OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS E NÃO-A GRÍCOLAS: TRAJETÓRIA … · podem estar ocupadas ou desocupadas...

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CAPÍTULO 15 OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS E NÃO-AGRÍCOLAS: TRAJETÓRIA E RENDIMENTOS NO MEIO RURAL BRASILEIRO Brancolina Ferreira Otavio Valentim Balsadi Rogério Edivaldo Freitas Alexandre Nunes de Almeida 1 INTRODUÇÃO Este trabalho tem como embrião o artigo “Ocupação e renda no meio rural brasileiro”. 1 Ali, buscou-se traçar um comparativo abrangente da ocupação e renda no meio rural brasileiro, além de estimar as ocupações na agricultura familiar e as geradas pelo programa de reforma agrária. Já este segundo traba- lho tem dois objetivos mais pontuais: avaliar a distribuição das ocupações no meio rural brasileiro entre 1993 e 2004, em termos das atividades agrícolas e não-agrícolas; e confrontar os rendimentos auferidos em cada um dos casos. Vale lembrar que no primeiro trabalho procedeu-se a uma caracterização ampla da PEA 2 rural ocupada no país, momento em que foram efetuados diferentes recortes geográficos. Aqui, dados os objetivos mais circunscritos, as análises vão reportar-se de preferência ao Brasil como um todo. Além da presente Introdução, o texto é composto por mais cinco seções, que apresentam o estado da arte (Seção 2), a metodologia orientadora do tra- balho (Seção 3), os resultados obtidos (Seção 4) e as considerações finais. 2 OCUPAÇÃO E RENDA NO MEIO RURAL BRASILEIRO Para o estudo do espaço urbano se dispõe de uma ampla oferta de levantamen- tos estatísticos gerais e setoriais, tanto aqueles realizados pelo Instituto Brasi- leiro de Geografia e Estatística (IBGE), como outros desenvolvidos no âmbito de agências estaduais de pesquisa. Daí a diversidade analítica e as maiores possibilidades de acompanhamento sistemático das transformações em curso nas áreas urbanas. 1. Vide Ferreira et alii (2006), trabalho preparado para o livro “O Estado de Uma Nação 2006”, do Ipea. 2. A População Economicamente Ativa (PEA) compõe-se da parte da população adulta que representa a chamada força de trabalho. A PEA é constituída pelas pessoas à procura de trabalho em certo período, que sejam consideradas aptas para o trabalho (não-crianças) e que podem estar ocupadas ou desocupadas na economia [Mankiw (1995)].

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CAPÍTULO 15

OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS E NÃO-AGRÍCOLAS: TRAJETÓRIA ERENDIMENTOS NO MEIO RURAL BRASILEIRO

Brancolina FerreiraOtavio Valentim BalsadiRogério Edivaldo FreitasAlexandre Nunes de Almeida

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como embrião o artigo “Ocupação e renda no meio ruralbrasileiro”.1 Ali, buscou-se traçar um comparativo abrangente da ocupação erenda no meio rural brasileiro, além de estimar as ocupações na agriculturafamiliar e as geradas pelo programa de reforma agrária. Já este segundo traba-lho tem dois objetivos mais pontuais: avaliar a distribuição das ocupações nomeio rural brasileiro entre 1993 e 2004, em termos das atividades agrícolas enão-agrícolas; e confrontar os rendimentos auferidos em cada um dos casos.

Vale lembrar que no primeiro trabalho procedeu-se a uma caracterizaçãoampla da PEA2 rural ocupada no país, momento em que foram efetuadosdiferentes recortes geográficos. Aqui, dados os objetivos mais circunscritos, asanálises vão reportar-se de preferência ao Brasil como um todo.

Além da presente Introdução, o texto é composto por mais cinco seções,que apresentam o estado da arte (Seção 2), a metodologia orientadora do tra-balho (Seção 3), os resultados obtidos (Seção 4) e as considerações finais.

2 OCUPAÇÃO E RENDA NO MEIO RURAL BRASILEIRO

Para o estudo do espaço urbano se dispõe de uma ampla oferta de levantamen-tos estatísticos gerais e setoriais, tanto aqueles realizados pelo Instituto Brasi-leiro de Geografia e Estatística (IBGE), como outros desenvolvidos no âmbitode agências estaduais de pesquisa. Daí a diversidade analítica e as maiorespossibilidades de acompanhamento sistemático das transformações em cursonas áreas urbanas.

1. Vide Ferreira et alii (2006), trabalho preparado para o livro “O Estado de Uma Nação 2006”, do Ipea.

2. A População Economicamente Ativa (PEA) compõe-se da parte da população adulta que representa a chamada força de trabalho. A PEAé constituída pelas pessoas à procura de trabalho em certo período, que sejam consideradas aptas para o trabalho (não-crianças) e quepodem estar ocupadas ou desocupadas na economia [Mankiw (1995)].

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Assim, por exemplo, Menezes-Filho, Pichetti e Chahad (2003) estuda-ram as relações de ocupação na região metropolitana de São Paulo entre 1988e 1999, a partir de dados da Fundação Seade, e identificaram evidências derelação positiva entre educação, tempo de ocupação, idade e renda relativa,bem como maior duração de relação de ocupação no caso de homens, chefesde famílias e de trabalhadores mais qualificados.

Chahad (2003), também analisando o meio urbano, aponta a existênciade fatores que têm elevado por demais a vulnerabilidade de renda e de ocupa-ção para crescentes contingentes populacionais, a saber: a elevada rotatividadeda mão-de-obra, a reduzida produtividade de boa parte do trabalho disponí-vel, os relativamente baixos níveis de escolaridade e a expansão da informalidade.

Em se tratando do meio rural, a ocupação das pessoas nas atividadesagrícolas e não-agrícolas sempre foi e continua sendo uma questão relevante,mas nem sempre bem compreendida ao longo das mudanças pelas quais pas-sou o setor agropecuário brasileiro.

Nos Estados Unidos e Europa, é conhecido o processo de liberação (trau-mático em certos momentos) de mão-de-obra do campo para as cidades, nobojo dos processos de industrialização e urbanização que ocorreram naquelassociedades, sobretudo ao longo do século XIX.

No caso brasileiro, em especial no século passado, coube ao setoragropecuário atender certos requisitos no sistema econômico e social. Algunsdesses requisitos, tradicionalmente conhecidos como as funções clássicas daagropecuária, são: fornecer alimentos para a população total;3 fornecer capitalpara a expansão do setor não-agrícola; suprir mão-de-obra para o crescimentoe diversificação da economia; gerar divisas para a compra de insumos e bens decapital; e constituir-se em mercado para os produtos de outros setores da eco-nomia [Bacha (2004)].

Furtado (1980) já havia analisado o processo de extração de recursos reaisdo setor agropecuário ao longo da história econômica brasileira, listando osmotivos do êxito da empresa açucareira no Brasil colonial, a importância dodueto açúcar-pecuária no complexo econômico nordestino (sobretudo nosmomentos de crise), e a importância do chamado vazamento do capital cafeei-ro para outras atividades no desenvolvimento histórico de vários setores indus-triais e urbanos no Brasil do século XX. Em todos esses momentos, o setoragropecuário foi também central como fonte geradora de empregos na econo-mia brasileira.

3. Para uma análise do suprimento de alimentos no Brasil veja-se, por exemplo, Linhares e Teixeira da Silva (1981).

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Mais recentemente, Bacha (2004) destacou quatro mudanças estruturaisda economia brasileira com impactos associados ao setor agropecuário e ao seunível e forma de emprego, quais sejam:

a) Aumento da produtividade do trabalho: novos padrões tecnológicos edisponibilidade maior de maquinário aumentam o nível de produto portrabalhador;

b) Redução nas diferenças intersetoriais de produtividade do trabalho: aagropecuária é um setor no qual a produção tende a crescer substancial-mente ao passo que a população rural diminui;4

c) Modificações na estrutura da produção e da renda: há diminuição daimportância relativa da agropecuária na formação do Produto InternoBruto (PIB). Nos Estados Unidos, por exemplo, Jank (2002) já haviaenunciado tal fenômeno em relação ao agronegócio (complexo além daagropecuária), que passou de 30,8% do PIB norte-americano em 1947,para 8,6% em 1996;

d ) Alteração no uso da força de trabalho: simultânea à mudança de impor-tância relativa da agropecuária como fonte de emprego e/ou à crescenteurbanização da sociedade.

Embora se saiba que as transformações estruturais do sistema capitalistativeram forte impacto sobre o sistema produtivo agroalimentar, tanto em ter-mos de relações de produção quanto do papel reservado ao espaço rural,quantificações e análises mais específicas desses processos não estão sendo fei-tas com a necessária tempestividade. Há, no entanto, evidências de que o usointensivo do capital na agricultura tornou os agricultores mais dependentes defatores não-agrícolas (máquinas, equipamentos e insumos químicos), ao mes-mo tempo em que integrou a agricultura aos complexos agroindustriais, alte-rando progressivamente o seu papel na dinâmica produtiva das áreas rurais.

O caso da agropecuária é particularmente importante porque se trata doterceiro subsetor com maior geração de ocupações quando objeto de acrésci-mos na respectiva demanda final. Najberg e Pereira (2004) estimaram que umincremento de R$ 10 milhões (preços médios de 2003) na produção setorialimplicaria a geração de 828 ocupações na agropecuária, enquanto artigos devestuário e serviços prestados às famílias gerariam 1.000 e 1.080 ocupaçõessob a mesma hipótese, respectivamente.

4. No caso europeu, Jank et alii (2002) argumentam que durante as últimas quatro décadas a população européia aumentou em 18,1%em números absolutos, porém a população rural sofreu redução de 22,3%, e a população agrícola sofreu uma significativa queda de 75%.Atualmente, a população rural corresponde a 20% da população total, e a população agrícola a apenas 4% da população total, definindo-se a população rural como a parte da população que não reside nas áreas urbanas, enquanto a população agrícola é a parte da populaçãoque depende da agricultura como meio principal de sobrevivência econômica.

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Também responde por parcela importante do PIB [Maia et alii (2005)].De acordo com Guilhoto, Silveira e Azzoni (2004), em 2003, 30,6% da ren-da total da economia brasileira foram devidos ao agronegócio,5 considerando-se aí as empresas que fornecem insumos às unidades agropecuárias, as unida-des agropecuárias em si, as empresas processadoras de produtos agropecuáriose as empresas distribuidoras.

Em termos de divisas cambiais, as exportações agropecuárias têm respon-dido por cerca de 27% das receitas de exportações brasileiras, sendo responsá-vel por parcela significativa dos resultados positivos da balança comercial nopassado recente, conforme apresentado no gráfico a seguir.

GRÁFICO 1PARTICIPAÇÃO DA AGROPECUÁRIA NOS FLUXOS COMERCIAIS BRASILEIROS - 2003-2005

Fonte: Dados extraídos do Aliceweb. Acessível em: <http://aliceweb.mdic.gov.br/>.Obs. 1: Definição de produto agropecuário segundo especificado no Acordo Agrícola da Rodada do Uruguai.Obs. 2: As barras referem-se às transações com bens agropecuários (definição do Acordo Agrícola) em relação às transaçõesda economia brasileira como um todo.

No Brasil, em particular nos últimos anos, destacam-se alguns fenômenosimportantes, subjacentes às mudanças que ocorreram na ocupação das pessoasno meio rural. Entre os principais, observem-se a mecanização da produção e aintrodução de tecnologias poupadoras de mão-de-obra, a expansão de área pro-dutiva, o surgimento de novas culturas e variedades com distintos requisitos demanejo e, não menos importante, o cenário de abertura comercial e financeirada economia brasileira.

5. A metodologia de insumo-produto que gera esses resultados apoia-se nas ligações intersetoriais identificadas a partir das tabelas decontas nacionais brasileiras.

2005

2004

2003

0% 20% 40% 60% 80%

4%

29%7%

72%

29%5%

74%

27%

64%

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Nesse contexto, uma das questões em debate é a aparente dicotomia en-tre mão-de-obra de elevada qualificação e mão-de-obra de menor qualificação,em termos de substituição da última pela primeira. A difusão e oaprofundamento de técnicas de produção e manejo capital intensivas, sobre-tudo nas culturas vinculadas aos mercados internacionais como soja, algodão ecana-de-açúcar, estão relacionados ao aumento do tamanho médio das propri-edades rurais produtoras e ao aumento da produtividade por trabalhador,empregando-se volume menor de mão-de-obra, não raro sob a condição deelevadas cargas semanais de trabalho.6

Trata-se de um fenômeno inerente às discussões sobre ocupação e rendadas atividades agrícolas e não-agrícolas no Brasil, ou seja: o do padrão técnicohoje adotado, o qual incorporou o modus operandi cujo embrião esteve nasegunda Revolução Industrial. Segundo Schneider (2000), esse padrão incor-porou especialmente a motomecanização e a utilização de insumos de origemindustrial, como fertilizantes e defensivos químicos, em articulação com umsofisticado processo de seleção biológica de plantas e animais de alto rendi-mento, arcabouço que veio a ser conhecido como revolução verde [Goodmann,Sorj e Wilkinson (1990), Mazoyer e Roudart (1997)].

Ademais, há que se destacar também que a compreensão da agriculturaenquanto setor estratégico para a economia nacional deve considerar ao menosduas de suas principais esferas socioeconômicas: a da agricultura empresarial ea da agricultura familiar.

A agricultura familiar é um segmento importante do complexo maior daagropecuária, destacando-se por sua importância na geração de ocupação epela diversidade de produtos básicos de consumo alimentar que oferece. Estu-do recente mostra que cerca de 1/3 do agronegócio brasileiro se deve à produ-ção familiar e que o desempenho recente da agropecuária familiar e de todocomplexo a ela articulado tem sido positivo, inclusive com taxas superiores àsverificadas na esfera não-familiar [Guilhoto, Silveira e Azzoni (2004)].

Assim, dois movimentos parecem sobrepor-se. De um lado, a grande ecrescente participação de culturas de exportação – soja, algodão, café, laranja,e cana-de-açúcar, por exemplo – no volume produzido e na área colhida. Aomesmo tempo, há uma relativa concentração das pequenas propriedades nasregiões Sul e Nordeste, notabilizando-se unidades de agricultura familiar vol-tadas para o abastecimento doméstico.

6. No caso da soja e do algodão, isso significa aumento de carga horária para os operadores de maquinário. Já no caso da cana-de-açúcare da laranja, por exemplo, traduz-se em maior carga de esforço por trabalhador porque a remuneração é dada por volume produzido(volume cortado ou caixas colhidas, respectivamente).

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A interação e o resultado líquido desses elementos, em termos de ocupa-ção, constituem ponto fundamental relativamente à capacidade de o setoragropecuário reter mão-de-obra e sustentar renda no meio rural. Como exem-plo, Miranda (2003), estudando a viticultura do rio São Francisco, destacaque o crescimento do índice tecnológico provoca declínio do emprego atécerto ponto, após o que há aumentos no uso do fator trabalho.

A escassez de dados atualizados sobre os impactos, no setor agrícola, dastransformações tecnológicas e produtivas implementadas nos últimos anos – oCenso Agropecuário mais recente foi realizado em 1995/1996 – dificulta adelimitação de um quadro mais consistente sobre a evolução das ocupaçõesrurais, do peso relativo de cada categoria ocupacional e da composição darenda familiar dos domicílios rurais.

Da mesma forma ficam comprometidas as avaliações de caráter geral, ecom graus confiáveis de precisão, dos possíveis impactos de políticas voltadaspara o meio rural implementadas nos últimos dez anos, especificamente oPrograma Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf ) e areforma agrária.

Não obstante, o Censo Agropecuário (IBGE, 1995/1996) ainda serve dereferência para a quantificação e qualificação dos diferentes tipos de unidadesprodutivas rurais. Desde então, a área rural brasileira, os atores sociais e adinâmica socioeconômica nela presentes certamente sofreram modificações.No período 1995-2004 o Pronaf contabiliza cerca de 9,2 milhões de contra-tos de financiamentos rurais, sendo 74% para custeio e 26% para investimen-tos, o que deve ter contribuído para transformações econômicas e sociais.

Também o aumento dos assentamentos rurais da reforma agrária deve terimpactado as diversas esferas do mundo rural, criando novas ocupações e pos-sibilidades de geração sustentada de renda. Contudo, os dados específicos so-bre as ocupações e rendimentos auferidos pela reforma agrária carecem de umlevantamento geral. Estão disponíveis apenas alguns estudos de casos, não-exaustivos, inexistindo levantamentos que abarquem todo o conjunto das fa-mílias assentadas que, segundo levantamento recente do Sipra/Incra, somam602,7 mil famílias, distribuídas em 6.819 projetos.7

Por conta desses limitantes quanto a dados nacionais, muitos pesquisa-dores têm buscado compreender a natureza das transformações a partir deestudos regionais e/ou setoriais, ou através de estudos de caso. Alguns recentesexemplos nesse sentido são Alves e Santiago (2005), Cerqueira (2005), Vieirae Simon (2005), Arruda et alii (2005), Leite et alii (2004) e Ferreira e Silveira

7. Dados contabilizados até 17 de outubro de 2005.

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(2002). Além disso, outros trabalhos como Balsadi et alii (2002) e Belik et alii(2003) têm utilizado os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicí-lios (Pnad) como fonte alternativa de informações acerca da ocupação rural.

Mais pontualmente, Gasques e Conceição (2001) relacionam a saída detrabalhadores da agricultura a desacertos das políticas agrícolas, em especialentre 1970 e 1995. Segundo esses autores, ao longo do período citado, asprodutividades da terra e da mão-de-obra cresceram acima da produtividadetotal dos fatores no caso da agricultura brasileira. Nesse sentido, os autoressugerem que parte substancial do crescimento da produtividade do trabalhoestaria associada ao incremento da produtividade da terra, com reflexos sobreo emprego da agricultura.

Já Helfand e Rezende (2001) destacam o processo de crescimento dotamanho médio das explorações agrícolas, em especial nas áreas de milho efeijão, o que é importante para a geração de renda de inúmeros pequenosprodutores na agricultura brasileira. Entretanto, os estabelecimentos de gran-de porte estariam aumentando os rendimentos físicos em ritmo muito maisrápido do que o verificado nos pequenos estabelecimentos. Esse fenômenopode resultar numa perda de sustentabilidade dos pequenos produtores e emseu subseqüente afastamento da atividade agrícola ou pecuária.

Graziano da Silva e Del Grossi (2001a) alertam para o crescimento rela-tivo da renda dos grandes empregadores agrícolas, simultâneo ao decréscimodo número de produtores agropecuários nessa categoria. Nessa direção, iden-tificou-se um recuo generalizado no número de pessoas em todas as categoriasde pessoal ocupado no contexto agrícola, exceto para o grupo dos produtores“conta-própria” pluriativos8 com menos de dois hectares.

Tal decréscimo do número absoluto de pessoas nas categorias de pessoalocupado, bem como nas respectivas rendas do trabalho, já havia sido citado notrabalho de Delgado e Cardoso Jr. (2000). Para tais autores o setor agropecuárionacional viu-se desarticulado com o fim das políticas intervencionistas quevigoraram do pós-guerra até o final dos anos 1980, resultando claro impactosobre as condições de reprodução capitalista na agricultura brasileira.

Ainda sobre as novas condições, às quais a produção agropecuária brasi-leira se viu submetida na década passada, Homem de Melo (mimeo, s.d.)destaca a forte valorização cambial real até 1998 como fator de destaque paraa difícil situação vivida pelo setor agropecuário brasileiro em boa parte dadécada passada. Esse componente deve ter sido tanto mais problemático no

8. O surgimento e importância de famílias pluriativas no meio rural também já havia sido detectado por Schneider (2000), com foco no casodo Rio Grande do Sul.

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caso dos pequenos produtores, de regra impossibilitados de acessar instru-mentos financeiros e creditícios de natureza privada. Observe-se o Gráfico 2, aseguir, comparando-se os subperíodos 1997-2000 e 2001-2006.

GRÁFICO 2BRASIL: RENDA DOS PRINCIPAIS PRODUTOS AGRÍCOLAS

Fontes: LSPA/IBGE, dezembro/2005 e FGV – Preços Recebidos pelos Produtores, outubro/2005. Elaboração: José GarciaGasques (Mapa/Ipea).a Refere-se a prognóstico de safra.Obs. 1: Valores absolutos deflacionados pelo IGP-DI da FGV – dezembro/2005.Obs. 2: Algodão herbáceo (em caroço), amendoim (em casca), arroz (em casca), banana, batata inglesa, cacau, café (em coco),cana-de-açúcar, cebola, feijão (em grão), fumo (em folha), laranja, mamona (baga), mandioca, milho (em grão), pimenta-do-reino, soja (em grão), tomate, trigo (em grão), uva. 3.

Para Graziano da Silva (1997) não é mais possível entender o comporta-mento da ocupação rural apenas a partir do calendário agrícola e da flutuaçãodas áreas e da produção agropecuária. Um amplo conjunto de atividades não-agrícolas influencia, crescentemente, a atual dinâmica populacional do meiorural brasileiro. Nesse quadro, atividades de fundo de quintal, hobbies pessoaise pequenos estabelecimentos agropecuários intensivos teriam sido transforma-dos em fontes primárias de ocupação e renda no meio rural em anos recentes.9

Esse fenômeno já havia sido presenciado de longa data em áreas como oCanadá e a União Européia. Há inclusive políticas de subsídio e extensãorural explicitamente direcionadas à sustentação da renda oriunda da ativida-de agropecuária, conquanto reconhecendo-se o caráter paralelo das ativida-des não-agrícolas, importantes na complementação de renda do residente

9. As atividades aí compreendidas incluiriam piscicultura, horticultura, floricultura, fruticultura de mesa e criação de animais de pequenoporte ou para consumo regional. No caso da fruticultura de mesa, por exemplo, há regiões como Tabuleiro das Russas (RN) e Juazeiro/Petrolina (BA/PE) que, em certa medida, adequam-se a essa definição.

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no meio rural. Em especial na Europa unificada ainda prevalece a idéia deque parte da política de subsídios agrícolas tem a função de manter a popu-lação rural no campo, mitigando-se os efeitos e problemas decorrentes damigração campo-cidade.10

Outro ponto importante refere-se não apenas à alteração da dinâmica dedeslocamento campo-cidade, mas também à importância dos rendimentos deaposentados e pensionistas para as populações rurais [(Graziano da Silva e DelGrossi (2001b)]. Hoje, são centrais as transferências de renda (aposentadorias epensões) para os agricultores familiares, em especial na região Nordeste, a princi-pal região rural do Brasil. Esse fato tem sido comumente reportado como fonte desustentação econômica de muitos pequenos e médios municípios do Brasil.

Além disso, segundo esses mesmos autores, em seu trabalho de 2002, cha-ma a atenção o fato de que a participação das aposentadorias e pensões na rendadas famílias agrícolas é sempre maior que nas famílias pluriativas e não-agrícolas.

Em certa medida, esses trabalhos apresentam limitada capacidade paraassociar os impactos das políticas e dos processos de modernização da agricul-tura com caracterizações em nível nacional, dada a própria abrangência geo-gráfica trabalhada. Todavia, a compreensão dos problemas e temas estudadospermite que sejam feitas sugestões para o aperfeiçoamento das políticas – em-bora, na maioria das vezes, de caráter pontual ou especificamente voltadaspara aperfeiçoamentos da gestão.

No que diz respeito à manutenção e geração de ocupações e renda viaagricultura familiar e reforma agrária, uma caracterização mais detalhada podeser encontrada em Ferreira et alii (2006). Aí, os autores levantaram diversosestudos do tema e reportaram estimativas de criação e de sustentação de em-prego e renda via Pronaf e via projetos de assentamento da reforma agrária.Dado o delineamento desses programas, fica evidente que o potencial de gera-ção e de sustentação de ocupação no meio rural, em ambos os casos, não énada desprezível e deve ser tomado em conta numa estratégia maior de mitigaçãodos efeitos migratórios campo-cidade e em prol do bem-estar geral.11

3 ESTRATÉGIA METODOLÓGICA

Em linha com os objetivos desse trabalho, serão elaboradas estatísticas descri-tivas acerca da evolução das pessoas ocupadas na agropecuária. Os recortes

10. Um aprofundamento desse ponto foge ao escopo deste estudo. O leitor interessado encontrará maiores detalhes em Keeler (1996),Howarth (2000), Kaempfer, Tower e Willett (2002) e UKFG (2002).

11. Brevemente: há indícios de que cada operação de financiamento de crédito do Pronaf garante a manutenção de três empregos e ageração de 0,58 ocupação [Ibase (1999)]; além disso, no caso da reforma agrária, cerca de 80% dos moradores nos lotes de assentamentos,maiores de 14 anos, aí trabalhariam exclusivamente [Leite et alii (2004)].

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feitos observam a distribuição da população rural ocupada entre atividadesagrícolas e não-agrícolas, seu rendimento domiciliar médio em salários míni-mos e a participação de aposentados e pensionistas na força de trabalho ocupa-da no espaço rural.12

Já a estimação de rendimentos para as ocupações rurais agrícolas e não-agrícolas será realizada por meio de um procedimento econométrico.

De regra, os dados empregados serão os da Pnad, para os anos de1993 a 2004.

3.1 Estatísticas descritivas

A base de dados aqui empregada é a Pnad. Executada pelo IBGE, ela foi im-plantada progressivamente a partir de 1967 e trata-se de um sistema de pes-quisas por amostra de domicílios que investiga características como educação,trabalho, rendimento, migração e habitação.13

A pesquisa abrange a população residente nas unidades domiciliares (do-micílios particulares e unidades de habitação em domicílios coletivos). Aabrangência geográfica da Pnad ampliou-se gradativamente e apresenta a mes-ma estrutura entre 1981 e 2003, excluída somente a área rural da região Nor-te (com exceção do Estado do Tocantins). Em 2004, a Pnad incorporou toda aárea rural da região Norte no levantamento.

A expansão da amostra baseia-se em estimadores de razão cuja variávelindependente é a projeção da população residente, segundo o tipo de área(metropolitana e não-metropolitana). Essas projeções consideram a evoluçãopopulacional ocorrida entre os censos demográficos, sob hipóteses de cresci-mento associadas a taxas de fecundidade, mortalidade e migração. O desenhoamostral da pesquisa permite a expansão dos resultados para os níveis de país,grandes regiões, estados e áreas metropolitanas.14

Os anos de 1993 e 2004 foram escolhidos como pontos de observaçãoporque se entende que sejam fotografias representativas de dois momentosdistintos para a economia brasileira no passado recente.

12. Em particular no caso das remunerações, os números serão desagregados no sentido de se identificar os aposentados que se encontramem atividade laboral, fenômeno recorrentemente citado na literatura, sobretudo em termos do espaço rural [Camarano (2001)].

13. As características gerais de migração e de educação são pesquisadas para todas as pessoas, enquanto as características de trabalhoe rendimento são investigadas para as pessoas de dez anos ou mais de idade ou a partir de cinco anos, como aconteceu esporadicamenteem anos anteriores e anualmente a partir da Pnad 2001.

14. Detalhes sobre as características da Pnad podem ser encontrados em De Negri et alii (2001).

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O ambiente econômico vigente em 1993 ainda contemplava um cenárioinflacionário por resolver e uma série de políticas de desregulamentação que seconsolidaram na década passada ainda estavam em curso.15 Por sua vez, 2004constitui o último ano de Pnad disponível até o momento e assume-se que sejaum instante em que muitas das reformas empreendidas na década de 1990 jáestavam consolidadas. Além disso, trata-se de um ano já inserido na novamoeda, o real.

Como definição de pessoas ocupadas observaram-se as pessoas acima dedez anos que tinham um trabalho (remunerado ou não) na semana de referên-cia16 da pesquisa. A definição de espaço rural ou urbano e as definições para asocupações agrícolas ou não-agrícolas foram postas em anexo do texto, e respei-tam a categorização própria da Pnad.

A definição de rendimento mensal domiciliar empregada corresponde àsoma dos rendimentos mensais dos moradores do domicílio, exclusive os ren-dimentos das pessoas cuja condição no domicílio fosse pensionista, emprega-do doméstico ou parente do empregado doméstico. Nesse caso, o recorte to-mou por base a posição na ocupação no trabalho principal na semana dereferência da pesquisa para pessoas de dez anos ou mais, bem como a atividadedo trabalho principal no mesmo período.17

3.2 Equação de rendimentos e procedimentos econométricos

Para a estimação econométrica da equação de salário tanto para a força detrabalho agrícola como a não-agrícola da PEA rural, utilizou-se o procedimen-to de Heckman, fazendo uso da Pnad de 2004, recém publicada pelo IBGE.

Em primeiro plano, estima-se uma equação geral de rendimentos, atra-vés da qual a ocupação não-agrícola será diferenciada da ocupação agrícola pormeio de uma variável binária. Em seguida, são feitas análises desagregadas(agrícolas, não-agrícolas) para captar as particularidades dos dois subgruposestilizados no mercado de trabalho rural.

Para as análises desagregadas, segundo Heckman (1979), Kassouf (1994) eKassouf (1997) quando a amostra considera apenas os indivíduos que receberamsalário, uma estimação simples produziria estimadores tendenciosos. Assim, para

15. Sobre esse ponto Castelar Pinheiro, Giambiagi e Gostkorzewicz (1999) discutem a herança dos anos 1980 e os problemas deixados paraa década seguinte, frutos da estagnação econômica e da espiral inflacionária, assim como a primeira fase do Plano Real, levantando osêxitos da adoção de uma nova diretriz de política econômica – dentre os quais o combate à inflação é o mais expressivo – bem como osproblemas relacionados ao setor externo, à piora das contas públicas e à elevação da taxa de desocupação.

16. De regra, a última semana de setembro para aquele ano de observação.

17. Como em um dado domicílio podem ser encontradas diferentes categorias de ocupação e como o rendimento do domicílio é atribuídoa cada uma das categorias ali encontradas, os valores médios obtidos traduzem-se em certa superestimação para as categorias de menorrendimento e em alguma subestimação para as categorias melhor remuneradas.

456 Tecnologia, Exportação e Emprego

uma estimativa mais precisa acerca dos determinantes do salário, também se deve-ria considerar o custo de oportunidade dos indivíduos. Isto é, o indivíduo possuiimplicitamente um salário reserva diferente do observado, a partir do qual eledecide se participa ou não do mercado de trabalho. Neste caso, as taxas salariaistambém deveriam ser medidas com informações dos que não estão empregados,de modo a evitar o viés de seletividade amostral [Kassouf (1994)].

A estimativa baseia-se em duas análises, a oferta de trabalho e o saláriodos indivíduos. Primeiro, mede-se a probabilidade de um grupo de indivídu-os participarem ou não do mercado de trabalho através do modelo probit. Aseguir, realiza-se uma estimação tomando-se apenas os trabalhadores queauferiam salário com determinadas características socioeconômicas edemográficas, mais a inclusão de uma variável conhecida como Lambda ouinverso da razão de Mills, que corrige o viés de seletividade amostral e é geradaa partir dos coeficientes estimados pelo modelo probit.18

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Evolução recente das ocupações agrícolas e não-agrícolas no Brasil

A partir dos dados da Pnad/IBGE de 1993 a 2004, observa-se uma redução naPEA rural ocupada (Tabela 1). Para a análise dos dados agregados em nível deBrasil a melhor comparação seria 1993 contra 2003, por conta de que 2004 éo único ponto da série com dados das áreas rurais de toda região Norte,19 pois,até então, somente o Tocantins era pesquisado.

TABELA 1BRASIL: OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS E NÃO-AGRÍCOLAS NA PEA RURAL OCUPADA

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

Ano Agrícola (A) Não-agrícola (B) PEA Rural (C) Índice (C) A / (A+B) 1993 12.760.557 4.303.724 17.064.281 100 75% 1995 12.764.618 4.484.676 17.249.294 101 74% 1996 11.679.036 4.452.246 16.131.282 95 72% 1997 11.929.660 4.615.312 16.544.972 97 72% 1998 11.667.501 5.027.383 16.694.884 98 70% 1999 12.300.930 5.137.229 17.438.159 102 71% 2001 10.757.166 3.662.666 14.419.832 85 75% 2002 11.231.035 3.408.092 14.639.127 86 77% 2003 11.254.673 3.427.549 14.682.222 86 77% 2004 12.490.726 4.174.436 16.665.162 98 75%

18. As equações representativas do modelo de Heckman foram postas em anexo.

19. Ou seja, os Estados de Rondônia, Tocantins, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.

457Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

Entre 1993 e 2003, há dois movimentos básicos, nos intervalos de 1993a 1998 e de 2001 a 2003. O ano de 1999 pode ser considerado um anoatípico da série, em especial por conta de um evento de grande efeito sobre ascondições macroeconômicas de então. A desvalorização cambial do início da-quele ano muito provavelmente é fator de impacto para os níveis de empregoque se verificaram no meio rural para aquele exercício.

O subperíodo 1993-1998 configurou-se por sucessivas quedas na quan-tidade de pessoas em ocupações agrícolas no meio rural, enquanto o total deocupados não-agrícolas crescia. Já a partir de 2001, a trajetória foi de aumentono total de ambos os grupos, alertando-se novamente que os dados de 2004não são estritamente comparáveis aos dos demais anos.

Aqui, é preciso citar um fator não-econômico que aponta para a reduçãoda PEA no meio rural. Trata-se do avanço do perímetro urbano e do fenômenode emancipação de áreas municipais, o que acaba por converter áreas até entãorurais em espaços urbanos do ponto de vista da legislação.

Um ponto a ressaltar é a relativa estabilidade na proporção de ocupadosagrícolas entre os ocupados da PEA rural na década de 2000, cujo percentualtem estado em torno de 75% a 77%.

Nesse ponto, é também preciso assinalar que a variação intensa entre1999 e 2001 deve-se à base de amostragem do espaço rural pré e pós 2000.Antes de 2000, o enquadramento de uma área como rural dependia dosparâmetros definidos no Censo Demográfico de 1991, enquanto pós 2000 areferência passa a ser dada pelo Censo Demográfico de 2000.20

Ao mesmo tempo, no contexto das regiões brasileiras (Tabela 2), a pro-porção de ocupados agrícolas entre os ocupados da PEA rural mostra-se bas-tante diferenciada. Nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste (em especial) háuma perda de importância relativa das ocupações agrícolas.

Já na região Norte observou-se uma grande variabilidade do percentualde ocupados agrícolas na PEA rural, enquanto que a região Nordeste vem secaracterizando por uma importância crescente das ocupações agrícolas. Após2001, houve uma grande expansão no cultivo de grãos, oleaginosas e café nasáreas de cerrado da Bahia, Piauí e Maranhão, enquanto no Norte esse fenôme-no se deu em particular no sul do Pará e em Roraima.

20. “A comparação dos resultados da Pnad, a partir de 2001, com os das décadas anteriores deve levar em conta que a classificação dasáreas urbana e rural é feita de acordo com a legislação vigente por ocasião dos censos demográficos. Portanto, ainda que a legislação tenhaalterado a classificação de determinadas áreas no período intercensitário, a definição estabelecida por ocasião do Censo Demográfico 1991foi mantida para as pesquisas da Pnad, realizadas de 1992 a 1999 e, também, a classificação vigente por ocasião do Censo Demográfico2000 permanecerá para as pesquisas da Pnad desta década. Conseqüentemente, as estatísticas por situações urbana e rural não captamintegralmente a sua evolução, sendo que as diferenças se intensificam à medida que os resultados obtidos se afastam do ano de realizaçãodo censo demográfico que serviu de marco para a classificação da situação do domicílio” [IBGE (2004, p. 3)].

458 Tecnologia, Exportação e Emprego

TABELA 2PARTICIPAÇÃO DAS OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS NA PEA RURAL OCUPADA[em %]

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

4.2 Importância das ocupações rurais no Brasil

À parte os movimentos internos da PEA rural ocupada, é preciso referir algunsnúmeros sobre a sua importância em relação à população total brasileira e emrelação à população acima de dez anos.

Essa avaliação é ainda mais rica se feita por recortes como gênero, faixaetária e escolaridade da pessoa. Esse foi o caminho adotado observando-se ospercentuais de participação da PEA rural ocupada na população total e napopulação acima de dez anos em 1993 e em 2004. Para tais comparações,constatou-se que:

• há uma queda de participação da PEA rural ocupada na população totalem ambos os gêneros, queda essa também identificada em relação àpopulação acima de dez anos;

• há uma perda de participação da PEA rural ocupada em todas as faixasetárias comparáveis, seja em relação à população total ou à populaçãoacima de dez anos;

• há um comportamento miscellaneous relativamente à escolaridade. Em-bora haja perda de importância da PEA rural ocupada em alguns gruposde escolaridade, isso não se dá sempre. Em relação à população total,houve sustentação de participação nas faixas de quatro a sete anos deestudo e de 11 a 14 anos de estudo, bem como aumento de participaçãona faixa de oito a dez anos de estudo. Já em relação à população de maisde dez anos, houve estabilidade de participação nas faixas de quatro asete anos de estudo, 11 a 14 anos de estudo, e sem instrução e menos de

Ano Brasil Centro-Oeste Norte Nordeste Sudeste Sul

1993 75 81 72 72 73 81 1995 74 78 71 74 69 80 1996 72 73 71 73 68 76 1997 72 74 67 74 65 75 1998 70 70 62 71 63 74 1999 71 73 61 72 66 73 2001 75 74 77 77 67 78 2002 77 75 83 81 66 78 2003 77 74 83 81 65 77 2004 75 74 72 80 63 76

459Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

um ano de estudo, enquanto também ocorreu aumento de participaçãona faixa de oito a dez anos de estudo.

Em relação à escolaridade, ressalte-se que a PEA rural ocupada sustentaainda grande participação nas pessoas sem instrução e com menos de um anode estudo, conquanto sua parcela no contingente de pessoas com oito a dezanos de estudo tenha crescido e sua participação na categoria de um a trêsanos de estudo tenha se reduzido substancialmente. Esses movimentos po-dem estar sugerindo um sutil processo de aumento de escolaridade da PEArural ocupada, embora ainda exista um número relativamente grande de pes-soas ocupadas com nenhuma ou quase nenhuma instrução no meio rural bra-sileiro. Veja a Tabela 3, a seguir.

TABELA 3BRASIL: PARTICIPAÇÃO DA PEA RURAL OCUPADA NA POPULAÇÃO TOTAL – 1993 E 2004[em %]

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

4.3 Cenário das ocupações rurais em 1993 e 2004

Em primeiro lugar, há uma redução das ocupações agrícolas, mesmo com cres-cimento do plano de amostragem da Pnad, por conta da inclusão do Norterural na íntegra em 2004. Além disso, com exceção do Nordeste, nota-se umcrescimento das ocupações não-agrícolas.

Em 2004, o Nordeste concentrava a maior parcela da PEA rural ocupada(44,6%), sendo a principal região do país em termos do número de pessoasocupadas no meio rural, tanto em ocupações agrícolas como em ocupações

Na população total Na população acima de dez anos Gênero

1993 2004 1993 2004

Masculino 15 12 19 14 Feminino 9 7 11 8

Faixa etária

10 a 14 anos 10 6 10 6 15 a 18 anos 16 11 16 11 19 a 35 anos 15 12 15 12 36 a 55 anos 16 12 16 12 Acima de 56 anos 14 11 14 11

Escolaridade

Sem instrução e menos de 1 ano 10 9 23 23 1 a 3 anos 25 14 25 18 4 a 7 anos 12 12 12 12 8 a 10 anos 5 7 5 7 11 a 14 anos 4 4 4 4 15 anos ou mais 2 1 2 1

460 Tecnologia, Exportação e Emprego

não-agrícolas. Assim, quase a metade das ocupações agrícolas do Brasil encon-tra-se naquela região.

Outro ponto importante é o fato de que as regiões Sudeste e Sul parecemestar deslocando suas ocupações rurais para atividades não-agrícolas, com si-multânea perda de espaço das atividades agrícolas no total de pessoas ocupa-das nos respectivos meios rurais.

Já a amostragem plena da região Norte em 2004 revela que cerca de 12%das ocupações rurais brasileiras ali ocorrem, seja em atividades agrícolas comoem atividades não-agrícolas.

Veja as tabelas 4 e 5, a seguir.

TABELA 4COMPOSIÇÃO ABSOLUTA E PERCENTUAL DA PEA RURAL OCUPADA

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

O leitor interessado em uma abertura das ocupações agrícolas e não-agríco-las entre as grandes regiões brasileiras, recortadas para característicassocioeconômicas representativas, pode visitar o texto de Ferreira et alii (2006).Esse trabalho identifica as nuances regionais para diferentes categorias de ocupa-ção no meio rural, em avaliações por gênero e raça, escolaridade, e faixa etária.21

21. Houve muitas vezes uma distinção relativamente clara de perfil entre as regiões Sudeste e Sul face ao Centro-Oeste, Norte e Nordeste,particularmente realçada nas comparações junto ao Nordeste.

1993 2004 Brasil e regiões Agrícola Não-agrícola Total Agrícola Não-agrícola Total

Brasil 12.760.557 4.303.724 17.064.281 12.490.726 4.174.436 16.665.162 Norte 119.872 47.448 167.320 1.420.639 562.667 1.983.306

Nordeste 6.011.379 2.297.858 8.309.237 5.976.180 1.461.871 7.438.051 Sudeste 2.913.496 1.099.498 4.012.994 2.022.382 1.162.680 3.185.062 Sul 2.830.717 655.608 3.486.325 2.352.671 733.982 3.086.653 Centro-Oeste 885.093 203.312 1.088.405 718.854 253.236 972.090

1993 (%) 2004 (%) Brasil e regiões Agrícola Não-agrícola Total Agrícola Não-agrícola Total

Brasil 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Norte 0,9 1,1 1,0 11,4 13,5 11,9 Nordeste 47,1 53,4 48,7 47,8 35,0 44,6 Sudeste 22,8 25,5 23,5 16,2 27,9 19,1

Sul 22,2 15,2 20,4 18,8 17,6 18,5 Centro-Oeste 6,9 4,7 6,4 5,8 6,1 5,8

461Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

TABELA 5COMPOSIÇÃO ABSOLUTA E PERCENTUAL DA PEA RURAL OCUPADA (EXCETO NORTE)

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

4.4 Rendimento domiciliar médio em salários mínimos

Optou-se pelo uso do salário mínimo por conta da conhecida importância domesmo enquanto referência para as remunerações no meio rural. O uso dosalário mínimo como numerário do rendimento domiciliar médio permitefazer algumas observações adicionais entre os anos da análise e intergrupos deremuneração.22

Tanto em 1993 como em 2004, seja nas ocupações agrícolas como nasocupações não-agrícolas, nota-se que os maiores rendimentos domiciliaresmédios de regra ocorreram na classe dos empregadores, conquanto os empre-gadores das ocupações não-agrícolas sejam melhor remunerados que seus pa-res das ocupações agrícolas, exceção feita aos casos do Centro-Oeste agrícolaem 1993 e ao Sul agrícola em 2004. Esse ponto em particular alinha-se coma importância das ocupações agrícolas nas duas principais áreas produtoras decereais, leguminosas e oleaginosas do país, o Sul e o Centro-Oeste.

Ademais, a regra é que entre as categorias similares nas ocupações agrícolas enão-agrícolas predomina um maior rendimento domiciliar médio nessas últimas.

Conforme a Tabela 6, no caso das ocupações agrícolas, também são rela-tivamente maiores os rendimentos dos ocupados por conta própria em 1993,e dos empregados com carteira em 2004, esses últimos em especial nas regiõesCentro-Oeste e Nordeste. É de se notar também que, entre as ocupações agrí-colas, o conta-própria agrícola está recebendo menor número de salários míni-

22. Usou-se o valor do salário mínimo em setembro do ano em questão, 1993 ou 2004.

Brasil e Regiões 1993 2004

(exceto N) Agrícola Não-agrícola Total Agrícola Não-agrícola Total Brasil 12.640.685 4.256.276 16.896.961 11.070.087 3.611.769 14.681.856 Nordeste 6.011.379 2.297.858 8.309.237 5.976.180 1.461.871 7.438.051

Sudeste 2.913.496 1.099.498 4.012.994 2.022.382 1.162.680 3.185.062 Sul 2.830.717 655.608 3.486.325 2.352.671 733.982 3.086.653 Centro-Oeste 885.093 203.312 1.088.405 718.854 253.236 972.090 Brasil e Regiões 1993 (%) 2004 (%) (exceto N) Agrícola Não-agrícola Total Agrícola Não-agrícola Total Brasil 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Nordeste 47,6 54,0 49,2 54,0 40,5 50,7

Sudeste 23,0 25,8 23,7 18,3 32,2 21,7 Sul 22,4 15,4 20,6 21,3 20,3 21,0 Centro-Oeste 7,0 4,8 6,4 6,5 7,0 6,6

462 Tecnologia, Exportação e Emprego

mos em 2004 do que recebia em 1993, para todas as regiões brasileiras, exce-ção feita ao Norte do país.

TABELA 6COMPOSIÇÃO DA PEA RURAL OCUPADA AGRÍCOLA: RENDIMENTO DOMICILIARMÉDIO POR ATIVIDADE[em salários mínimos da época]

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.Obs.: O valor do salário mínimo em 1993 era CR$ 9.606,00, e em 2004 de R$ 260,00.

Em relação às ocupações não-agrícolas, nota-se que os empregados com car-teira e os militares são categorias também relativamente melhor remuneradas.

Acerca da região Nordeste, vale destacar que entre as ocupações agrícolasremuneradas houve em geral um crescimento da remuneração (em saláriosmínimos) de 1993 para 2004, contrariamente ao que se verificou para as ocu-pações não-agrícolas remuneradas.

Veja os números ilustrados na Tabela 7.

TABELA 7COMPOSIÇÃO DA PEA RURAL OCUPADA NÃO-AGRÍCOLA: RENDIMENTO DOMICILIARMÉDIO POR ATIVIDADE

(continua)

Não-agrícola 1993 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Brasil

Empregado com carteira 3,58 3,76 6,26 5,74 5,26 5,2 Militar - 8,08 6,98 3,81 8,31 7,02 Funcionário público estatutário 4,73 7,62 5,34 6,89 10,52 7,03 Outros empregados sem carteira 3,08 2 4,1 4,37 4,51 2,73 Sem declaração de carteira - 0,29 - - - 0,29 Trabalhador doméstico com carteira 2,56 11,47 3,06 4,03 3,58 4,31 Trabalhador doméstico sem carteira 3,26 4,07 2,84 4,05 4,92 3,65 Conta-própria 3,38 2,16 4,49 5,75 7 3,21

Agrícola 1993 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Brasil

Empregado com carteira 2,93 1,82 3,14 2,97 3,48 2,89 Outros empregados sem carteira 2,99 1,62 2,63 2,81 3,16 2,22 Conta-própria 2,85 1,88 3,58 5,4 4,01 3,24 Empregador 2,91 3,94 8,72 11,93 15,73 8,53 Trabalhador na produção para o próprio consumo 1,72 1,76 2,99 3,95 4,06 2,71

Não-remunerado 3,74 1,96 2,99 5,47 4,42 3,35 Agrícola 2004 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Brasil

Empregado com carteira 2,26 2,27 2,76 3,37 3,42 2,81 Outros empregados sem carteira 2,84 1,85 2,61 3,01 2,87 2,3 Conta-própria 2,88 1,8 3,43 4,47 3,21 2,76 Empregador 8,61 4,73 9,89 10,53 13,04 8,07 Trabalhador na produção para o próprio consumo 2,46 1,67 2,8 3,33 2,86 2,31 Não-remunerado 2,61 1,81 3,36 4,3 3,27 2,73

463Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

(continuação)

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.Obs.: O valor do salário mínimo em 1993 era CR$ 9.606,00, e em 2004 de R$ 260,00.

4.5 Aposentadorias e pensões no meio rural

Houve um expressivo crescimento do número de aposentados e/ou pensionis-tas que compõem a PEA rural ocupada, ou seja, pessoas aposentadas ou pensi-onistas que prosseguem trabalhando. Esse grupo passou de 1,48 milhão, para2,03 milhões, crescimento de 36,8%, conforme a Tabela 8.

O crescimento de participação de aposentados e pensionistas na PEArural ocupada associou-se ao aumento dos números absolutos de aposentadose/ou pensionistas a ela integrados. Entre os dois anos da análise, no segmentorural não-agrícola, houve um incremento de cerca de 52 mil pensionistas ouaposentados na PEA rural ocupada. Esse fenômeno ocorreu de forma generali-zada entre as categorias de remuneração da PEA rural não-agrícola.

Já no segmento agrícola essa cifra foi de 493 mil pessoas, notabilizando-seacréscimos expressivos entre os conta-própria, empregadores e trabalhadores naprodução para o próprio consumo. Isso evidencia que a maior parte da elevaçãode 36,8% do número de aposentados/pensionistas que passaram a compor aPEA rural ocupada entre 1993 e 2004, deu-se em ocupações agrícolas.

Entre 1993 e 2004, do lado das ocupações agrícolas, observou-se um aumentode 5 pontos percentuais (p.p.) – 10% para 15% – na parcela de aposentados epensionistas na PEA rural. Já no universo das ocupações não-agrícolas, esse incre-mento foi de 2 p.p. (de 3% para 5%) no mesmo corte de observação. Em termosagregados, a parcela devida aos aposentados e pensionistas na PEA rural ocupadasubiu de 9% para 12% entre 1993 e 2004, de acordo com os dados da Tabela 9.

Não-agrícola 1993 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Brasil

Empregador 3,57 10,17 16,85 12,09 15,67 13,37 Trabalhador na produção para o próprio consumo 2,64 1,06 2,32 2,61 1,62 1,4 Não-remunerado 3,67 2,2 6,33 7,49 5,36 3,86

Não-agrícola 2004

Empregado com carteira 5,48 3,16 4,63 5,41 4,65 4,6 Militar 7,89 8,78 9,55 2,61 9,42 8,17 Funcionário público estatutário 5,61 3,48 7,65 6,54 7,06 5,5 Outros empregados sem carteira 3,43 2,5 3,96 4,88 4,26 3,4 Trabalhador doméstico com carteira 2,27 2,44 3,31 3,48 3,17 3,19 Trabalhador doméstico sem carteira 2,32 1,9 2,77 3,3 2,79 2,52 Conta-própria 4,14 2,34 4,75 4,89 4,47 3,6 Empregador 13,62 5,67 14,9 9,94 13,26 11,72 Trabalhador na construção para o próprio uso 2,24 1,47 1,46 1 2,42 1,7 Não-remunerado 5,11 2,33 7,27 5,09 6,84 4,17

464 Tecnologia, Exportação e Emprego

TABELA 8OCUPADOS DA PEA RURAL: POSIÇÃO E CATEGORIA DE OCUPAÇÃO ENTRE OS QUERECEBEM APOSENTADORIA E/OU PENSÃO

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

TABELA 9PROPORÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS NA OCUPAÇÃO DA PEA RURAL[em %]

(continua)

1993 Agrícola Não-agrícola Total Empregado com carteira 12.101 20.008 32.109 Funcionário público estatutário - 7.475 7.475 Outros empregados sem carteira 96.674 20.902 117.576 Trabalhador doméstico com carteira - 3.277 3.277 Trabalhador doméstico sem carteira - 10.386 10.386 Trabalhador doméstico sem declaração de carteira - 813 813 Conta-própria 591.575 72.795 664.370 Empregador 57.095 3.058 60.153 Trabalhador na produção para o próprio consumo 404.289 4.632 408.921 Não-remunerado 172.086 6.419 178.505 Total 1.333.820 149.765 1.483.585

2004 Agrícola Não-agrícola Total Empregado com carteira 10.086 22.709 32.795 Funcionário público estatutário - 13.917 13.917 Outros empregados sem carteira 71.752 31.449 103.201 Trabalhador doméstico com carteira - 6.575 6.575 Trabalhador doméstico sem carteira - 24.359 24.359 Conta-própria 730.967 86.806 817.773 Empregador 92.291 5.518 97.809 Trabalhador na produção para o próprio consumo 691.176 - 691.176 Trabalhador na construção para o próprio uso - 796 796 Não-remunerado 230.639 9.955 240.594 Total 1.826.911 202.084 2.028.995

1993 Agrícola Não-agrícola Total Empregado com carteira 2 2 2 Funcionário público estatutário - 3 3 Outros empregados sem carteira 4 2 4 Trabalhador doméstico com carteira - 4 4 Trabalhador doméstico sem carteira - 2 2 Trabalhador doméstico sem declaração de carteira - 34 34 Conta-própria 19 6 15 Empregador 22 5 18 Trabalhador na produção para o próprio consumo 21 13 21 Não-remunerado 4 2 4 Total 10 3 9

2004 Agrícola Não-agrícola Total Empregado com carteira 1 2 2 Funcionário público estatutário - 4 4

465Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

(continuação)

,

Fontes: Tabulações especiais da Pnad/IBGE de 1993 a 2004.

4.6 A equação de rendimentos

A Tabela 10 a seguir reporta-se aos diferenciais de salários, através dos quais asocupações agrícolas e não-agrícolas foram diferenciadas apenas e tão somenteatravés de uma variável dummy.

TABELA 10DIFERENCIAIS DE SALÁRIOS PARA O TRABALHO AGRÍCOLA E NÃO-AGRÍCOLA – 2004

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes.Obs.: Modelo de Heckman considerando toda a população rural acima de dez anos (ocupados agrícolas e não-agrícolas, não-ocupados, e pessoas procurando emprego).

Outros empregados sem carteira 4 4 4 Trabalhador doméstico com carteira - 4 4 Trabalhador doméstico sem carteira - 5 5 Conta-própria 21 9 18 Empregador 32 6 26 Trabalhador na produção para o próprio consumo 31 - 31 Trabalhador na construção para o próprio uso - 12 12 Não-remunerado 6 5 6 Total 15 5 12

Trabalhador rural (agrícola e não-agrícola)

Faixa Etária 1 (= 1 se o indivíduo tem entre 14 e 20 anos) -27,90 Faixa Etária 2 (= 1 se o indivíduo tem entre 21 e 35 anos) -16,89 Faixa Etária 3 (= 1 se o indivíduo tem entre 36 e 50 anos) -4,65 Faixa Etária 4 (= 1 se o indivíduo tem entre 51 e 60 anos) - Branca (= 1 se o indivíduo é da raça branca ou amarela) - Preta (= 1 se o indivíduo é da raça preta) -9,81 Parda (= 1 se o indivíduo é da raça parda ou indígena) -9,77 Norte (= 1 se o indivíduo se localiza na região N) -2,80 Nordeste (= 1 se o indivíduo se localiza na região NE) -42,55 Sul (= 1 se o indivíduo se localiza na região S) -5,24 Sudeste (= 1 se o indivíduo se localiza na região SE) -20,35 Centro-Oeste (= 1 se o indivíduo se localiza na região CO) - Educ4 (= 1 se o indivíduo tem menos de 4 anos de estudo) -40,95 Educ10 (= 1 se o indivíduo tem entre 4 e 10 anos de estudo) -27,25 Educ14 (= 1 se o indivíduo tem entre 11 e 14 anos de estudo) - Educ15 (= 1 se o indivíduo tem mais de 15 anos de estudo) 98,44 Gênero (= 1 se o indivíduo é do gênero masculino) 16,27 Ocup1 (= 1 se é empregado com carteira) - Ocup2 (= 1 se é empregado sem carteira) -27,78 Ocup3 (= 1 se é conta-própria) -27,59 Ocup4 (= 1 se é empregador) 59,40 Tagri (= 1 se é trabalhador de ocupação agrícola) -19,94

466 Tecnologia, Exportação e Emprego

Dada a faixa etária, os rendimentos são maiores para os trabalhadores emidade mais avançada (51 a 60 anos), notabilizando-se diferenciais sucessiva-mente maiores em relação às classes de trabalhadores mais jovens. Já em ter-mos de cor do trabalhador, há diferenciais de salários positivos para os traba-lhadores brancos relativamente aos pretos e pardos.

A localização geográfica também é fator que denota uma diferenciaçãosalarial, pontuada por rendimentos superiores no caso do Centro-Oeste. Éinteressante notar que há diferenciais expressivos em relação ao Sudeste e aoNordeste (sobretudo), mas diferenciais curiosamente modestos na compara-ção dos trabalhadores rurais do Centro-Oeste com os do Norte do país.

A análise de escolaridade sustenta resultados já discutidos na literatura,em linha com remunerações superiores para os perfis mais altos de escolarida-de. Assim, os diferenciais de salário em favor das pessoas com entre 11 e 14anos de estudo caem quando as pessoas estudam mais, de tal forma que otrabalhador com nível superior ganha substancialmente mais (quase o dobro)que os que têm o ensino médio.

Também a condição de empregador mostrou-se com diferencial salarialpositivo em relação às demais categorias do tipo de ocupação (funcionáriopúblico ou com carteira, sem carteira e conta-própria).

Por fim, observou-se que o trabalhador de ocupações agrícolas recebecerca de 20% a menos que o trabalhador de ocupações não-agrícolas (catego-ria omitida). A ocupação rural não-agrícola é aquela exercida por pessoas resi-dentes na área rural em atividades fora da agricultura, sejam elas desenvolvidasna área rural ou na urbana. Por isso, o fato de as pessoas residirem no meiorural não significa que exerçam suas atividades no meio rural. Logo, um pe-dreiro, uma empregada doméstica ou até mesmo um empresário que declareresidir no meio rural pode perfeitamente trabalhar no centro urbano próximo.

Em realidade, os números da Tabela 10 representam uma boa aproxima-ção; porém, as diferenças entre as ocupações agrícolas e não-agrícolas pedemum maior detalhamento da análise, de modo a comparar os rendimentos eperfis diferenciados entre os dois grupos e dentro deles.

Nesse sentido, e com maior completude, foram estimadas equações espe-cíficas para os trabalhadores agrícolas e não-agrícolas, de modo a ser possívelcomparar as duas situações bem como o impacto dos diversos perfissocioeconômicos na ocupação e renda em cada caso.

467Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

Para tal, utilizaram-se dois arquivos para estimar a equação de salário, umpara trabalhadores agrícolas e outro para trabalhadores não-agrícolas, nos quaisse incluem indivíduos entre 14 e 60 anos de idade.23

Na primeira amostra, constam 21.250 observações de trabalhadores ocu-pados no setor agrícola (recebendo salário ou não) mais 9.456 indivíduos não-ocupados e também aqueles que estavam procurando ocupação. A amostracompleta totaliza 30.706 observações. Na segunda estimação de salário paraos trabalhadores não-agrícolas, além das 7.920 observações de ocupados (rece-bendo salário ou não) foram também incluídos os mesmos 9.456 indivíduosda amostra anterior totalizando 17.376 pessoas.

Assim, nas duas análises, ao estimar o salário consideram-se as caracterís-ticas de todos os residentes no meio rural, que estão ou que poderiam estar nomercado de trabalho, tanto agrícola como não-agrícola.

Na construção das duas amostras, foi considerado como variável depen-dente o rendimento do trabalho principal na forma de salário ou venda de pro-dutos ou mercadorias mais os rendimentos provenientes de outros trabalhos.

A média, o desvio padrão e a descrição de cada variável usada na estima-ção estão apresentados nas Tabelas 11 e 12.

Na abertura da Tabela 11, que reporta a média e desvio-padrão das vari-áveis sociais utilizadas, observa-se que 64% dos trabalhadores agrícolas são dogênero masculino e entre os trabalhadores não-agrícolas, 52%. Para os semocupação apenas 23% são do gênero masculino.

Analisando a raça, para os três grupos de pessoas, praticamente 50% ouum pouco mais se autoclassificaram como pardos em 2004.

Com relação à localização geográfica dos indivíduos, quase 50% dos tra-balhadores exercendo ocupação agrícola e o grupo com aqueles sem ocupaçãoou procurando ocupação estão localizados na região Nordeste. Entre os ocu-pados para trabalhos não-agrícolas, 34% e 29% estão, respectivamente, nasregiões Nordeste e Sudeste.

A população rural jovem e adulta apresenta escolaridade baixa, principal-mente entre os trabalhadores agrícolas. Observa-se que praticamente 50% possu-em somente até quatro anos de estudo. Entre os trabalhadores não-agrícolas, onível de escolaridade melhora um pouco com mais da metade dessa força de traba-lho incluída entre quatro e dez anos de estudo ou equivalente ao primeiro grau.

23. A escolha da faixa de idade baseou-se na idade de trabalho permitida por lei. Para indivíduos entre 14 e 15 anos, o trabalho é proibido,salvo na condição de aprendiz; contudo, a entrada no mercado de trabalho desse grupo se dá muito precocemente, sobretudo no meio rural,onde as oportunidades de freqüentar a escola são menos numerosas em muitas regiões do país.

468 Tecnologia, Exportação e Emprego

TABELA 11MÉDIA E DESVIO-PADRÃO DAS VARIÁVEIS PARA TODA A POPULAÇÃO RURAL(14 A 60 ANOS) – 2004.

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes.

No status domiciliar, em ambos os grupos de trabalhadores não se obser-vam grandes diferenças. Um pouco mais de 40% dos indivíduos dos dois tiposde mão-de-obra são considerados chefes e ao redor de 30% da PEA rural ocu-pada (agrícola e não-agrícola) é classificada como cônjuge. No grupo de pesso-as sem ocupação, prevalecem os cônjuges e filhos, grupo composto majoritari-amente por mulheres.

Trabalhador agrícola

Trabalhador não-agrícola

Sem ocupação Variável Descrição das variáveis

média desvio-padrão

média desvio-padrão

média desvio-padrão

Gênero =1 se é do gênero masculino 0,64 10,54 0,52 10,82 0,23 9,19 Branca =1 se é da raça branca ou amarela 0,40 10,72 0,47 10,80 0,38 10,60 Preta =1 se é da raça preta 0,04 4,53 0,05 4,51 0,05 4,74 Parda =1 se é da raça parda ou indígena 0,56 10,88 0,49 10,82 0,57 10,80 Norte =1 se o indiv está localizado na reg N 0,11 6,91 0,13 7,34 0,11 6,74 Nordeste =1 se o indiv está localizado na reg NE 0,47 10,94 0,34 10,27 0,49 10,90 Sudeste =1 se o indiv está localizado na reg SE 0,17 8,21 0,29 9,82 0,24 9,26 Sul =1 se o indiv está localizado na reg S 0,19 8,55 0,17 8,17 0,11 6,83 Coeste =1 se o indiv está localizado na reg CO 0,06 5,28 0,06 5,28 0,06 5,14 Educ4 =1 se tem menos de 4 anos 0,49 10,95 0,27 9,58 0,36 10,45 Educ10 =1 se tem entre 4 e 10 anos 0,47 10,94 0,52 10,82 0,56 10,81 Educ14 =1 se tem entre 11 e 14 anos 0,04 4,15 0,19 8,54 0,08 5,77 Educ15 =1 se tem mais de 15 anos 0,00 0,81 0,02 2,97 0,00 1,27 Chefe =1 se é chefe 0,41 10,77 0,43 10,71 0,12 6,97 Cônjuge =1 se é cônjuge 0,27 9,77 0,30 9,88 0,41 10,71 Filho =1 se é filho 0,29 9,94 0,25 9,37 0,43 10,78 Parente =1 se é outro parente 0,03 3,56 0,03 3,43 0,05 4,82 Crianças =1 se tem crianças até 5 anos 0,65 10,42 0,63 10,47 0,69 10,12 Faixa Etária 1 =1 se o indivíduo tem entre 14 e 20 anos 0,20 8,79 0,16 7,87 0,41 10,74 Faixa Etária 2 =1 se o indivíduo tem entre 21 e 35 anos 0,35 10,44 0,44 10,75 0,32 10,15 Faixa Etária 3 =1 se o indivíduo tem entre 36 e 50 anos 0,29 9,98 0,32 10,07 0,17 8,14 Faixa Etária 4 =1 se o indivíduo tem entre 51 e 60 anos 0,16 7,94 0,08 6,01 0,10 6,58 Rntraba = 1 se tinha renda não oriunda do

trabalho 0,20 8,72 0,14 7,56 0,24 9,27

469Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

Dentre todos os entrevistados da pesquisa, entre a PEA rural ocupada eaqueles que procuraram ocupação ou não (sem ocupação), perto de 65% de-clararam que em suas residências há crianças de até cinco anos. Acredita-seque essa variável também tem um peso na determinação dos indivíduos parti-ciparem ou não do mercado de trabalho [Kassouf (1997)].

Com relação ao perfil etário da força de trabalho, para os trabalhadoresagrícolas e não-agrícolas a proporção de 21 a 50 anos era, respectivamente, de64% e 76%. Como se nota, a força do trabalho agrícola possui um contingen-te ainda bastante jovem; contudo, há também um percentual mais elevado deindivíduos de maior idade nas vésperas da aposentadoria (faixa 4) em ativida-des agrícolas do que em atividades não-agrícolas e sem ocupação.

Cerca de 20% da força de trabalho agrícola possui rendimentos oriundosde fontes que não o trabalho (principal e outros). Esses rendimentos incluemas aposentadorias e pensões. Na força de trabalho não-agrícola, 14% possuemrendimento não oriundo do trabalho e entre as pessoas desocupadas ou procu-rando ocupação, 24% auferem esse tipo de rendimento.

A Tabela 12 apresenta algumas características econômicas dos trabalha-dores ocupados agrícolas e não-agrícolas.

TABELA 12MÉDIA E DESVIO-PADRÃO DAS VARIÁVEIS – 2004.

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes.

Variável Descrição das variáveis Trabalhador não-agrícola

Trabalhador agrícola

média desvio-padrão

média desvio-padrão

Ocup1 =1 se é empregado com carteira 0,37 10,48 0,08 5,79 Ocup2 =1 se é empregado sem carteira 0,34 10,28 0,18 8,47 Ocup3 =1 se é conta-própria 0,22 8,92 0,25 9,49 Ocup4 =1 se é empregador 0,02 2,95 0,02 2,81 Ocup5 =1 se é sem remuneração ou

trab p/ próprio uso/consumo 0,05 4,59 0,47 10,94

Rend = 1 se tinha rendimento do trab

na semana referência 0,95 4,71 0,52 10,95

Salari Salário médio do trabalho principal 409,94 11.401,98 359,12 16.103,78 Salari2 Salário médio de todos os trabalhos 428,18 13.401,46 378,35 17.299,47 Lsalari Logaritmo da variável salari2 5,60 20,37 5,45 19,94 Horas Horas semanal do trabalho principal 39,70 325,74 35,73 367,43 Horas2 Horas semanal de todos os trabalhos 40,57 335,86 37,08 382,21 Lhora Salário-hora de todos os trabalhos 2,74 88,84 2,06 97,09 Lsaho Logaritmo do salário-hora de todos os trabalhos 0,63 18,20 0,28 17,88

470 Tecnologia, Exportação e Emprego

Entre as pessoas de 14 a 60 anos da força de trabalho agrícola, 53% estãoempregadas ou exercem atividades como conta-própria e 47% não têm remu-neração ou trabalham na produção para o próprio consumo. Nesse caso, éimportante ressaltar que grande parte desse contingente é de jovens que traba-lham auxiliando seus pais, cuja condição ocupacional é principalmente deconta-própria.

Para os trabalhadores não-agrícolas que residem nas áreas rurais, embora37% trabalhem com carteira assinada, 34% não possuem carteira e estão nainformalidade do mercado de trabalho. Esse grupo também cresce ao considerarindivíduos que exercem atividades não-agrícolas na condição de conta-própria.

Dado que na força de trabalho agrícola há um número grande de pessoas(em especial jovens) sem remuneração, diferentemente do que ocorre entre ostrabalhadores não-agrícolas, apenas 52% recebeu em setembro de 2004 al-gum rendimento oriundo do trabalho principal.

Já ao comparar os salários de ambos os grupos de trabalhadores, os trabalha-dores agrícolas auferem um rendimento inferior (R$ 378,35) ao dos trabalhado-res não-agrícolas (R$ 428,18). Contudo, o número de horas trabalhadas na sema-na por esses (40,57h) é maior que entre os trabalhadores agrícolas (37,08h).

Isto posto, os resultados econométricos estão reportados da seguinte or-dem: a) equação medindo a participação no mercado de trabalho agrícola enão-agrícola com toda a população rural entre 14 e 60 anos; b) equação desalário corrigido pelo procedimento de Heckman com apenas quem recebeusalário; c) tabela com os diferenciais de salários com base nos coeficientes esti-mados na equação de Heckman.24

A Tabela 13 apresenta os resultados dos efeitos marginais do modeloprobit com as probabilidades de os indivíduos participarem ou não participa-rem do mercado de trabalho agrícola e não-agrícola. Se o indivíduo recebeusalário assume-se valor 1, e se não recebeu, 0.

Pelos resultados pode-se observar que os jovens (14 a 20 anos) têm me-nor probabilidade de participar do mercado de trabalho (tanto agrícola comonão-agrícola) do que os mais velhos (51 a 60 anos, classe omitida).

Os indivíduos entre 21 e 50 anos, em ambos os tipos de trabalho, têmmaior probabilidade de trabalhar do que aqueles com 51 a 60 anos. Essesnúmeros coincidem com o argumento da depreciação do fator trabalho quan-do do avanço da idade.

24. Todas as equações (probit e Heckman) foram ponderadas pelo fator de expansão da amostra da Pnad 2004.

471Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

TABELA 13EFEITOS MARGINAIS DO MODELO PROBIT SOBRE A PARTICIPAÇÃO (=1) OU NÃO (=0)NO MERCADO DE TRABALHO PELA POPULAÇÃO RURAL – PESSOAS ENTRE 14 E 60ANOS – 2004

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes.*, ** e *** representam níveis de significância de 10%, 5% e 1%, respectivamente, e n.s. não-significativo a 10%.Obs.: os testes z estão entre parênteses, ao lado dos coeficientes.

Quanto à raça dos indivíduos, à procura de efeitos discriminatórios nomercado de trabalho, os resultados se mostraram bastantes interessantes paraas duas equações propostas. Por exemplo, pretos e pardos têm maior probabi-lidade do que os brancos de participar do mercado de trabalho agrícola. Noentanto, esses dois grupos têm menor probabilidade que os brancos de parti-cipação no mercado de trabalho não-agrícola. Assim, pelo modelo proposto,

Não agrícola Agrícola

Variável Efeitos Marginais Variável Efeitos Marginais

Faixa etária 1 -0,1913*** Faixa etária 1 -0,188***

Faixa etária 2 0,0845*** Faixa etária 2 0,005

Faixa etária 3 0,1644*** Faixa etária 3 0,067*** Cor Preta -0,0452** Cor Preta 0,071***

Cor Parda -0,0206** Cor Parda 0,032*** Norte 0,0058 Norte -0,053***

Nordeste -0,0403** Nordeste -0,02*

Sudeste 0,0079 Sudeste 0,047***

Sul 0,0672*** Sul 0,022 Educ4 -0,3123*** Educ4 0,103***

Educ10 -0,2047*** Educ10 0,086***

Educ15 0,1387** Educ15 -0,145*** Gênero 0,2487*** gênero 0,476*** Chefe 0,269*** Chefe 0,373***

Filho -0,0741*** Filho -0,126***

Parente -0,0684*** Parente -0,028 Rntraba -0,1612*** Rntraba -0,121*** Crianças 0,0308*** Crianças -0,001 Wald text 3.616,05*** Wald text 9.852,21***

Obs 17.376 Obs 30.706

472 Tecnologia, Exportação e Emprego

os resultados sugerem a presença de discriminação sobre a população parda enegra rural, reservando-lhes as ocupações agrícolas, tradicionalmente de me-nor remuneração.

Para a localização geográfica da população rural, enquanto os indivíduosdas regiões Sudeste e Sul têm maior probabilidade do que os residentes daregião Centro-Oeste (classe omitida) de trabalhar tanto na ocupação agrícolacomo na não-agrícola, os indivíduos na região Nordeste têm menor probabili-dade de ofertar trabalho face aos moradores do Centro-Oeste. Resultados se-melhantes também foram obtidos por Kassouf (1997) ao analisar os dados daPesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989 com indivíduosentre 18 e 65 anos.

A inclusão do nível de instrução escolar no modelo procura captar asexigências do mercado de trabalho via ocupações mais qualificadas. Mais umavez, os resultados se mostraram reveladores principalmente para a oferta damão-de-obra no mercado agrícola

Por exemplo, entre a ocupação não-agrícola, aumentando o nível de esco-laridade aumenta a participação da população rural no mercado de trabalho;já no mercado de trabalho agrícola, uma pessoa com alto nível de escolaridade(ensino superior) tem menor probabilidade de participar do que indivíduoscom segundo grau apenas (classe omitida). Isso vem reiterar a baixaespecificidade que a mão-de-obra agrícola possui face à não-agrícola.

Quanto ao gênero, os homens têm maior probabilidade do que as mu-lheres (categoria omitida) de participar do mercado de trabalho, agrícola comonão-agrícola. As responsabilidades domiciliares, a legislação trabalhista, a pre-ferência dos empregadores pelos homens, a prevalência de sindicatos controla-dos pelo público masculino e aspectos culturais encarecem o custo de ocupa-ção das mulheres e desestimulam a inserção desse grupo no mercado de trabalho[Pagán e Sánchez (2000)].

Os chefes de família têm maior probabilidade de trabalhar que seus côn-juges (categoria omitida). Ao mesmo tempo, os filhos e outros parentes têmmenor probabilidade do que os cônjuges de participar e receber por algumtrabalho agrícola ou não-agrícola.

Conforme esperado, aqueles que possuem fonte de renda não provenien-te do trabalho, como aposentadorias e pensões, têm menor probabilidade departicipar do mercado de trabalho do que aqueles que não possuem (classeomitida). Esse efeito foi observado nas duas equações.

473Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

E, finalmente, observou-se que pessoas que possuem crianças com atécinco anos têm maior probabilidade de participar do mercado de trabalhonão-agrícola do que aqueles que não têm filhos. Kassouf (1997), com dados daPNSN de 1989, analisou no recorte gênero a probabilidade de os indivíduosdas áreas rurais participarem do mercado de trabalho. Segundo seus resulta-dos, enquanto para os homens, a presença de filhos pequenos aumenta a pro-babilidade de participação no mercado de trabalho, para as mulheres comfilhos até 13 anos, a probabilidade de trabalhar é menor. Contudo, esse efeitose inverte para famílias com filhos adolescentes que, segundo a autora, acabampor assumir as tarefas domiciliares das mães permitindo que elas trabalhemem razão do efeito substituição.

Pagán e Sanchéz (2000) analisaram o mercado de trabalho rural por gê-nero no México com dados de 1994. Pelos resultados empíricos encontradosos autores sugerem que com algumas políticas públicas se reduziriam as desi-gualdades do mercado de trabalho. Por exemplo, a existência de uma políticasocial de subsídio para a mãe com filhos pequenos, certamente decresceria seusalário-reserva e aumentaria sua participação na força de trabalho.

Os resultados da equação de salário para trabalho agrícola e não-agrícolaestão apresentados na Tabela 14.

O teste F que testa a hipótese de todos os coeficientes serem iguais a 0 foialtamente significativo para as duas equações, rejeitando a hipótese. Em segundoplano, observa-se que em ambas as equações, o inverso da razão de Mill (coeficien-te Lambda) foi significativo a 1% indicando que o procedimento econométricoaplicado foi eficaz em corrigir o viés de seletividade amostral. A variável dependen-te considerada foi o logaritmo do salário hora de todos os trabalhos.

Pode-se notar que ao considerar as características de toda a população,tanto entre os que possuem trabalho agrícola como entre os que possuemtrabalho não-agrícola, os mais jovens e adultos até 50 anos tendem a ganharmenos que os mais velhos, cuja faixa etária (51 a 60 anos) foi omitida.

No recorte de raça, também se observou que pretos e pardos ganhammenos que os brancos tanto para o mercado agrícola como não-agrícola.

Outro resultado interessante é que ao considerar diversas característicasde toda a população, conforme proposto por Heckman, tanto os trabalhadoresagrícolas como os não-agrícolas da região Centro-Oeste recebem mais que osdas outras regiões. Isso provavelmente coincide com a expansão agrícola doCentro-Oeste, cuja demanda é por mão-de-obra melhor qualificada.

474 Tecnologia, Exportação e Emprego

TABELA 14EQUAÇÃO ESTIMADA PELO PROCEDIMENTO DO HECKMAN DO LOGARITMO DORENDIMENTO POR HORA PARA O TRABALHO AGRÍCOLA E NÃO-AGRÍCOLA – PESSOASENTRE 14 E 60 ANOS RESIDENTES NA ÁREA RURAL – 2004

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes.*, ** e *** representam níveis de significância de 10%, 5% e 1%, respectivamente, e n.s. não-significativo a 10%.Obs.: os testes t estão entre parênteses, ao lado dos coeficientes.

O nível de instrução também tem um grande efeito no rendimento obti-do pelo fator trabalho. Trata-se de um impacto esperado de acordo com asteorias de capital humano, em que um aumento no nível de instrução eleva orendimento salarial como constatado pelos sinais negativos nos coeficientesdas categorias até 4 anos de estudo (educ4) e entre quatro e dez anos de estu-do (educ10), e positivo na classe de 15 ou mais anos de estudo (educ15) faceà variável omitida, equivalente ao ensino médio.

A titulo de ilustração, Kassouf (1997) calculou os retornos à escolaridadepara trabalhadores do meio urbano e rural e observou que os picos de rendi-mentos ocorrem mais precocemente entre os do meio urbano. De fato, é nascidades que existem maiores incentivos para se investir em educação e os queresidem nas zonas rurais, ao se qualificarem, migram para as localidades urba-nas buscando melhores salários.

Trabalho Não agrícola Trabalho Agrícola Variável Coeficiente Variável Coeficiente

Constante 1,672*** Constante 1,451*** Faixa etária 1 -0,425*** Faixa etária 1 -0,153*** Faixa etária 2 -0,265*** Faixa etária 2 -0,107*** Faixa etária 3 -0,099*** Faixa etária 3 -0,032 Preta -0,051 Preta -0,123*** Parda -0,094*** Parda -0,114*** Norte -0,008 Norte -0,102*** Nordeste -0,417*** Nordeste -0,606*** Sul -0,119*** Sul -0,024 Sudeste -0,116*** Sudeste -0,301*** Educ4 -0,493*** Educ4 -0,463*** Educ10 -0,288*** Educ10 -0,283*** Educ15 0,642*** Educ15 0,886*** Gênero 0,119*** Gênero 0,034 Ocup2 -0,328*** Ocup2 -0,327*** Ocup3 -0,342*** Ocup3 -0,288*** Ocup4 0,533*** Ocup4 0,513*** Lambda -0,289*** Lambda -0,162***

R2 0,358 R2 0,267 Teste F 244,09*** Teste F 225,35*** Obs 7.920 Obs 11.616

475Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

Com relação ao gênero, os homens recebem mais do que as mulheres (cate-goria omitida), tanto para as ocupações agrícolas como para as não-agrícolas.Esse resultado coincide com os argumentos de Kassouf (1994) e Kassouf (1997).

Jacinto (2005) também analisou os diferenciais salariais por gênero entreos trabalhadores da indústria avícola na região Sul do país. A partir dos dadosda Relação Anual de Informações Sociais (Rais) de 1998, o autor assume quenesse tipo de indústria, as mulheres, por terem maiores habilidades manuais,teriam vantagens sobre os homens, ocorrendo aí uma inversão da discrimina-ção salarial por gênero. Contudo, o autor não confirmou sua hipótese ao ob-servar um salário superior para os homens, ainda que controladas as variáveisde escolaridade, idade e tempo de ocupação.

TABELA 15DIFERENCIAIS DE SALÁRIOS PARA O TRABALHO AGRÍCOLA E NÃO-AGRÍCOLA – PESSOASENTRE 14 E 60 ANOS – 2004

Fonte: Pnad/IBGE de 2004. Elaboração: Ipea e autores, a partir da transformação dos dados obtidos nas fontes. Modelo deHeckman.

Trabalho Não agrícola Trabalho Agrícola Variável Coeficiente Variável Coeficiente

Faixa etária 1 -34,63 Faixa etária 1 -14,19 Faixa etária 2 -23,30 Faixa etária 2 -10,16 Faixa etária 3 -9,44 Faixa etária 3 -3,12 Faixa etária 4 - Faixa etária 4 - Branca - Branca - Preta -4,98 Preta -11,59 Parda -8,93 Parda -10,80 Norte -0,80 Norte -9,72 Nordeste -34,10 Nordeste -45,47 Sul -11,26 Sul -2,34 Sudeste -10,91 Sudeste -26,01 Coeste - Coeste - Educ4 -38,93 Educ4 -37,08 Educ10 -25,05 Educ10 -24,63 Educ14 - Educ14 - Educ15 89,99 Educ15 142,51 Gênero 12,59 Gênero 3,44 Ocup1 - Ocup1 - Ocup2 -28,00 Ocup2 -27,89 Ocup3 -28,96 Ocup3 -25,06 Ocup4 70,33 Ocup4 67,01

476 Tecnologia, Exportação e Emprego

Por fim, a Tabela 15 apresenta os diferenciais de salários para algumas caracte-rísticas socioeconômicas, calculados a partir dos coeficientes do modelo de Heckmananteriormente aplicado para os trabalhadores agrícolas e não-agrícolas.25

Ademais, analisando o tipo de ocupação, enquanto os trabalhadores semcarteira de trabalho assinada e conta-própria ganham menos do que funcioná-rios públicos ou com carteira assinada (classe omitida), os empregadores, con-forme o esperado, ganham mais do que aqueles com carteira assinada, seja nomercado de trabalho agrícola como no não-agrícola.

Os valores são mais uma vez analisados em função da variável omitida.Por exemplo, os jovens entre 14 e 20 anos que recebem salário pelo trabalhonão-agrícola, recebem 34,6% a menos que os indivíduos que possuem de 51 a60 anos (classe omitida).

Em linhas gerais, observa-se que os diferenciais de salários para os traba-lhadores agrícolas até 50 anos são menores do que entre trabalhadores não-agrícolas para a mesma faixa de idade com relação aos trabalhadores com 51 a60 anos de idade.

Ao se observar os diferenciais considerando a raça dos indivíduos, os ne-gros e pardos com trabalho não-agrícola têm diferenciais salariais menores emrelação aos brancos. Entre os trabalhadores agrícolas, como observado anteri-ormente, existe uma oferta de trabalho maior pelos negros e pardos do quepelos brancos; contudo, os diferenciais de salários em relação aos brancos sãosuperiores ao do trabalho não-agrícola, evidenciando-se novamente a discri-minação por raça.

Quanto às regiões, ao analisar os salários dos trabalhadores agrícolas enão-agrícolas, e corrigido o viés de seletividade amostral, pode-se observar queos residentes na região Centro-Oeste tiveram em 2004 salários maiores do quequalquer trabalhador do restante do país.

O maior diferencial foi observado para um trabalhador agrícola do Nordes-te que recebe 45% a menos que seu par no Centro-Oeste. O mesmo efeitotambém se observa para o trabalho não-agrícola com os trabalhadores nordesti-nos recebendo 34% a menos do que os trabalhadores da região Centro-Oeste.

Outro ponto é a importância do grau de qualificação em termos dosrendimentos. Claramente, se observa que os menos instruídos (com até o en-sino fundamental completo) e sem instrução auferem menos (em torno de38%) do que aqueles que possuem entre 11 e 14 anos de estudo; todavia,

25. A fórmula para calcular os diferenciais salariais é [exp(b) - 1]*100, onde b é o coeficiente estimado da equação de salários [Cunha (2005)].

477Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

cumpre observar que esses diferenciais se assemelham em ambos os tipos deatividades (agrícola e não-agrícola).

Lanjouw (1999) ao estudar a população rural do Equador com dados de1995 encontrou para aqueles que exercem atividades não-agrícolas um percentualno diferencial de salário de 31% a menos entre os sem instrução face aos instru-ídos com ensino básico (categoria omitida). Para quem tem ensino superior ovalor chegou a 258% a mais. Em sua conclusão, o autor também sugere queuma melhora no nível educacional da população rural facilitaria seu acesso àsocupações não-agrícolas, já que aumentaria sua resposta às oportunidades demercado, e principalmente, incentivaria as famílias a desenvolverem empreendi-mentos não tipicamente agrícolas, atenuando-se a pobreza.

Quanto ao gênero, os homens trabalhadores em atividades não-agrícolasganharam 12,59% mais do que as mulheres (categoria omitida). Lanjouw(1999) também analisou por gênero e observou que as mulheres ganhariam70% a menos que os homens nas ocupações não-agrícolas.

Por fim, quanto ao tipo de ocupação, olhando-se ambas atividades, ospercentuais não variam substancialmente; porém, dentro de cada recorte, tan-to agrícola como não-agrícola, pode-se observar que os indivíduos das ocupa-ções sem carteira e conta-própria ganham menos (de 25% a 28%) do que oscom carteira de trabalho (categoria omitida). De outra parte, os empregadoresganham significativamente mais do que empregados formais, em torno de70% a mais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em grandes linhas, há uma redução no número de pessoas da PEA rural ocu-pada, tanto nas ocupações agrícolas como não-agrícolas. Até certo ponto, pordetrás desse fenômeno, encontram-se a mecanização da produção e a introdu-ção de tecnologias poupadoras de mão-de-obra, e o aumento de uso do fatorterra (fronteira agrícola) com o maior utilização de técnicas de produção emanejo intensivas em capital, descontando-se desses componentes o avançodo perímetro urbano conduzido por mudanças na legislação.

Não obstante, é preciso citar que esse movimento pode ser contrabalan-çado por aumentos no uso de mão-de-obra cuja origem se encontre no cresci-mento do índice tecnológico da produção, como já verificado em estudos naregião do submédio São Francisco em áreas de viticultura.

Ao mesmo tempo, presencia-se uma certa estabilidade na distribuição daPEA rural ocupada, entre ocupações agrícolas e ocupações não-agrícolas, emque pesem claras distinções regionais. Aqui, destaca-se a grande parcela de

478 Tecnologia, Exportação e Emprego

ocupação agrícola situada no Nordeste, ao passo que no Sul, Sudeste e Centro-Oeste observou-se um acréscimo generalizado da proporção de pessoas remu-neradas em ocupações não-agrícolas.

Essa redução de tamanho da PEA rural ocupada também se traduz emsua menor participação na população total, com perda de participação emtodas as faixas etárias. Esses movimentos convergem para tendências jáverificadas ou já consolidadas em outros países desenvolvidos ou em desenvol-vimento de tradição ocidental.

Do prisma da remuneração dos indivíduos que participam do mercadode trabalho rural, no caso das ocupações agrícolas, 53% das pessoas entre 14 e60 anos estão empregadas, são empregadoras ou exercem atividades como conta-própria e 47% não têm remuneração ou trabalham na produção para o pró-prio consumo. Além disso, a proporção de pessoas na categoria de conta-pró-pria é muito similar entre as ocupações agrícolas (25%) e não-agrícolas (22%),ou seja, a informalização das ocupações no meio rural é um fenômeno signifi-cativo e independente do tipo de ocupação.

Acerca das análises de rendimento, dois eventos prevaleceram: a vigência demaiores remunerações médias para as categorias não-agrícolas, e a ocorrência demelhores remunerações para empregadores, empregados com carteira, e trabalha-dores por conta própria (apenas os agrícolas). Esses dados corroboram a ocorrênciade melhores remunerações para os detentores dos meios de produção.

No caso específico das ocupações agrícolas, para as áreas do Centro-Oestee Nordeste são especialmente significativos os rendimentos dos conta-própriae dos empregados com carteira, sendo que estes últimos devem estar relaciona-dos sobretudo à produção com maquinário em operações de larga escala.

Também é digno de nota o crescimento de aposentados e/ou pensionis-tas integrados à PEA rural ocupada. Esse fenômeno poderia ser muito maisforte na ausência de extensão dos benefícios previdenciários para o meio rural.Dessa forma, evidencia-se a busca por remuneração complementar face aosvencimentos de aposentadorias ou pensões, conquanto os dados de oferta detrabalho mostrem que receber aposentadoria ou pensão minimize a probabili-dade de participação no mercado de trabalho rural.

Quanto aos resultados econométricos, em geral foram identificados pa-drões de discriminação no mercado de trabalho rural, em favor das pessoasbrancas (mais presentes no Sul e Sudeste), das ocupações não-agrícolas e dasatividades no Centro-Oeste.

Na oferta de trabalho no meio rural, os jovens provavelmente serão dis-criminados em relação aos mais velhos, enquanto os indivíduos adultos (21 a

479Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

50 anos) experimentam maior probabilidade de trabalhar que os indivíduosmais velhos. Isto é, há uma dupla discriminação no mercado de trabalho rural,contra os estratos etários superior e inferior, fato já detectado em análises simi-lares aplicadas ao espaço urbano. Ao mesmo tempo, a diferença de remunera-ção pró-trabalhadores mais velhos é menor nas ocupações agrícolas que nasnão-agrícolas, o que pode estar relacionado com diferentes níveis de complexi-dade das atividades num caso e noutro.

Há também evidências de discriminação sobre as populações negra e par-da, empurrando-as para as atividades agrícolas da PEA rural. Estas, por suavez, seriam preteridas pelos indivíduos melhor qualificados, ou quando as pes-soas adquirem melhor qualificação.

Os homens e chefes de família apresentam probabilidade maior de partici-pação no mercado de trabalho rural, comparativamente a outras categorias. Aqui,entretanto, cabe a ressalva de que principalmente nas áreas de pequenas propri-edades rurais não chega a ser incomum a presença de chefes de família mulheres.

Quanto à equação de salários estimada, o procedimento econométrico decorreção do viés de seletividade amostral sugere algumas conclusões.

Em primeiro lugar, as pessoas até 49 anos tendem a ganhar menos que osmais velhos. Confirmou-se também que aumentos na escolaridade dos traba-lhadores aumentam os rendimentos do trabalho, tanto para as ocupações agrí-colas como para as não-agrícolas.

Entre as principais categorias de ocupação (com carteira, sem carteira,empregador e conta-própria), há padrões e diferencias salariais marcados, comremunerações mais modestas na ausência de vínculos trabalhistas formais, in-dependentemente da natureza agrícola ou não-agrícola da ocupação rural.

Além disso, negros e pardos com trabalho não-agrícola têm diferenciaissalariais menores em relação aos brancos em termos da mesma comparaçãopara as ocupações agrícolas. Nas atividades não-agrícolas a discriminação pare-ce menos marcada, até porque no caso agrícola ela pode relacionar-se à possedos meios de produção.

Em termos geográficos, tanto os trabalhadores agrícolas como os não-agrícolas do Centro-Oeste recebem mais que os de outras regiões. Isso coinci-de provavelmente com a demanda por uma mão-de-obra específica, dada aprodução mecanizada e em larga escala que ali tem se estabelecido. Excetuadaa comparação com o Nordeste, a ausência de um padrão de distância em rela-ção ao Centro-Oeste sugere que os diferenciais de remuneração são afetados

480 Tecnologia, Exportação e Emprego

não só por condicionantes regionais, mas pelas específicas atividades agrícolasou não-agrícolas desenvolvidas em cada região.

Sob tal prisma, estudos que atentem para os impactos de variaçõestecnológicas sobre distintas produções agropecuárias seriam também muitobem-vindos, sobretudo porque diferentes culturas e criações animais parecemresponder diferentemente – em termos de emprego – a mudanças tecnológicasna forma de produzir.

Frente a tais considerações, conclui-se que as políticas públicas (as dedesenvolvimento rural, por exemplo) destinadas ao trato da questão da ocupa-ção rural precisam de um cerne universal porque são complexas e diretamenterelacionadas a outras políticas como a agrícola, a de infra-estrutura, aprevidenciária e a educacional.

Em especial a sustentabilidade do emprego rural passa por uma claraarticulação dessas políticas. Como exemplo típico, a política agrícola tem deconter um braço de financiamento e outro – mais do que necessário – deextensão, assistência técnica e capacitação, sobretudo do pequeno e médioprodutores agropecuários.

Trata-se de requisitos para se evitar a sub ou sobreutilização de insumos(fertilizantes, defensivos, terra, horas de trabalho) no setor. O uso de fatoresalém ou aquém do recomendado por um acompanhamento de manejo tendea degradar as condições ambientais e/ou a reduzir a produtividade, com osubseqüente comprometimento da atividade no médio prazo.

Ademais, a articulação dessas políticas pode e deve se beneficiar de deta-lhes operacionais que levem em conta o fato de que no caso do setor agropecuárioas especificidades regionais – inclusive, as aqui identificadas – são condicionantesobjetivas não só da produção final como das demandas de insumos e serviçospara trás e para frente, tanto mais no caso de um país de vasto espaço geográ-fico e sob variadas condições edafo-climáticas, como é o Brasil.

Em torno de toda essa discussão, reitera-se a urgência da realização deum novo censo agropecuário nacional. A produção censitária de dados recen-tes da agropecuária constitui parâmetro importante para uma análise detalha-da do atual quadro do setor, de modo a instrumentalizar as respectivas políti-cas públicas e a desejada articulação das mesmas em direção às condições defato identificadas no levantamento a campo, as quais podem ser hoje bastantesdistintas daquelas retratadas no Censo Agropecuário 1995/1996.

481Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

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485Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

ANEXO26

DEFINIÇÕES GEOGRÁFICAS: URBANO, RURAL

Obs.: A classificação das áreas urbana e rural é feita de acordo com a legislação vigente por ocasião dos Censos Demográficos.

ATIVIDADE DO TRABALHO PRINCIPAL DA SEMANA DE 21 A 27/09/2004 PARA PESSOASDE DEZ ANOS OU MAIS.

CÓDIGOS DE OCUPAÇÕES AGRÍCOLAS27

‘01101’ = ‘Arroz,_cultivo_de’

‘01102’ = ‘Milho,_cultivo_de’

‘01103’ = ‘Cereais,_cultivo_de’

‘01104’ = ‘Algodao_herbáceo,_cultivo_de’

‘01105’ = ‘Cana-de-açúcar,_cultivo_de’

‘01106’ = ‘Fumo,_cultivo_de’

‘01107’ = ‘Soja,_cultivo_de’

‘01108’ = ‘Mandioca,_cultivo_de’

‘01109’ = ‘Frutas_e_leguminosas,_cultivo_de’

‘01110’ = ‘Horticultura’

‘01111’ = ‘Flores,_cultivo_de’

‘01112’ = ‘Cítricos,_cultivo_de’

‘01113’ = ‘Café,_cultivo_de’

‘01114’ = ‘Cacau,_cultivo_de’

‘01115’ = ‘Uva,_cultivo_de’

1 Urbana - Cidade ou vila, área urbanizada. 2 Urbana - Cidade ou vila, área não urbanizada. 3 Urbana - Área urbana isolada. 4 Rural - Aglomerado rural de extensão urbana. 5 Rural - Aglomerado rural, isolado, povoado. 6 Rural - Aglomerado rural, isolado, núcleo. 7 Rural - Aglomerado rural, isolado, outros aglomerados. 8 Rural – Zona rural exclusive aglomerado rural.

1 Agrícola 2 Não-agrícola 3 Sem declaração

26. Foram utilizadas as definições fornecidas pelo próprio dicionário de variáveis da Pnad.

27. Os códigos das demais ocupações são, por exclusão, definidos como ocupações não-agrícolas.

486 Tecnologia, Exportação e Emprego

‘01116’ = ‘Banana,_cultivo_de’

‘01117’ = ‘Abacate,_cultivo_de’

‘01118’ = ‘Atividade_agrícola_não_especificada’

‘01201’ = ‘Boi,_inclusive_para_corte,_criação_de’

‘01202’ = ‘Eqüinos,_criação_de’

‘01203’ = ‘Gado_ovino,_criação_de’’

‘01204’ = ‘Gado_suino,_criação_de’’

‘01205’ = ‘Aves,_criação_de’

‘01206’ = ‘Apicultura’

‘01207’ = ‘Sericultura’

‘01208’ = ‘Animais_domésticos,_criação_de’’

‘01209’ = ‘Criação_de_animais_não_especificados’

‘01300’ = ‘Agropecuária,_produção_mista_lavoura_e_pecuária’

‘01401’ = ‘Adubação’

‘01402’ = ‘Adestramento_de_animais,_exclusive_cães_de_guarda’

‘01500’ = ‘Animais_silvestres,_caça_de’

‘02001’ = ‘Abate_de_árvores_plantadas_e_nativas’

‘02002’ = ‘Atividade_de_serviços_ligados_com_a_silvicultura_e_exploração_vegetal’

‘05001’ = ‘Pesca_artesanal,_industrial,_marítima’

‘05002’ = ‘Aquicultura’

O PROCEDIMENTO DE HECKMAN PARA ESTIMAR A EQUAÇÃO DE SALÁRIO DA MÃO-DE-OBRA RURAL28

A metodologia aplicada e usada para medir os determinantes sobre o salá-rio do trabalhador da área rural (agrícola e não-agrícola) corresponde ao métododesenvolvido por James Heckman (1979). A idéia central sugere que certosindivíduos não participam do mercado de trabalho porque seu salário de reservadifere do salário de mercado. Neste caso, ao se determinar as taxas salariais, demodo a evitar o viés de seletividade amostral daqueles que auferem salário, de-vem-se incluir características dos indivíduos que não estão participando do mer-cado de trabalho por ser o seu salário de reserva distinto do observado.

28. Baseado em Greene (2000).

487Ocupações Agrícolas e Não-Agrícolas: trajetória e rendimentos no meio rural brasileiro

Considere-se uma equação medindo a oferta de trabalho ou equação quedescreve a seletividade amostral como sendo:

iii uwz += '* γ , zi* é a oferta de trabalho (1)

onde:

*

*

1 se 0,

0 se 0i i

i i

z z

z z

= >

= ≤

wi = características de variáveis socioeconômicas e demográficas.

Em seguida, tem-se a equação que mede as taxas salariais como:

iii xy εβ += ' , iy é o salário observado (2)

onde

xi = características de variáveis socioeconômicas e demográficas.

Supondo que iu e iε tem distribuição normal com média zero e correla-

ção ρ tem-se:

iiiiiii wuyEzyEyyE '0observadoé * γ−>=>=

iii wuEx '' γεβ −>+=

uiix αλρσβ ε+= '

)(' uiix αλββ λ+=

(3)

onde:

( )

Φ

=−

=

u

i

u

i

u

iu w

w

w

σγ

σγ

φ

αλσγ

α'

'

e '

u

488 Tecnologia, Exportação e Emprego

Logo:

iiiii vzyEzy +>=> 00 **

iuii vx ++= αλββ λ' (4)

Assim, para produzir estimadores β consistentes através do método doMínimos Quadrados Ordinários (MQO), a variável dependente y deve serestimada em função de x e de λ (inverso da razão de Mills).

Em termos práticos, calcula-se por máxima verossimilhança a probabili-dade (modelo probit) de um grupo de indivíduos participarem (=1) ou não(=0) do mercado de trabalho com base em características socioeconômicas,demográficas, localização etc. Em seguida, estima-se por MQO considerandosomente os trabalhadores que auferiam salário, também a partir de determina-das características socioeconômicas, demográficas e de localização dos indiví-duos, mais a inclusão da variável λ

) , que corrige o viés de seletividade amostrale é gerada a partir dos coeficientes estimados no modelo probit como propostopor Heckman.