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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X O TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DA REGIÃO SUDESTE Beatriz Carvalho Nogueira 1 Fabiana Cristina Severi 2 Resumo: O presente trabalho pretendeu analisar decisões proferidas nos Tribunais de Justiça da região sudeste do país relacionadas a condutas ocorridas no contexto do parto, consideradas como violência obstétrica. Essa análise foi realizada para que se compreendesse, de forma crítica, as dificuldades no acesso à justiça e à efetivação de direitos das mulheres parturientes. A partir da amostra de julgados, buscamos analisar o perfil das demandas relacionadas à temática para que pudéssemos verificar se o debate que já é realizado por diversos movimentos sociais e por políticas públicas brasileiras de humanização do parto integra as fundamentações e as decisões proferidas pelos membros dos tribunais. Assim, visamos observar se as violências narradas nas ações ajuizadas são imputadas como violência obstétrica, sendo esta compreendida como violência de gênero. Os dados sugerem que os casos de violência obstétrica judicializados não aparecem categorizados como violência obstétrica. Além disso, o foco nem sempre está na análise da violação de direitos das mulheres, mas sim na combinação de danos ao bebê e à mulher. Esperamos que a pesquisa forneça subsídios para que os órgãos do sistema de justiça possam tratar os casos judicializados de violência obstétrica sob uma perspectiva de gênero, garantindo os direitos humanos das mulheres, em especial os seus direitos sexuais e reprodutivos. Palavras-chave: Direito e Gênero, Direitos da Mulher, Direitos Sexuais e Reprodutivos, Violência Obstétrica. Introdução No presente artigo, iremos analisar o tratamento jurisprudencial que tem sido conferido aos processos que possuem como objeto a reparação por danos físicos, psicológicos e/ou sexuais abrangidos no conceito de violência obstétrica. Para que essa análise seja possível, iremos trazer o panorama internacional dos direitos sexuais e reprodutivos e o enquadramento destes como direitos humanos. Partindo-se dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, iremos apresentar os critérios necessários para que o Direito seja utilizado em uma perspectiva relacional, ou seja, que não considere os sujeitos como neutros e universais, servindo como instrumento na eliminação de das assimetrias de gênero. Para tanto, é necessário que os atores do sistema de justiça examinem os casos relacionados à violência obstétrica e, consequentemente, aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, sob uma perspectiva de gênero e antirracista que não exclua também outros marcadores sociais como classe 1 Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto USP, Ribeirão Preto, Brasil. 2 Professora Doutora do Departamento de Direito Público e do Programa de Mestrado da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP/SP. Membro do IPDMS. Coordenadora do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular de Ribeirão Preto - SP (NAJURP), Ribeirão Preto, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

O TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

NOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DA REGIÃO SUDESTE

Beatriz Carvalho Nogueira1

Fabiana Cristina Severi2

Resumo: O presente trabalho pretendeu analisar decisões proferidas nos Tribunais de Justiça da

região sudeste do país relacionadas a condutas ocorridas no contexto do parto, consideradas como

violência obstétrica. Essa análise foi realizada para que se compreendesse, de forma crítica, as

dificuldades no acesso à justiça e à efetivação de direitos das mulheres parturientes. A partir da

amostra de julgados, buscamos analisar o perfil das demandas relacionadas à temática para que

pudéssemos verificar se o debate que já é realizado por diversos movimentos sociais e por políticas

públicas brasileiras de humanização do parto integra as fundamentações e as decisões proferidas pelos

membros dos tribunais. Assim, visamos observar se as violências narradas nas ações ajuizadas são

imputadas como violência obstétrica, sendo esta compreendida como violência de gênero. Os dados

sugerem que os casos de violência obstétrica judicializados não aparecem categorizados como

violência obstétrica. Além disso, o foco nem sempre está na análise da violação de direitos das

mulheres, mas sim na combinação de danos ao bebê e à mulher. Esperamos que a pesquisa forneça

subsídios para que os órgãos do sistema de justiça possam tratar os casos judicializados de violência

obstétrica sob uma perspectiva de gênero, garantindo os direitos humanos das mulheres, em especial

os seus direitos sexuais e reprodutivos.

Palavras-chave: Direito e Gênero, Direitos da Mulher, Direitos Sexuais e Reprodutivos, Violência

Obstétrica.

Introdução

No presente artigo, iremos analisar o tratamento jurisprudencial que tem sido conferido aos

processos que possuem como objeto a reparação por danos físicos, psicológicos e/ou sexuais

abrangidos no conceito de violência obstétrica.

Para que essa análise seja possível, iremos trazer o panorama internacional dos direitos

sexuais e reprodutivos e o enquadramento destes como direitos humanos. Partindo-se dos

compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, iremos apresentar os critérios necessários para

que o Direito seja utilizado em uma perspectiva relacional, ou seja, que não considere os sujeitos

como neutros e universais, servindo como instrumento na eliminação de das assimetrias de gênero.

Para tanto, é necessário que os atores do sistema de justiça examinem os casos relacionados

à violência obstétrica e, consequentemente, aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, sob uma

perspectiva de gênero e antirracista que não exclua também outros marcadores sociais como classe

1 Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – USP, Ribeirão Preto, Brasil. 2 Professora Doutora do Departamento de Direito Público e do Programa de Mestrado da Faculdade de Direito de Ribeirão

Preto da USP/SP. Membro do IPDMS. Coordenadora do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular de Ribeirão Preto - SP

(NAJURP), Ribeirão Preto, Brasil.

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social, deficiências, dentre outros. No campo da violência obstétrica, isso requer, por exemplo, que

se reconheça as violações contra as mulheres como uma forma de violência institucional, pois

praticada no âmbito da prestação dos serviços de saúde nos períodos do pré-parto, parto e pós-parto.

Violência Obstétrica, Direitos Sexuais e Reprodutivos e Direitos Humanos

A violência obstétrica, termo empregado por diversos movimentos pela humanização do

parto e feministas, tem sido tratada pelos tribunais de justiça pátrios como situações de erros médicos,

sendo analisados conforme os requisitos de responsabilização civil. Contudo, conforme analisaremos,

a violência obstétrica deve ser entendida como violação aos direitos sexuais e reprodutivos das

mulheres, os quais, por sua vez, se enquadram no âmbito da proteção aos direitos humanos das

mulheres.

A violência obstétrica é conceituada como “qualquer ato ou intervenção direcionado à mulher

grávida, parturiente ou puérpera (que deu à luz recentemente), ou ao seu bebê, praticado sem o

consentimento explícito e informado da mulher e/ou em desrespeito à sua autonomia, integridade

física e mental, aos seus sentimentos, opções e preferências” (Fundação Perseu Abramo, 2013).

A violência obstétrica se insere no conceito de violência contra as mulheres, a qual é definida

pela Convenção de Belém do Pará3 como “qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause

morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na

esfera privada”. Ainda de acordo com a convenção, a violência contra a mulher abrange as violências

física, sexual e psicológica ocorridas no âmbito doméstico e público, inclusive, as perpetradas pelo

Estado ou seus agentes.

A violência obstétrica deve, portanto, ser analisada como violência contra as mulheres

institucionalizada e, mais especificamente, sob o aspecto dos direitos sexuais e reprodutivos, ou seja,

como uma verdadeira violação de direitos humanos das mulheres nos períodos do pré-parto, parto

e/ou pós-parto.

Os direitos sexuais e reprodutivos passaram a ter grande destaque na pauta dos movimentos

feministas a partir de 1970, principalmente no tocante ao direito de escolha e de liberdade de decisão

das mulheres (Corrêa; Alves; Januzzi, 2006, p. 39). No âmbito internacional, o reconhecimento desses

direitos como direitos humanos se iniciou em 1979 com a aprovação da Convenção sobre a

Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher4, resultado das reinvindicações

3 Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a Violência contra a Mulher, “Convenção de Belém do Pará”.

Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994. 4 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, adotada e aberta à assinatura,

ratificação e adesão pela resolução n.º 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 18 de Dezembro de 1979.

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realizadas pelos referidos movimentos a partir da primeira Conferência Mundial sobre a Mulher, no

México, em 1975. A Convenção é considerada como a responsável pelos delineamentos iniciais dos

direitos sexuais e reprodutivos na esfera global, especialmente pela atribuição de um duplo papel ao

Estado: eliminar a discriminação contra as mulheres no âmbito da saúde (vertente repressiva/punitiva)

e assegurar o acesso aos serviços de saúde, notadamente no que tange ao planejamento familiar

(vertente promocional). Essas duas vertentes dos direitos sexuais e reprodutivos representam, pois, a

principal diferença no tocante aos tradicionais direitos civis e sociais (Piovesan, 2002, p. 6).

A garantia ao respeito dos direitos sexuais e reprodutivos passou a ocorrer de modo mais

efetivo, sendo tratados na formulação de políticas públicas em âmbito global na Conferência do Rio

de 1992 (ECO 92) - responsável pela articulação dos seguintes eixos: meio ambiente, pobreza,

desenvolvimento, direitos humanos, gênero e saúde reprodutiva - e na Declaração e Programa de

Ação de Viena (Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, em 1993) – responsável por introduzir

a ideia de proteção dos direitos humanos das mulheres à comunidade internacional (Corrêa; Alves;

Januzzi, 2006, p. 35).

No âmbito interamericano da proteção dos Direitos Humanos, é necessário destacar a

importância da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a

Mulher (“Convenção de Belém do Pará”)5, pois estabeleceu como compromisso formal dos Estados

signatários o combate à violência contra as mulheres.

Em 1994, com a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), do

Cairo, os direitos humanos das mulheres e a desigualdade de gênero passaram a ser tratados de modo

mais específico no campo dos direitos reprodutivos. Nesse momento, deslocaram-se as questões

relacionadas à reprodução da perspectiva econômica e ideológica para a área da saúde e dos direitos

humanos (Corrêa; Alves; Januzzi, 2006, p. 35).

Os avanços no tocante aos direitos sexuais e reprodutivos foram ainda mais significativos na

IV Conferência Mundial sobre a Mulher em Pequim, no ano de 1995, uma vez que esta reafirmou e

ampliou as recomendações da CIPD, fazendo com que a sexualidade e os direitos sexuais fossem

tratados como direitos humanos das mulheres e recomendando aos países a revisão das legislações

que criminalizam ao aborto (Corrêa; Alves; Januzzi, 2006, p. 37).

Referida convenção foi promulgada pelo Brasil pelo Decreto nº 4.377/2002, revogando o Decreto no 89.460/84, o qual

apesar de também promulgar referida Convenção, possuía algumas reservas. 5 Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a Violência contra a Mulher, “Convenção de Belém do Pará”.

Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994.

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De acordo com Piovesan (2002, p. 6), os direitos sexuais e reprodutivos envolvem duas

vertentes diversas e complementares. A primeira compreende a liberdade e a autodeterminação

individual, exigindo o respeito ao livre exercício da sexualidade e da reprodução humana sem nenhum

tipo de coerção ou violência. Essa vertente consagra o poder de decisão no controle e no exercício da

fecundidade. Para que os direitos sexuais e reprodutivos sejam efetivados, exige-se a atuação ativa

na implementação de políticas públicas, representando estas, a segunda vertente.

Nesse sentido, a Declaração e a Plataforma de Pequim de 1995, reforçando a interdependência

e indivisibilidade dos direitos humanos, afirma que a violação dos direitos reprodutivos limita às

mulheres as oportunidades na vida pública e privada, seu acesso à educação e o pleno exercício dos

demais direitos (Piovesan, 2002, p. 13).

Os parâmetros internacionais exigem, portanto, que os direitos sexuais e reprodutivos das

mulheres sejam tratados e incorporados pelos Estados como direitos humanos. Todas as vertentes de

proteção dos direitos sexuais e reprodutivos: concepção, parto, contracepção, aborto, dentre outros,

devem ser encarados de forma interligada e a impossibilidade de sua concretização remete as

mulheres para um lugar de submissão (Ávila, 1994, p. 10).

No Brasil, a incorporação dos temas referentes à reprodução e sexualidade das mulheres foi

inicialmente realizada no âmbito da saúde e esteve intrinsecamente ligada às lutas pelas liberdades

democráticas, incluindo-se os movimentos pela democratização da saúde. O Programa de Assistência

Integral à Saúde da Mulher (PAISM) foi formulado pelo Ministério da Saúde em 1983 e abordava os

direitos sexuais e reprodutivos das mulheres em conjunto com as reinvindicações políticas pela

democratização (Ávila, 1994, p. 13). O programa foi responsável por conceber a saúde das mulheres

de forma integral e não apenas sob os aspectos da concepção e contracepção (Corrêa; Alves; Januzzi,

2006, p. 42).

A partir dos documentos e das práticas citados, observa-se a necessidade de implementação

dos direitos sexuais e reprodutivos sob a ótica dos direitos humanos, exigindo-se que os Estados

incorporem os compromissos internacionais em suas agendas de políticas públicas.

A efetivação desses direitos também depende de avanços legislativos internos e de atuação

qualificada pelos diversos atores do sistema de justiça, o que envolve a adoção de critérios específicos

que garantam a prestação jurisdicional adequada às mulheres, ou seja, a utilização de perspectiva de

gênero na análise dos casos que envolvam os direitos humanos das mulheres (transversalização da

perspectiva de gênero).

Violência obstétrica e o sistema de justiça

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A Justiça de Gênero, termo empregado por algumas feministas, sobretudo latino-americanas,

para designar a construção de um sistema formal de justiça sob a perspectiva de gênero, tem como

principais preocupações a efetivação dos Direitos Humanos das mulheres, a democratização do

sistema de justiça e do acesso à justiça pelas mulheres, uma vez que, apesar da revogação da maioria

dos textos normativos claramente discriminatórios com relação ao gênero, o Direito ainda é marcado

por fortes assimetrias (Severi, 2013, p. 55).

Dentre essas assimetrias, pode-se destacar a ausência de leis e normas que tratem da

violência obstétrica, seja responsabilizando os agentes de saúde e hospitais, seja garantindo Direitos

Fundamentais à mulher no momento do pré-parto, parto e pós-parto. A ausência de legislação

específica, além de dificultar a aplicação de punições aos agentes da violência obstétrica, também

pode significar a não preocupação do Direito em relação aos temas que afetem a saúde física e

psíquica da mulher.

Além da ausência de previsão normativa a respeito da violência obstétrica, notamos ainda

que o sistema de justiça, no julgamento de processos relacionados a essa temática não tem encarado

a violência obstétrica como violência institucional e de gênero (Nogueira; Severi, 2016, p. 465).

Em pesquisa por nós realizada, no período compreendido entre 03.02.15 e 13.02.15, na base

de jurisprudência de todos os Tribunais de Justiça do país pelo termo “violência obstétrica” não foi

encontrado nenhum resultado, ou seja, em nenhuma decisão judicial de segunda instância

disponibilizada eletronicamente foi utilizada essa categoria para nomear as situações de violência

relatadas. Além disso, em busca realizada nos Tribunais de Justiça da região sudeste (Espírito Santo,

Minas Gerias, Rio de Janeiro e São Paulo), nos períodos compreendidos entre 16.02.2015 a

26.02.2015 e entre 20.08.2015 e 24.08.2015 pelo termo “direitos reprodutivos” também não localizou

nenhum julgado que descrevesse situações de violência obstétrica (Nogueira; Severi, 2016, p. 442 e

446).

Assim, observamos que, apesar de o termo “violência obstétrica” ser amplamente utilizado

por movimentos sociais e políticos, ele ainda não aparecia em uso, pelas partes e pela Poder Judiciário

para categorizar e nomear as violações sofridas pelas mulheres nos períodos do pré-parto, parto e pós-

parto. Essas violações também não estavam sendo enquadradas no marco dos direitos sexuais e

reprodutivos das mulheres ou mesmo dos direitos humanos das mulheres (Nogueira; Severi, 2016, p.

446).

A pesquisa realizada também demonstrou que, em regra, as ações que buscam a reparação

pelas violências sofridas pelas mulheres são de natureza cível (88,5%) e ajuizadas pelas mães das

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crianças (60,1%) em face do hospital ou mesmo do hospital em litisconsórcio com alguma outra

categoria (Fazenda Pública, profissionais de saúde, plano de saúde) (55,3%). Os pedidos, em sua

grande maioria, referem-se à violência psicológica sofrida pela mulher/mãe (31,8%). Esse número

fica ainda mais evidente quando somado aos casos em que a violência psicológica é cumulada com

pedido de danos morais e/violência física (87,7%) (Nogueira; Severi, 2016, p. 448-450).

A partir dos acórdãos analisados, pareceu-nos que os casos foram decididos com base,

fundamentalmente, na combinação de danos às crianças e às mulheres, sem que houvesse enfoque na

violação de direitos das mulheres. Assim, o deferimento dos pedidos formulados pelas mulheres

dependeu mais do preenchimento dos critérios caracterizadores do erro médico (dano, nexo causal e

culpa) do que propriamente nas violações sofridas pelas mulheres nos momentos do pré-parto, parto

e pós-parto.

Contudo, no ajuizamento das ações com pedido de reparação dos danos decorrentes das

condutas praticadas no parto, as mulheres demonstraram não apenas a demanda pela reparação dos

danos sofridos, mas também a expectativa do reconhecimento de que os danos sofridos decorreram

da conduta dos profissionais e não do parto em si, desejando, portanto, a força simbólica da decisão

judicial na nomeação e no reconhecimento da violência institucional sofrida (Nogueira; Severi, 2016,

p. 465).

Nos casos analisados foram encontradas diversas decisões fundamentadas apenas em provas

periciais, tendo estas reproduzido conceitos e informações baseadas em práticas institucionalizadas e

em estereótipos que não apresentam respaldo pela Medicina baseada em evidências como é o caso da

episiotomia (Diniz, 2005, p. 631).

Foi recorrente, desse modo, encontrarmos fundamentações baseadas em laudos periciais que

informavam que “a episiotomia é um procedimento usual e adequado em parto normal, especialmente

tratando-se de primeiro filho. Assim, correto o procedimento médico nesse ponto” (São Paulo, 2006,

p. 4); “a ‘lesão’ ocorrida é decorrente da Episiotomia, normal nas mulheres submetidas a partos

normais, e não impede vida sexual dentro da normalidade, tanto que a autora ao ser examinada pelo

perito estava grávida de outro filho” (São Paulo, 2011, p. 4).

Salientamos que, apesar de haver diversas críticas à prática da episiotomia, os danos ao

períneo (fístula reto-vaginal e fístula reto-perineal) foram assuntos muito recorrentes no universo da

pesquisa realizada, superando 20%, o que demonstra sua expressiva utilização (Nogueira; Severi,

2016, p. 459).

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O fato de os danos ao períneo causados, principalmente pela episiotomia, e outras violências

narradas pelas mulheres (restrição ao direito de acompanhamento, danos permanentes às mães,

desrespeito à escolha do parto, ausência do médico, dentre outras) não serem consideradas como

violência institucional cometida contra as mulheres (ou ainda na categoria específica: violência

obstétrica), dificulta a própria problematização das conclusões apresentadas na prova pericial e

utilizadas pelos julgadores.

No caso da episiotomia, por exemplo, por ser um procedimento realizado frequentemente

pelos responsáveis à assistência da saúde da mulher, pode ocorrer de o perito, inserido também nesse

contexto, conceder laudo pericial afirmando que se trata de procedimento adequado e usual, sem

nenhum questionamento ou mesmo levantamento de evidências médicas que possam levar a

conclusões contrárias. Do mesmo modo, sem questionar a realidade da assistência à saúde e dessa

violência institucional, o julgador se utiliza, muitas vezes, unicamente da prova pericial apresentada.

Esse tipo de fundamentação, entretanto, pode violar compromissos internacionais firmados

pelo Brasil. O artigo 2º da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação contra

a Mulher6 (CEDAW) estabelece que os Estados-partes devem condenar a discriminação contra a

mulher em todas as suas formas e concordam em seguir, por todos os meios apropriados e sem

dilações a estabelecer a proteção jurídica dos direitos da mulher em uma base de igualdade com os

do homem e garantir, por meio de seus tribunais nacionais e de outras instituições públicas, a proteção

efetiva da mulher contra todo ato de discriminação. Além disso, devem se abster de incorrer em

práticas de discriminação contra as mulheres e zelar para que as autoridades e instituições públicas

atuem em conformidade com essa obrigação.

A própria Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a

Mulher (“Convenção de Belém do Pará”7) estabelece como dever dos Estados-partes a modificação

de padrões sociais e culturais, inclusive mediante a formulação de programas formais e não formais

que combatam preconceitos, costumes e práticas baseadas na inferioridade ou superioridade de

qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou

exacerbem a violência contra as mulheres. Os Estados-parte devem também promover a educação e

treinamento do pessoal judiciário e policial e demais funcionários responsáveis pela aplicação da lei,

6 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, adotada e aberta à assinatura,

ratificação e adesão pela resolução n.º 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 18 de Dezembro de 1979.

Referida convenção foi promulgada pelo Brasil pelo Decreto nº 4.377/2002, revogando o Decreto no 89.460/84, o qual

apesar de também promulgar referida Convenção, possuía algumas reservas. 7 Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a Violência contra a Mulher, “Convenção de Belém do Pará”.

Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994.

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bem como do pessoal encarregado pela implementação de políticas para prevenção, punição e

erradicação da violência contra as mulheres (artigo 8º, “b” e “c”).

Além das referidas convenções internacionais, a Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha), no

artigo 8º, VII, estabelece como diretriz na formulação de políticas públicas contra a violência

doméstica e familiar contra as mulheres a capacitação permanente do Poder Judiciário, do Ministério

Público e da Defensoria Pública nas áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação,

trabalho e habitação quanto às questões de gênero e de raça ou etnia. Apesar de a referida lei ser

destinada à proteção da mulher em situações de violência doméstica e familiar, traz importantes

considerações no tocante à eliminação das demais violências e discriminações sofridas pelas

mulheres, o que abrange, inclusive, situações de violência obstétrica.

Em 2011, o Comitê CEDAW, após denúncia internacional realizada pelo Center for

Reproductive Rights (Centro por Direitos Reprodutivos) e pela Advocacia Cidadã pelos Direitos

Humanos decidiu o caso “Alyne v. Brasil” e declarou a responsabilidade do Estado brasileiro pela

violação do acesso à justiça, da regulamentação das atividades de provedores de saúde particulares e

pela discriminação contra as mulheres. O caso refere-se à morte de Alyne da Silva Pimentel Teixeira,

brasileira, residente em uma das localidades mais pobres do Rio de Janeiro e negra, ocorrida em

novembro de 2002, logo após a indução de parto, a qual resultou em feto natimorto. A extração da

placenta ocorreu apenas quatorze horas após a indução do parto, o que resultou na deterioração do

estado de saúde de Alyne que, após mais de oito horas, foi transferida ao Hospital Geral de Nova

Iguaçu. Após mais de vinte e uma horas sem receber assistência médica, Alyne faleceu (Centro de

Derechos Reproductivos, 2014, p. 2; Conectas Direitos Humanos, 2010, p. 2).

O Comitê CEDAW declarou a responsabilidade do Estado brasileiro em razão de uma morte

materna evitável, sendo essa decisão importante no reconhecimento dos direitos reprodutivos,

especialmente nos direitos da mulher à maternidade segura e ao acesso a serviço público de qualidade,

sem que haja nenhuma forma de discriminação (Centro de Derechos Reproductivos, 2014, p. 2). O

Comitê recomendou ao Brasil que garantisse tutela jurisdicional efetiva às mulheres, pois ainda não

havia sido iniciado processo judicial para responsabilização dos profissionais de saúde responsáveis

pelo atendimento de Alyne. A ação ajuizada pela família de Alyne também não havia sido conhecida,

mesmo após mais de sete anos de tramitação e da negação de dois pedidos de antecipação de tutela.

Nesse aspecto, merece destaque a recomendação realizada pelo Comitê Cedaw referente à

garantia ao acesso aos recursos efetivos nos casos de violação dos direitos reprodutivos das mulheres

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e treinamento aos operadores do direito e membros do poder judiciário (Centro de Derechos

Reproductivos, 2014, p. 4)

O caso Alyne v. Brasil demonstra que, além do necessário julgamento com perspectiva de

gênero, é importante que outras diferenças sociais também sejam consideradas na tomada de decisões

pelos integrantes do Poder Judiciário. Assim, as características de raça, etnia, classe social,

preferência sexual, dentre outros marcadores, devem ser analisadas nas fundamentações judiciais,

pois também alteram as condições referentes ao acesso à justiça:

Quando consideramos grupos e categorias de mulheres como migrantes, campesinas,

prostitutas, profissionais do sexo, sem terra, sem teto, lésbicas, travestis, transexuais e

pertencentes às camadas populares, as problemáticas ligadas ao processo crescente de

institucionalização estatal das políticas para o enfrentamento da violência de gênero ganham

ainda maior complexidade e se imbricam com outras questões como colonialismo, racismo e

heteronormativismo (SEVERI, 2017, p. 21).

Essa observação é importante pelo fato de que essas categorias não afetam apenas o acesso

à justiça e sua efetividade, mas também o próprio acesso ao sistema de saúde. A população negra

apresenta os piores indicadores sociais e de saúde (Werneck, 2016, p. 539), fato corroborado por

pesquisa realizada sobre a variável raça/cor da pele em relação aos dados do inquérito “Nascer no

Brasil”, estudo de base hospitalar realizado com puérperas e seus recém-nascidos entre fevereiro de

2011 e outubro de 2012. Na pesquisa, foi possível identificar que há diferenças importantes no acesso

e na qualidade da assistência prestada às mulheres negras e ainda às mulheres negras em condições

econômicas mais precárias (DINIZ et al, 2016, p. 568).

Dentre os resultados que permitiram a confirmação das diferenças no atendimento das

mulheres negras durante o período do pré-parto, parto e pós-parto, destacam-se a menor frequência

no acesso ao pré-natal (31,1% e 37,5% para mulheres de cor parda e negra, respectivamente), a menor

presença de acompanhantes durante o parto (30,9% e 24,8% mulheres pretas e pardas ficaram sem

acompanhamento, enquanto 17,4% das mulheres brancas não contaram com acompanhante) e a maior

realização de partos vaginais e de períodos de trabalho de parto8 (Diniz et al, 2016, p. 570).

Diante da necessidade de que os sistemas de justiça atuem com perspectiva de gênero, alguns

países latino-americanos têm elaborado documentos que enfatizam essa obrigação internacional e que

buscam o estabelecimento de critérios aplicáveis pelos atores do sistema de justiça nos casos

relacionados aos direitos humanos das mulheres. Destacam-se, nesse sentido, os Protocolos para

8 Esse aspecto é denominado como paradoxo perinatal, pois representam casos em que a assistência à saúde possui tanto

peso negativo que pode, inclusive, anular as vantagens socioeconômicas e raciais. Isso não significa, contudo, que a

assistências às mulheres negras seja melhor, mas sim que a assistência médica concedida às mulheres brancas, em regra,

acaba gerando efeitos mais danosos: parto pré-termo e recém-nascido de baixo peso (Diniz et al, 2016, p. 570).

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julgamento com perspectiva de gênero (“Protocolo para juzgar con perspectiva de género”)

elaborados pelo México e pela Bolívia.

O julgamento com perspectiva de gênero pelos tribunais evita, assim, que sejam utilizados

argumentos baseados em estereótipos e que reforcem as desigualdades de gênero e de outros

marcadores sociais como, raça, etnia, classe social, dentre outros. Os estereótipos de gênero estão

“relacionados com as características social e culturalmente atribuídas a homens e mulheres a partir

das diferenças físicas baseadas principalmente em seu sexo9” (SCJN, 2013, p. 17 e 48-49 – tradução

nossa).

A adoção dessa abordagem no julgamento objetiva questionar o paradigma construído sobre

a ideia de sujeitos de Direito, os quais são tidos como neutros e universais, enquanto, na verdade,

representam o “homem branco, heterossexual, adulto sem incapacidades, não indígena e os papéis

que são atribuídos a esse paradigma”10 (TSJ, 2017, p. 33 – tradução nossa). É por essa razão que o

protocolo afirma que o julgamento com perspectiva de gênero não inclui somente mulheres, mas

também as diversidades sexuais e de gênero, questionando, inclusive, a própria ideia de

“masculinidade”.

Preconiza-se, portanto, a construção de uma Justiça de Gênero e antirracista que seja capaz

de eliminar as assimetrias de gênero e de reparar efetivamente as mulheres vítimas de violência,

inserindo-se aqui a violência obstétrica.

Conclusão

A partir do presente artigo, foi possível concluirmos que as práticas institucionalizadas de

violência obstétrica não devem apenas ser analisadas sob a disciplina aplicada à responsabilidade

civil, mas também como espécie de violência contra as mulheres, notadamente no que se refere aos

direitos sexuais e reprodutivos.

Isso significa dizer que as decisões dos casos que tenham como objeto os danos sofridos à

mulher nos períodos do pré-parto, parto e pós-parto não podem reproduzir estereótipos que reforcem

as violações cometidas contra as mulheres como ocorre, por exemplo, com o reforço da prática da

episiotomia.

Assim, nos casos que possuam relação com violações aos direitos sexuais e reprodutivos,

seguindo-se o que é preconizado por tratados internacionais, os tribunais devem fornecer resposta

9 “Los estereotipos de género están relacionados con las características social y culturalmente asignadas a hombres y

mujeres a partir de las diferencias físicas basadas principalmente en su sexo” (México, 2013, p. 49 – tradução nossa). 10 “Así, la perspectiva de género cuestiona el paradigma construido a partir de un ser humano neutral y universal, que

tiene como base al hombre blanco, heterosexual, adulto sin discapacidad, no indígena, así como los roles que a dicho

paradigma se le atribuyen” (Bolívia, 2017, p. 33 – tradução nossa)

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

jurisdicional capaz de assegurar o reconhecimento das violências sofridas e do seu efetivo reparo.

Desse modo, não reforçarão as assimetrias de gênero, raça, etnia, classe social, origem social e outros

marcadores sociais.

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THE JURISPRUDENTIAL TREATMENT OF OBSTETRIC VIOLENCE IN THE COURTS

OF JUSTICE OF BRAZIL’S SOUTHEASTERN REGION

Astract: The present study aimed to analyze decisions rendered in the Courts of Justice of Brazil’s

southeastern region related to conducts occurring in the context of childbirth, considered as obstetric

violence. This analysis was done in order to understand, critically, the difficulties in access to justice

and the enforcement of parturient women's rights. Based on the sample of judges, we sought to

analyze the profile of the demands related to the issue so that we could verify if the debate that is

already carried out by several social movements and by brazilian public policies of childbirth’s

humanization integrates the reasons and the decisions pronounced by the members of the Courts.

Therefore, we aim to observe if the violence narrated in the lawsuits are imputed as obstetric violence,

understood as gender violence. The data suggest that cases of judicial violence are not categorized as

obstetric violence. In addition, the focus is not always on the analysis of the violation of women's

rights, but rather on the combination of harm to the baby and the woman.We hope that the research

will provide support for justice system bodies to handle cases of obstetric violence from a gender

perspective, ensuring women's human rights, especially their sexual and reproductive rights.

Keywords: Law and Gender, Women's Rights, Sexual and Reproductive Rights, Obstetric Violence.