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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO ACADÊMICO: LUIS ROBERTO DAL PONT LODETTI São José (SC), novembro de 2004

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA NO DIREITO

PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

ACADÊMICO: LUIS ROBERTO DAL PONT LODETTI

São José (SC), novembro de 2004

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA NO DIREITO

PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí

ACADÊMICO: LUIS ROBERTO DAL PONT LODETTI

São José (SC), novembro de 2004

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA NO DIREITO

PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação da Prof. Esp. Pedro de Queiroz Córdova Santos.

ACADÊMICO: LUIS ROBERTO DAL PONT LODETTI

São José (SC), novembro de 2004

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA NO DIREITO

PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

LUIS ROBERTO DAL PONT LODETTI

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de

bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

São José, ... de novembro de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof. Esp. Pedro de Queiroz Córdova Santos - Orientador

_____________________________________________________

Prof. Esp. Anna Lúcia Matozo Camargo - Membro

_______________________________________________________ Prof. Esp. Giancarlo Castelan - Membro

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Realmente sábio é aquele que

sabe que não sabe nada.

Talmud

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Às pessoas mais importantes na minha vida, Loraines Dal Pont Lodetti, minha mãe,

Nestor Lodetti, meu pai, Luis Paulo e Nicola, irmãos e

Elisa. Pelo carinho e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a conclusão deste

trabalho.

Especialmente à minha tia Maria das Graças pela dedicação e ajuda na revisão dos

textos.

Ao meu amigo Antônio Augusto Teixeira Diniz, pelo incentivo e ajuda na busca

das obras necessária para a elaboração desta monografia.

Ao meu orientador e amigo Pedro de Queiroz Córdova Santos pela ajuda e

dedicação para a conclusão do trabalho.

E a todos os colegas de classe que fizeram os cinco anos de faculdades

inesquecíveis.

A todos o meu muito obrigado!

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DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –

Univali, a Coordenação do Curso de Direito e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade

acerca do mesmo.

São José (SC), 18 de outubro de 2004

Luis Roberto Dal Pont Lodetti Acadêmico

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ROL DE ABREVIAÇÕES

ampl. - Ampliada

Art. – Artigo

Arts. - Artigos

Câm - Câmara

CC – Código Civil

CDC – Código de Defesa do Consumidor

Cf. - Conforme

CF/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CPC– Código de Processo Civil

Des. - Desembargador

DJU - Diário Oficial da Justiça da União

ed. - Edição

j. – julgado em

p. – página

pp. - páginas

pub. - publicado em

rel. – Relator

rev. - Revisada

TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

TJSC – Tribunal de Justiça de Santa Catarina

vol. - volume

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SUMÁRIO

RESUMO ........................................................................................................................... xi INTRODUÇÃO ...................................................................................................................1 1 O PROCESSO E SUA FUNÇÃO JURISDICIONAL ....................................................3 1.1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO PROCESS ...............................................................3 1.2 BREVE RELATO HISTÓRICO DO DIREITO PROCESSUAL ROMANO... ..............4 1.2.1 Período das legis actiones ..............................................................................................4 1.2.2 Período per formulam............................................................................................. .......5 1.2.3 Período da cognitio extraordinária ...............................................................................6 1.3 O PROCESSO COMO MEIO DE ATUAÇÃO DA JURISDIÇÃO ................................7 1.4 PROCESSO E PROCEDIMENTO ..................................................................................9 1.5 A EFETIVIDADE DO PROCESSO E O PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA ......10 1.6 TEMPO E PROCESSO ..................................................................................................10 1.7 CLASSIFICAÇÃO DOS PROCESSOS.........................................................................14 1.7.1 Processo de conhecimento ...........................................................................................15 1.7.1.1 Eficácia declaratória..................................................................................................16 1.7.1.2 Eficácia constitutiva..................................................................................................17 1.7.1.3 Eficácia condenatória................................................................................................18 1.7.1.4 Eficácia mandamental...............................................................................................19 1.7.1.5 Eficácia executiva lato sensu ....................................................................................20 1.7.2 Processo de execução...................................................................................................21 1.7.3 Processo cautelar..........................................................................................................22 1.8 INDEPENDÊNCIA DOS PROCESSOS E O PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DO PROCESSO DE EXECUÇÃO .............................................................................................24 2 O SINCRETISMO PROCESSUAL NA ATUAL DISPOSIÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ............................................................................................................26 2.1 CONCEITO DE SINCRETISMO PROCESSUAL........................................................26 2.2 A POSIÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1939......................................27 2.3 ORIGEM DO SINCRETISMO PROCESSUAL............................................................28 2.4 A GRADUAL EXTINÇÃO DA AUTONOMIA DO PROCESSO DE EXECUÇÃO ..30 2.5 O SINCRETISMO PROCESSUAL E AS TUTELAS MANDAMENTAIS E EXECUTIVAS LATO SENSU........................................................................................................................31 2.5.1 O sincretismo processual em ações que envolvem direitos reais ................................33 2.5.2 Os artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil e a execução específica das obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa fundadas em título judicial...............................35 2.6 O SINCRETISMO PROCESSUAL E A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA ...................41 2.7 A POSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO IMEDIATA DA SENTENÇA ........................44

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3 O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS JUDICIAIS PARA O PAGAMENTO DE QUANTIA .....................................................................................46 3.1 A DICOTOMIA DAS ATIVIDADES JURISDICIONAIS. EXECUÇÃO DE SENTENÇA PARA PAGAMENTO DE QUANTIA ................................................................................46 3.2 A CRISE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA............................................................48 3.3 O PROJETO DE LEI 3.253 DE 2004 E SUAS PROPOSTAS ......................................55 3.4 AS VANTAGENS APONTADAS POR HUMBERTO THEODORO JÚNIOR NA ADOÇÃO DE UM PROCEDIMENTO ÚNICO..................................................................58 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................61 REFERÊNCIAS .................................................................................................................64 ANEXOS .............................................................................................................................68

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RESUMO

O trabalho é direcionado ao estudo da execução de sentença quando fundada em

obrigação para pagamento de soma em dinheiro. Inicia-se com um estudo geral do processo,

abordando principalmente aspectos relativos à efetividade e a problemática de sua duração.

Aponta-se também, a atual classificação dos tipos de processo, enfatizando a autonomia do

processo de execução. Em seguida, observa-se a gradual extinção da autonomia do processo de

execução frente ao emergente sincretismo processual. Hipóteses estas, representadas pelas

eficácias mandamentais e executivas lato sensu que cada vez mais ganham espaço no cenário

processual civil brasileiro, mais precisamente no tocante as obrigações de fazer ou não fazer e de

entrega de coisa, como também, nas ações que envolvam direitos reais. A terceira parte relaciona-

se com a autonomia do processo de execução quando se tratar de títulos executivos judiciais

visando pagamento de quantia em dinheiro. Aponta-se a criticada dicotomia das atividades

jurisdicionais e a insatisfação da doutrina no que diz respeito ao cidadão ter que mover duas

ações para a entrega definitiva do seu direito. Apresenta-se a proposta de mudança no referido

sistema e as vantagens apontadas pela doutrina na unificação dos processos.

Palavras chave: efetividade do processo; sincretismo; pagamento de quantia.

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INTRODUÇÃO

A discussão acerca da efetividade do processo e de possíveis meios capazes de

torná-lo cada vez mais hábil a satisfazer os anseios da sociedade apresenta-se de relevante

interesse.

O acesso ao judiciário é uma necessidade de todos, e cada vez mais se exige do

Poder Judiciário uma atuação dentro dos padrões esperados pelos consumidores da justiça, isto é,

realmente eficaz. Para que isso ocorra, é necessário que o instrumento colocado à disposição dos

cidadãos, o processo, seja realmente útil e entregue a quem tem um direito tudo aquilo que tem

direito de receber.

A verdade, porém, é que, cada vez mais a justiça no Brasil tem inspirado o

descrédito à população em relação à eficiência e rapidez da prestação jurisdicional, uma vez que

o processo, em determinadas situações, mostra-se extremamente embaraçoso e,

conseqüentemente, ineficaz.

Evidentemente que o problema da ineficiência da prestação jurisdicional não se

resume à ineficácia do processo; vários fatores fazem com que a “justiça” brasileira torne-se

insuficiente, valendo citar a falta de recursos humanos necessários para o funcionamento

adequado do judiciário e a falta de vontade política. Em termos, um judiciário efetivamente forte.

É de se reconhecer, contudo, que algumas inovações têm sido concebidas com o

objetivo de dinamizar o processo, por exemplo, a criação dos juizados especiais (Lei 9.099/95), a

instituição da antecipação dos efeitos da tutela (art. 273 do Código de Processo Civil), dentre

outras que, felizmente, já fazem parte do nosso sistema jurisdicional.

Nessa seara, o presente trabalho destina-se a expor, na ótica do processo civil

brasileiro, aspectos processuais relativos à execução de sentença, especificamente no que se

refere à execução dos títulos judiciais para pagamento de quantia certa - questão muito discutida,

nos tempos atuais, pela doutrina especializada.

Assim, - fundamentado no estudo de aspectos gerais do processo civil brasileiro e,

na medida do possível, acompanhando a doutrina especializada - proceder-se-á ao estudo das

deficiências da atual dicotomia do atual sistema no tocante à execução de títulos judiciais para

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pagamento de quantia e apoiando este fato à ineficiência da eficácia condenatória. Ademais,

serão abordadas as vantagens apontadas pela doutrina na adoção de um procedimento único.

Neste trabalho, utilizou-se o método dedutivo, e a forma indireta de pesquisa.

Posto isso, o trabalho foi dividido em três capítulos. Inicialmente foi abordada a

função jurisdicional do processo, a garantia constitucional de sua efetividade, a sua classificação,

acercou-se, nessa divisão, do papel de cada tipo de processo e suas subdivisões e, por fim, a

posição “clássica” adotada pelo Código de Processo Civil de 1973, calcada na autonomia do

processo de execução.

No segundo capítulo, ponderou-se toda a evolução processual já existente em

nosso ordenamento jurídico, na busca do sincretismo processual. Dessa forma, deixa-se para trás

a malfadada dicotomia das atividades jurisdicionais, idealizada pelo legislador de 1973.

Sustentam-se, mais precisamente, as execuções das obrigações de fazer ou não fazer e de entrega

de coisa e ainda as execuções de ações fundadas em direitos reais, as chamadas “execuções

reais”, assim denominadas por Ovídio A. Baptista da Silva, pelas quais se percebe a inserção do

referido princípio em nosso ordenamento jurídico. Nessa vereda, dar-se-á ênfase às eficácias

mandamentais e executivas lato sensu; eficácias estas que dispensam a ação autônoma de

execução.

No terceiro e último capítulo, serão pesquisadas, na doutrina, opiniões que levam a

acreditar que o princípio do sincretismo deveria expandir-se e atingir a execução mais comum

entre nós, qual seja, a execução por quantia certa contra devedor solvente - fundada em título

executivo judicial. Para se chegar a essa conclusão, discorre-se sobre a crise na eficácia

condenatória - preceito autorizador da execução de sentença. Ainda no último capítulo,

apresenta-se a proposta do Projeto de Lei nº 3.253 de 2004, o qual pretende realmente pôr fim à

execução de sentença para pagamento de quantia. Em arremate, são apresentadas vantagens

apontadas pela doutrina na adoção de um procedimento único para essas demandas.

Com base nos argumentos expostos, procura-se nesta monografia refletir sobre a

dispensabilidade de uma nova ação a qual visará alcançar o intento inicial não satisfeito com a

sentença condenatória, por conta disso, seu reflexo na ineficiência da prestação jurisdicional.

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1 O PROCESSO E SUA FUNÇÃO JURISDICIONAL

1.1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO PROCESSO

A evolução da vida humana e, conseqüentemente, da sociedade está intimamente

ligada ao seu desejo de se comunicar - viver em sociedade. Buscando-se a harmonia entre os

seres que vivem conjuntamente, chega-se à idéia de que deve o direito amparar a sociedade. A

par disso, tem-se que “A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações

sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo

de sacrifício e desgaste1”.

O direito como conseqüência natural dessa cultura social faz-se presente perante a

sociedade, nos termos do dizer latino “ ubi societas, ibi jus2”, e seu progresso deve seguir a

evolução social3.

Outrossim, a existência do direito faz com que sejam necessários mecanismos para

poder efetivá-lo, através do exercício da jurisdição; assim, por intermédio do processo é que

teremos o direito como forma de segurança social.

Desde a antiguidade, no momento em que se chegou à conclusão de que os

particulares não deveriam utilizar-se das próprias mãos para fazer valer a justiça, conclui-se que

todos deveriam ser submetidos à autoridade pública, para, então, de forma imparcial impor a

vontade pública e, com efeito, resolver os conflitos de interesses4.

1 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 11ª ed. rev. e atual. – São Paulo: Malheiros, 1995. p. 19. 2 Conforme definição de PLÁCIDO e SILVA, o brocado significa a “Máxima em que a ssenta o princípio de que onde há sociedade, há Direito. E, assim, não se pode admitir o Direito fora da sociedade, nem a sociedade sem Direito”.(SILVA, Plácido. Vocabulário Jurídico. – São Paulo: Forense. 1973. p.1273.) 3 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela Jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu. – Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 3. 4 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 20ª ed. vol. 1 – Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 10.

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1.2 BREVE RELATO HISTÓRICO DO DIREITO PROCESSUAL ROMANO

Em tempos primitivos, a figura do Estado centralizado e forte que solucionava os

conflitos de interesses entre particulares não existia5.

Contudo, não havia um ente público que impusesse a vontade pública perante os

particulares, nem havia lei. Posto isso, o indivíduo que desejasse obter algo de outrem deveria,

necessariamente, fazer valer suas próprias mãos6 .

Porém, aos poucos, a sociedade primitiva começou a perceber que essa forma de

solução de conflitos causava males, e, então, passaram a preferir, ao invés da solução parcial dos

conflitos, feitos pelas próprias partes, adotar soluções por intermédio de um ser imparcial: o

árbitro. A decisão proferida pelo “julgador” era basicamente informada pelos costumes da

época7.

Tomando-se por base o direito processual romano, que se encontra dividido em

três fases, veremos, a seguir, uma breve síntese de cada período.

1.2.1 Período das legis actiones

Este sistema era eminentemente privado, uma espécie de compromisso entre as

partes em submeter-se à decisão de um julgador privado. As decisões dos atritos eram feitas pelos

próprios sujeitos sociais, sem a intervenção de um Poder Judiciário, nos moldes do ordenamento

moderno8.

No direito processual romano, em um primeiro momento, no chamado período

legis actiones, as partes só poderiam utilizar-se das chamadas ações da lei, as quais eram apenas

cinco. O procedimento seguia oralmente e compreendia duas fases: uma perante o magistrado

(fase in iure) e outra perante o árbitro (iudex, o árbitro privado), a quem cabia a produção das

5 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 21. 6 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 21. 7 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 22. 8 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela Jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, pp. 5/6.

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provas e a decisão final9. “Proferido o julgamento, encerravam -se as atividades do juiz e o

próprio processo10”.

Caso não houvesse o cumprimento da sentença, deveria o credor propor uma nova

ação, chamada de legis actio per manus iniectionem. A forma de execução desta era

essencialmente pessoal e os procedimentos totalmente privados, devendo o credor conduzir o

devedor à força perante o julgador, para, então, tomar as medidas necessárias para o cumprimento

da medida (aprisionamento, venda ou morte do devedor, apossamento de seu patrimônio). Esta

forma de execução não dava o direito do devedor defender-se11.

1.2.2 Período per formulam

Neste período, o processo passou a ter uma base escrita, porém ainda carregando a

predominância da oralidade12.Aboliram-se as chamadas ações da lei, ficando o magistrado

autorizado a conceder as chamadas “fórmulas” para compor os conflitos de interesse.

Da mesma forma que ocorria no período das ações da lei, havia uma fase em que o

demandante apresentava o caso ao magistrado e a fórmula era escolhida. Logo após, o caso era

levado ao árbitro para o julgamento13.

Para ainda melhor satisfazer a sociedade, o Estado passa a definir critérios para

tais decisões. Desta forma, deixan de lado as antigas decisões subjetivas proferidas na

antiguidade14.

O cumprimento da decisão, caso não fosse espontaneamente feito, deveria ser

efetivado por meio de uma nova ação - a chamada actio iudicati - remédio processual criado para

eliminar as brutalidades que ocorriam no período da legis actiones. Aos poucos, foi sendo

9 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, pp. 11/12. 10 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal. – Rio de Janeiro, Aide Ed., 1987. p. 88. 11 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 88. 12 Cf. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. – 6. ed. ver. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997. p. 40. 13 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p. 12. 14 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 23.

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implementado o direito de defesa, na fase de execução, deixando-se claro, nesta fase, que toda a

execução deveria ser precedida de condenação15.

1.2.3 Período da cognitio extraordinária

Tempos depois, a medida que o Estado começou a ser afirmado como um ser

superior e a quem todos deveriam obedecer, passou-se a transferir ao Estado o poder de

solucionar os conflitos de interesses.

Após o período formulário, surgiu outro que apresentou como mais representativa

característica a expressiva evolução do Estado como solucionador de conflitos. Neste período,

chamado de cognitio extraordinária, o processo não mais possuía a posição bipartida, conduzido

integralmente pelo juiz estatal16; a justiça consolida-se como pública; o Estado já é

suficientemente forte para impor-se perante os particulares e autoritariamente e por fim aos

conflitos17. É também nesta fase que há a transição entre a justiça privada e a justiça pública18.

Sobre o período da cognitio extraordinária, Enrico Tullio LIEBMAN é

categórico:

De qualquer forma, a característica da nova época reside no fato que o

processo se tornou inteiramente estatal: o magistrado investido da jurisdição conduz o

processo até o fim e profere, ele próprio, a sentença, ou delega o pronunciamento a um

funcionário dependente dêle (iudex datus)19.

Neste período, o juiz de direito, exercia função eminentemente pública,

objetivando a realização do direito - era o responsável pelas decisões20 e a função jurisdicional

passou a ser privativa de funcionários públicos - desaparecendo os árbitros privados.

A fase executiva, representada pela actio iudicati, sofre diversas inovações, por

exemplo, a diferenciação dos procedimentos para os diversos tipos de execução21. Como colocou

15 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, pp. 96-98. 16 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela Jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 7. 17 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 23. 18 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela Jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 7. 19 LIEBMAN, Enrico Tullio Liebman. Embargos do Executado. – São Paulo: Saraiva, 1968. p. 16. (manteve-se a grafia original) 20 Cf. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 41.

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Humberto THEODORO JÚNIOR22: “Foi dessa fase que surgiram os germes do processo civil

moderno”.

1.3 O PROCESSO COMO MEIO DE ATUAÇÃO DA JURISDIÇÃO23

Importante é, prescindindo do estudo de qualquer aspecto relativo ao processo e

suas individualidades, conhecer o conceito do termo “processo”. A palavra “processo”,

etimologicamente, significa “marcha avante”, “caminhada”, vinda do latim procedere24. O

processo, então, pode ser compreendido pelos juristas como “a série de atividades que devem se

levar a cabo para chegar a obter a providência jurisdicional25”.

Como sintetizou Piero CALAMANDREI26, “A proibição da autodefesa, tal como

existe nos ordenamentos jurídicos modernos, é o resultado de uma longa e trabalhosa evolução”.

Assim, sendo vedada a autotutela27 nos tempos atuais, ficando o cidadão impossibilitado de

utilizar a chamada “justiça com as próprias mãos”, o Estado coloca à disposição da sociedade

instrumento que possibilita a tutela do direito postulado, este instrumento é o processo. Por meio

21 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 110. 22 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p. 12. 23 Na definição de PLÁCIDO e SILVA, jurisdição: “Derivada do latim jurisdictio (ação de administrar a justiça, judicatura), formado, como se vê, das expressões jus dicere, juris dictio, é usado precisamente para designar as atribuições especiais conferidas aos magistrados, encarregados de administrar a justiça. Assim, em sentido emientemente jurídico ou propriamente forense, exprime a extensão e limite do poder de julgar de um juiz”.(SILVA, Plácido. Vocabulário jurídico, p. 897.) 24 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 277. 25 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil; tradução de Luiz Abezia e Sandra Drina Fernandez Barbiery – Campinas: Bookseller, 1999. pp. 253/254. 26 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, p. 180. 27 “Apesar da enérgica repulsa à autotutela como meio ordinário para a satisfa ção de pretensões em benefício do mais forte ou astuto, para certos casos excepcionalíssimos a própria lei abre exceções à proibição. Constituem exemplos o direito de retenção(CC, arts. 1.219, 1.434, 578, 644, etc.), o “desforço imediato”(CC, art. 1210 § 1 º), o penhor legal (CC, art. 1.467), o direito de cortar raízes e ramos de árvores e ramos de árvores limítrofes que ultrapassem a extrema do prédio (CC, art. 1.283), a auto-executoriedade das decisões administrativas; sob certo aspecto, podem-se incluir entre essas exceções o poder estatal de efetuar prisões em flagrante (CPP, art. 301) e os atos que, embora tipificados como crime, sejam realizados em legítima defesa ou estado de necessidade (CP, arts. 24-25; CC, arts. 188, 929 e 930)”. (CINTRA, Antonio Ca rlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 29.). (atualizado com os artigos do Código Civil de 2002, Lei 10.406/2002).

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do processo e exercendo sua função jurisdicional, o Estado coloca-se de forma imparcial perante

os litigantes e, assim, entrega o direito ao merecedor28.

De acordo com ARRUDA ALVIM29, a jurisdição destina-se a solucionar os

conflitos de interesses, tal como tenham sido trazidos ao Estado-juiz, e deverá este afirmar a

existência de uma vontade concreta da lei, favorecendo a parte merecedora.

Cândido Rangel DINAMARCO disserta sobre jurisdição:

A jurisdição é, pois, uma das funções do Estado, mediante a qual este

se substitui aos titulares dos interesses em conflito, para, imparcialmente, buscar a

atuação da vontade do direito objetivo substancial válido para o caso concreto – seja

expressando imperativamente o preceito, seja realizando no mundo das coisas o que o

preceito dita30.

O Estado então, assumindo o monopólio da jurisdição, é quem tem o direito e ao

mesmo tempo o dever de solucionar os conflitos interindividuais. PINTO FERREIRA explica a

atuação da jurisdição por meio do processo:

Processo é o conjunto de atos vinculados os juízes e seus auxiliares

aos litigantes, com a presença do contraditório. É o instrumento utilizado pelo Estado

no exercício da função jurisdicional para compor os conflitos intersubjetivos, tendo

assim a finalidade de resolver pretensões insatisfeitas. Ele se desenvolve mediante um

conjunto de atos interdependentes sucessivos, em que são partes os litigantes, os órgãos

judiciários e seus auxiliares31.

Como visto, é por meio do processo que a jurisdição opera. É o Estado, por meio

dos juízes e como reflexo de sua soberania, que tem o poder de impor coercitivamente suas

decisões para à sociedade. A função jurisdicional compete concretizar a vontade da lei, aplicação

a norma pré-existente ao caso concreto; assim, não tem o juiz o dever de criar normas, apenas

aplicá-las32.

28 Cf. ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 8ª ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 71. 29 Cf. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 161. 30 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 3ª ed. rev., atual e ampl. – São Paulo: Malheiros, 1993. p. 185. 31 FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Processual Civil. – São Paulo: Saraiva, 1998. p. 5. 32 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela Jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, pp. 10/11.

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O processo é elemento indispensável ao exercício da função jurisdicional. Papel

este exercido com o objetivo único de resolver as questões inerentes aos conflitos litigiosos de

interesses, aplicando a vontade concreta da lei. “É, por definição, o instrumento através do qual a

jurisdição opera, (instrumento para a positivação do poder)33”.

Humberto THEODORO JÚNIOR, não discordando da doutrina, define desta

forma o processo:

Para exercer a função jurisdicional, o Estado cria órgãos

especializados. Mas estes órgãos encarregados da jurisdição não podem atuar

discricionária ou livremente, dada a própria natureza da atividade que lhes compete.

Subordinam-se, por isso mesmo, a um método ou sistema de atuação, que vem a ser o

processo.

Entre o pedido da parte e o provimento jurisdicional se impõe a

prática de uma série de atos praticados em juízo; importa, também e principalmente, no

estabelecimento de uma relação jurídica de direito público geradora de direitos e

obrigações entre o juiz e as partes; cujo objetivo é obter a declaração ou a atuação da

vontade concreta da lei, e maneira a vincular, a esse provimento, em caráter definitivo,

todos os sujeitos da relação processual34.

Sintetizando, visualiza-se que o processo é o meio pelo qual o cidadão soluciona

seus conflitos por meio da atuação imparcial do Estado (função jurisdicional).

1.4 PROCESSO E PROCEDIMENTO.

Impede observar a distinção entre os termos processo e procedimento. Não se

confundindo com a definição de processo, o procedimento, na visão de PINTO FERREIRA35,

têm-se como “uma seqüência coordenada de atos processuais de acordo com a forma

predeterminada em lei”. Seria na melhor definição de Humberto THEODORO JÚNIOR 36, “a

forma material com que o processo de realiza em cada caso concreto”. Cândido Rangel

33 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 277. 34 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p. 42. 35 FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Processual Civil, p. 5. 36 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p 43.

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DINAMARCO37, contribuindo para o assunto, explica que o conceito de processo “encontra -se

intimamente enleado com o de procedimento, que é sua expressão visível”. Desta forma, destaca -

se a dessemelhança existente entre os termos.

O procedimento é apenas a forma como o processo se exterioriza: o meio

extrínseco pelo qual o processo se inicia, desencadeia-se e chega ao seu fim. É a parte perceptível

do processo38.

Neste sentido, colhe-se da doutrina o seguinte trecho:

Terminologicamente é muito comum a confusão entre processo,

procedimento e autos. Mas, como se disse, procedimento é o mero aspecto formal do

processo, não se confundindo conceitualmente com este; autos, por sua vez, são a

materialidade dos documentos em que se corporificam os atos do procedimento. Assim,

não se deve falar, por exemplo, em fases do processo, mas do procedimento; nem em

“consultar o processo” mas os autos. Na legislação brasileira, o vigente Código de

Processo Civil é o único diploma que se esmerou na precisão da linguagem39.

Contribuindo sobre o assunto, José FREDERICO MARQUES dirime qualquer

dúvida a respeito dos termos processo e procedimento, e assim explica a questão:

Processo indica o conjunto de atos que o compõe, num sentido

finalístico e em que se realça a função que nele se desenvolve para solucionar litígios.

No procedimento, no entanto, o que predomina é o lado exterior desses atos, isto é, a

forma particular de cada um e o modo pelo qual eles se coordenam e se sucedem.O

processo é a própria jurisdição em atividade, ao passo que o procedimento nada mais

significa que a forma de exteriorização dessa atividade e das que com ela se

conjugam40.

Na visão de Luiz Rodrigues WAMBIER41, o procedimento “é meramente o

mecanismo pelo qual se operam os processos diante da jurisdição”.

37 DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. 3ª ed. – São Paulo: Malheiros, 2000. p. 122. 38 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 277. 39 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 278. 40 MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. vol 1 – Campinas: Bookseller, 1997. p. 191. 41 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, v.1 / Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida, Eduardo Talamini; coordenação Luiz Rodrigues Wambier. 3. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 156.

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Mesmo sendo empregados como sinônimos na linguagem comum, os termos têm

significado técnico diferente.

1.5 A EFETIVIDADE DO PROCESSO E O PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA

Se o processo é o meio que tem o cidadão de buscar a justiça, é indispensável que

este mesmo meio seja eficaz e traga realmente ao consumidor da justiça o bem-estar social

buscado. E mais, que este bem-estar social venha em um espaço de tempo no mínimo razoável.

Assim, tornar-se-á realmente efetivo.

Falar-se em efetividade do processo é sempre lembrar a máxima de Giuseppe

CHIOVENDA42: “o processo deve dar, quanto for possível praticamente, a quem tenha um

direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir”.

Seguindo esta linha de que o processo deva ser definitivamente útil, muito a

doutrina colocou-se a defender a efetividade do processo.

Cândido Rangel DINAMARCO discorre sobre o assunto:

Em boa medida, o movimento reformador do Código de Processo Civil

está ligado ao advento da Constituição Federal de 1988, que realçou significativamente o

compromisso do Estado brasileiro por uma tutela jurisdicional a quem tiver razão,

mediante um processo justo, acessível e realizado em tempo razoável. Ao definir e

explicitar muito claramente garantias e princípios voltados à tutela constitucional do

processo, a nova Constituição tornou crítica a necessidade não só de realizar um processo

capaz de produzir resultados efetivos na vida das pessoas (efetividade da tutela

jurisdicional), como também de fazê-lo logo (tempestivamente) e mediante soluções

aceitáveis segundo o direito posto e a consciência comum da nação (justiça). Efetividade,

tempestividade e justiça são os predicados essenciais sem os quais não é politicamente

legítimo o sistema processual de um país43.

A Constituição da República de 1988, em seu art. 5º, XXXV, garante que “a lei

não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”, logo, extrai -se deste

42 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. – Campinas: Bookseller, 1998. p. 67. 43 DINAMARCO. Cândido Rangel. A reforma da reforma. – 6ª. ed. Atual. – São Paulo: Editora Malheiros, 2003. p. 29.

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dispositivo constitucional o que chama a doutrina de princípio do “acesso à justiça”. Tal princípio

garante aos cidadãos não só o acesso irrestrito ao judiciário, mas também que este acesso se faça

realmente útil ao consumidor da justiça. Trata-se aqui do que se denomina de direito fundamental

à efetividade da tutela jurisdicional44.

Luiz Guilherme MARINONI explica a preocupação de termos um processo

efetivo:

Propõe-se que o processo seja analisado na perspectiva do

consumidor dos serviços jurisdicionais, passado a ter relevo, assim, e entre outros

pontos, os efeitos concretos do processo na vida das pessoas. Seguindo essa linha, o

movimento pelo acesso à justiça abre a vertente da “efetividade do processo”. Se o

processo é analisado também através de uma lente sociológica, na perspectiva do

consumidor do serviço jurisdicional, é natural que importem seus resultados concretos e

não mais apenas seus resultados formais. Surge, assim, uma forma de ver o processo

intimamente preocupado com a efetividade45.

Seguindo a linha de raciocínio de Nelson Rodrigues NETTO46, a idéia de uma

tutela jurisdicional efetiva se liga à garantia do pleno acesso ao judiciário, devendo-se buscar, por

meios adequados, o objetivo de obter um resultado eficiente que traga “a plena satisfação do

titular do bem protegido pelo ordenamento jurídico”.

José Carlos BARBOSA MOREIRA expõe sua opinião a respeito da efetividade do

processo:

Efetividade do processo é expressão que, superado as objeções de

alguns, se tem largamente difundido nos últimos anos. Querer que o processo seja

efetivo é querer que desempenhe com eficiência o papel que lhe compete na economia

do ordenamento jurídico. Visto que esse papel é instrumental em relação ao direito

substantivo, também se costuma falar da instrumentalidade do processo. Uma noção

44 “Tal direito não poderia deixar de ser pensado como fundamental, uma vez que o direito à prestação jurisdicional efetiva é decorrência da própria existência dos direitos e, assim, a contrapartida da proibição da autotutela. O direito à prestação jurisdicional é fundamental para a própria efetividade dos direitos, uma vez que esses últimos, diante das situações de ameaça ou agressão, sempre restam na dependência da sua plena realização. Não é por outro motivo que o direito à prestação jurisdicional efetiva já foi proclamado como o mais importante dos direitos, exatamente por constituir o direito a fazer valer os próprios direitos”. ( in, MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à tutela jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 378, 20 jul. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5281>. Acesso em: 22 set. 2004.) 45 MARINONI. Tutela Inibitória: individual e coletiva. 2. ed. – São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2000. pp. 398/390. 46 RODRIGUES NETTO, Nelson. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 104.

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conecta-se com a outra e por assim dizer a implica. Qualquer instrumento será bom na

medida em que sirva de modo prestimoso à consecução dos fins da obra a que se

ordena: em outras palavras, na medida em que seja efetivo. Vale dizer: será efetivo o

processo que constitua eficiente de realização de direito material47.

Seguindo as palavras de Teori Albino ZAVASCKI48, tem-se que o direito

fundamental à tutela jurisdicional efetiva, ou direito de acesso à justiça, compreende não apenas o

direito de invocar a tutela jurisdicional do Estado na resolução de conflitos, tem-se mais, exige-se

que esta decisão seja justa e venha em prazo adequado, fazendo-se, assim, eficaz no mundo dos

fatos.

Ter-se um processo ágil, seguro, útil e essencialmente voltado ao direito material,

que é a que o processo deve voltar-se, é necessidade de todos aqueles que a Constituição Federal

de 1988 tutelou com o advento do princípio do acesso à justiça.

1.6 TEMPO E PROCESSO

Toda a discussão acerca da efetividade do processo resulta num dos pontos

cruciais sobre o processo: a duração deste.

Muito se fala a respeito da morosidade da justiça, destacando o processo como um

instrumento lento, o qual, muitas vezes, não consegue entregar a quem tem direito o que lhe é

devido em tempo hábil.

Não é preciso muito para observar que a demora do processo jurisdicional sempre

foi um entrave para a efetividade do direito de acesso à justiça. Se o Estado proíbe a justiça de

mão própria, não faz sentido que coloque à disposição da população instrumento lento e ineficaz.

Posta assim a questão, vale ratificar a posição de Luiz Guilherme MARINONI:

É óbvio que a morosidade processual estrangula os direitos

fundamentais do cidadão. É o pior que, algumas vezes, a morosidade da justiça é opção

dos próprios detentores do poder. Não é intuitiva, por exemplo, a razão de ser da lei que

47 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: oitava série. – São Paulo: Saraiva, 2004. p. 15. 48 Cf. ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. – 3. Ed. rev. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2000. p. 64.

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proibiu, á época do denominado “plano Collor”, a concessão da medida liminar e a

execução provisória da sentença na ação cautelar e no mandado de segurança? O uso

arbitrário do poder, sem dúvida, caminha na razão proporcional inversa da efetividade

da tutela jurisdicional. É flagrante, ainda, que o abuso político, e nessa linha a própria

desconsideração ao princípio da separação dos poderes, encontra campo aberto na

inefetividade (=lentidão) do processo, sendo suficiente pensar, sob esse enfoque, no

controle de constitucionalidade da lei por via direta49.

E, adiante, acrescenta:

A lentidão do processo pode transformar o princípio da igualdade

processual, na expressão de Calamandrei, em “coisa irrisória”. A morosidade gera a

descrença do povo na justiça; o cidadão se vê desestimulado de recorrer ao Poder

Judiciário quando toma conhecimento da sua lentidão e dos males (angústias e

sofrimentos psicológicos) que podem ser provocados pela morosidade da

litispendência. Entretanto, o cidadão tem direito a uma justiça que lhe garanta uma

resposta dentro de um prazo razoável50.

Na opinião de J. E. CARREIRA ALVIM51, “o tempo continua sendo o inimigo

número um do processo”, e, evidentemente, nota -se a preocupação da doutrina frente a um

problema que atinge a todos que esperam do Judiciário poder que realmente aplique a justiça de

forma rápida, assim, gerando crédito à população.

Luiz Guilherme MARINONI vai a fundo no tocante à morosidade processual:

Se o tempo é a dimensão fundamental da vida humana e se o bem

perseguido no processo interfere na felicidade do litigante que o reivindica, é certo que

a demora do processo gera, no mínimo, infelicidade pessoal e angústia e reduz as

expectativas de uma vida mais feliz (ou menos infeliz). Não é possível desconsiderar o

que se passa na vida das partes que estão em juízo. O cidadão concreto, o homem das

ruas, não pode ter os seus sentimentos, as suas angústias e as suas decepções

desprezadas pelos responsáveis pela administração da justiça52.

49 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 3. ed. rev. e ampl. – São Paulo:

Malheiros, 1999. p. 33. 50 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil, p. 36. 51 CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela Antecipada. 3ª ed. Curitiba: Juruá, 2003. pp. 20/21. 52 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória: julgamento antecipado e execução imediata da sentença. – 3. ed. ver. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. pp. 17-21.

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Vale ainda ressaltar o disposto no art. 6º, I, da Convenção Européia para a

Proteção dos Direitos do Homem e das liberdades Fundamentais, que garante: toda pessoa tem o

direito a uma audiência eqüitativa e pública, dentro de um prazo razoável. E ainda em seu art. 8º,

afirma que “toda a pessoa tem direito de s er ouvida com as devidas garantias e dentro de um

prazo razoável”. Tal convenção tem plena vigência no território brasileiro, em face do art. 5º, §2º,

da Constituição Federal de 198853.

Como explana Luiz Guilherme MARINONI54, tem-se que o processo, lento, “[ ...]

é o instrumento que sempre prejudica o autor que tem razão e beneficia o réu que não tem!” E

arremata: “É preciso admitir, ainda que lamentavelmente, a única verdade: a demora sempre

beneficia o réu que não tem razão”.

Mas pelo visto nas últimas reformas processuais, que veremos nos capítulos

seguintes, há, de certa forma, a preocupação dos poderes legislativo e executivo na busca de um

processo efetivo. Registre-se que, nos últimos anos, reformas vêm alterando a legislação

processual civil no sentido de tornar o processo cada vez mais eficaz.

Neste sentido, pelo exposto por José Miguel Garcia MEDINA55, há de se

considerar que o processo de execução tradicional não se amolda às necessidades enfrentadas

pela sociedade em geral. As últimas reformas processuais reforçam a idéia de que este modelo

apresenta-se ineficaz. Se o processo é o instrumento que o cidadão tem para protestar pela justiça,

como já dito alhures, nada adianta que tal instrumento seja moroso e ineficaz. Daí a necessidade

de se buscar modos de atuação da tutela jurisdicional inovadores que, conseqüentemente,

satisfatoriamente, resolvam as demandas propostas.

Em razão disso, a morosidade processual é uma questão que desafia a todos que

estudam o processo. Além dos motivos aqui acostados, outros motivos contribuem para essa

lentidão. Podemos citar o número exacerbado de processos, a insuficiente quantidade de juízes e

ainda a vasta quantidade de recursos previstos em nossa legislação processual.

53 Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil, pp. 36/37. 54 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória: julgamento antecipado e execução imediata da sentença, p. 21. 55 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 91.

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Porém, o legislador ciente do direito constitucional, que garante a todos uma

resposta jurisdicional tempestiva, tem se empenhado em alterar a legislação processual para

tornar o processo civil brasileiro cada vez mais célere, justo e efetivo, como veremos adiante.

1.7 CLASSIFICAÇÃO DOS PROCESSOS

A doutrina classifica os tipos de processo da seguinte forma: processo de

conhecimento, processo de execução e processo cautelar. Veremos a seguir a função de cada uma

dessas classificações do processo.

1.7.1 Processo de conhecimento

O processo de conhecimento, também chamado de processo cognitivo, tem por

finalidade a certificação do direito. Objetiva debater amplamente a questão colocada em juízo,

apurar todos os fatos relacionados ao caso concreto e, por conseqüência, dizer a favor de quem o

Estado deve se posicionar.

Humberto THEODORO JÚNIOR assim leciona sobre o processo de

conhecimento:

Se a lide é de pretensão contestada e há a necessidade de definir a

vontade concreta da lei para solucioná-la, o processo aplicável é o de conhecimento ou

cognição, que deve culminar por uma sentença de mérito que contenha a resposta

definitiva ao pedido formulado pela parte56.

No mesmo sentido, José FREDERICO MARQUES57 explica que, no processo de

conhecimento, a tutela jurisdicional “exerce a mais genuína das funções: a de dizer o direito (o

ius dicere), a do poder de julgar”.

O processo de conhecimento é aquele em que a parte certifica-se do direito,

colocando sua pretensão à análise pelos juízes, de acordo com a formulação de um pedido, em

56 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p. 331. 57 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, p. 15.

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que a solução será positiva ou negativa, dependendo da procedência ou improcedência do

pedido58.

Então, como processo de conhecimento, pode-se afirmar ser a certificação das

pretensões postas em juízo, em que se visa à obtenção da certeza jurídica. Com ele, chega-se

realmente à conclusão de quem realmente tem direito sobre outrem.

Diante do conceito de processo de conhecimento, adentra-se à classificação desse

tipo de processo. Adotando a classificação quinária apontada pela doutrina, o processo de

conhecimento apresenta-se subdividido em: declaratório, constitutivo, condenatório,

mandamental e executivo lato sensu.

1.7.1.1 Eficácia declaratória

A eficácia jurisdicional declaratória é aquela que se limita a pedir que se declare a

existência de direito de alguém ou a inexistência de direito de outrem.

Cabe aqui salientar que a tutela declaratória, embora permita o juízo de “certeza”

de determinada relação jurídica, não é capaz de obrigar alguém a fazer algo. Conforme os dizeres

de Eduardo TALAMINI59, “A tutela se dá pela automática eliminação da incertez a jurídica entre

as partes”.

A função declaratória na visão de PONTES DE MIRANDA60, “[...] é a prestação

jurisdicional que se entrega a quem pediu a tutela jurídica sem querer ‘exigir’”. O processo de

conhecimento tem por finalidade básica declarar o direito, e objetiva declarar a quem o direito

pertence no conflito apresentado em juízo. Desse modo, em todos os processos de conhecimento,

há uma atividade judicial declaratória61.

58 Cf. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, pp. 111/112. 59 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, p. 188. 60 MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil, tomo V: arts. 444 a 475, Rio de Janeiro, Forense, 1997. p. 39. 61 Cf. RODRIGUES NETTO, Nelson. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 27.

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Prestam-se somente a declarar a existência ou não de relação jurídica ou a

falsidade ou a autenticidade de documento hipóteses previstas no art. 4º do Código de Processo

Civil.

Sobre a eficácia declaratória, ARAKEN DE ASSIS explica:

Tem o autor por fito, através da força declarativa, extirpar a incerteza.

Deseja tornar indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade de coisa julgada,

a existência, ou não, de relação jurídica e a falsidade ou a autenticidade de documento

(art. 4º, I e II)62.

Quem busca na esfera jurídica a declaração63 e obtém sucesso dar-se-á por

satisfeito unicamente pelo término de sua demanda, não necessitando, assim, de qualquer ato

complementar em juízo. A sentença declaratória é instrumento auto-suficiente, no sentido que o

direito pleiteado na demanda declaratória encontra-se perfeitamente acabado com o trânsito em

julgado da sentença. Daí concluir-se que a eficácia declaratória não necessita de atividade

executiva posterior64. Como afirmou Enrico Tullio LIEBMAN65, “A lei não autoriza a execução

com fundamento em sentença declaratória”.

1.7.1.2 Eficácia Constitutiva

Por intermédio da eficácia constitutiva66, persegue-se além da declaração de

existência ou inexistência, pois toda sentença adquire, transitada em julgado, eficácia declarativa,

a criação, a modificação ou a extinção de uma relação jurídica67.

PONTES DE MIRANDA68 diz que “A constitutividade muda em algum ponto,

por mínimo que seja, o mundo jurídico”.

62 ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, vol. VI: arts. 566 a 645. – Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 13. 63 Giuseppe CHIOVENDA aduz que, “O autor que requer uma sentença declaratória não pretende conseguir atualmente um bem da vida que lhe seja garantido por vontade da lei, seja que o bem consista numa prestação do obrigado, seja que consista na modificação do estado jurídico atual; quer, tão-somente, saber que seu direito existe ou quer excluir que existia o direito do adversário; pleiteiam no processo a certeza jurídica e nada mais”.(CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. pp, 260/261). 64 Cf. ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, p. 14. 65 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução. – São Paulo: Saraiva, 1980. p. 15. 66 Sobre a eficácia constitutiva, Giuseppe CHIOVENDA contribui que “[...] a sentença constitutiva verifica uma preexistente vontade da lei, que visa à mudança doutra vontade de lei e traz consigo aquela mudança mesma. (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 245). 67 Cf. ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, p. 14.

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A doutrina define desta forma a tutela constitutiva:

Pelo processo constitutivo chega-se à declaração peculiar a todas as

sentenças de mérito (provimentos jurisdicionais de conhecimento), com o acréscimo da

modificação de uma situação jurídica anterior, criando-se uma nova. Chama-se, pois,

processo constitutivo aquele que visa a um provimento jurisdicional que constitua,

modifique ou extinga uma relação ou situação jurídica. E para que se proceda à

constituição, à modificação, ou à desconstituição, é mister que antes a sentença declare

que ocorrem as condições legais que autorizem a isso69.

Piero CALAMANDREI70 observa que “nas providências constitutivas, à

declaração de certeza que se refere ao passado acompanha uma mudança jurídica que se refere ao

futuro”. E mais adiante expõe que “É evidente, confrontando as providências de declaração de

mera certeza com estas providências constitutivas, que nestas últimas se encontra contida, além

de declaração de certeza, alguma outra coisa, que é precisamente a constituição da mudança

jurídica a qual a declaração de certeza serve premissa [...]”.

A eficácia constitutiva também se apresenta auto-satisfativa, visto que, no caso de

procedência ou improcedência da ação constitutiva, o estado jurídico novo se estabelece

imediatamente à esfera jurídica do autor. Assim, o provimento “agasalha toda a sua eficácia,

independentemente de outro processo ou de execução71”.

1.7.1.3 Eficácia condenatória

As tutelas de conhecimento que existem em maior número são as condenatórias.

As tutelas condenatórias72, além da declaração, que é o pedido inicial de qualquer ação, visam

também à condenação do réu ao cumprimento de uma obrigação exposta na sentença73.

68 MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 43. 69 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 305. 70 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, p. 172. 71 ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, pp. 14/15. 72 Sobre condenação, Giuseppe CHIOVENDA: “[...] é condenatória, quando tem igualmente em mira a ulterior atuação da vontade da lei, ou seja, se prepara a execução”. (grifo do autor). (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 274). 73 A respeito da eficácia condenatória, Enrico Tullio Liebman expõe que, “[...] tem duplo conteúdo e dupla função: em primeiro lugar, declara o direito existente – e nisto ela não difere das outras sentenças (função declaratória); em

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Conforme observou Enrico Tullio LIEBMAN74, “[...] a condenação é o ato que

aplica, impõe, determina in concreto a sanção que o transgressor deverá sofrer pelo ato

cometido”.

Por meio dessa eficácia, o juiz reprova o réu e condena que sofra a execução. O

que gera o direito à execução, dotada de efeito executivo75.

Enquanto as tutelas declaratórias e constitutivas são auto-suficientes, a

condenatória, ao contrário, mostra-se não satisfativa76. Necessita esta, pois, da ação autônoma de

execução para a sua real efetivação, tornado-se somente desta forma, perceptível no mundo dos

fatos.

Piero CALAMANDREI bem analisa o papel da eficácia condenatória e a

necessidade de processo de execução ex intervallo para efetivar o disposto em sentença desta

natureza:

Também nas providências de condena, à declaração de certeza de

preceito se acompanha de um plus que se dirige – Providências de condena – em

direção ao futuro; mas enquanto nas providências constitutivas a mudança

correspondente ao preceito declarado certo entra, sem mais, em vigor junto com a

declaração de certeza do preceito primário, a formulação de um novo mandato, que

autoriza os órgãos executivos o cumprimento de uma providência posterior. O efeito da

condenação não é, somente, o de declarar certo o preceito primário, senão também o de

abrir cominho à execução forçada, submetendo o condenado à força física que pode ser

necessária à observância do direito77.

Para entendermos melhor a questão citamos OVÍDIO BAPTISTA da Silva:

[...] as sentenças condenatórias se definem como aquelas que, embora

contendo uma dose de eficácia executiva, capaz de legitimar a conseqüente execução

forçada, são, no entanto, incapazes de realizá-las na mesma relação processual. Elas

não se confundem com as meramente declaratórias porque contém, como eficácia

virtual inclusa no decisum, um componente executório, capaz de ensejar a execução

segundo lugar, faz vigorar para o caso concreto as forças coativas latentes da ordem jurídica, mediante aplicação da sanção adequada ao caso examinado – e nisto reside a função específica, que a deferência das outras sentenças ‘função sancionadora’”. (LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução, p. 18.) 74 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução, p. 18. 75 Cf. ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, p. 15. 76 Cf. RODRIGUES NETTO, Nelson. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 29. 77 CALAMANDREI. Piero. Direito processual civil, p. 174.

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forçada noutro processo. Essa eficácia executiva, embora relevante, é insuficiente para

provocar a “auto -execução” da sentença, no próprio processo que a gerou78.

Em suma, a eficácia condenatória é a única que participa do estabelecimento, a

favor do autor, de um novo direito de ação, que é o direito à ação de execução79. Como nos

trouxe Enrico Tullio LIEBMAN80, “Tudo isso se resume na fórmula: a sentença condenatória tem

força de título executório”.

1.7.1.4 Eficácia Mandamental

Contemplada, expressamente no Código de Processo Civil (art. 14, V)81, com a

redação dada pela Lei nº 10.358 de 2001, a tutela mandamental mostra-se presente no

ordenamento processual civil brasileiro, deixando, assim para trás, a velha classificação trinária

das tutelas cognitivas. Insere-se, portanto, a eficácia mandamental em nosso ordenamento

jurídico. Essa eficácia, ao contrário da condenatória, não necessita de processo autônomo de

execução, à medida que o juiz condena e, ao mesmo tempo, ordena que se cumpra o disposto na

sentença sob pena de sanção. Conforme dizeres de PONTES DE MIRANDA82, “[...] na sentença

mandamental, o juiz não constitui: ‘manda’”.

A diferencial da tutela mandamental está no fato da decisão conter uma ordem

para que seja cumprida imediatamente sob pena de sanção. No âmbito mandamental, não se tem

uma simples advertência ao réu, como ocorre na condenatória, em que o devedor deve,

posteriormente, ingressar com nova demanda para obter a plena satisfação do seu direito.

Sobre a tutela mandamental, Luiz Guilherme MARINONI:

[...] se a sentença condenatória difere da declaratória por abrir

oportunidade à execução por sub-rogação, a tutela mandamental delas se distancia por

tutelar o direito do autor forçando o réu a adimplir a própria ordem do juiz. Na sentença 78 SILVA, Ovídio Baptista da e GOMES, Fábio. Teoria Geral do Processo Civil. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 337. 79 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, p. 305. 80 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução, p. 20. 81 Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: [...] V – cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final. (grifo do acadêmico) 82 Cf. MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 48.

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mandamental há ordem, ou seja, imperium, e existe a coerção da vontade do réu; tais

elementos, como foi amplamente demonstrado, não estão presentes no conceito de

sentença condenatória, compreendida como uma sentença correlacionada com a

execução forçada83.

No seu magistério, ARAKEN DE ASSIS discorre sobre a eficácia mandamental:

Mas a essência da eficácia mandamental repousa no conteúdo da

ação. Elemento independente, o mandado, incrustado no núcleo de eficácias da

sentença, irradia efeitos bem discerníveis no campo executivo: primeiro, a já realçada

estatalidade imanente, tutelada através de medida coercitiva contra a pessoa do sujeito

passivo; ademais, o ato executivo ocorre ulteriormente ao provimento, porém dentro da

mesma estrutura (“processo”) 84.

Há na tutela mandamental um diferencial. O juiz tem o poder de realmente

ordenar que se cumpra o que estabeleceu. Esta ordem advém do poder Estatal do juiz e o seu

descumprimento dela pode gerar até sanções do tipo penal a quem a descumpre85.

Assim, mostra-se claro a inserção da eficácia mandamental no processo civil

brasileiro. Porém, ainda há, na doutrina, posições adeptas à clássica classificação trinária86 das

tutelas de conhecimento, negando, assim, a inserção da eficácia mandamental em nosso

ordenamento jurídico.

1.7.1.5 Eficácia Executiva lato sensu

A outra classificação das eficácias consiste na denominada executiva lato sensu.

Essa se identifica com a eficácia mandamental no sentido de dispensar o processo executivo para

a concretização do julgado, e difere da condenatória exatamente por isso, afinal na eficácia

executiva lato sensu os atos executivos iniciam-se de imediato. Esta eficácia não se destina à

83 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória, p. 351. 84 ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, pp. 91/92. 85 Esta sanção seria o crime de desobediência, contemplado no Código Penal em seu art. 330. Que diz: Art. 330. Desobedecer a ordem legal de funcionário público: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa. 86 José FREDERICO MARQUES, referindo-se a inexistência da tutela mandamental, disserta desta forma: “Não há outras espécies de ações de conhecimento. As ações denominadas dispositivas, assim como aqueles chamados mandamentos, não passam de figuras impróprias da ação [...]” (MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, p. 61).

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formação de título executivo judicial, sua força executiva é suficiente para se concretizar no

mesmo processo em que se constitui.

ARAKEN DE ASSIS posiciona-se sobre a tutela executiva:

A força executiva retira valor que está no patrimônio do demandado,

ou dos demandados, e pôe-no no patrimônio do demandante. Ela é imediata (eficácia)

quando a incursão na esfera jurídica do réu mira valor identificado, que lá se encontra

de maneira reconhecida como ilegítima no pronunciamento judicial, e, portanto,

dispensa novo processo; e diferida (efeito), quando a penetração executiva atinge a

esfera patrimonial e jurídica legítima do executado, o que acarreta a necessidade de

controlar de maneira plena à atuação do meio executório.

Entram na primeira espécie de ações executivas, p. ex., as de depósito,

a reivindicatória, o despejo, as possessórias, a de imissão na posse, a petição de

herança, a nunciação de obra nova, e outras, máxime se o direito alegado na demanda,

ou seja, o objeto litigioso – considerado, neste passo, a partir de critério distinto – se

revela real87.

Com a característica principal da auto-executividade, a eficácia executiva lato

sensu contém um algo mais que a condenatória. Há sim uma condenação, porém os seus efeitos

práticos são gerados no mesmo processo88.

1.7.2 Processo de execução

Fase subseqüente à cognitiva, senão menos importante, é a executiva. Destina-se a

efetivar o que foi decidido em um processo de conhecimento (sentença condenatória), ou a

concretizar o que se encontra disposto em um documento a que a lei concedeu eficácia executiva

(títulos executivos extrajudiciais).

No tocante à execução baseada em sentença, Enrico Tullio LIEBMAN89 confirma

que “só se pode fazer execução com fundamento em sentença condenatória”. Por isso que se

costuma falar em tutela condenatória-executiva90.

87 ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p. 93. 88 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 227. 89 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução, p. 14. 90 Cf. NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 31.

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A execução é atividade jurisdicional que serve para por em prática a reprovação da

ordem jurídica ao comportamento do vencido. Tem o objetivo de conseguir por meio de um

processo, sem a ajuda do obrigado, a obtenção do resultado prático que não foi obedecido

espontaneamente pelo obrigado na prolação da decisão91.

No particular da execução judicial, após o término da fase de certificação do

direito, pode o condenado não cumprir o que lhe foi imposto. Assim, não resta alternativa ao

credor, senão chamar novamente o Estado para concretizar o que este anteriormente já

reconhecera como certo.

Piero CALAMANDREI assim posiciona-se a respeito do processo de execução:

Resolvido o problema da certeza do direito, através da fase da

jurisdição que é chamada de cognição, fica aberto o problema da execução prática do

direito declarado como certo. Uma vez que se chegou à declaração oficial de certeza,

pode ocorrer que a conduta do obrigado se ajuste, sem mais, a tal preceito; mas pode

também ocorrer que a execução voluntária não seja possível ou que o obrigado

deliberadamente se negue a obedecer ao mandato já indiscutível. Neste caso, de que

modo assegura o Estado a observância do direito? Responde a esta pergunta aquela fase

posterior da função jurisdicional que se chama execução forçada92.

O processo de execução tem por objetivo a entrega efetiva do direito ao credor, e

não a definição deste mesmo direito. Isso é dizer que não é a finalidade da execução posicionar-

se a favor de qual das partes deve o direito dar razão, mas sim por em prática o direito já

reconhecido. A execução ocorrerá, sempre objetivando o resultado prático da tutela jurisdicional

invocada93.

Luiz Rodrigues WAMBIER elucida sobre execução:

Para atuar concretamente o provimento de mérito proferido em

processo de conhecimento condenatório anterior é que existe o processo de execução.

Essa expressão – atuar concretamente – quer dizer fazer com que aquela decisão

judicial, que, por exemplo, condenou o réu ao pagamento de determinada quantia em

dinheiro, realize-se e produza efeitos no mundo dos fatos, de forma que o autor receba

aquilo a que tem direito por força da sentença94.

91 Cf. LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução, p. 4. 92 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, pp. 135/136. 93 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 50. 94 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, p. 113.

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Logo, será de execução o processo, quando seu real fim seja definitivamente por

no mundo dos fatos o que foi decidido em sentença de mérito condenatória ou por meio de

acertos particulares documentados, entregando assim o direito ao seu titular.

1.7.3 Processo cautelar

A outra forma de atuação da jurisdição por meio do processo consiste no processo

cautelar. O ordenamento jurídico prevê a tutela cautelar para aqueles casos em que a excessiva

demora na entrega da prestação jurisdicional possa acarretar prejuízo a alguma situação que se

torne ineficaz com o passar do tempo. Garantir a eficiência de um processo principal será o papel

do processo cautelar, seja o processo primário de conhecimento, seja de execução.

Assim a doutrina define o processo cautelar:

Para que a reintegração do direito por via jurisdicional pudesse ser

eficaz e tempestiva, seria necessário que o conhecimento e a execução forçada

interviessem instantaneamente, de modo a colher a situação de fato tal como se

apresentava no momento em que a atividade jurisdicional foi invocada. Mas a

instantaneidade do provimento jurisdicional de mérito não é possível na prática, porque

o desenvolvimento das atividades indispensáveis para a declaração e a execução

reclama tempo: assim, há o perigo de que, enquanto os órgãos jurisdicionais operam, a

situação de fato se altere de tal modo que torne ineficaz e ilusório o provimento (que

pode chegar tarde demais, quando o dano já for irremediável).

[...]

Assim, a garantia cautelar surge, como que posta a serviço da ulterior

atividade jurisdicional, que deverá restabelecer, definitivamente, a observância do

direito: é destinada não tanto a fazer justiça, como a dar tempo a que a justiça seja

feita95.

Assegurar um resultado final eficiente, para um processo de conhecimento ou de

execução, é o papel de um processo cautelar. Por conseguinte, dirime-se o risco de ineficácia do

processo principal.

95 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, pp. 317/318.

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OVÍDIO BAPTISTA da Silva96 sustenta que a medida cautelar “contém

necessariamente um componente preventivo contra as futuras ameaças ao direito que elas visam

proteger, sem realizá-lo no plano jurisdicional”.

Como bem sintetiza Nelson Rodrigues NETTO97, a finalidade do processo

cautelar é “impedir que o tempo do processo resulte em dano irreparável ou de difícil reparação

(periculum in mora) àquele que demonstrar estar calcados em argumentos ponderáveis de seu

direito subjetivo (fumus boni iuris)”.

1.8 A INDEPENDÊNCIA DOS PROCESSOS E O PRINCÍPIO DA

AUTONOMIA DO PROCESSO DE EXECUÇÃO

A doutrina atribui ao processo civil brasileiro o que chamamos de princípio da

autonomia do processo de execução98. Por esse princípio temos o indicativo de que as atividades

cognitivas e executivas não se misturam - cada uma deverá ser realizada em momento e em

procedimentos próprios. Como ensinou Enrico Tullio LIEBMAN99, a ação condenatória morre

por consumação quando passar em julgado a sentença, e a execução deve ser proposta em

processo novo e separado.

96 SILVA, Ovídio Baptista da. Do processo cautelar. 3ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 11. 97 NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 35. 98 No mesmo sentido, Humberto THEODORO JÚNIOR: “Eliminado o litígio com o acertamento da relação jurídica entre as partes, o direito reconhecido ao vencedor pode ser satisfeito voluntariamente pelo vencido, e não haverá mais ensejo para a atuação da justiça. Mas, sem embargo do pronunciamento judicial, a pretensão do credor pode continuar insatisfeita. Surge, então, a necessidade de voltar perante os órgãos judiciários e pedir novas providências para que o direito proclamado na sentença seja tornado efetivo. Esta tarefa é a finalidade, o objetivo, do processo de execução: as execuções forçadas, que é promovida numa nova relação processual, independentemente e autônoma diante do processo de conhecimento”. (grifei). (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, p. 87.). 99 Cf. LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de Execução, p. 45.

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José Miguel Garcia MEDINA bem sintetiza a independência dos processos:

A conseqüência mais evidente da adoção do princípio, por outro lado,

reside na idéia de que os processo de conhecimento e de execução sejam “puros”, isto é,

de que não se realizam atos executivos no curso do processo de conhecimento bem

como não ocorram atos cognitivos no processo de execução. Argumenta-se, como já se

mencionou, que as atividades operadas nos dois processos são bastante distintas, o que

aconselha que elas se desenvolvam em processos diversos. Como corolário desta

concepção, tem-se que as eventuais defesas que o executado tenha a opor deverão ser

apresentadas em processo distinto, no direito brasileiro chamado de embargos100.

E segue:

Pode-se dizer que o CPC brasileiro adotou, de modo geral, o princípio

da autonomia, na medida em que previu a existência de dois processos distintos para se

realizarem as atividades de conhecimento e execução. As reformas processuais aludidas

não romperam com esta separação. Neste caso, deve-se examinar em que medidas

podem se realizar atos executivos no curso do processo de conhecimento, e,

inversamente, se é possível à realização de atos cognitivos no processo de execução,

principalmente no tocante à possibilidade de o executado defender-se contra a execução

no curso deste processo, ou se é mesmo imprescindível a oposição de embargos, neste

caso101.

No mesmo sentido, Sérgio SHIMURA102 reforça a idéia da autonomia entre

cognição e execução, contemplando que “O p rocesso de execução tem existência autônoma, livre

e distinta do processo de conhecimento ou mesmo do cautelar. Não é mera fase executória do

procedimento inaugurado pela ação condenatória, nem a sua parte integrante”.

Pelo visto, adotando a posição conservadora do processo civil de 1973, o princípio

da autonomia encontra-se presente. Como complementa ARAKEN DE ASSIS103, “O processo

executivo apresenta caráter autônomo. Trata-se de conseqüência natural da natureza específica da

função executiva”.

100 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 203. 101 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 192. 102 SHIMURA, Sérgio. Título executivo. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 11. 103 ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, p. 27.

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Sendo a atividade executiva independente da cognitiva, a sistemática do Código

de Processo Civil prevê, por meio dos embargos do devedor, a defesa do executado104.

Conseqüência da adoção do princípio da autonomia do processo de execução.

Porém, como veremos no capítulo seguinte, a autonomia do processo de execução

progressivamente vem perdendo terreno para o que aqui chamaremos de sincretismo entre

cognição e execução. A posição “clássica” adotada pelo legislado de 1973, baseada na autonomia

do processo de execução, cada vez mais cai em desuso, principalmente frente às reformas que

vem sofrendo o Código de Processo Civil desde 1994.

2 O SINCRETISMO PROCESSUAL NA ATUAL DISPOSIÇÃO DO

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 104 A defesa do executado no processo de execução se dá através dos embargos do devedor. Ação autônoma de conhecimento que visa desconstituir o título executivo. Neste sentido ARAKEN DE ASSIS: “[...] o processo executivo não comporta a defesa de devedor, necessariamente dirigida à desconstituição da pretensão de executar, que se realizará, nesta contingência, através de ação autônoma. Há inequívoca incompatibilidade funcional na convivência de atos executivos com atos de índole diversa, simultaneamente, na mesma estrutura (processo). Esta idéia fundamental posta à base dos embargos do executado”.(ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p. 1.182).

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2.1 CONCEITO DE SINCRETISMO PROCESSUAL

Contrariando o que prevê o princípio da autonomia, o princípio do sincretismo105

prevê a união dos processos de conhecimento e execução. As novas técnicas processuais,

baseadas no sincretismo processual ganham força. Admitir que sejam efetuados atos cognitivos e

executivos em um mesmo processo vêm sendo a idéia cada vez mais prestigiada pela doutrina e

pelo legislador106.

Porém há de se ressaltar que o princípio do sincretismo não substituiu o princípio

da autonomia. Como observa José Miguel Garcia MEDINA107, ambos os princípios encontram-se

inseridos em nosso ordenamento jurídico.

Pode-se dizer que a intenção do legislador, preocupado com a “efetividade do

processo”, é garantir uma maior eficiência da prestação jurisdicional. Dessa forma, visando

encurtar os caminhos, reconhece-se, hoje, cada vez mais no ordenamento jurídico brasileiro o que

denominamos de sincretismo108 entre as fases cognitiva e executiva.

José Miguel Garcia MEDINA reconhece o sincretismo entre cognição e execução:

105 A expressão sincretismo foi utilizada por Cândido Rangel DINAMARCO: “[...], tem -se o

sincretismo de uma ação que é, ao mesmo tempo, o poder de exigir o julgamento da pretensão e a satisfação do

direito reconhecido nesse julgamento. Julgada procedente a pretensão, o mesmo processo vai prosseguir e,

naturalmente, sem que nova demanda seja proposta, ou citação efetuada, ter-se-ão os atos executivos adequados. O

processo é um só e uma só a ação, ambos partilhando da natureza cognitivo-executiva”.(DINAMARCO, Cândi do

Rangel. Execução civil, p. 133). 106 As últimas reformas processuais, advindas das Leis nº 8.952 de 1994, 10.358 de 2001 e 10.444 de 2002 principalmente, ressaltam a possibilidade de termos atos executivos no curso do processo de conhecimento (ex: art. 273, 461, 461-A do Código de Processo Civil). 107 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 191. 108 “SINCRETISMO”: 1) Sociologia geral = fusão de dois ou mais elementos culturais antagônicos em um só. 2) Filosofia geral = a) visão confusa e compreensiva de um todo complexo; b) reunião de idéias ou de teses heterogêneas ou de origem díspar, mas que aparentam ser compatíveis porque não são claramente concebidas (Lalande); c) mescla ou justaposição de conceitos não harmônicos (De Castro). (DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico / Maria Helena Diniz. – São Paulo: Saraiva, 1998. p. 348).

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Reconhece-se hoje, assim, que as atividades cognitivas e executivas

podem ser realizadas num mesmo processo. Como se verá adiante, esta situação tende a

tornar preponderante, de modo que já se pode falar, atualmente, na existência de um

princípio que representa esta nova configuração da relação entre cognição e execução, a

que denominaremos de princípio do sincretismo entre cognição e execução109.

E adiante complementa:

Nos casos em que se manifesta o princípio do sincretismo entre

cognição e execução, as duas atividades realizam-se na mesma relação jurídico-

processual. A partir desta premissa, as mais diversas formas de relação entre cognição e

execução podem ser concebidas, e de fato têm sido elaboradas pelo legislador com o

fito de se obter uma tutela jurisdicional mais efetiva110. (grifo do acadêmico)

Admitido o princípio do sincretismo, como observa Joel Dias FIGUEIRA

JÚNIOR, inserem-se também em nosso ordenamento jurídico as chamadas ações sincréticas,

assim conceituadas por ele:

As ações sincréticas não apresentam a dicotomia entre conhecimento

e executividade, verificando-se a satisfação perseguida pelo jurisdicionado numa única

relação jurídico-processual, onde a decisão interlocutória de mérito (provisória) ou a

sentença do pedido (definitiva) serão auto-exeqüíveis111.

Segundo esclarecimento de Joel Dias FIGUEIRA JÚNIOR112, percebe-se, no

mundo jurídico, a tendência do legislador em adotar o sincretismo processual e,

conseqüentemente, deixar de lado o sistema adotado pelo Código de Processo Civil de 1973. Em

tal procedimento se inferem as tutelas mandamentais e executivas lato sensu, bem como pela

inserção da antecipação da tutela, dotados estes sistemas de técnicas diferenciadas à efetivação

das decisões judiciais.

2.2 A POSIÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1939

109 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, pp. 190-191. 110 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 217. 111 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à novíssima reforma do CPC: Lei 10.444, de 07 de maio de 2002. – Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 03. 112 Cf. FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à novíssima reforma do CPC, pp. 8/9.

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Diferentemente do que atualmente encontra-se no processo civil brasileiro, o

Código revogado de 1939 adotava outra posição relativa às atividades cognitivas e executivas.

Conforme o art. 196 do referido diploma, “A instância começará pela citação inicial válida e

terminará por sua absolvição ou cessação ou pela execução da sentença”. Como se pode perceber,

havia a união entre conhecimento e execução.

José Miguel Garcia MEDINA explica a posição do CPC de 1939:

Na vigência do CPC de 1939, a ação executiva seguia um

procedimento sincrético, em que no curso da execução realizavam-se atos mais

condizentes ao processo de conhecimento (art. 298 do referido Código). Com ou sem

embargos – que, como se afirma na doutrina, tinham natureza de contestação – havia a

necessidade de realização de todos os atos de um processo de conhecimento, inclusive o

proferimento da sentença que acolhesse ou rejeitasse o pedido do autor. Realizavam-se,

assim, no mesmo processo, atos cognitivos e executivos, razão pela qual pode-se dizer

que referida ação era sincrética, não incidindo no caso o princípio da autonomia113.

Cândido Rangel DINAMARCO, referindo-se a autonomia do processo de

execução, aborda a posição do Código de 1939, que contrariava a atual posição do CPC em

relação à autonomia dos processos cognitivos e executivos:

O Código de Processo Civil revogado, no art. 196, dizia que o

processo nascido com a citação do réu para a cognição só vai terminar ao fim da

execução -, nesse passo secundado o que já dissera o Código paulista, art. 220. Em

outras palavras, tudo se faria num só processo e a execução não seria mais que mera

fase do processo. Tal enunciado era a negação da autonomia do processo executivo e

choca-se frontalmente com as considerações acima, construídas sobre o pressuposto de

haver uma relação processual na execução, distinta e autônoma perante a que há no

processo de conhecimento114.

Segundo se pode depreender das colocações transcritas, o Código de Processo

Civil revogado de 1939 reservava a atividade executiva como mera conseqüência do processo de

conhecimento. O princípio da autonomia não era contemplado, havia a união entre cognição e

113 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 201. 114 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil, p. 131.

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execução. Conforme observou José Miguel Garcia MEDINA, a ação seguia “procedimento

sincrético”.

2.3 A ORIGEM DO SINCRETISMO PROCESSUAL

Essa união das atividades cognitivas e executivas, aqui abordadas, guarda estrita

relação de origem com os sistemas da common law do direito anglo-americano.

Como se pode depreender das palavras de Humberto THEODORO JÚNIOR115,

nesse sistema não há a separação entre processo de conhecimento e executivo. A execução de

sentença nesses sistemas se dá de forma automática, já que, se o condenado não cumpre o

disposto na sentença, o Juiz faz expedir contra o devedor o mandado de execução, que, traduzido,

seria como a “ordem” necessár ia para que, desde logo, as autoridades ponham-se a aprender os

bens que fazem parte da disputa judicial, façam a entrega a quem de direito, procedam à penhora

etc. Uma espécie de agente oficial realiza as atividades práticas para a efetivação da decisão.

Assim observa o doutrinador: “É tão grande o respeito pelas decisões judiciais, que a sanção

prevista, e efetivamente aplicada sobre os que ousam violá-las, é a prisão116”.

José Miguel Garcia MEDINA117 é de opinião que no sistema adotado pelos países

da common law, o entendimento é que o desacato ao disposto na sentença implicaria o chamado

contempt of court. O que significa dizer que, se a Jurisdição não tem o poder de fazer respeitar

suas decisões, careceria de substância. Nesse passo, o autor sintetiza que o poder de emitir ordens

estaria implícito no poder atribuído aos órgãos jurisdicionais.

E uma das armas que possui o judiciário para coagir o devedor à prestação da

obrigação é a imposição de multa, além de advir do direito anglo-americano como forma de

efetivação do direito, é também idéia do chamado contempt of court118.

115 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 220. 116 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 220. 117 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 337. 118 Cf. Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira...(et al). – São Paulo: Editora Método, 2002. p. 38.

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Tal idéia liga-se à credibilidade do Poder Judiciário ao fazer com que todos

acreditem que este ente estatal é capaz de “fazer justiça”.

O contempt of court, nos países da common law, divide-se em criminal e civil.

Especificamente no civil tem a função de coagir o devedor ao cumprimento da decisão judicial,

caracterizando não punição, mas coação. Nestes países pode ser imposta multa e até mesmo a

prisão civil, como já observado, em desfavor do devedor que não respeitar as decisões

judiciais119.

Interessante sobre o sistema da common law é o que observa OVÍDIO BAPTISTA

da Silva120, na sentença que determinar que o demandado pague uma quantia certa em dinheiro,

“[...] poderá o credor requerer que o tribunal imponha ao condenado uma injunção, determinando

o cumprimento da sentença, sob pena de considerar-se a resistência como ato de desobediência e

desacato ao tribunal (contempt of court) [...]”.

Portanto, aqui no Brasil, conforme ensinou José Miguel Garcia MEDINA121,

tornou-se notória a preocupação em termos um judiciário eficiente; reforçando-se, portanto, a

idéia de que o imperium deve sempre acompanhar a jurisdictio. Assim, tem-se a tendência em

adotar a tutela mandamental, semelhante ao que ocorre nos países anglo-americanos. Mas ainda

aqui, diferentemente do que ocorre em outros países, a tutela mandamental somente surgiu nos

últimos anos, advinda das reformas do Código de Processo Civil.

2.4 A GRADUAL EXTINÇÃO DA AUTONOMIA DO PROCESSO DE

EXECUÇÃO

Fato diretamente relacionado às últimas reformas processuais, o princípio da

autonomia do processo de execução vem perdendo força. Com o intuito de dinamizar o processo,

o legislador cada vez mais privilegia os provimentos mandamentais e executivos lato sensu,

deixando-se para trás a eficácia condenatória dependente do processo de execução.

119 Cf. Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira...(et al), p. 39. 120 SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais. Volume 2. – 4. ed. ver. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 346. 121 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, pp. 338/339.

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Com o objetivo de alcançar resultados mais efetivos e conseqüentemente mais

justos, o legislador passou a admitir a efetivação dos atos executivos no curso do processo de

conhecimento. Como exemplo disso, podemos citar a antecipação da tutela, tutela específica das

obrigações de fazer ou não fazer, etc. Com os adventos das Leis 8.952 de 13 de dezembro de

1994 e 10.444 de 7 de maio de 2002 - esta última dando nova redação ao art. 644 do Código de

Processo Civil122 - podemos perceber com maior facilidade a intenção do legislador. No dizer de

José Miguel Garcia MEDINA123, “Tais alterações justificam, no mínimo, releitura do princípio da

autonomia entre cognição e execução”.

Vale lembrar ainda que as ações executivas lato sensu, nas quais não há

necessidade de processo autônomo de execução, já se fazem presentes em nosso ordenamento

jurídico há tempos.

Nesze sentido, ARAKEN DE ASSIS registra:

O princípio da autonomia cedeu, nos últimos tempos à tentação de

dotar as ações de força executiva. Em ralação às prestações faciendi, o art. 644, na

redação da Lei. 10.444/2004, remete a disciplina do art. 461, doravante estendida,

através do art. 461-A, às prestações para entrega de coisa, aplicando-se tais normas,

indiferentemente, aos provimentos antecipados e finais (sentenças). É bem de ver, a

inclusão da atividade executiva na relação processual originária não altera os problemas

práticos do cumprimento das resoluções judiciais, nem, a fortiori, prescinde do

emprego dos meio executórios adequados à natureza da prestação. De qualquer modo,

nesses casos, desaparece a necessidade de instauração de novo processo e o princípio da

autonomia perde seu vigor originário124.

Sobre a autonomia do processo de execução, José Miguel Garcia MEDINA expõe

razões atuais que levam a explicar a gradual extinção do processo autônomo de execução:

[...] o princípio da autonomia do processo de execução surgiu e se

desenvolveu principalmente por razões históricas, o que não impediu, entretanto, que se

buscassem, na doutrina, fundamentos científicos para a sua adoção, bem como que se

defendesse a superioridade de tal esquema sobre o outro em que se cumulassem

cognição e execução – tais atividades, como se afirmou na doutrina, seriam

funcionalmente incompatíveis.

122 Art. 644 do Código de Processo Civil: “A sentença relativa à obrigação de fazer ou não fazer cumpre -se de acordo com o art. 461, observando-se, subsidiariamente, o disposto neste Capítulo”. 123 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 190. 124 ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p. 114.

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[...]

As atividades cognitivas e executivas, no entanto, devem ser

consideradas, hoje, eminentemente como meios para a consecução de uma tutela

jurisdicional, de modo que qualquer entendimento que procure demonstrar a “auto -

suficiência” destas atividades deve ser evitado 125.

Diante da total inversão de idéias inseridas entre o princípio do sincretismo e o da

autonomia, e considerando a progressiva aceitação ao princípio do sincretismo,

manifestadamente frente às últimas reformas processuais, chega-se à conclusão de que a

autonomia do processo de execução ex intervallo cada vez mais perde terreno. A preocupação

com um processo realmente efetivo levou o ordenamento jurídico a preferir o chamado processo

sincrético.

2.5 O SINCRETISMO PROCESSUAL E AS TUTELAS MANDAMENTAIS E

EXECUTIVAS LATO SENSU

Contrariando a clássica classificação trinária126 das ações, as tutelas mandamentais

e executivas lato sensu ganham mais força e aceitação no cenário processual civil brasileiro.

Como visto anteriormente, uma das características dessas ações, senão a mais relevante delas, é a

total dispensa de processo autônomo de execução para a sua real efetivação. É por meio delas que

podemos compreender o sincretismo processual.

Como observou OVÍDIO BAPTISTA da Silva127, “[...] o elemento comum às

sentenças executivas lato sensu e mandamentais, reside na circunstância de existir, nelas, alguma

atividade posterior à sentença de mérito, na mesma relação processual, como resposta

jurisdicional [...]”.

125 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, pp. 216/217. 126 Nelson Rodrigues NETTO diz que, “O processo de conhecimento, ou cognitivo, apresenta uma subdivisão em três modalidades de tutelas: declaratória, constitutiva e condenatória, razão pela qual é tradicionalmente denominada de classificação trinaria”. (NETTO, Nelson Rodrigues. Tutela jurisdicional específica: mandamental e executiva lato sensu, p. 26). 127 SILVA, Ovídio Baptista. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 24.

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Na tutela executiva lato sensu, como já observado, a eficácia é tão forte que a

execução se inicia de imediato, sendo desnecessária a formação de nova relação processual. A

eficácia executiva não visa constituir títulos executivos, diferindo-se da condenatória exatamente

por isso; logo, a execução inicia-se, sem que haja qualquer ato da parte vencedora. O que

sintetizou José Miguel Garcia MEDINA128: “Simplesmente expede -se mandado para o

cumprimento da decisão, não se permitindo a apresentação de embargos à execução”.

A doutrina esclarece a executividade de certos provimentos jurisdicionais:

Há certas espécies de sentenças que, no entanto, permitem a prática de

atos materiais, e conseqüentemente satisfação do credor, sem que seja necessária a

formação de outra relação jurídica processual, sem que seja necessária a formação de

outro processo. A doutrina dá ao provimento jurisdicional dotado dessa eficácia nome

de executiva lato sensu.

[...]

A sentença executiva lato sensu não se destina à formação de um

título executivo judicial, não se destina a abrir portas ao processo de execução de

sentença. Pelo contrário, sua força executiva é tão grande que em seu comando é

realizado no próprio processo em que exarada129.

Já a eficácia mandamental, como também visto anteriormente, prescinde de

execução autônoma. Como disserta OVÍDIO BAPTISTA da Silva130, “[...] a eficácia

mandamental tem por fim que o juiz emita uma ordem a ser observada pelo demandado, em vez

de limitar-se a condená-lo”.

Eduardo TALAMINI131 tem presente que “O provimento mandamental

normalmente será acompanhado da ameaça de imposição de alguma outra medida processual

coercitiva [...]”. Tal provimento funciona, dessa forma, como técnica de indução de conduta ao

destinatário, baseada na autoridade estatal do ato que a veicula.

128 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 90. 129 Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira...(et al). p. 449. 130 SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 336. 131 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer: e sua extensão aos deveres de entrega de coisa. – 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 191.

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Como exemplo típico da tutela mandamental é o mandado de segurança132, no

qual, ao final o juiz expede uma ordem a ser devidamente cumprida pela autoridade coatora.

Como se depreende, as tutelas mandamentais e executivas lato sensu não se

prestam à formação de uma situação jurídica que permita a execução forçada (título executivo

judicial)133; porém por sua própria natureza, destina-se a cumprir imediatamente o direito

disposto na decisão, produzindo efeitos no mundo empírico, seja por de ordens do juiz,

relativamente a uma autoridade (tutela mandamental), seja por atos executivos imediatos (tutela

executiva lato sensu).

2.5.1 O sincretismo processual nas ações que envolvem direitos reais

Há tempos o sistema processual vigente admite as chamadas tutelas executivas

lato sensu, especialmente nas demandas que envolvem direitos reais ou que se voltem à

recuperação da coisa, muitas delas podendo ser encontradas no Livro IV do atual Código de

Processo Civil brasileiro, e se classificam como procedimentos especiais de jurisdição

contenciosa134.

Podemos citar aqui algumas dessas ações (executivas), que, por não necessitarem

de ação autônoma de execução, são classificadas como sincréticas. São elas: reivindicatória,

132 Sobre a eficácia mandamental contida no mandado de segurança, OVÍDIO BAPTISTA da Silva observa o seguinte: “[...] com relação às ações mandamentais, seja porque esse agir corresponda a uma atividade pessoal infungível que somente o demandado poderia livremente realizar, seja em virtude de outra circunstância, a realização efetiva da pretensão faz-se através de uma ordem cogente, constante do mandado judicial nascido da sentença. É o que acontece, por exemplo, como mandado de segurança”. (SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 354.) 133 Sobre título executivo, ARAKEN DE ASSIS: “O título é a prova pré -constituída da causa de pedir da pretensão executória: a alegação, realizada pelo credor, de que o devedor não cumpriu, espontaneamente, o direito reconhecido pela sentença ou obrigação”. (grifo do acadêmico) (ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 147). José FREDERICO MARQUES conceitua título executivo como sendo: “Imanente ao título , assim moldado secundum lege, está a força executiva, isto é, a possibilidade de ser exigida a prestação típica, pela vias processuais da execução forçada. É que a lei cria os títulos executivos com o fim exclusivo de dar ao processo de execução o seu pressuposto básico e específico”. (MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, pp. 41/42). 134 Carlos Roberto Gonçalves define direitos reais como sendo “O direito real consiste no poder jurídico, direito e imediato, do titular sobre a coisa, com exclusividade e contra todos. Tem, como elementos essenciais, o sujeito ativo, a coisa e a relação ou poder do sujeito ativo sobre a coisa, chamado de domínio”.(GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil: direito das coisas, volume 3.- 5. ed. atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.460, de 10-1-2002) – São Paulo: Saraiva, 2002. p. 82).

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despejo, depósito135, imissão na posse, reintegração de posse, nunciação de obra nova, petição de

herança, divisão de terras e demarcação. Com salienta OVÍDIO BAPTISTA da Silva136, estamos

perante as chamadas “pretensões reais”, que geram as “execuções reais”, assim denominadas por

ele.

Humberto THEODORO JÚNIOR137 diz que a lei autoriza em vários casos um

chamado “procedimento especial”. E, como conseqüência disso, anula a separação entre a ação

cognitiva e a executiva. Na opinião do jurista, esta “união” é perfeitamente possível e gera

resultados concretos muito proveitosos, quando emanados de ações conexas e conseqüenciais.

Para uma resposta jurisdicional mais efetiva, cumula-se na mesma relação processual,

conhecimento e execução.

Sobre a ação de reintegração de posse, Luiz Guilherme MARINONI:

Algumas sentenças, relacionadas aos direitos reais ou voltadas à

recuperação de coisa – como as de imissão na posse, reivindicatória, de reintegração de

posse e de despejo -, já eram classificadas, muito antes da inserção do art. 461-A no

CPC, como executivas lato sensu.

Tais sentenças eram assim classificadas porque, ao declararem a

ilegitimidade da posse do demandado, alteravam a linha discriminatória das esferas

jurídicas, deixando claro que, para a realização do direito, seria apenas necessário

transferir para o autor algo que estava ilegitimamente no patrimônio do réu. Como a

recuperação da coisa, ou a imissão na posse, exigiam apenas essa transferência, não

dependendo de nenhum ato do réu, entendia-se que bastava, para a realização da tutela,

apenas a prática de atos executivos dependentes da expedição de mandados, que já

estariam autorizados pela própria sentença138.

135 Interessante é a posição de Ozéias J. SANTOS no tocante a ação de depósito, “As condenações de ação de depósito implica na ordem de pronta expedição de mandado de entrega, onde é cumprido, de imediato, dentro do processo condenatório”. Assim, percebe -se a negativa de eficácia executiva para este determinado tipo de ação, segundo o autor. (SANTOS, Ozéias J. Ação de depósito: teoria, legislação, jurisprudência e prática. – São Paulo: Iglu, 2000. p. 26). Em sentido contrário, Ovídio Baptista da Silva afirma a natureza executiva da ação de depósito: “Esta ação é executiva, de modo que a restituição do depósito dá -se no mesmo processo em que se proferiu a sentença de procedência e em virtude de ordem nela contida”.(SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 253.) 136 Cf. SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, pp. 183-213-214. 137 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 233. 138 MARINONI, Luiz Guilherme. As novas sentenças e os novos poderes do juiz para a prestação da tutela jurisdicional efetiva. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 317, 20 mai. 2004. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5045. Acesso em: 23 mai. 2004.

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O disposto no art. 929 do Código de Processo Civil deixa claro o caráter executivo

em decisões que envolvam demandas possessórias. Transcrevendo o teor do artigo, observamos

claramente não se tratar de mera condenação: “Julgada procedente a justificação, o juiz fará logo

expedir mandado de manutenção ou de reintegração”.

E oportunamente, Luiz Guilherme MARINONI complementa:

É de se admitir, também, a categoria da sentença executiva. Essa

sentença difere da condenatória; a sentença executiva, como o próprio nome sugere,

executa, não se limitando a criar o pressuposto para a execução. Ninguém pode afirmar

que a sentença que decreta a reintegração na posse do imóvel esbulhado apenas

condena a uma prestação. A sentença que decreta a reintegração de posse faz mais do

que condenar; ela decreta a reintegração de posse. A sentença é executiva porque

decreta a reintegração e não porque abre ensejo à expedição de mandado executivo de

reintegração. O mandado é mera conseqüência do que está contido na sentença

executiva, que, repita-se, não se limita a condenar o réu a uma prestação139.

Acompanhando o ensino de Luiz Guilherme MARINONI140, nas demandas

dotadas de eficácia executiva, ao invés de termos a simples condenação, tem-se mais, há uma

ordem, o juiz não dá a oportunidade do vencido adimplir com a obrigação, mas ordena que se

cumpra. A expedição do mandado é efeito direto da sentença. Nas demandas possessórias, o juiz,

ao julgar, determina.

No mesmo diapasão, OVÍDIO BAPTISTA da Silva reforça a união do processo de

execução ao de conhecimento no particular da ação de despejo:

Pense-se na ação de despejo. Conforme prescreve o art. 352 do

Código de Processo Civil de 1939, ainda vigente, nesse particular, a execução da

sentença que decretar o despejo far-se-á por notificação ao réu para que o desocupe o

prédio, sob pena de despejo. Não há, aí, igualmente, necessidade de nova ação (actio

iudicati) para tornar efetiva a sanção imposta pela sentença. O efeito executivo é

contemporâneo à sentença emanada do processo de conhecimento. Houve processo em

que ambos os momentos – declaração do direito e execução do julgado – estão

aglutinados num só todo. O juiz, ao dar pela procedência da ação de despejo, declara o

direito e ordena, desde logo, a execução141.

139 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva, p. 362. 140 Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. A Antecipação da Tutela. 5ª. ed. rev. e ampl. – São Paulo: Malheiros, 1999. pp. 49/50. 141 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada: ensaios e pareceres, p. 13.

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Conforme já explanado, certas ações que envolvem direitos reais, como aquelas

acima mencionadas, geralmente classificadas pela doutrina como dotadas de eficácia executivas

lato sensu e reservam a particularidade da execução nos próprios autos do processo de

conhecimento, sendo uma mera fase subseqüente à cognição. Logo, inserem-se no que se

denomina procedimento sincrético.

2.5.2 Os artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil e a execução específica

das obrigações de fazer ou não fazer e entrega de coisa

Advindos das últimas reformas processuais das Leis 8.952/1994 e 10.444/2002, os

artigos 461, 461-A do Código de Processo Civil, respectivamente, mudaram radicalmente o

mecanismo para efetivação de julgados referentes à execução das obrigações de fazer142 ou não

fazer e de entrega de coisa143 144.

Podemos aqui transcrever os artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil

para uma melhor compreensão:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação

de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se

procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático

equivalente ao do adimplemento.

§ 1.º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor

o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático

correspondente.

§ 2.º A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa

(art. 287).

142 Pela definição de Silvio RODRIGUES, “Na obrigação de fazer o devedor se vincula a determinado comportamento, consiste em praticar um ato, ou realizar uma tarefa, donde decorre uma vantagem para o credor. Pode esta constar de um trabalho físico ou intelectual, como também da prática de um ato jurídico”.(RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Parte geral das obrigações. 30ª ed., atual. De acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406/02) – São Paulo: Saraiva, 2002. p. 31.) 143 Segundo Silvio RODRIGUES, “A obrigação de dar consiste na entrega de alguma coisa, ou seja, na tradição de uma coisa pelo devedor ao credor”. (RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p. 19.) 144 No mesmo sentido e anterior ainda é o art. 84 da Lei 8.078 de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).

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§ 3.º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado

receio de ineficácia do provimento final, é licito ao juiz conceder a tutela liminarmente

ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou

modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§ 4.º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença,

impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou

compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do

preceito.

§ 5.º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado

prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as

medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e

apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de

atividade nociva, se necessário com a requisição de força policial.

§ 6.º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da

multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz,

ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

§ 1.º Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e

quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha;

cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo

juiz.

§ 2.º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á

em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se

tratar de coisa móvel ou imóvel.

§ 3.º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1.º a 6.º

do art. 461.

Na busca da tutela específica, tendo o credor o direito de receber a obrigação “in

natura”, foi desenvolvido em nosso sistema processual todo um aparato processual que realmente

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se preocupa com a prestação “específica” disposta na obrigação. O credor sem dúvida visa

receber o que realmente lhe é devido e não outra coisa. Nesse sentido, deve-se dizer que, no

tocante às obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa, reformas processuais surgiram

para, cada vez mais, dotar o indivíduo de possibilidades à obtenção de um resultado prático

equivalente ao adimplemento da obrigação. Estas reformas possibilitaram ao credor o direito de

ter à sua disposição várias medidas práticas de tutela do seu direito, inclusive de natureza

preventiva e, ainda mais, deram ao magistrado o poder de aplicar tais medidas inclusive ex

officio. Tudo isso na busca da melhor solução à tutela prática equivalente. Essas evoluções

encontram-se dispostas no artigo 461 do Código de Processo Civil, traz-se como exemplo, o

poder do magistrado impor multa por tempo de atraso (tutela mandamental), busca e apreensão,

força policial, impedimento da atividade nociva (tutela executiva), dentre outras medidas que se

mostrarem necessárias à busca do resultado útil do processo ao demandante.

Tem-se nesses casos o que se chama de execução específica, atos executivos que

buscam, no patrimônio do devedor, proporcionar ao credor exatamente aquilo que, segundo o

vínculo obrigacional, deveria ter sido entregue por meio voluntário do cumprimento da

prestação145.

A questão mais relevante para o presente estudo é a total dispensa de ação

autônoma de execução para efetivação de obrigações que visam obrigações de fazer ou não fazer

e de entrega de coisa. Em virtude dessas reformas, não há mais a necessidade de propositura de

nova ação (executiva) para os casos mencionados. As eficácias executiva lato sensu e

mandamental, aqui, mostram-se inseridas.

É no âmbito das obrigações de fazer e não fazer que a inadequação da estrutura

tradicional baseada na separação de cognição e execução encontra maior intensidade146. E,

exatamente por isso, vieram as reformas processuais de 1994 e 2002.

Cândido Rangel DINAMARCO147, observando a evolução processual no que

tange às obrigações de fazer, explica que em nosso sistema processual não pairam dúvidas; já no

curso do processo de conhecimento e com a total dispensa de atividades adicionais, como

145 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer . Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2904>. Acesso em: 07 out. 2004. 146 Cf. TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer: e sua extensão aos deveres de entrega de coisa, p. 220. 147 Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma, p. 221.

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execução forçada, produz-se uma decisão capaz de conduzir à mesma situação jurídica final que

deveria ter sido oferecida ao credor por ato obrigado e não foi.

Sobre a execução das obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa, Luiz

Guilherme MARINONI expõe suas palavras:

Entretanto, o CPC, em seus arts. 461 e 461-A, generalizou a dispensa

da ação de execução diante das sentenças relativas a não-fazer, fazer e entrega de

coisa. Em razão dessas disposições, tais sentenças, mesmo dependentes da prática de

ato pelo réu (as quais, assim, em princípio poderiam ser condenatórias), embora não

autorizem, desde logo, a expedição de mandado de execução, eliminam a necessidade

da propositura da ação de execução.

É certo que as novas sentenças executivas – advindas das novas

disposições dos arts. 461 e 461-A do CPC, como as relativas a prestações obrigacionais

de fazer ou de entrega de coisa – não autorizam a execução imediata, pois exigem o

adimplemento do réu. De qualquer forma, tais sentenças possuem nítida diferença

diante daquela que apenas abre caminho para a execução forçada (a condenatória). Em

relação a essas espécies de sentenças executivas, ainda que a diferença em relação à

condenação seja mais tênue, e possa ser vista como relacionada à forma processual da

execução – que agora não mais precisa ser feita em processo separado, instaurado por

meio de ação – não é possível ignorar que existe um propósito (e assim um valor) muito

forte na concentração da execução com o conhecimento 148.

Visto que o art. 461, § 4º, da Lei 5.869 de 1973 prevê a aplicação de multa,

inclusive ex officio, fica claro que não se trata de tutela exclusivamente condenatória. Tem-se

uma espécie de execução indireta149, trata-se de meio coercitivo utilizado com o objetivo de levar

o demandado ao cumprimento da obrigação. Contudo tem-se que o provimento mandamental não

se presta a autorizar a propositura de ação executiva, mas sim a efetivar realmente o julgado sem

a propositura de ação autônoma150. Percebe OVÍDIO BAPTISTA da Silva151 que se trata de

“execução através de coação patrimonial”.

148 MARINONI, Luiz Guilherme. As novas sentenças e os novos poderes do juiz para a prestação da tutela jurisdicional efetiva. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 317, 20 mai. 2004. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5045. Acesso em: 23 mai. 2004. 149 Execução indireta, na explicação de ARAKEN DE ASSIS, é a que utiliza meios coercitivos para pressionar o obrigado a cumprir a obrigação, seja esta coerção patrimonial ou pessoal. (Cf. ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p 128/134.) 150 Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Inibitória, p. 351. 151 SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 150.

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No tocante à multa, colhe-se da jurisprudência o seguinte julgado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISÃO DE CONTRATO.

DECISÃO MONOCRÁTICA. MULTA COMINATÓRIA. A multa com caráter

inibitório é medida consagrada no direito processual moderno, tendo em vista os arts.

461 e 461-A do CPC, e 84 do CDC. Sua finalidade instrumental, de coagir o devedor a

cumprir sua obrigação, justifica a possibilidade de sua fixação mesmo de ofício, tanto

nos provimentos finais quanto nos antecipatórios. Quanto ao valor da multa diária, deve

ser significativo, a fim de atingir a sua finalidade. NEGADO SEGUIMENTO AO

AGRAVO, COM FUNDAMENTO NO ART. 557, CAPUT, DO CPC152.

Do Tribunal de Justiça de Santa Catarina também colhemos trechos de julgados

neste sentido:

É legal a fixação de multa cominatória por dia de atraso, com o

escopo de forçar o cumprimento da obrigação, consoante o art. 461, § 4º, do CPC.

Assim, deve ser fixada em valor razoável justamente para compelir a parte obrigada a

cumprir a determinação judicial e, de outro norte, impedir que volte a incidir em atitude

perniciosa153.

No tocante à executividade das medidas previstas nos artigos 461 e 461-A do

Código de Processo Civil, o § 5º do referido artigo prevê “medidas necessárias” à obtenção do

resultado prático equivalente ao do adimplemento. Nota-se aqui a executividade lato sensu

inserida. Atos executivos são autorizados na busca de melhor e imediato resultado útil da

demanda e sem a necessidade de propositura de nova ação.

Observando às últimas reformas processuais no sentido de adotar o sincretismo

processual, Cândido Rangel DINAMARCO bem observa o disposto nos artigos 461 e 461-A,

respectivamente as obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa:

Todas as alterações aportadas pela lei. 10.444, de 7.5.2002 à

disciplina do processo de execução para a entrega de coisa (arts. 621-631) tiveram por

objetivo eliminar desse capítulo toda e qualquer disposição que pudesse envolver as

152 BRASIL. TJRS. Agravo de Instrumento n.º 70009750258, 13ª Câmara Cível. Relator: Desa. Ângela Terezinha de Oliveira Brito. Julgado em 17.09.04. 153 BRASIL. TJSC. Agravo de Instrumento n.º 03.005869-9, da Capital, 3ª Câmara de Direito Comercial. Relator: Des. Fernando Carioni. Julgado em 12.06.03.

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execuções por título judicial. A razão desse empenho reside no novo art. 461-A,

também trazido pela Reforma da Reforma, segundo o qual a execução para a entrega,

quando fundada em título judicial, far-se-á segundo o estatuto da execução específica,

representado pelo art. 461 e seus parágrafos. O sistema de meios de coação e mesmo de

sub-rogação, contido nesses parágrafos, é suficiente para produzir todo o resultado

desejado, seja mediante a persuasão do obrigado a entregar, seja apanhado

imperativamente a coisa e entregando-a ao credor; e isso se faz em continuação ao

processo de conhecimento, sem a formal instauração de processo executivo algum154.

Impende observar que, para Eduardo TALAMINI155, nesses casos, os provimentos

antecipatórios ou finais não terão natureza condenatória, não se criará título executivo para sua

execução em processo subseqüente e possuirá eficácia mandamental e executiva lato sensu156.

Conseqüência natural dessas reformas é de que a adoção do processo autônomo de

execução só se prestaria para títulos executivos extrajudiciais, visto a total incompatibilidade de

se propor execução de sentença nos casos dos art. 461 e 461-A do Código de Processo Civil.

Neste sentido FLÁVIO CHEIM JORGE diz:

Harmonizando-se com a regra do art. 461, que prevê as técnicas

processuais mandamentais e executivas lato sensu como os tipos de provimentos

adequados para impor a tutela específica, a nova redação do art. 287 fez o sepultamento

definitivo e irreversível da técnica processual condenatória pura para esses mesmos

casos.

Assim, como não poderia deixar de ser, o art. 287 não só supriu a

palavra “condenação” como ainda substituiu a remissão aos arts. 644 e 645 pelos arts.

461 e 461-A. Nada mais lógico e coerente, tendo em vista que os arts. 644 e 645 estão

insertos no Livro II (Processo de Execução), que agora só prestam para a efetivação de

execução específica de título executivo extrajudicial157.

154 DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma, p. 266. 155 Cf. TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, p. 416. 156 “O provimento final do processo ex vi do art. 461 apenas ensejará subseqüente e autônomo processo executivo: a) quando tiver havido conversão em perdas e danos (caso em que a sentença será apenas condenatória); b) para a cobrança das verbas de sucumbência (honorários e custas judiciais); c) para a cobrança do crédito decorrente da incidência de multa diária; d) para o ressarcimento das despesas adiantadas pelo autor, de custeio da produção do ‘resultado prático equivalente’, quando não tiver sido possível a concreta adoção de nenhuma técnica simplificada e atípica de obtenção do numerário. Porém, em todos essas casos, ter-se-á execução por quantia certa – e não execução do art. 632 e seguintes”. (TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, pp. 416/417). 157 JORGE, Flávio Cheim; RODRIGUES, Marcelo Abelha e DIDIER JÚNIOR, Fredie. A nova reforma processual: as mudanças indroduzidas na legislação processual pelas Leis 10317, 10352 e 10358, de dezembro de 2001, e pela Lei 10444, de maio de 2002. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 204.

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Posta assim a questão, conclui-se que há uma total desnecessidade de propositura

de ação executiva na intenção de efetivar as obrigações de fazer, não fazer e entrega de coisa

quando fundadas em decisão judicial. Os poderes conferidos ao juiz de ofício, ou a requerimento

da parte (artigo 287 do Código de Processo Civil), para efetivá-las (multa, busca e apreensão,

força policial dentre outras expostas no art. 461 do Código de Processo Civil), são mais que

suficientes tornando-as concretizadas sem a tradicional execução ex intervallo. Quer isso

classificá-las como inteiramente sincréticas. De modo que, como visto, o processo de execução,

em tais casos, presta-se única e exclusivamente para execuções fundadas em títulos executivos

extrajudiciais. E, ainda, dirimindo qualquer dúvida a respeito da execução de sentença nestes

casos, a nova redação dada ao art. 644 do CPC expressamente prevê a execução de sentença das

obrigações de fazer e não fazer pelo disposto no art. 461 do Código de Processo Civil.

2.6 O SINCRETISMO PROCESSUAL E A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA

Nos termos já expostos, a sentença condenatória forma o título executivo que dá

ao litigante o direito de provocar a execução forçada. Esta execução pode vir, porém, a ser

realizada de forma diversa, por meio da antecipação dos efeitos da tutela, contemplada nos

artigos 273 e 461 do Código de Processo Civil.

Trata-se aqui de uma exceção ao princípio da nulla executio sine titulo158.

Contrariando este princípio, a antecipação da tutela permite que se efetuem atos executivos159 no

158 “Significa o princípio, antes de qualquer coisa, que não se pode realizar execução sem título executivo. O Código de Processo Civil adotou-o, expressamente, referindo-se em seu art. 583: ‘Toda execução tem por base título executivo judicial ou extrajudicial’”. (MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 91.) No mesmo sentido, Enrico Tullio LIEBMAN observou que: “Diferencia -se a execução dos outros processos por isso que não se pode ser instaurada senão com fundamento em título executório legalmente existente, observadas todas as condições formais de sua exeqüibilidade”. (LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução, p. 66.). 159 Nos ensinamentos de José Miguel Garcia MEDIA, temos que “[...] a possibilidade de realização de atos executivos com base em decisão que antecipa os efeitos da tutela importa exceção ao princípio da nulla executio sine titulo”. O mesmo doutrinador concluir que “[...] os provimentos sumários, embora autorizem execução imediata, não são títulos executivos. Não se aplica à execução baseada em tais provimentos o princípio da nulla executio sine titulo, mas o princípio da execução sem título permitida”.(MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, pp. 82-88). (destaques no original).

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curso do processo de conhecimento baseados em julgamento de verossimilhança160, advindos de

cognição sumária161.

Anteriormente à inovação trazida pela Lei 8.952 de 1994, a antecipação de tutela

já se fazia presente em nosso ordenamento jurídico. As chamadas liminares162 encontravam-se

taxativamente expressas em nossa legislação, como é o exemplo da liminar em mandado de

segurança163, liminar na ação de reintegração de posse164, liminar na ação popular165, dentre

outras.

O advento da Lei 8.952 de 13 de dezembro de 1994, com o intuito de acelerar os

provimentos jurisdicionais, prestou-se a realmente ampliar a aplicabilidade do adiantamento da

tutela para qualquer tipo de ação, na dicção do artigo 273 do Código de Processo Civil (genérica)

e ainda inserir a antecipação de tutela do art. 461 do Código de Processo Civil (específica), aqui,

para os casos envolvendo obrigações de fazer ou não fazer166.

A antecipação de tutela - objetivando encurtar os caminhos para prestação

jurisdicional - torna esta mais eficiente, autorizando a concretização de atos executivos no curso

do processo de conhecimento167.

160 Teori Albino ZAVASCKI aduz que “[...] a antecipação de tutela de mérito supõe verossimilhança quanto ao fundamento de direito, que decorre de (relativa) certeza quanto à verdade dos fatos”.(ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, p. 76.). 161 Teori Albino ZAVASCKI referindo-se a tutela antecipada fundada em juízo de verossimilhança e cognição sumária, explica que “Enquanto a tut ela definitiva se busca o juízo de certeza, aqui a tutela jurisdicional é conferida à base de juízos de verossimilhança. É que, em se tratando de tutela para hipóteses em que há, em alguma medida, urgência, sua concessão acaba sendo necessariamente incompatível com a demora – inafastável – exigida para o atendimento simultâneo e completo das garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa”. (ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, pp. 30/31.). 162 Teori Albino Zavascki sobre liminar explana que, “Não há dúvida de que, de um modo geral, quando se fala em liminar está-se referindo a provimento judicial decretado ao início do processo”.(ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, p. 163.) 163 Art. 7º, II, da Lei 1.533/51. 164 Código de Processo Civil, art. 928. 165 Art. 5º, § 4º da Lei 4.717/1965. 166 “Com a universalização do instituto da antecipação da tutela (artigos 273 e 461 do CPC, com a redação que lhes deu a Lei 8.952, de 13 de dezembro de 1994), cravou-se mais um significativo marco no sentido de romper o dogma da absoluta separação entre processo de cognição e processo de execução. Conforme tivemos oportunidade de sustentar, a antecipação da tutela nada mais representa senão a possibilidade de adiantar, ainda que provisoriamente, a satisfação do direito afirmado pelo demandante, ou seja, antecipar atos de natureza executiva. Ora, para que isso ocorra, impõe-se ao intérprete e aplicador do direito a necessidade de adequar o sistema tradicional do Código, a fim de viabilizar, na medida do possível, que os referidos atos de execução sejam promovidos no âmbito da própria ação de conhecimento, sem o que a medida antecipatória nem sempre poderá alcançar, adequada e eficazmente, a sua finalidade”. (ZAVASCKI, Teori Albino. Título executivo e liquidação. – 2. ed. rev. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 48.) 167 Teori Albino ZAVASCKI elucida sobre Antecipação da Tutela: “[...] quando se antecipam os efeitos da tutela, com base no art. 273 do Código de Processo Civil, o que se faz, em verdade, é antecipar atos executivos, com o que a

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Visto que no âmbito da antecipação da tutela há atos executivos no mesmo

procedimento cognitivo, neste sentido conclui-se que há a manifestação do princípio do

sincretismo.

Neste sentido, José Miguel Garcia MEDINA confirma: “[...] tendo em vista que a

execução da decisão que antecipa os efeitos da tutela realiza-se no curso do processo de

conhecimento, insta reconhecer-se que se está diante de manifestação do princípio do sincretismo

entre cognição e execução168”.

Ainda sobre a antecipação dos efeitos da tutela, José Miguel Garcia MEDINA

defende a eficácia executiva lato sensu das ações que confirmam os efeitos concedidos

antecipadamente. Assim:

Poder-se-ia dizer que, após o provimento da sentença condenatória, a

execução não mais se realizaria com base na decisão que lhe teria antecipado os efeitos,

mas com base na sentença condenatória que, por assim dizer, “confirmaria” os efeitos

da tutela concedida pelo juiz.

[...]

Mesmo neste caso, no entanto, não se trataria, mais, diante de uma

sentença genuinamente condenatória. Se os atos executivos já se realizaram, total ou

parcialmente, significa que eles não dependeram – e não podem passar a depender - de

um título executivo para serem realizados. A execução dos provimentos sumários segue

o rito do tradicional processo de execução e apenas como parâmetro operativo, como se

viu, de modo que o proferimento da sentença condenatória não pode interferir no rito

até então observado. Considerando que, nestes casos, realizam-se cognição e execução

na mesma relação jurídico-processual, cremos seja mais apropriado considerar que se

está diante de uma ação executiva lato sensu, e não uma ação condenatória169.

Aprofunda-se a doutrina no que diz respeito à antecipação dos efeitos da tutela. Se

a tutela é concedida antecipadamente e posteriormente é confirmada em sentença, não há espaço

para a propositura de ação autônoma de execução. Eis que seu conteúdo não se encontra mais à

disposição. Se o objeto da demanda já está nas mãos do credor, logicamente não haverá por que o

credor buscar novamente a tutela jurisdicional. Daí entender-se porque José Miguel Garcia

prestação dessa tutela ocorre antes ou simultaneamente – e não sucessivamente – à tutela de cognição”.(ZAVASCHI, Teori Albino. Antecipação da tutela, p. 11). 168 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, p. 205. 169 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: princípios fundamentais, pp. 256/257.

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MEDINA defende a eficácia executiva lato sensu das decisões que confirmam a antecipação dos

efeitos da tutela.

Como visto, a antecipação da tutela nada mais é do que adiantar os atos executivos

que provavelmente ocorreriam no futuro, admitindo-se, desse modo, no curso do processo de

conhecimento, a satisfação do direito procurado pelo autor da demanda. Vislumbra-se, assim, o

sincretismo processual. Da mesma forma que o sincretismo processual manifesta-se em

decorrência das tutelas mandamentais e executivas lato sensu por não prescindirem de ação

autônoma de execução - efetivando-se nos mesmos autos - pela definição de Joel Dias

FIGUEIRA JÚNIOR, anteriormente mencionada170, as decisões interlocutórias de mérito - estas

admitindo a execução antecipada do feito, ainda que provisoriamente - caracterizam-se por

apresentar o conhecimento e a execução no mesmo procedimento.

Mister se faz esclarecer que sobre o assunto, a doutrina disserta sobre os atos

executivos advindos das tutelas mandamentais, executivas lato sensu e ainda da decisão que

antecipa os efeitos da tutela:

É unânime a doutrina em apontar o art. 461 como sucedâneo do art.

84 da legislação consumerista. Prevêem ambos os dispositivos legais (e agora também o

art. 461-A) a sentença mandamental, ou executiva lato sensu, para aqueles que

visualizarem diferença entre elas. Ambas têm como característica comum fazer com

que o processo autônomo de execução seja totalmente dispensável, estando a sentença,

e também a decisão que concede a liminar (antecipa a tutela), carreadas de força

executiva própria, o que significa dizer aptas a ensejar a realização imediata de meios

materiais visando à satisfação do direito171.

Dessa forma, nota-se que o princípio do sincretismo é uma realidade em nosso

sistema processual e uma tendência também. Diante dos termos das últimas reformas processuais,

principalmente no tocante aos artigos 273, 461, 461-A e 644, ambos do Código de Processo

Civil, tem-se a certeza de que atos executivos podem ser realizados no transcorrer do processo

cognitivo. Porém, muito ainda há que evoluir na busca do processo realmente efetivo. Como

veremos no capítulo seguinte, a espécie de execução mais comum no nosso sistema jurídico-

170 Ver item 2.1. 171 Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira...(et al), pp. 213/214.

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processual - qual seja, a execução de título judicial para pagamento de quantia - ainda guarda a

milenar dicotomia das relações processuais.

2.7 A POSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO IMEDIATA DA SENTENÇA

Dispõe o art. 520 do Código de Processo Civil que o recurso de apelação será em

regra recebido nos efeitos devolutivo172 e suspensivo173, salvo as hipóteses previstas no referido

dispositivo. Como regra geral, as sentenças de primeiro grau não são imediatamente eficazes.

As reformas processuais que inseriram os arts. 461 e 461-A do Código de

Processo Civil, não alteraram a regra do duplo efeito do recurso de apelação. E nos dizeres de

CLETO UNTURA COSTA174, “[...] foi um verdadeiro banho de água fria [...]” no principal

objetivo da reforma que era possibilitar a execução imediata da sentença.

Tal “ problema” já foi observado por Luiz Guilherme MARINONI. Na visão deste

doutrinador, há uma incoerência em nosso sistema processual. Se baseado em cognição sumária,

pode o juiz autorizar atos executivos, por que calcados em cognição exauriente não? Neste

sentido o doutrinador expõe sua opinião:

Se o direito brasileiro admite expressamente a tutela antecipatória,

contraditoriamente ele não viabiliza a possibilidade da sentença – que é o instrumento

que concede a tutela final – ser executada na pendência do recurso interposto para o

tribunal. Em outras palavras: é viável a execução da tutela no curso do processo, mas

não é possível a execução da sentença na pendência de recurso de apelação! Não é

preciso grande esforço para demonstrar a incoerência do sistema brasileiro neste ponto.

Ora, dever-se-ia admitir a execução de sentença na pendência do recurso ao menos com

172 “O efeito devolutivo é aquele em vir tude do qual o conhecimento da matéria é devolvido ao

órgão judicante, seja superior àquele do qual emanou a decisão, seja do próprio órgão prolator da decisão”.

(MEDINA, José Miguel Garcia. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. – 2. ed., ver., ampl.

E atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 50) 173 “O efeito suspensivo é aquele em virtude do qual se impede a produção imediata dos efeitos da

decisão, qualidade esta que perdura até o julgamento do recurso”. (MEDINA, José Miguel Garcia. O

prequestionamento nos recursos extraordinário e especial, p. 58). 174 A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil: leis n. 10.352/2001, 10.358/2001 e 10.444/2002 / coordenadores Hélio Rubens Batista Ribeiro da Costa, José Horácio Haifeld Rezende Ribeiro e Pedro da Silva Dinamarco. p. 213.

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base nos mesmos fundamentos que podem ser invocados para a concessão da tutela

antecipatória175.

Tentando solucionar essa falha no sistema processual, reforma advinda da lei

10.352 de 26 de dezembro de 2001 acrescentou ao rol do art. 520 o inciso VII que diz:

Art. 520. A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e

suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de

sentença que:

[...]

VII – confirmar a antecipação dos efeitos da tutela. (grifo do

acadêmico)

A reforma alterou o sistema anterior apenas para tornar possível a execução

imediata nos casos em que a tutela antecipada já tivesse sido concedida, subtraído o efeito

suspensivo do recurso de apelação nesses casos. Essa alteração veio com o intuito de corrigir a

incongruência de que as decisões advindas de cognição sumária possuíam maior eficácia que as

advindas de cognição exauriente. Porém, na opinião de Luiz Guilherme MARINONI176, a

referida reforma “[...] perdeu uma grande oportunidade para viabilizar a execução de toda e

qualquer sentença na pendência do recurso de apelação”.

No mesmo sentido, a doutrina expõe sobre a questão:

Sem ter a coragem de mudar a regra geral inscrita no caput do art. 520

– o legislador acabou optando por uma inovação mixuruca, de pouca ou quase nenhuma

valia – que constituiu no acréscimo do inciso VII, consoante o qual a apelação será

recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que: confirmar a

antecipação dos efeitos da tutela177. (destaques no original)

175 MARINONI, Luiz Guilherme. O custo e o tempo do Processo Civil brasileiro . Jus Navigandi,

Teresina, a. 8, n. 441, 21 set. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5717>. Acesso

em: 23 set. 2004. 176 MARINONI, Luiz Guilherme. O custo e o tempo do Processo Civil brasileiro . Jus Navigandi,

Teresina, a. 8, n. 441, 21 set. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5717>. Acesso

em: 23 set. 2004. 177 Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira... (et al.), p. 277.

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Ademais, nota-se que a execução da sentença somente poderá ser efetivada

quando da confirmação pelo tribunal competente; portanto, apenas as demandas que tiverem a

confirmação dos efeitos da tutela estão legalmente autorizadas a serem executadas de imediato.

3 O SINCRETISMO PROCESSUAL E A EXECUÇÃO DOS TÍTULOS

JUDICIAIS PARA PAGAMENTO DE QUANTIA

3.1 A DICOTOMIA DAS ATIVIDADES JURISDICIONAIS: EXECUÇÃO DE

SENTENÇA PARA PAGAMENTO DE QUANTIA

Como já exposto, há na legislação processual civil brasileira178 todo um

aparelhamento legal que visa à efetivação das prestações as quais visam obrigações de fazer ou

não fazer e de entrega de coisa ou ainda que tutele direitos reais179, sem a necessidade de

instauração de novo processo, o executivo.

As tutelas previstas nos artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil e

algumas ações que envolvam direitos reais dispensam totalmente a execução ex intervallo.

Porém, as obrigações que envolvam direito de crédito, isto é, pagamento de quantia certa, ainda

guarda a posição clássica pautada na dicotomia180 entre cognição e execução, fruto da natureza da

eficácia condenatória, dispositivo autorizador da execução forçada. Nesse particular, o princípio

da autonomia do processo de execução encontra guarida. Como coloca Eduardo TALAMINI181, a

condenação não veicula uma ordem, “A comunicação do preceito executivo é apenas última

chance de cumprimento espontâneo”. 178 Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973. 179 Geralmente tutelados por ações mandamentais ou executivas lato sensu. 180 Pela definição de Maria Helena Diniz: “DICOTOMIA”: 1. Lógica jurídica. Divisão lógica de um conceito em outros dois, em regra contrários, de modo que estes venham a esgotar a extensão do primeiro. 2. Teoria geral do direito. a) Método de classificação em que cada uma das divisões ou subdivisões não pode conter mais de dois termos. Só se pode dividir cada coisa em duas, subdividindo-se cada uma delas em duas, e assim, por diante; b) divisão em dois ramos [...]. (DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico, pp. 130/131). 181 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, pp. 307/308.

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A doutrina especifica a dicotomia processual. Esta ainda paira nas pretensões que

envolvem o direito de crédito:

A distinção básica para se saber se a sentença terá efeito condenatório

ou executivo reside, segundo nos informa Ovídio A. Baptista da Silva, na pretensão que

está sendo tutelada: se for direito de crédito, a sentença será condenatória, e se for

pretensão real que tenha por fim obter a coisa sobre a qual incida o direito litigioso, a

sentença será executiva182.

Não há na nossa legislação qualquer privilégio ao possuidor de um título

executivo judicial especificamente para obrigações de pagamento de quantia. Neste particular

tipo de execução, ainda paira em nosso sistema processual a chamada equiparação dos títulos

executivos183. Como observou Enrico Tullio LIEBMAN184, “Não procede a distinção entre a ação

executiva originária de títulos executórios judiciais e a de títulos contratuais”. Dissertando no

mesmo sentido, Vicente GRECO FILHO185 ensina que “As medidas executivas, bem como o

procedimento, são os mesmos, de modo que, não havendo embargos do devedor, o processo resta

absolutamente idêntico, seja o título judicial, seja o título extrajudicial”.

ERNANE FIDÉLIS DOS SANTOS desta forma explica a equiparação dos títulos:

No novo sistema processual civil brasileiro, com o Código de 1973,

adota-se o critério de equiparação dos títulos executivos judiciais e extrajudiciais. Isto

quer dizer que, definido a lei – e somente ela - os títulos executivos, pouco importa à

sua eficácia executória a origem respectiva, tendo a mesma força de realização os que

provenham de decisão judicial e os que se acertam por ato das partes186.

Como visto, a execução de sentença para obrigações em dinheiro se dá de forma

autônoma, isto é, em processos distintos. Após o término do processo de conhecimento, com o

respectivo trânsito em julgado (coisa julgada material)187, deverá o autor promover a execução,

182 Nova reforma processual civil: comentada / Alberto Camiña Moreira...(et al), p. 451. 183 Neste sentido é o art. 583 do Caderno Processual Civil: Art. 583. Toda execução tem por base título executivo judicial ou extrajudicial. 184 LIEBMAN, Enrico Tullio. Embargos do Executado, p. 145. 185 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 3º vol – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 8. 186 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Novos perfis do processo civil brasileiro. – Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 65. 187 Teori Albino ZAVASCKI explica assim a coisa julgada material: “Formado o juízo em processo que as partes tiveram oportunidade de exercer o direito à cognição exauriente, a tutela jurisdicional que daí decorre assumirá caráter definitivo em relação ao seu postulante e à parte em face da qual foi postulada. Essa, pois, a segunda característica a ser salientado, da tutela jurisdicional padrão prometido pelo Estado: a sua imutabilidade. Passada definitivamente em julgado, a sentença de mérito estará, desde logo, imune a qualquer modificação por ato de outro

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para assim somente ocorrer a entrega efetiva daquilo que tem direito. Ressalva-se, por óbvio, a

hipótese de cumprimento espontâneo do condenado ao disposto no título.

Cândido Rangel DINAMARCO, resume bem a impossibilidade de termos a

execução de ações que visam ao direito de crédito serem efetuadas em um mesmo processo:

As sentenças condenatórias não são capazes de dar ao titular do

direito a imediata e automática satisfação. Sua efetividade de pende de conduta ulterior

do obrigado, a ser substituída pelas atividades que integram o processo de execução.

Aqui, no tocante à efetividade do processo voltada à baila o tema da realização

específica dos direitos. Quando se trata de obrigação a ser satisfeita em dinheiro, a

extrema fungibilidade deste afasta qualquer consideração acerca do cumprimento

específico e a efetividade da tutela jurisdicional residirá na integral satisfação do

crédito, considerado o quantum debeatur188.

Este sistema, considerado “clássico” pela doutrina, em que cognição e execução

não se confundem, como veremos a seguir, encontra-se em franca decadência, mostrando-se

distante de satisfazer os interesses da coletividade, sem propiciar um processo realmente

efetivo189. Nesse diapasão, tempo e efetividade mostram-se distantes de serem contemplados.

O que se pode utilizar em termos práticos em relação a demandas que visam ao

pagamento de soma em dinheiro para uma resposta mais rápida é, verificando-se a urgência, o

instituto da tutela antecipada, nos termos do artigo 273, § 3º do Código de Processo Civil190.

3.2 A CRISE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA

poder do Estado, inclusive por ato normativo superveniente”.(ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela, p. 22). 188 DIMAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo, p. 367. 189 Sobre o sistema executivo, ARAKEN DE ASSIS expôs que, “[...] despreparado que esteja o sistema judiciário para resolver os desafios permanentes do processo de ‘conhecimento’, que se limita a reconhecer qual dos litigantes têm razão, a atuação prática dos direitos já reconhecidos em provimento judicial, âmbito particular da execução, constitui campo em que a falta de efetividade compromete a ordem jurídica. E inexiste dúvida de que processo executivo oferece ao juiz, aos seus auxiliares e aos advogados, personagens principais nesta cena, labirinto intransponível”. (ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de processo civil, p. 1). 190 Cf. FERREIRA, Rodrigo Alexandre. Regime jurídico da efetivação da tutela antecipada para pagamento de soma em dinheiro. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 207, 29 jan. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4781>. Acesso em: 07 out. 2004.

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A eficácia condenatória, como visto anteriormente, não possui o condão de

efetivar, por si só, o ato compositivo da lide191. Presta-se exclusivamente à instauração de um

novo processo, o executivo. Como explica OVÍDIO BAPTISTA da Silva192, não é função do juiz

nas demandas condenatórias emitir ordens, mas apenas declarar o direito aplicável.

A condenação, no dizer de Giuseppe CHIOVENDA193, tende exclusivamente a

preparar a execução; por meio dela, pois, forma-se o título executivo, o qual estará apto a instruir

o processo de expropriação. “Sem a execução, a sentença condenatória não teria eficácia. Seria

como o sino sem o badalo ou o trovão sem a chuva194”.

Sobre a eficácia condenatória, disserta o magistrado catarinense Joel Dias

FIGUEIRA JÚNIOR:

De outra parte, há de se considerar que o espaço de tempo verificado

entre a violação ou ameaça do direito subjetivo e a efetiva tutela jurisdicional prestada

pelo Estado-juiz no processo de conhecimento tradicional fundado da ordinariedade e

esta, por sua vez, geradora de uma sentença condenatória, é extremamente longo e

penoso para o autor da demanda, que nada obstante vir a tornar-se o vencedor da lide,

não encontrará a tão almejada satisfatividade, perseguida durante vários anos,

porquanto a condenação do sucumbente não passa de um ato judicial de mera exortação

e, portanto, desprovida de ius imperii. Significa dizer que o juiz que condena não

ordena; se assim é, a condenação não passará de órbita de uma exaltação ao

cumprimento da parte dispositiva do julgado, aqui transformada e equiparada sempre a

uma singela declaração de obrigação que, se não cumprida espontaneamente pelo

condenado, gerará, necessariamente, um novo processo, desta feita execucional195.

(destaques no original)

191 Eduardo TALAMINI, aduz que “A doutrina dominante descarta a noção de que a sentença condenatória vicularia uma ‘ordem de prestação’, um comando para que o obrigado adotasse determinado comportamento. O comando de prestar dirigido ao condenado já estaria integralmente na lei, que a sentença limita-se a declarar. Nesse sentido, tal ‘ordem de prestar’ também apresentar-se-ia na sentença meramente declaratória de um dever”. Mais adiante acrescenta que, “[...] não há outra perspectiva para identificar a condenação senão de sua ‘função processual’. Sentença condenatória é a que possibilita a execução forçada. No dizer de Calamandrei, define-se a condenação não tanto pelo que ela é, mas pelo que ela prepara”.(TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, p. 188/189.). 192 Cf. SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil: execução obrigacional, execução real, ações mandamentais, p. 346. 193 Ver, item 1.7.1.3 194 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e garantia do devido processo legal, p. 212. 195 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à novíssima reforma do CPC, pp. 6/7.

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Neste sentido, atenta-se ao fato de a condenação pura e simples não obrigar

ninguém, por si só, a cumprir o disposto na decisão, desprovida de imperium. Visto isso, a

doutrina tem se manifestado de forma radicalmente contrária a este sistema. Sustenta, para tanto,

que o mesmo não condiz com o processo realmente efetivo, ágil e conseqüentemente útil. Por

isso, muito se fala na crise da sentença condenatória. No mesmo sentido, Eduardo TALAMINI196

observou o que se poderia chamar de “[...] insuficiência da tutela condenatória”.

José Miguel Garcia MEDINA, a seu turno, leciona acerca da ineficácia da

sentença condenatória:

[...] a sentença condenatória sequer poderia ser arrolada dentre os

instrumentos de tutela jurídica do direito material, porque não se tutela qualquer direito

material com a sentença condenatória. Daí a necessidade de se ajuizar outra ação (de

execução) para se tutelar o direito reconhecido (ou declarado) pela sentença

condenatória como violado197.

A atual dicotomia das atividades jurisdicionais é fruto do modelo de eficácia

condenatória que temos em nosso sistema processual, considerado como “clássico” pela doutrina

especializada.

Como demonstrado, o modelo de processo de conhecimento concebido pela

doutrina, pautado na insubsistente separação entre conhecimento e execução, não mais satisfaz os

anseios sociais, porquanto não consegue fazer com que o processo, na prática, se torne útil198.

Humberto THEODORO JÚNIOR disserta sobre a falta de efetividade nas

sentenças de natureza condenatória:

A falta, o retardamento e a deficiência do cumprimento das

condenações judiciais comprometem, inquestionavelmente, o princípio da autoridade

do Poder Judiciário e, conseqüentemente, debilitam o Estado de Direito. Há, pois,

inegável interesse de ordem pública e constitucional na superação das deficiências do

atual procedimento das execuções de sentença199.

Oportuno se torna dizer que a maior relevância na abordagem desse aspecto é, sem

dúvida, a demora na entrega do direito postulado. A necessidade de propositura de duas ações

196 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer, p. 188. 197 MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil: Princípios fundamentais, p. 222. 198 Cf. FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à novíssima reforma do CPC, p. 8. 199 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 256.

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leva tempo, e na maioria dos casos, acaba por deixar o credor insatisfeito, gerando o descrédito

do judiciário em relação à população.

Como se pode perceber da leitura da transcrição abaixo, esse problema já era

percebido por Luiz Guilherme MARINONI:

O grande problema diz respeito à sentença condenatória de

pagamento de soma em dinheiro, que freqüentemente não é observada pela parte

condenada, sendo necessária a propositura de ação de execução, que exige mais gastos

e tempo para a efetivação do direito200. (destaques no original)

Como se pode ver, a doutrina não mede esforços para demonstrar sua total

insatisfação com a eficácia condenatória.

OVÍDIO BAPTISTA da Silva, em passagem interessante, igualmente se posiciona

de forma diametralmente oposta ao sistema condenatório adotado em nosso sistema processual e

a sua conseqüente lentidão na entrega do direito postulado, trazendo, para tanto, interessante

exemplo prático:

Utilizemo-nos do exemplo de uma ação proposta com o objetivo de

obter ressarcimento de danos verificados, suponha-se, num acidente automobilístico.

Cremos que ninguém há de questionar a natureza condenatória dessa demanda, pois as

sentenças dessa espécie são os exemplos mais freqüentes do que se entende por

condenação.

[...]

Para penetrarmos em nossas questões, antes colocadas sob a forma de

duas perguntas básicas, façamos agora uma inversão na ordem em que pusemos e

formulemos ao autor de nossa demanda de indenização a indagação sobre o sentido

prático da sentença por ele obtida e pela qual o juiz declarou o demandado responsável

pelo ressarcimento de danos e o condenou a indenizá-lo. Ou simplesmente

perguntemos-lhe de que lhe serviu a sentença condenatória. A resposta a essa pergunta

se torna mais dramática quando, ao invés de ser feita ao demandante, é formulada por

este a seu advogado, a quem ele entrega o caso esperando obter não um documento

formal de reconhecimento de seu direito, mas a efetiva e concreta indenização dos

prejuízos sofridos. No plano da realidade forense, onde dominam os fatos a que as

teorias se devem afeiçoar, não é fácil dar ao leigo que procura o amparo jurisdicional

uma explicação satisfatória da natureza da utilidade da sentença condenatória. Na

200MARINONI, Luiz Guilherme. O custo e o tempo do Processo Civil brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 441, 21 set. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5717>. Acesso em: 23 set. 2004.

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perspectiva eminentemente pragmática em que as partes se colocam perante o processo,

a sentença condenatória pouca coisa oferece além da declaração que ela contém sobre a

existência do direito invocado pelo autor e dessa virtualidade especial de constituir um

título para uma nova demanda subseqüente.

[...]

Agora, a pergunta que o advogado prático, enquanto profissional do

foro, não poderá responder a seu cliente: por que deve ser a sentença condenatória um

mero título para outra ação e não um título para uma simples fase subseqüente da

mesma ação, da mesma pretensão de tutela jurídica que, segundo o ponto de vista do

demandante, sempre fora uma só, o efetivo, cabal e definitivo ressarcimento?

[...]

Por que a ordem jurídica, quando se trata desse tipo de demanda,

obriga o autor a desdobrar sua pretensão em duas ações, ligadas entre si, por uma

relação de dependência, em que a condenação apenas desempenha o papel de

preparação para a atividade subseqüente201? (grifos do autor)

O exemplo trazido à colação, indubitavelmente, guarda consonância com a

realidade fática diuturnamente vivenciada nos Foros, afinal não se desconhece a enorme

quantidade de demandas desse tipo que atualmente tramita.

Nessa seara, tem-se que o desdobramento - desnecessário, consoante o enfoque

realizado neste trabalho - dessas lides em dois processos distintos (cognitivo e executivo)

contribui, sobremaneira, para o acúmulo de processos nas prateleiras dos Cartórios Judiciais,

prejudicando o próprio exercício da jurisdição.

Acompanhando esse raciocínio, Humberto THEODORO JÚNIOR tece críticas ao

atual e insistente sistema processual civil brasileiro voltado o qual esta voltado à dicotomia das

atividades de conhecimento e execução:

Embora o que queira de fato o credor seja a concretização efetiva de

seu direito, só não é possível, por exemplo, o autor de uma ação de indenização pedir

desde logo a condenação do devedor ao pagamento do prejuízo, com a cominação de

penhora e praceamento de bens e conseqüente pagamento do que lhe é devido, porque

teima em prevalecer o dogma de que o processo de conhecimento e o processo de

201 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada: ensaios e pareceres. – 4. Ed. rev. e

ampliada. – Rio de Janeiro: Forense, 2003, pp. 24/25.

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execução são atividades distintas e que só devem ser tratadas em relações processuais

diversas202. (grifo do acadêmico)

Assim, adotando o modelo de condenação, e efetivando-se o julgado somente com

a propositura de nova ação, pode-se dizer que há uma total vantagem ao réu. Quanto maior o

tempo de espera pelo devedor para realmente dispor de seu patrimônio, maior será sua vantagem.

Nesse passo, Luiz Guilherme MARINONI203 prevê a vantagem ao réu (devedor) em um processo

condenatório e em consonância confirma que “Em um ‘processo condenatório’, a demora na

obtenção do bem significa a sua preservação no patrimônio do réu. Quanto maior for a demora do

processo, maior será o dano imposto ao autor e, por conseqüência, maior o benefício conferido ao

réu”.

Não é preciso ocupar muitas linhas para se perceber que o processo condenatório

deveria, evidentemente, privilegiar ainda mais os interesses do autor - titular de um direito

violado ao qual se procura reparar - mas acaba por prejudicá-lo, à medida que, ao mesmo tempo

em que se propõe a apresentar mecanismos aptos a possibilitar a efetiva satisfação desse direito,

cria embaraços à entrega célere de uma solução definitiva, ao prever essa criticada dicotomia

entre cognição e execução.

No mesmo sentido, Humberto THEODORO JÚNIOR mostra sua insatisfação

sobre a eficácia condenatória:

A necessidade de propor uma nova ação para dar cumprimento à

condenação provoca uma longa paralisia na atividade jurisdicional, entre a sentença e

sua execução, além de ensejar oportunidade a múltiplos expedientes de embaraço à

atividade judicial aos devedores maliciosos e recalcitrantes204.

LEANDRO SILVA RAIMUNDO, em artigo publicado, reflete sobre a questão,

deixando transparecer o mesmo inconformismo lançado por OVÍDIO BAPTISTA da Silva, em

passagem anteriormente citada neste trabalho, acerca da incredulidade do cliente ao tomar

ciência, pelo seu advogado, de que deverá mover novo processo a fim de ver efetivamente

satisfeito seu direito:

202 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 237. 203 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória: julgamento antecipado e execução imediata da sentença, p. 17. 204 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 250.

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O processo de execução não pode ser instrumento de favorecimento

do devedor inadimplente. As regras da execução de quantia pecuniária oferecem meios

para o executado furtar-se à constrição judicial, inviabilizando o atendimento da

pretensão do exeqüente.

[...]

É muito difícil para o advogado convencer seu cliente da necessidade

de, mesmo após a sentença que condena o devedor e depois do tribunal tê-la

confirmado, proceder-se à nova citação do vencido, com todas as circunstâncias que

envolvem esse ato processual. Ademais, superado o longo trâmite do processo de

conhecimento, o profissional do direito terá de explicar ainda, que o executado poderá

embargar ou suspender a execução, na maioria das situações, com o intuito nitidamente

protelatório.

[...]

Faz-se necessário, portanto, a mudança no procedimento de execução

por quantia certa, de forma a unificar, no mesmo processo, cognição e execução,

permitindo, assim, que o direito material seja atendido sem a instauração de outra

relação processual, diminuindo consideravelmente o caminho para a obtenção da tutela

jurisdicional205.

Diante dessa realidade, é de se reconhecer a premente necessidade de obtenção de

soluções aptas a satisfazerem, de forma efetiva e ágil, o direito da parte lesada.

Nesse contexto Luiz Guilherme MARINONI, além de discorrer sobre a crise da

sentença condenatória - pressuposto autorizador da execução forçada - ressalta sua ineficácia e

sugere a implementação do sincretismo processual por meio da tutela mandamental, visando pôr

fim de efetivação de títulos judiciais para pagamento de quantia:

É sabido, há muito tempo, que a sentença condenatória é a menos

efetiva de todas as sentenças; a sentença condenatória é apenas um pressuposto para a

execução.

[...]

Nos últimos anos, em vista da preocupação da doutrina com a

“efetividade do processo”, surgiram propostas no sentido de permitir que a própria

execução por créditos se faça independentemente de uma “ação de execução”.

[...]

205 RAIMUNDO, Leandro silva. A efetividade do processo e a tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. Notas sobre o sincretismo processual. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 314, 17 mai. 2004. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5276. Acesso em: 23 mai. 2004.

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De qualquer forma, também seria possível falar, pensando de lege

ferenda, na condenação ao pagamento de soma sob pena de multa (tutela

mandamental). Não há razão, com efeito, para não se admitir o uso cumulado da

execução forçada e da execução indireta ainda que no caso de “condenação

pecuniária206”.

Como se vê, o uso da multa na efetivação de obrigações pecuniárias tem a

aquiescência de Luiz Guilherme MARINONI, ferrenho defensor do modelo sincrético, para quem

“O objetivo do uso da multa seria convencer o obrigado a adimplir, evitando -se as complicações

e os custos inerentes à execução forçada207”.

Luiz Guilherme MARINONI observa, ainda, manifestações da jurisprudência em

favor da imposição da multa como meio coercitivo para efetivação das obrigações a qual visa ao

pagamento de quantia, acarretando, assim, uma maior efetividade destes provimentos

jurisdicionais:

Para o autor, a sentença ao assim entender teria violado texto de lei,

pois somente em se tratando de obrigação de fazer ou não fazer seria lícita a fixação

de multa diária. Esse modo de ver entra em aberto conflito, no entanto, com uma visão

mais atualizada do exercício da jurisdição. Nos dias atuais, as medidas coercitivas vêm

se caracterizando como instrumento de concretização do direito fundamental à tutela

jurisdicional efetiva, de tal sorte que o seu emprego não pode ser excluído de maneira

apriorística. Como bem pondera Marcelo Lima Guerra (Execução Indireta, São Paulo,

RT, 1998, p. 54), ‘o juiz tem o poder-dever de, mesmo e principalmente no silêncio da

lei, determinar as medidas que se revelem necessárias para melhor atender aos direitos

fundamentais envolvidos na causa, a ele submetida’. E o jurista, com toda pertinência,

invoca o ensinamento de Vieira de Andrade (Os direitos fundamentais na Constituição

Portuguesa de 1976, p. 256), no sentido de que na falta de lei que concretize

determinado direito fundamental, ‘o princípio da aplicabilidade direta vale como

indicador de exeqüibilidade imediata das normas constitucionais, presumindo-se a sua

perfeição, isto é, a sua auto-suficiência baseada no caráter líquido e certo do seu

conteúdo de sentido. Vão, pois, aqui incluídos o dever dos juízes e dos demais

operadores jurídicos de aplicarem os preceitos constitucionais e a autorização para com

esse fim os concretizarem por via interpretativa’. Tal significa, no âmbito do processo

de execução, que o juiz tem o poder-dever de, mesmo e principalmente no silêncio da

206 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória, p. 370. 207 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória, p. 370.

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lei, determinar os meios executivos que se revelem necessários para melhor atender à

exigência de prestação de tutela executiva eficaz (Marcelo Guerra, ob. cit., p. 57). No

campo da execução por quantia certa não se passa de modo diverso, justificando-se o

emprego de medidas coercitivas, como a astreinte, por concretizar o valor

constitucional protegido da efetividade da tutela jurisdicional. Por tal razão, o uso de

tais medidas não pode ser obstado nem por expressa disposição infraconstitucional,

muito menos pelo silêncio dessa legislação. (TJRS, 6a. CC, Rel. Des. Osvaldo

Stefanello, Ação Rescisória n. 599263183, julgado em 26/04/2000.)208.

Impede ressaltar aqui, conforme observa Eduardo TALAMINI209, que a aplicação

da multa em provimentos que visam ao pagamento de quantia “Trata -se de medida impossível, na

atual disciplina, em virtude da falta de autorização legal”.

Diante desse quadro é que Luiz Guilherme MARINONI210 sente a necessidade de

uma reforma processual, com o fito de introduzir o sincretismo no direito processual civil pátrio,

a fim de trazer efetividade aos provimentos judiciais condenatórios, que visam ao pagamento de

quantia, aduzindo, para tanto, “Que nos últimos anos, em vista da preocupação da doutrina com a

efetividade do processo, surgiram propostas de permitir que a própria execução por créditos se

faça independentemente de uma ação de execução”.

Referido posicionamento não é isolado, guardando consonância com outras

manifestações doutrinárias favoráveis à reforma e, conseqüentemente, contrárias à manutenção

da dicotomia das atividades jurisdicionais relativas à obrigação de pagar soma em dinheiro.

Assim, CLETO UNTURA COSTA preceitua:

Pelo exposto, denota-se a benéfica tendência da reforma de

paulatinamente abolir a milenar dicotomia cognição-execução, conferindo-se, por

conseguinte, maior efetividade às ações que tenham por objeto a obrigação de fazer ou

não fazer e entrega de coisa, certa ou incerta, como pioneiramente sugeriu Humberto

Theodoro Júnior, referendado por Cândido Rangel Dinamarco, ao afirmar que “não se

exclui, de lege ferenda, a conveniência da ampliação dos casos em que a execução se

faz como mera fase do processo iniciado para o conhecimento da causa, ou mesmo

generalização de um sistema assim”. A única crítica que se faz refere -se à omissão na

208 MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à tutela jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 378, 20 jul. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5281>. Acesso em: 22 set. 2004. 209 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer: e sua extensão aos deveres de entrega de coisa, p. 464. 210 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória, p. 369.

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adoção do sincretismo para as ações que objetivam o cumprimento de obrigação de

pagar valor em dinheiro, mormente quando é sabido que a necessidade de nova citação

e possibilidade de oposição de embargos do devedor são constantemente utilizados

como artifícios protelatórios para o adimplemento da obrigação. Com a devida vênia,

não encontramos razão alguma para a manutenção da autonomia do processo de

execução de sentença nessas ações211.

Pelo visto, a doutrina mais qualificada une-se à severa crítica à ineficiência da

sentença condenatória e à manutenção deste sistema para obrigações que visam pagamento em

dinheiro. O fato de termos processos distintos para efetivar o direito reconhecido em juízo parece

ser de total inoperância perante os consumidores da justiça, especificamente no caso de execução

para pagamento de quantia, eis que as execuções que visam obrigações de fazer e entrega de

coisa, os problemas já foram dirimidos em recentes alterações na legislação processual.

Humberto THEODORO JÚNIOR212 assim resume a questão: “E razão não há para

persistir na manutenção de uma autonomia da execução de sentença que não se justifica, nem no

plano lógico, nem no jurídico e muito menos no econômico”.

E mais adiante arremata que a separação das atividades de condenação e execução,

“[...] só serve para retardar a consumação da prestação jurisdicional desde o início desejad a e

procurada pela parte, com acúmulo de atos estéreis e comprometedores da eficácia e do bom

nome da Justiça213”.

3.3 O PROJETO DE LEI 3.253 DE 2004 E SUAS PROPOSTAS

Observando a ineficácia da eficácia condenatória, pautada na dicotomia entre

cognição e execução, Humberto THEODORO JÚNIOR214, com muita pertinência, faz a seguinte

211 A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil: leis n. 10.352/2001, 10.358/2001 e 10.444/2002 / coordenadores Hélio Rubens Batista Ribeiro da Costa, José Horácio Haifeld Rezende Ribeiro e Pedro da Silva Dinamarco. – São Paulo, 2002. p. 215. 212 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 253. 213 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 217. 214 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 237.

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pergunta: “Por que não generalizar esse procedimento unitário para todas as ações

condenatórias215?”.

A resposta para essa indagação poderá vir pelo do Projeto de Lei nº 3.253 de 2004,

de autoria do Poder Executivo, que efetivamente pretende dirimir este problema que é a execução

ex intervallo nas obrigações para pagamento em dinheiro. Assim, ampliando as hipóteses que

possam se ver presente o aqui tão explorado sincretismo processual.

Não cabe aqui fazer um estudo profundo sobre o projeto, mas sim observar o que

ele traz de mais importante: o fim da execução de sentença fundada em título judicial para

pagamento de quantia.

Acolhendo todas as críticas vindas da doutrina e dos usuários da justiça, o Poder

Executivo toma a frente da situação e lança o projeto que visa pôr fim a execução de sentença

para este determinado tipo de obrigação.

A medida há muito tempo já era apoiada por Humberto THEODORO JÚNIOR.

Na opinião do jurista, “A inov ação só renderia frutos positivos, quer em eficácia quer em

celeridade da prestação jurisdicional, em nossos dias tão desprestigiada por notória morosidade e

inoperância216”.

Como novidade, o projeto traz a adoção da multa217 por tempo de atraso nas

sentenças que obrigam pagamento de soma em dinheiro, contribuindo assim para uma maior

eficiência e rapidez do processo - hipótese anteriormente abordada como inviável ante a falta de

autorização legal.

Extrai-se do voto do eminente relator do projeto, Deputado INALDO LEITÃO,

passagem que demonstra toda a sua intenção favorável à adoção do sincretismo processual para

obrigações de crédito:

Daí a pertinência de se pôr fim à atual dicotomia existente entre

processo de conhecimento e processo de execução, dando lugar à adoção daquilo que a

215 O procedimento unitário referido pelo autor é a eficácia executiva lato sensu, encontrada na ação de despejo, por exemplo. 216 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 10.

217 Luiz Guilherme MARINONI expõe que, “Contudo, parece que a sentença que impõe o

pagamento de soma em dinheiro ganharia em efetividade se fosse possível a ordem de pagamento sob pena de

multa”.( in, MARINONI, Luiz Guilherme. O custo e o tempo do Processo Civil brasileiro. Jus Navigandi, Teresina,

a. 8, n. 441, 21 set. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5717>. Acesso em: 23 set.

2004.

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doutrina denomina de processo sincrético, com a integração das atividades cognitivas e

executivas. A execução passa a ser apenas uma nova fase do processo de conhecimento,

sem necessidade de instauração de processo autônomo. Nada mais justo, já que a

sentença não é suficiente para, por si só, satisfazer o direito subjetivo material da parte,

o qual deve ser implementado no mundo dos fatos218. (grifo do acadêmico)

Nota-se em rápida análise sobre o teor dos artigos, as inovações trazidas pelo

projeto. Relacionamos aqui as inovações apontadas pelo deputado relator:

O projeto de lei em questão se alicerça, pois, em três bases, da qual

todas alterações são decorrentes:

- efetivação da sentença condenatória por quantia certa como etapa

final do processo de conhecimento (processo sincrético), dispensando a instauração de

processo autônomo de execução;

- liquidação de sentença como procedimento incidental e, não, ação

incidental;

- extinção dos embargos do executado, devendo toda impugnação ser

veiculada por mero incidente219.

Podemos sentir as diferenças trazidas transcrevendo-se o teor do projeto:

Art. 475-I. O cumprimento da sentença far-se-á conforme os artigos

461 e 461-A ou, se tratando de obrigação por quantia certa, por execução, nos termos

dos demais artigos deste Capítulo.

§ 1º [...]

§ 2º [...]

Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia

certa ou já fixado em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da

condenação será acrescido de multa percentual de dez por cento e, a requerimento do

credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, expedir-se-á mandado de penhora e

avaliação. (grifo do acadêmico)

§ 1º [...]

§ 2º [...]

218 Voto do relator do Projeto de Lei nº 3.253/2004, Deputado Inaldo Leitão. Disponível em: <http://200.219.132.4/sileg/integras/224693.htm> Acesso em: 02/09/2004. 219 Voto do relator do Projeto de Lei nº 3.253/2004, Deputado Inaldo Leitão. Disponível em: <http://200.219.132.4/sileg/integras/224693.htm> Acesso em: 02/09/2004.

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Como anteriormente mencionado, o projeto pretende atender os anseios da

doutrina e incluir a multa como meio de coerção ao devedor, coagindo-o ao pagamento da dívida.

Também haverá a dispensa de nova citação, a intimação do advogado pelo Diário

da Justiça bastará para vincular o réu a obrigação. Na inércia do devedor, o montante será

acrescido de multa de 10%, ficando desde logo a critério de o credor escolher sobre quais bens

deverá recair a penhora.

Pelo visto, percebe-se a evolução proposta pelo projeto de lei em análise. A

efetivação do disposto na sentença passaria a ser imediata. A execução seria uma fase

subseqüente do processo, e não um novo processo. O meio coercitivo da multa apresenta-se como

forma de impor o poder de imperium das decisões judiciais. Dando-se, assim, passo enorme para

uma maior efetividade das decisões judiciais e por conseqüência, do sistema processual.

Além disso, desaparecerão os embargos do devedor, cuja resposta será feita

através por impugnação, devendo o juiz da causa decidir se o incidente suspenderá ou não o curso

do processo (artigo 475-M caput do referido projeto de Lei).

Evidentemente que, se aprovado, o debatido projeto transformaria radicalmente o

processo civil “clássico” pautado na dicotomia das relações jurisdicionais. Mas esta mudança há

tempo é aguardada pelos estudiosos do processo, visto as inúmeras críticas acostadas inclusive

neste trabalho, sobre o tradicional sistema executivo.

3.4 AS VANTAGENS APONTADAS POR HUMBERTO THEODORO JÚNIOR

NA ADOÇÃO DE UM PROCEDIMENTO ÚNICO

Humberto THEODORO JÚNIOR aponta vantagens na adoção da unificação dos

processos de conhecimento (condenatório) e execução. Podemos aqui citá-las:

a) a pretensão que justifica a prestação jurisdicional não comporta a

falta dissociação em pretensão de condenar e pretensão de executar. Na realidade, só há

uma pretensão: a de compelir o devedor à prestação sob inadimplência;

b) se a lide real não de compõe apenas com a sentença condenatória,

tem o órgão judicial, para atingir o desiderato da pacificação social, que prosseguir

através de atos que tornem efetiva a restauração da ordem jurídica violada;

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c) se a condenação não basta para pacificar a lide, e necessária ainda

se faz a atuação executiva, razão não há para encerrar-se a função jurisdicional com a

sentença de mérito e exigir que o credor proponha outra ação para levar o órgão judicial

a executar sua própria ordem de condenação;

d) as nulidades ou ilegalidades do processo de conhecimento jamais

seriam motivo para exigir a execução forçada e completa, apenas com o fito de ensejar

embargos do devedor, pois outros meios há de se defender contra tais vícios, fora e

dentro do processo executivo;

e) na verdade, a execução, como processo autônomo e completo, só se

justifica na cobrança de títulos extrajudiciais, porque equiparados à sentença,

dispensam a fase de cognição e já autorizam o início da atividade jurisdicional no

estágio da realização prática do direito do credor, sem perder tempo com sua definição

ou acertamento220.

E, mais adiante, ressalta as vantagens “práticas” que poderiam ocorrer na referida

unificação:

a) a eliminação da propositura da execução forçada de sentença em

nova petição inicial do credor;

b) a eliminação da citação executiva: na própria sentença seria feita a

assinatura do prazo de pagamento, o qual, ultrapassado sem comunicação ou prova de

resgate, acarretaria a automática expedição do mandado de imissão de posse, se a

condenação for de entrega de coisa, ou de penhora, se de pagamento de dinheiro;

c) desaparecerão os embargos à execução, porque sendo único o

processo, toda matéria de defesa terá de ser produzida obrigatoriamente antes da

sentença, como hoje ocorre com as ações possessórias e com as de despejo. Com isso

desapareceriam, também, os embargos de retenção;

d) a prova de pagamento ou de outra causa de extinção da dívida, para

encerramento da execução, será feita por meio de simples petição do executado. Só em

casos de alta complexidade, o juiz remeterá as partes para as vias ordinárias, sem,

contudo, suspender a execução;

e) as alegações de nulidade do processo de execução, ou da sentença

exeqüenda, quando se tratar de nulidade de pleno iure, que prescinde da ação rescisória,

serão argüidas, também, por simples petição do executado, enquanto não ultimada a

execução;

220 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, pp. 253/254.

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f) sem efeito suspensivo, poder-se-iam admitir apenas embargos à

arrematação, se o processo chegasse ao final expropriatório, sem atentar-se para alguma

nulidade ocorrida nos próprios atos executivos, e contra a qual não tivesse ocorrido a

preclusão;

g) para maior prestígio e maior eficácia da condenação principalmente

nos casos de dívida em dinheiro, poder-se-ia privar a apelação do efeito suspensivo, o

que permitiria, logo após a sentença, a penhora, e eliminaria o risco de inutilizar-se a

condenação, na demora da tramitação recursal, pela superveniência de insolvência do

devedor ou algum ato fraudulento dele221.

Percebe-se que o jurista é de opinião que a união do processo cognitivo e

executivo só traria progresso para nosso sistema processual. O fato de termos nova ação a ser

proposta, nova citação, possibilidade de propositura de embargos do devedor, não parece

simpático. Como observado pelo doutrinador, várias são as formas de o devedor se defender de

supostas injustiças senão em meio a um novo processo. E na opinião do autor, “[...] a economia

processual seria valorizada pela eliminação de dispêndios inúteis relativos à reabertura da nova

relação processual executiva222”.

E segue Humberto THEODORO JÚNIOR:

A expedição incontinenti do mandado de cumprimento da sentença,

logo após o trânsito em julgado, ou até mesmo sem ele, independentemente de qualquer

petição ou citação, não só eliminaria vários atos processuais, como aceleraria a

atividade executiva, tornando mais prestante a função jurisdicional e mais rápida a

efetiva eliminação da lide, fim maior do processo e anseio único daqueles que batem às

portas da Justiça223.

Como exposto no tópico anterior, o Projeto de Lei 3.253/2004 traz a proposta de

solucionar a questão das execuções para pagamento de quantia. Eis que, como já mencionado, as

execuções de fazer ou não fazer e de entrega de coisa já foram solucionadas em recentes

alterações na legislação processual, trazendo, assim, mais celeridade e conseqüentemente

efetividade às decisões judiciais; além disso, adequando, cada vez mais, o processo civil

221 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, pp. 254/255. 222 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 253. 223 THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, p. 253.

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brasileiro ao que garante a Constituição da República promulgada em 1988 em seu artigo 5º,

inciso XXXV.

A manutenção da execução de sentença guarda estrita relação a actio iudicati

romana, porém há de se ressaltar que os tempos atuais não mais concedem espaço para a

continuidade do sistema “romanista anacrônico”, assim denominado por Humberto THEODORO

JÚNIOR224.

224 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. A execução de sentença e a garantia do devido processo legal, pp. 244-256.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho propôs-se a estudar uma das questões mais discutidas pela doutrina

em tempos atuais, englobando aspectos relativos à efetividade do processo, qual seja, a execução

de sentença quando se tenha por objeto o pagamento de quantia em dinheiro.

Em análise aos propósitos expostos, nota-se claramente que a atual sistemática do

Código de Processo Civil para as execuções de títulos judiciais que visam pagamento de quantia

não agrada a doutrina especializada e menos ainda os usuários da justiça. O fato de ter-se que

intentar “duas” ações para realmente chegar -se ao objetivo final, leva-nos ao descrédito do Poder

Judiciário. A falta de poder de imperium nestas decisões, condenatórias, afasta o processo de sua

efetividade garantida constitucionalmente.

O que acontece realmente na parte prática, nessas demandas, é o adimplemento

voluntário do réu, hipótese raramente observada em tempos atuais.

Para se ter um Judiciário forte e atuante, é preciso que se faça respeitar as decisões

judiciais. O fato da sentença condenatória não impor nada ao condenado leva-nos ao descrédito.

Reitera-se neste ponto, que o processo condenatório não pode servir de artifício

protelatório do réu-devedor, deve efetivamente propiciar ao credor o direito de ter seu direito

entregue em tempo hábil, e como sabemos, não é isso que ocorre atualmente, a demora na entrega

do direito nesses tipos de ação estrangula o direito fundamental do cidadão em obter a tutela

jurisdicional efetiva.

A necessidade de se intentar uma nova ação - característica principal do princípio

da autonomia do processo de execução - gera o direito do devedor embargar a execução, e, como

diariamente se observa na prática jurídica, é a procrastinação do processo civil. A manutenção da

ação autônoma de execução de sentença não se justifica, como abordado exaustivamente no

presente trabalho, em nenhum aspecto.

Nessa seara, pode-se concluir que: se existem meios para tornar o processo mais

efetivo, por que não fazê-lo?

Nessa esteira, seguindo a linha de todas as últimas alterações processuais, lembra-

se que as Leis 8.952 de 1994 e 10.444 de 2002 eliminaram de nosso ordenamento jurídico as

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execuções de sentença que visam obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa,

vislumbra-se a idéia de ampliar a idéia às obrigações para pagamento de quantia.

Seguindo essa linha, a chamada dicotomia das atividades jurisdicionais,

especificamente nos casos de pagamento de quantia, pode estar com os dias contados. Acolhendo

as insatisfações da doutrina, jurisprudência e principalmente daqueles que necessitam do Poder

Judiciário, tem-se concretamente a proposta de modificar o Código de Processo Civil. Nada mais

coerente, eis que no estado em que se encontra o sistema processual, propostas de evolução hão

de ser bem-vindas.

As propostas apresentadas acolhem as sugestões da doutrina. A busca da rapidez e

conseqüentemente da efetividade do processo, faz o legislador repensar a posição adotada em

1973.

As inovações apresentadas inovam radicalmente a forma de execução dessas

demandas. De forma acertada, o Projeto de Lei n.º 3.253 de 2004 prevê a execução de sentença

como mera fase do processo de conhecimento e não uma nova ação, como temos atualmente.

Aproveitando-se o disposto no referido projeto os casos de pagamento de quantia

certa ou incerta, eis que a alteração proposta também modifica o disposto no Código de Processo

Civil no que tange a liquidação de sentença. A liquidação passaria a ser parte integrante do

processo de conhecimento, e não procedimento autônomo como temos atualmente. Englobaria as

execuções contra devedor solvente, eis que, no estado de insolvência do devedor, deverá a

execução seguir de forma diferenciada, conforme o disposto nos artigos 748 e seguintes do

Código de Processo Civil.

Há tempos esta mudança é esperada. É preciso tomar consciência que o processo

privilegiar o autor que tem razão e não o devedor malicioso que não quer ver seu patrimônio

prejudicado.

Aguarda-se agora, vontade política em aprovar o referido projeto. A velha máxima

de que se “ganhou, mas não levou” precisa acabar. Tornar as decisões judiciais de condenação

respeitáveis é uma necessidade pública.

A aprovação de referido projeto, como prevê anteriormente a doutrina, só poderá

trazer benefícios para o nosso ordenamento jurídico e conseqüentemente tornar o processo civil

brasileiro, especificamente nesses casos, um tanto quanto mais efetivo.

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ANEXOS

1. Projeto de Lei nº 3.253 de 2004

2. Voto do Relator do Projeto de Lei nº 3.253 de 2004, Deputado Inaldo Leitão

3. Material colhido da Internet sobre o Projeto de Lei nº 3.253 de 2004