OAB Projeto Para Extinguir o Jus Postulandi
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OAB/SP elogia aprovação de PL que acaba com o jus postulandi na JT A CCJ da Câmara aprovou, na última terça-feira, 29, o PL 3.392/04 (clique aqui), que torna necessária a presença do advogado nas ações judiciais trabalhistas e institui honorários de sucumbência nessa Justiça especializada. Para o presidente da OAB/SP, Luiz Flávio Borges D'Urso, "foi feita justiça com a advocacia trabalhista brasileira. Valeu a pena o esforço de tantos. No que tange a nós, o convencimento dos deputados foi fundamental, sendo que oficiamos em agosto a todos os deputados federais, demonstrando as razões para tal aprovação. Uma grande vitória, fruto da união da advocacia, que reclama que continuemos mobilizados para ver esse projeto aprovado no Senado e sancionado pela presidente Dilma Rousseff".
Na OAB/SP, a Comissão de Direito Trabalhista vem desde 2004 desenvolvendo debates e trabalhos científicos, sustentando a obrigatoriedade da presença do advogado e também a necessidade da verba de sucumbência nos processos trabalhistas. Eli Alves Silva, presidente da Comissão, destaca o trabalho feito junto à advogada trabalhista Clair da Flora Martins, que apresentou o projeto na época, quando era deputada Federal.
"O trabalho e o debate que vimos realizando nos congressos da OAB e da Abrat - Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas, a qual presidi, apontavam para a necessidade de garantir que o advogado é indispensável à administração da Justiça e o fim do jus postulandi, já que nas ações cíveis, salvo algumas exceções a parte vencida fica com os honorários de sucumbência e na Justiça trabalhista o encargo fica para o trabalhador, que não recebe seus direitos e tem de arcar com a totalidade dos honorários", diz Clair.
O projeto foi aprovado por 77 dos 79 parlamentares presentes (um voto contra e uma abstenção), relatado pelo deputado Hugo Leal (PSC/RJ) e defendido pelo deputado Fábio Trad (PMDB/MS), da Frente Parlamentar em Defesa da Advocacia.
A proposta, que ainda precisa ser aprovada pelo Senado, altera o art. 791 da CLT, estabelecendo que os honorários sejam fixados entre 10% e 20% do valor da condenação. A Fazenda Pública também deverá pagar se perder a ação.
Ainda de acordo com o projeto, as partes no processo trabalhista deverão ser representadas por advogado legalmente habilitado. A ausência de advogado só será admitida se a parte tiver habilitação legal para postular em causa própria, se não houver advogado no lugar da propositura da reclamação ou se ocorrer recusa ou impedimento dos que houver.
Veja abaixo a íntegra do PL.
__________
PROJETO DE LEI Nº , DE 2003
(Da Sra. Dra. CLAIR)
Altera dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho -CLT, estabelecendo a imprescindibilidade da presença de Advogado nas ações trabalhistas e prescrevendo critérios para a fixação dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º O art. 791 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 791. A parte será representada por advogado legalmente habilitado.
§ 1º Será lícito à parte postular sem a representação de advogado quando:
I – tiver habilitação legal para postular em causa própria;
II – não houver advogado no lugar da propositura da reclamação ou ocorrer recusa ou impedimento dos que houver.
§ 2º A sentença condenará o vencido, em qualquer hipótese, inclusive quando vencida a Fazenda Pública, ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, atendidos:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
§ 3º Nas causas sem conteúdo econômico e nas que não alcancem o valor de alçada, bem como naquelas em que não houver condenação, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas dos incisos I, II e III do parágrafo anterior.”(NR)
Art. 2º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º. Ficam revogados os arts. 731, 732 e 786 da Consolidação das Leis do Trabalho e o art. 15 da Lei nº 5.584/70.
JUSTIFICAÇÃO
A Constituição Federal, em seu art. 133, prescreve que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
Todos aqueles que, pelo menos uma vez, já se viram na contingência de reclamar por seus direitos em juízo sabem da importância desse dispositivo constitucional. O cidadão comum, além de não compreender os intrincados ritos processuais, é, na maioria das vezes, acometido de verdadeiro temor reverencial diante das autoridades constituídas. Alguns chegam mesmo a ficar mudos com a simples visão de uma toga de juiz.
Atualmente, na prática, já não existe o jus postulandi na Justiça do Trabalho, pois o resultado do pedido verbal sem a participação do advogado é conhecido de todos: pedidos mal formulados, quando não ineptos; produção insuficiente de provas etc., o que resulta, sempre, em prejuízo à parte que comparece a juízo sem advogado, seja ela o empregado ou o empregador.
Além disso, por força dos enunciados 219 e 220 do TST, as decisões dos tribunais trabalhistas revestem-se de um aspecto, no mínimo, intrigante. A parte vencida somente é condenada a pagar honorários advocatícios quando o vencedor for beneficiado pelo instituto da justiça gratuita. Ou seja, quando o vencedor não tem despesas com advogado, condena-se o vencido em verbas honorárias, procedendo-se de modo diverso na situação contrária, negando-se o ressarcimento dessas verbas justamente àquele que as custeou do próprio bolso.
Em face disso, não havendo honorários de sucumbência, justamente o trabalhador menos protegido, não sindicalizado, geralmente de baixa escolaridade, não consegue contratar
advogado para representá-lo, situação agravada pelo fato de não haver defensoria pública junto à Justiça do Trabalho.
Cabe observar que tal situação afronta um dos princípios mais elementares de direito: a indenização, judicial ou extrajudicial, deve ser a mais ampla possível. Aquele que se vê obrigado a contratar advogado para fazer valer seus direitos, faz jus aos honorários de sucumbência. Caso contrário não estará sendo integralmente indenizado, como é de se esperar de uma decisão fundamentada em um senso mínimo de justiça.
Entendemos que o presente projeto, se aprovado, sanará essas falhas da legislação processual trabalhista em vigor.
São essas as razões por que contamos com sua aprovação.
Sala das Sessões, em de abril de 2004.
Deputada Dra. CLAIR
__________
OFÍCIO ENVIADO PELA OAB SP AOS DEPUTADOS
GP. 1695/11
Sr.
São Paulo, 24 de agosto de 2011.
Senhor(a) Deputado(a).
A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, manifesta seu apoio ao Projeto de Lei n.º 3.392/04, de autoria da Deputada Dra. Clair, que altera dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, estabelecendo a imprescindibilidade da presença de Advogado nas ações trabalhistas e prescrevendo critérios para a fixação dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho.
A alteração legislativa ao artigo 791 da CLT proposta pela nobre Deputada, além de fazer valer o artigo 133 da Carta Magna, passa a dispensar tratamento igualitário às partes litigantes no tocante à imposição do ônus da sucumbência ao vencido, além de ir ao encontro dos anseios dos operadores de direito de serem remunerados pelo trabalho realizado.
Contando com a votação de Vossa Excelência favoravelmente à aprovação desse Projeto, renovamos os protestos da nossa consideração e apreço.
Luiz Flávio Borges D’Urso Presidente
SUMÁRIO: Introdução; 1. Jus postulandi pessoal da parte; 1.1. Conceituação e delimitação; 1.2.
Contexto histórico; 2. O jus postulandi pessoal da parte e o acesso à justiça; 2.1. O princípio do
acesso à justiça; 2.2. Indispensabilidade do advogado e assistência judiciária gratuita; 2.3.
Honorários advocatícios na Justiça do Trabalho; 3. Análise crítica do Projeto de Lei n.
3.392/2004; Considerações finais; Referências Bibliográficas.
RESUMO: O presente artigo visa a discutir e analisar criticamente o Projeto de Lei n. 3.392, de
2004, à luz do jus postulandi pessoal da parte, na Justiça do Trabalho, e do acesso à justiça.
Para tanto, primeiramente, discorrer-se-á a respeito do próprio instituto, conceituando-o e
delimitando-o, e também analisando o contexto histórico em que foi criado, bem como a sua
evolução até os dias de hoje. Em seguida, trar-se-á o estudo do princípio do acesso à justiça e a
sua relação com o jus postulandi pessoal da parte, assim como a problemática que envolve a
sua efetividade no âmbito trabalhista. Por fim, chegar-se-á à análise crítica do Projeto de Lei n.
3.392, de 2004, expondo-se, sucintamente, a tramitação pela qual passou (e vem passando),
para, após, analisar o projeto de lei em si, com todos os seus aspectos, além de fornecer
alternativas que se integrem a ele.
PALAVRAS CHAVES: Jus postulandi pessoal da parte. Acesso à justiça. Projeto de Lei n.
3.392/2004. Direito Processual do Trabalho.
ABSTRACT: The present article aims to discuss and analyze critically the Law Project n. 3.392, of
2004, under the jus postulandi staff party, in the Labor Courts, and the access to justice. For
this, initially, the institute itself will be discussed, presenting its concept and limits, and also
analyzing the historic context in which it was created, as well as its evolution until nowadays.
Then, the study of the access to justice principle, and its relation with the jus postulandi staff
party, will be done, such as the issues that involve its effectiveness in the labor ambit. In the
end, the analysis of the Law Project n. 3.392, of 2004, will be reached, at first, exposing, briefly,
its course through legal channels, and, after that, analyzing the law project itself, with all of its
aspects, and additionally providing alternatives that may integrate with it.
KEYWORDS: Jus postulandi staff party. Access to justice. Law Project n. 3.392/2004. Procedural
Law of Labor.
INTRODUÇÃO
O jus postulandi pessoal da parte é um instituto que atravessou várias épocas, perdurando
desde a sua criação, na década de 40 do século passado, até os dias de hoje. Ao longo de todo
esse tempo, diversos estudos tendo-o como objeto foram realizados e posicionamentos
antagônicos foram tomados a respeito de a sua existência ser positiva ou negativa, dentro da
esfera processual trabalhista.
Ao lado desses variados estudos, inúmeras propostas para a sua modificação, ou, até mesmo,
total extinção, também foram feitas, o que sempre levantou questionamentos a respeito do
quanto isso seria benéfico ou prejudicial para os jurisdicionados. Além disso, também
ocasionam dúvidas os impactos que eventuais mudanças provocariam no acesso à justiça, pois
ele possui uma intrínseca correlação com o jus postulandi.
Por isso, o presente artigo visa a fornecer uma análise crítica do Projeto de Lei n. 3.392, de
2004, que propõe, exatamente, a modificação deste instituto tão característico do Direito
Processual do Trabalho brasileiro. Apesar de ser um projeto de lei bastante antigo (uma vez
que já tramita há quase 10 anos), tudo indica que ele está próximo de ser aprovado, o que
motivou a realização deste trabalho.
Dessa maneira, primeiramente far-se-á a conceituação e a delimitação do jus postulandi
pessoal da parte, seguidas de uma breve análise do seu contexto histórico, a fim de que se
possa compreender como ele está inserido no ordenamento jurídico brasileiro, assim como o
porquê da sua criação e o seu cabimento nos dias de hoje.
Em seguida, estudar-se-á o princípio do acesso à justiça, explicitando-se o que se entende por
isso, modernamente, e relacionando-o ao jus postulandi. Também serão tratadas as principais
problemáticas que envolvem a efetividade do acesso à justiça na seara processual trabalhista,
por meio do estudo de dois institutos que com ele guardam relação: a indispensabilidade do
advogado (que traz à tona a questão da assistência jurídica gratuita) e os honorários
advocatícios na Justiça do Trabalho.
Por fim, então, chegar-se-á à análise crítica do Projeto de Lei n. 3.392, de 2004, que consistirá,
primeiramente, na sucinta exposição da tramitação pela qual o referido projeto passou (e vem
passando) durante esse tempo. Após, far-se-á a análise, propriamente dita, do projeto em si,
ressaltando-se os aspectos positivos e negativos, sugerindo-se algumas soluções e verificando-
se as alterações que ele causará no cenário processual trabalhista.
Por fim, far-se-ão as considerações finais do artigo, serão expostas as conclusões do presente
estudo, reiterando-se o entendimento de que o projeto de lei objeto deste presente estudo (e,
por conseguinte, tudo aquilo que cerca o jus postulandi) ainda seja mais debatido, a fim de
que se pensem outras alternativas e que se concretizem medidas para que o acesso à justiça
alcance a plena efetividade no Processo do Trabalho.
1. JUS POSTULANDI PESSOAL DA PARTE
Apesar de ser um instituto marcante ao Direito Processual Trabalhista brasileiro, o jus
postulandi pessoal da parte tem sido bastante discutido ao longo dos anos. Sua real
efetividade é alvo de várias críticas e levanta debates doutrinários acerca dos benefícios e
malefícios advindos da sua aplicação e utilização.
Os seus críticos alegam que ele coloca o jurisdicionado em uma posição muito frágil dentro da
relação jurídica processual, deixando-o desamparado dentro de um cenário que não lhe é dos
mais amigáveis. Por outro lado, os seus defensores dizem que ele é um instrumento
fundamental de acesso à justiça, sem o qual, muitas vezes, não teria o indivíduo condições de
litigar perante a Justiça do Trabalho.
Contudo, de todos os diversos pontos de vista a respeito do jus postulandi, apenas uma
certeza pode-se ter: o instituto é problemático, pois, se não o fosse, não haveria tantas
discussões sobre ele e sua efetividade.
2.1 Conceituação e delimitação
O estudo do conceito e delimitação do jus postulandi trabalhista requer, antes, que se faça a
diferenciação entre a terminologia utilizada nos outros campos do Direito Processual (mais
notadamente no Direito Processual Civil) e a utilizada especificamente no âmbito Processual
Trabalhista.
De maneira geral, podemos conceituar o jus postulandi como “uma locução latina que indica o
direito de falar, em nome das partes, no processo (...)” (MARTINS, 2010, p. 185). Assim, ele
seria o direito que decorre da capacidade postulatória conferida, no Direito Processual, em
regra, aos advogados. Dessa forma, a capacidade postulatória pode ser considerada como um
atributo do sujeito, enquanto o jus postulandi, um exercício do direito oriundo desse atributo
(PINTO, 2005, p. 254).
Já na esfera Processual Trabalhista, o jus postulandi “é o direito que a pessoa tem de estar em
juízo, praticando pessoalmente todos os atos autorizados para o exercício do direito de ação,
independentemente do patrocínio de advogado” (MARTINS, 2010, p. 185). Portanto, chega-se
à conclusão de que o jus postulandi, diversamente do que ocorre, em regra, nas outras áreas
do Direito Processual, é um direito assegurado às partes da relação trabalhista, não lhes sendo
imposta a representação por alguém previamente habilitado para tal.
Entretanto, a sua utilização no Processo Trabalhista não é ilimitada e indiscriminada. Para se
chegar a essa constatação, faz-se necessário analisar o artigo que prevê o instituto na
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
Art. 791. Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça
do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.
Primeiramente, observa-se que a disposição legal previu expressamente a possibilidade de
reclamação apenas perante a Justiça do Trabalho. Assim, fica excluída do alcance da lei a
prática de qualquer ato quando este seja realizado perante outra esfera do Judiciário que
“escape” ao âmbito trabalhista. O exemplo mais claro do que aqui está sendo dito é a
impossibilidade de interpor-se Recurso Extraordinário por quem esteja exercendo o jus
postulandi pessoal da parte, uma vez que isso implicaria a saída dos limites trabalhistas.
Em 2010, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) editou a Súmula n. 425, restringindo ainda
mais o alcance do instituto ora tratado. Por sua importância para o estudo aqui realizado, é
válida a sua transcrição:
Súmula n. 425 do TST – JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ALCANCE. Res 165/2010,
DEJT divulgado em 30.04.2010 e 03 e 04.05.2010. O jus postulandi das partes, estabelecido no
art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não
alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de
competência do Tribunal Superior do Trabalho.
Assim, percebe-se que, mesmo no âmbito da Justiça do Trabalho, o jus postulandi pessoal da
parte não é ilimitado. A grande razão dessas limitações dentro da esfera trabalhista é o fato de
os recursos destinados ao TST e as ações elencadas na súmula anteriormente citada serem
apelos eminentemente técnicos, o que carece de um conhecimento especializado e
apropriado para a sua interposição e ajuizamento (MARTINS, 2010, p. 188).
Outra limitação decorre da interpretação literal do art. 791, da CLT, ao fazer menção a quem
poderá exercer o direito dele oriundo. Nota-se que o dispositivo legal expressamente prevê
“os empregados e os empregadores” como os detentores do exercício do jus postulandi
pessoal da parte. Para que seja possível o entendimento do porquê essa referência restringe,
mais uma vez, o alcance do instituto, faz-se necessária uma breve explicação do que seja
relação de emprego.
Antes de partir para a relação de emprego, deve-se definir a relação de trabalho. Segundo
Mauricio Godinho Delgado (2010, p. 266), a relação de trabalho:
(...) refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial
centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a
toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. (...) Traduz,
portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de
trabalho existentes no mundo jurídico atual.
Ainda de acordo com o ilustre doutrinador, paralelamente, a relação de emprego:
(...) do ponto de vista técnico-jurídico, é apenas uma das modalidades específicas de relação
de trabalho juridicamente configuradas. Corresponde a um tipo legal próprio e específico,
inconfundível com as demais modalidades de relação de trabalho ora vigorantes. (DELGADO,
2010, p. 266)
Dessa forma, relação de emprego é uma espécie do gênero relação de trabalho, esta sendo,
por óbvio, mais ampla do que aquela. Empregado e empregador são, portanto, os sujeitos
integrantes dessa relação de emprego. As características que diferenciam o empregado dos
outros sujeitos das outras relações de trabalho são a prestação de trabalho por pessoa física,
pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade. Caso todas elas estejam
presentes, configurar-se-á a relação de emprego (DELGADO, 2010, p. 269).
Essa interpretação literal, bastante restritiva, encontra guarida na Instrução Normativa n. 27,
de 2005, do TST (IN 27/2005), que dispõe sobre normas aplicáveis ao Processo do Trabalho. Ela
traz, em seu art. 3º, § 3º, a seguinte disposição: “Salvo nas lides decorrentes da relação de
emprego, é aplicável o princípio da sucumbência recíproca, relativamente às custas”. Em
seguida, no art. 5º, prevê: “Exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários
advocatícios são devidos pela mera sucumbência”.
O raciocínio utilizado para se concluir que os sujeitos de relações de trabalho (que não sejam a
relação de emprego) não podem exercer o jus postulandi pessoal da parte é muito bem
ilustrado nas precisas palavras de Carlos Henrique Bezerra Leite (2006, p. 343):
Ora, se para fins de pagamento de custas e honorários advocatícios nas ações não oriundas da
relação de emprego é aplicável o princípio da sucumbência recíproca inerente ao processo
civil, então a presença do advogado torna-se obrigatória em tais demandas, pois o “dever de
pagar honorários pela mera sucumbência” pressupõe a presença do advogado, já que os
honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao
advogado (EOAB, art. 23).
Dessa maneira, o fato de nas citadas relações ser cabível a condenação em honorários
advocatícios é o que provoca o entendimento de que a elas não se aplica o jus postulandi
pessoal da parte, uma vez que não seria necessário, já que o referido cabimento descaracteriza
o propósito do instituto aqui estudado.
Contudo, tal entendimento vem sendo discutido e questionado. Especialmente após a
competência da Justiça do Trabalho ter sido ampliada pela Emenda Constitucional n. 45, que
incluiu no caput e no inciso IX do art. 114 da Constituição Federal a previsão de julgamento de
quaisquer demandas relativas às relações de trabalho em geral, essa interpretação restritiva
acaba sendo um verdadeiro desrespeito ao princípio da igualdade (ALMEIDA, 2012, p. 102). Ou
seja, paulatinamente tem-se entendido que essa restrição vai de encontro à tendência de
fornecer aos diversos tipos de trabalhadores o mesmo patamar de proteção.
Nessa esteira, o Enunciado 67 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho,
realizada em conjunto pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados
do Trabalho (ENAMAT), pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), e com o apoio do Conselho de Escolas de
Magistratura Trabalhista (CONEMATRA), no ano de 2007, dispõe o seguinte:
67. JUS POSTULANDI. ART. 791 DA CLT. RELAÇÃO DE TRABALHO. POSSIBILIDADE. A faculdade
de as partes reclamarem, pessoalmente, seus direitos perante a Justiça do Trabalho e de
acompanharem suas reclamações até o final, contida no art. 791 da CLT, deve ser aplicada às
lides decorrentes da relação de trabalho.
2.2 Contexto histórico
O jus postulandi trabalhista surgiu em 1943, previsto na Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT). Para que se possa entender melhor o porquê da sua idealização, é necessário analisar o
contexto histórico em que ele foi criado.
O Direito do Trabalho começou a consolidar-se dentro do país a parti de 1930. Com o início da
Era Vargas, o Estado passou a intervir fortemente em questões sociais, tais quais as relações
empregatícias. Assim, a atividade legiferante brasileira, antes incipiente, começa a intensificar-
se, passando a atuar em diversos sentidos com o objetivo de instituir políticas governamentais
para formar o modelo justrabalhista da época. Essas políticas visavam a que o modelo fosse
marcado por um caráter corporativista e autocrático, em que a área sindical fosse vinculada ao
Governo Federal, e que a solução dos conflitos trabalhistas também tivessem um cunho
administrativo, uma vez que eram vinculadas ao Poder Executivo (DELGADO, 2010, p. 103-
105).
Como parte dessas políticas oficiais da época, surgem as Comissões Mistas de Conciliação
(para conciliar os dissídios coletivos) e as Juntas de Conciliação e Julgamento (para conciliar e
julgar os dissídios individuais), em 1932 (LEITE, 2006, p. 104). Essa criação consolida a
institucionalização de órgãos destinados a solucionar os conflitos trabalhistas. Entretanto, é
válido ressaltar que eles ainda não possuíam qualquer vinculação ao Poder Judiciário, ou seja,
tinham caráter administrativo (não judicial).
As Juntas de Conciliação e Julgamento, segundo Amauri Mascaro Nascimento (2009, p. 51):
(...) eram compostas de um presidente, estranho aos interesses das partes e de preferência
membro da Ordem dos Advogados do Brasil, e de dois vogais, um dos empregados e um do
empregador, além de dois suplentes, escolhidos com base em listas remetidas pelas
associações e sindicatos ao Departamento Nacional do Trabalho.
Além disso, as Juntas de Conciliação e Julgamento somente aceitavam ações propostas por
empregados sindicalizados, o que demonstra, mais uma vez, a política estatal de manter a
resolução dos conflitos trabalhistas dentro do seu controle administrativo. Outro fato que
demonstra o aqui exposto é que o “Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio podia avocar
qualquer processo, a pedido do interessado, nos casos de flagrante parcialidade dos julgadores
ou violação do direito” (NASCIMENTO, 2009, p. 51).
É com a criação das Juntas de Conciliação e Julgamento que podemos começar a ver os
primeiros sinais do que viria a ser o jus postulandi pessoal da parte. Como as Juntas possuíam
natureza administrativa, não se fazia necessária a representação por advogado, uma vez que
não estavam diante de um conflito em órgão judicial. Dessa forma, os próprios interessados,
fossem da classe dos empregados ou dos empregadores, poderiam reclamar e defender seus
próprios interesses pessoalmente.
Não obstante não houvesse qualquer previsão do instituto do jus postulandi, resta claro que
ele estava presente na sistemática das Juntas de Conciliação e Julgamento, conforme podemos
inferir do art. 6º, do Decreto 22.132, de 1932, que as instituiu:
Art. 6º As reclamações determinantes dos litigios de que trata o art. 1º, serão dirigidas pelos
interessados ou seus representantes legais, no Distrito Federal, aos procuradores do
Departamento Nacional do Trabalho e, nos Estados ou Territorio do Acre, ás Inspetorias
Regionais, aos delegados ou funcionarios federais indicados pelo ministro do Trabalho,
Industria e Comércio, por escrito ou verbalmente, sendo neste último caso reduzidas a termo,
assinado pelo reclamante ou alguem a seu rogo.
Com as Constituições de 1934 e 1937, houve a chamada constitucionalização da Justiça do
Trabalho, uma vez que as citadas Cartas Magnas passaram a prevê-la expressamente em seus
respectivos textos. Porém, elas ainda não colocaram a Justiça do Trabalho como órgão do
Poder Judiciário (LEITE, 2006, p. 104). Apesar da sua previsão constitucional, ela somente veio
a ser criada com o Decreto n. 1.237, de 1939, e sua posterior regulamentação ocorreu com o
Decreto n. 6.596, de 1940. A declaração da sua instalação deu-se em 1º de maio de 1941, em
discurso histórico proferido por Getúlio Vargas.
Em 1943, ocorreu a aprovação do Decreto-Lei n. 5.452, a chamada Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), e, dentre outras prerrogativas e direitos assegurados ao empregado, em seu
artigo 791 há a expressa previsão do jus postulandi pessoal da parte. Esse texto normativo
reuniu o que se havia produzido acerca do Direito do Trabalho anteriormente, realizando a
sistematização e organização da disciplina trabalhista. Apesar disso, contudo, o Direito do
Trabalho e Processual do Trabalho ainda possuía natureza administrativa.
Assim, o jus postulandi pessoal da parte nela previsto justificava-se, seguindo o raciocínio do
que foi dito a respeito dos seus primeiros indícios nas Juntas de Conciliação e Julgamento, pois
as reclamações no âmbito administrativo possuíam um aspecto muito mais informal e célere,
além de serem gratuitas, o que permitia à parte postular pessoalmente pelos seus direitos.
Além disso, à época, as causas trabalhistas não tinham a complexidade dos tempos atuais,
nem eram tantos os direitos acobertados pelo diploma normativo, o que facilitava o uso da
prerrogativa de postulação pessoal pelas partes. Também, o fato de a Justiça do Trabalho ser
composta por representantes de ambas as classes legitimava o instituto do jus postulandi.
Com a derrocada da Era Vargas, o Decreto-Lei n. 9.777, de 1946, integrou a Justiça do Trabalho
ao Poder Judiciário. Posteriormente, com a promulgação da Constituição de 1946, essa
integração alcançou status constitucional. Dessa forma, aos juízes trabalhistas foram
assegurados os mesmos direitos e garantias, como também os deveres, previstos aos
membros do Poder Judiciário (NASCIMENTO, 2009, p. 55). Contudo, é necessário observar que,
apesar da integração da Justiça do Trabalho ao Poder Judiciário, ela ainda continuou com as
mesmas feições anteriores, visto que muito pouco foi produzido legislativamente em sede
trabalhista após a Constituição de 1946, de forma a adaptá-la a esse novo tempo democrático.
Assim, verifica-se que o modelo instituído na Era Vargas (e a consequente legislação
trabalhista) sobreviveu até o fim da ditadura militar (que tomou o poder em 1964), em 1985
(DELGADO, 2010, p. 112-113).
A partir da Constituição de 1988, a “Constituição Cidadã”, começou-se a romper com o modelo
justrabalhista que havia sido implementado na década de 1930. Como reflexo de seu tempo
moderno e globalizado, as causas trabalhistas adquiriram uma complexidade muito maior,
surgindo fenômenos que, até então, não eram vistos ou sentidos tão fortemente no país,
como a terceirização e as fusões de empresas (NASCIMENTO, 2009, p. 56). Grandes símbolos
desse rompimento e do novo cenário do Direito Trabalhista brasileiro foram as Emendas
Constitucionais n. 19, de 1999, e n. 45, de 2004, que alteraram profundamente as feições da
Justiça do Trabalho.
Nessa fase contemporânea do Direito do Trabalho brasileiro, há a multiplicação dos litígios
trabalhistas, oriundos justamente desse novo cenário em que o mundo hoje se encontra, o
que leva os doutrinadores, pensadores e operadores do Direito a depararem-se com algumas
problemáticas, tais quais: como garantir a concretização dos direitos sociais e humanos dos
trabalhadores?; como tornar o processo trabalhista mais humano?; como garantir o efetivo
acesso dos trabalhadores a uma ordem jurídica justa?; dentre outras (LEITE, 2006, p. 105).
Com essa complexidade inerente à nova realidade social, o jus postulandi pessoal da parte
passou a ser questionado, uma vez que o modelo justrabalhista não mais é marcado pela
simplicidade, informalidade e celeridade de quando o referido instituto foi idealizado. O
mundo contemporâneo apresenta problemas que precisam ser discutidos e solucionados,
buscando-se adaptar e atualizar o Direito Trabalhista e Processual Trabalhista às exigências
desse novo tempo.
O jus postulandi trabalhista surgiu em uma época inteiramente diferente, há mais de 60 anos,
e passou praticamente intocado por todo esse tempo. Apesar de condizente àquela realidade,
é necessário que se discuta a sua real efetividade e necessidade nos dias atuais, uma vez que,
como visto, inclusive a natureza do processo trabalhista era diversa da que se tem hoje. Tal
discussão, porém, não se torna completa sem que se leve em conta diversos fatores correlatos
ao instituto ora tratado, que serão analisados propriamente em tópico próprio, quais sejam: o
princípio do acesso à justiça, os honorários advocatícios no processo trabalhista e a assistência
jurídica gratuita trabalhista.
2. O JUS POSTULANDI PESSOAL DA PARTE E O ACESSO À JUSTIÇA
O jus postulandi pessoal da parte é um instituto que possui uma intrínseca relação com o
acesso à justiça, uma vez que a sua principal marca é justamente ser tratado como um
instrumento que proporciona esse acesso à justiça no âmbito trabalhista. Portanto, aqui, dar-
se-á continuidade ao presente estudo analisando-se essa relação entre o jus postulandi
pessoal da parte e o princípio do acesso à justiça.
Contudo, o estudo aqui proposto vai além de apenas relacionar o jus postulandi trabalhista
com o princípio do acesso à justiça, pois, ao desenvolvê-lo, vêm à tona determinadas
problemáticas que se correlacionam diretamente com eles e demandam uma análise mais
aprofundada, a fim de que se tenha uma visão correta e articulada do acesso à justiça no
cenário processual trabalhista atual.
2.1. O princípio do acesso à justiça
O jus postulandi pessoal da parte sempre foi considerado um instituto capaz de promover o
acesso à justiça dentro do âmbito trabalhista, sendo uma das principais razões de sua defesa
por inúmeros estudiosos. Sendo assim, é necessário o estudo do referido princípio, para que se
possa compreender a sua relação com o jus postulandi e a sua importância para o mesmo.
O princípio do acesso à justiça não está previsto expressamente em nosso ordenamento.
Contudo, ele pode ser extraído como a faceta mais importante do princípio da
inafastabilidade, previsto no inciso XXXV, do art. 5º da Constituição Federal, que diz: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito”. Assim, esse
dispositivo, ao assegurar que o Judiciário não se furtará de apreciar a demanda que lhe for
proposta, assegura a todos o acesso à justiça.
Entretanto, é necessário dimensionar propriamente as implicações a que se refere o acesso à
justiça. Numa visão mais tradicional, a leitura desse princípio provoca o entendimento único
de que a qualquer pessoa é permitida a busca pelo Poder Judiciário para resolver os conflitos
que surgirem e que careçam da resposta jurisdicional adequada àquela situação, sem que
antes seja obrigatória a procura por outros meios para tanto (NEVES, 2011, p. 21). Essa é uma
visão completamente correta, mas que, diante da sociedade atual, é insuficiente.
Modernamente, a leitura mais adequada do princípio aqui exposto é a que o interpreta como a
forma de se alcançar o “acesso à ordem jurídica justa”. Esse acesso à ordem jurídica justa não
se satisfaz apenas com a possibilidade de propor a demanda e tê-la analisada pelo Poder
Judiciário independentemente de outros meios condicionais, mas que referido acesso seja
verdadeiramente efetivo. Tal efetividade é alcançada, dentre outras formas, fazendo-se com
que o maior número de pessoas possa demandar e propiciando-lhes mecanismos capazes de
ter a sua demanda processada de maneira adequada (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2010,
p. 39-40).
Dessa maneira, o acesso à justiça deve ser considerado como um direito fundamental capaz de
proporcionar ao jurisdicionado um resultado justo e efetivo do processo. Ou seja, além de ter
a sua demanda apreciada pelo Poder Judiciário, e que esta esteja ao alcance de todos, a leitura
moderna do referido princípio exige que esse processo, ao final, seja concretamente efetivo, e
não apenas formalmente efetivo. Neste sentido:
A democratização do acesso à justiça implica, nessa toada, a inclusão irrestrita de todos no
sistema jurídico, ultrapassando barreiras econômicas, sociais, culturais e até mesmo físicas,
bem como o reconhecimento da função social do processo, garantindo-se resultados efetivos
com a concretização dos direitos através da tutela jurisdicional. Configura-se, portanto, o
acesso à justiça em um direito fundamental público, subjetivo e instrumental. (ANDRADE,
2014)
Assim, a grande preocupação que envolve o acesso à justiça é diminuir as diferenças, as
barreiras existentes entre os diversos indivíduos que compõem a sociedade e proporcionar-
lhes o acesso à ordem jurídica justa, e não apenas o mero acesso aos órgãos judiciais. O que se
busca com esse estreitamento das diferenças é fazer com que aquele que demande ao
Judiciário faça-o adequadamente e com a maior “paridade de armas” possível. Ou seja, o
sistema deve garantir que o acesso à justiça seja efetivado de forma a que qualquer um tenha
condição de litigar com os recursos e meios adequados e necessários, sem ser afetado
negativamente por estar em uma condição social, econômica ou jurídica inferior (CAPPELLETTI;
GARTH, 1988, p. 15).
Essas diferenças são verdadeiros obstáculos ao acesso à justiça efetivo, sendo necessária a sua
identificação para que se possa tentar minimizá-las. Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988, p.
15-29) colocam como principais obstáculos: as custas judiciais, uma vez que é bastante
dispendioso arcar com o ônus econômico de se demandar em juízo; as possibilidades das
partes, encarando-se aqui não apenas as diferenças econômicas, mas também a própria
diferença de nível educacional do indivíduo, que, por conhecer melhor os seus direitos e a
forma de assegurá-los, além de saber mais sobre como funciona o sistema jurídico, tem uma
vantagem maior dentro do processo; e as dificuldades de defesa aos direitos difusos, pois,
apesar de extremamente importantes aos indivíduos em termos de “ser coletivo”, os meios
existentes para efetivá-los e garanti-los não são facilmente acessíveis.
Diante dos principais obstáculos identificados pelos ilustres autores, eles vislumbraram três
grandes “ondas” de esforços realizados para solucionar os problemas do acesso à justiça:
Podemos afirmar que a primeira solução para o acesso – a primeira “onda” desse movimento
novo – foi a assistência judiciária; a segunda dizia respeito às reformas tendentes a
proporcionar representação jurídica para os interesses “difusos”, especialmente nas áreas da
proteção ambiental e do consumidor; e o terceiro – e mais recente – é o que nos propomos a
chamar simplesmente “enfoque de acesso à justiça” porque inclui os posicionamentos
anteriores, mas vai muito além deles, representando, dessa forma, uma tentativa de atacar as
barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo. (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p.
31)
Nessa esteira, pode-se considerar o jus postulandi pessoal da parte como um mecanismo de
combate ao primeiro dos obstáculos citados, qual seja, as custas. Esse entendimento advém
do fato de que o exercício desse direito elimina o principal gasto daquele que litiga perante o
Judiciário: arcar com as despesas de constituir-se um advogado. Isso faz com que a demanda
torne-se financeiramente menos onerosa. Além disso, ele concretiza um dos grandes objetivos
de efetividade ao possibilitar que qualquer indivíduo, independentemente do seu nível
econômico, social ou jurídico, demande à Justiça do Trabalho.
Contudo, não se pode concluir precipitadamente que o jus postulandi pessoal da parte
proporciona um efetivo acesso à justiça, visto que isso seria ater-se a apenas um dos aspectos
deste. Conforme visto anteriormente, o acesso à ordem jurídica justa é alcançado através da
diminuição das diferenças entre os indivíduos, o que exige ações em todos os obstáculos que
dificultam ou impedem o acesso. O que o instituto central desse estudo faz é eliminar apenas
um desses obstáculos, sem, porém, atingir ou resolver quaisquer outros (o estudo mais
aprofundado da problemática dos outros obstáculos ao acesso à justiça, relacionados ao jus
postulandi, será feito nos tópicos subsequentes).
O ponto mais sensível que se observa do que foi dito acima é quanto às possibilidades das
partes. Com a eliminação do obstáculo referente às custas, mas sem qualquer ação integrada
referente aos demais, percebe-se que as diferenças, na maioria das vezes, são acentuadas, ao
invés de reduzidas. Isso ocorre devido ao fato de que a parte que procura a Justiça do Trabalho
para ter o seu conflito solucionado é, quase sempre, hipossuficiente em todos os níveis
anteriormente expostos. Assim, esse indivíduo que carece de recursos depara-se com um
processo altamente complexo e desacompanhado de alguém que esteja capacitado para lidar
com ele, fazendo com que a relação processual seja desigual e que tenha pouco resultado
prático.
Não há cabimento, também, para que se argumente que o jus postulandi pessoal da parte
oferece uma possibilidade que não impede ou embaraça a quem deseje constituir um
advogado, pois tal argumento deturpa uma visão mais profunda do cenário de acesso à justiça.
É evidente que a faculdade de não ter um gasto com a constituição de um patrono oferecida a
um indivíduo que dispõe de parcos recursos financeiros é extremamente tentadora, se não
irrecusável.
Isso o leva a fazer tal opção quase que automaticamente, sem que vislumbre o quanto pode
ser prejudicial à defesa e possível obtenção do seu direito, uma vez que não tem o
conhecimento e as informações necessárias para tomar a decisão mais adequada. Dessa
forma, o que deveria ser uma alternativa acaba transformando-se em um instrumento não só
sem efetividade, mas também com possíveis efeitos maléficos, por falta de um sistema de
ações que visem a combater os obstáculos do acesso à justiça de forma integrada.
O que aqui está sendo defendido coaduna-se com a chamada terceira “onda” de reformas
destinadas a solucionar os problemas do acesso à justiça, de acordo com o que já foi exposto
em momento anterior. Para enfatizar essa ideia, é altamente recomendável atentar-se às
seguintes palavras:
Finalmente, como fator complicador dos esforços para atacar as barreiras do acesso, deve-se
enfatizar que esses obstáculos não podem simplesmente ser eliminados um por um. Muitos
problemas de acesso são inter-relacionados, e as mudanças tendentes a melhorar o acesso por
um lado podem exacerbar barreiras por outro. Por exemplo, uma tentativa de reduzir custos é
simplesmente eliminar a representação por advogado em certos procedimentos. Com certeza,
no entanto, uma vez que litigantes de baixo nível econômico e educacional provavelmente não
terão a capacidade de apresentar seus próprios casos, de modo eficiente, eles serão mais
prejudicados que beneficiados por tal “reforma”. Sem alguns fatores de compensação, tais
como um juiz muito ativo ou outras formas de assistência jurídica, os autores indigentes
poderiam agora intentar uma demanda, mas lhes faltaria uma espécie de auxílio que lhes pode
ser essencial para que sejam bem sucedidos. Um estudo sério do acesso à Justiça não pode
negligenciar o inter-relacionamento entre as barreiras existentes. (CAPPELLETTI; GARTH, 1988,
p. 29)
Uma observação deve ser feita: no âmbito trabalhista brasileiro não se verificou, em sua
plenitude, o que é observado na primeira “onda” de reformas destinadas a solucionar os
problemas do acesso à justiça, uma vez que ainda não houve implementação da Defensoria
Pública Trabalhista. Esse aspecto, porém, será estudado atentamente no próximo tópico.
Dessa maneira, o estudo do jus postulandi trabalhista e do acesso à justiça envolve a análise
de determinadas questões problemáticas, uma vez que se deve considerar o acesso à justiça
como um conjunto de ações integradas. Por isso, é necessário que se estude essas referidas
problemáticas, pois elas são de caráter fundamental para que, aliadas ao avanço na questão da
facultatividade da representação da parte, alcance-se a efetividade do acesso à justiça.
2.2. Indispensabilidade do advogado e assistência judiciária gratuita
O jus postulandi pessoal da parte está intrinsecamente ligado à questão da representação por
advogado, uma vez que o instituto torna-a facultativa e muitas dúvidas são levantadas a
respeito dessa possibilidade deixada pela legislação. Além disso, ao adentrar essa discussão,
sobreleva-se e torna-se latente a questão da assistência judiciária gratuita na esfera
trabalhista.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 a faculdade da representação
possibilitada pelo jus postulandi tornou-se muito questionada devido ao art. 133 daquela
dispor que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus
atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. A partir disso, instaurou-se a
polêmica quanto a se a Carta Magna havia tornado o art. 791 da CLT inconstitucional ou não.
Para muitos estudiosos, o fato de a Constituição prever a indispensabilidade do advogado
tornou obrigatória a sua presença em todo e qualquer processo, o que levaria à
inconstitucionalidade do jus postulandi pessoal da parte. Uma análise atenta e sistemática do
dispositivo em tela, porém, afasta qualquer controvérsia nesse sentido.
Primeiramente, faz-se mister observar que o art. 133 da Constituição exara um princípio, qual
seja: o princípio da indispensabilidade do advogado. Entretanto, apesar de os princípios serem
“proposições fundamentais que informam a compreensão do fenômeno jurídico” (DELGADO,
2010, p. 173), é também verdade que não há princípio que seja absoluto. Ou seja, todo
princípio admite certo grau de derrogação, principalmente em determinadas situações
concretas que exigem do intérprete ou aplicador do Direito o sopesamento entre diferentes
bens jurídicos a serem preservados, o que pode levar ao afastamento de um princípio ante a
preponderância de outro. Nesse sentido, dispõe Mauricio Godinho Delgado:
É claro que a prevalência dos princípios sobre as regras legais, defendida por diversos desses
autores, é relativa, sob pena de criar-se total insegurança na ordem jurídica e meio social
regulado. Na verdade, parece-nos mais adequado sustentar que, em vez de função normativa
própria, específica, autônoma, verifica-se que os princípios atuam como comandos jurídicos
instigadores, tendo, no fundo, uma função normativa concorrente. Trata-se de papel
normativo concorrente, mas não autônomo, apartado do conjunto jurídico geral e a ele
contraposto. (DELGADO, 2010, p. 176)
Assim, com base no que foi aqui exposto, quanto à indispensabilidade do advogado, constata-
se que o princípio dela exarado não é absoluto, o que possibilita a sua restrição por outras
normas legais, como, por exemplo, a que trata do jus postulandi na CLT.
Além disso, fazendo-se uma interpretação mais exegética do dispositivo constitucional que
traz o referido princípio, observa-se que ele prevê a indispensabilidade do advogado “nos
limites da lei”, o que deixa aberta a possibilidade de restrição do seu conteúdo por lei
infraconstitucional. Ora, se o próprio legislador constituinte ressalvou que é possível limitar-se
o alcance do conteúdo da norma em questão, torna-se claro que a mesma não é absoluta
(PINTO, 2005, p. 264).
A Lei nº 8.096, de 1994, conhecida como Estatuto da Advocacia, que veio regulamentar o
exercício da profissão de advogado, além de dispor sobre o conteúdo do art. 133 da
Constituição, gerou mais polêmica quanto ao jus postulandi pessoal da parte. O inciso I, do art.
1º, previa, originariamente, que é “atividade privativa de advocacia a postulação a qualquer
órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais”, estabelecendo, assim, “o monopólio da
capacidade postulatória em favor do advogado” (PINTO, 2005, p. 264).
Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar, em 2006, o dispositivo legal, na Ação Direta
de Inconstitucionalidade (ADI) n. 1.127, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros,
declarou inconstitucional o termo “qualquer”, nele contido. Dessa forma, o STF adotou o
entendimento de que a legislação pode apresentar exceções ao princípio da
indispensabilidade, como ocorre na Justiça do Trabalho, através do jus postulandi (ALMEIDA,
2012, p. 109-110).
Posteriormente, naquele mesmo ano, o STF também apreciou a ADI n. 3.168, proposta pelo
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que questionava a possibilidade de
postular-se nos Juizados Especiais Federais sem representação por advogado, declarando a
constitucionalidade do dispositivo que previa essa faculdade. Assim, mais uma vez, a Corte
Suprema entendeu pela constitucionalidade de restrições à indispensabilidade do advogado
(ALMEIDA, 2012, p. 110-111).
Dessa maneira, evidencia-se que a limitação trazida pelo jus postulandi ao princípio da
indispensabilidade do advogado é possível e constitucional, não só pelo fato de nenhum
princípio ser absoluto, mas também pela interpretação da norma que o prevê, respaldada pelo
entendimento do STF.
O que se deve entender do princípio aqui tratado, na verdade, é que o advogado não pode ser
posto à margem da Justiça, ou seja, que não se pode tentar excluí-lo ou ameaçar as suas
prerrogativas e direitos. Facultar a sua representação no processo, sem que haja proibição ou
embaraço, não vai de encontro ao que o sistema jurídico exige.
A facultatividade da representação por advogado, porém, na forma em que é concebida no jus
postulandi, acaba retirando a efetividade do acesso à justiça, quando exercido o direito nela
previsto. Isso ocorre porque ela atua de forma isolada dentro do âmbito trabalhista, sem que
haja uma integração com outras ações pensadas em conjunto para que se proporcione a
efetividade do acesso à justiça, na linha do que foi proposto por Cappelletti e Garth, como
visto no tópico anterior.
Não é o simples fato de estar desacompanhado de advogado que causa essa “inefetividade”,
mas sim a união entre isto e a ausência de outros institutos que dêem suporte para o instituto
objeto principal deste estudo. Um dos essenciais, de fundamental importância para que se
alcance o objetivo proposto pelo jus postulandi, é a assistência jurídica gratuita na esfera
trabalhista.
A assistência jurídica integral e gratuita está prevista no art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal,
a ser prestada pelo Estado àqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Na Justiça do
Trabalho, o benefício da justiça gratuita é regulado pelo art. 790, § 3º, da CLT, que diz:
§ 3º. É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de
qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita,
inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior
ao dobro do mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de
pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família.
Dessa forma, esse benefício pode ser concedido a qualquer trabalhador que litigue na esfera
trabalhista, mesmo que esteja representado por advogado. Apesar de haver a previsão de um
determinado teto salarial máximo a ser percebido pelo beneficiado, a norma também prevê
que ele poderá ser concedido a quem perceba um salário maior, desde que declare que sua
condição financeira não lhe permite litigar sem que haja prejuízo. Assim, o dispositivo foi
salutar ao privilegiar a realidade fática ao invés de apegar-se a limites engessados (LEITE, 2006,
p. 358).
Já a assistência judiciária é prestada, na Justiça do Trabalho, pelos sindicatos, conforme
disposto na Lei nº 5.584, de 1970, que veio a regulamentar essa prestação especificamente na
área trabalhista. Em seu art. 14, a referida lei expressamente prevê que “na Justiça do
Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será
prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador”. Mais a
frente, no art. 18, é previsto que “a assistência judiciária, nos têrmos da presente lei, será
prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo sindicato”.
Na mesma linha do que acontece no benefício da justiça gratuita, a assistência judiciária
também é concedida àqueles que necessitem dela, seja por presunção absoluta (perceber até
dois salários mínimos), ou por presunção relativa (perceber mais que dois salários mínimos,
mas não poder litigar sem comprometer o seu sustento ou de sua família), de acordo com o §
1º, do art. 14, da referida lei (PINTO, 2005, p. 265).
Entretanto, é necessário observar que a solitária atuação sindical na assistência judiciária é
muito pouco para que se alcance a sua plenitude, e ainda mais se se pensar na perspectiva da
assistência jurídica, que é mais ampla que a assistência judiciária. Assim o é por alguns
motivos, tais quais: não há sindicatos presentes em todas as localidades, nem todos os
sindicatos dispõem de recursos suficientes para prestar uma assistência ampla e abrangente,
muitas vezes o trabalhador não sindicalizado é coagido a associar-se ao sindicato para obter a
assistência, muitos trabalhadores desconhecem essa alternativa garantida pela legislação, etc.
(PAROSKI, 2010, p. 79).
Assim sendo, embora a assistência prestada pelos sindicatos seja fundamental para o acesso à
justiça, é imperioso que a assistência, de maneira geral, no âmbito trabalhista expanda-se,
para que se possa oferecer melhores e mais efetivas alternativas ao assistido (PINTO, 2005, p.
265). Nessa esteira, torna-se imprescindível trazer à tona a problemática da Defensoria Pública
Trabalhista.
A Lei Complementar nº 80, de 1994, organizou e regulamentou a Defensoria Pública da União,
do Distrito Federal e dos Territórios, além de prescrever normas gerais para sua organização
nos Estados. O art. 134 da Constituição já dispunha que essa instituição seria a responsável
pela prestação da assistência jurídica integral e gratuita prevista no inciso LXXIV, do art. 5º,
também da Carta Magna. Salutar é a transcrição do art. 1º da referida lei, uma vez que
explicita a função da Defensoria Pública dentro do sistema jurídico e reproduz (ampliando o
conteúdo) o disposto na Constituição Federal:
Art. 1º. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático,
fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em
todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e
gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da
Constituição Federal.
Percebe-se, com isso, que, tanto a lei, quanto a Constituição Federal prevêem que a assistência
jurídica não se limita ao benefício da justiça gratuita e à assistência judiciária, indo além ao
estabelecer que essa assistência deve abranger a orientação jurídica dos necessitados e a
defesa não só judicialmente, mas também extrajudicialmente. Assim, segue o que foi
observado na obra de Cappelletti e Garth, no que se refere à primeira “onda” de acesso à
justiça.
A referida lei, em seu art. 14, dispõe que “a Defensoria Pública da União atuará nos Estados,
Distrito Federal e nos Territórios, junto às Justiça Federal, do Trabalho, Eleitoral, Militar,
Tribunais Superiores e instâncias administrativas da União”. Logo, constata-se que foi prevista
expressamente a atuação da Defensoria Pública da União (DPU) no âmbito da Justiça do
Trabalho. Contudo, o que se verifica na prática é que essa atuação é praticamente inexistente,
fazendo com que a assistência jurídica dê-se apenas por meio dos sindicatos, o que, como foi
visto em linhas anteriores, é insuficiente para promover uma assistência adequada.
A DPU é, sabidamente, uma instituição que sofre com o fato de ter um quadro de pessoal
bastante reduzido em relação à proporção de demandas a que deve atender. Por isso, seus
membros procuram priorizar áreas em que a representação por advogado é obrigatória, em
detrimento das causas trabalhistas, visto que o jus postulandi pessoal da parte torna aquela
facultativa. Assim, o maior prejudicado acaba sendo o trabalhador hipossuficiente, que não
tem condições de arcar com o custo de um advogado particular, nem pode contar com uma
assistência jurídica gratuita adequada, tendo como única alternativa a postulação
desacompanhado de advogado, o que, muitas vezes, é bastante prejudicial ao seu direito
(GODEGHESI, 2009, p. 94-95).
Dessa maneira, é urgente que se crie um órgão especializado da Defensoria Pública da União
para atuar perante a Justiça do Trabalho, tal qual ocorreu com o desdobramento do Ministério
Público Federal em outros ramos, notadamente o Ministério Público do Trabalho (ALMEIDA,
2012, p. 122-123). Mesmo que se amplie o número de membros da DPU, ainda assim as causas
trabalhistas seriam relegadas a segundo plano, o que pouco adiantaria, reforçando o que aqui
se propõe. Além disso, a criação de uma Defensoria Pública Trabalhista, especializada em
causas laborais, traria muito mais segurança e confiança aos trabalhadores para procurar essa
assistência, além do que contaria com profissionais mais habilitados e acostumados com esses
processos típicos e suas peculiaridades.
Portanto, observa-se que a ampliação da assistência jurídica gratuita, mormente com a criação
e instalação da Defensoria Pública Trabalhista, é fundamental para que se dê efetividade ao
acesso à justiça propugnado pelo jus postulandi. Como já foi discutido anteriormente, não é
apenas a ausência de representação por advogado que impede essa efetividade, mas sim essa
possibilidade sem que haja a sua integração com outros institutos capazes de cumprir o
objetivo por ele pretendido.
O que deve ser feito é proporcionar ao indivíduo alternativas viáveis e efetivas para que se
litigue sem que isso comprometa financeiramente a sua sobrevivência. Uma assistência
jurídica gratuita e integral capaz de fornecer acompanhamento ao hipossuficiente, para que,
mesmo quando não o represente no processo, por ser a causa de menor complexidade, possa
instruí-lo e orientá-lo adequadamente para que obtenha sucesso na demanda, é um grande
passo rumo a esse efetivo acesso à justiça que aqui tanto se almeja.
Não é demais frisar novamente: não é a possibilidade oferecida pelo jus postulandi pessoal da
parte que afeta a efetividade do acesso à justiça, mas a sua existência isolada.
2.3. Honorários advocatícios na Justiça do Trabalho
A questão dos honorários advocatícios é uma das mais tormentosas na esfera trabalhista. Suas
particularidades, que a diferem da forma como essa questão ocorre no processo civil, tornam-
na alvo de inúmeras críticas e questionamentos. Algumas dessas peculiaridades relacionam-se
muito fortemente com o jus postulandi pessoal da parte, inclusive encontrando nele sua razão
de ser.
Os honorários advocatícios surgiram na Roma antiga, quando “o vencedor de uma demanda
judicial prestava honrarias a seu advogado, daí advindo o termo honorarius” (MARTINS, 2010,
p. 378). Assim, naquela época, os honorários objetivavam apenas prestigiar aquele que
patrocinava a causa, mediante o pagamento de um determinado prêmio. Nos dias atuais,
contudo, os honorários passaram a ter um caráter remuneratório pelos serviços prestados, e
não mais de mero reconhecimento prestigioso por parte do patrocinado. Nesse sentido,
observa-se o disposto no art. 22, da Lei 8.096, de 1994 (Estatuto da Advocacia):
Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos
honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.
Faz-se necessário que se explicite o último tipo dos honorários previstos no artigo acima, qual
seja: os honorários de sucumbência. Ao tratar dos honorários advocatícios, Sérgio Pinto
Martins (2010, p. 378) assim dispõe:
O fundamento dos honorários é o fato objetivo de alguém ter sido derrotado. Assim, aquele
que ganhou a demanda não pode ter diminuição patrimonial em razão de ter ingressado em
juízo. Os honorários de advogado decorrem, portanto, da sucumbência. A parte vencedora
tem direito à reparação integral dos danos causados pela parte vencida, sem qualquer
diminuição patrimonial.
Essa é a forma que se verifica no âmbito Processual Civil, ou seja, os honorários decorrem da
mera sucumbência ocorrida no processo, conforme se depreende da leitura do art. 20, do
Código de Processo Civil.
Entretanto, em regra, os honorários advocatícios não são devidos pela mera sucumbência no
âmbito Processual Trabalhista, ocorrendo apenas em determinadas hipóteses. Esse é o
entendimento majoritário dos tribunais, consubstanciado nas Súmulas 219 e 329, do TST, que
dizem:
Súmula n. 219 do TST – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO (nova
redação do item II e inserido o item III à redação). Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e
31.05.2011.
I – Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca
superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência,
devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a
percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação
econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva
família. (ex-Súmula n. 219 – Res. 14/1985, DJ 26.09.1985)
II – É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no
processo trabalhista.
III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como
substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego.
Súmula n. 329 do TST – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 133 DA CF/1988 (mantida). Res.
121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Mesmo após a promulgação da CF/1988, permanece válido
o entendimento consubstanciado na Súmula n. 219 do Tribunal Superior do Trabalho.
Dessa maneira, os honorários advocatícios são devidos apenas no caso de a parte estar
assistida pelo sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior
ao dobro do mínimo legal, ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita
demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família, nos termos do art. 14, da
Lei n. 5.584, de 1970. É válido pontuar que os honorários são revertidos em favor do sindicato
assistente, conforme disposto no art. 16 da referida lei.
O entendimento utilizado para que não se aplique os honorários na Justiça do Trabalho pela
mera sucumbência baseia-se, principalmente, na existência do jus postulandi pessoal da parte.
Entende-se que a possibilidade de litigar em juízo desacompanhado de advogado torna o
patrocínio na causa uma faculdade à disposição da parte, fazendo com que a retribuição pelos
serviços prestados seja uma despesa voluntária, não podendo, assim, ser custeada pela parte
adversária (MARTINS, 2010, p. 379). Reforçando o aqui exposto, oportunas as palavras de
Mauro Vasni Paroski:
A existência do jus postulandi na Justiça do Trabalho tem sido certamente o maior empecilho
para que não se aplique o princípio da sucumbência em processos trabalhistas, negando-se o
direito aos honorários advocatícios à parte vencedora na demanda, assim como aplicabilidade
às regras de compensação e proporcionalidade na medida do êxito de cada litigante quanto às
despesas processuais em geral.
O fundamento principal, embora singelo sob certo enfoque, até pode se revestir de uma
aparente validez jurídica, dado que é de uma lógica incontestável: não se onera a parte
vencida com o pagamento de honorários de advogado, uma vez que este profissional não é
necessário para o acesso ao Judiciário, sendo facultado ao próprio interessado, pessoalmente,
exercer a capacidade postulatória e a se defender em juízo. (PAROSKI, 2010, p. 102)
Essa linha de pensamento, porém, não pode mais prosperar. A não condenação em honorários
advocatícios na Justiça do Trabalho acaba sendo um óbice enorme ao efetivo acesso à justiça,
uma vez que, como já foi visto no tópico anterior, a assistência jurídica prestada pelo sindicato
é insuficiente e não existe Defensoria Pública Trabalhista. Assim, o trabalhador hipossuficiente,
caso deseje constituir um advogado para a sua causa, é obrigado a desfalcar uma considerável
parcela de suas verbas pleiteadas. Sabendo-se que as verbas trabalhistas, quase que em sua
totalidade, são verbas de natureza alimentar, o prejuízo causado àquele que está procurando a
Justiça para fazer valer os seus direitos (muitas vezes líquidos e certos) é enorme. Essa
constatação fica ainda mais estarrecedora quando se observa que, na grande maioria dos
casos, não é ele o responsável pela necessidade de provocação do Judiciário, mas é ele que
acaba arcando solitariamente com o custo de tal (ALMEIDA, 2012, p. 128).
O acima exposto reforça o que já foi dito ao tratar do princípio do acesso à justiça, quando foi
colocado que a opção pelo jus postulandi pessoal da parte acaba sendo praticamente
automática, pois aquele que não dispõe de muitos recursos econômicos, e também por não
contar com uma assistência jurídica gratuita e integral efetiva no âmbito trabalhista, acaba
encontrando-se sem alternativas para perseguir o seu direito em juízo. Nesse sentido:
A ausência de sucumbência reduz a possibilidade de real opção entre o exercício do jus
postulandi pela própria parte ou a contratação de advogado, esta última sob o custeio do
obreiro, uma vez que não se tem assistência judiciária garantida e gratuita, assegurando o livre
acesso à justiça. Afinal, o que restará ao obreiro carente de recursos que pleiteia verbas de
pequena monta, em causas que certamente serão dispensadas pelos advogados em razão da
contraprestação pelos serviços ser inviável, sob a análise do custo-benefício? Não haverá, para
o obreiro que mais necessita, opção e sim imposição do exercício pessoal do jus postulandi.
(ALMEIDA, 2012, p. 130)
Além disso, observa-se que a Súmula 219, do TST, acima transcrita, na parte final de seu inciso
III, estabeleceu que serão devidos honorários advocatícios nas lides que não derivem da
relação de emprego. Essa restrição surgiu, originariamente, na Instrução Normativa n. 27, de
2005, que em seu art. 5º dispõe que “exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os
honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência”, e foi reafirmada pela Súmula
em questão.
O principal argumento para que se faça essa restrição, mais uma vez, está no jus postulandi
pessoal da parte. Como foi observado anteriormente, entende-se, majoritariamente, que o jus
postulandi não se aplica às relações de trabalho que não sejam empregatícias, utilizando-se de
uma interpretação bastante restritiva do art. 791, da CLT, que prevê o referido instituto. Dessa
forma, como não pode exercer a faculdade de litigar em juízo desacompanhado por advogado,
justificar-se-ia a condenação em honorários de sucumbência, uma vez que a constituição de
patrono seria obrigatória (LEITE, 2006, p. 342-343). É curioso notar que esses fatos são
utilizados reciprocamente como argumentos, ou seja: uma das justificativas para o cabimento
de honorários advocatícios é a impossibilidade de exercício do jus postulandi pessoal da parte
nas relações diversas da empregatícia; e um dos argumentos para não se exercer o jus
postulandi pessoal da parte nas relações diversas da empregatícia é o cabimento de
condenação em honorários advocatícios.
Entretanto, essa distinção acaba sendo, mais uma vez, um flagrante desrespeito ao princípio
da igualdade, pois não coloca os diversos tipos de trabalhadores sob a mesma proteção
jurídica. Já foi visto que a doutrina caminha a passos largos para considerar que as diversas
relações de trabalho (especialmente após a Emenda Constitucional nº 45) devem ser
protegidas de maneira igualitária, o que acaba colocando esse entendimento restritivo quanto
aos honorários como antiquado.
É necessário que se perceba o quanto essa regra geral de não condenação em honorários
advocatícios é prejudicial ao acesso à justiça. De acordo com o que já foi exposto
anteriormente (especialmente quando se tratou do princípio do acesso à justiça), o acesso à
justiça é alcançado através da eliminação dos obstáculos que se opõem a ele. O tratamento
dado aos honorários advocatícios no âmbito trabalhista, contudo, acaba reforçando-os mais
ainda, visto que, ao não permitir a condenação em honorários, faz com que o custo torne-se
pesado para a parte hipossuficiente suportar.
Pode-se argumentar que a existência do jus postulandi pessoal da parte, na verdade, elimina
todo esse obstáculo das custas, ao dispensar a obrigatoriedade de constituição de advogado.
Isso não deixa de ser verdade, mas, como foi abordado ao longo de todo esse capítulo, é
imprescindível para alcançar o efetivo acesso à justiça que se faça uso de diversas ações que,
integradamente, cumprirão esse objetivo.
Dessa forma, deve-se se levar em conta que existem demandas trabalhistas que simplesmente
não podem ser postuladas em juízo sem patrono por aqueles que não possuem conhecimento
jurídico e processual suficiente para tal, pois o resultado pode ser-lhe prejudicial e irreversível,
uma vez que esteja sob o manto da coisa julgada. Por isso, não é suficiente que se possibilite,
abstratamente, à parte litigar em juízo desacompanhada de advogado, mas que também lhe
ofereça a possibilidade de ter o acompanhamento por um profissional apto a colocá-la em
paridade de armas com a outra parte, concreta e efetivamente, seja esse profissional um
defensor público ou um advogado. O que não se pode é transformar uma alternativa em única
escolha para aqueles que não têm muitos caminhos e vêem na resposta jurisdicional a
esperança de ter o seu conflito solucionado.
Finalizada essa importante exposição, far-se-á, enfim, a seguir, a análise crítica do Projeto de
Lei que pretende extinguir o jus postulandi pessoal da parte.
3. ANÁLISE CRÍTICA DO PROJETO DE LEI N. 3.392/2004
Após o estudo inicial do jus postulandi pessoal da parte, estabelecendo-se o seu conceito e
debruçando-se brevemente sobre o seu histórico, e, em seguida, fazendo-se o estudo da
problemática que envolve o jus postulandi e o acesso à justiça, chega-se, finalmente, ao ponto
principal deste artigo.
O jus postulandi pessoal da parte, no âmbito trabalhista, como já se pôde perceber, é objeto
de inúmeros debates e discussões, além de diversas críticas. Por isso, já se tentou por várias
vezes modificá-lo, ou até mesmo extingui-lo. A tentativa que logrou maior êxito, e angariou
maior número de adeptos (especialmente a classe dos advogados), até agora, corresponde a
um projeto de lei da Câmara dos Deputados, apresentado em 2004, que já se encontra em
tramitação no Senado Federal e, ao que parece, será aprovado e promulgado: o Projeto de Lei
n. 3.392, de 2004.
Dessa forma, procurar-se-á analisar, aqui, o Projeto de Lei (PL) n. 3.392, da Câmara dos
Deputados, que tramita desde 2004, o qual propõe profundas mudanças no instituto do jus
postulandi pessoal da parte, alterando a forma como é concebido atualmente e levando-o à
extinção.
O Projeto de Lei n. 3.392, de 2004, foi apresentado em 20 de abril daquele ano pela Deputada
Dra. Clair, do PT-PR. Inicialmente, o PL contava com poucos dispositivos e a justificação da
Deputada para o PL baseava-se em atender à indispensabilidade do advogado, de acordo com
o art. 133, da Constituição Federal, além de estabelecer os honorários advocatícios a partir da
mera sucumbência. Dessa forma, segundo a citada justificação, proteger-se-iam as partes dos
prejuízos da litigância desacompanhada de um profissional habilitado para tal, e corrigir-se-ia a
injustiça referente à não condenação em honorários.
Após ser aprovado pelas Comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) e
de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), na Câmara dos Deputados, após mais de 9 anos de
tramitação, o projeto foi remetido ao Senado Federal. Nesta Casa Legislativa, ele foi aprovado
na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), sendo enviado, em seguida, à Comissão de Assuntos
Econômicos (CAE), onde não chegou a ser aprovado, pois houve um requerimento solicitando
a sua tramitação em conjunto com o Projeto de Lei do Senado n. 728, de 2007, fazendo com
que o PL aqui referido fosse enviado à Secretaria-Geral da Mesa para votação do referido
requerimento. Até a presente data (10/03/2014), o projeto de lei encontra-se aguardando a
citada votação.
Partindo-se para a análise crítica propriamente dita do projeto de lei, o texto do projeto de lei
a ser analisado aqui será aquele aprovado pela CCJC, na Câmara dos Deputados, e pela CAS, já
no Senado Federal, que é, exatamente, o substitutivo que havia sido aprovado ainda na CTASP.
Isso se deve ao fato de esse ser o texto do projeto de lei que teve a última aprovação, até
agora, na tramitação do mesmo perante o Senado Federal.
O PL 3.392/2004 (PLC 33/2013 no Senado Federal) apresenta, atualmente, o seguinte texto:
Art. 1º. O art. 791 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº
5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 791. A parte será representada:
I- por advogado legalmente habilitado;
II- pelo Ministério Público do Trabalho;
III- pela Defensoria Pública da União.
§ 1º. Será lícito à parte postular sem representante legalmente habilitado quando tiver
habilitação legal para postular em causa própria.
§ 2º. A sentença condenará o vencido, inclusive quando vencida a Fazenda Pública, ao
pagamento de honorários de sucumbência aos advogados, fixados entre o mínimo de 10% (dez
por cento) e 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, atendidos:
I- o grau de zelo do profissional;
II- o lugar da prestação do serviço;
III- a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo profissional e o tempo
exigido para seu serviço.
§ 3º. Os honorários dos peritos, tradutores, intérpretes e outros necessários ao andamento
processual serão fixados pelo Juiz, conforme o trabalho de cada um, com observância, entre
outros, dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
§ 4º. É vedada a condenação recíproca e proporcional da sucumbência.
§ 5º. Nas causas sem conteúdo econômico e nas que não se alcance o valor de alçada, bem
como naquelas em que não houver condenação, os honorários dos advogados, peritos,
tradutores, intérpretes e outros sempre serão fixados consoante apreciação equitativa do Juiz,
atendidas as normas previstas nos incisos I, II e III do § 2º deste artigo.
§ 6º. Nas causas em que a parte estiver assistida por Sindicato de Classe, nos termos dos arts.
14 a 20 da Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970, e do § 1º do art. 4º da Lei nº 1.060, de 5 de
fevereiro de 1950, a condenação nos honorários advocatícios não a alcançará, devendo ser
pagos por meio da conta das dotações orçamentárias dos Tribunais.
§ 7º. A parte que declarar não possuir condições de demandar sem prejuízo do próprio
sustento ou de sua família não sofrerá condenação em honorários advocatícios, desde que
tenha sido deferida a justiça gratuita.
§ 8º. Nas ações em que for deferida justiça gratuita à parte, os honorários advocatícios, pagos
pelo vencido, reverterão ao profissional patrocinador da causa.” (NR)
Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Primeiramente, a análise concentrar-se-á na questão da representação da parte, para que, em
seguida, se discorra a respeito dos honorários advocatícios.
Deve-se observar, inicialmente, que o projeto de lei propõe a extinção do jus postulandi
pessoal da parte. Apesar de o texto permitir a postulação em causa própria, quando a parte
tiver habilitação legal para tanto, tal fato não pode importar na acepção de que o que ocorre,
na verdade, é uma mitigação do instituto aqui estudado. Assim não pode ser tratado, pois a
proposta contida no projeto de lei descaracteriza completamente o jus postulandi, como ele é
concebido no âmbito processual trabalhista, uma vez que, nessa esfera ele possui uma
significação própria e peculiar, que se coaduna com o objetivo com que foi criado, à época.
Mesmo se permitindo essa exceção, colocando-o em compasso com o Processo Civil, não é
suficiente para que se defenda que há uma mera mitigação do instituto.
Também é importante observar que o texto positiva a representação pela Defensoria Pública
da União. Mesmo que todo o sistema jurídico brasileiro já forneça essa possibilidade,
conforme demonstrado em tópico próprio anterior, essa expressa previsão legal, constante no
mesmo dispositivo que trata da representação na esfera trabalhista, é bastante salutar, pois
pode funcionar como uma forma de “pressão extra” para que se instale, definitivamente, a
Defensoria Pública Trabalhista. Por outro lado, parece desnecessária a previsão do Ministério
Público do Trabalho nesse rol, uma vez que a sua esfera de atuação já é bem delimitada pela
Lei Complementar nº 75, de 1993. Além disso, pode levar à falsa impressão de que o
Ministério Público do Trabalho agiria como um verdadeiro patrono da parte nas reclamações
trabalhistas, o que não pode ser admitido.
Outro ponto que se deve observar é que o projeto de lei continua proporcionando à parte a
possibilidade de ser assistido pelo Sindicato de Classe, e reforça-a ao estabelecer que não
haverá condenação em honorários quando a parte utilizar-se dela. Também reforçou o
benefício da justiça gratuita, fazendo a mesma previsão. A questão dos honorários
advocatícios, porém, será melhor analisada mais adiante, sendo importante, neste momento,
atentar-se apenas ao aspecto da representação.
Na esteira do que foi exposto acerca do que o projeto de lei prevê para a representação no
âmbito processual trabalhista, nota-se que há um avanço provocado pela necessidade de se
constituir um advogado para a causa, profissional que está adequadamente preparado para
perquirir os direitos do reclamante em juízo. Conforme estudado no anteriormente, a
facultatividade da representação por advogado, na forma como é exercida mediante o jus
postulandi trabalhista, acaba sendo extremamente prejudicial ao hipossuficiente, uma vez que
atua de forma isolada e irrestrita dentro do sistema jurídico trabalhista.
Entretanto, a maneira que está sendo idealizada, por esse projeto de lei, para resolver esse
problema não é inteiramente benéfica. Isso ocorre, pois o PL 3.392/2004 utiliza dois
pressupostos que se mostram equivocados. O primeiro é que a assistência jurídica gratuita
seria capaz de atender plenamente as demandas daqueles que não podem arcar com as
despesas de um advogado. O segundo é que, mesmo se a parte dispuser de advogado
particular, por estar amparada pelo benefício da justiça gratuita e com a condenação da outra
parte em honorários advocatícios, não terá qualquer despesa.
O equívoco do primeiro pressuposto encontra-se no fato de que a assistência jurídica gratuita
no âmbito trabalhista é bastante deficiente e problemática. A ausência de um ramo
especializado da Defensoria Pública da União que atue apenas perante a Justiça do Trabalho, e
a quase inexistente atuação daquela nessa área, aliada à insuficiência da assistência por parte
dos sindicatos, acaba deixando sem alternativas a parte que dispõe de parcos recursos
financeiros. Essa questão já foi mais detalhadamente debatida anteriormente.
Já o segundo pressuposto mostra-se equivocado, pois não é capaz de solucionar a questão das
pequenas causas. Explica-se: nas reclamações cujo valor econômico não seja muito alto, os
honorários advocatícios também não representarão significativa quantia, o que não atrairá o
interesse de profissionais para a sua causa. Dessa maneira, certamente, ser-lhe-á cobrado,
pelo advogado, um percentual (geralmente de 20%) sobre o montante que for recebido ao
final, para que, enfim, aceite representá-lo no processo. Ou seja, aquele valor que já era
pequeno para o reclamante hipossuficiente, diminui ainda mais, desfalcando-lhe, muito
provavelmente, um crédito de natureza alimentícia. Nesse mesmo sentido, Mauro Cappelletti
e Bryant Garth (1988, p. 19-20) afirmam que as causas de pequena monta são as mais afetadas
pelos custos do processo, uma vez que o preço de demandar no Judiciário acaba tornando
aquela demanda insignificante ou inútil. Corroborando com o aqui exposto:
Neste caso, normalmente o reclamante não ficará desguarnecido e terá a assessoria técnica
necessária. Contudo, ao final do processo, não poderá obter acesso a tudo o que lhe foi
deferido como direito reconhecido pelo Judiciário Trabalhista, ainda que tenha todos os seus
pedidos providos. (GODEGHESI, 2009, p. 87)
Dessa forma, percebe-se que a extinção total da facultatividade de representação por
advogado, como está sendo idealizada, apesar de constituir um avanço por um lado, provoca
uma barreira ao acesso à justiça pelo outro. Como já foi exaustivamente colocado ao longo
deste estudo, é necessário que o jus postulandi pessoal da parte atue em conjunto com outros
institutos para que, integradamente, atinja-se um efetivo acesso à justiça. Excluí-lo por
completo, no cenário atual, será mais prejudicial do que benéfico, especialmente diante da
ausência de uma assistência jurídica capaz de realizar plenamente esse papel dentro do
âmbito trabalhista, uma vez que, ao tentar proteger o hipossuficiente dos males advindos de
litigar sozinho no processo, acabará impedindo-o de litigar de jeito algum.
Como bem assevera José Augusto Rodrigues Pinto (2005, p. 265):
Nossa posição não é indicativa de que aplaudimos o exercício do jus postulandi pelo leigo em
direito. Muito pelo contrário, a experiência adquirida em longos anos de judicatura nos indica
haver mais ameaças ao direito processual e material dos postulantes, que provêm de seu
alheamento às normas técnicas a ser manipuladas no processo, do que vantagens em sua
aventura pessoal num terreno desconhecido.
(...) O que preconizamos é, em lugar da erradicação do jus postulandi, pura e simplesmente,
sobretudo no Dissídio Individual, sua substituição por um sistema amplo e eficiente de
prestação de assistência judiciária gratuita.
Uma possível solução para se evitar que o projeto de lei, com isso, acabe prejudicando o
acesso à justiça encontra-se na possibilidade de manutenção do jus postulandi pessoal da
parte, porém mitigado. Essa possibilidade, inclusive, foi trazida à tona em alguns pareceres (do
Deputado Indio da Costa, na Câmara dos Deputados, e do Senador Sérgio Souza, no Senado
Federal) ao projeto de lei ao longo da tramitação, em que foram propostos limites de 20
salários mínimos e 40 salários mínimos, respectivamente, para que a parte pudesse valer-se do
jus postulandi. Esse é um caminho que merece ser tratado com mais atenção pelo projeto de
lei.
Além do limite estabelecido pelo valor da causa para utilizar-se do jus postulandi pessoal da
parte, outros podem ser idealizados para dar uma maior efetividade a esse instituto. Nesse
sentido, poder-se-ia estabelecer que nas causas que envolverem questão unicamente de
direito, e esta estiver devidamente comprovada de plano, a parte poderia postular
desacompanhada de advogado, tal qual ocorre no julgamento antecipado da lide previsto pelo
Código de Processo Civil, em seu art. 330. Não se está, com isso, argumentando que a lide deva
ser julgada antecipadamente, nem que a parte reclamada tenha tolhido seu direito ao
contraditório e à ampla defesa, mas apenas que, nessas condições o reclamado possa litigar
sozinho perante o Judiciário.
Tanto nessa situação proposta, como nos casos de utilizar-se o critério do valor da causa, a
mitigação do jus postulandi pessoal da parte traria dois importantes papeis na esfera
processual trabalhista. O primeiro seria o dos servidores responsáveis por receber a
reclamação do indivíduo desacompanhado de advogado, cabendo-lhes analisar se aquele seria
um caso apto ao exercício do instituto, e informá-lo sobre como adequar-se ao mesmo, nos
casos em que isto for possível. O segundo seria o do magistrado, que estaria incumbido de
dirigir o processo de maneira mais ativa, a fim de preencher certas deficiências provocadas
pela ausência de representação por um profissional habilitado. Obviamente, essa posição mais
ativa do juiz já é permitida e aconselhada pelo ordenamento jurídico: não se está propondo,
aqui, nenhuma inovação. Porém, o que se pretende é que ele exerça esse posicionamento
mais efetivamente, uma vez que se observa, ainda, na cultura jurídica, um distanciamento
muito grande da causa pelo juiz. Não se está querendo que o magistrado atue como um
verdadeiro procurador do reclamante, mas que ele possa suprir algumas falhas que uma
pessoa sem conhecimento técnico pode cometer, e que não comprometeriam a sua
imparcialidade no processo. A proposta de o juiz alertar à parte sobre o uso do jus postulandi,
feita pelo Senador Sérgio Souza, caso sejam incorporadas essas alternativas, revela-se
imprescindível dentro desse contexto.
Mesmo quando a assistência jurídica gratuita conseguir ser, finalmente, efetiva na seara
trabalhista, essa mitigação ampliará o acesso à justiça, uma vez que permitirá à parte,
naquelas causas de baixa complexidade (econômica ou jurídica), demandar sem que haja um
custo com o qual não terá condições de arcar. Considerando-se o cenário atual, em que a
assistência jurídica gratuita não é efetiva, resta fundamental a permanência, embora mitigada,
do jus postulandi pessoal da parte no âmbito trabalhista.
Superadas essas considerações acerca do que o projeto de lei prevê para a questão da
representação, passar-se-á, agora, à análise mais detalhada da questão dos honorários
advocatícios.
O projeto de lei propõe a condenação em honorários advocatícios pela sucumbência no
processo trabalhista, fixados entre o mínimo de 10% sobre o valor da causa, e o máximo de
20% sobre o valor da condenação, atendidos os critérios estabelecidos pelo projeto de lei. A
princípio, a limitação em até 15% sobre o valor da condenação, proposta pela emenda do
Senador Armando Monteiro, e acatada pelo parecer do Senador Sérgio Souza parece
desnecessária, tendo em vista os argumentos utilizados. A alegação de que esse limite
respeitaria o disposto na Súmula 219, do TST, e o § 1º, do art. 11, da Lei 1.060/50, não é
cabível, uma vez que um dispositivo legal é hierarquicamente superior a uma súmula de
Tribunal, e no caso da norma da Lei 1.060/50, esta seria tacitamente revogada, nos termos do
§ 1º, do art. 2º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de
1942), que diz que “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei
anterior”. Dessa forma, essa pretendida alteração possui pouca utilidade, parecendo, apenas,
que se quer manter uma autonomia do Direito Processual do Trabalho, em relação ao Direito
Processual Civil. Não se está aqui dizendo que a alteração é prejudicial ou maléfica, mas
apenas que ela pouco representa diante do estudo aqui realizado.
Também é importante observar que é proposta a fixação de honorários de peritos, tradutores,
intérpretes e outros necessários ao andamento processual, pelo juiz, observados os critérios
de razoabilidade e proporcionalidade. Nesse mesmo sentido, estabelece o projeto de lei que a
fixação de honorários dos advogados, peritos, tradutores, intérpretes e outros, nas causas sem
conteúdo econômico e nas que não se alcance o valor de alçada, bem como naquelas em que
não houver condenação, será feita mediante apreciação equitativa pelo juiz, observados os
mesmos critérios quando fixado o valor dos honorários advocatícios. Essas disposições, apesar
de não trazerem algo inteiramente inédito ao ordenamento jurídico, tendo em vista o art. 790-
B, da CLT, que já prevê a responsabilidade pelo pagamento de honorários periciais,
representam uma consolidação daquela, além de uma melhor disciplina da mesma, ao
fornecer critérios e previsões para esses honorários, e explicitam não só os honorários do
perito, mas também de outros que exerçam atividade relevante para o processo, como os
tradutores e intérpretes. Além disso, a previsão de arbitramento de honorários advocatícios,
mesmo quando não houver condenação, e naquelas outras hipóteses, também consolida os
honorários devidos pela sucumbência, reforçando-os dentro do sistema jurídico.
Uma proposta interessante do PL 3.392/2004 refere-se à vedação de condenação recíproca e
proporcional da sucumbência. Contudo, essa redação apresenta uma interpretação um tanto
quanto ambígua. Pelo disposto, pode-se depreender que, nos casos de reclamante e
reclamado serem, em parte, vencedores e vencidos na demanda, não se aplicará qualquer
condenação em honorários. A outra interpretação advém de uma leitura sistemática e
teleológica do dispositivo. Assim como ocorre quanto às custas, em que não há pagamento pro
rata, ou seja, se o reclamante tiver seu pedido acolhido, ainda que seja uma parte mínima
dele, ficará isento das custas (LEITE, 2006, p. 617); o projeto de lei parece que pretende
estabelecer a mesma lógica para os honorários advocatícios. Esse segundo caminho
interpretativo afigura-se como uma escolha que se coaduna melhor aos princípios processuais
trabalhistas, ao proteger, principalmente, a parte hipossuficiente do processo de ter que arcar
com as despesas do profissional constituído. Não se deve perder de vista que, caso não tenha
todos os seus pedidos atendidos, o indivíduo disporá de um montante menor ao final da
demanda; imagine-se o prejuízo que suportaria ao ainda ter que desfalcá-lo para remunerar o
seu advogado.
As últimas considerações acerca da questão dos honorários advocatícios no PL 3.392/2004
referem-se à relação deles com a assistência judiciária gratuita. É previsto que, nas causas em
que a parte for assistida pelo Sindicato de Classe, ela não será alcançada pelos honorários
advocatícios, devendo ser pagos por meio da conta das dotações orçamentárias dos Tribunais.
Também é previsto que não sofrerá condenação em honorários advocatícios a parte que gozar
do benefício da justiça gratuita, e que, nesse caso, os honorários pagos pelo vencido
reverterão ao profissional patrocinador da causa. Essas disposições visam a não onerar a parte
que, ao ter o benefício da justiça gratuita deferido em seu favor, já demonstrou não dispor de
condições econômicas suficientes para arcar com a condenação em honorários advocatícios.
Além disso, o que é previsto para as causas em que a parte esteja assistida pelo Sindicato da
Classe busca fortalecer essa forma de assistência, que, embora seja insuficiente, ainda possui
importância no âmbito processual trabalhista.
Diante do que foi apresentado quanto ao que o projeto de lei prevê para os honorários
advocatícios, tem-se que o PL 3.392/2004 representa um enorme avanço na direção de uma
maior efetividade do acesso à justiça na seara processual trabalhista. Como já foi visto
anteriormente, o estabelecimento desse dispositivo combate fortemente uma das barreiras ao
acesso à justiça: o elevado custo de se demandar em juízo. Com ele, a parte não necessitará
mais comprometer parcela do montante ganho na causa para que possa constituir advogado,
não desfalcando, assim, seus créditos de natureza alimentícia.
Não se deve cair no argumento falacioso de que ele, na verdade, prejudicaria o reclamante
hipossuficiente, quando fosse vencido na demanda, pois ele pode valer-se do benefício da
justiça gratuita, não sendo condenado a arcar com os honorários advocatícios em tal situação
(ALMEIDA, 2012, p. 129). Além disso, caso o projeto de lei incorpore, de fato, a linha
interpretativa, quanto à sucumbência recíproca, de que o reclamante vencedor e vencido
parcialmente na causa não sofrerá essa condenação, muito raramente se teria um caso em
que ele tivesse que arcar com esses custos.
Contudo, essa previsão de condenação em honorários advocatícios, apesar de extremamente
benéfica, não é suficiente para proporcionar um acesso à justiça plenamente efetivo. Como já
foi observado acima, ao se tratar da questão da extinção do jus postulandi pessoal da parte, as
causas de baixo valor econômico não seriam atraentes aos profissionais habilitados, uma vez
que os honorários de sucumbência não representariam um ganho relevante. Dessa maneira,
para o reclamante poder constituir um patrono que o represente em juízo, teria que
comprometer parcela do que ganhou no processo, o que se tornaria extremamente danoso
para ele.
Nessa esteira, repisando-se o que já foi demasiadamente exposto ao longo deste estudo, deve-
se pensar em uma forma de integrar as diversas ações em prol do acesso à justiça, para que
elas atuem conjuntamente e possam alcançar a efetividade tão desejada. Assim, além da
combinação entre os honorários advocatícios e as propostas feitas para a mitigação do jus
postulandi pessoal da parte, cada vez mais imprescindível se torna a Defensoria Pública
Trabalhista. A instalação desse órgão, na verdade, parece ser o elo capaz de unir essas diversas
medidas que envolvem o instituto do jus postulandi e proporcionar a efetividade do acesso à
justiça no âmbito processual trabalhista.
Outras medidas também podem (e devem) ser adotadas para atuarem em conjunto com as
aqui já expostas. Um maior incentivo à conciliação e a que as partes firmem acordos judiciais,
por exemplo, parece um caminho bastante positivo a ser seguido. Apenas se deve ter cuidado
quanto aos acordos feitos, para que eles não subtraiam do trabalhador parte de seus créditos
de natureza alimentar, uma vez que estes devem ser considerados indisponíveis, evitando-se
favorecer o empregador que age de má-fé.
Portanto, após a análise feita ao longo desse capítulo, chega-se à conclusão de que o Projeto
de Lei n. 3.392, de 2004, representará avanços consideráveis para que o acesso à justiça seja
efetivo na Justiça do Trabalho. A sua aprovação (e posterior promulgação), no entanto, não
será capaz de concretizar esse objetivo inteiramente. Ainda é necessário que se faça mais e
que se pense em novas alternativas, que se integrem àquelas já existentes, para que a Justiça
do Trabalho esteja ao alcance de qualquer indivíduo que dela necessitar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, ao longo do estudo aqui realizado, o jus postulandi pessoal da parte é um instituto
que, na forma em que foi idealizado e em que é praticado ainda hoje, não mais atende ao seu
primordial objetivo: proporcionar o pleno acesso à justiça, tido em sua acepção moderna.
Apesar de permitir à parte que tenha a sua demanda apreciada pelo Poder Judiciário, ele não
consegue ser efetivo, pois se prende apenas a essa dimensão formal e tradicional do acesso à
justiça, o que causa muitos prejuízos ao litigante, especialmente o hipossuficiente. Isso se
deve, em grande parte, ao fato de que, à época em que foi criado, o processo trabalhista era
muito mais simples do que atualmente, possuindo um caráter muito mais administrativo que
judicial. Com o passar do tempo, e o crescente número de inovações complexas a que o
processo trabalhista foi submetido, o jus postulandi pessoal da parte acabou tornando-se
obsoleto.
Outra constatação a que se pôde chegar reside no fato de que a efetividade do jus postulandi
pessoal da parte envolve o combate a outros problemas que o circundam. Destes, os mais
urgentes são os que se referem à assistência jurídica gratuita e aos honorários advocatícios.
Conforme observado, e recorrentemente ressaltado, no presente estudo, a efetividade do
acesso à justiça vai muito além da resolução de um único obstáculo, devendo ser tratada em
conjunto com diversas ações que, integradamente, ajam em prol desse objetivo.
Nesse sentido, a análise do Projeto de Lei 3.392, de 2004, buscou avaliar as proposições feitas
por ele, atendo-se a cada um dos dispositivos elencados em seu texto, a fim de que se
analisassem atentamente as alterações previstas para o cenário do acesso à justiça no âmbito
processual trabalhista. Procurou-se, assim, fazer uma análise que englobasse os diversos
institutos aqui estudados, pensados em conjunto, e não apenas em si próprios.
Dessa maneira, concluiu-se que as mudanças propostas pelo PL 3.392/2004 são extremamente
positivas, mas que ainda são insuficientes para que se atinja o pleno e efetivo acesso à justiça.
A partir disso, verificou-se que a implementação da Defensoria Pública Trabalhista,
especializada, pode ser o ponto crucial que, aliado às modificações propostas pelo projeto de
lei, concretize definitivamente a efetividade do acesso à justiça. Além disso, novas medidas e
ações devem ser idealizadas e propostas para atuar conjuntamente com as demais, a fim de
tornar esse acesso à justiça ainda mais abrangente e efetivo.
É realmente necessário que se continue discutindo essa problemática do acesso à justiça, para
que a sua plena efetividade seja alcançada na seara trabalhista. Somente através dos estudos
aprofundados e dos debates realizados, esse objetivo poderá ser alcançado, e caminhar-se-á,
cada vez mais, rumo a uma justiça verdadeiramente digna e justa que esteja ao alcance de
todos.
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