O que as urnas farão com as ruas

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O que as urnas farão com as ruas? Seria uma pena que o ódio ganhasse as ruas, criasse mártires e prejudicasse quem mais precisa. Ruth de Aquino 20/08/2013 07h30 - Atualizado em 20/08/2013 12h54 A pergunta, feita por um jovem durante debate na Casa do Saber, no Rio de Janeiro, provocou um silêncio pesado e ensurdecedor, na plateia e na mesa. Ninguém ousariaresponder. O medo da radicalização se instalou nas casas, nas famílias, nos locais de trabalho. As ofensas de baixo calão na internet mostram que uma simples divergência de opinião leva pedradas e balas de borracha. O gás lacrimogêneo nubla a lucidez, o spray de pimenta favorece o extremismo. Não se prevê sequer o que acontecerá no próximo dia 7 de setembro. As redes sociais convocam todos os brasileiros para “o grito do gigante” contra a corrupção política. Um tema válido e nacional, que causa a repulsa de todo cidadão de bem e transcende partidos. “Não existe corrupção do PT, do PSDB ou do PMDB. Existe corrupção. Não há corrupção melhor ou pior. Dos „nossos‟ ou dos „deles‟. Não há corrupção do bem. A corrupção é um mal em si e não deve ser politizada”, disse o mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso. Concordo. Espero que a declaração de Barroso signifique que todos serão punidos. E não que todos serão inocentados, sob o argumento de que “sempre se roubou” no Brasil. Caso contrário, o julgamento dos mensaleiros virará uma chicana. Barroso poderia acrescentar que os abusos e desvios não se restringem ao Legislativo. Contaminam o Executivo e também o Judiciário, Poder que ele representa. Há mordomias imorais para todo gosto entre os excelentíssimos representantes do povo. Ou Barroso acha válido que a gente pague R$ 101 milhões de auxílio-alimentação retroativo a juízes? Por isso, as ruas se levantaram com tanta indignação. Não porque as pessoas estão felizes e querem mais.

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O que as urnas farão com as ruas?

Seria uma pena que o ódio ganhasse as ruas, criasse mártires e prejudicasse quem

mais precisa.

Ruth de Aquino

20/08/2013 07h30 - Atualizado em 20/08/2013 12h54

A pergunta, feita por um jovem durante debate na Casa do Saber, no Rio de

Janeiro, provocou um silêncio pesado e ensurdecedor, na plateia e na mesa. Ninguém

ousariaresponder. O medo da radicalização se instalou nas casas, nas famílias, nos

locais de trabalho. As ofensas de baixo calão na internet mostram que uma simples

divergência de opinião leva pedradas e balas de borracha. O gás lacrimogêneo nubla a

lucidez, o spray de pimenta favorece o extremismo. Não se prevê sequer o que

acontecerá no próximo dia 7 de setembro. As redes sociais convocam todos os

brasileiros para “o grito do gigante” contra a corrupção política.

Um tema válido e nacional, que causa a repulsa de todo cidadão de bem e

transcende partidos. “Não existe corrupção do PT, do PSDB ou do PMDB. Existe

corrupção. Não há corrupção melhor ou pior. Dos „nossos‟ ou dos „deles‟. Não há

corrupção do bem. A corrupção é um mal em si e não deve ser politizada”, disse o mais

novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso. Concordo. Espero que a

declaração de Barroso signifique que todos serão punidos. E não que todos serão

inocentados, sob o argumento de que “sempre se roubou” no Brasil. Caso contrário, o

julgamento dos mensaleiros virará uma chicana.

Barroso poderia acrescentar que os abusos e desvios não se restringem ao

Legislativo. Contaminam o Executivo e também o Judiciário, Poder que ele representa.

Há mordomias imorais para todo gosto entre os excelentíssimos representantes do povo.

Ou Barroso acha válido que a gente pague R$ 101 milhões de auxílio-alimentação

retroativo a juízes? Por isso, as ruas se levantaram com tanta indignação. Não porque as

pessoas estão felizes e querem mais.

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A corrupção mina a democracia e contribui para o padrão quinto-mundista de

nossos serviços públicos: saúde, educação e transporte. O que mais tira o meu apetite

são as condições dos hospitais públicos. Não tenho estômago para ver uma grávida de

16 anos parindo em frente às grades de um hospital, depois de não ter sido aceita no

hospital anterior. Ou para ver idosos sentados em cadeiras ou amontoados em macas por

dias, na emergência de hospitais à espera de um leito, tendo sofrido fraturas ou

derrames. Ou saber que pacientes esperam um ano para fazer uma endoscopia. Ou olhar

as filas imensas de doentes diante dos hospitais. São violações de direitos humanos.

Diárias.