisia de um povo que muitas vezes tem conhecimento de um
problema porém não se dispõe a resolvê-lo ou simplesmente debatê-lo.
Assim como os médicos, Toscani se preocupa muito em fazer um
diagnóstico de determinado problema, assim ele entende o passado e explica
o presente, visando criar um debate na sociedade para que no futuro esse
problema possa ser minimizado.
Outro ponto em comum entre o texto e as peças do fotógrafo é a
diferenciação por rastros culturais. O texto deixa bem claro que uma coisa é
analisar vestígios físicos, como pegadas e fezes, destes podemos tirar
conclusões com base na dedução, pois são iguais de indivíduo para indivíduo;
outra coisa é fazer uma analise de aspectos como a escrita ou a pintura pois
estes sofrem influências culturais. Justamente por utilizar destes aspectos em
comum entre todos os indivíduos para reportar diferenças em geral a obra de
Toscani se destaca. O coração, por exemplo, é um órgão comum a todos os
seres humanos, quando ele faz uso de três corações humanos expostos e
utiliza as palavras “Black”, “White” e “Yellow” busca desconstruir as
mentalidades racistas e etnocêntricas, colocando três etnias diferentes em um
mesmo patamar: se não houvesse tais palavras para discriminá-los, não
saberíamos diferenciá-los.
Toscani faz uma comunicação utilizando povos excluídos, porém voltada
para a sociedade como um todo: busca criar um choque e posteriormente
gerar uma discussão para que os olhos se voltem aos mesmos. Faz um estudo
da sociedade pelos seus sintomas, assim pode classificá-la e tentar curá-la,
não que essa seja a melhor forma, mas sim a forma de Oliviero Toscani achou
para tentar fazê-la.
Referências Bibliográficas:
ECO, Umberto ; SEBEOK, Thomas A. O Signo de Três: Dupin, Holmes, Pierce.
Editora Perspectiva.
SANTOS, João de Almeida. Oliviero Toscani: Considerações sobre um Intelectual-
Publicitário. <http://www.lxxl.pt/babel/biblioteca/toscani.html> Acesso em
04/09/08.
CALAZANS, Flávio. Midiologia da Benetton.
<http://www.duplipensar.net/principal/2004-04-benetton.html> Publicado em
29/04/04. Acesso em 03/09/08.
TOSCANI, Oliviero. A Publicidade é um cadáver que nos sorri. Rio de Janeiro:
Ediouro, 2002.