o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

298
ISER INSTITUTO DE ESTUDOS DA RELIGIÃO PESQUISA: O QUE AS LIDERANÇAS BRASILEIRAS PENSAM SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O ENGAJAMENTO DO BRASIL RELATÓRIO FINAL (2008)

description

Relatório

Transcript of o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

Page 1: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

I S E R

I N S T I T U T O D E E S T U D O S D A R E L I G I Ã O

P E S Q U I S A :

O Q U E A S L I D E R A N Ç A S B R A S I L E I R A S P E N S A M

S O B R E M U D A N Ç A S C L I M Á T I C A S

E O E N G A J A M E N T O D O B R A S I L

R E L A T Ó R I O F I N A L

( 2 0 0 8 )

Page 2: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2

Í N D I C E

A p r e s e n t a ç ã o 3 I n t r o d u ç ã o 4 R e s u m o d a s c o n c l u s õ e s 5 P o s i c i o n a n d o o s s e t o r e s 9 P r e s e n t a t i o n 1 2 I n t r o d u c t i o n 1 3 S u m m a r y o f t h e r e s u l t s 1 4 P o s i t i o n i n g t h e s e c t o r s 1 8 M e t o d o l o g i a 2 0 R e s u l t a d o s d a p e s q u i s a 3 0

L e i t u r a d o s d a d o s r e s u l t a n t e s d a s q u e s t õ e s e s t r u t u r a d a s 3 1 A n á l i s e s s e t o r i a i s 5 2

M í d i a 5 3 P a r l a m e n t a r e s 1 0 1 S o c i e d a d e c i v i l e O N G s 1 2 9 E m p r e s á r i o s 1 7 4 C i e n t i s t a s 2 0 3 G o v e r n o 2 3 7

C o m e n t á r i o s F i n a i s 2 7 3 E q u i p e t é c n i c a 2 7 9 N o t a t é c n i c a 2 8 0 A n e x o s 2 8 1

A n e x o I 2 8 2 A n e x o I I 2 9 0 A n e x o I I I 2 9 4

Page 3: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3

APRESENTAÇÃO

Este relatório apresenta os resultados finais da “Pesquisa de Opinião sobre Mudanças Climáticas no Brasil”, realizada pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER) com o apoio da Embaixada Britânica no Brasil.

A pesquisa teve como objetivo geral coletar e sistematizar opiniões de pessoas influentes (key-influencers) de sete setores da sociedade: mídia, parlamento, sociedade civil, organizações não-governamentais, universidades e institutos de pesquisa, empresariado e agências governamentais sobre o tema das mudanças climáticas.

A pesquisa pode ser definida como um estudo de percepção: explora o nível de informação e de engajamento e as visões dominantes de 210 lideranças (30 em cada segmento selecionado) sobre o tema das mudanças climáticas e outros tópicos relacionados. Deste modo, pretende indicar diretrizes para o desenvolvimento de programas de ação que possam vir a ser desenvolvidos no Brasil.

De natureza predominantemente qualitativa, a pesquisa usou a técnica da entrevista em profundidade com roteiro semi-estruturado. Cada entrevista presencial durou cerca de 50 minutos. A sondagem foi realizada em várias cidades e capitais do Brasil entre janeiro e maio de 2008.

A primeira parte do relatório traz uma síntese analítica que contém uma comparação dos setores estudados e destaca os resultados da sondagem; a segunda introduz cada setor com um resumo e procede a análises detidas sobre cada um deles; a terceira e última parte traz as conclusões gerais do estudo.

Page 4: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4

INTRODUÇÃO

Os objetivos da pesquisa foram indagar, sistematizar e organizar informações e opiniões fornecidas pelos formadores de opinião entrevistados, buscando:

1) Aprender mais sobre os formadores de opinião como um todo, incluindo suas percepções sobre as oportunidades, adequações e restrições impostas pelas mudanças climáticas ao desenvolvimento nacional;

2) Compreender o engajamento pessoal e institucional no combate às mudanças climáticas por parte de pessoas reconhecidas como lideranças, bem como suas percepções no que concerne às responsabilidades, barreiras e oportunidades para lidar com o assunto;

3) Obter informações complementares sobre as preocupações, esperanças e propostas que possam vir a subsidiar programas de ação, projetos e políticas públicas sobre mudanças climáticas no país.

Page 5: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5

RESUMO DAS CONCLUSÕES

Uma importante conclusão do estudo é a de que o tema das mudanças climáticas está na agenda dos atores sociais e governamentais. Nenhum dos sete setores selecionados (cientistas, empresários, sociedade civil, ONGs, mídia, governo e parlamentares) nega a alta relevância do tema ou avalia que o fenômeno das mudanças climáticas não deva ser tratado como uma das questões mais importantes e estratégicas do nosso tempo.

A problemática entra em pauta a partir dos anos 90 e ganha mais força e consistência nos últimos cinco anos. A consciência recente de que o “aquecimento global” e os “gases do efeito estufa” (na terminologia da época) estavam indicando mudanças drásticas no regime climático do planeta começou com a Rio-92. Para a maioria, foi a Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, realizada no Rio de Janeiro, que pautou o Brasil, signatário da Convenção do Clima e do Protocolo de Kyoto desde a primeira hora. Entretanto, admitem que foram, na seqüência, o relatório Stern (2006), o relatório do IPCC (2007) e o documentário Uma verdade inconveniente, de Al Gore, amplamente divulgado no Brasil, que chamaram a atenção para um fato que poucos contestam: o fenômeno das mudanças climáticas já se faz sentir, não é um problema distante do mundo de hoje e da geração atual. Por conseguinte, todas as sociedades têm que cooperar e encontrar um modelo de governabilidade para lidar com a questão.

A maneira como cada segmento da sociedade brasileira lida com o tema está relacionada a vários fatores, como a natureza do próprio segmento (mais ou menos informado), sua proximidade em relação aos temas e assuntos pertinentes (mais ou menos orgânico), a formação e inserção do próprio entrevistado (mais ou menos especializado) e a importância atribuída ao tema por cada uma das 210 lideranças entrevistadas.

Além do interesse ou trajetória estritamente profissional, quase todos disseram estar preocupados como indivíduos e cidadãos. Encontramos em todos os setores uma presença expressiva de opiniões balizadas, razoável domínio sobre o tema e uma grande motivação para aprender mais.

As principais conclusões, orientadas pela lista dos principais tópicos pesquisados, são as seguintes: A maioria absoluta dos entrevistados concorda com a visão científica de que o impacto das

mudanças climáticas será grande e afetará todos, especialmente a população pobre. i. O divisor de águas na formação de uma opinião consistente sobre o assunto foram os

dados do último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, 2007, amplamente divulgados pela internet e pela mídia, além de analisados em diversos fóruns. Para os entrevistados, o conjunto de evidências de que o clima do planeta está mudando é consistente e não se pode mais ignorar as possíveis conseqüências desse fato para a economia e os processos de desenvolvimento em curso.

ii. A quase totalidade dos entrevistados nomeia o fenômeno de “aquecimento global” ou de “mudança climática”. Praticamente nenhum entrevistado referiu-se à problemática da

Page 6: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6

"segurança climática" (climate security), terminologia comum nos Estados Unidos e na Europa.

iii. As lideranças consideram que ainda conhecem pouco o tema das mudanças climáticas e a maioria se considera altamente motivada a aprender mais sobre a problemática.

iv. A maioria dos entrevistados considera que o tema das mudanças climáticas é muito importante para seu setor ou área de atuação, podendo afetar políticas, consumo e negócios. Acreditam que a tendência será regular as atividades emissoras e se preocupam com o impacto desse tipo de medida sobre a competitividade econômica dos produtos brasileiros e com o rebatimento nas políticas praticadas de preço. A opinião geral é a de que a “transição energética tem um custo” e não se sabe ainda quem pagará a conta.

v. Os líderes apontam que entre os maiores desafios dos próximos 20 anos, tanto para a humanidade quanto para o Brasil, o protagonismo cabe às questões ambientais e às questões sociais. Em sua opinião, não é possível separá-las, pois a pobreza leva a práticas predatórias. Sobre o enfrentamento das questões ambientais, destacaram o problema das mudanças climáticas e a necessidade de conservar os recursos hídricos; no enfrentamento das questões sociais, destacaram a necessidade de combater a pobreza e reduzir as desigualdades.

vi. Em todos os setores ouvimos críticas ao atual modelo de desenvolvimento, tido como insustentável, principalmente pelo fato de ser baseado em “combustíveis fósseis”. Também foi amplamente criticado o atual modelo de consumo, inspirado no “modelo americano”: para os entrevistados, rever padrões de produção e consumo é uma questão que não pode ser mais adiada se nós, como civilização, decidirmos enfrentar seriamente o desafio das mudanças climáticas.

vii. Para todos os setores, o maior responsável pelo agravamento das mudanças climáticas é o binômio desmatamento/queimadas. Em segundo lugar, destacaram as fontes veiculares e criticaram o modelo rodoviarista adotado pelo país nas décadas de 1960 e 1970. Como terceiro fator mais importante, mencionaram as atividades industriais, destacando como vilões as indústrias petroleira, mineradora e química, bem como o agronegócio.

viii. Para a maioria absoluta, a responsabilidade do Brasil perante o mundo no combate às mudanças climáticas pode ser resumida em quatro ações: 1) conter o desmatamento da Amazônia; 2) rever a matriz de transportes; 3) não sujar a matriz energética brasileira, considerada limpa em comparação aos demais países; e 4) desenvolver os biocombustíveis, o que pode ser uma “grande contribuição” para a transição energética que os países devem enfrentar nas próximas décadas.

ix. Apenas uma minoria, no entanto presente em todos os setores pesquisados, considera que o Brasil não deve ceder a imposições vindas de fora, e que o momento é de negociar vantagens para o país, pois preservar a Amazônia “custa caro”. Para esses, o Brasil tem direito a se desenvolver e, assim como a China e a Índia, não pode pagar o preço que desejam os países desenvolvidos, que usaram perdulariamente seus recursos no passado. Em outras palavras, para essa minoria o Brasil deve receber recursos para preservar a Amazônia.

x. Quase todos os entrevistados se mostraram preocupados com o futuro da Amazônia, enxergando nela nosso problema e solução. Conter o desmatamento é um problema, pois significa mudar o modelo de uso do solo na região, tida como enorme e diversa. Segundo eles, a Amazônia não é somente importante para o mundo, mas também para o Brasil; a questão é provar para os agentes econômicos que a floresta vale mais em pé do que derrubada para produzir madeira, gado ou soja.

Page 7: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7

xi. A maioria absoluta dos entrevistados declarou ser possível compatibilizar crescimento econômico e redução de emissões, ou seja, não agravar ainda mais o fenômeno das mudanças climáticas. Contudo, afirmam que é esse o desafio amazônico, e que a solução dos transportes, principalmente nas grandes cidades, será decisiva. As indústrias de um modo geral acabarão se adequando às normas, mesmo porque isso se tornou uma questão de competitividade, e o mercado de crédito de carbono deverá oferecer os instrumentos para isso. Com o esgotamento dos mecanismos criados pelo Protocolo de Kyoto, surgirá uma nova geração de instrumentos e o mercado deverá responder rapidamente.

xii. Uma minoria, contudo, também presente em todos os setores, mostrou-se cética quanto à possibilidade de compatibilização: para eles, o problema está no próprio modelo de desenvolvimento, ainda baseado em combustíveis fósseis. A transição energética, dizem, não se faz do dia para noite, e esbarra além disso nos fortes interesses econômicos das petroleiras e associados. Lembraram também que o modelo de consumo adotado pela maioria dos países é insustentável e que não há sinais de que os países que têm consumo alto de energia per capita (caso dos EUA, por exemplo) estejam dispostos a sacrifícios.

xiii. Para parte expressiva dos entrevistados, os biocombustíveis são uma “janela de oportunidades” para o Brasil, desde que os parâmetros dessa produção sejam regulados a partir de um marco de sustentabilidade. Os entrevistados falam entusiasticamente da chance que o Brasil tem de contribuir para o mundo, não só com o etanol, mas com uma economia de biomassa de baixo carbono. Para esses entusiastas, o Brasil tem território, tem tecnologia e tem o apoio de suas elites. Eles criticam, no entanto, o modelo de “agricultura familiar”, afirmando que, para ser a maior economia de biocombustíveis do mundo, o Brasil precisa de escala, e não de projeto social com assentados da reforma agrária.

xiv. Em sua maioria, os entrevistados se declararam não especialistas, mas disseram acompanhar a discussão internacional, realizada de dois em dois anos pelos países-membros da ONU nas reuniões da Conferência das Partes (COP). As principais fontes desse acompanhamento são a internet, os jornais impressos e os noticiários televisivos. Muitos declararam que lêem revistas especializadas e documentos disponíveis na internet. Uma minoria acompanha bem de perto na qualidade de negociadores, consultores ou membros das delegações brasileiras. Para essa minoria mais especializada, as opiniões estão divididas entre um grupo que considera o Brasil pouco engajado, atuando equivocadamente, e outro que acredita que o Brasil está bem, tem a matriz limpa e o etanol, e que a Amazônia é o único problema real.

xv. Entre os que acompanham de perto a batalha das negociações nos encontros preparatórios e oficiais, a maioria criticou a posição dos Estados Unidos, classificando como erro histórico o não-alinhamento ao Protocolo de Kyoto, desde 1997. Acreditam que essa posição deverá mudar com o resultado das atuais eleições presidenciais no país e que o grande problema será a China, por ser uma grande potência com um modelo de produção sujo (baseado em carvão).

xvi. Apenas uma minoria disse ter acompanhado a Conferência de Bali e manifestou descrença na agilidade desse tipo de reunião, afirmando que os mecanismos são “velhos” e “inoperantes” para as necessidades urgentes que a questão climática impõe ao mundo. Uma parte expressiva, no entanto, incluindo os que não acompanharam, declarou que apesar de tudo houve avanços e que a agenda está estabelecida para 2009. Para esses otimistas, há grande desigualdade na esfera internacional e a saída é negociar, pois o fenômeno das mudanças climáticas terá impacto diferente em cada país. Segundo eles, as responsabilidades são “comuns, mas diferenciadas”.

Page 8: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8

xvii. Para uma parte significativa dos entrevistados, mais de dois terços, o Brasil tem desperdiçado a chance de liderar uma iniciativa relevante, tornando-se líder dos países emergentes. O país tem perfeitas condições para isso, pois é uma “potência ambiental”. A maioria desconhece a proposta que a diplomacia brasileira apresentou em Bali, denominada “desmatamento evitado”. Quem disse conhecer Bali criticou as resoluções da Conferência, consideradas de difícil operacionalização; mesmo aqueles que simpatizam com a proposta consideram necessário aprimorá-la;

xviii. A totalidade dos entrevistados considera que a Europa está na vanguarda no que se refere às metas de redução e de programas de adaptação e mitigação, mas a maioria não sabe citar os programas específicos ou não conhece detalhes. Os países mais citados foram Alemanha, Holanda e Dinamarca; os mais criticados foram EUA, Rússia e China;

xix. Para a maioria absoluta dos entrevistados, quem deve liderar o processo de engajamento do Brasil, dentro e fora do país, é o governo. Trata-se de uma “tarefa de Estado”, disseram. Se o governo mostrar à sociedade que está levando o assunto a sério, os demais atores tendem a se engajar. Pela ordem, além do próprio governo foram citados o empresariado, a sociedade civil e a mídia. Também foi dito que o país precisa de um projeto de desenvolvimento tecnológico voltado para a produção de energias limpas. O governo poderia sinalizar suas intenções aprovando uma política nacional do clima e discutindo a sua implementação com todos os setores.

xx. A maioria dos entrevistados mostrou-se pessoalmente sensibilizada com os possíveis efeitos e cenários sombrios que a questão das mudanças climáticas coloca. Acreditam ser este “o maior desafio de todos os tempos” e se mostram preocupados como pessoas, profissionais e líderes que devem tomar decisões. Recusam, contudo, o tom “apocalíptico” ou catastrofista que costuma imperar no noticiário e em fóruns mais militantes. Acreditam que a “pedagogia do medo” pode ser paralisante ou provocar atitudes como a do homem que, ao receber a notícia do fim do mundo, torna-se um hedonista.

xxi. Finalmente, as lideranças ouvidas consideram que a humanidade já teve desafios importantes em outros momentos da história e que a cooperação para enfrentar o agravamento climático deverá acontecer em breve. Embora reconheçam que não há base científica e tecnológica para lidar com toda a complexidade do fenômeno das mudanças climáticas, mostram-se otimistas quanto às possibilidades de reversão do fenômeno. Parte dos entrevistados, também uma minoria presente em todos os segmentos, mencionou a necessidade de consolidar uma base ética e de invocar não só as forças econômicas, mas também as energias espirituais da humanidade, pois estamos sem dúvida em um período crítico da história para os seres humanos e o planeta.

Page 9: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9

POSICIONANDO OS SETORES

Em termos de suas opiniões sobre o tema das mudanças climáticas, os setores selecionados se dividem em dois grupos distintos: um constituído pelos indivíduos mais informados e engajados; e outro mais reticente, com menos informação ou com outras prioridades declaradas. Entretanto, em cada setor, observou-se a consciência de seu papel e de sua contribuição específica para a constelação dos esforços que o Brasil deve empreender.

Em termos de uma consciência e engajamentos mais consistentes, verificamos que o setor com um posicionamento mais franco é o representado pelos parlamentares. Os entrevistados deste setor admite que ainda não dá a devida importância à questão climática. Para os parlamentares, isso se deve ao fato de que o executivo ainda não se definiu. Para eles, sem sociedade e sem governo, o parlamento pouco pode fazer.

Logo em seguida temos a mídia. Embora os profissionais de comunicação reconheçam ter o papel de formar opinião e de conscientizar, eles não são produtores de informação, mas comunicadores; são como caixas de ressonância. Além disso, são reféns da lógica do noticiário, que se alimenta de novidades e de eventos dramáticos. Ainda assim, a maioria dos entrevistados se sente pessoalmente mobilizada e acredita que a problemática vem conquistando cada vez mais espaço no setor, tendência que deve perdurar. Acreditam ainda que, assim como surgiu um jornalismo especializado nas questões ambientais, o mesmo deverá ocorrer com o tema das mudanças climáticas.

Em terceiro lugar estão, consideradas conjuntamente, as ONGs e as associações do terceiro setor – isto é, as organizações de corte mais militante junto com aquelas de representação empresarial. Como já era previsível, neste segmento encontramos uma enorme heterogeneidade de perfis de atuação e engajamento. O primeira aspecto a sublinhar é que não são muitas as organizações que lidam sistematicamente com o tema das mudanças climáticas ou se apresentam como especializadas. O segundo é que os diferentes registros ideológicos, ou recortes da questão, pulverizam os esforços e não se pode dizer que há uma atuação forte, em rede temática.

Ainda assim, pela força do papel militante e das convicções apresentadas, o setor traz interessantes argumentos sobre a segurança climática do planeta e sobre os desafios da sustentabilidade. Para os entrevistados desse segmento, é o desenvolvimento sustentável que trará as soluções de médio e longo prazos para os desafios impostos pelas mudanças climáticas. Estão nesse setor os depoimentos mais pessimistas e mais críticos. No entanto, é também nesse setor que se apresentam os esforços mais engajados no sentido de promover as chamadas energias limpas, associando processos tecnológicos de escala ou alternativos a projetos de inclusão social.

Em quarto lugar, na direção do menos para o mais consistente em informação e engajamento (não necessariamente de influência), está o setor empresarial. A contribuição específica desse setor é analisar os custos da transição energética, o custo em investimentos e competitividade dos negócios e produtos brasileiros e sugerir os instrumentos legais e financeiros adequados.

O empresariado ouvido na amostra tem plena consciência de seu papel, pois, no limite, o fenômeno das mudanças climáticas desafia os setores econômicos a se adaptarem à nova matriz

Page 10: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0

(menos intensiva em energia e menos emissora de gases do efeito estufa). Esse setor entende que, sem sua participação, não é possível mudar os padrões de produção e consumo. Eles reconhecem que o problema é mundial e que regulações e adaptações não podem ser iniciativas individuais; para surtirem efeito, precisam partir de um setor inteiro e ter impacto local, nacional e global. Esse setor é o que mais levanta dúvidas sobre a adoção, pelo Brasil, de metas de redução de emissões. Naturalmente, essas dúvidas têm por base o receio de perder competitividade.

Em quinto lugar, como um dos setores mais orgânicos e bem informados, identificamos os agentes governamentais, distribuídos em ministérios e posições que têm o poder de formular e tomar decisões. Esse setor concorda com a posição manifestada pelos demais de que o governo deve liderar o processo de articulação e formação de consenso, capaz de engajar a sociedade brasileira de um modo mais significativo no combate aos efeitos das mudanças climáticas. Embora componham o aparelho estatal, criticam fortemente a morosidade com que o próprio governo vem atuando na questão, falsamente dividido entre o dilema do crescimento e o dilema da preservação da Amazônia.

O segmento governamental é o que mais insiste na percepção de que há uma ênfase excessiva na Amazônia, e o mais otimista, depois dos empresários, no que se refere à oportunidade do Brasil de ser o maior produtor de biocombustíveis do mundo. Esse setor foi o mais crítico do problema dos transportes, considerado estrutural, mas fortemente ancorado em interesses econômicos difíceis de reverter. Para esse setor, o verdadeiro problema está nas cidades, no padrão de organização e consumo, na indústria automobilística e na matriz de transportes adotada pelo Brasil. O setor acredita que em breve será editada, por iniciativa do governo, uma política nacional do clima, e que sua regulação e implementação revelará até que ponto a sociedade brasileira está disposta a mudar seus hábitos.

Por fim, percebemos o setor científico como o mais consistente e preocupado. Isso se deve em parte à natureza do setor, que possui informação altamente qualificada, e em parte às características dos amostrados, todos cientistas ou pesquisadores que ocupam posições estratégicas ligadas direta ou indiretamente à questão. Como era de se esperar, o setor científico sabe da sua importância como fonte de conhecimento e validação das teses que vêm sendo difundidas sobre mudanças climáticas. Ainda assim, e embora tenham reafirmando a importância e gravidade do tema, não se consideram pessimistas. Acham que o país está equipado, tem técnicos e cientistas preparados para lidar com os problemas mais emergenciais. Ressentem-se, contudo, da falta de uma política de desenvolvimento científico e tecnológico que expresse a preocupação com o tema das mudanças climáticas. Lembram que doutores e pesquisadores precisam de tempo para completar sua formação e começar a aplicar seus conhecimentos.

De um modo geral, os cientistas e pesquisadores amostrados são entusiastas da possibilidade de o Brasil vir a se tornar um grande produtor de biomassa e de biocombustíveis. Eles são os mais fortes defensores do Brasil como potência ambiental. Para eles, o país tem território e biodiversidade suficientes para despontar como uma grande economia de baixo carbono. É preciso, contudo, valorizar a biodiversidade e traduzi-la em produção não só de commodities ambientais, mas também em biotecnologia de alto valor agregado. O sonho do setor é colocar sua base de conhecimento a serviço de um modelo de desenvolvimento sustentável que consideram viável e possível para o país.

Page 11: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1

Parlamento

(-)

Mídia ONGs Empresários Técnicos gov. Cientistas

(+)

(O diagrama mostra a gradação, de menos para mais, da consistência encontrada nos setores.)

Page 12: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2

PRESENTATION

This report presents the results of the “Opinion Poll on Climate Change in Brazil”, developed by the Institute of Religious Studies (ISER) with the support of the British Embassy in Brazil.

The general purpose of the poll was to collect and systematise opinions of key influencers from seven sectors of society: media, parliament, civil society, non-governmental organizations, universities and research institutes, the business sector and government agencies.

The research can be described as a study of perception: it explores the level of information and engagement, as well as the prevailing perceptions of 210 leaders (30 in each selected segment) on climate change and other related issues. It also indicates directions for potential programs and plans of action that might be developed in Brazil.

The poll is predominantly qualitative. The researchers have used the in-depth interviewing technique with a semi-structured script. Each personal interview was about 50 minutes long. The study was carried out in several towns and cities in Brazil between January and May 2008.

The first part of the report offers an analytical summary, comparing the seven sectors and highlighting the survey results; the second part comprises separate analysis of the sectors, each one introduced by a summary; the third part addresses the general conclusions of the study, followed by a technical comment on the methodology and the procedures adopted.

Page 13: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3

INTRODUCTION

The objectives of the study were to inquire, systematise and organise information and opinions obtained from the interviewed key influencers in order to:

1) Learn more about the overall group of key-influencers, including their understanding of the opportunities, adaptations and restraints imposed by climate change on the country’s development;

2) Understand the personal and institutional involvement of people recognised as influencers to combat climate change, and their perceptions of the responsibilities, barriers and opportunities to deal with the subject;

3) Obtain supplementary information about concerns, hopes and proposals that may support programmes, projects and policies on climate change in the country.

The topics addressed by the poll were the following:

• Major challenges of humanity and Brazil in the next 20 years;

• Major environmental challenges in the next 20 years (worldwide and Brazil);

• Degree of concern and gravity attributed to the problem of climate change;

• Knowledge of the topic and the causes and effects involved;

• Opinion about the impact of climate change on the economy and prospects of socioeconomic development;

• Opinion about the impact of climate change on the interviewee’s work sector;

• Brazil’s responsibilities towards the world;

• Contribution of sectors and players to reduce emissions;

• The importance of renewable energies (discussion on the energy matrix);

• Identification of key-influencers and the role of individuals in furthering consciousness and mitigation;

• Knowledge of mitigation/adaptation actions and programmes at home and abroad;

• Knowledge of how the subject is addressed abroad.

Page 14: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4

SUMMARY OF THE RESULTS

A major conclusion of the study is that climate change has been placed on the agenda of social and government players. No sector among the selected seven (scientists, business sector, NGOs, civil society, media, government and members of parliament) denied the utmost importance of the topic or affirmed that the phenomenon of climate change must not be addressed as one of the most important and strategic issues of our time. The problem emerged in the 1990s and even more consistently in the past five years. The recent consciousness that “global warming” and “greenhouse gases” (expressions used at that time) have been showing drastic change in the climate system of the planet began with Rio-92. The majority considers that it was the UN Conference on Environment and Development, held in Rio de Janeiro, which put Brazil on the map right from the start as signatory to the Climate Convention and Kyoto Protocol. They do, however, admit that the Stern Report (2006), the IPCC Report (2007) and Al Gore's documentary An Inconvenient Truth, widely publicized in Brazil, were decisive to shape a perception that few contest: that the phenomenon of climate change is now felt to be not so distant a problem to the current generation. Consequently, all societies need to cooperate and find a model of governability to deal with the question.

The way each segment of Brazilian society deals with the matter depends on various factors, such as the nature of the segment itself (with more or less information), its familiarity with related topics and subjects (organic to a greater or lesser degree); the interviewee’s own background and insertion (more or less experienced) and on the topic’s importance to each of the 210 leaders interviewed. Almost all of them claimed to be concerned beyond their professional interest or career, as individuals and citizens. We find a strong presence of supported opinions, reasonable command of the topic and keen motivation to learn more in every sector.

The main conclusions, guided by the list of principal topics studied, are as follows:

i. The absolute majority of the interviewees agree with the scientific view that climate change will have a strong impact and will affect everyone, especially the poor population.

ii. The watershed in forming a strong opinion on the matter was the data brought by the latest IPCC Report (Intergovernmental Panel on Climate Change, 2007), widely reported by the media and the internet, whose data were analysed at various forums. The interviewees said that the overall evidence of the planet’s climate change is consistent and they can no longer ignore the possible effects that it has on the economy and the development processes in progress.

iii. Nearly all interviewees name the phenomenon "global warming" or "climate change". Practically none of them referred to the problem as "climate security", the most common terminology in the United States and Europe.

iv. Leaders believe that they still have little information about the question of climate change and most consider themselves highly motivated to learn more about the problem.

Page 15: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5

v. Most of the interviewees believe that climate change is a major problem for their sector or working area, and that it may affect policies, consumption and business. They believe the tendency will be to regulate activities with emissions, and they are concerned with the impact of this type of measure on the economic competitiveness of Brazilian goods, as well as with the kickback on adopted price policies. The general opinion is that “energy transition has a price”, and no one knows who will pay the bill.

vi. Influencers mention that the key challenge for humanity and Brazil in the next 20 years is to address the environmental and social issues at the same time. In their opinion, it is impossible to dissociate them, since poverty leads to predatory practices. When addressing the environmental issues, the most cited aspects are climate change and the need to protect water resources; when addressing social questions, the prime need is to fight against poverty and reduce inequalities.

vii. In every sector, we have heard criticism against the current development model, considered unsustainable, mostly because it is “fossil fuel” based. The current consumer model, inspired on the “American model”, was also widely criticised; the interviewees consider that reviewing production and consumer standards is an issue that can no longer be postponed if we, as a civilization, really decide to face the challenge of climate change.

viii. All sectors consider that the deforestation/burnings binomial is mostly responsible for the increasing climate change. Secondly, they pointed to vehicle sources and criticised the highway model adopted by Brazil in the 1960s and 1970s. Thirdly, they mentioned industrial activities, pointing to such “villains” as the oil, mining and chemical industries, as well as agribusiness.

ix. The absolute majority believes that Brazil’s responsibility towards the world to combat climate change is concentrated in four actions: 1) to curb Amazon deforestation; 2) to reconsider the transport matrix; 3) not to stain the Brazilian energy matrix, which is considered clean compared to other countries; and 4) to develop biofuels, which may be a “valuable contribution” to the energy transition the countries shall face in the next few decades.

x. Only a minority in all sectors surveyed considers that Brazil should not yield to impositions from outside, and that the moment is now to negotiate benefits for the country, since preserving the Amazon “is costly”. They believe that Brazil has the right to develop itself, and, like China and India, should not pay the price demanded by the developed countries, which squandered their own resources in the past. In other words, they believe that Brazil must receive resources to protect the Amazon.

xi. Practically every interviewee was concerned with the future of the Amazon, where they discern our “problem and solution”. Curbing deforestation is a problem, since it means changing the land use model in the region, considered vast and diverse. They believe the Amazon is not only important for the world, but also for Brazil; the question is to prove to the economic agents that the forest is worth more standing than felled to produce timber, cattle or soybean.

xii. The absolute majority of the interviewees stated that it is possible to combine economic growth with reducing emissions, i.e. that it is possible not to worsen climate change even further. However, they do say that the Amazon transportation challenge and solution will set the pace, especially in the large cities. Industries in general will eventually adapt to the regulations, because of the growing importance of the issue to competitiveness; the carbon credit market shall offer instruments to do so. With the exhaustion of the mechanisms created by the Kyoto Protocol, a new generation of instruments should emerge and the market will probably be quick to respond.

Page 16: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6

xiii. A minority, however, also in every sector, was doubtful about the combination. They believe that the problem lies in the development model, still based on fossil fuels: the energy transition does not happen overnight; moreover, it goes against the strong economic interests of the oil companies and their associates; they also mentioned that the consumer model adopted by most countries is unsustainable, and that there is no sign that the countries with a high per capita energy consumption, such as the USA, are willing to make the sacrifice.

xiv. In the opinion of most interviewees, biofuels are a “window of opportunities” for Brazil, as long as its production parameters are regulated within a sustainability benchmark. The interviewees talk enthusiastically about Brazil’s chance to contribute to the world, not only with ethanol but also with a “low carbon biomass economy”. These enthusiasts believe that Brazil has land, technology and the support of its elites. Nevertheless, they criticize the “family agriculture” model; for them, in order to become the largest biofuel economy, the country needs scale, and not a “social project” with land reform settlers.

xv. Most interviewees claimed not to be “specialists”, but they did say they accompanied the international discussion held by the UN member countries during the meetings of the Conference of the Parties (COP) every two years. The main sources of this follow-up are the internet, newspapers and television news broadcasts. Many claim to read specialised journals and publications and also documents provided by the internet. A minority accompanies COP very closely as negotiators, consultants or members of the Brazilian delegations. The opinions of this more specialized minority are divided between a group that considers Brazil to be little involved, acting wrongly, and another that thinks Brazil is well, has ethanol and a clean matrix, and Amazon is the one and only real problem we should deal with.

xvi. The majority of those who closely accompany the battle of the negotiations at the preparatory and official meetings criticised the attitude of the USA, rating the non-alignment to the Kyoto Protocol since 1997 as an “historical faux pas”. They believe that this attitude could change with the new US elections and that the major problem will be China, since it is a major power with a dirty production model (coal-based).

xvii. Only a small minority said that they had accompanied the Bali Conference and expressed disbelief in the efficiency of this kind of meeting, saying that the mechanisms are “old” and “inoperative” for the pressing needs of the climate issue for the world. A large number, however, said that, nevertheless, “there has been progress” and that the agenda is set for 2009. The rest consider that there is a high degree of inequality among the countries and it is necessary to negotiate, since the phenomenon of climate change will affect each country differently. They think the responsibilities are “mutual, but differentiated”.

xviii. For a large number of the interviewees, Brazil has been wrongly ignoring the chance of leading an important project, becoming a leader among the emerging countries. The country has perfect conditions to do so, since it is an “environmental power”. The majority are unaware of the proposal that Brazilian diplomacy presented in Bali on avoided deforestation, and whoever said they were aware criticised the proposal by considering it difficult to put into practice; even those who were in favour of the proposal consider that there is need to enhance it.

xix. All interviewees consider that Europe is in the forefront in terms of reduction goals and adaptation and mitigation programmes, but most could not name or provide details about the programmes. Individually, the countries most mentioned were Germany, Holland and Denmark; the most criticized were the China, Russia and the USA.

xx. The absolute majority of the interviewees believe that the leadership of Brazil's engagement process at home and abroad should be taken over by the government. This is an “affair of

Page 17: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7

state”, they said. Once the government shows signs to society that it is taking the matter seriously, the other players tend to get involved. The government sector was followed by the business sector, civil society and the media, in that order. They also said that the country needs a technological development project focusing on the production of clean energies. What the government must do to show its intentions is to approve a national policy on climate and discuss its implementation with all sectors.

xxi. Most interviewees seemed personally worried about the possible outcomes and dismal scenarios raised by the question of climate change. They believe that it is “the greatest challenge ever” and are concerned as individuals, professionals and decision-making leaders. Nevertheless, they reject the “apocalyptic” or catastrophic tone that usually prevails in the headlines or in the more militant forums. They believe that the “pedagogy of fear” is paralysing or may lead to unpredictable attitudes such as that of the man who becomes a hedonist, believing the end of the world is at hand.

xxii. Lastly, the key influencers interviewed consider that humanity has already faced other tremendous challenges in the past and that cooperation against climate change should be just round the corner. Although they acknowledge that there is no scientific and technological basis for dealing with all the complexity of the climate change phenomenon, they are optimistic towards the possibility of “reversing the phenomenon”. Some of the interviewees, also in every sector but fewer in number, talked about the need to consolidate an ethical base and call upon not only economic forces but also the spiritual energies of humankind, since we are undoubtedly living in one of the most critical periods in the history of the planet and humankind.

Page 18: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8

POSITIONING THE SECTORS

The selected sectors are divided, in terms of their opinions on climate change, in two distinct groups: one consisting of more informed and involved individuals, and the other one more reticent, with less information or with other stated priorities.

In each sector, however, there was awareness of “their role” and their specific contribution within the constellation of efforts Brazil must make.

In terms of consciousness and the most consistent engagement, we found the representatives of the parliament sector to be in the weakest position. The parliamentarians admit that they still do not give due importance to the climate issue. They believe that this is because the Executive has not yet taken a stance. They consider that “without society and government, parliament can do very little”.

Media follows closely in their wake. Although the communication professionals acknowledge their role in forming opinions and encouraging consciousness, they are communicators, an echo chamber, rather than information producers. Moreover, they are hostage to the logic of news, which feeds on novelty and sensational events. Even so, most interviewees personally feel mobilised and believe that the problem is being given increasing space in the sector, a trend that should last. They also believe that, just as specialised journalism emerged on environmental questions, the same should occur with climate change.

The NGOs and third sector associations together come in third place. In these segments, we find a huge heterogeneity of active and engaged profiles. They range from represented professional associations or consulting firms to militant organisations active in the climate change issue. The first thing to note is that there are not many organizations addressing the topic systematically, or that are specialized in it. Secondly, the different ideological perspectives shift the focus of attention, and it seems that there is no close thematic networking. Nevertheless, through the force of the militant role and stated convictions, the sector offers interesting arguments about the planet’s climate security and challenges of sustainability. The opinion of this sector is that sustainable development will bring mid and long term solutions for the challenges raised by climate change. This sector has the most pessimistic and most critical opinions. However, this sector also shows the most institutionalised efforts to promote the so-called clean energies, associating technological progress of large scale or alternatives with processes of social inclusion.

In this scale from the least to the most consistent in terms of information and engagement (not necessarily influence), the business sector comes in fourth place. This sector’s specific contribution is to analyse the costs of energy transition, the cost in terms of investments and competitiveness of business and Brazilian goods, and suggest compatible legal and financial instruments. The interviewees from the business sector in the poll are fully aware of their role, since the borderline is that the climate change phenomenon challenges the economic sectors to adapt to the new matrix (less energy-intensive and with fewer greenhouse gas emissions). This sector believes that there is no change in production and consumer patterns without the sector’s participation. They recognize that this is a worldwide problem and that regulations and

Page 19: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9

adaptations cannot be individual initiatives. To be effective, these initiatives have to be set up by an entire sector and have local, national and global impact. This sector raises doubts about the benefits of Brazil's adoption of goals to reduce emissions. Of course, these doubts are based on reluctance to lose competitiveness.

In fifth place, we found the government agents to be one of the most organic and best-informed sectors. Distributed throughout ministries and positions and having the power to formulate and take decisions, this sector agrees with the view expressed by the others that the government must lead the coordination process, forming a consensus that can engage the Brazilian society more strongly against the effects of climate change. Although they are part of the state apparatus, they fiercely criticise the slowness with which the government has been addressing the issue, mistakenly divided between the “dilemma of growth” and the “dilemma of preserving the Amazon rainforest”. This sector is the most insistent on perceiving that there is too strong a focus on the Amazon, and is it also the most optimistic, right after the business sector, about Brazil’s opportunity to be the largest biofuel producer in the world. This sector was the most critical regarding the question of transportation that it considers structural, firmly anchored in stubborn economic interests. In the opinion of this sector, the real problem lies in the towns, organisation and consumer pattern, the car industry and transport matrix adopted by Brazil. The sector believes that the government, on its own initiative, will soon announce a national climate policy, and then we will see in its provisions and implementation to what extent Brazilian society is willing to make the sacrifice.

At last, the scientific sector appears as the most consistent and concerned. This is in part due to the very nature of the sector, which not only has highly qualified information, and in part to the peculiarities of the interviewees: all are scientists or researchers that directly or indirectly work with the issue, occupying strategic positions. As was to be expected, the scientific sector is aware of its own importance as a source of knowledge and validation of the theories published on climate change. Even so, although they have reaffirmed the importance and gravity of the topic, they do not consider themselves pessimistic. They believe that the country is equipped, has a technical body and enough scientists to be able to deal with the most pressing problems. They resent, however, the lack of a scientific and technological development policy that expresses concern with climate change. They recall that specialists and researchers need time to learn and apply their knowledge. In general, the interviewed scientists and researchers are enthusiastic about the possibility of Brazil becoming a major biomass and biofuel producer. They are the strongest champions of Brazil as an “environmental power”. They consider that it has enough land and biodiversity to become a major low-carbon economy. We need, however, to value biodiversity and translate it not only into production of environmental commodities, but also into high value-added biotechnology. The sector dreams of putting its knowledge base at the service of a sustainable development model that they find feasible and possible for the country.

Parliament members

(-)

Media professionals

NGO activists Businessmen Government

managers

Scientific sector

(+)

(The diagram above shows the information and engagement level found amongst all surveyed sectors.)

Page 20: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0

METODOLOGIA

1. ABORDAGEM CONCEITUAL E CARACTERÍSTICAS DA PESQUISA

A pesquisa mescla aspectos qualitativos e quantitativos. O roteiro, que pode ser conhecido no Anexo I, combina perguntas estruturadas e abertas. A técnica empregada foi a da entrevista em profundidade, adequada aos estudos de percepção.

Foram realizadas 210 entrevistas presenciais com um conjunto de pessoas previamente classificadas como influentes. O conceito de influência adotado baseia-se na premissa de que determinadas pessoas são formadoras de opinião, influenciando opiniões e comportamentos no âmbito de sua comunidade, de sua empresa ou organização, ou ainda em relação à opinião pública.

Em geral, as características de um formador de opinião estão relacionadas a fatores como informação, poder e prestígio e são determinadas pela posição ou função que ele detém na escala social ou profissional. Em muitos casos, o formador de opinião alcança esse status a partir de características pessoais, tais como carisma e capacidade de liderar comprovada.

No caso desta pesquisa, as pessoas selecionadas para compor a amostra são elas mesmas influentes (líderes reconhecidos em sua área de atuação) e/ou ocupam posições de destaque em organizações consideradas estratégicas para os temas pesquisados.

A escolha dos nomes partiu de um conjunto inicial de pessoas identificadas em cada setor e foi acrescida de indicações solicitadas aos entrevistados.

Buscou-se, portanto, entrevistar homens e mulheres que ocupam lugar de destaque nas empresas, nas organizações e postos de agências governamentais, assim como acadêmicos e profissionais de mídia com trajetórias consolidadas.

Na pré-seleção dos nomes, procurou-se não incluir pessoas que são líderes no campo da sustentabilidade ou que atuam na esfera de influência dos ambientalistas com posições já firmadas no tema das mudanças climáticas. Este procedimento teve como finalidade evitar um viés.

A pesquisa é de abrangência nacional, uma vez que entrevistou pessoas em todas as regiões brasileiras. As entrevistas duraram em média 50 minutos e foram gravadas, transcritas e editadas para fins de análise de seu conteúdo.

Page 21: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1

2. CONTEÚDO

O conteúdo geral versou sobre o conhecimento dos entrevistados sobre mudanças climáticas, seu posicionamento diante da gravidade da questão e as relações da problemática com as questões do desenvolvimento e da governabilidade global.

O roteiro contemplou os seguintes tópicos de interesse:

Os tópicos explorados pela pesquisa foram os seguintes:

• Principais desafios do Brasil e da humanidade nos próximos 20 anos; • Principais desafios ambientais do Brasil e do mundo nos próximos 20 anos ; • Grau de preocupação e opinião sobre a gravidade ao problema das mudanças climáticas; • Conhecimento da questão e das causas e efeitos envolvidos; • Impacto das mudanças climáticas na economia e nas perspectivas de desenvolvimento

socioeconômico; • Impacto das mudanças climáticas no setor de atuação do entrevistado; • Responsabilidades do Brasil perante o mundo; • Contribuição dos setores e atores para a redução de emissões; • Importância das energias renováveis e discussão sobre a matriz energética; • Atores-chave e o papel dos indivíduos na promoção da consciência e da mitigação; • Conhecimento de ações e programas nacionais e internacionais de mitigação/adaptação; • Conhecimento do tratamento da temática no âmbito internacional.

Page 22: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2

3. UNIVERSO DA PESQUISA E AMOSTRAGEM

Sete segmentos foram definidos como universo da pesquisa: organizações governamentais, organizações não-governamentais, parlamento (Câmara, Senado e Assembléias Legislativas), empresários, sociedade civil, imprensa e academia/cientistas. A seleção dos entrevistados levou em conta, além do critério do segmento, cinco recortes: economia; agricultura; energia; desenvolvimento socioeconômico e uso da terra. Preferencialmente, cada entrevistado deveria falar sobre um desses campos.

Ao todo foram realizadas 210 entrevistas, conforme mostra o quadro a seguir, discriminando os setores e áreas de interesse:

Número de entrevistas realizadas por segmento e área de interesse

Área de interesse Setor Economi

a Agricultur

a Energia

Des.

Socioec. Uso da terra

Total de entrevistas

Governamental 6 6 6 6 6 30 ONGs 6 6 6 6 6 30

Empresarial 6 6 6 6 6 30 Sociedade civil 6 6 6 6 6 30

Mídia 6 6 6 6 6 30 Científico/acadêmi 6 6 6 6 6 30

Parlamentar 6 6 6 6 6 30 TOTAL GERAL 42 42 42 42 42 210

4. PERFIL DA AMOSTRA SEGUNDO O POTENCIAL DE INFLUÊNCIA

O perfil da amostra tem a seguinte conformação: homens e mulheres com alta escolaridade, residentes nas principais capitais do país, consideradas formadoras de opinião. São em geral profissionais e empresários que estão no topo de sua carreira, cujas opiniões e ações fazem diferença em seu Estado e em seu setor de atuação ou âmbito temático. Ao todo foram entrevistadas 210 pessoas em 11 Estados brasileiros, entre os meses de janeiro e maio. A lista completa de entrevistados consta do Anexo II.

4.1. QUEM É MAIS INFLUENTE?

Com o objetivo de se determinar o potencial de influência, a todos os entrevistados foi atribuído “nível de influência 1” (pois o foco da pesquisa são os formadores de opinião). Após a realização das entrevistas, a amostra foi redistribuída, incluindo mais duas categorias: “nível de influência 2” e “nível de influência 3”.

Page 23: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3

Os dois gradientes adicionados visaram categorizar os entrevistados segundo seu potencial para exercer influência efetiva e ampliar a preocupação com as mudanças climáticas, bem como gerar ações pertinentes.

Estar no “nível 1 de influência” significa ser apenas influente. Determinou a redistribuição para o “nível 2 de influência” a combinação entre o entrevistado se declarar muito motivado a compreender mais o fenômeno das mudanças climáticas e atribuir muita importância ao tema. Estar no “nível 2 de influência” significa ser muito influente para os objetivos de disseminação e ampliação do conhecimento sobre mudança climática.

Determinou a redistribuição para o “nível de influência 3” uma combinação entre o entrevistado se declarar muito motivado a compreender o tema, atribuir muita importância ao tema e ainda demonstrar conhecimento relevante sobre as questões relativas ao fenômeno, bem como sobre sua interface com o seu setor de atuação. Estar no “nível 3 de influência” significa ser altamente influente para os objetivos de disseminação e ação.

Permaneceram com “nível de influência 1” aqueles que, além de demonstrar informação insuficiente, se mostraram menos motivados ou pouco interessados em aprofundar seus conhecimentos.

A distribuição que resultou da adoção desses gradientes está representada no seguinte quadro:

Distribuição dos entrevistados por influência

Influência N % 1 7 3,3 2 164 78,1 3 39 18,6

Total 210 100

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

4.2. QUEM TEM MAIS PODER?

O nível de poder foi estabelecido de acordo com a relevância da instituição, o cargo que os entrevistados ocupam e o poder que exercem ou podem exercer nos processos decisórios de suas organizações.

O primeiro nível de poder – “nível 1” é atribuído pela posição estratégica da organização e/ou instituição a que o entrevistado pertence. (Um ministério é uma agência estratégica; já a gradação de um canal de televisão dependerá de sua posição no ranking dos canais televisivos e de seu público.)

O “nível de poder 2” é atribuído pelo cargo que o entrevistado ocupa. Se ele é um presidente de empresa, isso é mais estratégico do que, por exemplo, um cargo médio ou de segundo escalão. Um repórter que cumpre uma pauta é menos importante que um editor-chefe.

O nível de poder 3 é atribuído aos entrevistados que têm o poder de decidir sobre mudanças ou sobre a adoção de focos específicos em suas empresas, organizações, políticas, pesquisas, fatos jornalísticos etc.

Page 24: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4

Distribuição dos entrevistados por poder

Poder N % 1 10 4,8 2 106 50,5 3 94 44,8

Total 210 100 (Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

4.3. INFLUÊNCIA POTENCIAL DOS ENTREVISTADOS

O real potencial de influência de cada entrevistado resulta, portanto, do cruzamento de seu nível de influência com seu nível de poder. O potencial de influência, para efeito de classificação, está subdividido em três categorias, como segue:

Têm baixo potencial de influência aqueles entrevistados que combinam o fato de estarem em organizações e/ou instituições que foram classificadas no “nível 1 de poder” e que ocupam cargos de segundo ou terceiro escalão, e que ainda não têm poder de decisão, além de não se mostrarem motivados.

Têm médio potencial de influência os entrevistados que, apesar de se mostrarem motivados, não estão em organizações estratégicas, não têm poder ou não participam dos processos decisórios; e, inversamente, os que têm poder de fato, ocupam cargos importantes em instituições relevantes, mas não atribuem importância ao tema e tampouco estão interessados em aprender mais.

Têm alto potencial de influência os indivíduos que são motivados, estão em uma organização/instituição estratégica, ocupam cargos de mando e têm poder de decisão para alterar processos e influenciar o setor.

Os quadros abaixo simulam o exercício e nos dão o resultado final:

Critérios para classificação da influência potencial

Influência Poder

Influência nível 1 com poder nível 1

baixa baixo

Influência nível 1 com poder nível 2

baixa baixo

Influência nível 2 com poder nível 1

média baixa

Influência nível 2com poder nível 2

média média

Influência nível 2 com poder nível 3

média alta

Influência nível 3 com poder nível 2

alta média

Influência nível 3 com poder nível 3

alta alta

Page 25: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5

Cruzamento poder x influência Poder

Influência 1 2 3 1 0 7 0 2 10 90 64 3 0 9 30

Distribuição de entrevistados por influência potencial

Influência potencial N % 1- baixa 17 8,0

2 - média 163 78,0 3 - alta 30 14,0 Total 210 100

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Como se pode verificar, nossa amostra é composta de uma maioria de lideranças que têm um médio potencial de influência: 163 entrevistados estão classificados nesta categoria, ou seja, 78% da amostra. Mas também temos um significativo conjunto de alta influência, 30 entrevistados, compondo 14% da amostra. Uma minoria, apenas 17 entrevistados, ou 8% da amostra apresentam um perfil de baixa influência.

Distribuição dos entrevistados por poder, influência e influência potencial

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Poder Influência Influência potencial

123

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 26: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6

5. PERFIL DETALHADO DA AMOSTRA

5.1. ABRANGÊNCIA GEOGRÁFICA DO ESTUDO

Como ja era previsível (sobretudo por ser Brasília a cidade onde se concentram os parlamentares e executivos do governo, bem como as principais associações empresariais), as entrevistas se concentraram nas regiões Sudeste (46%) e Centro-Oeste (29%), como mostra o gráfico abaixo:

Entrevistas por região

60

18 17 18

97

0

20

40

60

80

100

120

CO N NE S SE

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Os Estados com maior ocorrência de entrevistas foram Distrito Federal (27%), São Paulo (27%) e Rio de Janeiro (14%):

Page 27: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7

Entrevistas por Estado

DF30%

AM3%

PA5%

CE1%

PE7%PR

1%RS2%

SC5%

MG5%

RJ14%

SP27%

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Mais da metade dos entrevistados é natural da região Sudeste: 26% de São Paulo, 13% do Rio de Janeiro e 10% de Minas Gerais. Outros 17% são naturais da região Sul e 15% da região Nordeste. A amostra ainda contou com 8% de entrevistados estrangeiros residentes no Brasil.

Entrevistados por naturalidade

54

28

2117 17 16

10 97

4 4 4 3 3 2 2 2 2 1 1 1 1 10

10

20

30

40

50

60

SP RJMG PE

Outros p

aíses RS SC PR PA AM BA ES CE PB DF GO MS MT AC AL MA PI

SE

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 28: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8

5.2. SEXO E IDADE

Os entrevistados foram, em sua grande maioria, homens (84%), como mostra a figura abaixo. Essa disparidade de gênero é explicada pelos critérios da seleção e pela intencionalidade da amostra, que privilegiou altos cargos e ocupantes de posições estratégicas.

Entrevistados por sexo

Masculino84%

Feminino16%

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

A maioria dos entrevistados (70%) têm entre 40 e 59 anos. Essa parece ser a faixa na qual os indivíduos alcançam maior poder e influência (critérios da amostra). A faixa entre 50 e 59 anos é a mais representada: 42% da amostra. Outros 28% dos entrevistados têm entre 40 e 49 anos, e apenas 10% se incluem na faixa entre 27 e 39 anos, como se vê no gráfico a seguir:

Entrevistados por faixa etária

21

58

89

34

8

0102030405060708090

100

27 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 59 anos 60 a 69 anos 70 anos emais

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 29: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9

5.3. ESCOLARIDADE

O nível de escolaridade dos entrevistados é bastante alto, o que era esperado. A maioria (54%) tem o ensino superior completo. Outra grande parte (43%), quase metade, é pós-graduada: tem mestrado (17%), doutorado (18%) ou ainda pós-doutorado (8%), como mostra a figura abaixo.

Entrevistados por escolaridade

Ensino Superior Completo

54%

Mestrado17% Doutorado

18%

Pós-doutorado8%

Ensino Médio Incompleto /Ensino

Médio Completo2%

Ensino Superior Incompleto

1%

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 30: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 0

RESULTADOS DA PESQUISA

Page 31: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 1

LEITURA DOS DADOS RESULTANTES DAS QUESTÕES ESTRUTURADAS

INTRODUÇÃO

O roteiro aplicado nas entrevistas contemplou nove questões estruturadas.

Os tópicos seguintes fornecem os resultados obtidos nas tabulações acrescidos dos comentários pertinentes.

MAIORIA CONCORDA COM A VISÃO CIENTÍFICA DE QUE O IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SERÁ GRANDE E AFETARÁ TODO O MUNDO

Como podemos ver na tabela e no gráfico abaixo, 52,9% dos entrevistados concordam fortemente com a proposição científica de que as mudanças climáticas afetarão todas as sociedades humanas. Se somarmos os que concordam fortemente com aqueles que apenas “concordam”, temos a maioria absoluta de 94% dos entrevistados com essa convicção contra uma minoria de 1% que discordam e 3, 8% que afirmam não possuir informação suficiente para ter uma opinião. Assim, 199 entrevistados contra 11 acreditam na gravidade do fenômeno das mudanças climáticas.

Cientistas sustentam que o fenômeno das mudanças climáticas causará grande impacto na vida de todas as sociedades humanas. O(A) senhor(a) concorda com essa visão?

N % Concorda fortemente 111 52,9

Concorda 88 41,9 Discorda 3 1,4

Não tem informação 8 3,8 Total 210 100,0

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 32: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 2

Cientistas sustentam que o fenômeno das mudanças climáticas causará grande impacto na vida de todas as sociedades humanas. O(A) senhor(a) concorda com essa visão?

111

88

38

0

20

40

60

80

100

120

Concorda fortemente Concorda Discorda Não tem informaçãosuficiente

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

MAIORIA CONSIDERA QUE AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS CONSTITUEM PROBLEMÁTICA MUITO IMPORTANTE PARA SEU SETOR OU ÁREA DE ATUAÇÃO

Apenas uma minoria, 9 entrevistados em 210, constituindo 4% da amostra, afirmou que as mudanças climáticas não têm importância para o seu setor ou área de atuação. A maioria dos entrevistados declarou ser muito importante (77,5%) ou importante (18,2%). A ênfase no “muito importante”, entre três opções, revela a preocupação das lideranças e sua visão de que o fenômeno terá impacto em sua atividade ou área de atuação.

Essa problemática é, para o seu setor ou área de atuação:

N % Muito importante 162 77,5

Importante 38 18,2 Pouco importante 9 4,3

Total 209 100,0 Não opinou 1

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 33: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 3

Essa problemática é, para o seu setor ou área de atuação:

162

38

91

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Muito importante Importante Pouco importante Não opinou

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Observamos que, ao distribuir os entrevistados por setor, mantém-se a tendência da maioria dos setores de atribuir alta importância ao tema: o menor número de respostas “muito importante” está no setor parlamentar, com apenas 17 menções, e os maiores estão nas ONGs e empresas, com 27 e 25 menções, respectivamente.

Importância do tema para o setor de atuação, por setor

Setor Importância Científic

o Congress

o Empresa

Governo Mídia ONGs Socieda

de Civil

Muito importante

27

17

25

20 22 27 24

Importante

3

11

3

9 6 2 4

Pouco importante

2

2

1 1 1 2

Total

30

30

30

30 29 30 30

Não opinou

1

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 34: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 4

Importância do tema para o setor de atuação, por setor

0

5

10

15

20

25

30

Científ ico Congresso Empresa Governo Mídia ONG SociedadeCivil

Muito importante

Importante

Pouco importante

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

LIDERANÇAS CONSIDERAM QUE AINDA CONHECEM POUCO O TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Indagados sobre como consideravam seu conhecimento sobre as mudanças climáticas, a maioria (43%) disse estar explorando ou conhecer pouco. Uma terça parte (32,5%) disse ter um conhecimento bom, mas incompleto, e apenas 25%, um quarto da amostra, alegou ter um conhecimento abrangente. A resposta predominante leva à conclusão de que é necessário e oportuno empreender ações de comunicação que visem melhorar esse conhecimento entre as nossas lideranças.

Quando elencaram as fontes de informação mais utilizadas (apenas uma minoria o fez), seminários, palestras, simpósios e debates foram citados como principais fontes. A segunda fonte de informação mais citada foi a televisão. Em 210 entrevistas, o livro Uma verdade inconveniente, de Al Gore, foi mencionado por 10 entrevistados.

Outras menções menos freqüentes foram feitas às seguintes obras: Os senhores do clima, de Tim Flannery; Colapso, de Jared Diamond; Eco-economy, de Lester Brown; Cool it, de Bjørn Lomborg; Climate change, de Robert Henson, Um sopro de destruição, de José Augusto Pádua; e A Terra gasta: a questão do meio ambiente, de Luis Paulo de Menezes. Alguns entrevistados indicaram as obras completas de autores como James Lovelock e José Marenga. Outros se referiram a publicações editadas pela Embrapa e revistas científicas internacionais.

Page 35: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 5

Você considera que o seu conhecimento sobre as mudanças climáticas é

N %

Bastante abrangente 52 24,9

Bom, mas incompleto 68 32,5

Está explorando e 78 37,3

Conhece pouco 11 5,3

Total 209 100,0

Não opinou 1 (Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Você considera que o seu conhecimento sobre as mudanças climáticas é:

52

6878

111

0102030405060708090

Bastanteabrangente

Bom, masincompleto

Estáexplorando eaprendendo

mais

Conhecepouco

Não opinou

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/20080)

Quando distribuímos os resultados por setor, novamente chama a atenção o fato de que apenas um dos parlamentares declarou ter conhecimento abrangente. É também neste setor que temos o maior número dos que se auto-classificaram como “exploradores”. Se somarmos o conhecimento bastante abrangente com o bom, mas incompleto, temos que o setor que se apresentou mais consistente é o científico, seguido do empresariado e do governo.

Page 36: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 6

Nível de conhecimento por setor

Setor

Nível de conheciment

Científico

Congresso

Empresa Governo

Mídia ONG Sociedade Civil

Bastante abrangente

10

1

8 9 6 10 8

Bom, mas incompleto

12

9

13 9 8 6 11

Está explorando

8

18

9 8 14 12 9

Conhece pouco

1

4 2 2 2

Não informou

1

Total

30

30

30 30 30 30 30

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Nível de conhecimento por setor

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

Científic

o

Congress

o

Empresa

Govern

oMídia

ONG

Socieda

de C

ivil

Bastante abrangenteBom, mas incompletoEstá explorandoConhece pouco

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 37: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 7

Fontes de informação:

Menções N

Seminários/ Simpósios/ Comunicações/ Convenções/

Encontros/ Debates

16

TV 6 Relatórios do IPCC 3

Sites 2 Revistas especializadas 2

Radio 1 Filmes 1

The Economist 1 Telejornal/noticias em geral 1

Documentos de bancos 1 Materiais de entidades parceiras 1

Artigos acadêmicos 1 Newsletter online 1 Todas as opções 3

Outros 2 Total 42

Não se aplica 168 (Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 38: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 8

MAIORIA SE CONSIDERA ALTAMENTE MOTIVADA A APRENDER MAIS SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Convidados a se posicionar diante de três opções, com relação à motivação, a maioria dos entrevistados se auto-classificou como “altamente motivada a aprender mais” (72,6%). Um quarto da amostra, no entanto, afirma ter interesse mas estar investindo em temas mais importantes no momento (25,0%). Somente um entrevistado afirmou não ter interesse no assunto e dois não quiseram opinar nessa questão, o que nos leva apreender da recusa a falta de interessa.

Em que posição o(a) senhor(a) se veria nas quatro que vou citar?

N %

Altamente motivada

151 72,6

Interessada, mas há outros temas mais importantes

52 25,0

Somente interessada, sem intenção de aprofundar

4 1,9

Desinteressada

1 0,5

Total

208 100,0

Não opinou

2

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Nível de motivação para aprender sobre as mudanças climáticas

151

52

4 1 20

20

40

60

80

100

120

140

160

Altamentemotivada

Interessada, mashá outros temasmais importantes

Somenteinteressada, sem

intenção deaprofundar

Desinteressada Não opinou

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 39: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

3 9

Distribuída a amostra por setor, vemos que há alta motivação por parte de todos os setores de compreender melhor o tema das mudanças climáticas, com menor destaque para o Congresso e maior destaque para o setor científico e as empresas.

Motivação por setor

Setor Motivação

Científico

Congress

o Empresa

Governo

Mídia

ONG

Sociedad

e Civil

Altamente motivada

26

18

25 21 18 20 23

Interessada, mas há outros temas mais importantes

4

11

5

8

9

8

7

Somente interessada

1

2

1

Desinteressada

1

Não opinou 1 1

Total

30

30

30 30 30 30 30

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Nível de motivação por setor

Page 40: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 0

0

5

10

15

20

25

30

Científic

o

Congress

o

Empresa

Govern

oMídia

ONG

Socieda

de C

ivil

Altamente motivada

Interessada, mas há outros temasmais importantesSomente interessada, semintenção de aprofundarDesinteressada

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

LÍDERES APONTAM QUE O MAIOR DESAFIO A SER ENFRENTADO NOS PRÓXIMOS 20 ANOS, TANTO PELA HUMANIDADE COMO PELO BRASIL, ESTÁ NO ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES AMBIENTAIS, COM DESTAQUE PARA AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Perguntados sobre “o maior desafio” a ser enfrentado pela humanidade estimando um período próximo de 20 anos, os entrevistados discorreram livremente, pois tratava-se de uma pergunta aberta.

Agrupadas as respostas por campo temático, verificou-se que a maioria das questões citadas pertence à esfera ambiental (55%). 25% dos problemas citados são da esfera socioeconômica e 18% foram classificados como culturais. Entre os problemas ambientais mais destacados, o mais mencionado foi o fenômeno das mudanças climáticas.

Page 41: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 1

Qual o maior desafio da humanidade? (respostas múltiplas – até 3 respostas)

Campo temático N

Ambiental*

159

Socioeconômico**

72

Cultural***

53

Outros

6

Total

289

Não opinou

1

* Campo ambiental: mudanças climáticas/aquecimento global, sustentabilidade, desenvolvimento sustentável com inclusão social, desenvolvimento econômico, social e ambiental equilibrado, questões ambientais, destruição ambiental, preservação ambiental, água, saneamento básico, energia, mudar/reduzir o padrão de consumo e produção, compatibilizar desenvolvimento e conservação, equilibrar crescimento e recursos naturais, reduzir a emissão de gases, lidar com os limites do planeta, manter o planeta vivo, cuidar melhor do planeta, biodiversidade, conservar a floresta Amazônica. ** Campo socioeconômico: desigualdade social, distribuição e geração de renda, problemas sociais, pobreza, fome, produção de alimentos, aumento da eficiência agrícola, combate às doenças, epidemia, saúde, mudar o modelo econômico-tecnológico, reverter o modelo de desenvolvimento, desequilíbrio do modelo de desenvolvimento, inclusão social, transformação do Brasil em país desenvolvido. *** Campo cultural: corrupção, educação, consciência, sobrevivência humana, mitigação e adaptação, mudança do modo de vida, valores, hábitos, comportamento, religião, fanatismo, misticismo religioso, terrorismo, violência, solidariedade e diálogo, construção de um mundo de paz, migração, diferenças étnicas.

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 42: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 2

Qual o maior desafio da humanidade?

Âmbito Ambiental*

55%Âmbito Sócio-Econômico*

25%

Âmbito Cultural*

18%

Outros2%

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Qual o maior desafio da humanidade? (Seleção de problemas a partir de 10 citações.)

Desafio N

Mudanças climáticas/aquecimento global

36

Questões ambientais/destruição ambiental/preservação ambiental

24

Sustentabilidade/Desenvolvimento sustentável com inclusão social/Desenvolvimento ambiental e

socioeconômico equilibrado

23

Desigualdade social/Distribuição e geração de renda/Problemas sociais

23

Água (carência de água potável)

22

Pobreza/fome/combate às doenças/epidemia/saúde

19

Energia

17

Alimentos/produção de alimentos/aumento da eficiência agrícola

14

Outros/corrupção

12

Modificar modelo econômico-tecnológico/Mudança do modelo/Reverter modelo de

desenvolvimento/Desequilíbrio do modelo de desenvolvimento

10

Page 43: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 3

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Os 10 mais citados dentre os maiores desafios da humanidade:

36

24 23 23 2219

1714

1210

0

5

10

15

20

25

30

35

40M

udan

ças

clim

átic

as/a

quec

imen

togl

obal

Que

stõe

s am

bien

tais

Sus

tent

abili

dade

Pro

blem

as s

ocia

is

Água

(car

ênci

a de

águ

apo

táve

l) Pobr

eza

Ene

rgia

Alim

ento

s

Out

ros

Mod

ifica

r mod

elo

econ

ômic

o-te

cnol

ógic

oe

de d

esen

volv

imen

to

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

No caso do desafio do Brasil, os entrevistados aumentam o percentual de desafios que estão no âmbito socioeconômico (44,2%) e diminuem a relevância dos problemas ambientais em comparação com a dimensão “humanidade”. Mas ainda assim, 60,8% das respostas agrupadas apontam problemas ambientais como o maior desafio do Brasil nos próximos 20 anos.

Os problemas socioeconômicos mais destacados foram: desigualdade, má distribuição de renda, e problemas sociais como pobreza e fome.

Qual o maior desafio do Brasil? (respostas múltiplas agrupadas)

Campo temático N

Ambiental*

121

Socioeconômico**

88

Cultural***

62

Total

271

Não opinou

11

* Campo ambiental: mudanças climáticas/aquecimento global, sustentabilidade, desenvolvimento sustentável com inclusão social, desenvolvimento econômico, social e ambiental equilibrado, conservar a

Page 44: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 4

floresta Amazônica, queimadas e desmatamento da Amazônia, questões ambientais, destruição ambiental, preservação ambiental, energia, água, preservar recursos naturais, reduzir emissão de gases, mudança de padrão de consumo e produção, compatibilizar desenvolvimento com conservação, equilíbrio crescimento x recursos naturais, sobrevivência humana, mitigação e adaptação, reduzir crescimento populacional, biodiversidade, lidar com limites do planeta, manter o planeta vivo, cuidar melhor do planeta, saneamento básico ** Campo socioeconômico: desigualdade social, distribuição e geração de renda, problemas sociais, pobreza, fome, alimentos, produção de alimentos, aumento da eficiência agrícola, combate às doenças, epidemia, saúde, modificar modelo econômico-tecnológico, reverter modelo de desenvolvimento, desequilíbrio do modelo de desenvolvimento, inclusão social, desemprego, gerar emprego, transformação do Brasil em país desenvolvido *** Campo cultural: corrupção, educação, consciência, questão política, amadurecimento das instituições políticas, moralização política, falta de controle, monitoramento, gestão, mudança do modo de vida, comportamento, sobrevivência humana, mudança do modo de vida, valores, hábitos, religião, fanatismo, misticismo religioso, terrorismo, violência, infra-estrutura, impunidade, domar capitalismo selvagem, sociedade democrática, compreensão da visão histórica do mundo, solidariedade e diálogo, construção de um mundo de paz, migração, diferenças étnicas.

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Qual o maior desafio do Brasil?

Âmbito Ambiental

45%

Âmbito Sócio-Econômico

32%

Âmbito Cultural

23%

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 45: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 5

Os mais citados dentre os maiores desafios do Brasil (a partir de 10 citações)

Desafio N

Desigualdade social/Distribuição e geração de renda/Problemas sociais

42

Educação/Consciência/Educação ambiental 28

Sustentabilidade/Desenvolvimento sustentável com inclusão social/Desenvolvimento ambiental e socioeconômico equilibrado

22

Conservar a floresta amazônica/queimadas e desmatamento da Amazônia

20

Pobreza/fome 18

Questões ambientais/destruição ambiental/preservação ambiental

16

Mudanças climáticas/aquecimento global 12

Energia 10

Água 10

Outros (domar capitalismo selvagem/sociedade democrática/compreensão da visão histórica do mundo)

10

Brasil: transformação em país desenvolvido/crescimento econômico/Importância do país na apresentação de soluções

10

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Os mais citados dentre os maiores desafios do Brasil (a partir de 10 citações):

42

28

2220

18 1612

10 10 10 10

05

1015202530354045

Problemas

socia

is

Educaçã

o ambienta

l

Sustenta

bilidade

Conse

rvar a

floresta

amazônic

a

Pobreza

/fome

Questões

ambien

tais

Mudança

s clim

áticas

Energia

Água (c

arência de águ

a potáve

l)

domar c

apitalis

mo selva

gem

Brasil: pa

ssar a

ser p

aís des

envolvid

o

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 46: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 6

LIDERANÇAS APONTARAM ÁGUA COMO O PRINCIPAL DESAFIO AMBIENTAL E MUDANÇAS CLIMÁTICAS EM SEGUNDO LUGAR

Em uma pergunta que permitia que cada entrevistado citasse até três problemas, o problema dos recursos hídricos foi o mais destacado, com 33 menções. As mudanças climáticas vieram em seguida, com 30 menções, como mostra o quadro abaixo. As demais citações estão pulverizadas numa série de outros problemas envolvendo a Amazônia e a questão das energias, alcançando respectivamente, 23 e 17 menções.

Os mais citados dentre os maiores desafios ambientais (a partir de 7 citações)

Água/Água potável/Rios poluídos/Recursos hídricos

33

Mudanças climáticas/Aquecimento global

30

Amazônia/Preservação da Amazônia/Desmatamento

23

Fontes alternativas de energia/Energia

17

Redução da emissão de gases/cotas de diminuição do dióxido de carbono

13

Compatibilizar desenvolvimento com conservação/conservação e distribuição de riquezas

7

Desenvolvimento sustentável/Melhoria econômica e social com desenvolvimento sustentável

7

Agricultura sustentável/Sustentabilidade do sistema produtivo

7

Mudança do padrão de consumo/Mudança de estilo de vida

7

Problemas ambientais/Reverter quadro ambiental/Degradação ambiental

7

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 47: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 7

Os mais citados dentre os maiores desafios ambientais (a partir de 7 citações)

33

30

23

17

13

7 7 7 7 7

0

5

10

15

20

25

30

35

Rec

urso

s hí

dric

os

Mud

ança

scl

imát

icas

/Aqu

ecim

ento

glob

al Amaz

ônia

Ener

gia

Red

ução

da

emis

são

dega

ses

Com

patib

ilizar

dese

nvol

vim

ento

com

cons

erva

ção

Des

envo

lvim

ento

sus

tent

ável

Agric

ultu

rasu

sten

táve

l/Sus

tent

abilid

ade

do s

iste

ma

prod

utiv

o

Mud

ança

do

padr

ão d

eco

nsum

o/M

udan

ça d

e es

tilode

vid

a

Prob

lem

asam

bien

tais

/Rev

erte

r qua

dro

ambi

enta

l/Deg

rada

ção

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Se fizermos uma seleção de todas as questões relacionadas às mudanças climáticas (por exemplo, a preservação da Amazônia, a energia etc.), veremos que a relevância desse tema aumenta significativamente o gráfico a seguir.

Page 48: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 8

Freqüência de menções a assuntos relacionados às mudanças climáticas como maior desafio ambiental

3

7

7

12

17

23

30

0 5 10 15 20 25 30 35

desarborização do mundo, recomposiçãoda cobertura vegetal, biodiversidade

mudança no padrão de consumo,mudanças do estilo de vida

agricultura sustentável, sustentabilidade dosistema produtivo

redução da emissão de gases, cotas dediminuição do dióxido de carbono

fontes alternativas de energia/energia

Amazônia, preservação da Amazônia,desmatamento

mudanças climáticas, aquecimento global

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 49: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

4 9

PARA LÍDERES, TRANSPORTE, DESMATAMENTO E ATIVIDADES DO AGRONEGÓCIO SÃO OS PROCESSOS QUE MAIS EMITEM GASES DO EFEITO ESTUFA

Convidados a citar as três atividades que mais emitem gases que afetam a mudança do clima, os entrevistados destacaram, em primeiro lugar, o desmatamento. Em segundo lugar, empatados, o transporte e a agricultura/agronegócio. Mas, se considerarmos a freqüência de citações (isto é, a soma de citações em primeiro, segundo e terceiro lugar), temos que o transporte é a principal preocupação entre as verificadas na totalidade da amostra: 76 citações, contra 71 citações sobre o desmatamento. Se considerarmos ainda que agricultura e agronegócio podem ser somados, temos, em terceiro lugar, 56 citações atribuídas a estas atividades.

A seguir mostramos um quadro com os dados coletados e um gráfico representando as atividades mais citadas em primeiro (1 - azul), segundo (2 – magenta) e terceiro (3 – amarelo) lugar.

Atividades econômicas no Brasil que mais contribuem com emissões, por ordem de importância

Atividades

Citado em primeiro lugar

Citado em segundo lugar

Citado em terceiro lugar

Desmatamento 48 17 6 Transporte 18 33 25 Agricultura 18 13 9

Agronegócio 13 2 1 Queimadas 12 11 4

Agropecuária 12 8 5 Indústria 11 21 20

Não respondeu 11 20 37 Pecuária 10 9 5

Queima de combustíveis 8 5 8 Indústria Madeireira 7 10 1

Matriz Energética 6 5 22 Indústria Automobilística 6 4 5

Indústria Siderúrgica 4 6 4 Indústria Petroquímica 3 2 4

Indústria Química 3 2 0 Exploração mineral 2 7 3

Outros 2 6 4 (Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 50: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 0

Atividades econômicas no Brasil que mais contribuem em emissões, por ordem de importância

0

10

20

30

40

50

60

Desmata

mento

Transp

orte

Agricu

ltura

Agrone

gócio

Queim

adas

Agrope

cuár

ia

Indús

tria

Não re

spon

deu

Pecuá

ria

Queim

a de c

ombu

stíve

is

Indús

tria M

adeir

eira

Matriz

Energé

tica

Indús

tria Auto

mobilís

tica

Indús

tria S

iderúr

gica

Indús

tria P

etroq

uímica

Indús

tria Q

uímica

Minerad

ora

123

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Para melhor entender o quadro e o gráfico acima, devemos no entanto considerar o total de menções por setor. Neste caso, verificamos que o setor industrial recebe 151 menções (considerando o primeiro, o segundo e o terceiro lugares); o desmatamento empata com o agronegócio em segundo lugar, com 111 menções cada um, enquanto o transporte cai para o terceiro lugar, com 76 menções.

Page 51: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 1

A ATIVIDADE INDUSTRIAL É RECONHECIDA COMO GRANDE EMISSORA DE GASES DO EFEITO ESTUFA, COM DESTAQUE PARA AS MADEIREIRAS E PETROLÍFERAS

Agrupando todas as citações sobre a indústria, temos 151 menções. Quando o setor aparece especificado, vemos que os principais destaques são dados às indústrias madeireira, petrolífera, siderúrgica e automotiva.

Que indústrias no Brasil têm mais impacto, por ordem de importância, sobre o fenômeno do agravamento das mudanças climáticas?

Tipo de indústria N não específica 52

madeireira 22 petrolífera 18

siderúrgica/metalúrgica 17 automotiva 14 mineradora 13

construção civil 7 química 5

transformação 3 Total 151

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Atividades industriais que emitem mais gases de efeito estufa

52

2218 17 14 13

7 5 30

10

20

30

40

50

60

não e

spec

ífica

madeir

eira

petro

lífera

siderú

gica/m

etalúr

gica

autom

otiva

minerad

ora

cons

truçã

o civil

quim

íca

trans

formaç

ão

(Fonte: Trabalho de campo janeiro-maio/2008)

Page 52: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 2

A N Á L I S E S S E T O R I A I S

INTRODUÇÃO

Esta parte do relatório apresenta a análise das entrevistas por setor – mídia, parlamento (Câmara, Senado e Assembléias Legislativas), ONG/sociedade civil, empresarial, científico e governamental. Nota-se que as entrevistas de representantes de ONGs e entidades da sociedade civil, nessa análise, foram agrupadas, pois não apresentam posicionamentos distintos e, juntas, representam as opiniões e os posicionamentos do chamado terceiro setor.

As análises setoriais estão organizadas em quatro partes: a primeira apresenta um resumo dos principais pontos levantados na amostra; a segunda tece comentários sobre as 18 questões principais listadas abaixo, ilustrando-as com trechos das entrevistas; a terceira sintetiza as conclusões de cada setor; e a quarta traça o perfil dos entrevistados de cada setor.

Questões levantadas (tópicos):

1. Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez?

2. Qual o seu nível de conhecimento sobre o tema?

3. Qual o seu nível de motivação para aprender mais sobre a temática do clima?

4. Qual o maior desafio da humanidade para os próximos 20 anos?

5. Qual o maior desafio do Brasil para os próximos 20 anos? Qual o maior desafio ambiental para os próximos 20 anos?

6. Qual o impacto das mudanças climáticas sobre as civilizações atuais?

7. Como avalia a importância do tema das mudanças climáticas para o seu setor?

8. Em que medida as metas de redução das emissões afetarão as suas atividades?

9. Que barreiras identifica para o enfrentamento das mudanças climáticas?

10. Que incentivos identifica para o enfrentamento das questões climáticas;

11. Quais os atores com maior responsabilidade no enfrentamento das mudanças climáticas?

12. Como as mudanças climáticas estão sendo tratadas no âmbito internacional?

13. Qual o seu nível de conhecimento e opinião sobre a proposta de "desmatamento evitado"?

14. Qual o seu nível de conhecimento e opinião sobre a Conferência de Bali?

15. Qual a responsabilidade do Brasil frente às questões climáticas?

16. Qual a importância das ações individuais?

17. Quais as atividades econômicas que mais contribuem para as emissões?

18. Como compatibilizar desenvolvimento e enfrentamento das mudanças climáticas?

Ao final da análise, incluímos uma tabela-resumo dos 18 tópicos abordados nas análises setoriais. O objetivo da tabela é permitir que o leitor compare as principais posições cruzando todos os setores.

Page 53: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 3

MÍDIA

RESUMO

A seleção da amostragem do segmento mídia privilegiou jornalistas e comunicadores da grande imprensa falada, escrita e televisiva. Procurou-se entrevistar profissionais com carreiras consolidadas e com projeção nacional, regional ou local. Foram ouvidos editores e redatores-chefes, colunistas de jornais diários e repórteres dos principais jornais televisivos transmitidos em cadeia nacional.

O setor se apresenta como “generalista”. Frases como: “somos os artesãos da informação”, “a informação chega bruta, complicada, e a gente dá a ela uma forma de notícia, de modo a comunicar melhor”, somos o “ventríloquo da sociedade”, ou ainda “somos o intermediário” entre a informação científica, técnica ou política e o “cidadão comum”. “Somos canais, e não produtores de informação” é a visão que predomina no setor, mostrando que ele encara o seu possível protagonismo apenas como “poder de comunicar”, mas não de produzir informação. Os comunicadores seriam magos da forma, e não do conteúdo em si.

Entretanto, além da profissão que exercem, os entrevistados se declararam, em sua grande maioria, “cidadãos preocupados com o mundo à nossa volta”. Portanto muitas das opiniões não foram “profissionais” (segundo suas próprias palavras), mas de brasileiros que se preocupam com o país e com o mundo.

Em geral, mostraram interesse e um razoável domínio sobre os assuntos em pauta na entrevista, especialmente quando as questões demandavam um conhecimento mais técnico ou complexo.

Reconhecem que as questões ambientais, e em particular o tema das mudanças climáticas, ganharam as manchetes da mídia, e que essa tendência, que começou há pouco mais de 2 anos, deverá perdurar, embora “nunca se saiba”, e citam o evento de 11 de setembro, nos Estados Unidos, quando as torres gêmeas foram destruídas por um comando terrorista. Quando esse tipo de evento acontece, passa-se um tempo capturado por novos dramas: “pode ser o terrorismo, pode ser a morte da Lady Di” ou da “menina Isabella” (referindo-se a fato recente que comoveu o país); a mídia tem um compromisso com o dia-a-dia das pessoas, os dramas, e as expectativas são variados. Mas, como tendência, as “mudanças climáticas vieram para ficar”.

Também chamam atenção para o fato de que novos temas atraem novos talentos e, assim como se formou no país um jornalismo científico e depois especializado em questões ambientais, em breve teremos um jornalismo especializado em mudanças climáticas. Para os entrevistados, é uma questão de tempo e de “institucionalização do tema”.

Acham que o assunto ganhou, na imprensa internacional e na brasileira, cores e tintas dramáticas, por demais catastrofistas. Para eles, a era idílica do meio ambiente, quando dominavam as imagens de natureza esplêndida e selvagem – típicas do Discovery Channel e National Geographic – está acabando para o espectador ou para o cidadão comum. As imagens são agora cada vez mais associadas a desastres, degradação e colapso. Um dos entrevistados lembrou o drama recente vivido pela cidade de Nápoles, “afogada no seu próprio lixo, entrando sem mais nem menos em nossas casas na hora do jantar”.

Para eles, “o catastrofismo rende manchetes” e é mais fácil de comunicar, pois pega o cidadão “pelo estômago, não é aí que reside o cerne das emoções?”, indaga um redator-chefe do maior canal de televisão brasileira. Mas há dúvidas, manifestadas pelos próprios entrevistados, quanto ao resultado positivo desse tipo de conscientização. “O medo pode paralisar”, observa o mesmo autor da pergunta.

Page 54: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 4

Segundo os entrevistados desse setor, os dois maiores desafios da humanidade nos próximos 20 anos serão enfrentar os efeitos das mudanças climáticas e distribuir melhor a renda, diminuindo a pobreza e a desigualdade. São os mesmos desafios do Brasil.

Em termos de desafio ambiental especifico, citaram em primeiro lugar mudanças climáticas, com destaque para a necessidade de preservar a Amazônia. Em segundo, manifestaram forte preocupação com a água e a “proteção da natureza” de um modo geral. O vocábulo “sustentabilidade” foi largamente empregado por todos eles, que dominam o famoso triângulo virtuoso: desenvolvimento econômico equilibrado com o desenvolvimento social e a responsabilidade ambiental.

Metade dos entrevistados discorreu com desenvoltura sobre a necessidade de promover o desenvolvimento sustentável como a única via que pode levar à redução da emissão de gases do efeito estufa, bem como a uma boa qualidade de vida para a humanidade nas décadas futuras.

A totalidade dos entrevistados concorda com a tese de que o impacto das mudanças climáticas nas sociedades humanas será enorme. No entanto, poucos possuem uma visão catastrofista acerca do futuro da humanidade.

Para que o tema das mudanças climáticas possa ser adequadamente percebido e enfrentado por quem decide, o setor considera que o Estado deve se engajar. Enquanto isso não acontece, prevalecerão interesses comerciais e financeiros, além da falta de consciência da população em geral. Em sua opinião, se o Estado se engaja a sociedade se engaja também, e então a mídia faz o seu papel: atuar como uma caixa de ressonância.

Segundo os profissionais ouvidos, o melhor meio de convencer as empresas, o setor privado, é a regulação e a legislação, mas a esfera pública precisa de outras ferramentas. A sociedade em geral precisa de informação qualificada e muita educação ambiental. Aí a mídia pode ajudar: este é um dos principais nichos para que os meios de comunicação possam atuar como “agente dinamizador” dessa conscientização. A maioria considera que o “engajamento individual” é importante, mas não suficiente para alterar padrões coletivos de comportamento.

Parte expressiva dos entrevistados, cerca de dois terços, considera que as questões relacionadas às mudanças climáticas vêm sendo tratadas no âmbito internacional “com muito discurso e pouca ação efetiva”, além de uma parcela de negligência por parte dos maiores emissores, intolerável diante da gravidade do problema. Os Estados Unidos foram muito criticados; a China foi por diversas vezes lembrada como “uma incógnita”, “um país que assusta” por ser um dos maiores emissores e por ter uma matriz de energia suja (a carvão).

Como os maiores emissores também são os que detêm o poder político mundial, o cenário é de incerteza sobre “se teremos tempo”. Tempo, aqui, é entendido como tempo para nos adaptarmos e iniciarmos os programas de mitigação; quase sempre, o “tempo” mencionado pelos entrevistados se refere à capacidade de reverter o fenômeno das mudanças climáticas ou impedir que se agrave ainda mais.

Um terço da amostra está convencida de que a equação do tempo não está resolvida, e que caminhamos para uma situação caótica, na qual será muito mais difícil estabelecer “uma negociação saudável”.

Quando se trata de citar programas concretos, o setor só é capaz de mencionar uns poucos. Refere-se genericamente aos programas de “crédito de carbono” do “MDL” (mecanismo de desenvolvimento limpo), solução que emerge no âmbito do Protocolo de Kyoto.

Page 55: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 5

A proposta do desmatamento evitado é desconhecida pela maioria. Aqueles que ouviram falar demonstram certa descrença em relação à sua possível implementação ou mesmo eficácia, considerando, no entanto, que foi melhor o Brasil ter levado “alguma proposta”.

Os entrevistados consideram que os transportes e o desmatamento/queimadas são as atividades que mais contribuem para as emissões. Indústria, agricultura e pecuária também foram destacadas.

A grande responsabilidade brasileira perante o mundo é “deter o desmatamento e as queimadas”, e não só na Amazônia, dizem nossos entrevistados; em segundo lugar, é importante controlar as emissões por veículos automotores; em terceiro, investir em energias limpas.

Finalmente, perguntados sobre a possibilidade de compatibilizar crescimento e desenvolvimento econômico com políticas de enfrentamento das mudanças climáticas, a maioria declarou ser possível; ademais, não haveria outra escolha para o Brasil, que precisa “tirar milhões da pobreza”.

Embora não existam incompatibilidades, a tarefa não é fácil: a transição a ser efetuada de uma economia baseada em combustíveis fósseis e abundância de recursos para a nova economia, de menos intensiva em energia e emissões, tem primeiro que encontrar uma forma de traduzir o futuro marco regulatório em oportunidades de negócios e permitir que o mercado entre com força nessa questão.

A receita, para eles, é misturar eficiência energética com redução das emissões, desenvolvendo aos poucos uma economia de baixo carbono que não deprima os setores mais competitivos da economia brasileira atual.

Os entrevistados afirmaram que o Brasil, se comparado a outros países, tem capital ambiental e possibilidades de desenvolver essa nova economia e, com isso, exportar um novo paradigma, o que seria uma enorme contribuição. O futuro pode ser complicado, mas não é desesperador.

Page 56: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 6

ANÁLISE DETALHADA

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

A primeira vez

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez?

Antes da Na década de Na década de De 2000 para NS/R TOTAL

5 10 8 2 5 30

Embora houvesse certa imprecisão inicial nas respostas, a maioria afirmou ter entrado em contato com o tema pela primeira vez entre os anos 80 e 90 (18), e outros 5 entrevistados declararam tê-lo feito “antes dessa época”. Para estes últimos, a lembrança se perde em memórias sobre notícias a respeito da “a elevação do mar”, da “poluição urbana” e da poluição provocada pela queima dos combustíveis fósseis, e os gases que provocavam o buraco na camada de ozônio:

“Há muito tempo que se ouve falar da elevação do nível do mar, há muito tempo que se fala sobre a grande poluição provocada pelo carvão, pelas usinas geradoras de energia a carvão. Há muito tempo que se estuda até possíveis danos à saúde das pessoas que possam morar embaixo de linhas de transmissão de energia elétrica. O índice de poluição urbana pelo mau funcionamento dos motores a diesel, a poluição nas margens das estradas, os danos à saúde dos trabalhadores das empresas, como o caso de Cubatão, que no Brasil é um exemplo.” (MÍDIA, A.D., 63, JORNALISTA)

“Algumas publicações da ONU no final dos anos 1970, 80 já falavam nessa questão. Mas não tinham esse foco, falavam dos gases que estavam criando o buraco de ozônio, acho que anterior a isso. Já se falava nessa possibilidade. Eu me lembro, por exemplo, ter de estudado um pouco de História, e sempre se dizia que a Revolução Industrial foi responsável pelo aquecimento da temperatura média do planeta com a queima de combustíveis e etc.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“Eu me lembro claramente da primeira vez em que eu me preocupei com isso aos 17, 18 anos, quando eu fui a uma praia em Pernambuco — se eu não me engano, Marinha Farinha — e vi o mar avançando sobre as casas. (...) Foi a primeira vez em que eu comecei a ver os efeitos da natureza ganhando do ser humano. E de lá para cá eu nunca deixei mais de prestar atenção nisso.” (MÍDIA, L.H.Y., 49, JORNALISTA)

“Foi na revista Super Interessante que minha mãe assinava e na verdade foi quando se começou a falar do efeito estufa, a primeira coisa com esse papo de mudança climática (...). Segunda metade da década de 80. Quando comecei a ouvir falar de AIDS em 86, quando as desgraças todas estavam chegando juntas.” (MÍDIA, P.C., 31, JORNALISTA)

Rio-92 foi divisor de águas

Mas foi a partir da Rio-92, que muitos entrevistados chamam de “Eco-92”, que a maioria tomou conhecimento profissional do tema:

“Do ponto de vista científico, como catástrofe... Não sei, mas como risco, como um perigo, acho que de uns dez anos para cá...” (MÍDIA, L.H.Y., 48, JORNALISTA)

Page 57: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 7

“Eu sei que foi a partir daí que eu tomei uma certa consciência. Foi a partir da ECO 92 que eu comecei a ler sobre o assunto. Então, já faz um bom tempo.” (MÍDIA, A.C., 48, JORNALISTA)

Para uma das entrevistadas, colunista de grande projeção que vem cada vez mais se ocupando de questões ambientais em suas colunas, “a discussão era ainda ingênua na época da Rio-92”:

“Em 92 a discussão era ainda muito mais ingênua. A Rio-92 ainda tinha um discurso para o grande público, leigo como eu, a idéia da preservação. Eu acho que é mais para o fim da década de 90 que fica claro que a coisa tinha evoluído muito mais do que eu imaginava. Portanto, a questão não era como preservar, mas como reduzir esse dano. Essa consciência não havia na época.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

O IPCC fez a diferença

Outros dois jornalistas revelaram que foi com os relatórios periódicos do IPCC que a mídia começou a formar uma opinião a respeito do assunto. É quando ele “deixa de ser papo de ambientalista” para virar coisa séria, de cientista, chefe de Estado, de pessoas “do naipe do Al Gore”:

“Foi quando foi divulgado aquele grande relatório do aquecimento global que eu entrei no assunto: 2001, 2002, o primeiro grande painel, se não me engano, foi quando o assunto estourou na mídia. (...) Quando falavam em efeito estufa, eu só pensava: o planeta está esquentando. Mas com os relatórios eu entendi a complexidade da coisa, o acúmulo dos gases, as fontes de emissão, as conseqüências, e, sobretudo a questão do tempo, da iminência da coisa, isso foi aí pelo ano 2002.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Maioria considera que conhece bem o tema, mas precisa aprender mais

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é:

Bastante abrangente Bom, mas incompleto Está explorando e aprendendo mais

Conhece pouco TOTAL

6 8 14 2 30

Entre os que dizem precisar aprender mais, o argumento é o de que não detêm conhecimento científico ou técnico, não são “estudiosos”:

“Eu não tenho nenhuma pretensão de entender cientificamente esse assunto. (...) Eu sei que a Amazônia está sendo destruída e que a capacidade humana de interromper esse processo não me parece estabelecida... Eu acho que eu tenho um bom nível de conhecimento, eu não tenho técnico. O que significa o aumento [de um centímetro no nível] do mar eu não sei. Eu sei que lá em Atafona as casas estão sendo invadidas, que ilhas desaparecerão, vai haver salinização de lençóis, é isso.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

“Eu me informo lendo na internet, vendo jornais. Mas eu não saio daqui, compro um livro sobre o assunto e vou para casa ler.” (MÍDIA, A.L., 50, JORNALISTA)

Page 58: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 8

“Não sou um estudioso, mas me considero, pela minha vida de jornalista, um homem informado e uma pessoa responsável. Quem não se preocupa hoje com a questão ambiental, seja médico, engenheiro, advogado, agricultor, cientista, é um irresponsável, porque é evidente que aí está o aquecimento global e aí está a China poluidora, a América poluidora e um mundo absolutamente indefeso.” (MÍDIA, A.D., 63, JORNALISTA)

Saber se catástrofe é verdadeira leva a desejo de aprender mais

Embora tenham firmado posição contra o tom catastrofista que estaria imperando no tratamento da questão – como se a própria mídia não contribuísse para isso –, paradoxalmente, em suas declarações, os entrevistados afirmam que buscam fazer mais leituras e obter mais informações para saber se “a catástrofe é mesmo iminente”:

“Não tenho um conhecimento gigantesco, quero conhecer mais, então eu procuro me interessar sobre o assunto. Claro que com algum ceticismo quando vejo esse prognóstico de filme-catástrofe. Então por isso que eu estou me informando, para não ficar desligado nem paralisado pelo terror, pelo apocalipse.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“Tenho muitas informações, mas estou procurando me informar cada vez mais porque, como disse, a ameaça é muito grave, a ameaça é para amanhã, a ameaça é já, e nós não temos ainda uma consciência plena a respeito desses riscos de mudanças climáticas.” (MÍDIA, M.P., 61, JORNALISTA)

“Estou aprendendo mais, pois a cada dia aparecem mais conseqüências dessas mudanças. É ainda um assunto tratado superficialmente na mídia, carregado nas tintas, anunciando catástrofes. A ênfase devia ser no que fazer: reduzir consumo! Estou comprando livros, quase tudo o que se escreve é novo.” (MÍDIA, J.L.D., 50, JORNALISTA)

3. GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Maioria se sente altamente mobilizada pelo tema

Como se sente em relação ao tema:

Altamente motivada

Motivada, mas tem outros assuntos

mais importantes

Apenas interessada

Não opinou TOTAL

18 9 2 1 30

A maioria, 18 entrevistados, se declarou “altamente motivada” a aprender mais; 9 disseram ter outros temas mais importantes no momento para se ocupar. No entanto, a maioria admitiu que “este é um tema que mobiliza”. A natureza da mobilização é a preocupação com o futuro da espécie humana (das gerações futuras) e do planeta:

“Sou um ser humano preocupado com o futuro do planeta onde moro e também com as gerações por vir, me preocupo se elas vão continuar usufruindo.” (MÍDIA, R.M., 48, JORNALISTA)

Page 59: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

5 9

“Sobrevivência da humanidade, sobrevivência da espécie. E também o meu trabalho profissional.” (MÍDIA, M.P., 61, JORNALISTA)

“Não vou a seminários sobre isso, mas o tema me emociona, me mobiliza. Emocional e intelectualmente. É o nosso futuro, né?” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

“Eu sou um habitante da Terra. Na minha leitura, nos meus livros, é o meu principal foco de interesse, na minha vida privada.” (MÍDIA, L.M., 34, JORNALISTA)

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Mudanças climáticas e combater o binômio fome/pobreza são prioridades

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos?

Meio ambiente/ Água/ Aquecimento Global / Mudança

Climática

Pobreza/ Fome/ Distribuição de Renda/ Desigualdade Social

Mudanças no padrão de consumo

Exploração inteligente dos

recursos naturais

TOTAL

15 13 1 1 30

Perguntados sobre o maior desafio que a humanidade vai enfrentar nos próximos 20 anos, os entrevistados se dividiram: 15 responderam não ter dúvidas de que devem ser as mudanças climáticas e 13 disseram que será erradicar a fome e a pobreza. Um ainda mencionou “mudar o padrão de consumo”, e um segundo “mudar a nossa maneira de explorar os recursos naturais”. Claramente, a maioria se referiu as questões ambientais, o que é surpreendente para um setor que recebe e transforma milhares de informações em suas mãos todos os dias.

Vejamos alguns dos argumentos daqueles que mencionaram mudanças climáticas:

“O século XXI vai ser o contrário do anterior, vai ser marcado por determinantes físicos das grandes mudanças; estas vão ser basicamente determinadas pelo esforço da humanidade em mitigar e se adaptar às mudanças climáticas. Então, o desafio central é basicamente incorporar a mitigação e adaptação das mudanças climáticas no núcleo das atividades humanas e aí, obviamente, todas as decisões políticas, econômicas e sociais terão que passar a contemplar esse desafio climático.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

Nas duas falas abaixo emerge claramente o sentimento de que o desafio existe, mas “não sabemos como fazer”. A humanidade não tem ainda a receita, o caminho:

“Acho que o desafio é o mesmo de hoje: o esgotamento do planeta como moradia, como fonte de alimentos e abrigo. Mais do que qualquer outro problema, alguns me parecem que ficam além da possibilidade tecnológica de solução.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

“Acho que o grande desafio da humanidade, não nos 20, mas nos próximos 50 anos é estabilizar as emissões de CO2. (...) Acho que é o maior desafio coletivo que a humanidade já teve que enfrentar.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

“Eu acho que aquecimento global é o problema central porque já estão lançadas as bases para que o mundo venha a aquecer nas próximas décadas. Contornar, enfrentar esse problema exige uma cooperação multinacional que o mundo não está acostumado a ter. É um problema difícil e um problema urgente.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

Page 60: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 0

Além disso, como o depoimento abaixo deixa claro, falamos uma coisa e fazemos outra. Ao mesmo tempo em que pedimos à sociedade engajamento, o consumismo “anda solto”:

“O principal desafio talvez seja o ecológico, seja o desafio de tentar cuidar melhor do planeta porque daqui a pouco o planeta vai entrar em colapso, esse é o grande problema. (...) Esse é o grande desafio mundial, na medida em que temos um número considerável de megalópoles e essas megalópoles são centros de transferência de consumo de energia e essas energias utilizadas, além de elas não serem renováveis ao infinito. Uma série de problemas encadeados que têm a ver com o meio ambiente (...)” (MÍDIA, J.S., 46, JORNALISTA)

“Eu acho que agora que está caindo a ficha de tudo o que no passado a gente fez, de destruir a natureza, essa coisa da água, do clima, do aquecimento global. Porque não é uma história que estão contando, a gente está vendo as coisas acontecendo, então o maior desafio é tentar reverter isso, principalmente para amenizar os efeitos para os países mais pobres.” (MÍDIA, A.L., 50, JORNALISTA)

Água preocupa

Muitos entrevistados tiveram dificuldade de citar um só desafio. Os que optaram por falar de meio ambiente, apontaram em primeiro lugar mudanças climáticas e em segundo água:

“Eu penso que seja não só a questão das mudanças climáticas, mas principalmente a geração de energia limpa e a manutenção dos mananciais de água doce no mundo.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

“É a água. Ah, eu não tenho dúvidas que é a água. Eu fico boba porque a situação de São Paulo é dramática. A maior cidade do país, com mais de 10 milhões de habitantes e nós não temos água aqui dentro. Nós temos a Guarapiranga, que serve a 40% da população, se a gente perder a Guarapiranga nós estamos fritos e não se fala nisso.” (MÍDIA, N.D., 56, JORNALISTA)

Cidades e o “caos do transporte urbano” são mencionados

Também não deixaram de mencionar os problemas urbanos, “o caos do transporte”. Percebe-se a preocupação com “um discurso que não está se traduzindo em prática”:

“Eu acho que são vários os desafios. Eu vejo que a humanidade está caminhando cada vez mais rápido e degradando cada vez mais rápido. A questão do meio ambiente é a questão que mais me preocupa, com certeza. É porque, ao mesmo tempo em que você incentiva todo um aumento de produção, um aumento de consumo, isso tudo está batendo diretamente com o planeta. (...) eu não vejo realmente um interesse real de colocar em prática o discurso. (...) Toda uma cadeia não é pensada globalmente. Então não consigo entender como países como os Estados Unidos, Rússia, Brasil, todos os países praticamente, todos falando em desenvolvimento sustentável... Mas o que vemos é um consumismo louco nas cidades, em todo o mundo sendo incentivado.” (MÍDIA, L.H.J., 49, JORNALISTA)

Para aqueles que optaram pelos problemas sociais, também foi difícil ficar só com a pobreza ou a fome. Acabaram por mencionar uma somatória de outras questões que ajudam a agravar o cenário futuro:

“Acho que o primeiro desafio é o de sempre, não houve ainda uma mudança no perfil da economia que a torne capaz de contemplar uma maioria da população, esse é um problema eterno. E, em segundo lugar, este que surgiu agora, no final do século passado,

Page 61: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 1

problema novo, que é o próprio planeta. Se esse não for resolvido ninguém sobrevive. Acho que é o da sobrevivência mesmo, da sobrevivência do planeta.” (MÍDIA, L.A.N., 48, JORNALISTA)

“Eu acho que o maior desafio que a humanidade vai enfrentar vai ser incluir nas condições dignas de vida o resto da população atualmente excluída. Isso no mundo e no Brasil. Cercar os países de muros, de restrições, não vai adiantar quando todo mundo estiver desesperado. A severidade climática com a severidade da pobreza é pior do que uma bomba nuclear.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“Pensando na sustentabilidade, acho que o maior problema da humanidade é a pobreza. Por quê? Porque a pobreza traz diversas outras questões, diversos problemas nascem de se ter pessoas com necessidade. Enquanto você tiver pessoas pobres, isso é sinônimo de problema de educação, problema de maltratar sua água (...). Honestamente, o nosso desafio é conseguir economicamente eliminar a pobreza e fazer isso de maneira que a gente não se elimine.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

Entre frases como “a pobreza tem um efeito deletério”, “ela afeta o meio ambiente negativamente”, “a sustentabilidade passa por resolver o problema humano”, este parece definitivamente ser o desafio mais importante que a humanidade e o Brasil enfrentarão, para parte expressiva dos nossos entrevistados:

“Que ninguém vá dormir com fome na face da Terra. Acho que esse é o maior desafio. O segundo maior desafio talvez venha a ser que ninguém durma ao relento na face da Terra. O terceiro, que ninguém deixe de ter a oportunidade de ir à escola.” (MÍDIA, J.K., 58, JORNALISTA)

Desafio da humanidade é sobreviver em ambiente hostil

Alguns entrevistados não se sentiram confortáveis em ter que apontar apenas um desafio. Outros alertaram para o fato de que é preciso evitar posições radicais que separem os que têm visão social de um lado e os que são ambientalistas. Lembram que a sustentabilidade passa pela redução da miséria, que está na raiz do conceito, e que é desejável evitar um discurso radical:

“O desafio da humanidade é sobreviver nesse ambiente hostil. Ah, eu acho que são vários os desafios, e temos que dar conta do conjunto: sobreviver, manter as condições, melhorar as condições de vida, eu acho que é o grande desafio. Em segundo lugar, é viver num ambiente mais saudável, mais equilibrado, crescimento econômico sustentável: preservação do meio ambiente, controle das emissões, é uma agenda.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

“É acabar com esse maniqueísmo, radicalismo que divide a humanidade cada vez mais. Cada um acha que é o dono da verdade. Acha que tem as respostas para todas as perguntas. Isso é muito ruim, porque ninguém é dono da verdade. Você não encontra a verdade num livro só de jeito nenhum. Nem o Alcorão, nem a bíblia, nem no Machado de Assis. A verdade está no conjunto.

Claro que têm muitos males: o aquecimento global, a pobreza que está aumentando. Quando eu estava no ginásio, dizia-se que a humanidade tinha dois bilhões de habitantes. Sessenta anos depois tem seis bilhões. E comida para toda essa gente? A miséria está aumentando violentamente no planeta.

E aí vem essa divisão ideológica catastrófica que é de um lado o capitalismo – como eles dizem, o mercado tem respostas para todas as perguntas – e do outro os radicais, seja de

Page 62: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 2

esquerda, direita, os fundamentalistas que acham que tem que ser no pau, o que também não dá.

Então nós estamos cada vez mais caminhando para um mundo maniqueísta, divididos em emissores e não emissores, em consumistas e não consumistas, em capitalistas e socialistas, então é sempre a mesma droga, né? No Brasil, então, nem se fala: é torneiro mecânico de um lado e sociólogo do outro.” (MÍDIA, C.C., 70, JORNALISTA)

Para o mesmo jornalista, os problemas que devemos enfrentar nas duas próximas décadas não são “isso ou aquilo”: tudo é sistêmico, têm efeitos em cadeia e o mundo precisa aprender a cooperar:

“... temos que evitar que o velho modelito do conflito, da guerra à la Bush seja o modelo catastrófico a ser utilizado. Isso detonaria tudo.” (MÍDIA, C.C., 70, JORNALISTA)

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Distribuir renda é o desafio eterno do Brasil

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Distribuição de Renda/ Fome/ Oportunidade

para todos

Meio Ambiente/ Mudanças climáticas

Preservação da Amazônia

Educação

Estratégias de Desenvolv./

Sustentabilidade

Política/ Violência/ Drogas

TOTAL

8 7 5 5 3 2 30

As opções de resposta nesta pergunta, que pedia aos entrevistados que mencionassem apenas um problema, foram pulverizadas em seis diferentes tipos de problemas. Os mais citados foram, pela ordem: distribuir renda, mudanças climáticas e, empatados em terceiro lugar, educação e preservação da Amazônia.

O raciocínio sobre a necessidade de distribuir renda e combater as desigualdades já havia sido explorado na questão anterior, e os nossos entrevistados insistem que essa não é uma questão só do Brasil. Quando querem citar um exemplo extremo, mencionam a África.

“É o desafio de sempre: a desigualdade social é o eterno, essa disparidade brutal entre ricos, pobres, remediados e gente que está na mais absoluta miséria, sem acesso a nada, nem à dignidade humana.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“É crescer horizontalmente, com oportunidade para todos. Não é crescer dando esmola, bolsa família e aí fica todo mundo feliz e quem não tinha emprego ganha o Bolsa Família, cesta básica e viva o Brasil e viva o Lula. Não é por aí que nós vamos chegar lá.

E também não é pela forma de que se dane todo mundo, a vida é uma grande competição. Quem não tiver condições de competir se lasca. Não, meu Deus do céu. Todo mundo tem direito de pelo menos um trabalho, a uma habitação, a alimentação, mesmo pequena, mesmo ainda tímidos. (...) Esse é o grande problema no meu entender.” (MÍDIA, C.C., 70, JORNALISTA)

Page 63: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 3

Bolsa família não resolve

A necessidade de combater a pobreza, na opinião dos entrevistados, não está sendo atendida pelos programas atuais do governo brasileiro. São muitas as críticas ao “Bolsa Família” (programa de complemento de renda direcionado à população pobre):

“O presidente Lula esteve em Gana e ele foi inaugurar oficialmente, abrir um novo escritório da Embrapa em Gana, com o objetivo de levar tecnologia de agricultura do Brasil para os países africanos. Então o que ele está fazendo lá? Ele está ensinando as pessoas a pescar, levando tecnologia para que essas pessoas possam plantar cana, desenvolver seu potencial agrícola, além de produzir o tal do biocombustível, para que elas possam produzir comida, alimentos...

E aí eu paro para pensar: e aqui no nosso Norte, Nordeste? Por que não tem um empenho grande como esse? Por que temos que dar Bolsa Família, Bolsa Alimentação, Bolsa Gás, bolsa não sei o que? Você está dando peixe. Eu acho que no Brasil o grande desafio é você tirar as pessoas, principalmente do Norte e Nordeste, não digo todas, mas boa parte, desse estado de letargia. Porque elas estão ali. As coisas vêm. Não que elas não tenham uma vida sofrida, mas não é o caminho.” (MÍDIA, E.P., 49, JORNALISTA)

Como reduzir a pobreza e as desigualdades? Quando nossos entrevistados usam a expressão “o de sempre”, “o mesmo desafio”, querem dizer que se trata de um desafio histórico. Por que o Brasil ainda não conseguiu, apesar de sua economia respeitável, dar conta do problema?

“Tem vários mecanismos, vários [para reduzir pobreza]. É você criar mais oportunidade para emprego; geração de renda; educar a população; tem a infra-estrutura; levar informação às pessoas; cidadania, justiça; justiça sob o ponto de vista de Estado, na questão jurídica; melhor organização da sociedade; manter a democracia.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

O Brasil precisa crescer economicamente, gerar riqueza e oportunidade de emprego e renda:

“O maior desafio do Brasil, na minha opinião, vai ser se consolidar como uma das grandes economias do planeta. E, além disso, no campo econômico, no campo social, vai ser desenvolver a cidadania e permitir que as pessoas possam chegar a um nível desenvolvimento educacional e cultural melhor do que elas têm hoje.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“O desafio do Brasil é mudar de patamar, passar de um país pequeno para grande, no sentido de um país que é capaz de gerar riqueza e conhecimento e, com isso, capaz de lutar contra seus problemas. (...) Acho que o Brasil tem um desafio cultural muito grande. A gente tem que enfrentar a questão de que muita gente no país não valoriza diversos princípios que são essenciais para o país fazer essa transição. (...) Claro, a gente precisa formar mão de obra especializada no sentido de crescer economicamente, mas a gente precisa também investir na formação cultural do brasileiro.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

O Brasil precisa educar sua população

O Brasil precisa educar sua população. Os objetivos desses esforços são, em primeiro lugar, qualificar mão-de-obra para poder realizar a mudança cultural necessária à transição econômica – de país emergente para país desenvolvido:

“Educação, totalmente. A gente pode viver um apagão de gente, falta de mão-de-obra capacitada, falta de gente preparada para viver o país, para tocar o país, porque o mundo

Page 64: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 4

está se encaminhando economicamente e tecnologicamente e socialmente para diferenciar nações pelo grau de preparo que os seus habitantes têm.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

“O Brasil precisa é entender que educação, ciência e tecnologia são as únicas coisas que podem fazer este país se desenvolver. Não tem nada, não tem parque, não tem segredo econômico, taxa Selic, sem investimento realmente na educação, ciência e tecnologia.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

Além da questão do desenvolvimento e da competitividade, a educação é decisiva para a preservação do meio ambiente:

“Acredito que só a educação do povo poderá gerar ações que contribuirão para o meio ambiente.” (MÍDIA, J.L.D., 50, JORNALISTA)

“O Brasil tem que desenvolver na área educacional uma competência da sua população mais carente em relação a essa necessidade de manutenção dos mananciais, porque não se pode culpar as pessoas pelo que elas fazem, se a ignorância for maior que seu conhecimento. Então, cabe às autoridades dar educação, principalmente, muito mais do que fiscalização do meio ambiente, porque quando você fiscaliza é sinal de que já aconteceu. A prevenção é educação.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

Mudanças climáticas: o tempo da prevenção já passou

Com relação ao tema das mudanças climáticas, vários entrevistados, quando se manifestaram na pergunta sobre “desafio da humanidade”, já tinham dito “também do Brasil”. Podemos dizer que há entre os amostrados uma clara consciência de que este é um desafio importante par todos os países, inclusive o Brasil.

O enfoque adicional aqui, quando se trata de pensar os efeitos do fenômeno sobre o Brasil, é que os “efeitos vão recair sobre os mais pobres”, e isso leva os nossos entrevistados a prever uma situação difícil para grande parte da população. Para eles, o tempo de um debate “mais conceitual” já passou. Trata-se de arregaçar as mangas e preparar a população para o que virá:

“O tempo para um debate mais conceitual já passou: vai ser um problema físico, as manifestações daqui para frente, vão ficar cada vez mais claras; são modificações de mudanças climáticas e vão produzir efeitos severos. Naturalmente os pobres sofrerão mais. Uma coisa que poderia acontecer em larga escala é melhorar, por exemplo, nossa defesa civil. Somos tradicionalmente um país sem grandes tradições de ventos extremos, a não ser as enchentes. Precisamos melhorar essa capacidade.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA-3)

“Você tem desafios temporais... O desafio da miséria, violência, saúde pública, educação e tudo mais. Mas esses eu diria que são sanáveis: você faz uma mega revolução, muda lá a relação da sociedade com as coisas e de certa maneira resolve. Ou pelo menos abre uma perspectiva de solução dentro de um prazo visível. Mas o desafio ambiental eu acho que já escapou da capacidade humana de interferir de forma a reverter. (...)

A questão é saber se o mundo que restará dessas transformações será um mundo que nós poderemos chamar de habitável. Que tipo de conseqüência há de vir dessa transformação do planeta, ou de alguma coisa que a gente não sabe ainda o que é, é o que eu acho que é impossível prever.

Page 65: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 5

Pensando no Brasil, o que não podemos fazer é esperar pela desgraça: temos que mapear as áreas que serão mais atingidas, pelo menos no curto prazo, e trabalhar para minorar, trabalhar para a população se conscientizar (...)

Não é um processo que você possa falar de uma forma radical de intervenção na história, que revolucionariamente você possa modificar. Uma revolução não reconstitui Jequitibá.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

A Amazônia e o aquecimento global são os desafios ambientais do Brasil para os próximos 20 anos

Qual será o maior desafio ambiental do Brasil nos próximos 20 anos? Preservação da Amazônia

Aquecimento global

Promover sustentabi-

lidade

Água Garantir que o planeta continue

funcionando

Sanea- mento

Geração de energias limpas

Manejo dos recursos naturais

TOTAL

30 8 5 4 4 3 3 2 1

Vimos que a Amazônia foi citada por 5 dos nossos entrevistados como um dos maiores “desafios do Brasil”. Isso se repete, agora com 8 citações, em relação “ao maior desafio ambiental” que teremos que enfrentar nos próximos 20 anos. Neste caso, foi o item individualmente mais citado, uma vez que as demais respostas foram diversificadas e se dirigiram a outros focos.

Se juntarmos os respondentes que indicaram o “aquecimento global”, a “necessidade de controlar emissões” e “gerar energias limpas”, temos como segundo maior desafio a questão das mudanças climáticas.

Promover a sustentabilidade, de um modo geral, e cuidar da água vieram em terceiro, com quatro menções cada uma. Depois, com menções mais diversificadas, foram lembrados o binômio saneamento/lixo e a gestão sustentável dos recursos naturais.

A Amazônia está sendo destruída diante dos nossos olhos

Para alguns dos entrevistados que responderam ser a Amazônia um dos maiores desafios do Brasil, parece que estamos fazendo um esforço para destruir, e não para preservar:

“O grande problema do Brasil, a meu ver, é preservar Amazônia, e o Brasil não está fazendo nada nesse sentido. Ao contrário, a meu ver, o Brasil esta fazendo um esforço danado para destruir a Amazônia, e se continuar assim vai conseguir. (...) O Brasil precisa dar um salto no sentido não só de crescer, avançar economicamente, incorporar boa parte da população ainda em situação precária, mas de fazer isso preservando o meio ambiente.” (MÍDIA,J.M.,46, JORNALISTA)

Para um entrevistado, além de agravar o problema do aquecimento global, o desmatamento da Amazônia é “criminoso” e não traz nenhum desenvolvimento para o Brasil:

“Acho que o desafio ambiental para a humanidade é o aquecimento global, e o desafio para o Brasil é, obviamente, resolver a questão do desmatamento na Amazônia, que além de agravar o aquecimento global não traz desenvolvimento nenhum para o Brasil. Pelo menos metade do desmatamento é simplesmente criminoso, então ninguém ganha com isso. O país não ganha divisas, não ganha impostos, não ganha absolutamente nada com o

Page 66: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 6

desmatamento. Pelo contrário, perde capital ambiental.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

O Brasil precisa das riquezas da Amazônia

Mas as razões para não desmatar a Amazônia estão na esperança de que possamos aproveitar as riquezas que lá existem e as vantagens de ter a floresta preservada.

“(o desafio) é preservar o verde que ainda sobrou. Eu acho que vai ser a grande moeda do Brasil, porque é uma coisa que existe cada vez menos no planeta e a gente tem a Amazônia que é o pulmão mesmo. Se o Brasil souber administrar isso acho que até pode se dar bem com isso, acho que pode trazer divisas (...)” (MÍDIA, M.S., 46 JORNALISTA)

“É manter a Amazônia e o Pantanal (...). Mas não é manter a Amazônia como se fosse um grande jardim botânico ou zoológico, à disposição dos estrangeiros, ONGs que estão de olho na Amazônia para preservar a floresta intocada. Não, estou de olho porque lá tem riquezas que o Brasil não consegue explorar ordenadamente. O futuro do planeta está lá. (...)

É um horror o que esses madeireiros fazem indiscriminadamente. Cortam árvore para burro. Agora para onde é que vão essas árvores? (...) Tudo o que a gente precisava mesmo era de tempo e vontade política para ordenar o desenvolvimento da Amazônia, acabar com os excessos. Botar na cadeia quem fica cortando árvores à toa aí. Mas vamos utilizar bem a Amazônia.” (MÍDIA,C.C.,70, JORNALISTA)

Além da vontade política de explorar a Amazônia ordenadamente, um dos entrevistados lembra que para manter a floresta em pé é preciso oferecer alternativas econômicas a quem está lá:

“Como a gente vai fazer para levar formação cultural para as pessoas da Amazônia sem levar um desenvolvimento econômico? (...) Não vamos convencer o cara a não derrubar árvore falando ‘Por favor, não derrube árvore’. A gente tem que, no mínimo, fornecer uma alternativa econômica, que não seja destrutiva para aquele ambiente.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

Saneamento e água também foram destacados

Do mesmo modo como aconteceu na questão sobre o desafio da humanidade, alguns entrevistados não conseguiram optar por um desafio ambiental principal:

“Eu acho que é uma cruza de saneamento com Amazônia. (...) Tudo que se fizer nessa direção está ótimo, porém, no meu entendimento, junto vem o saneamento e o saneamento não está na agenda internacional nem nacional para valer.” (MÍDIA, E.G., 64, JORNALISTA)

“São mudanças climáticas e água, sem dúvida esses dois.” (MÍDIA, A.D., 63, JORNALISTA)

“Isoladamente, talvez a questão da água e o aquecimento global, isoladamente falando.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

“São vários desafios, desde os poluentes que a gente solta nas nossas máquinas maravilhosas que congestionam o trânsito da cidade até esta coisa selvagem que é a desarborização do mundo, da Amazônia”. (MÍDIA, J.K., 58, JORNALISTA)

Vimos também, nas falas acima, a importância atribuída à necessidade de conservar a água, preocupação bastante presente nas entrevistas de um modo geral. Se somarmos as pessoas que

Page 67: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 7

citaram “água” como o maior desafio ambiental com aqueles que a citaram em segundo lugar, temos mais de 6 citações.

Sustentabilidade é a maneira de resolver

Por fim, neste tópico sobre desafios, devemos destacar as falas que indicam a necessidade de promover a sustentabilidade ou o desenvolvimento sustentável, a maneira correta e mais sistêmica de enquadrar todos os problemas citados:

“Eu diria que o desafio do Brasil, para resumir, é sustentabilidade. A gente ainda tem uma riqueza enorme de recursos humanos, naturais e materiais. A gente tem que conseguir explorar isso de maneira sustentável.” (MÍDIA, P.C., 31,JORNALISTA)

“Eu acho que é exatamente isso, a tal da sustentabilidade. (...) Manter o sistema capitalista que de certa forma está globalizado, mas colocá-lo dentro de uma lógica de responsabilidade ambiental, climática, o que não é fácil... continuar produzindo com o menor impacto possível para o meio ambiente, esse me parece ser o desafio ambiental mais importante.” (MÍDIA, M.S., 46, JORNALISTA)

“O maior desafio ambiental na minha opinião, seria tentar desenvolver uma sociedade auto-sustentável em termos ambientais, ou seja, da gente se empenhar o mais possível na reciclagem de tudo o que a gente pode reciclar, procurar preservar tudo aquilo que a gente pode preservar, e procurar entender que todas as coisas que nós possuímos são finitas.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Maioria concorda que as mudanças climáticas terão forte impacto nas sociedades humanas

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas.

Concorda fortemente

Concorda

Não concorda nem

discorda Não sabe / não

respondeu TOTAL

14 14 1 1 30

Essa posição fica clara quando analisamos as respostas dos entrevistados:

“Concordo fortemente com esta afirmativa, pois estou sempre noticiando grandes catástrofes. Só não vê quem não quer, que tudo está mudando a nossa volta.” (MÍDIA ,J.L.D., 50, JORNALISTA)

“Vai causar grande impacto. Tanto é que a ONU já discute inclusive mitigação, essas coisas, não apenas como reverter o processo. A história das ilhas é a mais obvia. Se subir o mar um metro desaparece metade daquelas nações insulares do pacífico, Palau etc.” (MÍDIA, P.C., 31, JORNALISTA)

Maior preocupação é com populações pobres

A maioria, além de concordar, qualificou suas opiniões. Como já foi dito, a preocupação maior é com o impacto sobre as populações pobres:

Page 68: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 8

“Eu concordo com qualificantes: eu acho que as populações endinheiradas vão gastar um monte de dinheiro para se adaptar, mas vão se adaptar. (...) Populações que são vulneráveis à pobreza, à fome, a doenças, essas vão sofrer muito com o aquecimento global, porque a situação já está como fio da navalha, tudo o que você não precisa é de mais um problema ambiental para jogar essa gente pobre no buraco.”

O mesmo entrevistado parece conhecer a geografia das mudanças climáticas:

“(...) Então eu acho que há impactos e impactos, por exemplo, o pessoal do Canadá está muito feliz com essa história, porque eles podem aumentar a área agrícola deles e diminuir o consumo de energia e os gastos por conta do frio que eles têm: 7 meses por ano. (...) Agora só no Sudeste asiático, nos deltas, nos mega deltas da Ásia, nas zonas áridas da China e da Índia, e no Nordeste brasileiro tem tudo armado para um desastre.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

Jornalistas manifestam “incerteza quanto ao amanhã”

Embora insistam que não possuem uma visão fatalista, catastrofista, os entrevistados falam de sua incerteza quanto ao amanhã com angústia. Como será o mundo dos nossos netos, não se pode prever:

“Concordo fortemente, veja bem, eu não sou catastrofista. (...) Eu acho que a gente não pode entrar na paranóia, não pode entrar também no desconhecimento e minimização dos problemas que estão postos para humanidade de coisas que ela mesma vem fazendo há muito tempo (...) Eu sei que a minha geração não vai morrer amanhã, mas e a da minha neta? Não tenho essa certeza. Eu estou fazendo o mundo para minha neta, não para mim. Eu acho que a despreocupação com isso é criminosa.” (MÍDIA,J.K., 58, JORNALISTA)

Em várias entrevistas, frases como “não podemos ser paranóicos”, “devemos evitar o catastrofismo”, “há exageros no tratamento do tema” aparecem, mas nenhuma argumentação procura descredibilizar a tese de que as mudanças climáticas causarão impacto dramático sobre as sociedades humanas:

“Quando eu leio nos jornais e nas revistas umas previsões muito catastróficas, eu tento colocar um pé atrás e pensar, comparar informações. Tem muita informação sensacionalista misturada com informação séria. Eu mesmo fiz uma entrevista com um pesquisador britânico que falava que, em 2040, 80% da população da Terra vai ter desaparecido. Eu sou um pouco cético quanto a esse tipo de visão apocalíptica, mas eu acho que mudanças climáticas é a questão das próximas décadas.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“Concordo, sei que existem controvérsias, alguns cientistas dizem que isso tudo é exagerado, que estão fazendo terrorismo e que ainda não é possível realmente tirar conclusões mais firmes, mais conseqüentes. Eu digo que é praticamente impossível que se mexa na natureza como estamos mexendo sem que isso tenha conseqüência. (...)

É impossível não ter impacto sobre o meio ambiente, não só do continente, como certamente do mundo, vai ter impacto, impacto de toda ordem: espécies que desaparecem, impacto no sentido, por exemplo, de rio, de água potável, até impacto no sentido de produção de oxigênio, uma série de impactos.” (MÍDIA,J.M., 46, JORNALISTA)

Uma voz discordante

Somente um entrevistado, colunista de economia de um importante jornal diário, televisivo, disse não concordar nem discordar e apresentou a seguinte argumentação:

Page 69: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

6 9

“Eu acho que é uma questão polêmica. É muito difícil você mensurar os efeitos e relacioná-los realmente às mudanças climáticas... Claro que agressão ao meio ambiente a gente tem que evitar de várias maneiras. Não faz sentido queimar a floresta amazônica, você continuar queimando diesel com altos teores de enxofre. (...)

Mas esse processo de aquecimento global, se ele já está provocando de imediato a elevação dos mares, isso aí é uma coisa ainda difícil de você provar no meio científico.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

Ainda assim, o mesmo jornalista completou seu raciocínio dizendo que a falta de uma metodologia “cem por cento efetiva” não é desculpa para deixar de prevenir maiores desastres.

7. IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

O papel da mídia

Importância do tema em seu setor de atuação:

Perguntados se o tema das mudanças climáticas era importante para o seu setor de atuação, os entrevistados responderam, em sua maioria, que “sim, é muito importante”.

Começando pelo próprio negócio

A natureza dessa importância foi qualificada de diferentes maneiras. Houve referências à necessidade de usar papel reciclado, de contabilizar as emissões do processo de impressão de revistas, jornais etc.:

“Do ponto de vista do negócio de fazer revista, a gente tem um desafio muito grande pela frente. Será que um dia as pessoas vão começar a questionar que isso é desnecessário, a gente esta fazendo uma agressão ao meio ambiente imprimindo uma revista?

Eu não concordo muito que a solução seria interromper todos os nossos processos, eu acho que a gente tem que buscar maneiras de fazer isso aqui, sem agredir, de fazer revista, imprimir jornal, agredindo cada vez menos o meio ambiente, fazer de maneira sustentável, preocupado com todas as etapas do processo, desde o que a gente faz na redação (...) até a qualidade da água que a nossa gráfica vai despejar na rede de esgoto, depois de passar por todos os processos químicos na impressão. Eu acho que atacar todas essas frentes é importante.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

Um entrevistado citou um exemplo concreto:

“A National Geographic tem uma preocupação antiga, desde a sua fundação, em 1888, com a questão do ambiente, mas isso se radicalizou de um ano para cá, mudou até a missão da revista, a missão expressa da revista que era o mundo selvagem, mudou para inspirar pessoas a cuidar do planeta. (...) Passou a ter uma preocupação desde sua

muito importante

importante

pouco importante

não respondeu

total

22

6

1

1

30

Page 70: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 0

própria feitura, com papel, tinta, esse tipo de coisa, até o patrocínio de pesquisas.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

Formando opinião

Mas o maior impacto, para a maioria, é no conteúdo da notícia, na capacidade que os profissionais de mídia têm de informar e formar opinião:

“O maior impacto é na veracidade da notícia, a informação de qualidade. (...) Eu acho que o papel do jornalismo é ouvir mais as pessoas, seja o buraco grande ou pequeno, dar voz a diferentes visões, enriquecer a opinião, dar a informação relevante, para que as pessoas possam se posicionar.” (MÍDIA, A.L., 45, JORNALISTA)

“A gente tem o papel de formador de opinião. A informação de boa qualidade é primeiro importante para nós como pessoas, e depois para passarmos para o nosso público.” (MÍDIA, L.H.Y., 49, JORNALISTA)

Estabelecendo correlações

A maioria absoluta dos nossos entrevistados não é especializada em meio ambiente ou temas correlatos. Ainda assim, declararam que adquirir informação abrangente sobre um tema tão mobilizador como esse possibilita o estabelecimento de correlações com cada especialidade:

“Eu cubro de tudo, então é importante aos poucos ver que um tema como mudança climática tem a ver com tudo, com consumo, com esporte, com lazer. É bacana ver que todas as coisas têm a ver, aí a gente vê que pode contribuir, mesmo não sendo repórter especializado.” (MÍDIA, E.P., 49, JORNALISTA)

“Eu cuido de esporte e esporte devia ser sinônimo de saúde. (...) Estamos vendo que o principal maratonista do mundo não vai para Pequim porque ele tem problemas pulmonares, ele é asmático e ele diz que não suportará correr 40km na poluída cidade de Pequim. Veja você a que ponto as coisas chegam.” (MÍDIA, J.K., 58, JORNALISTA)

Agentes de conscientização

Tudo o que diz respeito à mudança de hábitos e de postura, voltado para a transformação da cultura, tem a ver com a mídia, dizem nossos entrevistados. A mídia é sem dúvida um veículo de conscientização:

“O aumento da temperatura no planeta demanda mudança de hábito, mudanças de cultura, de aproveitamento de solo, de agricultura, de tudo isso. E isso toca no dia-a-dia das pessoas. Então, sim, é um assunto importante e afeta profundamente o nosso trabalho. E nosso trabalho, se bem feito, pode mudar a vida das pessoas, prepará-las, incentivá-las a mudar.” (MÍDIA, R.M., 65, JORNALISTA)

“Acho que a mídia, de maneira geral, tem feito um esforço positivo no sentido de dizer que se precisa fazer alguma coisa. Em relação à mídia, sempre é muito curioso, porque a mídia trata de todas as coisas ruins, conscientiza, mas acho que o discurso da mídia é no sentido de preservação do planeta, de conscientização, de adoção de uma agenda ecológica positiva e tudo mais. (...) A mídia vem fazendo razoavelmente seu trabalho. Não faz melhor porque a própria cultura da sustentabilidade ainda é incipiente.” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

Page 71: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 1

Mudança climática vem ganhando cada vez mais espaço na mídia

Quanto ao espaço ocupado pelo tema das mudanças climáticas na mídia, os entrevistados se dividiram. A maior parte acha que o assunto vem ganhando cada vez mais espaço, e uma minoria acha que o espaço ainda não faz jus à sua importância.

Para aqueles que pensam que o tema ainda não ocupa o merecido destaque na imprensa, o argumento é que se trata de uma consciência recente:

“Eu acho que a sociedade brasileira está começando a descobrir a questão climática e ambiental de um modo geral, muito recentemente. Você tem pouquíssimas pessoas que atuam nessa área, eu diria que tem uma meia dúzia que de fato atuam nessa área. O resto dos cientistas políticos brasileiros ainda está voltado para as questões tradicionais da ciência política: partidos, eleições, democracia. (...)

Eu acho que é possível que a participação mais intensa seja a dos cientistas sociais, talvez no âmbito da SBPC, que é um fórum, evidentemente porque agrega ciências que são centrais nas questões climáticas. Mesmo o jornalismo de ciência, que é muito especializado e conta com profissionais muito bons, não dá muito destaque ao tema.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

Muitos entrevistados acham que há um interesse crescente, e que o assunto ganha cada vez mais espaço. Primeiro pela própria natureza do assunto, que é tratado com dramaticidade, e depois por ações que potencializaram o conteúdo noticioso, tais como o documentário de Al Gore e a repercussão que conquistou na mídia brasileira:

“Veio num crescendo, na minha opinião, desde o começo do ano 2000 até 2007, numa progressão, onde se começou a falar mais no assunto, a se ler mais coisas. Aí teve o documentário do Al Gore em 2006, que eu acho que ali foi o auge da exploração da mídia com os assuntos do meio ambiente. E, por coincidência, também com o tsunami, o Katrina e outros desastres, foi fácil estabelecer um link. Então o assunto foi muito explorado... Eu acho que ali foi o momento em que se falou mais de meio ambiente, e aí acho que estabilizou o assunto de um tempo para cá...” (MÍDIA, M.S., 46, JORNALISTA)

Enfoque sensacionalista é inevitável

Devido à ocorrência do tsunami e do Katrina, diz o mesmo entrevistado, parte da mídia tratou do assunto de forma séria e parte de forma sensacionalista. Mas isto é inevitável:

“Explorou-se o tema de forma um pouco sensacionalista, partes da mídia de forma séria, informando mesmo os efeitos do aquecimento global, mas acho que agora deu uma estabilizada.” (MÍDIA,M.S., 46, JORNALISTA)

“O assunto claramente está crescendo na imprensa e esse ano no “Faz Diferença“ do O Globo [jornal impresso], que é um prêmio dado todo ano, a gente deu um prêmio para um climatologista, o Carlos Nobre, e um para o Sebastião Salgado, não por causa do trabalho dele de fotógrafo que é admirável, mas principalmente pelo trabalho de reconstituição da Mata Atlântica na região onde ele nasceu. Então a questão de meio ambiente está invadindo a pauta, já tem editorias e cada vez mais vejo se formando especialistas. (...)

A imprensa brasileira começa a olhar para a Amazônia querendo ir lá e entender o que é isso. O que é Rondonópolis, o que é Paragominas? Passa a ter existência real, não é só uma coisa distante, um tapete verde distante que de repente tem lá uma queimada, eu faço uma matéria. Começa a se criar uma intimidade com a agenda da Amazônia. Se eu falasse

Page 72: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 2

três anos atrás assim, da Terra do Meio, no “Bom Dia Brasil”... Terra do Meio, o que é isso? É alguma coisa sobre o Senhor dos Anéis? (...)” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

Mídia está sensibilizada

Dois entrevistados chamaram a atenção para o fato de que a mídia nunca esteve tão sensibilizada e que os temas ambientais já vinham crescendo em importância na pauta dos meios de comunicação:

“Nunca a mídia esteve tão sensibilizada como agora. E quando falo mídia eu quero falar também dos sites alternativos, dos jornais alternativos, dos blogs que você tem hoje. Hoje, você está sendo bombardeado de todos os lados, não tem como você escapar.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“Todo mês a gente fala alguma coisa relacionada ao desenvolvimento sustentável. Está na pauta, todas as matérias tocam nesses pontos de uso de energia inteligente. Esse tempo, nós fizemos uma capa sobre moda, mas que não era (...) o que está na moda hoje. É usar tecidos sustentáveis, não consumir todas as coleções a cada temporada, comprar milhões de coisas, trocar o guarda-roupa, mas então destinar a bazar de caridade, fazer bazar de troca. Então mesmo em conteúdos aparentemente mais fúteis, como a moda, a gente tem essa preocupação de ter esse horizonte da sustentabilidade, de não exaurir os recursos. Esse tipo de questão é central para nós.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“Eu acho que é da natureza da mídia, porque é da natureza das pessoas, digamos assim, cobrir coisas que têm forte impacto. (...) Pode ser até bem alarmante, em determinados momentos; se tiver uma tendência jornalística mais sensacionalista, você pode usar isso de uma forma: ‘O mundo vai acabar’. Mas, de uma maneira geral, eu acho que a imprensa dá cobertura disso de forma muito séria, chamando atenção para o debate. Isso é tema hoje no mundo acadêmico. Qualquer cidadão mais esclarecido hoje, você fala de aquecimento global, está atento... A questão são as massas e com elas é só televisão, nem jornal adianta.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

Maioria não sabe como as metas de redução podem afetar sua atividade

A maioria dos entrevistados disse não saber exatamente como a adoção de metas de redução pode afetar a sua atividade. Os que responderam “sim” alinharam razões como “todo jornal precisa de árvores, se a celulose vem de madeira certificada ou não, não se sabe”, ou “para transportar jornais e revistas, usamos transporte”. Um repórter chegou mesmo a dizer:

“Sim, porque eu trabalho com o carro o dia inteiro na rua. Pode começar por aí, eu acho que sim.” (MÍDIA,C.F.,27, JORNALISTA)

Mas dois entrevistados mencionaram o “imposto de carbono” como uma medida, uma taxação que sem dúvida terá conseqüências tanto para o empresário do setor quanto para o consumidor de jornais e revistas:

“Eu acredito que muito em breve vamos enfrentar um imposto de carbono, sem dúvida isso vai afetar. Não sei de que maneira ainda, uma vez que o imposto não foi aplicado, leio alguma coisa sobre isso, as idéias de se cobrar um imposto sobre emissões são muito interessantes, mas parece que aplicação talvez não dê tão certo, não surta os efeitos necessários. (...)

Eu acho que o imposto de carbono realmente faz sentido: vamos encarecer a coisa de uma maneira que fique mais barato fazer um processo ecológico. Acho que, na prática, o que

Page 73: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 3

pode acontecer é todas as empresas embutirem o imposto, repassando o mesmo para o consumidor, aí, com o tempo a medida vira paliativa, ela acabou não gerando fruto.

Tenho certeza de que vai causar impactos, não tenho certeza sobre quais seriam, não me considero suficientemente informado em economia, tributação, para entender quais seriam todas as conseqüências a longo prazo.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

“Afetaria sim, por causa do transporte. A gente já fez inclusive cálculo de emissões de carbono para compensá-las, já temos um programa. A gente faz nossas emissões e compensa o carbono delas, então a gente sabe quanto carbono a gente emite por edição e o custo maior está no transporte, na distribuição, nos caminhões que distribuem as revistas.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

Mas fica claro que não há uma idéia formada sobre como as metas de redução poderão afetar o setor além dos depoimentos acima. As declarações abaixo mostram a fraqueza dos argumentos, o pouco domínio do assunto:

“Profissionalmente não, mas o problema não é minha atividade, o problema é a minha preocupação, é a minha visão de cidadania de proteção da sociedade, de oferecer para os meus filhos, para os meus netos e para as novas gerações uma sociedade melhor do que esta que nós temos hoje”. MÍDIA, M.P., 61, JORNALISTA)

“Não creio que vá afetar. Talvez, de uma maneira muito remota, sei lá, as pessoas tivessem que viajar menos. Os aviões também são agentes causadores de prejuízo ao meio ambiente e talvez fosse interessante ter menos gente viajando. Quem sabe isso traria algum tipo de problema para o jornalista na medida em que ele teria mais dificuldade de viajar. Mas não creio, seria muito remota.” (MÍDIA,J.M.,46, JORNALISTA)

“Não sei, eu acho muito difícil. Nesse nosso tempo, papel já esta sendo relativizado, tem reciclados, compensações, a imprensa virtual. O que a gente produz é conteúdo, informação, então se não for papel daqui a 20 anos, vai ser na internet.” (MÍDIA, L.S.,34, JORNALISTA)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

A grande barreira para enfrentar mudanças climáticas ainda é econômica

Seja porque os “interesses capitalistas” se contrapõem aos “interesses ambientais”, seja porque “ninguém quer pagar” a conta de preservar o meio ambiente, seja porque as grandes corporações “seriam prejudicadas com uma transição rápida”, para os nossos entrevistados sãos os fatores econômicos os entraves que devem ser enfrentados, se for desejável levar a cabo uma política do clima global com a devida firmeza que o tema, pela sua urgência, reconhecida por todos, merece. Examinemos os argumentos:

Quem paga a conta?

Cuidar do meio ambiente, prevenir desastres, tudo isto custa caro. Aqui, a idéia chave é a de que uma política climática é “economicamente inviável” porque ainda há fontes de financiamento disponíveis para ela:

“Quando você vai ver, economicamente ainda é inviável, ainda é muito caro. Isso eu acho que é uma grande barreira ainda. Preservar também custa caro. Tudo isso envolve muita grana e isso tem que ser colocado como prioridade para realmente investirem nisso. No momento, o governo brasileiro raciocina assim: se o mundo inteiro quer a Amazônia de pé, tem que pagar por isso. Mas parece que o mundo cobra isso do Brasil, e aí o nosso

Page 74: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 4

presidente diz que a prioridade é combater a pobreza, que não há dinheiro para tudo... Eu acho que todo mundo está convencido de que é importante, mas não sabe de onde sairá o dinheiro.” (MÍDIA, A.L.,45, JORNALISTA)

“Tem um custo inicial na transição energética. Hoje nem Bush nega mais o problema. Agora, as pessoas estão negando é a solução do problema... É uma tragédia, um problema sério, mas nós não podemos nos apressar porque, afinal de contas, nós temos uma economia, eleições, nós temos, enfim... A gente não pode colocar o carro na frente dos bois. Ainda existe uma realidade econômica que não pode ser afetada muito negativamente por essa transição energética que precisa ser feita. Porque sem dúvida a economia será afetada em um primeiro momento, embora no médio e longo prazo todo mundo só tenha a ganhar com isso. Mas esse custo inicial é um problema.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

Interesses das grandes corporações atrapalham

“Para alguns entrevistados, no entanto, não se trata de o país não ter poupança para cuidar da Amazônia ou para investir em energias limpas; trata-se sim “dos interesses e do poder das corporações”:

“São sempre os impedimentos econômicos. São sempre os interesses maiores das grandes corporações, multinacionais, que no fundo, no fundo são as que nos governam hoje, muito mais do que aqueles representantes que a gente geralmente supôs ter elegido. E a gente vê cada vez mais isso até quando a gente se surpreende negativamente com figuras que você elege em nome de certas idéias, e que ao chegar ao poder abdicam dessas idéias em 48 horas. Em nome do pragmatismo. Você acha que uma Petrobras vai concordar com uma taxação da gasolina ou do diesel? Que uma Shell vai concordar com metas de redução? As grandes corporações sabem que deverão fazer uma transição, mas no tempo delas. Assim é que é.” (MÍDIA, J.K.,58, JORNALISTA)

“Para mim os grandes impedimentos são as corporações. (...) Então vai ser mais caro, eu não vou instalar um filtro de poluição na minha fábrica porque eu não quero gastar dinheiro. Então o que eu faço? Eu internalizo esse gás. Eu não estou pagando, eu vou jogar veneno na atmosfera. Quem vai pagar? A sociedade em geral. Gente que está ficando mais doente. Isso é o que eles chamam de externalidade. Você pega a população e, para maximizar os seus lucros, externaliza todos os seus custos.” (MÍDIA, P.C., 31, JORNALISTA)

Mesmo quando descem do nível abstrato das “grandes corporações” para os empresários predadores, por exemplo, da Amazônia, o principal entrave é sempre de ordem econômica, “que é sempre pior na lógica do curto prazo”:

“A principal barreira é de ordem econômica. Aqueles que querem ganhar dinheiro a qualquer custo, por exemplo, o caso de exploradoras de madeira na Amazônia, querem ganhar o dinheiro imediato, fácil, eles não estão pensando no futuro, nem daqui a cinco anos, dez anos, nem daqui um ano. É aqui e agora. O principal oponente é a ganância daqueles que querem ganhar dinheiro mais rápido.” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

“Uma barreira que eu vejo é a equação econômica. Quer dizer, o sujeito que derruba uma mata na região Centro-Oeste e planta soja, ele, pelo menos momentaneamente, acredita que está gerando progresso.” (MÍDIA, E.G.,64, JORNALISTA)

“Sempre interesses econômicos. É o que rege o mundo, não é? Eu acho que enquanto não mudar um pouco esse pensamento, enquanto não mudar esse jeito de levar o mundo: a economia mandando em tudo impondo a filosofia de vida, de como é que se vive, eu acho

Page 75: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 5

difícil que a gente pense diferente, que o mundo pense diferente.” (MÍDIA, N.O., 61, JORNALISTA)

Posição dos Estados Unidos e “modelo americano” são barreiras

Os entrevistados acreditam que para onde a “águia americana voar”, voará o resto do mundo. Enquanto os Estados Unidos mantêm uma posição reticente, criam condições para que outros grandes emissores ajam sem grandes compromissos. O raciocínio é o seguinte: se “eles não estão dispostos a se sacrificar, por que nós?”:

“Acredito que sem a adesão americana nenhum programa terá sucesso.” (MÍDIA, J.L.D., 50, JORNALISTA)

“Eu acho que a maior resistência é por parte dos Estados Unidos; temem que esse tipo de restrição possa diminuir demais o crescimento econômico, sua base industrial. Nos Estados Unidos a cada dois habitantes existe um carro; imagina se você começa a dizer: ’Lamento, mas agora vai ser para cada cinco um carro’, imagina o impacto que isso tem na vida dos norte-americanos. Eu acho que o mundo ainda discute isso de uma maneira cautelosa; talvez preocupado em fazer alguma coisa, mas, ao mesmo tempo, temendo conseqüências das medidas. (...) A questão é como administrar as expectativas de consumo do modelo americano.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

“Os Estados Unidos poderiam liderar uma economia de baixo carbono e criar as condições tecnológicas para essa transição. (...) A Europa sozinha não pode dar o tom. Países como China, Brasil, Índia, estão aguardando a política americana. Se os ventos mudarem com Obama, talvez estejam criadas as condições para sair do discurso, criando um sentimento de urgência que absolutamente não tem eco nos Estados Unidos.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

A China na berlinda

Além dos Estados Unidos, a China também é citada como uma barreira para que os demais países se alinhem em uma atitude mais responsável diante do desafio climático:

“Os Estados Unidos do Bush são uma perda de tempo, a gente perdeu muito tempo nesses oito anos. E a China é uma coisa assustadora, a maneira com que está lidando com a questão, porque o modelo de desenvolvimento dela é completamente suicida para nós e para eles.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

“Uma clara barreira é a maior economia do planeta ter um governo que nega o problema, a existência do problema oficialmente. (...) Mas os Estados Unidos são os Estados Unidos. Enquanto ele não entra para valer na discussão, no mecanismo de desenvolvimento limpo, não entra no Protocolo de Kyoto.

Primeiro é desculpa para todos os que não querem fazer algo, e segundo fica realmente irracional. Se dos dois maiores emissores um não entrar por causa do governo, o outro porque é um país em desenvolvimento e tem o direito de poluir, então nós estamos conversando sobre o que aqui? A grande barreira tem nome: Estados Unidos e China.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

“A China inteira que funciona ainda a carvão e os Estados Unidos que não querem nem saber. É o pior entrave. Primeiro eu acho que é a China, o pior, e depois eu acho que são os Estados Unidos... Porque um bilhão de pessoas, como é que você faz? O país funcionando a carvão? Eu acho que são desafios muito grandes, são coisas muito difíceis de resolver.” (MÍDIA, N.O., 61, JORNALISTA)

Page 76: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 6

Falta vontade política

Nas várias declarações a seguir, o raciocínio dos entrevistados converge para a visão de que o governo brasileiro não está empenhado em mudar a política de ocupação na Amazônia, isto é, não quer pagar “o preço político” de fazê-lo. Entre “planejamento e crescimento”, o governo optou por crescimento, sem medir as conseqüências de longo prazo. A maioria mostra-se desanimada com o que está acontecendo na Amazônia e acredita que falta vontade política do governo e que as ações são eleitoreiras:

“A falta de vontade de fazer um planejamento coletivo para enfrentar isso, dos governantes, que entre crescimento e planejamento com crescimento, estão preferindo o crescimento.” (MÍDIA, L.A.N., 48, JORNALISTA)

“Não existe vontade política. Pelo contrário, existe negligência com o assunto, não há interesse real de transformar o potencial que temos numa indústria do turismo de uma forma inteligente, até para atrair divisas. Não há vontade política. O que existe é um interesse eleitoral e a Amazônia é até usada como moeda de troca nesse processo. Interesse real eu não vejo.” (MÍDIA, M.S., 46, JORNALISTA)

“Não vejo barreira nenhuma a não ser falta de vontade política. Não vejo barreiras, não vejo nenhuma resistência a isso. O Brasil é signatário do Protocolo de Kyoto e está em todos os fóruns internacionais discutindo essa questão. E a defesa do meio ambiente é uma bandeira do Brasil sim.

Então, eu acho que a mudança climática também. Eu não vejo barreira institucional, eu vejo barreira do ponto de vista prático, ou seja, ir da palavra à ação vai demorar muito ainda, porque os atores não estão prontos. O governo brasileiro ainda não conseguiu unificar uma ação, é só ver o caso das hidrelétricas, do São Francisco e tantos outros casos.” (MÍDIA, R.M., 65, JORNALISTA)

“Conter a expansão das nossas emissões implicaria mudar a política de ocupação da Amazônia. Eu não vejo o governo sinceramente empenhado nisso. É um preço político muito alto que se paga para isso. (...) Você vai ter que mexer no setor de pecuária, de agricultura, que politicamente anda delicado. É complicado.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

“As barreiras são muitas, mas a maior é que o próprio governo ainda não se mexeu, é só olhar para o que está acontecendo com a Amazônia, porque o Estado não está presente na região da Amazônia e a ausência do Estado faz com que aquilo seja uma terra de ninguém. As pessoas invadem, grilam etc. Falta de cidadania, de educação, de cultura das populações locais, que muitas vezes, até por ignorância e para poder viver, são capazes de ajudar a derrubar tudo lá. E não compreendem que a mata de pé seja melhor para a convivência deles.” (MÍDIA, H. B.,57, JORNALISTA)

O território é grande e nossa fiscalização é frágil

Um único entrevistado disse não acreditar na falta de empenho do governo. Para ele a questão é outra. O Brasil tem dimensões continentais, o território da Amazônia é enorme e o nosso sistema de fiscalização é frágil. Some-se a isso a ignorância da população local:

“Eu acho que a maior barreira para dar um jeito é a extensão do nosso país, pois é um continente (...), aliada a dois fatores importantes: a questão da nossa estrutura governamental, especialmente de fiscalização ainda muito frágil; também a falta de educação para essas questões de grande parte da população brasileira, e infelizmente de

Page 77: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 7

uma certa cultura de aceitação, de que as coisas são assim mesmo, de uma certa acomodação.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

Padrão de consumo também é identificado como entrave

Três entrevistados lembraram que o atual “modelo de desenvolvimento” é um entrave, pois dele deriva o padrão consumista, intensivo em energia, sintetizado na seguinte expressão: “quanto mais carro produzir e vender, melhor”:

“Vou voltar à minha tecla: consumo desenfreado e a idéia das pessoas de que a melhor coisa do mundo é você consumir e gastar mais energia.” (MÍDIA, P.C., 31, JORNALISTA)

“Muitas coisas já foram feitas em termos de melhorar os padrões de produção; eu tenho acompanhado avanços, mas ninguém toca no raio do consumo. Será que ninguém percebe que não dá para todo mundo ter carro?” (MÍDIA, R.M., 65, JORNALISTA)

“Acho que é todo um modelo de consumo e de vida baseado no desperdício. É ainda o modelo de desenvolvimento que não levava isso em conta; a idéia era mesmo desmatar a Amazônia, era desenvolver a Amazônia como foi desenvolvido o Sudeste do Brasil, pondo a Mata Atlântica abaixo. O modelo ‘quanto mais carro produzir e vender, melhor’, ainda é o modelo, então é difícil, estamos todos em um Titanic que é difícil mudar.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

Barreiras “culturais” também são mencionadas

Por fim, uma das barreiras estaria nas próprias características culturais do povo brasileiro.

Falta de educação, “certa cultura de aceitação, acomodação” (trecho acima reproduzido), falta de engajamento e ignorância são alguns dos nomes os entrevistados usaram para dizer que uma forte barreira para enfrentarmos os desafios impostos pelas mudanças climáticas é a nossa própria população, por eles identificada como “massas pouco esclarecidas” ou “pobres que precisam comer, e para eles pouco importa a floresta em pé” etc.:

“(...) Então a primeira questão é a falta de engajamento popular, e eu vejo que a pobreza é uma dificuldade. O tipo de engajamento que a gente precisa é mais fácil nas sociedades esclarecidas, nas sociedades educadas. Só que hoje essas sociedades têm cada vez menos gente. Onde é que mais cresce a população? Nas sociedades mais pobres, então como você fica? Como você vai produzir o engajamento das pessoas se tem aquelas que não possuem senso de coletivo, como a gente tem no Brasil?” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

“(...) também a falta de educação para essas questões de grande parte da população brasileira, e infelizmente de uma certa cultura de aceitação, de que as coisas são assim mesmo, de uma certa acomodação.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Taxar emissões e conscientizar a população são os melhores incentivos

Perguntados sobre que medidas e incentivos poderiam funcionar para que os atores se dispusessem a um maior engajamento no combate às mudanças climáticas, os entrevistados se dividiram em duas tendências majoritárias. A primeira, com 9 menções, pensa que “emitir carbono tem que se tornar uma coisa cara”:

Page 78: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 8

“Acho que vamos ter que tornar a emissão de carbono cara, acho que é o que vai funcionar. Temos que tornar mais caro você não emitir carbono do que emitir carbono. É só a partir daí que vai funcionar.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

Igual número (9 menções) considerou que o melhor incentivo é conscientizar os setores produtivos e a população em geral, provocando reações proativas no consumidor:

“Acho que é conscientizar, talvez seja utópico, mas informar cada vez mais a população e a população bem informada, cobrar dos governos, das corporações.” (MÍDIA, LEANDRO SARMATZ, 34, JORNALISTA)

“As pessoas não vão andar de bicicleta, mas elas vão comprar um carro a álcool, então o que a gente tem que fazer é oferecer carro a álcool para elas e informá-las o quanto estão contribuindo para o planeta, para o país ao fazer isso (...) o que você deveria estar buscando, o foco, na minha opinião, é criar um mercado de baixo carbono, mas para isso as pessoas têm que entender por que deverão pagar certos produtos mais caros que outros e aceitar fazer sacrifícios, mas isso só conscientizando...” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

“Acho que só tem um incentivo efetivo: que as pessoas tenham consciência disso, quer dizer: você vai viver melhor, o seu filho vai viver melhor. A preocupação com o próprio meio ambiente. Acho que não precisa você dar dinheiro, inventar facilidades ou isentar de imposto. As pessoas têm que ter consciência. Por que você limpa e lava a sua casa? Não é para você viver melhor? Você não come e toma banho para viver melhor?” (MÍDIA, E.P., 49, JORNALISTA)

Cinco entrevistados acham que se deve criar um “mercado interno” de crédito de carbono:

“Eu acho que o crédito de carbono é uma coisa boa, não conheço o suficiente, mas acho que é uma boa experiência e que junta a emissão de carbono com a vontade das pessoas de compensar de alguma maneira.” (MÍDIA, E.G., 64, JORNALISTA)

“Criar um sistema de créditos de carbono que incluísse os Estados e municípios, um programa federal que contemplasse toda a federação. Aí cada Estado e cada município teriam um sistema para beneficiar as empresas, sei lá, tinha que ser alguma coisa que mexesse com o mercado e com a política institucional de todos os Estados, se não, não teria um impacto significativo.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

Este sistema, na visão deste último entrevistado, poderia ser estendido aos cidadãos, e não somente às pessoas jurídicas:

“Créditos especiais para pessoas físicas, para que tomassem iniciativas. Através do BB e da Caixa Econômica Federal, poderia, por exemplo, facilitar a aquisição de energia solar, de bens com eficiência energética... Eu vejo, por exemplo, que é cada vez maior o número de casas que buscam energia solar e muitas delas inclusive buscando tecnologia caseira. Aqui no Sul de Santa Catarina, em Tubarão, tem um senhor que desenvolveu um aquecedor de água usando garrafas pet de dois litros e caixinhas de leite, a parte interna dessas caixas de leite, e funciona perfeitamente bem. (...)” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

Outra sugestão, mencionada por três entrevistados, foi a criação de incentivos fiscais para indústrias e produtos não poluentes.”:

Page 79: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

7 9

“Podia dar incentivo fiscal, por exemplo, para as indústrias. O governo podia incentivar, não cobrar impostos de determinados produtos para que eles substituíssem outros que não contribuem para o bem do planeta.” (MÍDIA, A.L.,45, JORNALISTA)

Mas três outros entrevistados acreditam que todas as empresas devem ser obrigadas a fazer “inventário” e as que mais emitem devem ter um programa de redução que leve à punição em caso de não-cumprimento. O que as empresas precisam é de “desincentivo para poluir”, segundo um deles:

“Infelizmente a mentalidade do brasileiro ainda funciona só com mexer no bolso. Mais do que incentivo tinha que ter punição. Porque aí sim as pessoas iriam se sensibilizar e começar a refletir realmente.” (MÍDIA, C.F., 27, JORNALISTA)

“Eu não sei se incentivo, eu acho que tinha que ser feito é um desincentivo, o governo tinha que desestimular a pecuária em área de floresta. Essas medidas de contenção de crédito para desmatador, o governo acabou de baixar. Se elas surtirem efeito, vai ser uma enorme contribuição. Então você não precisa incentivar nada, você precisa proibir, fazer os caras se enquadrarem.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

O terceiro entrevistado dessa corrente completa:

“Legislação adequada e ordenamento territorial: aumentar o plantio de árvore, nós temos território, reservas naturais grandes... E fazer um zoneamento ecológico, por exemplo, começando por ordenar o plantio de soja. Isso é uma saída inteligente para essa questão: fazer certo zoneamento agrícola, ou seja, soja plantada a partir desse paralelo tal, ela passa a ser condenada pelo próprio país; ela é taxada, ela paga um imposto exorbitante, coisas desse tipo, que evitem que a agricultura avance sobre áreas que a gente não deseja.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

Outra sugestão foi a de se aumentar os investimentos na recuperação do meio ambiente e apresentar uma agenda de desenvolvimento de baixo carbono, ancorada em uma política nacional do clima (duas menções). Isso teria um efeito de sinalizar claramente quais são as regras do jogo. Na opinião desses dois entrevistados, o próprio mercado reage quando a legislação é clara e os mecanismos de financiamento para a conversão em produção menos poluente ficam definidos:

“O próprio mercado tende a criar barreiras contra os chamados poluentes, os emissores. (...) Então, por exemplo, você usar coisas com madeira não-certificada, o passo para isso é diminuir, chegar a um ponto que só mesmo produtor ilegal vai usar madeira não-certificada.

Segundo, o caso da indústria em si já virou até um instrumento de marketing: quanto mais sustentável é o seu produto, mais você divulga isso, como uma responsabilidade social também. (...)

Quer dizer, então o próprio mercado está agindo para que você aumente o número de empresas que ajam responsavelmente em relação ao meio ambiente, o ambiente social. O mesmo vai acontecer com o carbono. Vai ser um fator de competitividade. Eu vejo mais dificuldade é no setor público.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

“Falta uma política brasileira, nacional, que diga claramente qual é o programa. Não dá para ficar passivo. O incentivo é o governo se engajar, colocar para funcionar uma força-tarefa e fazer aprovar uma lei no Congresso que possa coibir, por exemplo, licenciamento de usinas a carvão, coisa que estão fazendo por aí...” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALSITA)

Page 80: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 0

Por fim, diz um entrevistado, deve-se investir em transporte público sustentável, baseado em biocombustíveis, nas grandes cidades. Seria uma maneira de convencer as pessoas a abdicar do veículo individual:

“Poderiam ser criados incentivos de várias ordens que dependem de investimento e de mudança de mentalidade, por exemplo, devia se incentivar cada indivíduo a usar transporte coletivo, mas para isso precisa ter transporte coletivo bom, que o sujeito se sinta realmente motivado a deixar o carro em casa e pegar o metrô. E mudar a matriz energética do transporte coletivo também, né?” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

O governo é quem deve liderar

Vinte e quatro entrevistados apontaram o governo como o ator que deve ser mais engajado no processo de enfrentamento das mudanças climáticas, bem como o líder da nação na busca de um desempenho responsável nas questões climáticas. Em segundo lugar ficaram, empatados, as empresas e os meios de comunicação (com sete menções cada um). Apenas dois entrevistados fizeram referência à sociedade “em segundo lugar”.

Embora acreditem que é o setor produtivo que tem a “responsabilidade ética e moral” de reduzir as emissões, a opinião dominante é a de que é o governo que tem que fazer o seu papel primeiro, criando os marcos legais:

“Nenhum ator é mais importante que o governo, pois, sem governo, nenhuma ação seria possível; a mídia, por exemplo, onde eu atuo, não é tão importante quanto o governo, pois ela não tem o poder de decidir e implementar políticas; seu papel fundamental é na formação dos cidadãos e na difusão de informações a respeito desses assuntos.” (MÍDIA, W.B., 44, JORNALISTA)

“É o governo, porque se você ficar cobrando isso das pessoas elas não vão se engajar, e por mais que eu ache que a culpa não é do governo, se este não fizer, ninguém vai fazer, é uma visão pragmática. (...) As empresas têm uma responsabilidade ética e moral de fazer isso? Têm. Já sabemos que a questão é de vida e de morte, mas eu não posso apostar que as empresas vão fazer isso. Então não dá para contar com elas. Tem que ser o governo a dar o primeiro passo, a liderar a mudança”. (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

“É o governo através de programas e projetos federais, e medidas socioeducativas, campanhas ampliando a informação, criação de novos projetos de lei voltados para essa questão ambiental e até mesmo com penalidades, com multas mais severas; a iniciativa privada fazendo seu dever de casa, apoiando e mesmo patrocinando ações de ONGs e até de pessoas físicas que tenham essa concepção, essa preocupação de melhorar essa questão ambiental; e nós com coisas pequenas no dia-a-dia. Cabe a cada um de nós fazer diferença.” (MÍDIA, C.F., 27, JORNALISTA)

Todas as instâncias de governo devem atuar

Para três entrevistados, o engajamento não deve ser cobrado somente do governo federal. Todas as esferas têm o seu papel e devem atuar de maneira coordenada:

“Todos os governos, claro. Quando eu falo, não é só o governo federal, é o governo da Amazônia, de São Paulo, do Rio de Janeiro, todos os que são emissores e possuem

Page 81: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 1

grandes mercados consumidores da madeira que se tira de lá. E tem que ter poder polícial atuando, até as forças armadas...

Então as instâncias federais e estaduais deveriam trabalhar em conjunto montando os mecanismos de coibir todo comércio de produtos ilegais. A Amazônia é destruída para nós mesmos. É um mito dizer que a madeira sai daqui para o exterior. É tudo consumido no Rio, em São Paulo, no sul do país. (...) Depois do governo, o empresariado, é claro...

Então acho que o empresário deveria assumir a liderança porque, na verdade, o que está em jogo é o mercado para ele. (...) Dentro da cadeia produtiva tem que acontecer esse conflito, o bom conflito, o bom combate para isolar quem se comporta de maneira inadequada.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

Parceria com as empresas

Para os entrevistados que apontaram a importância das empresas, elas teriam peso tanto político quanto econômico. Além disso, como as mudanças climáticas fazem parte de uma agenda global, mais do que os governos nacionais, as empresas têm um papel que não se pode subestimar:

“Eu acho que você tem dois atores chaves, dadas as condições inclusive da história política brasileira. Tem de um lado os atores políticos e estatais; sem o concurso deles é quase impossível fazer qualquer coisa no Brasil, porque o Estado é muito poderoso. (...) Do outro lado temos o setor privado brasileiro, que se acostumou por longo tempo a dizer o seguinte: eu só faço aquilo que o Estado manda e, na ausência da ordem estatal, eu desconsidero. (...)

Então o setor privado brasileiro tem que constituir lideranças que comecem a defender a tese de que o aquecimento global vai obrigar as empresas a irem em outro compasso, além daquilo que lhes é pedido. O engajamento desse setor é crucial para essa história avançar.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

“Olha, eu acho que são as empresas. O governo é óbvio, mas é quase tão importante as empresas se convencerem, as principais empresas, as maiores empresas, no mundo inteiro e no Brasil. Com algumas exceções, é claro, em geral as empresas têm influência e credibilidade, afinal são elas que movem a economia e influenciam inclusive o consumidor. Acho que o aparelho de Estado, legislação, de uma maneira geral, tem o seu papel. Também uma ou outra coisa, a mídia, eu acho que a mídia tem o seu papel, mas menos importante que os dois atores que citei: governo e empresários.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

Consenso se faz de baixo para cima

Para quem mencionou a sociedade, o cidadão comum, como ator importante, o argumento é o de que um “consenso se forma de baixo para cima”, e não o inverso:

“Eu acho que o principal ator seria o cidadão. Não adianta ONG, não adianta o governo, não adianta Ibama, não adianta nada se você não motivar o cidadão. Eu acredito que as mudanças começam de baixo para cima e não de cima para baixo. (...) Nós estamos transferindo isso pros cargos eletivos e tal, apostando que eles vão mudar, e não mudam. Não mudam porque nós os colocamos lá e nós não acompanhamos o que eles fazem, não fiscalizam nada. Então o grande ator é o cidadão.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

Houve quem apontasse que o ator mais importante é o próprio indivíduo:

“Para alguém de imaginação que um dia acreditou no homem novo, eu gostaria de insistir com você que só tem uma mobilização possível que é a conscientização de cada indivíduo,

Page 82: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 2

que isso é necessário. É acreditar minimamente que as pessoas possam ter consciência de que isso é necessário, de que isso vai depender de cada uma delas.” (MÍDIA, J.K., 58, JORNALISTA)

Todos devem se engajar

Por fim, um entrevistado disse que é a ação orgânica de todos os atores que vai fazer a sociedade tomar uma direção diferente da atual. Ele inclusive antecipa a emergência de uma “cidadania planetária”:

“Acho que o governo federal e a sociedade civil, desde o cidadão comum, a imprensa e as empresas. (...) Acho que é uma ação conjunta, orgânica que vai fazer diferença. Enquanto atores isolados estiverem dando o tom não vai adiantar. Acho que tem uma cidadania planetária aí se formando, é algo que vai transcender a coisa do país.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“O governo, sobretudo e em primeiro lugar, porque o governo tem um papel central, fundamental porque tem o poder de policia. Acho que vamos ter que usar do poder de policia no sentido mais abrangente do governo para acabar com o desmatamento da Amazônia. Depois do governo, todos nós, empresas, ONGS, cidadãos comum, civis, tudo.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

Os países não sabem ainda como enfrentar as mudanças climáticas

Para os jornalistas e profissionais de mídia ouvidos, o que se vê na esfera internacional é “muito discurso e pouca ação”:

“Muita notícia, muito discurso, muita entrevista e zero de ação. Esta aí o Protocolo de Kyoto que não deixa mentir. Após quase 15 anos, caducou sem ter sido implementado direito. Com a recusa dos Estados Unidos de ratificá-los perdeu força, não cumpriu seu papel. A questão chave agora é o biodiesel, e a competição pela liderança na produção desse tipo de combustível. (...) A questão chave é o tipo de energia que se vai usar daqui para frente e reduzir emissões... Como fazer isso sem causar colapso nas economias, ninguém ainda sabe.” (MÍDIA, A.D., 63, JORNALISTA)

Um deles foi enfático ao afirmar que, para compreender como a questão está sendo tratada na esfera internacional, é preciso regionalizar a análise:

“Em algumas regiões do mundo se dá muita importância para isso, em outras pouca importância e em outras nenhuma. Então, eu creio que é preciso regionalizar a importância do tema. Nos Estados Unidos é apenas importante, na Europa é muito importante, no Japão é muito importante, mas, se você pega o Brasil é mais ou menos importante, na África não tem importância nenhuma, na Ásia eu diria que, salvo alguns lugares, também não tem importância nenhuma.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

Bonzinhos e malvados

Para 11 entrevistados, portanto mais de um terço dos ouvidos na sondagem, há claramente “dois partidos” na questão climática: os que não querem fazer sacrifícios e os que não têm escolha; estes se passam por “bonzinhos”, aqueles são vistos como “malvados”:

“O mundo se divide entre os bonzinhos que falam, discutem e recriminam as emissões de dióxido de carbono, que participam de reuniões etc., e os malvados, os Estados Unidos, a

Page 83: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 3

China e a Rússia, que têm altas emissões e que não assinam nenhum tratado de redução das emissões. Mas, na realidade, muito alarde é feito e pouca ação implementada.” (MÍDIA, W.B., 44, JORNALISTA)

“Mais ou mais ou menos como o lobo tratava o cordeiro. A grande potência mundial que são os Estados Unidos não dá bola para isso. Façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço. Então as grandes potências anulam qualquer esforço dos demais.” (MÍDIA, C.C., 70, JORNALISTA)

Lentidão e falta de ações concretas

Muitos entrevistados dizem sentir angústia, pois, “se o problema é tão grave quanto alardeiam”, as ações estão lentas demais. Falta mais empenho, mais ações concretas, palpáveis:

“Acho que se está discutindo muito. Está se falando muito, coisa que até há uns cinco, seis anos atrás não era tão forte, mas acho que as decisões ainda estão muito lerdas, estão muito devagar, acho que precisariam ser mais incisivos nessa questão.” (MÍDIA, A.C., 48, JORNALISTA)

Este segundo entrevistado observa que “há uma escolha civilizatória” envolvida no processo de decisão que precisa ser feita:

“Em termos de exposição na mídia acho que está bom, o tema está muito na mídia.

Em termos de ação está ruim, vejo muito poucas ações concretas de diminuição e acho que a gente anda focado demais na questão de emissão de gases. Acho que a questão é muito maior do que o aquecimento global. (...)

É uma questão de escolha civilizatória, de como a gente se vê como espécie. Somos tão predadores que não conseguiremos nos descolar dessa natureza nem mesmo diante dos impasses colocados pelo aquecimento global?

E completa, citando uma ação concreta que considera “uma contribuição do Brasil”:

(...) Precisamos de mais ação, tecnologias menos agressivas. Eu acredito, por exemplo, que a maior contribuição que o Brasil deu ao aquecimento global foi inventar o carro flex. Mas essa foi uma ação indireta, não governamental. Eu acho que os governos deveriam estar investindo pesado nesse tipo de iniciativa, em tecnologias menos agressivas, talvez mais do que em impostos sobre o carbono, por exemplo.” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

A preocupação não tem sido compatível com o grau de ação

Os depoimentos abaixo seguem a mesma linha de argumentação:

“A taxa de preocupação é muito maior do que a de ação e a taxa de ação é muito maior do que a taxa de efeito. Você tem então três fatores desconexos. A preocupação não está compatível com o grau de ação.

O grau de ação não é compatível com o grau de efeito, até porque fenômenos naturais interferem para que os efeitos sejam muito graduais depois que ação é deflagrada. O mundo ainda não experimentou o cenário mais dramático, então se faz especulações, e aí uns acreditam que a coisa é para amanhã, outros que vai demorar uns anos, que dá para fazer uma 10 reuniões de Bali...

O mesmo entrevistado afirma que o dilema se resume à seguinte pergunta: “quanto eu tenho ainda o direito de desenvolver, crescer ou manter a minha economia no quadro do velho modelo”?

Page 84: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 4

(...) Há uma discussão, um dilema muito grande nos países em desenvolvimento entre o quanto eu tenho direito a desenvolver em detrimento daquilo que me pedem para preservar. Esse é um dilema que está em dois terços, três quartos do planeta. Rússia, China, Brasil, Índia, toda a América do Sul, toda a Ásia.

Quem não está vivendo esse dilema é porque já fez isso no passado sem vivê-lo, dizimou as suas reservas naturais, até porque não havia essa discussão: a Europa como um todo e os Estados Unidos.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

Europa tem atitude mais moderna

Enquanto as menções à posição americana nas discussões sobre emissões são fortemente criticadas, a Europa é vista como “vanguarda” no enfrentamento das mudanças climáticas. Embora poucos façam menção a países individuais, a Europa estaria “fazendo a sua parte”:

“Tem países que levam isso a sério, por uma questão que eles acreditam estratégica, tanto de redução de danos atuais e futuros quanto de competitividade industrial. A Europa é o melhor exemplo. Ela, sob um comando mais unificado devido à União Européia, está limpando seu parque industrial e energético desde a crise do petróleo de 70, e se desenvolveu bastante nessa área de tecnologia limpa. Então, eles querem garantir que seus esforços não serão inúteis...

Para o autor desta afirmação, a Europa está enfrentando de forma mais competitiva que os Estados Unidos a questão do baixo carbono, e a velha disputa entre potências vai se repetir no quadro da “segurança climática”:

“(...) se tem claramente um grupo de países que têm a ganhar economicamente com medidas de redução de emissões é a Europa. Os Estados Unidos têm muito a ganhar também, mas eles têm indústria mais suja, menos eficiente, mais pautada pelo desperdício e pela abundância de petróleo...

Não falta petróleo... Lá eles simplesmente invadem um país no Oriente Médio, conseguem o petróleo deles, é diferente da Europa, e então para o governo americano até agora não há interesse, como todos sabemos, em reduzir emissões.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

Este segundo entrevistado destaca o caso da Alemanha:

“Eu acho que a Europa como um todo tem uma atitude mais moderna. A Alemanha tem feito um esforço importante. Países pequenos fazem coisas interessantes, mas a Alemanha é uma grande economia, exportadora de tecnologia, então ela é relevante.

Eu acho que ela está fazendo o esforço de mudar a matriz energética, de investir em fontes realmente alternativas e de lutar contra as emissões de suas empresas. No contexto europeu, claramente os exemplos são Alemanha e Holanda, mas eu destaco a Alemanha pela sua importância geopolítica.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

O Brasil poderia exercer um papel de liderança no bloco dos países emergentes

Para renomada jornalista, especialista em questões econômicas e políticas, o Brasil tem assumido uma postura “velha, diplomaticamente falando” e está perdendo a chance de ser uma nação líder:

“Eu acho que o Brasil tem uma posição velha diplomática, tem uma visão norte e sul do problema, quando o problema não é mais norte e sul. (...) Ela deixa de colaborar, ter liderança, ela apequena o nosso papel que poderia ser muito maior dadas as virtudes

Page 85: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 5

ambientais que nós temos diante de um mundo que já destruiu suas florestas naturais, que não tem uma solução vegetal para o combustível dos carros.

A gente poderia ter uma dianteira maior nisso se a gente tivesse uma visão mais ousada na diplomacia. Eu acho o Brasil equivocado. Acho equivocado quando defende que os países em desenvolvimento têm o momento deles.” (MÍDIA, M.L.,54, JORNALISTA)

Há avanços, apesar de tudo

Embora tenham sido poucos na amostra, apenas três, esses entrevistados têm uma visão menos crítica a respeito dos demais países, com exceção dos Estados Unidos e da China, considerando que “há avanços”:

“Se você tirar a China e os Estados Unidos, os outros grandes países emissores me parece que têm tido uma postura pró-ativa, a partir do Protocolo de Kyoto, estabelecendo um percentual de redução até um determinado ano. A maioria desses países tem conseguido investir na transição sem traumas. O próprio Brasil, apesar de ainda ter alguma dificuldade em estabelecer voluntariamente metas de redução, vai estar em uma outra faixa de diminuição brevemente.

Não tem como ser diferente. Eu acredito que a humanidade se já deu conta do problema, ainda que com um certo atraso, da importância e necessidade da redução dessas emissões.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

“As sociedades em vários níveis estão se movimentando, ou seja, empresários estão começando a entender que isso vai ser uma coisa inevitável, alguns estão começando a acreditar que dá para ganhar dinheiro com isso, outros acham que não, mas é inevitável.

A comunidade científica tem um peso muito grande hoje em dia, porque ela já consegue mostrar muito claramente o preço que se paga por não fazer nada. Você tem uma pressão popular razoável, pois a consciência é recente.

Eu fui nos últimos encontros em Bali, por exemplo, claramente você tinha uma pressão pública em geral para que o mundo se organize de alguma maneira para controlar isso. As coisas estão caminhando e a gente está nesse ponto, de assumir um a posição mais firme.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE "DESMATAMENTO EVITADO"

Proposta precisa ser mais efetiva

No que se refere à proposta de “desmatamento evitado” que o Brasil levou para a última reunião de Bali, metade dos entrevistados disse não conhecer e oito disseram não lembrar em detalhes seu conteúdo.

O restante emitiu opiniões diversas, mas predominou o ceticismo em relação à sua “eficácia”:

“Acho que essas propostas que o Brasil faz ficam muito mais no campo teórico do que no campo prático. Há uma coisa virtuosa que é envolver a iniciativa privada na conservação das florestas etc. Mas acho que isso é como se nós quiséssemos aprender a fazer a raiz quadrada sem tabuada. Nós temos que fazer a nossa tabuada, que é impedir a progressão do desmatamento e da derrubada.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

Page 86: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 6

O próprio governo não gosta da proposta

Para um dos entrevistados que mostrou ter conhecimento técnico da proposta, ela não foi discutida adequadamente nem mesmo entre os membros do governo, e, além disso, é difícil de implementar:

“Se você chamar isso que foi proposto de desmatamento evitado o pessoal do governo vai te bater. Eles não querem ouvir de desmatamento evitado, eles chamam de redução compensada da taxa de desmatamento. (...)

Em primeiro lugar, com quem foi discutida essa proposta? O pessoal do Ibama odeia, não tem como implementar.

Arbitrariamente escolhem uma taxa que é bem alta, 10, 11 mil quilômetros quadrados como sua meta e dizem que as pessoas, quem quiser pode contribuir voluntariamente com o fundo para ajudar o Brasil a reduzir essa taxa abaixo do limite altíssimo, e a única coisa que você dá em troca é um diploma para quem botar dinheiro no seu fundo?

Enfim, pode ser que aconteça, mas eu não vejo isso indo muito longe sem um mecanismo de mercado pelo qual as pessoas ganham alguma coisa para contribuir com essa redução.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

O Brasil precisa de recursos para proteger a Amazônia

Para um dos entrevistados, o Brasil precisaria ter algo para pôr na mesa, pois a verdade é que conservar custa caro e é preciso encontrar formas de financiar o custo da conservação:

“Temos que ter uma solução diplomática, econômico-financeira para nos financiar a proteção da Amazônia. Custa caro proteger a Amazônia. Mas todo o raciocínio do governo é ruim. (...)

Nós estamos apenas em um momento de queda do desmatamento que pode ser véspera de uma nova onda de alta. Até porque nada mudou radicalmente.

Então, discutir algum mecanismo que dê valor à proteção da floresta, para que a gente financie a proteção da floresta, é crucial. Custa muito caro, ela é muito grande: são 25 mil homens do exército lá e eles não sabem o que fazer, ficam batendo cabeça. (...)

O fato é que aos trancos e barrancos protegemos 80% da floresta. Outros não conseguiram.

Mas o que temos é frágil, a estrutura de proteção precisa melhorar. Essa idéia apresentada pelo governo brasileiro em Bali é a seguinte: criar um fundo, eu deixei de desmatar, portanto deixei de emitir. É uma coisa assim: eu deixei de desmatar, o meu vizinho também; então, por favor, você me dá dinheiro.

Eu não compro muito essa lógica. A gente tinha que ser mais criativo do que isso e tentar explicar que a gente precisa de financiamento mesmo, porque é um trabalho que demanda recursos.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

Há um foco excessivo na Amazônia, podemos ter outras contribuições

Finalmente, outro entrevistado, que não demonstrou conhecer muito bem a proposta do desmatamento evitado, disse que há um foco excessivo na Amazônia, e que o governo perde uma enorme “janela de oportunidades” em não priorizar a produção de biocombustíveis:

“Desmatamento evitado pode ser uma parte do processo de zerar o desmatamento, reduzir emissões. Eu acho que a gente consegue em cinco anos chegar bem perto do zero, as

Page 87: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 7

emissões brasileiras vêm caindo muito. (...) O Brasil tem uma enorme janela de oportunidades porque tem capacidade de fazer biocombustível de segunda geração. (...)

Podemos melhorar nossa matriz energética, que ainda é altamente limpa, e nós podemos mantê-la assim. Temos muito espaço para fazer energia solar, eólica e complementar com biocombustíveis. (...) O Brasil tem tudo para ser uma das potências mundiais da bioeconomia do século XXI. Podemos contribuir muito para uma economia mundial de baixo carbono.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

14. CONFERÊNCIA DE BALI

Pouca repercussão

A maioria afirmou não ter acompanhado. Onze entrevistados declararam que só conhecem o que eles próprios noticiaram ou que acompanharam apenas pelo jornais, ou ainda se queixaram da quantidade de material que é preciso ler para se manter informado. Nesse grupo, alguns adotam uma perspectiva otimista, concluindo que “houve avanços”, e outros se manifestam descrentes de “reuniões como essas”.

Em geral, a visão otimista baseia-se na idéia de que não há outra via que não a negociação exaustiva, e que a questão é complexa:

“Ainda que alguns achem que a reunião não foi muito conclusiva e que a maior parte dos países aproveitou para fazer marketing, eu acho que sempre é um avanço, porque você chama a atenção da opinião pública mundial.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“Para o que ela se propôs, ela teve um excelente resultado. Ela não fechou nenhuma porta e as negociações continuam; e o mundo tem mais dois anos, um ano e tanto para produzir um acordo que substitua Kyoto depois de 2012. Agora, esta longe de ser uma negociação de algo que posso resolver definitivamente o problema.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

“Muito bom, porque se definiu melhor a agenda. (...) Muita gente saiu de lá tendo a impressão que saiu sem nada na mão, mas é porque tinham criado falsas expectativas, de sair de lá com um acordo, ninguém entrou naquela conferência para sair com um acordo.

É um processo que leva no mínimo mais uns dois anos. Foi muito bom porque ali algumas coisas foram mostradas claramente: vamos trabalhar com a perspectiva lançada pela União Européia de reduzir 40% das emissões até 2050. Vamos trabalhar com a perspectiva de remunerar países e ricos em florestas que reduzirem o seu desmatamento, então foi muito bom para dizer qual é a agenda. A discussão está encaminhada.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

Para os pessimistas, que disseram considerar que Bali teve “resultados fracos”, os argumentos giram em torno da idéia de que essas reuniões são caras, lentas e burocráticas, e que seus frutos decepcionam:

“Eu tenho uma certa descrença em relação a essas conferências. Quando eu vejo a Rio 92, acho que Bali, depois do último IPCC, tinha que ter mais impacto. (...) Sei que vários países, individualmente, estão fazendo alguma coisa, ou estão seguindo uma norma, ou estão buscando soluções. (...) Mas quando chega numa reunião dessa não há união, então ficamos desanimados. Falam que dois anos é pouco, mas será que podemos esperar mais dois anos?” (MÍDIA, L.H.Y., 49, JORNALISTA)

“Foi uma reunião que terminou muito pobre, perto do que poderia ser se tivesse algum avanço mais significativo. Mas é isso, quando você tem muitos grupos de veto é muito difícil para você chegar a uma posição satisfatória, é muito difícil, senão impossível. Eu

Page 88: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 8

vejo como uma luzinha muito tênue, que foi possível com muito esforço, teve uma certa entropia, gastou-se uma enorme energia política para obter um pequeno beneficio de avanço, que foi evitar que o Protocolo de Kyoto deixasse de vigorar diplomaticamente, e que a gente voltasse ao quadro da convenção do clima que não tem nem o que o Protocolo de Kyoto tinha. (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

“O que resultou de Bali concretamente? Que jequitibá deixou de ser derrubado? Que mico não foi extinto? Que planta não foi queimada? (...) O mundo, os Estados estão muito preocupados em discutir e talvez impotentes ou desinteressados em agir. Eu acho que algumas coisas básicas sobre o clima já são tão consensuais, tão claras, que já poderiam ter ações globais e de Estado mais afirmativas. (...) Você tem três estágios: a preocupação, a ação e o efeito da ação, muitos distantes entre si. Bali não acrescentou nada: saímos de lá com uma agenda, o que vai acontecer em 2 anos ninguém sabe.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

A primeira responsabilidade do Brasil para com o mundo é conservar a Amazônia

Nada menos que 18 entrevistados (quase dois terços da amostra do setor) consideram que a maior responsabilidade brasileira é cuidar da Amazônia, impedir sua destruição “da maneira estúpida” como vem ocorrendo. Segundo nossos entrevistados, o atual desmatamento da Amazônia e as queimadas não trazem desenvolvimento nem para a região, nem para o Brasil, e muito menos para o planeta. O segundo lugar coube às reformas na matriz de transportes. Aumentar a utilização de energias renováveis ficou em terceiro lugar. Neste último quesito, abrem um largo parêntese para discorrer sobre etanol e biocombustíveis.

De certo modo, a declaração abaixo resume o ponto de vista da maioria dos entrevistados, no sentido de que, para eles, há uma grande “obrigação” de conservar a Amazônia, mas isso não nos exime das “pequenas contribuições”, da procura incansável por adotar padrões mais compatíveis com o desafio do clima:

“Temos que controlar a queimada na Amazônia, esse é o grande ponto. É daí que vem a nossa contribuição. (...) Mas isso não nos impede, não nos desobriga das pequenas contribuições, de trocar o papel, de produzir uma gasolina com menos chumbo, trocar a frota para etanol e coisas assim. (....) A começar com o número de carros em São Paulo, que é um grande emissor de CO2, a gente sabe disso.

Não é o principal causador de CO2, do efeito estufa; no Brasil a principal fonte de emissão não vem dos carros, mas eles estão jogando gás carbônico na atmosfera e, além disso, tornando a vida das pessoas absolutamente infernal. Tem sentido?

A gente já tem tecnologia para isso não acontecer, a gente tem tecnologia para isso, como é que a gente vai fazer para eles não jogarem?” (MÍDIA, S.G., 30, JORNALISTA)

Para alguns dos entrevistados, basta ao Brasil sair do “ranking de maiores emissores” e conservar seu capital ambiental. Desse modo, o país se alçaria a uma posição confortável para trabalhar pela sustentabilidade sem tanto “constrangimento político”:

“Eu acho que a primeira responsabilidade do Brasil é sair do ranking de um dos quatro maiores emissores de carbono. Porque se ele sai disso, simultaneamente ele salva a floresta, porque a queimada da floresta é que nos coloca nessa posição. Então, eu acho que nós, assim que impedirmos a queimada da floresta, nós saímos desse ranking e

Page 89: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

8 9

seguramos o nosso capital. As pessoas têm que entender que a floresta amazônica é um grande capital e não um ferro-velho de que nós temos que nos livrar. Pelo contrário.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“Eu acho que, enquanto a gente não tiver uma política pública para ao Amazônia, a gente vai contribuir demais com o aquecimento global, e acho que o brasileiro ainda não tomou consciência disso: ele ainda não sabe, ele não tem informação, a informação, quando ela aparece, ela é muito escamoteada, ou complexa demais. Se cuidarmos da Amazônia, vamos nos livrar do constrangimento político e fazer um bem enorme ao país e ao orgulho do brasileiro (...).” (MÍDIA, A.C., 48, JORNALISTA)

Um jornalista diz que é preciso cuidar da tendência, pois nos últimos anos nossas emissões cresceram e, infelizmente, as emissões não estão gerando riqueza. Trata-se, portanto, de uma tendência perversa:

“O Brasil precisa reduzir a zero o desmatamento ilegal na Amazônia, porque mais de 70% das nossas emissões vêm do desmatamento e, além disso, 50% é desmatamento criminoso.

Então o Brasil já faria muito se fizesse cumprir a lei no seu território, coisa que não faz.

Agora precisamos prestar atenção nos seguinte: o Brasil tem crescido muito, as emissões brasileiras nos últimos dez anos cresceram acima do PIB, então o Brasil está poluindo mais que gerando riqueza, mesmo no setor florestal.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

O raciocínio de que o Brasil não explora a Amazônia de uma forma inteligente é amplamente ecoado pela maioria dos entrevistados:

“O Brasil tem responsabilidade porque é um país muito grande e é ambientalmente um país muito importante. A gente tem uma matriz energética maravilhosa e as nossas emissões se dão por desmatamento, o que não é uma vantagem para a gente. Então, reduzir o desmatamento seria vantagem para a gente, independentemente do aquecimento global, que desmatamento hoje é destruição de um recurso natural muito precioso para gente. A gente tem floresta que poderia produzir madeira tropical, que é um produto caro, valorizado. A gente simplesmente permite que essa floresta seja destruída e não aproveitada de forma inteligente. (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

Como mencionamos no parágrafo inicial, depois da floresta as menções à emissão derivada de carros também foram enfáticas e possuem basicamente dois argumentos: reduzir a quantidade de chumbo na composição da gasolina e ofertar transporte público não poluente (metrô e trens):

“As responsabilidades seriam, em poucas palavras, controlar as queimadas, as derrubadas de florestas e controlar a emissão derivada dos meios de transporte.” (MÍDIA, W.B., 44, JORNALISTA)

“A primeira coisa, e eu acho que é uma coisa relativamente fácil, mas que afetaria boa parte da população, é a questão dos carros, porque a gente sabe que eles são grandes responsáveis, depois das queimadas. (...)” (MÍDIA, C.F., 27, JORNALISTA)

“(...) O Brasil podia fazer várias coisas, a começar, por exemplo, por conseguir regular de forma eficaz toda sua frota de carros. Nossos carros são ainda muito poluentes. (...) O Brasil deveria, como qualquer outra grande cidade, ou grande país, investir em transportes públicos com energia não poluentes. Por exemplo, cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre deveriam ter dez, quinze, vinte, linhas de metrô. (...) O trem que é menos poluente é menos perigoso, praticamente todo o transporte de carga no Brasil poderia ser feito de trem.” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

Page 90: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 0

Dois entrevistados mencionaram a necessidade de disciplinar a agricultura, pois “o desmatamento e as queimadas não ocorrem sozinhos”. Para este entrevistado há um foco excessivo nas madeireiras e faz-se “vistas grossas” para o avanço da soja e da pecuária na Amazônia e no Pantanal brasileiro:

“Acho que devemos olhar a questão da agricultura também, acho que tem uma região muito grande do Brasil que está começando a ser explorada para pecuária e agricultura: o madeireiro está interessado em cortar e vender, quem queima é o agricultor para plantar ou o pecuarista. (...) Nessa questão da responsabilidade do Brasil, é o corte das florestas e queimadas e controlar o avanço da fronteira agrícola, uma coisa não dá para separar da outra.” (MÍDIA,R.M., 48, JORNALISTA)

Somente um entrevistado disse que “o Brasil já vem contribuindo”:

“Olha, se a gente for comparar, eu acho que a gente está contribuindo bem. Eu acho que a gente tem a questão do desmatamento, das represas que geram grandes impactos ambientais, inclusive geram gases na fase inicial, quando cobrem massas florestais. Mas o debate existe, vamos cumprir nossas obrigações dentro de um quadro complexo em que vivemos uma espécie de demanda reprimida por crescimento. Não temos dinheiro para fazer tudo rápido, ninguém tem, talvez aos países ricos. Eu acho que o Brasil não está indo mal.” (MÍDIA,P.C., 31, JORNALISTA)

Um entrevistado diz que se conseguirmos explorar a Amazônia sem derrubá-la e se nos tornarmos um grande produtor de energia limpa, teremos feito a nossa parte. Para este entrevistado, tirando a Amazônia, nossa “contribuição negativa” para o aquecimento é “mínima”:

“É cuidar da Amazônia. Cuidar bem, ver como que ela pode ser explorada de um jeito legal, porque o impacto do Brasil nesse processo é irrisório; basta comparar o nosso impacto com o impacto industrial americano, por exemplo. Nós emitimos muito menos do que a América e muito menos do que a China. Nossa participação no que seria nossa interferência nas mudanças climáticas é mínima.” (MÍDIA, M.S., 46, JORNALISTA)

Mas essa não é a opinião da maioria, que pensa ser o Brasil um importante interlocutor entre as autoridades mundiais, uma das maiores “potências ambientais do mundo”. Esse fato, por si, é suficiente para não cairmos nos discurso fácil da “soberania” brasileira. A opinião dominante é a de que o Brasil não pode usar o discurso “pseudo-nacionalista” de “eles (os países ricos) destruíram suas florestas e agora chegou a nossa vez”:

O Brasil tem não só a responsabilidade de país emergente de lutar por tudo aquilo que for, digamos, vanguarda no movimento mundial, como o Brasil abriga a floresta amazônica. E tem que tratá-la sem abdicar da sua soberania, mas também sem discurso nacionalista idiota de fechar os olhos para os crimes ambientais que se cometem na Amazônia.” (MÍDIA, J.K., 58, JORNALISTA)

“Eu acho que o Brasil está vivendo um momento muito ruim nesse aspecto. Porque reúne todos os direitos históricos de expor seu território, suas ambições e tal. Mas o contexto planetário não permite qualquer tipo de egoísmo nacionalista... 'Vocês destruíram a sua floresta e eu também vou destruir a minha': esse tipo de atitude expressa ignorância, mediocridade e ambição suicida.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

Page 91: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 1

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

As pessoas precisam sentir que fazem sua parte

O setor acredita fortemente que “ações individuais” fazem diferença: dois terços dos entrevistados responderam positivamente a essa idéia. Contudo oito, quase um terço, mostraram-se céticos. Vejamos seus argumentos:

Alguns entrevistados criticaram a forma demasiado dramática com que o tema é tratado, afirmando que deixa “todo mundo paralisado de medo”. Para eles, a sustentabilidade é uma necessidade histórica e o aquecimento global é apenas o fator que veio para “acelerar nossas decisões”. Nesse sentido, cada um precisa continuar a carregar sua “canequinha” para diminuir os plásticos, comprar carros menos poluentes, boicotar produtos de empresas emissoras, ou seja, está na esfera de cada um ajudar como pode.

Outro argumento usado é o de que as ações individuais são educativas e “cada indivíduo é um formador de opinião”, ainda que o seja apenas no âmbito da sua família, da sua comunidade de amigos ou de colegas de profissão. “Nenhum ser vive isolado”, diz uma jornalista:

“Claro que poderia fazer diferença se tivéssemos os indivíduos mais conscientes. Todo mundo com a sua canequinha para diminuir os plásticos. Eu acho que sim. Eu acho que tem que ter uma coisa educativa para as pessoas poderem ter as suas iniciativas individuais. Além disso, as pessoas não vivem isoladas, tudo tem um efeito sobre o entorno.” (MÍDIA, A.L., 45, JORNALISTA)

“Eu acho muito fácil, muito cômodo dizer que o problema é do governo e das autoridades mundiais. E nós, cara pálida? Vamos continuar comprando carrões e engarrafando o trânsito? Não vamos nos perguntar sobre quanto de água, de energia cada carro custa para ser produzido? Tem um papel ali, para o cidadão, para o consumidor, que é fundamental...

Ser politicamente correto é chato

Para este mesmo entrevistado, o problema é o excesso de cobrança, de patrulha nos hábitos individuais. As pessoas se sentem desconfortáveis “acham uma chatice” ser politicamente corretas o tempo todo:

“... acredito que é importante mudar o espírito das pessoas para querer agir de modo diferente. Atualmente está sendo encarado por muita gente como um assunto, uma obrigação chata que te impede de fazer o que tem vontade de fazer, que é andar de carro, comer carne, jogar lixo na rua. (...) Temos capacidade de resolver, não é difícil, e isso pode até ser muito divertido, o indivíduo contribui com essa boa vontade, então vamos parar de andar de carro, vamos achar um outro meio, vamos andar de bicicleta, de ônibus, isso não precisa ser chato.” (MÍDIA, M.S., 49, JORNALISTA)

Pequenas ações fazem muita diferença

Um dos entrevistados insiste que pequenas ações individuais, se somadas, farão grande diferença, principalmente se forem voltadas para o uso responsável do carro:

“Coisas pequenas, o cuidado com o lixo, porque a gente sabe que a gente gera muito lixo. A coisa do carro principalmente, pelo menos, se não tiver como poupar o carro, ter uma revisão para saber dos níveis de poluição que aquele carro está emitindo. Quase 80% da população brasileira vive em cidades e se torna cada vez mais dependente do carro individual, isso é uma loucura. Pressionar as montadoras para fazer carros mais

Page 92: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 2

econômicos, pode ser uma política pública, mas pode também partir do indivíduo...” (MÍDIA, C.F., 27, JORNALISTA)

O coletivo é constituído de indivíduos

Por fim, entre os que se manifestaram positivamente em relação à ação individual, surgiu o argumento de que o coletivo é formado por indivíduos, e que há uma interação entre um e outro. Além disso, “a opinião pública” é feita de líderes e consumidores, e indivíduos que agem de maneira a despertar simpatia ou chamar atenção para uma causa:

“Eu acho que a participação individual é muito importante em dois aspectos: primeiro, as pessoas precisam se dar conta de que não existe uma entidade chamada povo, opinião pública ou mercado consumidor. Isso é um coletivo, é um somatório de ações individuais. (...) Então é importante que as pessoas comecem a tomar a decisão de mudar, e isso vai produzir um volume e também uma nova qualidade na cidadania. (...) Começa a se criar um processo interno, no país, um processo da cidadania interna, de que as empresas precisam ser mais responsáveis socialmente do que são, ou, por exemplo, se são pessoas que estão na área do Ministério Público, professores etc., eles começam a formar opinião em seus núcleos. Então as pessoas têm muita importância”. (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

“Se você não tiver um compromisso individual, você não tem o coletivo.” (MÍDIA, L.H.Y., 49, JORNALISTA)

A cidadania do consumidor não pode ser desprezada

Uma entrevistada alerta para o fato de que o consumidor é um cidadão que pode fazer escolhas mais favoráveis ao planeta em seu dia-a-dia.

Mas a escolha de produtos está condicionada à existência de um mercado que informe o grau de poluição, de emissão, de aditivos químicos. Isso significa que o governo deve avançar na rotulagem, e o consumidor nas escolhas:

“Eu acredito na ação individual, acho que pode produzir contágio e acho que é uma parte do processo. Não acho que só com leis e regulações a coisa vai acontecer, se as pessoas não estão realmente envolvidas.

O consumidor tem que ter a informação para poder decidir, e ele não está tendo essa informação. Os produtos brasileiros não vêm com as classificações. Eu queria comer uma carne que viesse escrita, eu pago o dobro, se ela vier escrita: livre de trabalho escravo e desmatamento da Amazônia. (...) Então, na verdade, nós temos um grande potencial de ação individual que não está sendo utilizado, porque o consumidor não tem a ferramenta para tomar a decisão.

Eu vi o que é o poder do consumidor na estabilização. O consumidor decidia quem ficava ou saía do mercado. (...) Eu vi marca líder que perdia em um mês 30% e aí teve que mudar o preço e reconquistar o consumidor. (...) Eu gostaria que essa arma estivesse agora na mão do consumidor brasileiro para poder escolher que tipo de país ele quer, que tipo de produção. (...) Hoje nós não temos esse mecanismo.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

Os indivíduos não têm o impacto das indústrias

Para aqueles que se mostram céticos no que se refere ao alcance da contribuição individual, a questão não é que o cidadão não deva fazer sua parte, economizar água, energia, separar o lixo etc., mas sim o fato de que a gravidade da questão do aquecimento global pede uma ação de envergadura. Segundo a entrevistada abaixo, “precisamos de um choque de regulação”:

Page 93: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 3

“O indivíduo não é tão importante, não é tão responsável pela poluição quanto as indústrias, a produção em si. Acho que as pessoas, por uma questão de respeito ao meio ambiente, de respeito ao planeta, é claro que podem ajudar, e devem, mas diante da urgência da questão nós estamos precisando de um choque de regulamentação, e essa é tarefa de governo.” (MÍDIA, R.M., 48, JORNALISTA)

Outros acrescentaram o argumento de que a ação tem que ser coletiva e “as ações individuais não se sustentam”:

“A ação tem que ser coletiva.” (MÍDIA, H.B., 57, JORNALISTA)

“A ação individual é importante para a pessoa ter a consciência daquilo, mas, individualmente, uma ação como essa não se sustenta. Vamos usar o exemplo do lixo, uma coisa simples como reciclar lixo, que inclusive é economicamente possível. A gente separa em casa, mas a ação é simbólica, não tem continuidade lá na ponta, o caminhão da prefeitura ou de uma terceirizada mafiosa vai lá e mistura tudo. Então as ações dependem de um engajamento conjunto: empresas, governo, país.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

“Não acredito na ação individual. Qualquer coisa que você faça voluntariamente é pouco e não vai ajudar a resolver o problema. Dito isso, acho que mudanças de estilo de vida foram apontadas como necessárias pelo IPCC como uma coisa importante que, enfim, podem dar uma contribuição.

Eu, por exemplo, parei de comer carne porque eu não sei de onde vem a carne que eu como, você vai ao supermercado e você não sabe se a carne que você está comprando vem de Goiás ou do Pará. (...) Eu acredito que as pessoas precisem mudar seu padrão de consumo, mas eu tenho dúvidas sobre o peso da mudança individual na resolução do problema.” (MÍDIA, C.A., 32, JORNALISTA)

Finalmente, temos dois argumentos: o primeiro é o de que o povo não é educado e não está ainda suficientemente conscientizado. O outro argumento é o de que o indivíduo pode, é claro, fazer diferença, mas é uma diferença pequena diante do desafio a ser enfrentado. Portanto, é melhor apostar nas “formas de organização da sociedade”:

“Não acredito. O povo não está educado para isso.” (MÍDIA, J.L.D., 50, JORNALISTA)

“Eu acho que o indivíduo existe e o indivíduo faz diferença e o indivíduo faz história. Mas esse indivíduo sozinho pode pouco. E eu acredito nas formas de organização da sociedade.” (MÍDIA, JK.,58, JORNALISTA)

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

Atividades que mais contribuem para emissões são desmatamento e transportes

Numa questão que permitia respostas múltiplas, mas que pedia para classificar as respostas por ordem de importância, o setor repetiu o argumento de que a atividade que mais contribui para as emissões é o binômio desmatamento/queimadas, atividades empreendidas para cortar madeira, para a agricultura (24 menções) ou para a pecuária (7 menções). Em segundo lugar veio o setor de transporte, com 17 menções. A seguir foi citado, com seis menções, o setor petroleiro; depois, com menos de cinco menções cada um, as siderúrgicas, as mineradoras e a indústria química.

Os vilões são primeiro os que contribuem para o desmatamento

“Primeiro, sem dúvida nenhuma são as atividades econômicas, se é que podemos chamar assim, pois uma parte delas é claramente ilegal, é economia do crime, as que envolvem

Page 94: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 4

diretamente o desmatamento. Além das mais óbvias, que são o corte de madeira e a derrubada para colocar boi ou soja, temos a mineração, que também derruba grandes áreas, o setor de energia...

Não só o desmatamento, mas a agressão direta ao meio ambiente. (...) Mas eu acho que primeiro é uma atividade que acaba afetando diretamente a manutenção do que temos estabelecido como flora e fauna, necessárias à manutenção de um ecossistema, e não falo só da Amazônia: me preocupa também o Pantanal e o cerrado do qual ninguém fala.” (MÍDIA, M.M., 56, JORNALISTA)

As madeireiras

“Da produção de madeira que vem da Amazônia, calcula-se que mais da metade é ilegal: 15 a 20%. E da madeira que sai da Amazônia e vem para São Paulo, o maior consumidor de madeira tropical é São Paulo. Isso no caso brasileiro, porque o Brasil tem essa especificidade. E o restante? Todo mundo que está comprando madeira não certificada pode estar contribuindo para o desmatamento e para as emissões. Se eu fosse o governo, elegeria como primeiro foco as madeireiras. Ali quase tudo é criminoso, fora da lei ou feito com a leniência do Ibama.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

A pecuária

“A pecuária em relação à Amazônia é altamente agressiva porque precisa derrubar mata constantemente para aumentar as pastagens.” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

“A expansão da pecuária está ocorrendo em área de desmatamento, às custas do desmatamento, então, hoje madeireira e pecuária são os setores que mais impactam.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

A agricultura

“A agricultura brasileira é feita de uma maneira muito hostil, prejudicial à necessidade que temos de reduzir o aquecimento global, necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, porque mesmo quando você não está fazendo desmatamento, ainda assim se usa muita queimada, muito trator e máquina agrícola a diesel e se revolve muito o solo para plantar...

E quando se usa a técnica direta de plantio, essa mexida no solo já emite muito metano e gases que estão presos na terra, e isso faz com que a agricultura brasileira seja uma emissora muito forte.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

“A própria agricultura de determinados tipos de cultivo pode ser muito nociva. A monocultura tem essa tendência, destrói tudo no seu caminho, ela é, digamos assim, invasiva. A monocultura, seja da soja, do eucalipto ou da cana, por natureza, que toma todo o terreno, todo espaço, ela muda o ambiente, e tudo que está no entorno vai desaparecendo.” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

Investir num transporte público de qualidade e menos poluente é sugestão já mencionada em outras partes do relatório. As declarações selecionadas abaixo expõem o problema das grandes cidades brasileiras:

“O transporte é um grande problema: necessário investir em transporte público de qualidade. Hoje os preços dos automóveis estão muito acessíveis à população em geral e o número de veículos está crescendo cada vez mais. Mas como dizer àqueles que estão comprando carros para não o fazerem se não há alternativa para oferecer? O que é o

Page 95: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 5

transporte público hoje em dia? As pessoas ficam 3 a 4 horas no trânsito. Isso não é vida!” (MÍDIA, J.L.D., 50, JORNALISTA)

“Aqui em Belo Horizonte, hoje foi manchete de um jornal, que a gente está chegando no limite da frota de veículos, e ninguém está falando de emissões, de gases poluentes e tal. Eu não sei qual vai ser a saída. Porque a cada dia as pessoas estão tendo mais acesso a esse tipo de meio de transporte, está sendo mais facilitado, não vejo a tendência diminuir.” (MÍDIA, C.F., 27, JORNALISTA)

“São Paulo tem dez milhões de habitantes e cinco milhões e oitocentos mil carros e entram em média 500 mil carros por dia na cidade jogando gás carbônico o dia inteiro na atmosfera. (MÍDIA, L.A.N., 48, JORNALISTA)

“No Brasil hoje transportamos carga de grandes volumes e em grandes distâncias com o caminhão e isso só poderia se feito em ferrovias ou navios. Os transportes de passageiros no Brasil é um transporte muito pouco racionalizado, que emite uma quantidade bastante alta. Na verdade, o Brasil emite por passageiro transportado e por tonelada de carga transportada, entre três e quatro vezes mais que os Estados Unidos.” (MÍDIA, S.A., 57, JORNALISTA)

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Maioria considera ser possível compatibilizar desenvolvimento com redução de emissões

A maioria absoluta disse ser possível compatibilizar o desenvolvimento com a redução de emissões. Nove entrevistados, quase um terço, alertaram que não sem “ressalvas”, “cuidados”, deixando claro que não se trata de reeditar “o velho modelo”, que segundo eles tem em sua “natureza” a lógica do curto prazo e a gratuidade e infinitude dos recursos naturais. Como veremos a seguir, não é a isso que nossos entrevistados se referem.

Rejeição do modelo chinês

Nossos entrevistados insistiram que a compatibilização não se dará operando um modelo como o chinês, em que a inclusão vem pelo consumo fácil de produtos baratos, mas com alto custo ambiental:

“Ao investir em filtros, energias limpas, no reflorestamento, você está desenvolvendo economicamente, só que uma economia nova, de baixo carbono, você está gerando riqueza sim, você está criando empregos, você está fazendo circular a riqueza. É apenas um redirecionamento do investimento e isso é fundamental que seja feito, mas a nível mundial. Você não pode permitir que hoje a segunda economia do mundo, que é a China, produza produtos baratos, mas às custas da poluição e da devastação ambiental.” (MÍDIA, A.D., 63, JORNALISTA)

“Dá sim, claro que é uma outra escala, mas, por exemplo, outros países, Suécia, Dinamarca são países que cresceram, são países que têm justiça social e uma certa igualdade social e que têm consciência ecológica e um respeito pela natureza arraigado na população. (...) São realidades diferentes, mas acho que com informação, com educação e com um pouco mais de justiça social, acho que esse tipo de objetivo é perfeitamente realizável.” (MÍDIA, L.S., 34, JORNALISTA)

Page 96: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 6

Desenvolver e proteger o meio ambiente são agendas convergentes

Alguns entrevistados acreditam que as agendas são “coincidentes”: desenvolver não exclui a possibilidade de ser mais socialmente justo e ecologicamente responsável. Pelo contrário, os dois projetos são convergentes:

“Essas agendas são coincidentes. (...) Eu quero, do ponto de vista de melhorar o desenvolvimento econômico, mais gente no mercado de consumo, ou seja, um projeto de desenvolvimento mais inclusivo. Só que deve ser um consumo diferente. Um consumo mais informado. Não tem como falar para as pessoas não consumirem energia, mas ela vai ter que pagar mais caro, vai ter que ser energia solar, eólica, ou uma coisa mista... A realidade da economia vai mudar, mas eu acho que dá para compatibilizar sim. (...)

Se o país investir em eólica, solar, biomassa e também hidrelétrica, ele terá quatro fontes para oferecer. Todas elas são renováveis. (...) Não é uma matriz que possa preocupar nosso futuro, ainda mais que a via dos biocombustíveis está crescendo como uma alternativa viável. (...)

Se eu faço um desenvolvimento sustentável, ou seja, se eu estabeleço que não pode criar boi na Amazônia ou as áreas de florestas, se eu consigo conter e impedir isso aí; se eu conseguir estabelecer uma produção de carne, soja, açúcar, commodities, nós somos muito bons nisso; se eu consigo fazer tudo isso respeitando o meio ambiente, eu não enfrentarei barreiras verdes ao meu produto, o meu produto vai entrar melhor nos mercados. Em tudo que eu olho eu vejo coincidência, eu não vejo conflito.” (MÍDIA, M.L., 54, JORNALISTA)

Não desenvolver é imoral

Mesmo os que responderam com reticências crêem que “não se pode escolher o não desenvolvimento”, opção considerada “imoral”:

“Eu acho que dá. Claro, tem que dar. Não é possível, não é? Tem que dar. Eu não sei como, mas tem que dar. Não desenvolver, condenar o país a manter populações em pobreza é imoral.” (MÍDIA, N.O., 61, JORNALISTA)

“Honestamente, acho bobagem qualquer proposta de que precisamos conter o crescimento econômico; a gente precisa crescer economicamente, porque se a gente não crescer, primeiro que eu acho que você não pode castigar as pessoas a viver na pobreza, isso aí é idéia de quem é rico, não o pobre, que está a fim de não ficar pobre para conter o aquecimento global.

E segundo que os danos são maiores, o dano de manter essas pessoas, elas vão cortar árvores. Por serem pobres, vão usar até exaurir os recursos que elas têm da terra. A gente não tem outra opção, não é se dá ou se não dá. Precisamos é, a partir do momento em que a gente precisar, desenvolver essas políticas.” (MÍDIA,S.G.,30, JORNALISTA)

Desenvolver o Brasil não só é possível como “inevitável”

Mais do que possível, nossos entrevistados consideram que, para o bem do Brasil e do planeta, o país precisa se desenvolver:

Possível não é um horizonte, vai ser inevitável. (...) Se a gente não fizer isso não vai ter desenvolvimento nem mitigação de mudanças climáticas, os custos ambientais serão altíssimos. A gente vai começar a ter impactos muito sérios. Não na nossa geração, mas daqui a 50, 60 anos em diante, a gente vai ter impactos tão sérios, não vai ser possível trabalhar sem isso. Então, vai ser uma coisa inevitável.” (MÍDIA, A.M., 39, JORNALISTA)

Page 97: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 7

Brasil pode desenvolver economia “conservacionista”

Os mais otimistas afirmam que não só o país deverá desenvolver, como é um dos mais bem “aparelhados” para desenvolver a nova economia conservacionista, de baixo carbono:

“Completamente possível, completamente; não vejo nenhum impedimento a não ser a burrice, a falta de estratégia... Ao contrário, eu acho que o desenvolvimento econômico, daqui para frente, tende a ser conservacionista, qualquer que seja o país, e nesse aspecto o Brasil está bem porque tem abundância de recursos naturais. Os processos, de uma maneira, indicam necessidade de eficiência energética, é consumir menos energia, produzir uma geladeira que funciona com menos energia, entendeu? E assim por diante. Carros que tenham menos emissão, causem menos danos à natureza.” (MÍDIA, G.V., 55, JORNALISTA)

“Esse é o X e o Y da questão, é preciso crescer, mas crescer bem, crescer limpo, de uma outra maneira, não é mais possível crescer como cresceram os países europeus, como cresceu os Estados Unidos. (...) Agora precisa compatibilizar crescimento com defesa do meio ambiente. (...) Não adianta vender madeira o tempo inteiro, depois não ter mais madeira na Amazônia, é um crescimento que vai se esfarelar rapidamente. Precisa de cálculo, crescimento auto-sustentável, essas coisas assim. Como é que faz é um pouco mais complicado para a minha competência, mas eu acho que não pode ser fazendo PACs [referência ao Programa de Aceleração do Crescimento, do governo federal].” (MÍDIA, J.M., 46, JORNALISTA)

Os poucos entrevistados que se apresentaram como mais reticentes nas respostas apontam que compatibilizar é, sim, possível; o problema é como:

“É um casamento complicado, eu acho que para levar a sério teríamos que crescer num ritmo monitorado, e isso não está na pauta no momento, retardaria muito o desenvolvimento porque para a gente reduzir as emissões, enfim, cuidar da preservação do meio ambiente, custa muito dinheiro. Vai ter muito momento em que uma coisa vai bater de frente com a outra, mas eu acho que é possível isso acontecer, só que o desenvolvimento vai ter que reduzir a marcha.” (MÍDIA, A.L., 45, JORNALISTA)

Para terminar, um entrevistado, colunista da grande imprensa e que domina os três meios, rádio, televisão e jornal, faz uma reflexão otimista, afirmando que o ser humano sempre soube responder aos desafios de sua sobrevivência e que agora não será diferente. Nesse contexto os brasileiros farão sua parte, e nossa curta história de 500 anos mostra que somos criativos, um povo que responde bem aos desafios:

“Nós [seres humanos] vivemos em grandes aglomerados, estamos no topo da cadeia alimentar, sabemos transformar pedra em televisão, areia em comida, óleo fóssil em energia. Então nós demandaremos muitos recursos naturais sim. (...)

Agora temos tecnologia e o aquecimento global é um alerta para que tomemos consciência de que o modelo se esgotou. O mundo pode parar de destruir as florestas. Se houver uma postura de Estado coletiva, resolve isso em pouco tempo...

Usa força porque é preciso coibir os abusos, então o poder de polícia tem que funcionar. E usar planejamento... Quantos brasileiros vivem da destruição, da derrubada? Qual é o tamanho dessa economia? Vamos planejar sua substituição.

(...) O mundo tem que sair da equação econômica e ir para a ambiental; mas toda equação ambiental é também subordinada a uma equação econômica. Por quê? Porque todas as iniciativas de mitigação, substituição de tecnologias, custa dinheiro...

Page 98: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 8

Não acredito que alguém ache razoável acumular vários trilhões de dólares para morremos sorridentemente por falta de oxigênio ou atolados na neve, ou na fúria de um furacão. Isso não faz sentido...

O mesmo entrevistado conclui expressando uma idéia que foi exaustivamente apresentada nas entrevistas:

O Brasil tem capital ambiental, tem forças progressistas, tem um ambientalismo forte, até um pouco radical demais. Não tem um Al Gore, mas quem sabe nosso próximo presidente seja um?

Sem brincadeiras, acho que temos todas as condições... Definitivamente não somos nem bandidos nem coitadinhos.” (MÍDIA, R.B., 55, JORNALISTA)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O setor define-se como generalista e praticamente nenhum profissional ouvido na pesquisa pode ser considerado, a rigor, especialista no tema. Ainda assim, mostrou-se de um modo geral preocupado e propenso ao otimismo, otimismo este baseado na crença fundamental de que a humanidade encontrará uma saída e de que a ciência, em grande medida, fornecerá as bases tecnológicas necessárias para tanto.

Como brasileiros e como jornalistas, os entrevistados desse setor se sentem motivados e declararam estar dispostos a um maior engajamento.

Estão em fase, como eles mesmos dizem, de “aprender mais”. Procuram ler livros, pesquisar na internet e, pela natureza de seu trabalho, ficam atentos ao noticiário internacional. Consideram que o papel mais importante a ser desempenhado pelo setor é o de veicular informação de qualidade e contribuir para a conscientização e para o processo de decisão tanto individual quanto coletivo.

Para eles, é o governo quem deve liderar o processo de engajamento da sociedade. Consideram ainda que o tema das mudanças climáticas está ganhando um espaço cada vez maior na mídia, tendência que acreditam deva perdurar e ganhar mais densidade nos próximos anos.

Page 99: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

9 9

PERFIL DO SETOR

Como era de se esperar todos os entrevistados neste setor são profissionais dos meios de comunicação. A amostra abrange diversas áreas do jornalismo áudio-visual e impresso: foram entrevistados 9 jornalistas, 6 editores, 5 colunistas, 4 repórteres e 2 redatores-chefes, além de uma supervisora de telejornais, um diretor, um âncora e um gerente de jornalismo, como se pode ver na tabela abaixo:

Cargo Cargo Freq.

Jornalista 9

Editor 6

Colunista 5

Repórter 4

Redator-chefe 2

Supervisora de telejornais 1

Diretor 1

Âncora 1

Gerente de jornalismo 1

Total 30

A maioria dos entrevistados do setor mídia é do sexo masculino (22).

Sexo M F Total

22 8 30

Quase dois terços dos entrevistados estão na faixa dos 40-59 anos. Os demais têm entre 30-39 anos (5), 60-69 anos (4), e somente um em cada uma das faixas etárias restantes, 26-29 e 70-79 anos.

Idade 26-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 Total

1 5 10 9 4 1 30

Dois terços dos entrevistados são naturais de São Paulo. Os demais são de Minas Gerais (7), Rio de Janeiro (5), Rio Grande do Sul (4), Bahia (1) e Santa Catarina (1). Dois entrevistados são estrangeiros.

Naturalidade SP MG RJ RS Ext. BA SC Total

10 7 5 4 2 1 1 30

Page 100: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 0

26 dos 30 entrevistados possuem curso superior completo e somente 3 são pós-graduados.

Escolaridade

Superior Mestrado Doutorado Ensino médio incompleto TOTAL

26 1 2 1 30

Page 101: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 1

PARLAMENTARES

RESUMO

As 30 entrevistas realizadas com representantes do poder legislativo brasileiro privilegiaram o Congresso Nacional, ouvindo 20 deputados federais e quatro senadores. Também foram incluídos na amostra seis deputados estaduais. Procurou-se não entrevistar somente integrantes da chamada “frente parlamentar verde”, claramente simpática às questões ambientais. Nos Estados, buscou-se entrevistar parlamentares envolvidos com comissões de mudanças climáticas ou energia, ou ainda envolvidos com políticas de desenvolvimento rural.

O resumo a seguir organiza as principais opiniões expressas pelo setor.

“Como o governo não tem manifestado nenhum interesse em engajar-se mais a fundo nas questões de mudanças climática, nós aqui sofremos muito os reflexos desta inapetência.”

A declaração acima, de autoria de um parlamentar que integra a Comissão Mista de Mudanças Climáticas da Câmara dos Deputados, traduz o posicionamento dos entrevistados em relação à atuação do parlamento nessa questão: sem o apoio do governo federal, há muito pouco o que fazer em relação ao assunto. É da natureza do poder legislativo reagir a iniciativas seja do executivo, seja da sociedade. Como o tema das mudanças climáticas não está “nem com o povo nem no coração do governo”, o legislativo se ocupa de outras pautas.

Além de exercer um papel de “negociador dos interesse da população” e de ratificador de decisões que já obtiveram consenso, os parlamentares acreditam que é difícil um tema tão novo e complexo superar a morosidade própria dos procedimentos de análise e decisão que caracterizam a Câmara e o Senado.

Para o setor, assim como a problemática ambiental, as mudanças climáticas têm uma relevância “transversal”, ou seja, dizem respeito a uma série de atividades cujos problemas estão distribuídos em outras comissões como as responsáveis por temas como energia, infra-estrutura, transportes etc.

Apesar da reconhecida importância da problemática ambiental, os parlamentares admitem que são poucos os parlamentares que estão dedicados a ela: “são uns três ou quatro”. Citaram de pronto o deputado José Sarney Filho, o deputado Fernando Gabeira e a ex-ministra, agora de volta ao Senado, Marina Silva.

Contudo, a grande maioria reconhece que a questão é estratégica para o Brasil e para o mundo. Os parlamentares sabem que o poder legislativo deverá atuar na regulamentação brevemente e se declaram altamente motivados a “aprender mais”.

Para os parlamentares ouvidos na pesquisa, o desafio mais importante no mundo hoje e nos próximos 20 anos é conseguir ter eficácia nas políticas de combate à pobreza e à redução das desigualdades sociais. Já no Brasil, o maior desafio se traduz no termo sustentabilidade, uma combinação de políticas sociais e ambientais bem equilibradas.

Para eles, as responsabilidades do Brasil em relação às mudanças climáticas são preservar a Amazônia e assumir a condição de país líder na geração de energia limpa. Com relação à Amazônia são simpáticos ao estabelecimento de metas de redução de desmatamento e ao endurecimento na fiscalização. Para eles, madeireiras ilegais e outras formas de predação do território amazônico têm que ser combatidas, ainda que seja necessário envolver as forças de segurança nacional.

Page 102: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 2

O setor entende que as emissões brasileiras têm três principais fontes: o desmatamento e as queimadas provocados pela expansão da atividade agropecuária, as emissões veiculares provenientes de um sistema de transportes ineficiente e a queima de combustíveis fósseis, amplamente utilizados na atividade industrial de um modo geral.

As principais barreiras para enfrentar o desafio de reduzir as emissões são de ordem econômica e ideológica. Não é um problema exclusivamente brasileiro, mas mundial, e “ninguém tem a receita”. Para os parlamentares, os países da Europa, que estão mais avançados em programas de redução, gastaram milhões em tecnologias de conversão. O Brasil não tem esse dinheiro, e mesmo os Estados Unidos, que são a maior potência do mundo, não aceitam sacrifícios. A Amazônia é uma questão urgente. Manter a matriz energética limpa é um interesse do Brasil, mas o resto se fará em um ritmo que não comprometa o desenvolvimento, alerta o setor.

Ao governo federal, como vimos, é atribuída a principal responsabilidade de tomar a dianteira na formulação de políticas direcionadas às mudanças climáticas. Os outros atores da sociedade também são importantes, mas vêm em segundo plano, como suporte às ações governamentais. Chamam atenção para o fato de que o país é uma federação, sendo necessário engajar os Estados e municípios.

As principais propostas do setor parlamentar giraram em torno da educação e do desenvolvimento tecnológico voltado para as mudanças climáticas como formas de criar uma base de sustentação para enfrentar os problemas decorrentes das mudanças climáticas. Propostas como o incremento da fiscalização, a criação de fundos especiais, a criação de uma política nacional, a inspeção veicular e a criação de lei específica que obrigue os agentes econômicos a inventariar suas emissões foram citadas.

Os entrevistados não demonstraram conhecer programas nacionais que visam implementar ações de adaptação ou mitigação. Citaram genericamente os programas de crédito de carbono, que estariam sendo desenvolvidos por empresas. Mas muitos admitiram ter feito viagens para conhecer programas internacionais e mencionaram ações exemplares em curso em países europeus, principalmente.

A proposta brasileira de desmatamento evitado é pouco conhecida e, quando mencionada, admite-se a necessidade de uma revisão para que ela de fato funcione. A Conferência de Bali e os demais foros internacionais foram criticadas como ineficientes, mas uma minoria demonstrou possuir um conhecimento mais aprofundado.

O indivíduo, para os entrevistados deste setor, tem um papel importante a cumprir: é através de atitudes no plano individual que se atinge o plano coletivo. Foram citadas pelos parlamentares, como ações relevantes por parte dos indivíduos a redução do padrão de consumo, a diminuição do uso de recursos não renováveis, a conservação de energia, a redução do uso de produtos de pequena vida útil, a reciclagem e o uso de transporte coletivo. No entanto, enfatizam, a ação individual só tem um real efeito quando se multiplica e se espalha pela sociedade.

O parlamento está atento, mas admite que o tema das mudanças climáticas ainda não entrou pela porta da frente, nem está presente nas comissões mais importantes.

Page 103: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 3

ANÁLISE DETALHADA

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

A década de 90 como um marco histórico

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez?

Antes da década de 1980

Na década de 1980

Na década de 1990

De 2000 para cá Não respondeu

TOTAL

2 1 16 2 9 30

A amostra deste setor comprova que o assunto das mudanças climáticas é recente na pauta dos entrevistados. A década de 1990 foi a mais citada (16 vezes) por ter sido um marco na divulgação da problemática das mudanças climáticas, principalmente devido à Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Eco-92), sediada no Rio de Janeiro, e ao Protocolo de Kyoto, assinado em 1997. Apenas 3 entrevistados disseram ter ouvido falar nesse assunto antes dos anos 90; outros 2, somente desde 2000 para cá.

“Há vários anos. A questão do meio ambiente, porque fui professor universitário e essa discussão da questão ecológica, das mudanças climáticas, da ameaça do planeta que está ocorrendo. Eu conheço esse assunto pelo menos do final dos anos setenta, inicio dos anos oitenta.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

“Eu, já como parlamentar, principalmente na ECO em 92 no Rio de Janeiro, estive lá representando o Congresso, foi onde eu tive a oportunidade de ouvir mais a palavra dos cientistas. Ouvi palestras e tal, foi o momento de maior debate que eu tive oportunidade de participar.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, W.F., 50, MÉDICO VETERINÁRIO)

“Eu comecei a ter acesso às informações, por leitura de revistas como a Carta Capital e uma edição da revista Caros Amigos de 2005 (...), e essa edição representou, para mim, como um chamamento. Eu já tinha lido alguma coisa a respeito, mas não tinha, como se diz, ainda caído a ficha. Para mim era ainda algo teórico. (...)

A coisa chegou, não é algo muito distante, e temos que enfrentar já. Eu não tinha ainda esta percepção, e depois isso foi reforçado mais recentemente com a publicação de todos os trabalhos da ONU, com o filme do Al Gore e todo esse trabalho aí, um conjunto de coisas que a gente está acompanhando.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO).

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Parlamentares estão em estágio inicial de conhecimento sobre o tema

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é: Bastante

abrangente

Bom, mas incompleto

Está explorando e aprendendo mais

Conhece pouco

Não respondeu

TOTAL

1 9 18 1 1 30

Page 104: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 4

Esse setor é composto principalmente por pessoas que ainda estão em um estágio inicial de conhecimento sobre as mudanças climáticas: quase dois terços dos entrevistados (18) declarou estar explorando e aprendendo mais. Os parlamentares que afirmaram ter um conhecimento bom, mas incompleto, estão cônscios de que em geral esse conhecimento é principalmente sobre os aspectos políticos da questão, e não um conhecimento técnico ou científico aprofundado.

“Estou explorando e aprendendo mais como lição de casa todo dia.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.C.A., 60, ENGENHEIRO)

“Estou aprendendo, é um aprendizado permanente.” (CONGRESSO, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.C., 54, SOCIOLOGO)

“Acho que do ponto de vista de minha atuação política no cenário em que eu atuo, ele é bom, mas incompleto. Eu não sou cientista, sou político, leio, procuro ler, mas evidentemente é incompleto. (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 49, ADVOGADO)

O único entrevistado que considera seu conhecimento abrangente reconhece a necessidade de aprender mais sobre os vários temas relacionados às mudanças climáticas.

“Eu acho primeiro, ele é abrangente, mas ele é pouco, e eu estou aprendendo mais. Ou seja, ele não é restrito, mas é que eu não sou um especialista de uma emissão de gás, por exemplo... Eu tenho estudado muito o impacto sobre as águas, os rios, a necessidade de você recuperá-los, não contaminar os lençóis freáticos, aproveitar melhor tudo isso e tal...

Tenho estudado muito a parte das chuvas, que é quem garante, na verdade, a produção e essa coisa toda da produtividade, do alimento; está tudo muito diretamente ligado.Tenho visto a importância que têm tanto o Pólo Antártico quanto, na verdade, a floresta amazônica, para a estabilidade dos regimes e dos períodos de chuva, da formação de chuvas, no nosso país...

Tenho estudado, através dos transgênicos, que impacto a gente pode ter ou não também na saúde, no meio ambiente. Eu me considero uma pessoa que conhece um pouco de muita coisa, mas eu acho que é preciso continuar estudando cada vez mais...” (CONGRESSO, ENERGIA, J.S., 51, ENGENHEIRO)

3. GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Alto nível de interesse e preocupação

Como se sente em relação ao tema: Altamente motivado

Motivado, mas tem outros assuntos mais importantes

Apenas interessado

TOTAL

18 11 1 30

O interesse dos parlamentares sobre o assunto é bastante elevado: metade dos entrevistados disse ser altamente motivada pelo tema, como mostra o quadro acima.

“Eu me interesso muito pelo assunto. Eu procuro me atualizar constantemente...” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, J.A.T., 43, HISTORIADOR,)

Page 105: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 5

“Altamente motivado. Exatamente a preocupação com as gerações futuras. Eu acho que exercendo um cargo público eu tenho que ter necessariamente uma preocupação muito grande com o mundo que nós vamos deixar depois que sairmos da vida pública, se nós conseguirmos avançar de alguma forma e dermos mais qualidade de vida para as pessoas que vão ficar. Então eu me sinto muito motivado com isso.”(PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, N.M., 43, MÉDICO)

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Os maiores desafios da humanidade são relacionados à desigualdade social

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos? Questões sociais Mudanças climáticas Questões ambientais Desenvolvimento

Sustentável Outros TOTAL

10 6 6 5 3 30

Para um terço dos entrevistados, os maiores desafios da humanidade provêm das questões sociais: desigualdade, distribuição de renda, e inclusão.

“[O desafio da humanidade] vai ser como garantir o desenvolvimento, como garantir a repartição desse desenvolvimento para todos, povos e pessoas, países e pessoas, sem o menor impacto social possível... sem destruir o meio ambiente, como compatibilizar a necessidade de recursos naturais, a necessidade de água, as necessidades energéticas com os desafios do crescimento, do crescimento populacional, do desenvolvimento econômico e da repartição desses benefícios para o conjunto da população.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.R., 49, HISTORIADOR)

“Como conciliar os dois interesses: o econômico [e o] das populações. Como sobreviver e aumentar a renda, obviamente tendo paradigmas que não sejam aqueles do desperdício, da quantidade de consumo de massa, senão vamos ficar na miséria, que também é um grande componente destruidor: os lixos, os resíduos sólidos das cidades, da derrubada da floresta para plantar cultura de subsistência, falta de conhecimento.

[A falta de] acesso ao conhecimento, acesso às tecnologias, apreensíveis por parte dos povos que vivem na Amazônia, acaba levando também à destruição, não intencional, mas à destruição pela sobrevivência, então o combate à miséria é necessário que se faça, a renda tem que aumentar para que a conseqüência seja essa elevação de vida. Então esse é o desafio: como considerar isso tudo.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.V., 51, ENGENHEIRO)

“Eu acho que a humanidade enfrenta o tema da igualdade de oportunidades. As desigualdades sociais são muito importantes e eu acho que o tema da inclusão social é um tema importante no contexto global.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, P.T., 61, ADVOGADO)

Apenas 6 entrevistados mencionaram diretamente as mudanças climáticas como desafio principal. Outros poucos citaram a questão das águas e da escassez de recursos naturais. Algumas dessas observações estão selecionadas abaixo:

Page 106: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 6

“São dois [os desafios que a humanidade vai enfrentar]: resolver o problema do aquecimento global e o problema da escassez.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

“Eu acho que já está enfrentando: o aquecimento global, a elevação do nível dos oceanos, as geleiras se desprendendo, enfim... Lá vem secando, a Amazônia, você vê... Eu acho que é o clima, realmente.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, M.M., JORNALISTA)

“O primeiro é não deixar que o planeta aqueça.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, C.B., 54, ENGENHEIRO MECÂNICO)

“As informações não são semelhantes, nem a do Al Gore, nem a do Besserman, parece que o grande desafio que vem por aí vai ser a água. A água vai ser um liquido literalmente precioso, é a impressão que eu tenho haja vista que as alterações meteorológicas que você já consegue registrar, inclusive no seu dia-a-dia. (...)

Por alguma razão os lençóis freáticos não estão respondendo a esse rodízio das estações que no Brasil não são tão significativas. Mas a gente vê isso aqui no Sudeste de maneira clara. No ano passado nós tivemos um inverno – vou falar especificamente de Petrópolis – cinco meses sem cair uma única gota, nem sereno caiu, nada.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.N., 59, ADVOGADO)

Uma entrevistada aponta ainda a interconexão entre as mudanças climáticas e outros temas ambientais e sociais:

“Eu entendo que essa questão ambiental vai ter como uma teia, o centro é a questão ambiental, e dessa teia vão sair várias problemáticas: a questão climática, a questão das águas, a questão da alimentação... Eu acho que uma coisa vai gerando a outra.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.G., 32, ECONOMISTA)

Apesar de as mudanças climáticas serem amplamente reconhecidas como um desafio, um entrevistado observa que elas não são percebidas da mesma forma pela maioria da população mundial, que não dá ao assunto a devida importância:

“O pessoal só começou a acordar quando começou a morrer pessoas, aí entraram em pânico. O que acontece é que a mudança ambiental é tão distante para a maioria esmagadora das pessoas que esse assunto de tempo é temporal, a Antártida está degelando e depois do ano 2073, ele vê isso de maneira tão distante, é igual às manchas solares, comentaram sobre as manchas solares, mas é tão distante, não só sob o ponto de vista de distância propriamente dita, mas de tempo.

Então são coisas que não pertencem ao cotidiano dele, então acham “ah quando acontecer isso, eu já morri”, já cansei de ouvir essa frase. Então o que acontece é que não existe nenhuma preocupação imediata da maioria esmagadora, e nós estamos falando de seis bilhões de pessoas hoje no mundo.

Talvez um milhão, dois milhões, talvez cinco milhões de pessoas estejam verdadeiramente preocupadas em reciclar lixo, proteção ao meio ambiente e olhe lá, não acredito que haja mais do que isso.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.N., 59, ADVOGADO)

Page 107: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 7

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Para o Brasil, o desafio é a sustentabilidade

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Questões

sociais

Desenvolvi-mento

Sustentável

Questões ambientais

Crescimento

Mudanças climáticas

Outros

TOTAL

10 7 3 3 2 5 30

Para os entrevistados deste setor, no Brasil o grande desafio seria combinar a diminuição das desigualdades sociais com a preservação do meio ambiente, o que se traduz em sustentabilidade, conforme indicam as falas abaixo:

“Sustentabilidade. Acho que é essa palavra. Equilíbrio social e sustentabilidade. No Brasil principalmente, porque tem uma responsabilidade no equilíbrio ambiental por conta da Amazônia e por conta da água doce, de uma série de pontos é que fazem do Brasil um país que vai ter que crescer numa realidade diferente da dos outros países que cresceram.

A nós, não é dada a mesma oportunidade de crescer como crescer as outras potências, nós só temos condições de crescer com sustentabilidade, por isso que a gente tem que mensurar certo valor a questão da preservação para equilibrar a necessidade da nossa de renda e de estrutura e, ao mesmo tempo, oferecer ao mundo equilíbrio ambiental e dar nossa contribuição.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“O principal desafio nos próximos 20 anos do Brasil está relacionado à continuidade do seu crescimento com sustentabilidade, manutenção da democracia e inclusão social dos milhões que permanecem excluídos da geração e do consumo de riquezas. São velhos problemas que continuam a nos desafiar.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.J., 56, CONSULTOR)

“Em primeiro lugar a sustentabilidade do crescimento e em segundo lugar a inclusão social. Portanto esses dois estão vinculados a um modelo de desenvolvimento, e esse é o primeiro tema: modelo de desenvolvimento. O segundo tema, também a questão ambiental, a preservação da Amazônia, liberdade sobre fontes renováveis de energia, sustentabilidade das cidades, acho que esses dois temas: modelo de desenvolvimento e a questão ambiental.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, P.T., 61, ADVOGADO)

E as questões sociais, notadamente a desigualdade social, são as mais importantes para o Brasil:

“Diminuir ainda mais fortemente a questão da desigualdade social. Esse poço entre os mais ricos e os mais pobres no Brasil é um desafio que precisamos resolver muito aceleradamente para o bem dos mais ricos e para o bem dos mais pobres.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

“Eu acho que o grande desafio do Brasil é você diminuir as desigualdades sociais. Porque até em termos de opções de alimento para o Brasil nós não temos tantos problemas. Nós temos um país que tem um potencial de produção de alimentos enorme, temos também na questão ambiental uma biodiversidade enorme, eu acho que [o que] vai poder degradar mais o meio ambiente no Brasil não são os brasileiros, é a própria questão do aquecimento global, a emissão de carbono lá fora, que certamente interferirá internamente aqui na nossa biodiversidade. Então, nós temos aqui o desafio mais social da

Page 108: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 8

gente, poder diminuir as desigualdades sociais do nosso país.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, H.P., 52, ECONOMISTA)

O maior desafio ambiental são as mudanças climáticas

Maior desafio ambiental Mudanças climáticas

Questões ambientais Desenvolvimento sustentável

Crescimento Outros TOTAL

10 7 7 1 5 30

Um terço dos entrevistados deste setor afirmou que as mudanças climáticas são o maior desafio ambiental a se enfrentar nas próximas décadas; como desafios ambientais no Brasil, sobressaíram-se também a preservação da Amazônia e o desenvolvimento sustentável.

“O Brasil teria que assumir o seu papel e aí eu colocaria nos próximos vinte anos como exemplo de redução de dióxido de carbono, estabelecendo como país em desenvolvimento.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, S.J.G., 65, FÍSICO)

“Reduzir drasticamente os níveis de emissões.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“Hoje a questão do aquecimento global já não é mais uma falácia dos ambientalistas. Hoje é uma comprovação científica e acredito que o mundo tem que voltar exatamente para buscar um desenvolvimento sustentável, para propiciar que as futuras gerações tenham condições de sobrevivência no planeta.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, W.F., 50, MÉDICO VETERINÁRIO)

Amazônia

“No Brasil é mapear a Amazônia e usá-la sem destruí-la, esse é o grande desafio.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, C.B., 54, ENGENHEIRO MECÂNICO)

“No caso especifico do Brasil, neste caso será a floresta Amazônica, isto está claro, até porque a questão do desmatamento passou a ser um problema grave. O Brasil é o primeiro país em desmatamento, com a Indonésia em segundo.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.M., 37, ECONOMISTA)

Desenvolvimento sustentável

“Certamente é o que está colocado, de que forma nós vamos, no entender de que cada um tem que colaborar para que o mundo possa se desenvolver de uma forma sustentável, principalmente no caso das grandes cidades, ter condições de fazer essa integração de desenvolvimento e a preservação.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.M., 37, ECONOMISTA).

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Nenhum entrevistado do setor discorda sobre o grande impacto das mudanças climáticas

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas.

Concorda fortemente Concorda TOTAL

12 18 30

Page 109: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 0 9

Todos os entrevistados deste setor afirmaram concordar com a possibilidade de as mudanças climáticas causarem danos graves às sociedades. 12 entrevistados concordaram fortemente com essa afirmação; 18 apenas concordaram.

Algumas falas abaixo ilustram esse posicionamento:

“Concordo fortemente, não tenho nenhuma dúvida sobre o ponto de vista de que está havendo mudanças climáticas e que elas são impactantes, que são onerosas para todos, sobretudo para os mais pobres, porque as sociedades mais desenvolvidas conseguem ter cidades abaixo do nível do mar.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.C.A., 60, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Concordo perfeitamente, eu acho que as mudanças climáticas têm provocado essas catástrofes. E isso é muito claro, a cada ano, a cada década, as catástrofes são mais constantes. Se você desmata, você aumenta a temperatura, desequilibra o meio ambiente, você aumenta as enchentes, temporais e de repente falta água. (...) Então eu acho que isso está comprovado, é uma coisa que você vê a olho nu, não precisa ser cientista. Mas o cientista também tem todos os dados, créditos mostrados aí para a população.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, W.F., 50, MÉDICO VETERINÁRIO)

“Concordo [que as mudanças climáticas poderão causar impactos às sociedades], do ponto de vista de que as mudanças climáticas são um custo intergeracional. Nós não temos exatamente uma responsabilidade direta pelo que aconteceu, porque isso é resultado de outras gerações, de foco no desenvolvimento no mundo inteiro.

Nós não vamos exatamente viver benefícios da reversão do quadro, porque nós não vamos estar aqui quando isso acontecer, mas nós somos responsáveis pelas próximas gerações. Então, é uma geração que precisa se convencer e abrir mão disso, que dizer, a gente não vai conseguir resolver o problema para gente,

(...) Estamos pagando um preço de gerações atrás, de outras gerações, e vamos tentar consertar a vida das gerações adiante, então, é um dilema dessa geração que precisa ser a encarado do ponto de vista de quem a gente quer, de que mundo a gente quer deixar para frente.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

7.IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

Morosidade e superficialidade

Importância do tema em seu setor de atuação:

Muito importante Importante Pouco importante TOTAL

17 11 2 30

Apesar da reconhecida importância e urgência de se tratar das mudanças climáticas, a grande maioria dos entrevistados afirmou que o assunto não vem sendo tratado propriamente na esfera

Page 110: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 0

legislativa. Três entrevistados foram enfáticos em afirmar que a atuação parlamentar nesse sentido é quase nula:

“Muito pouca a atuação no parlamento, na verdade os projetos aqui andam muito devagar, como em grande parte dos países do mundo. O parlamento só anda quando há uma forte pressão da situação do próprio majoritário, como o governo, que não tem nenhum interesse em se aprofundar nas questões de mudanças climática, questões ambientais. Nós aqui sofremos muito os reflexos desta inapetência administrativa governamental do poder executivo federal.

É um tema em que a importância foi dada do ponto de vista da retórica, mas na verdade os projetos aqui andam muito lentamente. (...) Fez um seminário, promoveu uma viagem de quatro deputados até a Inglaterra e só isso. Amanhã nós vamos fazer um debate sobre a devastação da Amazônia, amanhã vai ser interessante.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

“Eu diria que essa preocupação é muito espasmódica em função da relevância que a mídia dá, quando o assunto sai da mídia a tendência é que os deputados acabem se preocupando mais com assuntos mais dos seus dia-a-dias, ligados às suas bases mais diretamente.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.R., 49, HISTORIADOR)

“Eu acho que ainda tem pouca importância, o ser humano de um modo geral quer cuidar da sua sobrevivência imediata sem se preocupar muito com as futuras gerações. É de pouca importância dado a importância que é o caso.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, W.F., 50, MÉDICO VETERINÁRIO).

Outros disseram que este tema está sendo discutido de forma superficial, nunca como prioridade. Apontam dificuldades no processo de tomada de decisão, tendo em vista o assunto ser ainda controverso e repleto de incertezas.

“Como em todo lugar do mundo, está tentando compreender o que é possível fazer, o que está à disposição do homem para fazer enquanto regulador, legislador, que tipo de ambiente a gente precisa criar para fazer das medidas mitigatórias, uma realidade.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“Está sendo tratado, está na pauta, é um tema até agora de muito mais preocupação do que de ação, não só no parlamento, mas também nos governos, não é um tema de governo central, só de governo de união, mas de todos os governos, as pessoas, mas é um tema em que uns resultados são resultados a médio e longo prazo, as pessoas debatem muito, mas agem pouco, tem grande preocupação, mas tem pouca ação, e a gente observa isso não só no Brasil, mas nas próprias Conferências da Partes que tratam do tema. Os países estão muito preocupados, mas, na hora de chegar e atingir de fato as metas, há uma grande dificuldade de conseguir um consenso em torno disso, porque muita gente quer discursar, mas pouca gente quer agir com relação ao tema.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“O Congresso Nacional é muito dividido, e eu acho que o Congresso Nacional sozinho também não vai se sensibilizar com diferentes problemas comerciais internacionais que existem.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, J.S., 51, ENGENHEIRO ELÉTRICO).

Page 111: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 1

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

A grande maioria dos entrevistados declarou que o estabelecimento de metas de redução, embora não afete o setor legislativo, vai implicar em muita discussão no parlamento, pois muitos setores da sociedade tenderão a discordar ou desejar exercer influência:

“Olha, a questão não é afetar, é discutir, não é?” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, M.T.M.S., 49, JORNALISTA)

“É uma variável importante na definição das políticas, acredito que vá gerar muita discussão.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, J.E.V.R., 58, ARQUITETO)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Interesses econômicos e conservadorismo dificultam o enfrentamento

As barreiras para enfrentar as mudanças climáticas segundo os entrevistados giram em torno dos interesses econômicos e do conservadorismo em relação aos modos de produção que ignoram as questões climáticas. Também foram mencionadas a falta de educação ambiental, a incompetência do poder público e a desinformação sobre o assunto.

A barreira econômica

O modelo econômico atual, na opinião de alguns entrevistados, parece não colaborar com os esforços para enfrentar as mudanças climáticas. Seja pela diminuição do lucro, seja pela perda de competitividade, o valor econômico pesa muito na hora de se adequar ao padrão de baixas emissões.

“As forças do mercado.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

“Barreiras desde o uso de determinadas restrições, que têm mais caráter econômico do que ecológico, desde imposição de restrições que não levem em conta a compensação para o serviço ambiental que o país presta, então você tem uma série de armadilhas aí. Quando, por exemplo, você discute no exterior a questão do etanol, as informações são totalmente equivocadas sobre a possibilidade de o Brasil produzir etanol na Amazônia, e isso quem conhece sabe — não é possível a curto prazo.

Mas isso pode servir de desculpa para evitar uma série de investimentos de possibilidades para o país crescer um pouco mais do que está crescendo. Então, o Brasil tem uma guerra diplomática e precisa ter uma atitude independente, altiva, em relação a esses questionamentos, porque tem um viés econômico também por trás de toda a medida mal calculada.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“É sempre econômico, o lucro, ele tem a prevalência, a economia tem a prevalência sobre o meio ambiente, sempre foi assim e continua sendo assim.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.N., 59, ADVOGADO)

A barreira ideológica

Outro entrave à ação em relação às mudanças climáticas é de ordem ideológica. A mudança de paradigma para um modelo mais limpo esbarra com a resistência, o preconceito e a desinformação de alguns atores à frente do processo de tomada de decisão.

Page 112: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 2

“Informação é o maior obstáculo, informação, conseqüentemente a desinformação, a falta de informação e a desinformação. As pessoas aceitam que a ministra da Casa Civil desafie e até, de certa forma, desqualifique as pessoas que estão defendendo a questão ambiental, porque ela é a grande defensora da produção de eletricidade a qualquer custo. No Brasil esse é um problema, no mundo inteiro.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.C.A., 60, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Pré-concepção de idéias, que resista a qualquer tipo de cooperação, ter fundamentalismo ambiental, fundamentalismo econômico, são barreiras em que pedem uma discussão racional.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.V., 51, ENGENHEIRO)

“Então, nós temos estes três fatores: a falta de educação ambiental, excesso de ganância dos empresários e uma estrutura econômica e política que foi criada e que é forte, ela existe em função de outros paradigmas, mas agora ela precisa ser transformada.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Eu acho que a limitação número um, vou voltar a dizer, é a vontade política de [fazer] acontecer. Falo vontade política, mas falo vontade do político; político [somos] todos nós, como cidadãos. Vontade de tomar uma atitude. É muito fácil reclamar, mas eu acho que o ponto número um é vontade.

Segundo, conhecimento. Para ter vontade, tem que saber, se vai brigar, por que razão? Tem que ter argumento, né? Então, falta conhecimento também da população, de uma forma geral, para saber de que forma ela vai brigar, e por que é que ela vai brigar, e por quem ela vai brigar.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, P.B., 43, JORNALISTA)

O sentimento de não urgência

Além da desinformação e dos posicionamentos ideológicos que constituem obstáculos à ação, há também aqueles que pensam que o problema das mudanças climáticas não é tão urgente assim. A falta de perspectiva em relação aos problemas concretos não favorece uma postura mais engajada, pró-ativa.

“Em primeiro lugar, um sentimento de não-urgência. As pessoas, cotidianamente, acham que isso é algo que – pelo menos no Brasil, né? – vai acontecer muito para lá, adiante; isso não entra na ordem das preocupações cotidianas. Em segundo lugar, as pessoas acham – no Brasil, a que eu estou me referindo sempre – não há consciência que o fenômeno vai nos alcançar, e que ele nos vai alcançar de uma maneira grave; isso é uma coisa bastante distante. E o reflexo disso [é que] o próprio governo tem outros temas mais urgentes; não é algo que convoque o governo como um todo para o enfrentamento disso. Na verdade, tem uma postura de empurrar com a barriga a solução desses problemas.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.J., 56, CONSULTOR)

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Propostas do setor

Foram identificadas, nas 30 entrevistas, cerca de 10 propostas de ação genéricas em relação às mudanças climáticas que incluem conscientização ambiental, programas de cooperação internacional e linhas de financiamento

“A mudança comportamental (...) enxerga as interdependências, e eu começo a fazer pressão junto às empresas, que passam a ser empresas sustentáveis, mais a somatórias das

Page 113: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 3

ações das empresas. Ela é insuficiente para resolver essa encrenca brutal em que nos metemos das mudanças climáticas.

[Mas] eu preciso da ação do governo, eu preciso de pressão do governo atuando nas três linhas que existe até hoje tomando o controle, leis de incentivos e medidas híbridas que inventarão. Eu preciso ter medidas compulsórias de caráter internacional, seguidas por todos os países de uma forma obrigatória, se eu não conseguir mudar esta situação ficar no âmbito da voluntariedade. Eu duvido que a solidariedade planetária seja suficiente para resolver o problema.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

“Hoje você tem linhas de financiamento, você tem programas de cooperação internacional, você tem organizações não-governamentais com apoio de outros países desenvolvendo projetos de fonte renováveis de energia, você precisa organizar isso e se direcionar melhor numa outra proporção.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“Na questão da Amazônia, acho que tem que ter um pacto internacional, nós temos que encontrar uma forma de melhorar a qualidade de vida, dar qualidade de vida, sobretudo aos habitantes da floresta, às pessoas que moram na região para que se possa preservar a floresta. (...) Nós temos que buscar um pacto internacional que traga qualidade de vida sustentável para os habitantes da floresta, sobretudo para o país.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.C.A., 60, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

Outras oito propostas mais específicas encontram-se listadas abaixo:

Atribuir valores à floresta em pé

“Por que a pessoa derruba floresta para substituir aquela floresta por uma pastagem ou uma agricultura? Porque ele economicamente acredita que da agricultura ou pastagem ele consegue aferir alguma coisa a mais do que da floresta. Então, você veja bem, ele deveria atribuir valores, valor à floresta, o valor ao cerrado, pagar por serviços ambientais, aí a pessoa não se sentiria estimulado a substituir as árvores por pastagens ou por agricultura. É uma coisa simples que eu falo. Tem muito discurso com pouca ação prática.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, H.P., 52, ECONOMISTA)

Política nacional de criação de fundações municipais de meio ambiente

“Incentivo de uma política nacional de criação, em cada município, de uma fundação municipal de meio ambiente.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, S.J.G., 65, FÍSICO)

Implementar inspeção veicular

“Considerando os principais emissores, você teria que, por exemplo, no âmbito das cidades, aplicar a inspeção veicular de forma rotineira e periódica pelas prefeituras, de formas progressivamente mais rígidas, as leis que dizem respeito à emissão de gases.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.J., 56, CONSULTOR)

Criação de um fundo de compensação

“Você teria que criar um fundo a exemplo do que no passado foi pensado como GEF — Global Environmental Facility, que resultou da Eco-92, e que nunca foi realizado. (...) Você tem que criar um fundo de compensação para a prática da utilização do desmate da madeira de forma sustentável, de acordo com o plano de manejo, aquilo que você não tem; enfim, você tinha que ter uma alternativa, está certo, a essa maneira em que a população

Page 114: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 4

ribeirinha e outras populações, ela termina, até por questão de pobreza, entrando nesse ciclo.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.J., 56, CONSULTOR)

Isenção fiscal

“As pessoas têm que sentir isso no bolso, então de repente se você desse algum tipo de isenção, algum tipo de incentivo a essas pessoas, ou de alguma forma recolhessem bônus que viessem a se transformar em alguma coisa, acho que isso seria um grande incentivo, um grande passo, já que pela conscientização que também é válida, a educação e a conscientização eu acho que na verdade é o maior resultado; quando você toma consciência da situação você vai querer pagar para contribuir.

Você não vai ter que ser incentivado a isso, você vai querer pagar para contribuir. Mas até que se chegue a esse estágio, já que a gente precisa acelerar, já que parece que as coisas estão andando mais rápido do que o imaginado, eu acho que um tipo de incentivos como isenções fiscais.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.G., 32, ECONOMISTA)

Lei de crimes ambientais

“Eu acho que uma coisa é muito importante aqui, e eu até fui relatora de um projeto de lei, logo na minha chegada aqui: são os crimes ambientais. Tem que constar do Código Penal; é prisão com reclusão. Eu defendi e consegui aprovar meu relatório, sabe?(...) Aí, quando eu coloquei a pena mínima de seis anos de reclusão, o cara pulou: “Está maluca? Se homicídio que é homicídio, a pena mínima é de seis anos, como é que você quer começar um crime ambiental com seis anos?” Eu falei assim: “Mas o crime ambiental; homicídio mata uma pessoa; crime ambiental mata um monte delas de uma vez só.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, M.M., JORNALISTA)

Educação ambiental

“Os governos precisam gastar mais e melhor, precisam investir mais do que seu próprio discurso, na educação ambiental, usando mais as publicidades de governo, trabalhando mais a transversalidade dentro das escolas e promovendo a educação ambiental, as discussões, em todos os fóruns possíveis da sociedade, numa Associação de Pais e Mestres, num Conselho Comunitário, num Conselho de Direitos Humanos, nós temos que integrar o foco ambiental a todas as políticas públicas. Os governos precisam fazer isso e a sociedade precisa cobrar e participar desse processo.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

Transferência de tecnologia

“Em contrapartida, nós precisamos desenvolver tecnologia, trazer tecnologia dos países desenvolvidos para cá, porque nós estamos em um nível de desenvolvimento muito grande.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL).

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

O governo é o principal ator

Segundo os entrevistados, a responsabilidade de lidar com as mudanças climáticas é compartilhada entre diversos atores, mas é principalmente do governo, em seus diversos níveis (15 citações). No entanto, é enfatizada a necessidade de articulação e educação de toda a sociedade para resultados eficientes. Surge aqui também a importância do engajamento dos jovens e dos meios de

Page 115: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 5

comunicação como impulsionadores de uma mudança social que leve em conta as questões climáticas.

“Você ter uma articulação: Estado brasileiro, Estado federativo, entre União, Estado e município. E todos estarem com o combate às emissões de maneira articulada. (...) Resta mesmo o Ibama fazer isso, [para que] então você não tenha descontinuidade no processo de controle de combate às emissões ambientais.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.V., 51, ENGENHEIRO)

“É claro que os governos têm a responsabilidade como gestores da coisa pública. Os governos, as três instâncias da União, Estado e município.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

“Bem, acho que a responsabilidade aí também é compartilhada, porque a administração pública tem um papel, o governo brasileiro e o Congresso Nacional, eles precisam adotar uma política nacional sobre mudanças climáticas, temos que ter uma diretriz.

Nós não temos ainda, não adianta discutir. Nós estamos discutindo aqui, no Congresso tem uma comissão nossa discutindo, mas são responsabilidades, nós temos que ter uma política. (...) Então a administração pública tem que ser propositiva, e tem que tomar iniciativa com relação ao tema.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

Em segundo lugar os entrevistados deste setor citaram a responsabilidade dos empresários e da sociedade civil:

“O empresariado, os capitalistas que interferem nisso e a população nas suas diversas formas de organização.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, J.E.R., 58, ARQUITETO)

“No Brasil são os proprietários de terra que desmatam e queimam e precisavam se comprometer com o fim da queimada e do desmatamento [e o setor].” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, P.T., 61, ADVOGADO)

“Naturalmente que as pessoas mais esclarecidas, com mais anos de escolaridade, elas têm muito mais facilidade de compreensão dos distúrbios climáticos que estamos vivendo. (...) O sistema produtivo tem que participar dessa discussão, sistema de trabalhadores.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, N.M., 43, MÉDICO)

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

EUA e China atrapalham tomada de decisão no âmbito internacional

Todas as entrevistas desse setor refletem que há ainda muito o que fazer no âmbito internacional em relação às mudanças climáticas. Muito ainda atreladas às questões políticas, as ações efetivas são identificadas somente em alguns países da União Européia, entre eles a Inglaterra e a Alemanha.

Os EUA e a China são vistos como os maiores empecilhos para políticas de redução das emissões de gases de efeito estufa, ainda que alguns reconheçam avanço relativo por parte do primeiro.

Nessas falas, nota-se certa descrença em relação às ações isoladas dos países, como se não fossem resultar em muitos benefícios a longo prazo. A importância da ação conjunta dos países é enfatizada por quase todos os entrevistados.

“Já os Estados Unidos têm o papel de não assumir redução, em caráter voluntário, avançou um pouco agora em Bali, mas é difícil resolver esse problema sem uma

Page 116: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 6

compreensão maior de uma potência como são os EUA.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“[O tratamento do tema no âmbito internacional se dá] ainda com timidez, embora com avanços importantes, mas a gente tem ainda os EUA e a China, os maiores emissores, que deveriam ser teoricamente os maiores interessados, e a gente percebe que estão a reboque. Eu espero que a próxima administração dos EUA tenha uma postura bem diferente. Me parece que pelo menos vai ser melhor que a do Bush, seja qual for um dos três, o vencedor. Até mesmo o candidato republicano é um pouco mais avançado que o atual presidente. Nós não temos uma situação melhor por causa destes dois países.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Nada adianta o Brasil acabar o desmatamento da Amazônia ou reduzir drasticamente suas emissões e os Estados Unidos a China e outros países continuarem aumentando, esse é um acordo que tem que ser global, e aí você tem dificuldades grandes, sobretudo duas, uma nos Estados Unidos, que se recusam a assinar o Protocolo de Kyoto, que tem toda a sua economia montada em base energética de origem fóssil, que tem uma postura muito arrogante com os demais países, e a China, por outro lado, que vem experimentando índices de crescimento bastante grande, um pais extremamente populoso, grande parte dessa população ainda em condições econômicas bastante precárias e que também toda sua economia baseada em origem fóssil.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.R., 49, HISTORIADOR)

“Eu percebo que alguns países importantes, como os Estados Unidos, a China e outros, ainda têm tratado isso como segundo plano, sempre depois da sua economia, do seu índice de desenvolvimento. É uma pena. Então, eu vejo que alguns países começam a tratar com mais dedicação, e outros menos, e às vezes até se escondendo atrás da falta de justificativa técnica. É um absurdo. São países que gastam milhões de dólares na guerra e em alguma coisa, e não estão gastando nada similar, na verdade, com estudo que poderia ser para nos ajudar a ter certeza ou não. Então, ainda é muito preocupante. Mesmo que grande parte dos países estejam discutindo, não está sendo dada a importância adequada, e alguns países ainda tratam um tema de tão importância como segundo ou terceiro plano.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, J.S., 51, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

Os bons exemplos: Inglaterra, Alemanha, Suécia, Noruega

“Eu acho que a Inglaterra faz um trabalho consistente e a formulação política com um componente ambiental já tem um peso diferenciado nas ações do primeiro-ministro e de toda a diplomacia britânica. Então, ela já atuou muito fortemente nisso, mesmo que isso ainda tenha certa incoerência com o relacionamento bilateral, o relacionamento com outras potências, nos outros países, como é o caso da China, da Índia.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“A redução das emissões na Inglaterra nos últimos anos. A Inglaterra conseguiu um crescimento reduzindo as emissões em 14%. Da mesma forma a Alemanha tem conseguido reduzir as emissões, a Suécia também está em processo de crescimento com redução das emissões. Alguns países nórdicos, a Inglaterra e a Alemanha já conseguem crescer e reduzir essas emissões. São projetos em processos vitoriosos que podem evidentemente ficar mais importantes na medida em que se desenvolve cientificamente, que a sociedade se organize. Mas a premissa é a de que é preciso crescer reduzindo as emissões.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, F.G., 67, JORNALISTA)

“Conheço [programas internacionais de redução das emissões], eu estive inclusive com a embaixadora da Noruega. A Noruega colocou o desafio de até 1920 ter carbono neutro,

Page 117: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 7

carbono zero. Então é um país altamente desenvolvido com um número de consciência da população muito elevado e dá um exemplo comum de que, se a gente colocar como regra não apenas reduzir 5%, como vários países europeus vão reduzir até 5% até 1920, mas zerar as suas emissões, ou seja, através de crédito de carbono de outros países emergentes e tal, neutralizar as emissões que ela hoje emana...” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

Um exemplo de boa prática no Brasil

“Um dos grandes programas que eu conheço, e que acho fantástico, é um programa que vem sendo desenvolvido há alguns anos, e de forma pioneira, aqui em Minas Gerais, pelo Grupo Plantar. Que tem hoje, seguramente, o maior e melhor viveiro de mudas de eucalipto do Brasil. E que tem hoje tido muito mais sucesso financeiro com crédito de carbono do que propriamente com suas atividades siderúrgicas. Eu vejo com muita simpatia as iniciativas dessa natureza. A gente começa a ver também outras iniciativas começarem a acontecer, inclusive em parceria com produtores, como é o caso do programa Fazendeiro Florestal, patrocinado pelo grupo Arcelor Mittal. Eu vejo tudo isso com muita simpatia.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, N.M., 43, MÉDICO)

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE "DESMATAMENTO EVITADO"

Proposta é pouco conhecida

Um dos assuntos abordados no âmbito internacional é a proposta brasileira de desmatamento evitado. A maior parte dos entrevistados desconhece a proposta, ou ouviu falar dela somente de modo superficial. Os poucos (4) que a conhecem consideram a proposta positiva, mas admitem que ela precisa ser aprimorada. Uma das grandes preocupações é com a necessidade de um mecanismo de compensação às populações que dependem economicamente da atividade de extração de madeira, para que a proposta seja eficaz.

“Eu acho a proposta boa. Como eu disse no inicio, se você quiser preservar uma área tem que dar condições de sobrevivência às pessoas que moram lá. Não pode pegar as pessoas que estão lá e trazer para Brasília, São Paulo, Espírito Santo, ou Rio de Janeiro, tem que dar condições de sobrevivência. (...) Eu acho que é muito adequado termos um fundo que possa ajudar a implantar projetos de desenvolvimento sustentável nas comunidades que moram na Amazônia, então, se você consegue evitar o desmatamento com a adoção de políticas, tem que financiar. Eu acho que os países que hoje já não têm mais suas florestas podem colaborar, os países que têm condições de colaborar podem colaborar para que o Brasil adote essas políticas.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“Com relação à questão das matas, da preservação, da manutenção das nossas árvores em pé, tem aí o grande projeto que está emergindo, há quase dois anos, já sendo discutido, e ainda tem que avançar muito para ser aperfeiçoado, que é o do desmatamento evitado. É da mais alta relevância às nossas populações pobres ribeirinhas, indígenas etc.; elas precisam desse tipo de apoio; elas vão segurar as nossas árvores em pé; elas vão manter as nossas árvores em pé. Mas elas precisam ter condições de vida melhor porque daí a árvore fica em pé. Porque se elas não tiverem condições de vida, elas vão derrubar a árvore, nem que seja escondido, de qualquer jeito.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, S.S., 59, CIENTISTA SOCIAL)

Page 118: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 8

14.CONFERÊNCIA DE BALI

A ineficiência de Bali

Na maioria dos casos, os entrevistados taxaram a Conferência de Bali (dezembro de 2007) como ineficiente — uma grande comoção para poucos resultados visíveis.

“Na verdade, hoje, até por uma questão lógica de realidades diferentes, de lugares diferentes no mundo, hoje o mundo meio que perdeu o sentido daquelas super conferências, super encontros, que não levam em conta a agilidade do mundo atual, a necessidade de direcionar esforços, outros tipos e atividade. Na verdade, 50% do que foi discutido lá poderia ser discutido em troca de e-mails, e todo mundo com a mão na massa. Então você não precisa reunir 50 mil pessoas para saber que 25 decidem. Você tinha que formular para essas 25 decidirem. O modelo para mim está ultrapassado.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“O que o Brasil fez em Bali é algo completamente diferente, é uma proposta de voluntários e vender diplominhas para ONGs colocarem na parede, empresas colocarem na parede para mostrar o bom comportamento, algo voluntário que não deveria nem ser feito numa reunião de Bali, que reuniu duzentos países com um custo tão grande para definir uma convenção, definir medidas compulsórias, leis internacionais, e não para ficar mostrando aquilo que cada pais fez de voluntariamente ou ainda o que pretende vir a fazer o que ainda e pior. (...) O que se obteve em Bali já se esperava — o resultado não é nenhum mapa do caminho, é um mero calendário de reuniões para chegar a alguma coisa.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

“Aí é que me preocupa. (...) A conferência na parte física foi um sucesso, mentes brilhantes passaram por lá, idéias inovadoras, idéias que muito contribuíram, mas por enquanto idéias que estão no papel, então o resultado prático dessa conferência ainda não foi apreciado, nós ainda não tivemos oportunidade de vermos esse resultado prático, resultado prático que nós estamos esperando, que é o que vai fazer a diferença na verdade.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.G., 32, ECONOMISTA)

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Um país, muitos deveres

A questão sobre as responsabilidades do Brasil em um programa mundial de redução das emissões de gases de efeito estufa suscitou uma vasta gama de opiniões dos entrevistados. Os argumentos tangenciam a retomada de liderança por parte do país em relação aos compromissos e metas de redução de emissão de gases de efeito estufa, a importância da contenção do desmatamento, o incentivo à produção de biocombustíveis e o investimento em ciência e tecnologia. A situação do Brasil se diferencia da dos demais países: o calcanhar de Aquiles brasileiro ainda é achar alternativas econômicas para as populações que dependem da exploração dos recursos naturais na ilegalidade, prevenindo o desmatamento irregular.

As responsabilidades mencionadas dizem respeito à preservação da Amazônia, estabelecimento de metas, fiscalização, liderança brasileira e preservação da matriz energética.

Page 119: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 1 9

Preservação da Amazônia

A maior missão do Brasil no que tange ao enfrentamento das mudanças climáticas é a preservação da Amazônia e de outras florestas no país, pois o desmatamento e as queimadas são nossos maiores emissores de gases de efeito estufa, dada a nossa matriz energética essencialmente “limpa”.

“Combater o desmatamento, hoje nossa missão é o desmatamento, a emissão de gases que causam o efeito estufa. Também reconhecendo que as cidades, as megalópoles brasileiras, [deveriam ter] tipo consumo racional.

Tem dados ambientais a serem tomados, no tocante ao lixo de resíduos sólidos, sua emissão de metano, mais racional, investir mais na hidroplicidade e no uso racional das riquezas dos rios, o pais ter uma matriz energética limpa, continuar investindo em pesquisa para usar os potenciais da Amazônia corretamente.

[A] primeira hidrelétrica da Amazônia com a concepção de sustentabilidade, que esse processo seja estendido para outras potências hidráulicas existentes, então fazer o dever de casa.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.V., 51, ENGENHEIRO)

“O Brasil tem que combater o desmatamento não apenas na Amazônia, mas na floresta Atlântica, mas combater o desmatamento e criando alternativas para as populações que já residem nessas regiões. Você não pode simplesmente, expulsar essas pessoas que vivem na região amazônica, e que dependem da floresta, como habitat para sobreviver, você tem que conduzi-las para um manejo sustentável sempre que possível.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Para o Brasil é muito mais fácil do que para outros países se adaptar a uma economia neutra em carbono ou com baixas emissões em carbono, porque nossa matriz energética já é de origem limpa, o nosso grande desafio hoje é como utilizar, como desenvolver conhecimento para explorar de forma sustentável a floresta em pé, para reduzir nossas emissões e aproveitar toda a biodiversidade que tem nela.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.R., 49, HISTORIADOR)

Estabelecer metas

Falou-se muito também na importância do estabelecimento de metas e medições das nossas emissões (chamadas inventários) para que se possa então prosseguir com projetos concretos de efeitos mensuráveis.

“Então nós caminhamos por esse ponto e agora estamos trabalhando aparentemente já com foco nos projetos que consideramos fundamentais. Um deles é o inventário. Determinar uma responsabilidade do governo e fazer um inventário das emissões e apresentar o resultado de ano em ano, de dois em dois anos de acordo com a possibilidade.

Vai ser muito difícil você definir uma política de mudanças climáticas no Brasil se você não tem um inventário, se você não sabe se as poluições estão aumentando ou diminuindo. (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, F.G., 67, JORNALISTA)

“Acho que temos que ter metas, não é porque somos um país em desenvolvimento que a gente deva dizer que isso é uma questão dos países desenvolvidos. Nós devemos preservar o que temos, devemos incorporar a preocupação ambiental em todos os projetos de desenvolvimento. Para mim é uma questão fundamental. Em minha opinião, nós, no Brasil, somos tão responsáveis como qualquer chinês, qualquer americano, qualquer alemão.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

Page 120: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 0

“Bem, a primeira delas é essa coisa de você definir as metodologias e os indicadores para ter e dar transparência e permitir que a sociedade realmente acompanhe esse andamento. No Brasil, eu acho que tem que ser isso, e aí o governo tem que fiscalizar.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, J.S., 51, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

Fiscalizar é preciso

“Eu não posso concordar com a atividade madeireira inconcebível, ridícula, como vem acontecendo, sem uma fiscalização. Defendo inclusive a presença da Força de Segurança Nacional, uma presença contínua dessa Força Nacional na Amazônia, para evitar que os madeireiros saqueiem a Amazônia, como têm feito nos últimos anos.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, N.M., 43, MÉDICO)

“Mas precisamos ainda de fiscalização, precisamos de controle, e a fiscalização punitiva sozinha não resolve o problema. (...) O que nós precisamos é de projetos que venham a ajudar as pessoas que estão passando necessidade lá muito longe e que vão derrubar uma, duas, três árvores para tirar sua sobrevivência; que elas sintam que são co-responsáveis e que não precisam derrubar essas duas, três árvores; e que elas terão a condição de vida com dignidade.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, S.S., 59, CIENTISTA SOCIAL)

O Brasil deveria reassumir posição de liderança

“O Brasil deveria reassumir a posição de liderança que teve em 1992 e 1997, usar o seu peso especifico no grupo que ele formou nos países em desenvolvimento e postura que todos os países do mundo assuma, compromissos, assumam metas de redução ainda que metas diferenciadas, se temos hoje um diagnostico mostrando que são doze os grandes emissores responsáveis por mais de 80% [das emissões].

Eu não vou conseguir resultados palpáveis se só a metade deles que são os países desenvolvidos se responsabilizarem por reduções de metas, a ladainha das metas comuns, porém diferenciadas. e ponto final. Ela pode ser uma meta, pode ser uma proposta correta do ponto de vista de um acerto de contas com o passado, mas ela é absolutamente caolha, cega, ela é catarata se nós observamos que ela não vê os grandes poluidores do presente, que nós vamos conseguir reduzir em 25% no mínimo até 2020, e em 50% no mínimo a emissão de gases do efeito estufa até 2050 em relação aos níveis de 1990 se não tiver a colaboração de todos.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, A.C.M.T., 61, ENGENHEIRO)

Manter limpa a matriz energética brasileira

“Acho que o Brasil, naquilo que ele consegue fazer, como um país ainda em desenvolvimento, com todas as diferenças sociais que a gente tem, pelo menos temos um programa de biocombustível em andamento com todas as imperfeições que o programa possa ter, mas pelo menos é um esforço nesse sentido de tentar reduzir. Nós temos um potencial de energia hidráulica, que poderia ser melhor aperfeiçoado, otimizado ainda, quando você fala de fazer energia a partir das nossas hidroelétricas, ainda tem um componente ambiental muito forte.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, H.P., 52, ECONOMISTA)

“Eu acho que temos de preservar a nossa matriz energética limpa. Cada vez mais, hoje, a gente vê à exaustão as grandes represas como modelo de geração de energia, energia das hidrelétricas, então os impactos ambientais que provocam, acabam levando a dificuldades de licenças ambientais para construção de grandes projetos.

Page 121: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 1

Então, temos hoje pequenas centrais hidrelétricas sendo construídas, mas a necessidade, a demanda por mais energia está levando a uma situação de buscar, e o Brasil tem lançado mão disso, energia termonuclear, ou seja, energia produzida através da queima de derivados de petróleo.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

Pequenos atos fazem diferença

Todos os entrevistados deste setor disseram considerar a ação individual parte do processo de redução de emissões. A ação individual está muito atrelada a pequenas ações que levem a um novo modo de vida, com a racionalização do uso dos recursos e a adoção de mudanças nos padrões de consumo.

A diferença ocorrerá nos pequenos atos, como trocar de carro ou usar transporte coletivo:

“Eu acho que, individualmente, é muito importante a atitude que cada um vai fazer, eu vendi um carro a gasolina e comprei um carro a álcool, ainda que haja muita celeuma sobre a cana, ainda eu acho melhor ter um carro com etanol, que de qualquer modo a cana cresce e ela seqüestra carbono, e a gasolina só emana o carbono. A gente tem sim cada atitude individual faz a diferença, pode até ser insuficiente do ponto de vista de resultado de curto prazo, mas faz a diferença em longo prazo.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Primeiro você procurar usar o transporte coletivo em sua cidade, lutar para que em sua cidade haja um transporte que limite dióxido de carbono, como o metrô, como de superfície, ônibus elétrico.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, S.J.G., 65, FÍSICO)

Ações domésticas, como tomar banhos mais curtos, substituir as sacolas plásticas nos supermercados por sacolas reutilizáveis também foram citadas.

“Como eu falei, o simples ato de você tomar um banho tentando reduzir o que você consome de água, a torneira que você abre para escovar seus dentes você abrindo só no momento que você precisa efetivamente da água, o lixo que você joga na rua...

Plástico que hoje é um inferno, você vai ao supermercado é sacolinha de plástico para tudo que é lado, e você vê hoje grandes lixões para tudo que é lado deste país. Eu acho que é do berço, tem que começar do berço uma campanha maciça.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

“Você usar sacolas que sejam biodegradáveis. Então quer dizer, ter várias atitudes para você transmitir através da discussão, conhecimento, alertar o mundo no que você falar aos seus filhos, à família, você tem tantas tarefas importantes, que basta seguir corretamente, que você vai ver como contribuir muito para o não aquecimento global.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, S.J.G., 65, FÍSICO)

As mudanças nos padrões de consumo seriam uma via de propagar ações maiores, coletivas.

“Nós somos induzidos ao consumo. Temos muito mais roupas do que a gente precisa, temos muito mais comida, a gente que eu digo é quem tem condições de comprar, tem mais comida do que precisa, gasta muito mais do que precisa e cada gasto nosso é um gasto de energia, e quando você gasta energia você está de alguma forma consumindo recurso natural.

Page 122: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 2

Então, a mudança no consumo, ela é fundamental, a mudança no comportamento é fundamental, como eu disse, as pessoas têm que passar a cobrar a origem do que estão consumindo, passar a cobrar a origem, passar a saber se aquilo que eles estão comprando em uma loja, qual a origem, se tem certificado desse produto ou não tem, se vem da extração sustentável de uma floresta, se tem origem adequada ambientalmente.

Acho que as grandes mudanças que aconteceram no mundo só aconteceram porque alguém, ou algumas pessoas começaram a verificar que a sua ação poderia ser uma ação de modificar a realidade. Uma ação demonstrativa, de cobrança, o caminho é por aí.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

Dois entrevistados crêem que um conjunto de ações individuais pode ser ainda mais significativo que políticas de Estado ou leis não respeitadas.

“Eu sou absolutamente convicto de que você é informado a economizar energia, não jogar lixo nas ruas, você fazer coleta coletiva de lixo, você não desfilar em dia de domingo em carrões lindos queimando petróleo à vontade. Todos têm um efeito bastante significativo, se todos resolvessem fazer isso, era mais do que qualquer política de Estado.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

“Eu acho que precisamos de políticas públicas que viabilizem isso, mas a ação individual, eu diria que é mais importante até do que a política. A gente vê um monte de lei aí, que existem e que não são respeitadas, então é melhor que haja a conscientização individual, que aí estaria sendo respeitada, do que uma lei que não seja respeitada.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.G., 32, ECONOMISTA)

O problema da ação individual no Brasil seria o baixo nível educacional da população. Sem educação, as ações individuais não são capazes de levar a um bem coletivo, ainda que possam ser benéficas em pequena escala ou, como disse um entrevistado, deixar a pessoa “com a consciência tranqüila”.

“A ação individual faz a diferença, porque ela está nessa parte da motivação, da ciência e das coisas. Eu acho que o Brasil tem uma coisa limitada na ação individual. Ela faz a diferença muito num país europeu, onde 70%, 80%, 90% das pessoas têm o curso básico, médio formado; aí a gente dá uma motivação pessoal mais forte. É difícil, para o Brasil, em que as pessoas que pegam o lixo e jogam da janela do seu carro, querer preservar uma árvore; ele [o brasileiro] quebra um galho por distração, por brincadeira.

Quer dizer, aí é o que eu te falei da educação: se o Brasil não investir realmente na educação, não aumentar o nível médio educacional do seu povo, o impacto que tem na ação individual é irrelevante, é realmente pequeno; ele é importante, mas ele não é impactante.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, J.S., 51, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Gastar menos água na hora de tomar banho, usar menos sacos de plástico quando fosse ao mercado, usar menos automóvel e, quando usar, não andar no carro vazio. Plantar árvores, você pode plantar árvores, você pode plantar árvores sozinho, não tem problema não. São coisas que pessoalmente você pode fazer. Agora, essas coisas pessoais não vão mudar a realidade totalmente, mas com a contribuição que você dá, pelo menos vai deixar você com a consciência tranqüila.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, C.B., 54, ENGENHEIRO MECÂNICO)

Page 123: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 3

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

O que mais preocupa é o desmatamento

Convidados a elencar as atividades que mais contribuem para as emissões de gases de efeito estufa no Brasil, os entrevistados mencionam o desmatamento da Amazônia e as queimadas, em primeiro lugar; em segundo, a matriz energética (que, embora ainda seja “limpa”, caso das hidrelétricas, está começando a ficar “suja” devido ao uso das termoelétricas); em terceiro lugar, mencionaram as emissões veiculares, devido ao arcaísmo do sistema de transporte de carga e urbano.

Expansão da fronteira agrícola

“Com relação às mudanças climáticas, a atividade mais impactante é a atividade de extração ilegal da madeira, então aí relacionado ao tema estão as madeireiras, estão atividades da agricultura, ampliação ou novas fronteiras agrícolas, a extração ilegal de madeira é a primeira atividade que mais impacta na questão das mudanças climáticas.” (PARLAMENTAR, ECONOMIA, R.C., 47, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“A exploração agro-pecuária das fronteiras agrícolas e devastando as matas e as vegetações originais, particularmente no Serrado e na Amazônia, já fez isso na Mata Atlântica e hoje faz no Serrado e na Amazônia.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, J.E.R., 58, ARQUITETO)

“O Brasil tem falhado na questão da preservação da floresta e visto errado. Quando nós falamos dos nossos dramas nós não podemos pensar na Amazônia e esquecermos, por exemplo, o cerrado que vem sendo engolido literalmente pelo avanço da fronteira agrícola, pela devastação que vai sendo imposta pelo agronegócio.

Então, por mais que se tenha aprimorado os mecanismos, por mais que tenhamos hoje à disposição satélite, sistema integrado de monitoramento da Amazônia, com satélites, aeronaves, enfim, com a parafernália tecnológica, mas o fato é que a cada ano, a cada relatório final produzido pelos institutos sérios que nós temos, como o INPE, como o IPAM, enfim, nós vemos que a devastação continua.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

“[A nossa grande emissão tem derivado] das queimadas provenientes do avanço da fronteira agrícola na Amazônia. Então as queimadas são o grande contribuinte.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S., 54, SOCIÓLOGO)

“No caso brasileiro é a queimada, essa técnica de queimada que se dá na Amazônia, a ação especial no território Amazônico, da forma que foi feita na década de 50, 60 quando a floresta era um empecilho ao desenvolvimento, a acelerada da região, houve a monocultura exportadora que foi implementada, não respeitando a sua riqueza de biodiversidade levou a essa aceleramento do desmatamento, então isso contribui com as alternativas econômicas e produtivas.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.V., 51, ENGENHEIRO)

Emissões veiculares

“Bom, eu acho que a gente poderia melhorar muito a qualidade das emissões oriundas de veículos, por exemplo. O sistema veicular do país, ele sempre foi ligado ao lobby de setores isolados, mas há hoje uma necessidade premente de um sistema para aferir a emissão de gases no trânsito brasileiro hoje, ainda é uma coisa muito arcaica, acho que tem que ter um investimento pesado nisso, na melhoria da qualidade do transporte urbano, e isso pode ser melhorado com a implementação de transporte de massa e qualidade e

Page 124: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 4

com a inspeção veicular, por exemplo.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“No Brasil a questão da ausência, nas grandes cidades, de transporte de massa. Esta é uma questão cada vez mais grave. O transporte nas grandes cidades é cada vez mais feito em cima de automóveis, muito embora parte do Brasil seja feito de álcool, que é muito poluente. Isso é uma questão absolutamente importante.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

O paradoxo do combustível

A declaração abaixo resume bem a natureza da preocupação de muitos entrevistados: que a descoberta de novos poços de petróleo pressione o uso mais amplo desse combustível, arrefecendo o investimento em outras fontes energéticas e, ao mesmo tempo, a expansão desenfreada dos biocombustíveis na busca de combustíveis mais “limpos” expanda a fronteira agrícola, causando ainda mais desmatamento e queimadas.

“A questão do petróleo. Acho que o fato de, uma contradição, ao mesmo tempo em que a gente, com uma grande possibilidade econômica com a descoberta de grandes poços de petróleo, é claro que a colocação desse petróleo a preços cada vez maiores no mercado internacional é cada vez mais atrativa, e isso pode se transformar também em um agravante, não apenas no plano local, mas também no plano mundial na utilização de combustíveis fosseis.

Eu temo muito que com a descoberta dessas reservas o interesse do Brasil pelo desenvolvimento em tecnologias de biocombustíveis no Brasil reaqueça, essa é uma preocupação que eu tenho. (...)

Terceiro, seria o avanço indiscriminado do etanol, por incrível que pareça, porque, primeiro: com a questão de reduzir biodiversidade e depois fazer com que o avanço sem planejamento do etanol possa avançar sobre novas áreas de cerrado, possa fazer movimento em relação à pecuária que acaba pressionando o sul do Pará e aumentando o arco de desmatamento.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, R.R., 49, HISTORIADOR)

Indústria

“E aí nós temos a indústria da habitação e todas as questões associadas à nossa matriz energética, nossa produção de energia que exige grande discussão cientifica, política, se nós produzimos alumínio, a que custo produzimos, a que custo ambiental, e temos que ir muito a fundo nisso tudo.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Eu acho que é a indústria petroquímica ou coisa parecida, eu acho que o próprio combustível fóssil, o petróleo e tudo mais, e as cidades, a população urbana. Que a questão sempre é voltada para a população rural, mas, os mais poluidores são as populações urbanas.” (PARLAMENTAR, AGRONEGÓCIO, H.P., 52, ECONOMISTA)

“A questão da indústria, da própria indústria. Que é a questão da emissão de fluentes. Muitas indústrias médias e até grandes não têm tratamento de efluentes ainda, mas os órgãos ambientais estão atuando junto a esse setor.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, S.J.G., 65, FÍSICO)

Page 125: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 5

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

É possível, mas requer planejamento

Compatibilizar o desenvolvimento social e econômico com o enfrentamento das mudanças climáticas, na opinião dos entrevistados deste setor, é possível, e se obtém principalmente através do conhecimento, de pesquisas e do desenvolvimento tecnológico, que definirão qual o modelo de desenvolvimento que o país quer traçar.

“Com inteligência, criatividade e formando valor daquilo que a gente tem para oferecer; que é um país com equilíbrio ambiental, uma capacidade de produzir com melhor qualidade, práticas ambientais que estimulem um mercado verde, um diferencial, o país precisa achar essa solução.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, E.G., 41, EMPRESÁRIO)

“Então, eu entendo é que investir maciçamente em educação ambiental, ciência e tecnologia e na promoção da conversão tecnológica da sustentabilidade em todos os parâmetros, na agricultura, na pecuária, e tal. Ter um grande programa de investimento que contemple todos estes princípios culturais da economia e que dê aos empresários a motivação da conversão de suas indústrias.

E o Brasil, ao fazer isso, ganha um crédito maior, evitar o desmatamento da Amazônia, mudar as suas matrizes de produção, melhorar a sua matriz energética e lutar com a Europa e outros países do mundo para termos as barreiras ecológicas, tarifar ecologicamente os produtos que são produzidos com forte prejuízo ambiental.” (PARLAMENTAR, USO DO SOLO, L.C.A.N., 58, ADVOGADO)

“Acho que nós temos tecnologia para isso. Você fazer projetos com responsabilidade ambiental, é uma questão de custar mais caro. Por isso que acho que o governo tem que se empenhar e bancar os custos de verba adicional e fazer projetos que não sejam poluidores. Existe uma forma de você crescer não ligando para o meio ambiente, é mais barato. Existe forma de você crescer olhando o meio ambiente, é mais caro e, portanto alguém tem que pagar essa diferença. A sociedade através do Estado deveria ou deve pagar.” (PARLAMENTAR, ENERGIA, J.M., 54, ECONOMISTA INDUSTRIAL)

“É totalmente possível [compatibilizar desenvolvimento com o enfrentamento das mudanças climáticas], desde que exista uma política pública consistente, discutida. Se nós fizermos canais de fomento, canais de financiamento, para darmos ao empreendedor a possibilidade de estar competindo com seus setores, seja aqui, seja no exterior, e ao mesmo tempo se utilizando dessa mudança comportamental, que é necessária para mudarmos a forma de entender o mundo daqui para frente, e pudermos nos adaptar a essa nova situação e estarmos atacando direta e indiretamente as mudanças climáticas.

Se o governo tiver essa capacidade de discutir essas questões, de fazer o enfretamento dessas questões junto com a sociedade civil organizada, com setores envolvidos, eu acho que nós podemos avançar muito, porque somos um país continental, temos bacias hidrográficas extremamente importantes.” (PARLAMENTAR, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, N.M., 43, MÉDICO)

Page 126: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 6

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este setor, como a mídia, também se considera generalista, cuidando de uma pauta ampla e em geral contando com “assessores” ou “peritos técnicos” para questões mais complexas, como a do clima, por exemplo.

Apesar de reconhecer que a temática das mudanças climáticas será um problema cada vez mais crítico para a sociedade brasileira e mundial, o poder legislativo brasileiro não a vem tratando com a devida importância.

Segundo os parlamentares ouvidos, existem, no momento, outros problemas mais importantes em pauta, e o lobby de alguns setores não permite a tramitação de medidas ligadas ao tema com mais rapidez e objetividade. Apesar da morosidade e superficialidade com que o tema ainda é tratado no Congresso e nas Assembléias Legislativas Estaduais, aos poucos os parlamentares estão se familiarizando com o assunto, principalmente desde o advento da Comissão Mista das Mudanças Climáticas da Câmara dos Deputados e da criação dos fóruns estaduais de mudanças climáticas (criados em São Paulo, Minas e Bahia).

Ao admitir que o tema das mudanças climáticas não está entre as prioridades do legislativo, atribuem o fato à falta de ânimo do governo federal para lidar mais seriamente com o tema, bem como à ausência de uma preocupação expressa da sociedade.

Sem o executivo e sem a sociedade, o Congresso tem muito pouco a fazer, dizem. Em certos nichos, porém, especialmente naqueles em que os ambientalistas transitam com mais desembaraço (e citam a Frente Parlamentar Verde), vai surgindo um interesse maior. Segundo este setor, o tema não chegou ainda ao “coração do Congresso”.

Page 127: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 7

PERFIL DO SETOR

Esta análise se baseia em 30 entrevistas realizadas com representantes do poder legislativo brasileiro, composto por deputados estaduais, federais e senadores. Entre os parlamentares selecionados, predominam os deputados federais (20), conforme mostra a tabela abaixo:

Ocupação Deputado Estadual Deputado Federal Senador Total

6 20 4 30

87% dos entrevistados são do sexo masculino.

Sexo M F Total

26 4 30

A maior parte dos entrevistados (14) tem entre 50-59 anos. Outros 9 situam-se na faixa entre 40 e 49 anos, 5 entre 60 e 69 anos, e somente 2 entre 30 e 39 anos.

Faixa etária 30-39 40-49 50-59 60-69 Total

2 9 14 5 30

A amostra deste setor inclui entrevistados naturais de 14 Estados brasileiros e um país estrangeiro. Metade dos entrevistados é natural da região Sudeste. A segunda grande região mais representada é a Nordeste, com 7 entrevistados.

Naturalidade SP RJ MG ES RS PE MT BA AM PR SC PI SE PB Ext Tot

6 4 3 2 2 2 2 2 1 1 1 1 1 1 1 30

25 de 30 entrevistados do setor possuem curso superior completo e somente 3 são pós-graduados.

Escolaridade Superior completo.

Superior incompleto

Mestrado Pós Ensino Médio

TOTAL

25 1 1 2 1 30

Os entrevistados deste setor são formados em diversas profissões, as mais representativas sendo engenharia (6) e jornalismo (5).

Page 128: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 8

Formação Formação Freq.

Engenheiro 6

Jornalista 5

Advogado 3

Historiador 3

Economista 3

Sociólogo 1

Arquiteto 1

Médico 1

Físico 1

Cientista Social 1

Geógrafo 1

Médico Veterinário 1

Não declarou 3

Total 30

Page 129: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 2 9

SOCIEDADE CIVIL E ONGS

RESUMO

A presente análise contempla dois setores representados na pesquisa: sociedade civil e ONGs. Como não houve dissidência de informação entre os representantes das instituições que compuseram essas amostras, e dado que ambos os setores representam entidades do chamado terceiro setor, a amostra foi unificada, considerando um total de 60 entrevistados pertencentes a diferentes áreas e especialidades.

A área mais representada foi a social, com 18 entrevistados, seguida da empresarial (13), ambiental (11) e agrícola (8). Também foram representadas instituições que atuam no campo religioso, em assessoria técnico-científica, econômica e energias renováveis.

Embora a amostra tenha sido composta por um bom número de representantes ligados ao setor empresarial, a análise não identificou dissonâncias entre seus posicionamentos e os dos demais entrevistados do terceiro setor. Nota-se que, no que tange à temática das mudanças climáticas, as opiniões e os posicionamentos dos entrevistados são muitas vezes pessoais e não se diferenciam significativamente, de acordo com o pertencimento a esta ou àquela entidade ou área de atuação. Com exceção de um número residual de organizações mais radicais, as opiniões encontradas guardam mais semelhanças do que diferenças entre elas.

O tema das mudanças climáticas mobiliza suas lideranças e faz com que, no momento, várias organizações estejam aprofundando seu engajamento. As organizações procuram trabalhar de forma independente a fim de manter a liberdade de ação. Em geral, faltam recursos para programas mais ambiciosos.

Entre os 60 representantes da sociedade civil e de ONGs, ao menos 10 têm programas já iniciados, a maioria na área de energia ou eficiência energética. Três estão envolvidos em projetos que têm componentes de “segurança climática” (conceito ainda pouco assimilado, dizem), outros dois tentam implementar programas que combinem produção de biomassa e agricultura familiar. Os demais fazem “campanhas”, e a mais citada é a “campanha do clima” do Greenpeace Brasil, que está mapeando o potencial de energias renováveis no Brasil, com ênfase nos tipos eólico e solar.

As múltiplas abordagens possíveis das questões climáticas oferecem, na visão das organizações do terceiro setor, uma ampla gama de oportunidades. As áreas melhor identificadas pela pesquisa são energia, agronegócio, desenvolvimento rural, desenvolvimento social etc. Em outras palavras, não há um campo da sustentabilidade socioambiental em que não haja uma organização social, ou um conjunto delas, atuando no nível político ou “na base” (grassroots).

O que mais chama a atenção nesse setor é a solidez do quadro de referências a partir do qual atua: o discurso dominante é ancorado conceitualmente nas premissas do desenvolvimento sustentável. A todo momento, lembram que não é possível “separar as questões sociais das ambientais”, tampouco tratar de “mudanças climáticas” sem mudar o modelo de desenvolvimento.

Para esse setor, “somos uma cobra comendo o próprio rabo”, pois é o modelo de desenvolvimento que operamos, altamente consumidor de energia fóssil e emissor de gases do efeito estufa, que agrava o fenômeno das mudanças climáticas.

De um modo geral, o terceiro setor mostra-se bem informado no que diz respeito às questões pertinentes ao debate sobre as mudanças climáticas. Em mais de dois terços da amostra, percebe-se um declarado engajamento por motivos profissionais ou “de militância”.

Page 130: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 0

Para a maior parte dos entrevistados, o tema das mudanças climáticas só entrou na agenda na época da Eco-92. Naquele momento, a palavra mágica era “sustentabilidade”. Era a bandeira branca em um mundo que destruía as suas próprias condições de vida. Embora já se falasse nos “gases do efeito estufa” e no “buraco na camada de ozônio”, a união das organizações era em torno do ideal de deter a destruição dos ecossistemas naturais.

A visão de que alguma coisa a mais nos assombrava, diz uma liderança que abraçou a construção de uma rede social do clima no início dos anos 90, só ganhou força em 1997, quando o Protocolo de Kyoto foi ratificado pela maioria dos países. É portanto um tema novo, sobre o qual “há muito a aprender”.

Para os entrevistados, mudanças climáticas está entre os principais desafios que a humanidade terá que enfrentar nos próximos 20 anos. As lideranças de ONGs entrevistadas declararam-se “otimistas-realistas”: acreditam no poder transformador das idéias e também no “empurrão” que a questão climática vai dar na civilização atual. Mas também acreditam que há um longo caminho a percorrer. Em outras palavras, crêem que a mudança se dará com sofrimento. Dificilmente as forças econômicas (expressão para nomear o poder das grandes corporações) serão convencidas sem “desastres” de grandes proporções.

Seja no plano individual, seja no coletivo, o discurso dominante entre os entrevistados que representam a sociedade civil e as ONGs privilegia a necessidade de “repensar o modelo de desenvolvimento”. Um dos maiores desafios para a humanidade é a própria mudança do atual modelo de produção e consumo, associada à diminuição das desigualdades sociais.

A quase totalidade das lideranças entrevistadas concorda que as mudanças climáticas causarão forte impacto, podendo tornar severas as condições para as populações pobres do planeta. Um terço da amostra soube discorrer sobre as possíveis conseqüências para o Brasil. Mencionaram a “savanização” da Amazônia, o avanço da desertificação, além do perigo do avanço do mar nas cidades costeiras. Reconhecem, em linhas gerais, que o regime climático mudará drasticamente.

Com relação ao maior desafio do Brasil, para o mesmo período, foram citadas a conservação da Amazônia e a redução das desigualdades. Não é possível separar as duas questões. Quem defende uma Amazônia sem gente, ou só como parques ou unidades de conservação, mostra sua ignorância em relação às propostas do desenvolvimento sustentável. É na Amazônia que está a chance do Brasil mostrar que é possível desenvolver sem destruir.

Devido à importância dos “serviços ambientais” que a Amazônia presta não somente para o Brasil, mas para o mundo como um todo, nossa responsabilidade maior é preservá-la, reduzindo o desmatamento e realizando um “ordenamento territorial” que impeça o avanço da fronteira agrícola sobre áreas de mata nativa.

A principal barreira identificada pelo setor para o país e o mundo se engajarem com mais firmeza no combate às mudanças climáticas são de ordem econômica: os entrevistados parecem concordar que, enquanto as políticas de redução não se traduzirem em oportunidade de negócios, poucas iniciativas terão sucesso. O que se vê, dizem os entrevistados, são “ações exemplares”, demonstrativas. Ainda não há uma política consistente, nem no nível global, nem no nível nacional.

Além das barreiras econômicas, as barreiras “ideológicas” também foram apontadas como obstáculos a uma ação mais abrangente para o combate das mudanças climáticas, tanto no Brasil como no âmbito internacional. Os entrevistados avaliam que há um grande desconhecimento por parte da população, não só do Brasil.

O governo é o maior responsável, acreditam, por implantar políticas em relação às mudanças climáticas, e não está fazendo o seu papel. Naturalmente os empresários e a sociedade civil devem

Page 131: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 1

se engajar, pois todos devem fazer a sua parte. Contudo, o governo federal precisa liderar o país em direção a um programa consistente de redução de emissões.

Um programa de reduções não prejudicará o Brasil, diz o setor, pois temos comparativamente uma matriz limpa e podemos expandir a produção de energias limpas. Conter o desmatamento e as queimadas já é suficiente para conquistar crédito. É absolutamente possível, no quadro atual ou em um cenário em que adotemos um programa de redução de emissões, dar continuidade ao desenvolvimento. A possibilidade da ampliação do comércio de crédito carbono seria uma boa conseqüência advinda da regulação, inclusive para os programas de reflorestamento.

Quanto às responsabilidades do Brasil perante o mundo, a maior parte dos entrevistados afirma que a principal é enfrentar questões da Amazônia. Citaram ainda a diminuição de emissões de gases por outras fontes, como o da frota veicular nas cidades. Além de deter o desmatamento, o Brasil deve investir em energias limpas e em programas de eficiência energética.

Os entrevistados pareceram bastante descrentes em relação ao processo de discussão das mudanças climáticas no âmbito internacional. Para eles, o que se vê é muito discurso e pouca ação. Segundo disseram, as questões climáticas estão claramente sendo tratadas de forma desigual pelos países: apenas alguns países estão tomando providências sérias e assumindo responsabilidades com afinco, como é o caso da Alemanha e da Inglaterra, que foram exemplos citados. Os países mais criticados foram os Estados Unidos e a China. Aquele por se recusar a assumir o papel que lhe cabe como uma das nações mais fortes do mundo, e o segundo pelo “perigo” que representa para a sustentabilidade. Além disso, disse um dos entrevistados, “negociação internacional é que nem tabuleiro de xadrez, está todo mundo esperando o que os Estados Unidos e a China vão fazer”. Os países em desenvolvimento como China, Índia e Brasil não estão obrigados, pelo Protocolo de Kyoto, a programas de mitigação e não colaboram nem de forma espontânea para reduzir as emissões.

A proposta brasileira de desmatamento evitado é amplamente conhecida neste setor, e apreciada, mas precisa ser, na opinião do setor, mais bem elaborada para que surta o efeito esperado de conter o desmatamento da Amazônia, que é tida, como já se falou, como a maior responsabilidade do Brasil num programa mundial de redução das emissões. No entanto, essa proposta de desmatamento evitado apresentada pelo governo brasileiro na Convenção do Clima, em Bali, é polêmica para o setor, pois “se implementada, só resolve a Amazônia, e o resto?”

Quanto aos resultados da Conferência de Bali, as avaliações dos entrevistados divergiram bastante. Há quem os considere “bons”, “tímidos”, “fracos” e “relativos”. “Tímidos” foi a resposta mais recorrente.

A maioria absoluta dos entrevistados afirma que o tema é “muito importante” para os segmentos nos quais atuam. Pensam que as questões do clima devem, sim, ser levadas em conta por ONGs, empresas e todos os segmentos sociais. As ações individuais também são importantes, pois, em sua visão, “nas sociedades atuais os indivíduos têm muito poder”, e citam casos como o da “irmã Dorothy” (assassinada por ferir interesses de posseiros no Norte do país), de Chico Mendes e outros.

As ações individuais foram muito valorizadas. Para o setor, “tudo começa no indivíduo”, que tem um importante papel transformador. Segundo eles, o Brasil está precisando de exemplos.

Page 132: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 2

ANÁLISE DETALHADA

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

O despertar para a temática nos anos 90

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez? Antes da

década de 80 Na década de

80 Na década de

90 De 2000 para

cá Não lembra

Não

respondeu TOTAL

4 6 31 8 2 9 60

Metade dos entrevistados disse ter ouvido falar em mudanças climáticas pela primeira vez na década de 90, com a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a Eco-92, no Rio de Janeiro.

“Praticamente nós [do FBDS] fomos criadores do conceito de mudanças climáticas. Eu fui um dos formatadores, um dos participantes da Conferência de 92, quando esse assunto foi inicialmente tratado de forma global, quando foi aprovado o chamado joint implementation, que foi o primeiro esforço voluntário para determinar os limites das emissões para o ano de 2000, que deveriam ser abaixo daquelas de 1990.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL) “Eu, particularmente só ouvi na época da Rio-92, quando foi proposto. (...) Mas acho realmente que o assunto só entrou na pauta do público em geral dois anos atrás, no máximo, talvez um pouco antes. (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.R., 40, JORNALISTA)

Mesmo quem já tinha ouvido falar no tema reconhece que ele só ganhou projeção de uns anos para cá:

“Esse é um tema que já se vem trabalhando há muito tempo. Há pelo menos uns 15 anos que eu escuto falar de mudanças climáticas, mas nunca ganhou a devida atenção; aí eu acho que, de uns dois anos para cá, quando começou essa história do painel intergovernamental, foi que eu fui tocado por informações e percebi a gravidade do problema, de dois anos para cá que eu fui percebendo.” (ONG, USO DO SOLO, M.M., 58, MÉDICO) “Nos últimos 4, 5 anos essa discussão ficou mais forte, nacional e internacionalmente. Mas, desde a Rio 92, eu já escutava alguma coisa sobre mudanças climáticas.” (ONG, USO DO SOLO, J.B.S.M., 31, FUNC. PÚBLICO)

Parte menor dos entrevistados (6) disse ter ouvido falar neste tema na década de 80 ou antes. Alguns ainda ressaltam que havia uma leve diferença de terminologia, que até certa época se usava mais a expressão “aquecimento global”, e que posteriormente “mudanças climáticas” tornou-se mais comum.

“[Ouvi falar em mudanças climáticas] em 1978 num congresso de mudanças climáticas em Toronto, quando um dos debates sobre mudanças climáticas e o que ocorreria no final do ano 2000, qual era a expectativa em 78 para alteração climática no ano 2000, na época foi uma belíssima reunião que se dedicava a essa parte de mudanças climáticas, isso no Canadá.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

Page 133: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 3

“No começo, não se falava em mudanças climáticas, se falava em aquecimento global, mas vamos dizer que a mudança climática veio depois. O conceito eu ouvi falar em 1981 pela palestra de um cientista inglês. Nessa época, ainda era aquecimento global.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA)

Fica claro que a terminologia relacionada ao aquecimento global ou mudanças climáticas foi sendo aprimorada e incorporada a novos discursos recentemente, como, por exemplo, o debate sobre sua origem antrópica ou não.

“Com essa conotação atual foram recentes, mas por exemplo, o caso da seca teve um período que uma vez a gente enfrentou em termos mundiais, a seca foi generalizada e muitos países tiveram esse processo e eu, já na época, tive um conhecimento e isso já faz mais de dez anos que era um estudo da ação do homem e a seca que era muito interessante, era mudança climática nesse sentido da curiosidade da UVA, não desse moderno que afeta o nível do mar, as geleiras etc., então há mais de dez anos eu já ouvi falar nisso, nessa outra conotação.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, P.I.C., 42, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Oito entrevistados só ouviram falar em mudanças climáticas pela primeira vez a partir do ano 2000:

“A primeira vez em que ouvi falar não lembro, mas só comecei a pensar nisso há uns cinco anos, não sei se foi a primeira vez em que ouvi, mas começamos a discutir isso há 5 anos e aí passei a acompanhar.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENGENHEIRO AMBIENTAL).

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Há sempre mais para aprender

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é: Bastante

abrangente Bom, mas incompleto

Está explorando e aprendendo mais

Conhece pouco Total

18 17 21 4 60

Pouco mais da metade dos entrevistados classificou seu conhecimento como bastante abrangente ou bom, mas incompleto. No entanto, notou-se que mesmo aqueles que possuem grande conhecimento sobre o assunto afirmaram estar explorando e aprendendo mais, pois nessa temática há sempre o que aprender e novidades aparecem diariamente.

“Está entre bom, mas incompleto e bastante abrangente. Eu já tenho trabalhado com essa questão desde 95 e já tive a oportunidade de participar em muitos eventos no Brasil. É mais para bastante abrangente. Agora a gente sempre tem coisas a aprender não é?” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.F., 36, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“O conhecimento que tenho não é o suficiente, estou procurando aprender, mas considero que tenho um bom conhecimento dessa questão do seqüestro de carbono, do aquecimento, tudo isso. (...) Eu estou buscando explorar e aprender, aqui na frente da AIMEX, acompanhei todos aqueles processos de discussão ainda do Protocolo de Kyoto em 1997, quando isso surgiu pela primeira vez tivemos reuniões aqui em Belém, com empresas voltadas para esta questão seqüestro de carbono, me interei bastante deste assunto e

Page 134: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 4

tivemos reunião com o próprio governo passado aqui no Estado do Pará, inclusive mandou buscar um especialista para discutir as possibilidades das empresas investirem em reflorestamento com o propósito de vender créditos de carbono na bolsa de Chicago, enfim acompanhei todo este processo.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, G.S.C., 52, ENGENHEIRO FLORESTAL)

Mais de um terço das lideranças entrevistadas (21) declarou “estar explorando” e, portanto, no estágio de “aprender mais”. Os entrevistados declaram que o fato de seus conhecimentos serem incompletos e necessitarem de mais aprofundamento se deve à complexidade do assunto e ao fato de ainda ser relativamente novo para alguns. Além disso, a cada reunião da Convenção das Partes são divulgados novos documentos. Outro argumento é que o tema permite que você se especialize em uma questão correlata:

“Meu conhecimento é bom, mas incompleto, pela seguinte razão: porque o tema é complexo; então a gente é obrigado a fazer um corte nele, quer dizer, eu procuro olhar a mudança climática de um ponto de vista da agricultura, então, nesse ponto ele é muito bom. Mas ele é incompleto, porque não é suficiente.” (ONG, ECONOMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

“Eu acho que eu estou explorando e buscando entender mais. A cada dia vem uma novidade, a cada dia tem uma coisa nova... Nem mesmo os grandes cientistas dominam todos os aspectos.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

3. GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Tema mobiliza e sensibiliza

Como se sente em relação ao tema: Altamente motivado

Interessado, com outros temas mais

importantes no momento

Apenas interessado, sem intenção de

aprofundar

Desinteressado

Total

43 15 1 1 60

Verificou-se que é alto o grau de interesse dos entrevistados pela problemática das mudanças climáticas. Bem mais da metade dos entrevistados (43) afirmou que o tema está entre suas prioridades. Contudo, para um quarto deles (15), o assunto “sensibiliza” e é de grande importância, mas no momento existem outras prioridades.

“Para mim é mais aquela idéia, eu estou interessado mas esse tema anda junto com outro, no caso é a conservação da água.” (ONG, ECONÔMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

“Eu ficaria entre altamente motivado e motivado, mas com outro tema mais importante no momento, pelo seguinte: para mim o grande problema ambiental no Brasil é perda dos ecossistemas naturais; mudanças climáticas, para mim, é uma conseqüência do processo de perda dos ecossistemas naturais; então, eu sou uma pessoa altamente motivada para entender do assunto das mudanças climáticas, mas eu acho que a mudança climática não é o grande tema. O grande tema é perda de biodiversidade.” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

Page 135: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 5

A natureza da motivação é muito diversificada: os entrevistados sentem-se motivados por preocuparem-se com a natureza, por preocuparem-se com os netos ou “gerações futuras”, ou mesmo porque possuem motivações profissionais:

“Altamente interessado porque nossa missão é a conservação, então, realmente entender a questão climática é fundamental para a própria conservação das espécies e da biodiversidade, da natureza em si; é muito importante para garantirmos um mundo seguro para as gerações futuras.” (ONG, USO DO SOLO, I.S.T., 48, ENG. FLORESTAL)

“A natureza deve ser preservada, não é? O homem é o centro da natureza e ele deve respeitar. Ela torna todos os seres interdependentes. Ela favorece a qualidade de vida ou então a destruição. É muito importante que a gente preserve toda a natureza e que cada família preserve e que plante árvores, que ensine as crianças desde cedo a cuidarem da água. Eu tenho 10 netos e eu digo assim, quando se escova os dentes, é melhor pegar um copo do que ficar soltando a torneira o tempo todo. Tem que realmente, desde as pequenas coisas, os gestos de respeito aos bens da natureza.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, Z.A., 73, MÉDICA PEDIATRA)

“Minha motivação é profissional. Eu trabalho com essa questão, relação indústria- meio ambiente, então eu tenho uma motivação profissional, além de uma motivação como cidadã. Eu quero entregar um mundo melhor para os meus netos.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, P.H.G.B., 53, ENGENHEIRA CIVIL)

Outros apontam para a curiosidade suscitada pela observação de primeira mão das alterações climáticas.

“Ela [a motivação] vem naturalmente da nossa perspectiva de vida, de qualidade de vida, então quando você observa no dia-a-dia as praias de uma ilha como a de Florianópolis, sendo ameaçada na faixa de areia, diminuindo a faixa de areia, quando você observa o calor excessivo ou você observa chuvas atípicas, vendavais, você começa a se perguntar: o que é isso? Quando você vê as abelhas ameaçadas de desaparecerem em umas regiões, isso tudo chama atenção e motiva a você buscar um conhecimento que dê conta disso.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, W.S., 54, FILÓSOFO)

Apenas um dos entrevistados, membro de uma ONG de desenvolvimento social, declarou não se sentir motivado em relação ao assunto.

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Os maiores desafios para a humanidade são as mudanças climáticas e diminuição da desigualdade

Page 136: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 6

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos?

Mudanças climáticas 13

Diminuir as desigualdades sociais/Questões sociais

11

Mudanças no modelo econômico, mudanças de paradigmas no consumo

8

Questões Ambientais 7

Utilização dos recursos naturais 4

Desenvolvimento Sustentável 4

Produção de alimentos 3

Energia 2

Outros 8

Os entrevistados, ao responderem à pergunta sobre qual será o maior desafio da humanidade para os próximos 20 anos, deram uma ou mais respostas.

Como maiores desafios para a humanidade foram citadas as mudanças climáticas, a desigualdade social, a questão da água, o acesso a alimentos e a questão energética. Em termos mais amplos, foi apontada a sustentabilidade em seus aspectos sociais, ambientais, econômicos e culturais. Outro desafio muito mencionado é o modelo de desenvolvimento econômico atual, baseado no “capitalismo selvagem”.

Mudanças climáticas

Treze entrevistados sustentam que o maior desafio ambiental para a humanidade nos próximos 20 anos será tratar dos assuntos relativos às mudanças climáticas, ainda que não se saiba efetivamente qual o tamanho do problema a ser enfrentado e de que forma deverá ser feito esse enfrentamento:

“Como humanidade, eu acho que é realmente o aquecimento global e suas conseqüências, o que vai acontecer com a água, como é que vão mudar a matriz energética, encontrar um mecanismo de restabelecer uma ordem normal menos assimétrica e que seja aceita.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.H.C., 76, SOCIÓLOGO)

“Eu acho que é o aquecimento global... Primeiro que falta avaliar todas as variáveis, tem tudo para ser feito, a gente não sabe ainda quais são as opções, não se sabe, de fato, o que existe de problema.” (ONG, ECONÔMIA, M.A.F., 48, ENG. AGRÔNOMO)

“A humanidade ainda não sacou que tem uma encrenca enorme e é provável que não tenhamos muitos mecanismos para trabalhar isso em nível de governo, mesmo em nível de

Page 137: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 7

tecnologia, de criar mecanismos mais duradouros mais perenes de lidar com o aquecimento global.” (ONG, ECONÔMIA, M.A.F., 48, ENG. AGRÔNOMO)

Desigualdades

Diminuir as desigualdades sociais foi o segundo desafio mais lembrando pelos entrevistados:

“Eu acho que não é um desafio desses 20 anos, mas um desafio permanente. Quando a gente aumenta a riqueza, melhora a tecnologia do planeta, o desafio é enfrentar a desigualdade. As desigualdades são cada vez maiores, são cada vez mais presentes. Não digo nem eliminar a desigualdade, mas tentar reduzir essa desigualdade que cada vez cresce mais.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Eu acho que é o desafio da desigualdade que está localizado em várias áreas, e o acesso a todos, acesso aos bens e recursos naturais. Essas questões estão diretamente relacionadas entre si. A gente está falando do acesso à renda e aos recursos naturais.” (ONG, AGRONEGÓCIO, M.G.A., 45, AGRÔNOMA)

Mudar o modelo econômico e padrões de consumo

Outro desafio é enfrentar o “capitalismo selvagem” que induz ao consumo desenfreado e à produção intensiva em energia. Este modelo é, segundo eles, insustentável. Se o padrão de consumo atual persistir, os riscos de esgotamento dos recursos naturais serão muito grandes, bem como as desigualdades sociais serão potencializadas:

“Esse é o grande desafio, uma mudança no paradigma de crescimento econômico e tudo o que diz respeito tanto às maneiras de produção quanto às maneiras de consumo...” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“Eu acho que deve entrar muito forte a questão da mudança de hábitos de consumo da sociedade, tanto individualmente quanto coletivamente. É muito fácil a gente falar em economizar água, economizar recursos naturais, economizar energia. Mas e aí como você fazer isso? Como quebrar esse paradigma e promover a mudança de hábitos?” (ONG, ENERGIA, M.A.Z., 42, ENG. PRODUÇÃO) “O fenômeno tem a ver com o padrão de consumo e de produção, o uso intenso de energia, o desperdício inclusive grande que se tem de energia... Acho que esta é a questão.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO) “Bom, o que mais contribui é o modelo econômico. Eu acho inclusive que mudanças climáticas não é um tema ambiental, mudanças climáticas é um tema econômico. Então, o que contribui é o modelo econômico e, enquanto ele não for profundamente modificado, seja na linha do consumo responsável, seja na linha de uma produção responsável, e não houver uma reformulação muito incisiva nessa troca de consumo, mudar de consumo, de serviço, acho que isso não tem uma solução. Então, necessita de uma solução grave, uma revisão do capitalismo enquanto não é tarde.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, P.H.G.B., 53, ENGENHEIRA CIVIL)

Água

“Sem dúvida alguma, o primeiro item que a gente tem que pensar seriamente é a parte de hidrografia e hidrologia, o consumo de água. Nós temos que decidir quem vai usar a água, se o animal, o ser humano ou a agricultura, nós vamos irrigar ou beber água, havendo uma comprovação daqui a vinte, trinta anos certamente a água vai ser um problema fundamental, e isso induz ao outro problema, por exemplo, um problema social em busca

Page 138: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 8

de água. Você pode ter grandes migrações internas, porque certamente a agricultura vai ter uma migração e essa migração é que tem preocupado a gente nesse aspecto humano.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

“É a falta de água para humanidade, a água vem sendo utilizada como se ela fosse um recurso infinito e na verdade ela não é, é finito, e a distribuição da água não é feita de acordo com a distribuição da população, das necessidades. Ela existe mais onde a demanda é menor, então ela existe em outros pontos onde a demanda é grande em alguns países, então a questão da água leva à questão do meio ambiente, então acaba que o grande problema é para o meio ambiente o meio ambiente acaba sendo o cenário de todas essas questões.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.C.G., 66, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

Acesso à alimentação

Como produzir alimentos para atender às necessidades mundiais também é um desafio para a humanidade, conforme apontaram alguns entrevistados. Com a questão climática, “não basta produzir alimentos”: teremos que produzi-los de forma sustentável, mantendo os recursos naturais e explorando a produtividade sem degradar os solos:

“Hoje, quando se fala em segurança alimentar, nosso grande desafio não é mais a produção de quantidade de alimentos, ou volume de alimentos. Nós estamos principalmente preocupados com a segurança do ponto de vista daquilo que nós construímos, em relação a quanto isto impacta o meio ambiente; quanto isto consome de recursos naturais, ou deixa de consumir; e qual é a segurança que o consumidor pode ter ao consumir o produto...

Então, o desafio é esse: é produzir sem degradar o estoque de recursos naturais necessários à produção de alimentos para que as futuras gerações possam ter as mesmas condições de satisfazer suas necessidades, como nós estamos tendo.” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

“Eu acho que em agricultura a gente tem grandes desafios. Acho que o mais importante é a gente fazer uma agricultura que demande menos terra, ou seja, que a gente consiga produzir mais usando cada vez menos terras ou podendo abrir mão da necessidade de aumentar a área cultivada.” (ONG, ECONOMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

“Eu acho que o principal desafio é a fome. Nós temos áreas suficientes para alimentar toda a nossa população, mas a gente precisa ter políticas que prevejam a ocupação do território de forma igual, de convivência com o semi-árido. (...) A fome é um desafio imenso, monumental...” (ONG, AGRONEGÓCIO, M.G.A., 45, AGRÔNOMA)

Energia

“Então, eu acho que o grande desafio vai ser tecnologicamente equacionar o problema da energia no país, no mundo; então hoje nitidamente a gente nota que todo o gargalo que existe no mundo é o gargalo de energia. Você vê, talvez a gente tenha em seguida o problema de água, por exemplo: mas se nós pensarmos que se tiver energia abundante, você tira a água do mar com facilidade, você dessaliniza, transforma a água do mar em água potável, você vê que o problema de água [inexiste]. Nós temos uma fonte de água enorme que são os oceanos, cobrem dois terços da terra, da superfície do globo. Então eu acho que a obtenção de energia barata, limpa etc., vai ser o grande desafio.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, M.M., 63, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

Page 139: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 3 9

Uso do solo

“[Esse desafio é tanto econômico como ambiental] porque, na verdade, a questão da agricultura talvez seja, das atividades humanas, a que tem maior quantidade de interfaces em questões ambientais, tanto direta como indiretamente. A agricultura se faz em áreas que foram de cobertura vegetal natural. Você não faz agricultura dentro de uma fábrica, em terrenos, solo, água, territórios que foram em algum momento cobertos por florestas ou outro tipo de vegetação.” (...)

[A área de agricultura que mais emite] é a parte agrícola propriamente dita, o desmatamento é um dos impactos, mas o próprio uso, o próprio manejo de solo é emissor de gás, o uso dos produtos químicos na agricultura tem efeitos pesados na emissão de gases do efeito estufa e aí as outras coisas, especificas do uso de combustíveis, emissões, CO2 etc.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

“Bem, a minha área é a área florestal e rural. Então, considerando essa área, principalmente o setor madeireiro, temos o grande desafio de utilizar os nossos recursos florestais e os nossos recursos ambientais de forma sustentável. (...) Qual é o nosso desafio? É estancar esse processo [do avanço da fronteira agrícola] aqui na Amazônia e mostrar que na Amazônia nós temos que trabalhar sobre o modelo do desenvolvimento sustentável mediante a exploração madeireira.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, G.S.C., 52, ENGENHEIRO FLORESTAL)

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS E MAIOR DESAFIO AMBIENTAL PARA OS PRÓXIMOS ANOS

Desigualdade social novamente citada

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Questões

sociais Questões ambientais

Mudanças climáticas

Des. sustentável

Agricul- tura Outros Total

24 12 6 5 3 10 60

As lideranças ouvidas em respostas espontâneas apontaram como principal desafio brasileiro “diminuir as desigualdades sociais”. Em segundo lugar foi citada a preservação dos recursos naturais, com destaque para os recursos hídricos e para a necessidade de “conservar a Amazônia”. As mudanças climáticas também foram citadas por 6 entrevistados, bem como o “desenvolvimento sustentável”.

Mais de um terço declara que diminuir desigualdades sociais é a grande tarefa dos brasileiros para os próximos anos:

“No Brasil você vê o seguinte: o nosso bolo econômico é grande, mas quando você vai dividir pela nossa população ele se torna pequeno. Então, eu acho que o Brasil tem um grande desafio político, uma decisão de eliminar a pobreza, ter um controle de saúde pública. O Brasil tem muitos problemas nessa área, nós não podemos continuar com essa desigualdade social. Não me conformo do país ter essa visão ainda desenvolvimentista sem cuidar dessas coisas básicas.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, M.M., 63, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“...por exemplo, a região Nordeste é a região que tem um terço da população brasileira, com desigualdades históricas e a gente destaca aqui a região Norte, onde está a

Page 140: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 0

Amazônia, que é destaque no mundo todo.” (ONG, AGRONEGÓCIO, M.G.A., 45, AGRÔNOMA)

“Do Brasil temos as questões mais domésticas brasileiras: a nossa sociedade é muito desigual, perto de outros países. Então, eu acho que o maior desafio do Brasil é tornar o Brasil menos desigual, fazer com que a diferença entre os muito ricos e muito pobres diminua tremendamente.”(ONG, ECONÔMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

Considerada tão importante quanto a questão da desigualdade, aparece a necessidade de promover o desenvolvimento “de forma sustentável”, mostrando que desenvolver e diminuir as desigualdades sociais são faces de uma mesma moeda:

“Eu acho que o desafio é consolidar o processo de distribuição de renda, de melhorias de acesso da maior parte da população aos benefícios que a civilização ocidental trouxe; então, distribuição de renda e poder e transformar essa distribuição em uma oportunidade de sustentabilidade. Não é ligar a questão do progresso material com a questão da sustentabilidade ambiental só. Incluiria também outra cosia que é bem particular, que é uma transformação de pensamento e até do espírito.” (ONG, ENERGIA, P.D.R.M., 49, GEÓGRAFO)

“O Brasil tem que atingir um desenvolvimento socioeconômico na forma mais sustentável e pressupõe-se também uma distribuição de renda numa sociedade mais eqüitativa. E o Brasil é um país extremamente desigual, nós temos favelados ou a pessoa que no meio rural vive na miséria absoluta, e tem a opulência de milionários, bilionários, isso também é uma pirâmide social que é muito injusta, então, para mim, o desafio é construir um novo modelo que seja sustentável, com distribuição de renda, e que ele seja sustentável, portanto pressupõe-se uma mudança de modelo tecnológico.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, P.I.C., 42, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

A necessidade de melhorar a educação foi citada por dois entrevistados como o maior desafio:

“O maior desafio do Brasil é a educação (...). Um país cujo cancro é a educação. Você não tem educação adequada, as pessoas não se interessam por educação. Não estou falando de segmentos pequenos específicos, estou falando dos cento oitenta milhões de habitantes do país.” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“Olha, eu vou pegar uma questão que para o Brasil é muito decisiva. Eu acho que a gente precisa ter uma reforma política séria e a gente precisa é de um processo educativo de melhor qualidade, ou seja, focar mais o ensino básico; a qualidade do ensino ainda é precária...” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

A água nossa de cada dia

Como vimos, à preocupação com um manejo adequado dos recursos naturais como um todo soma-se à preocupação específica com a água:

“(...) nós temos nossas situações de crise. Quer dizer, você tem uma situação em São Paulo que é uma cidade que não consegue se olhar com uma visão, digamos, mais ambiental de maior cuidado de mananciais da sua cidade. Quer dizer, tem uma crise de ocupação da região de mananciais e as pessoas não conseguem associar uma coisa a outra. Parece que a água vem da torneira mesmo, brota dali e pronto.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.R., 40, JORNALISTA)

Page 141: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 1

“Eu ando muito assustado, com a questão hídrica no Brasil. O Brasil tem um campo privilegiadíssimo de campo hídrico, mas a degradação dos rios, a falta de cuidados com os rios me deixa muito assustado. Acho que notoriamente o fato volta mais para o semi-árido. Há indicadores de que o semi-árido está se transformando em áreas desertificadas...” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

S.O.S. Amazônia

Doze (12) entrevistados citaram como principal desafio do Brasil nas próximas duas décadas a proteção da Amazônia. Se contarmos, contudo, aqueles que também a ela se referiram quando falaram de mudanças climáticas, temos 18 citações, mostrando a preocupação das lideranças de ONGs e da sociedade civil com esse bioma. A visão geral, comunicada em inúmeras entrevistas, é a de que está acontecendo um “verdadeiro desastre” na região, e a Amazônia precisa de um “choque de gestão sustentável”:

“É a Amazônia, o desmatamento da Amazônia, a questão da Amazônia. O Brasil precisa equacionar, precisa saber o que vai fazer com aquilo, precisa de um verdadeiro choque de gestão, botar para a frente os quilos de planos sustentáveis que já foram desenhados... Ou sempre vai predominar um discurso sensacionalista, um discurso mais desenvolvimentista e às vezes a gente acaba não tendo bom senso...” (ONG, ECONOMIA, M.A.F., 48, ENG. AGRÔNOMO)

“São sem dúvida as várias questões da Amazônia como as terras, como as madeiras, como os rios, como as riquezas minerais, o contrabando. (...) Se não houver uma revolução para a proteção da Amazônia, nós iremos destruir esse patrimônio e, com ele, dezenas de povos indígenas poderão morrer novamente num outro genocídio, como na colonização. (...)” (ONG, USO DO SOLO, J.B.S.M., 31, FUNC. PÚBLICO)

“Um é você evitar o desmatamento da Amazônia, iniciar um projeto, como já existem mais de 600 mil km² desmatados na Amazônia, de 1970 até agora, que é uma área do tamanho da França, é você realmente procurar reflorestar com um reflorestamento ecológico e também econômico.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

“No Brasil, cada vez mais isso se acentua pelos dois vetores. Um, a queimada e a destruição dos recursos naturais da Amazônia, que transformaram o Brasil de décimo sétimo emissor em quarto emissor do planeta.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

É preciso atuar nas causas e conseqüências das mudanças climáticas

Seis (6) entrevistados citaram como maior desafio do Brasil atuar sobre as causas e as conseqüências das mudanças climáticas. Em relação às causas, citaram a necessidade de “reduzir as emissões dos gases do efeito estufa”. Além da Amazônia, amplamente citada como emissora “por causa das queimadas”, as outras menções foram aos veículos automotores e à importância do uso de energia limpa para reduzir as emissões:

“Acho que no Brasil o grande desafio vai ser diminuir as emissões de CO2 dos veículos... Temos uma frota enorme de caminhões, carros nas cidades, tratores, enfim, tudo aqui é movido a combustível fóssil, a participação do etanol é ainda pequena, e a gente esquece que o etanol também emite... Acho que o principal desafio nosso hoje em dia são as queimadas que precisamos diminuir, depois tentar retirar essas emissões de carbono através da eficiência energética.” (ONG, ENERGIA, L.F.L.P., 38, ENG. ELÉTRICO)

Page 142: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 2

“E outro desafio que eu acho que é importante é o desafio que nós estamos enfrentando aqui, estamos trabalhando nele, é você encontrar formas de produção de energia que sejam limpas no que diz respeito às emissões de CO2, ou que você utilize fontes de energia que permitam uma série de compensações.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

“E agora, com a incapacidade governamental de um planejamento de prazo longo, a substituição da demanda de energia limpa por uma energia termoelétrica e, pior ainda, uma energia termoelétrica baseada em carvão. Carvão importado, carvão nacional, não tem importância, todos eles nos farão dependentes de uma situação global que se desenha altamente punitiva para países emissores.

Então, eu não estou vendo claro que a consciência governamental está nos levando para uma situação melhor, porque se a demanda de energia para crescimento é cada vez maior, e isso não foi planejado, as soluções já existentes em que o Brasil seria pujante na apresentação dessas opções, tais como biomassa e várias outras, solar, eólica, não estão sendo adequadamente tratadas. Então, eu acho que o Brasil está numa posição de saber fazer, mas não fazer.” (I.K., 60, SOCIEDADE CIVIL, SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO).

Alguns entrevistados discorreram sobre as conseqüências e sobre a necessidade de promover programas de mitigação. Escolhemos a declaração a seguir por ser a mais elaborada:

“Acho que o grande desafio mundial, e também brasileiro, é a questão do clima, das mudanças climáticas, sem dúvida nenhuma do aquecimento global e as conseqüências...

Esse é um tema que implica mudanças, efeitos em cadeia, em todo o resto: compromete seriamente a questão hídrica, compromete seriamente a manutenção da biodiversidade e ele vai comprometer a questão dos assentos humanos...

Pouca gente fala nisso, mas o aquecimento global, as mudanças climáticas vão provocar uma grande migração humana e das demais espécies vivas, mobilidade nos ecossistemas, nos regimes de chuvas, uma migração sistêmica, no mundo todo, que pode ser catastrófica, pode acentuar muito o problema da pobreza, da violência, da doença.

Acho que é um desafio imenso que as pessoas não têm encarado com a devida seriedade. Não escuto nada sobre mitigação no Brasil, nadinha, só de redução de emissões, e esse é só um lado da questão.” (ONG, ECONOMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

Mudanças climáticas realmente preocupam

Qual será o maior desafio ambiental do Brasil nos próximos 20 anos? Mudanças climáticas

Questões ambientais Des. sust. Energia Questões sociais Outros TOTAL

16 16 12 5 3 8 60

Com relação ao maior desafio ambiental para a humanidade nos próximos 20 anos, praticamente um terço dos entrevistados sustentam que será tratar dos assuntos relativos às mudanças climáticas. Em seguida foram citadas outras questões ambientais (16 citações), com destaque para a questão hídrica.

Page 143: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 3

“Sem dúvida nenhuma as mudanças climáticas. (ONG, ENERGIA, L.F.L.P., 38, ENG. ELÉTRICO)

“A área ambiental é um grande desafio e dentro dela tem vários problemas a enfrentar, mas eu acho que as mudanças climáticas realmente são questões que já estão e vão estar cada vez mais nos noticiários, e os problemas afetados por isso também vão despontar. Junto disso é que a gente vai ter problemas que vão impactar diretamente os comportamentos humanos, alimentação, abrigo, proteção e doenças.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.F., 36, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“O visível já imediatamente configurado pela ciência e que não há mais dúvida alguma está nas mudanças climáticas oriundas da matriz energética.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

Recursos hídricos e as lições da história

“O grande desafio é a água e a administração da água, quer dizer, eu citei recentemente a Jordânia, um país que não tem praticamente água. O rio Jordão, cuja imagem que temos é a de um rio caudaloso, viabilizou aquelas populações todas que se instalaram ali e onde hoje é Gaza, Israel, Líbano e Jordânia, e à medida que foram queimando as florestas, até por guerras, foram reduzindo a disponibilidade de água a níveis mínimos. Eu acho que isso está acontecendo também em outros países, por exemplo na Austrália.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, M.V.P.M., 58, ECONOMISTA)

O uso sustentável dos recursos naturais foi lembrado como um importante desafio ambiental a ser enfrentado pela humanidade nos próximos 20 anos:

“É se organizar por volta dos temas da utilização dos recursos naturais...” (ONG, USO DO SOLO, I.S.T., 48, ENG. FLORESTAL)

“É exatamente como garantir a conservação da biodiversidade e todos os serviços ambientais que são gerados a partir dessa biodiversidade; como conciliar conservação da biodiversidade com o desenvolvimento social e econômico da humanidade...” (IDEM)

Um entrevistado sustenta ainda que o movimento de crescimento das populações tem se dado no sentido contrário ao desenvolvimento sustentável:

“...até hoje o movimento tem sido principalmente da população humana crescer e usar de forma descontrolada os recursos naturais. Hoje nós estamos vendo que isso não é o caminho correto. Se nós continuarmos na mesma marcha pode ser que a nossa espécie se extinga por falta de recursos naturais.” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Discordância quanto à intensidade do impacto

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas. Concordam fortemente

Concorda Discorda Não tem informação suficiente

Não respondeu

TOTAL

29 25 1 1 4 60

Page 144: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 4

A quase totalidade dos entrevistados (54 em 60) concorda que as mudanças climáticas poderão afetar todas as sociedades humanas.

A divergência está nas visões sobre a intensidade do impacto: enquanto 29 concordam fortemente que os impactos serão graves, 25 preferiram apenas concordar, com ressalvas.

Os que concordam fortemente o fazem devido às evidências fornecidas pelos cientistas e aos fenômenos extremos estão se multiplicando no mundo:

“Eu concordo fortemente, pois não há mais dúvidas por parte da ciência... Há fortes evidências de que o Katrina e as enchentes na Índia já são manifestações de severidades climáticas. (...) Uma vez que boa parte da população mora no litoral, boa parte da população do mundo está nos litorais e elas serão impactadas... Algumas culturas vão ter que deslocar de seus territórios, e isso vai afetar a cultura de uma região inteira.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Eu concordo fortemente que haverá impactos nas populações. Muitas populações vivem do meio ambiente, as pescadoras e os pescadores, por exemplo, haverá um impacto grande. Se você tem hoje um lago, um açude, e se ele secar, você não vai ter como sobreviver. As pessoas pensam que as mudanças climáticas são uma coisa que vai acontecer com as geleiras por causa da imprensa. Há uma necessidade de informar que a coisa vai acontecer aqui mesmo, no nosso litoral, que a Amazônia pode virar um cerrado pobre, enfim falta informação de como vai impactar o Brasil.” (ONG, AGRONEGÓCIO, M.G.A., 45, AGRÔNOMA)

“Eu concordo, eu acho que a ciência, inclusive, custou muito para poder ser realmente, vir a ser pública, porque é claro que isso implica questionar muitos interesses, e certamente concordo e acho que hoje, no momento que nós vivemos, é muito importante que as pessoas compreendam a complexidade do desafio que nós temos. A opinião de alguns é real. Todo mundo está vendo e a ciência explica.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, T.C., 51, JORNALISTA)

Até argumentos espirituais foram invocados por um representante de organização indígena:

“Concordo fortemente porque já havíamos alertado há muitos e muitos anos para esse problema grave que vai afetar toda a humanidade. A Amazônia, assim como outras florestas tropicais, como outras questões da natureza, são questões sagradas. Nós analisamos a partir de dados científicos, mas também analisamos a partir da nossa espiritualidade. Nossos lideres espirituais nos alertaram há muito tempo que isso podia ocorrer. (...)”

Nossos pajés, inclusive um deles o Davi Capinana, já diziam alguns anos antes de saírem pesquisas que haveria um grande buraco no céu que cairia sobre a Terra, que isso iria trazer a destruição da humanidade e que nós precisávamos trabalhar bastante para que isso não viesse a acontecer.” (ONG, USO DO SOLO, J.B.S.)

Outro grupo de entrevistados concorda, mas apresenta dúvidas quanto à intensidade real dos impactos. Eles alegam que “não há precisão nos dados, são hipóteses”, há imprecisão nas estimativas, “não temos metodologias, temos projeções”, ou ainda que “há um clima de terror nas notícias”:

“Eu concordo, mas não sei se colocaria fortemente… É que a gente não sabe se a temperatura em 30 anos vai subir 3 graus, eu acho que sim, mas e se ela não subir? Só subir só meio? Há muita imprecisão nas estimativas...” (ONG, ECONOMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

Page 145: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 5

“Eu concordo, mas eu acho que ela pode ser tão gradativa que a gente pode não saber direito causa e conseqüência. Tem previsões de várias alterações devido à mudança climática, temos fortes indícios, mas não temos cem por cento de certeza do que vai gerar; vão acontecer várias coisas, mas isso vai ser gradativo e talvez não dê para saber direito o que é o quê.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

Nesse grupo também obtivemos os depoimentos mais otimistas, que não vêem no Brasil do futuro um cenário sombrio:

“Eu analiso mais o lado agrícola. O outro lado eu não saberia dizer, se vai haver inundações, elevação do nível do mar etc., eu não saberia dizer. A produção agrícola depende de luz, calor e chuva. Eu pessoalmente não acredito que haja, no caso do Brasil, grandes mudanças em relação à chuva. (...) Calor, um pouco mais? As plantas precisam de calor para crescer. Luz, não vejo que vai mudar muito ao nível de horas de sol que nós temos. Inicialmente não vejo motivos de nós termos mudanças que nos prejudiquem, de modo que me faz crer que nós vamos ter um papel único na humanidade para prover alimentos, fibras e biocombustível.”(ONG, AGRONEGÓCIO, F.P.C.F., 93, ENG. AGRÔNOMO)

Para o mesmo entrevistado, os efeitos das mudanças climáticas poderão ser benéficos para alguns países:

“Por exemplo, na Islândia o aquecimento está colocando em produção áreas de solo cobertas de gelo, que se descobriram de gelo e podem ser plantadas... (ONG, AGRONEGÓCIO, F.P.C.F., 93, ENG. AGRÔNOMO)

Apenas um entrevistado discorda que as mudanças climáticas poderão causar danos às sociedade, e justifica seu posicionamento alinhando-se com uma corrente neomalthusiana que acredita na adaptação tecnológica como solução de possíveis ameaças ambientais.

“Olha, eu não tenho informação suficiente, eu escuto de tudo, eu escuto uma corrente que eu chamo de neomalthusiana, porque Malthus foi aquele que no século XVIII fez um livro declarando que, se a população do mundo continuasse a crescer, todo mundo ia morrer de fome em poucos anos. Esse é o Malthus, neomalthusianos formam essa [visão]. Eu acho que há consistência técnica em algumas dessas afirmações, mas eu não chego aos extremos porque acredito muito na tecnologia. (...) Então eu creio que é uma associação de mais cuidados ambientais, com mais avanço tecnológico, que vai permitir ao mundo continuar crescendo e alimentando suas populações.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, M.V.P.M., 68, ECONOMISTA)

7. IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

Temática é considerada muito importante

Importância do tema em seu setor de atuação: Muito importante

Importante

Pouco importante TOTAL

51 6 3 60

Page 146: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 6

Solicitados a apontar o grau de importância do tema das mudanças climáticas para o setor em que atuam, mais de dois terços dos entrevistados (51) o classificaram como “muito importante”; seis o classificaram como “importante” e apenas três responderam que o tema é “pouco importante”:

A quase totalidade dos entrevistados desse setor (51 em 60) afirmou considerar a temática das mudanças climáticas importante ou muito importante para o seu setor de atuação. Entre os entrevistados que consideram o tema “muito importante” para seu setor de atuação, alguns estão envolvidos com atividades relacionadas diretamente à questão do clima:

“É muito importante, porque trabalhamos com o desenvolvimento de energias limpas e com eficiência. A energia brasileira é praticamente hidrelétrica. A parte hidráulica e nossos rios está acabando, o potencial dos rios, a gente vai acabar passando para a parte térmica. Ou seja, mais emissões no planeta, no país. A eficiência energética está diretamente ligada às questões das emissões.” (ONG, ENERGIA, L.F.L.P., 38, ENG. ELÉTRICO)

“Olha, ela é muito importante. (...) A missão da nossa organização é contribuir para a sobrevivência autônoma das comunidades, contribuir com as estabilidades, com a questão da convivência no semi-árido e essa coisa toda. E, por tudo o que a gente tem visto, o semi-árido será uma das regiões mais afetadas com as mudanças climáticas.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

A área de atuação ligada à geração de energia vê uma oportunidade para novos negócios de energias alternativas, como viabilizar energias outrora antieconômicas.

“Sim, fazendo prevalecer a regulação, tecnologias que outrora eram consideradas antieconômicas, ou seja, eram condenadas apenas por custos, passam a receber maior apoio ou maior abertura por conta de subsídios. Antigamente, quando se comparavam dois ciclos de produção de energia de conversão, você jamais faria sobre hipótese de flexiadores, e hoje flexiadores é uma realidade. Você computa favorável não à sua idéia, ao seu trabalho, à sua concepção e à sua tecnologia.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, S.C., 59, ENGENHEIRO MECÂNICO)

Também na área de agricultura a questão climática oferece novos horizontes, com a aceleração do processo de certificação e a redução do uso de insumos derivados do petróleo. Ela pode também afetar negativamente, alterando o clima e o regime de chuvas.

“O tema mudança climática agindo diretamente no setor, não só em relação a isso como também traz, acelera a questão da necessidade dos processos de certificação, ou seja, a necessidade que temos de cadeia limpa de produção. O consumidor lá fora compra um quilo de carne e vai dizer: essa carne veio lá do Brasil e veio lá do Estado tal que tem uma propriedade que esta lá certificada.

Nós estamos entrando na era da certificação e da rastreabilidade que a informática e a globalização nos permitem. Traz ao setor uma necessidade premente de que o setor se adapte as questões conjunturais globais de mercado, e essa adaptação tem como requisito as questões de ordem ambiental. Nós temos que fazer esses ajustes.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, R.J., 42, ECONOMISTA)

“[As mudanças climáticas para a agricultura podem] até ser positivas, porque a nossa estratégia tecnológica, a nossa estratégia de sistema produtivo já é muito próxima de reduzir o consumo de insumos de derivados de petróleo. Usa fontes alternativas de energia. Não afeta porque nós já trabalhamos nesse sentido. Ela pode até reforçar, pode

Page 147: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 7

até trazer recursos adicionais, como por exemplo o seqüestro de carbono, incentivos e políticas que estimulem, mas isso não afetaria negativamente no sentido de que 'olha, nós fazemos tal coisa e temos que deixar de fazer'. E nos afetaria negativamente com impactos de mudanças, no sentido de alterar clima, regime de chuvas, isso vai afetar fortemente a agricultura.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, P.I.C., 42, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

Regulação pode trazer impactos negativos e positivos

Com relação à regulação das emissões de gases do efeito estufa, quase um terço dos entrevistados declaram que ela afetaria suas atividades profissionais, mas positivamente, pois ampliaria as possibilidades de negociar créditos de carbono. Isso seria bom para as ONGs, para o governo e para a sociedade de um modo geral. Quanto às empresas, na opinião das lideranças entrevistadas, muitas já estão se antecipando e fazendo seus inventários.

Entre os argumentos positivos, está o de que a regulação pode representar oportunidades para um crescimento sustentável:

“Com as metas de redução, teríamos uma corrida das empresas para entrarem em conformidade. Isso aceleraria enormemente os processos de certificação, e outros mecanismos, pois com certeza os bancos aumentariam créditos para isso, seria uma coisa muito boa para o Brasil.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.D., 52, GEÓGRAFO)

Ampliar o mercado de crédito de carbono seria outro efeito positivo:

“O Brasil não tem metas específicas de redução... Mas ele, sob o Protocolo de Kyoto, tem oportunidade de se ver livre do limite dos ajustes necessários dos países desenvolvidos. Então a questão, por exemplo, dos créditos de carbono – que é uma conseqüência desse processo – nos afetam por enquanto positivamente. (...) Nós já consideramos a possibilidade de vender créditos de carbono como uma fonte de renda...” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

“No caso do reflorestamento, o mercado de créditos de carbono é essencial; no caso da Mata Atlântica, que hoje só tem 7% da floresta, e grande parte das espécies ameaçada de extinção no Brasil, estão concentradas na Mata Atlântica. Então o reflorestamento é uma grande oportunidade de transformar a Mata Atlântica via pagamento por carbono seqüestrado...” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

Já com relação à agricultura, a regulação das emissões não é consenso entre nossos entrevistados. Os seguintes depoimentos mostram que a regulação impactaria negativamente este setor de atividade:

“Interfere diretamente na vida dos agricultores com quem eu convivo. Alguns impactos de decisões internacionais os atingem diretamente. E é claro que um impacto na vida deles vai interferir na minha ação junto a eles.” (ONG, AGRONEGÓCIO, M.G.A., 45, AGRÔNOMA)

“A regulação pode afetar a competitividade. Conheço a produção de flores e de alguns legumes, em estufa, onde todos os dias se injeta gás carbônico para incentivar a produção, de modo que as plantas precisam de gás carbônico, e o fato de subir um pouquinho mais,

Page 148: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 8

a diferença é mínima. Sob o aspecto humano, o gás carbônico não é um veneno, você está respirando 4, 5% de gás carbônico, e se aumentar de 5% para 5,1% não vai fazer diferença.” (ONG, AGRONEGÓCIO, F.P.C., 93, APOSENTADO)

Algumas lideranças afirmam que, em suas atividades, a regulação não seria sentida, ou o seria apenas indiretamente:

“Afeta, acho que vai afetar a atividade de todo mundo, especialmente porque vai interferir na mobilidade, não e? Viagens, carros aviões, acho que a mobilidade, se você tem meta de redução, vai atingir a mobilidade de todo mundo.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.D., 52, JORNALISTA)

“Afetar a atividade não, porque não temos uma atividade produtiva tipo industrial, em que isso possa gerar uma descontinuidade na produção. Eu acredito que é uma questão muito mais de afetar a vida no planeta. Claro que, se essa pergunta for endereçada para um determinado setor da economia, com certeza a resposta será outra. (ONG, ENERGIA, M.P., 58, ENG. MECÂNICO)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Falta de recursos, de educação e de consciência

Barreiras econômicas e financeiras (falta de recursos) são, juntamente com falta a de educação e consciência, as duas dificuldades mais citadas pelos entrevistados para o enfrentamento das questões do clima. Também foram amplamente citados a falta de “vontade política” e o modelo de produção e consumo.

A declaração abaixo resume bem as razões da dificuldade do engajamento dos atores, que, além de passar pela questão econômica, também esbarra em obstáculos políticos e tecnológicos:

“Você tem barreiras de diversas ordens: você tem barreiras políticas no sentido de que os compromissos no âmbito da Convenção de Mudanças Climáticas precisam ser apoiados por todos os países, e portanto como os interesses são muito distintos entre os países pelo porte, pela região, pela situação geográfica etc., você tem dificuldade de construir consciências que falam mais rápido, as consciências são muito lentas.

Você tem dificuldades econômicas porque os agentes econômicos invertem e têm os custos já realizados, e eles têm que depreciar esses custos, então existe um tempo econômico para a depreciação dos investimentos. Isso faz também com que você não tenha tanta agilidade assim para modificar a estrutura produtiva.

Você tem limitações tecnológicas, tem muitos casos que você quer fazer, gostaria de ter uma determinada tecnologia, por exemplo, um carro usar célula combustível, que usa o hidrogênio como combustível que é uma tecnologia extremamente limpa, mas que você não tem hoje como representar isso, porque você tem barreira tecnológica. Eu chamaria a atenção para as principais, que na minha opinião são essas. Políticas, econômicas e tecnológicas.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, M.M., 47, ECONOMISTA)

Dói no bolso

O entrave econômico é o mais forte. Os interesses das nações mais ricas e poderosas ou de grupos econômicos específicos impedem que ações mitigadoras sejam efetivamente implementadas. A

Page 149: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 4 9

diminuição do lucro, a perda de competitividade e o prejuízo são algumas das conseqüências temíveis:

“As barreiras econômicas para mim são as principais, no mundo inteiro, por causa do modelo que é capitalista e precisa, para funcionar, do combustível fóssil. Fala-se muito no combustível do próximo século, o hidrogênio, mas por enquanto mata-se pelo petróleo.” (ONG, ENERGIA, R.B., 56, ENGENHEIRO HIDRÁULICO)

“Eu acho que tem o fator da economia, tudo esbarra na economia. Se você não reprime, todo mundo alega que não se fazem ações contra as madeireiras, mas se você faz, aí você tem problemas com a população, queda de emprego, muitas cidades podem colapsar... Veja as fábricas de automóvel, saíram de São Bernardo e deixaram um rastro de desemprego para trás... Não é fácil mudar. (...) Ainda estamos naquela de ter de provar que é possível gerar riqueza sem estar destruindo o ambiente.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

“A gente lê muito que as principais resistências que os países têm são no que se refere à parte econômica, alegando que essas questões ambientais vão acabar afetando direta ou indiretamente a sua atividade econômica. Um dos que mais defendem isso é o Estados Unidos, pela quantidade de carros que tem, ou seja isso vai acabar de qualquer forma, queira ou não queira, isso vai afetar a sociedade civil, a economia dos países. Eu acho que é isso que faz com que os países fiquem com muito discurso e pouca ação.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, G.S.C., 52, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“Na maior parte dos casos isso esbarra sobretudo em setores de maior competitividade, com o fato de que quem fizer isso, quer dizer, ele está perdendo de alguma forma a competitividade, a competição você tende a dificultar, a adoção destas medidas mitigadoras, apenas por uma iniciativa individual de um ou outro empresário. (...) Um custo maior, uma rentabilidade menor, as práticas predatórias são desgraçadamente, elas têm um efeito econômico de curto prazo, mas positivo” . (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

Politicagem

O impasse político como um entrave para enfrentar as mudanças climáticas foi bastante mencionado nas entrevistas. A falta de motivação política pelas mudanças climáticas, aliada aos interesses particulares dos setores produtivos, criam um obstáculo grande no momento da tomada de decisão por parte de atores influentes.

“Interesses particulares políticos, intelectuais, egoístas, falta de motivação por falta de visão prospectiva, por aí.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

“Como fatores limitantes, devo dizer que a presença de forte lobby que depende de um modelo construído em cima da indústria dos fósseis e embora esse mesmo lobby esteja olhando em outros setores para o seu próprio futuro, mas ainda hoje domina a agenda dos políticos, a gente vê, no Brasil certo incentivo para aumentar carros, então isso domina ainda a agenda das políticas públicas, então esse é o maior destaque.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA)

“Eu acho que o que falta é vontade política para tentar de verdade, coibir de verdade os privilégios locais que existem nessa questão, e tudo para que o desmatamento seja zero no país, zero.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, M.G., 49, ECONOMISTA)

Page 150: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 0

Educação

As declarações abaixo mostram o posicionamento de dois entrevistados em relação à barreira imposta pela falta de educação – tanto formal quanto informal – no Brasil. Um dos entrevistados também aponta a questão cultural de o Brasil se ver como um país subdesenvolvido como um problema.

“A educação científica, que no Brasil é extremamente deficitária, em conseqüência, a educação da classe política, principalmente porque o Brasil não se cerca de cientistas para sequer discutir questões relacionadas ao clima e à energia. Porque você vê no Brasil o seguinte: o Ministério de Energia, que é dirigido por pessoas de talento, pode até ser, não sei, no entanto os comitês e as sessões não têm nenhuma relação com a comunidade cientifica da base, diferentemente de qualquer país desenvolvido.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, S.C., 59, ENGENHEIRO MECÂNICO) “Nos países não desenvolvidos, ditos em desenvolvimento, eu diria que a ignorância é o fator fundamental... A falta de leitura, a falta de entendimento, a reação que determinados setores empresariais fazem, por exemplo, à questão das mudanças climáticas. (...) Quando analisamos essa situação, eu diria que em países como o Brasil é a falta de educação e a ignorância. Talvez seja um dos sintomas em que a Europa esteja na frente, onde a cultura tem um grau de valorização diferenciado.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.M., 51, ENGENHEIRO FLORESTAL) “É uma questão cultural e de auto-percepção. O Brasil sempre se vê como país subdesenvolvido e aí cai nessa coisa. E também tem setores da economia que aproveitam isso, porque não querem investir nas emissões. Então, eu acho que a barreira brasileira é cultural.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, C.W., 47, CIENTISTA POLÍTICA)

A falta de conscientização e educação ambiental não permite que as populações mundiais mudem paradigmas importantes que poderiam ajudar na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, tais como o estilo de vida e os hábitos de consumo:

“Sem conscientização não se muda mentalidade. Eu acho que é a mudança de comportamento que está faltando. (...) Por exemplo, o pequeno produtor, o fazendeiro que derruba: que fatores afetam essas decisões no dia-a-dia? Isso tem que ser trabalhado e mudado... Se, atualmente, o seu maior interesse é derrubar para plantar ou colocar boi, plantar pasto, então obviamente ele vai fazer isso porque essa é a visão que ele tem do seu futuro, então isso tem que ser trabalhado porque o ser humano tem a tendência da visão de curto prazo...” (ONG,USO DO SOLO, I.S.T., 48, ENG. FLORESTAL)

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

A vantagem brasileira

A vantagem brasileira em relação à redução das emissões foi lembrada por alguns entrevistados. Ela é fundamentada no fato de termos flexibilidade na nossa matriz energética, em podermos conter a principal fonte de emissão e de termos uma rica biodiversidade.

A flexibilidade da matriz de energia

“O Brasil teria como fazer isso de maneira mais fácil do que outros países por ter mais flexibilidade em relação à matriz de seu desenvolvimento, países que têm uma matriz

Page 151: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 1

muito definida, muito avançada no seu desenvolvimento tendem a ter mais dificuldade para alterá-la.

Então o Brasil teria um potencial maior nesse sentido, por exemplo, dizer que o Brasil ainda tem que oferecer acesso a determinados serviços ou bens a grande parte da população e tem a opção de fazer isso já a partir de uma dimensão da sustentabilidade, enquanto quem já o fez tem mais dificuldade para alterar porque o padrão já atingiu todo mundo.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA)

Fonte emissora concentrada

Outra vantagem brasileira é que a maior concentração das nossas emissões está no desmatamento, que pode ser reduzido facilmente por não ser decorrente de nenhuma atividade macroeconômica que possa prejudicar a economia do país e sim estar baseada na exploração local que beneficia uma mínima parcela da população.

“Brasil é dos poucos países que podem se dar ao luxo de reduzir as suas emissões sem afetar o desenvolvimento. Por quê? Porque no Brasil a grande fonte de emissões é o desmatamento da Amazônia, do cerrado e das florestas, mas o principal ainda é a Amazônia e o cerrado e como não há, como o Brasil é muito grande, não há mais necessidade de desmatar. (...) É aí que a gente tem que atuar: se nós reduzirmos o desmatamento para números muito baixos a emissão brasileira cai 60%, 70%, quer dizer nós já teríamos conseguido o compromisso que os países desenvolvidos têm uma enorme dificuldade de cumprir e sobraria uma margem pro Brasil aumentar suas emissões de outros setores que são muito associados com o país que sai do estágio de pobreza e passa a ser um país vamos dizer assim desenvolvido (...)” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, C.N., 56, METEOROLOGISTA)

Biodiversidade e a promessa da biotecnologia

Outro ponto alto do Brasil é a biodiversidade brasileira, que, se trabalhada na indústria de tecnologia de alta capacitação, pode se tornar a base produtiva importante e substituir a atual, sustentada pelas commodities, que são extremamente danosas ao meio ambiente.

“Aproveitando a biodiversidade brasileira, investindo muito mais em indústria de tecnologia de alta capacitação do que em indústrias exportadoras de commodities.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, P.H.G.B., 53, ENGENHEIRA CIVIL)

Minoria vê contradição entre conter o desmatamento e incentivar a expansão agrícola

Para três entrevistados, há uma dicotomia tanto no discurso quanto na prática dos tomadores de decisão no Brasil. Fala-se ao mesmo tempo em combater o desmatamento e em ampliar a produção agrícola exportadora, aquela que mais demanda recursos naturais como solo e água. Expandir significa hoje avançar a fronteira agrícola em direção ao Pantanal e à Amazônia:

“...O Brasil é meio esquizofrênico, porque ao mesmo tempo em que ele faz uma grande política contra o desmatamento, por outro lado tem aí o Banco do Brasil, Caixa Econômica, BNDES financiando abertura de áreas na Amazônia, uma coisa que a gente não consegue entender.

Acho que tem que ter essa política de incentivo quase que recompensando aqueles que fazem direito, que trabalham respeitando as leis ambientais, as normas ambientais e punindo ou pelo menos não privilegiando aqueles que estão agindo errado, isso só no campo dos incentivos e criando condicionantes para o crédito.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.D., 52, JORNALISTA)

Page 152: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 2

Propostas do setor

A maior parte dos entrevistados limitou-se a responder genericamente quando solicitados a arrolar propostas. Alguns, porém, fizeram sugestões específicas. Listamos a seguir as mais significativas:

Moratória contra o desmatamento

“Incentivar o uso dessas terras para não desmatar, diminuir o desmatamento. Ou, eu já falei uma vez, eu acho que o Brasil devia ter uma moratória contra o desmatamento.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

Reduzir impostos para energias alternativas

“Eu acho que tem muitos incentivos. Na questão de imposto poderia ser muito importante você reduzir imposto sobre algumas energias alternativas como aquelas que usam energia solar, eólica, por exemplo. A gente poderia investir em novas tecnologias, não só para uso no Brasil, mas também como negócio. O produtor de biodiesel ou de álcool daria muito mais recursos e geraria muito mais emprego e renda se a gente tivesse investido em tecnologia de ponta de outras energias. Fazer turbinas eólicas.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.F., 36, ENGENHEIRO FLORESTAL)

Reforma tributária que leve em conta os produtos ambientalmente “amigáveis”

“Eu acho que nós estamos num momento muito propício para fazer isso [incentivar ações de enfrentamento das mudanças climáticas]. Nós estamos em vias de ter uma reforma tributária, o que toca no padrão de desenvolvimento, o que direciona o padrão de produção e o lucro. (...) Então eu acho que as preocupações ambientais devem influenciar cada vez mais a política tributária, que é a forma ou talvez uma das formas mais eficazes de você encorajar produtos que têm menor impacto ambiental ou desencorajar produtos que têm alto impacto ambiental.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.F.C., 55, ECONOMISTA)

Valorizar a floresta em pé e os serviços ambientais

“Se o desmatamento é o problema, então vamos dar valor à floresta inteira (...) sim, porque normalmente o desmatamento, a retirada da floresta é por razão econômica, seja pasto, colocar boi ou seja outro, normalmente agricultura não é; então vamos valorar a floresta inteira, vamos pagar pelos serviços ambientais, vamos manter a floresta em pé...” (ONG, USO DO SOLO, I.S.T., 48, ENG. FLORESTAL)

“Eu acho que a solução é a valorização dos serviços ambientais. A gente precisa realmente criar um mecanismo forte para aqueles que preservem, conservem suas florestas, preservem e conservem seus recursos florestais; que eles sejam premiados, e não punidos. Eu acho que o meio de se conseguir isso é através do incentivo financeiro para a conservação dessas áreas.” (ONG, ENERGIA, M.A.Z., 42, ENG. PRODUÇÃO)

Movimento dos consumidores

“Vamos supor que você tenha uma campanha significativa a respeito do uso de determinados produtos químicos na agricultura que tenham um grande impacto na saúde ou no aquecimento global, ou coisa que o valha, e os consumidores resolvam que não vão comprar produtos que sejam fabricados ou que sejam produzidos de tal, ou tal forma...

Por exemplo, a questão dos transgênicos, que não tem a ver necessariamente com a questão do efeito estufa, embora indiretamente tenha, existe uma regulamentação no Brasil, que para a defesa do consumidor, para ele poder ter a opção de consumir ou não

Page 153: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 3

os transgênicos, tem que saber se o produto possui ou não, é uma regra, é uma lei, um decreto que diz que todos os produtos tem um Tzinho ou não, indicando que tem transgênicos. Você já viu algum? Não, esta lei não é aplicada. Esse é um problema, tem que ter uma regulamentação, para ter fiscalização. (...)

Poderia vir de movimento de consumidores, certamente; no resto do mundo, na Europa em particular, isto tem um efeito muito grande, muito significativo porque isto é suficientemente forte para ter marcas na política pública, quer dizer obriga os Estados e a União Européia a reagir a determinado tipo de impulso de consciência tomado pela sociedade e aí obriga também a fiscalização, o que permite que o consumidor faça a sua opção. Isto em geral tem efeito sobre como os industriais, os empresários se comportam.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

Fiscalização, bloqueio e punição das atividades ilegais

“Não há outra solução que não seja uma fiscalização rigorosa, ostensiva. Já os satélites estão dando um panorama muito claro de que as taxas do desmatamento voltaram a subir. O que precisa agora é uma fiscalização ostensiva, precisa uma ação no campo, precisa deter, impedir que se desmate ilegalmente com a presença muito forte dos órgão de fiscalização de todas as polícias, exército, órgãos estaduais, órgãos federais. O Ministério Público precisa congelar a atividade ilegal do desmatamento nos próximos meses, eu diria até nos próximos anos. (...)

Então é isso, são as 3 escalas, curtíssimo prazo, meses e anos, fiscalização ostensiva, um bloqueio às atividades criminosas; a médio prazo é a cadeia produtiva, rigor muito grande na cadeia produtiva; a longo só mesmo dando valor econômico para a floresta em pé.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, C.N., 56, METEOROLOGISTA)

Orientação técnica ao agricultor

“(...) se você criasse um sistema de orientação técnica no país como nós tivemos nos últimos trinta anos onde você ensinasse o agricultor, orientasse o agricultor a desenvolver uma agricultura tecnológica uma agricultura onde se abordasse, por exemplo, um sistema agropastoril, floresta integrada com pastagem, integrado com agricultura, isso certamente levaria o país e a agricultura a racionalizar de maneira muito intensa a produção de CO2, então a integração pecuária já seria uma forma de você minimizar a produção do efeito de CO2. Se você usar padrões de plantio, chamado de padrão de plantio direto na agricultura, é sabido que é uma forma de você economizar carbono.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

Crédito de carbono

“Todos os incentivos têm sido tentados. O próprio crédito, a alocação de valor a papéis de redução de emissão. É uma tentativa.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO)

Agroecologia

“Agroecologia, agricultura ecológica é uma solução certamente, para esse conjunto de problemas você consegue ter esse sistema, você usa uma quantidade muito pequena de qualquer tipo, primeiro ao recompor em parte, ela recompõem em parte a cultura vegetal e, portanto ela já tem uma atividade de reabsorção de carbono, ela não usa os produtos de grande efeito, aliás muito maiores que o CO2, o óxido do nitrato, que é feito da decomposição nitrogenados, tem um efeito de até mais que 300 vezes maior que o CO2, embora as quantidades emitidas forem menores, o efeito é infinitamente maior. Então, por

Page 154: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 4

não ter esse tipo de uso de insumos, porque a agricultura ecológica tem o fator que ela emite pouco, mas absorve mais, pelo tipo de práticas que desenvolve...” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

Eficiência energética na produção

“Todo mundo tem geladeira, televisão e outros aparelhos em casa, lâmpadas etc. Acho que comprar produtos que gastem menos energia deveria ter um incentivo... além do benefício financeiro imediato acho que a medida teria um efeito educativo. Ouvi dizer que uma famosa marca de geladeiras estaria distribuindo esse tipo de produto, mais eficiente, nas camadas pobres que são justamente aquelas que precisam fazer economia. Esse tipo de programa eu acho que ajuda.”

“Um dos causadores do efeito estufa são as hidroelétricas, porque quando você barra um rio ele inunda áreas que tem matas e tal (...) uma solução é você começar a utilizar a energia eólica e solar em larga escala, dar incentivo para isso, diminuir ICMS das empresas, para os prédios que quiserem usar energia solar diminuir IPTU, estar pensando em coisas desse tipo.” (ONG, USO DO SOLO, M.M., 58, MÉDICO)

“Os principais incentivos dizem respeito um lado o mundo do consumo e do outro lado o mundo da redução. Do lado do mundo do consumo está principalmente relacionado com eficiência energética, investimento de eficiência energética, seja para empresa, seja consumidores individuais e do lado da produção esta relacionada também da eficiência. No sentido da redução das perdas tanto na produção como no transporte da energia, ou seja, fazer contratos que maximizem o interesse das geradoras ou distribuidoras, em aproveitar aquilo que é produzido e não contratos que como hoje as estimulam a não se tornar eficientes, e para gerar e colocar no mercado tecnologias que permitam reduzir o consumo ou aumentar a eficiência dos processos combustíveis em geral.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA)

Educação ambiental

“Eu acho que o principal incentivo é a educação. Eu acho que as mudanças e práticas individuais é que vão fazer as mudanças sociais, políticas e econômicas acontecer. E eu acho que a educação seria o ponto para começar essa conversa.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Eu diria que é ter um baita investimento maciço em educação e que essa questão ambiental fosse abordada com muita ênfase (...). A população brasileira ainda é muito vinculada à questão ambiental, por laços familiares, laços de criação muito vinculados com a questão da qualidade de vida. Então você pode transformar esse potencial num maciço projeto de educação e de mudança de mentalidade para adotar um modelo econômico menos impactante e mais sustentável.” (ONG, ENERGIA, P.D.R.M., 49, GEÓGRAFO)

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Governo é o ator principal

O governo foi citado por metade dos entrevistados como ator mais importante para mobilizar ações em relação ao enfrentamento das mudanças climáticas. Para os entrevistados, é do governo a responsabilidade de liderar o processo de engajamento nessa questão, o que não exclui outras

Page 155: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 5

responsabilidades e outras iniciativas. Mas nenhuma ação terá impacto sem a presença do governo. O Brasil, dizem, é muito grande e muito diverso. Só uma força organizadora como a do governo poderia causar o impacto desejado. Além disso, o poder de polícia e de fiscalização cabe a ele:

“Primeiro lugar, você tem que ter uma posição de governo. O governo tem uma posição e coloca as diretrizes gerais. Governo federal, estadual e até municipal. Tem que chegar ao nível municipal para que ele funcione.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

“Eu não tenho dúvida alguma o governo... quem resolve um problema desse tamanho é alguém desse tamanho que é o governo, então o governo tem que tomar conta da queima indiscriminada da floresta amazônica, não é índio, ou o agricultor que está invadindo com o pasto que vai resolver o problema, ele nem sabe disso, ele taca fogo nas árvores e diz que se dane.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA).

“...Obviamente, o governo e principalmente o Ministério do Meio Ambiente junto com o Ministério das Minas e Energia e Agricultura. Eu daria a bola para os três, e tem também o da infra-estrutura...” (ONG, USO DO SOLO, I.S.T., 48, ENG. FLORESTAL)

Em segundo lugar foi citado o empresariado, ou as “lideranças econômicas”, que tem o poder de influenciar a cadeia produtiva e os consumidores:

“As lideranças econômicas. Exige planejamento, principalmente, no sentido de criar, desenvolver e fomentar políticas públicas de desenvolvimento mais responsável. Então são os principais atores.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, P.H.G.B., 53, ENGENHEIRA CIVIL)

“As empresas direta ou indiretamente estão sendo forçadas pelo próprio mercado de tomar atitudes. Hoje em dia, para você exportar alguma coisa, se o cara tiver uma dúvida lá ou é mudança climática, ou não está tendo impacto socioeconômico, ou socioeconômico e ambiental, você tem problemas no mercado. Então as empresas, as grandes empresas exportadoras estão preocupadas com o assunto. Mas, de uma maneira geral, a pequena e média empresa não está. Isso, às vezes, pode representar um pequeno custo no tratamento dos resíduos, está certo ou nos investimentos e normalmente não tem investimento para fazer.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

Em terceiro lugar foi destacada a idéia de que a sociedade inteira precisa se mobilizar, liderada pelo governo, e não isolar a questão das mudanças climáticas dos outros problemas sociais como a pobreza e a violência.

“O governo regulamentar; as empresas buscarem outros caminhos de realização do lucro e da produção; e os consumidores, em geral, procurarem pressionar, nesta direção, e discutirem, como cidadãos, como membro da comunidade, da sociedade civil, adepto de alguma corrente política. Esse problema da mudança climática, junto com os outros. Eu acho que é impossível isolá-lo.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO)

“A natureza de todo o desafio é difícil de você enfrentar se não tiver uma sociedade inteira mobilizada em cima de disso, esse é um desafio setorial e de abrangência em todos os órgãos da cadeia do consumo, produção, financiamento, políticas públicas então é difícil escolher alguns que sejam mais importantes.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA).

“Bom, o meio ambiente interessa a toda sociedade: todos têm responsabilidade, agentes públicos e privados. Então significa que quem vai usar recursos naturais para desenvolver suas atividades econômicas tem que tratá-los como algo que não lhe pertencem,

Page 156: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 6

privadamente. O que quero dizer com isto, é que vai sempre caber à sociedade (...) representada pelos governantes, e pelos poderes constituídos, buscar caminhos para que aquilo que ela entender que seja sustentável, seja de fato aplicado.” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

Também foram citados genericamente segmentos que atuam na sociedade civil, como a mídia, a igreja e as universidades.

“A educação em massa nos meios de comunicação, mídia em geral, TV, rádio, escolas, igrejas, e todos os atores de grande capilaridade deveriam ser envolvidos com programas e incentivados, para que realmente trabalhassem para haver maior informação e motivação. Agora para que a prática aconteça além de informação e motivação, nós temos que educar muito o povo para que ele seja participante, denuncie e ajude a preservar o meio ambiente.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, Z.A., 73, MÉDICA PEDIATRA)

“Certamente as universidades, o centro de pesquisas tanto como fornecedor de informações, como de propostas alternativas. Essas informações de novo aí, a sociedade civil organizada se aproprie um tanto dessa informação e pressione, nesse sentido, as empresas com o uso dessas tecnologias. O Estado tem um papel fundamental, mas ele vai ser o resultado dessa pressão em cima dele.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, O.G., 64, ENGENHEIRO ELÉTRICO).

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

Muita palha, pouco trigo

Mais da metade dos entrevistados declarou considerar moroso o tratamento das mudanças climáticas no âmbito internacional, principalmente tendo em vista a urgência do assunto. Para eles, há grande assimetria no engajamento dos países e em sua disposição de colaborar com as negociações em andamento, sobretudo no âmbito da Convenção das Partes e do Protocolo de Kyoto.

Fala-se em muito discurso e pouca prática por parte dos países que deveriam estar liderando essa discussão. Os entrevistados mencionaram a lentidão, a omissão americana e a postura mais ativa do bloco europeu como exemplos dos diferentes posicionamentos. Para mais de um terço dos entrevistados, há muito debate e pouca ação:

Abaixo temos declarações que exemplificam a decepção dos entrevistados:

“Pelo o que tenho acompanhado na imprensa, o que dá para notar é que tem muito discurso e pouco comprometimento dos países com essa causa do aquecimento. Vemos muito discurso, como na reunião de Bali, mas pouco resultado prático.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, G.S.C., 52, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“De forma tímida, inadequada e com uma visão particularizada e de pequenos interesses nacionais, sobretudo a partir dos grandes emissores europeus e americanos.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

“[O tratamento das questões climáticas no âmbito internacional] vai mal. Porque ela tem aumentado muito e os países do Anexo 1, da Convenção do Clima, que são os países ricos e ex-comunistas. Os ex-comunistas, devido ao colapso econômico, diminuíram suas emissões. Mas os países desenvolvidos não. Com exceção, praticamente, restrita ao Reino Unido e a Alemanha, por fatores aleatórios.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO)

Page 157: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 7

“É muito tímida, chega até a ser ridícula. É muito discurso e pouca ação. O Protocolo de Kyoto, que por si não resolveria nada, o Protocolo de Kyoto não é uma revolução: ele não é regulamentado para uma posição assim como a dos Estados Unidos. Você tem dificuldade na pratica (...).” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, P.I.C., 42, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Omissão americana é lamentada

Os EUA são citados como o país mais omisso, porque “com o seu poderio econômico e político” poderia já ter mudado os destinos da humanidade no planeta, se tivesse adotado uma atitude menos egoísta:

“ (...) Os Estados Unidos são um dos maiores produtores de CO2, e é o [país] mais refratário...” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“Até onde eu possa acompanhar não avançou muito. Eu acho que até a objeção de alguns países têm um peso muito grande, como os dos EUA, e essa é uma das angústias...” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

“(...) Os Estados Unidos não estão preocupados, eles estão agindo com irresponsabilidade, quer dizer, literalmente talvez o termo não seja irresponsabilidade, seja leviano, egoísta... Eu tinha grande admiração pela democracia americana, mas agora eu penso para que serve essa democracia se não é capaz de ver que estamos indo em uma rota suicida?” (ONG, ENERGIA, R.B., 56, ENG. HIDRÁULICO)

China e Índia vão aumentar as emissões

O setor considera que tanto a China quanto a Índia vão aumentar as emissões. Talvez também o Brasil, mas não se tem certeza, pois um a redução do desmatamento na Amazônia pode nos deixar em uma situação ainda confortável por muitos anos:

“A China e a Índia pelo estágio de evolução de desenvolvimento econômico, são países que vão ser emissores fortemente, já são e serão ainda por algum tempo; eles estão esperando para ver os que os EUA e a Rússia farão, não têm ainda uma política muito clara por parte do governo.” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“Você tem de um lado os países emergentes, que são aqueles que estão crescendo, China e Índia, também o Brasil, mas a gente cresce com taxas menores, e você tem países ricos que não querem mexer uma palha... fica difícil. Pelo grau de desenvolvimento a África não conta, e a Ásia, bem tem o Japão que não possui combustíveis fósseis e também é um país pequeno (...). Sem dúvida, o grupo europeu é o que está à frente.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.R., 40, JORNALISTA)

Europa à frente

A União Européia, mais do que qualquer país individual, é reconhecida pelo setor como a que mais tem se esforçado para tirar a questão climática do discurso e transformá-la em prática:

“Eu vejo que na Europa eles têm um debate bastante avançado, e que interfere diretamente em tudo o que é política que está sendo desenvolvida no mundo hoje, políticas de energia, política de alimentos...” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Nós temos, basicamente os europeus, que aderiram ao Protocolo de Kyoto – que manifestaram, portanto, uma clara intenção de ajustar o seu sistema de produção para

Page 158: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 8

reduzir até 2012 uma média aí de 5%, 5,5% das suas emissões...” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

“Olhe, eu acho que só a sociedade européia se engajou realmente e também os governos europeus de uma forma geral, você tem uma postura avançada, propositiva...” (ONG, ENERGIA, R.B., 56, ENG. HIDRÁULICO)

Brasil age timidamente

Entre os entrevistados que fizeram referência mais direta à postura do Brasil nas negociações internacionais no âmbito da Convenção e do Protocolo de Kyoto, a maioria emitiu a opinião de que o Brasil está agindo de forma tímida e está aquém da sua capacidade de liderança:

“Eu acho que o Brasil tem sido um bocado omisso internacionalmente... E naquela lógica, apesar de ser um dos quatro ou cinco maiores poluidores do mundo, segundo o IPCC, ele não propõe redução de emissão por que é um país emergente, em desenvolvimento. Então, ele se esquiva dizendo: mas eu sou um país em desenvolvimento... eu posso ainda poluir um pouquinho mais. Então, isso é uma omissão drástica, não se envolver diretamente na solução do problema.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R.)

“Existe um principio no Protocolo de Kyoto chamado responsabilidade comum e responsabilidade diferenciada, o que quer dizer: a responsabilidade de redução de emissões pode ser comum para humanidade mas é diferenciada entre os países; claro, porque tem grandes emissores e pequenos...

... só que hoje se confunde responsabilidade comum porém diferenciada, com falta de responsabilidade. É o caso do Brasil, lamentavelmente. Então eu acho que a gente tem uma responsabilidade enorme e o que a gente faz hoje é o jogo dos países sujos, ao lado da Índia, da China, quando a gente podia estar fazendo um tipo de desenvolvimento diferente, como mostrar que o século XXI está diferente, a gente ta fazendo o jogo do desmatamento da Amazônia, plantando soja, fazendo um jogo meio besta, burro. A gente podia estar sendo líder no mundo em uma série de coisas...” (ONG, ECONOMIA, M.A.F.).

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE “DESMATAMENTO EVITADO”

Nível de conhecimento sobre a proposta varia

A proposta de desmatamento evitado é conhecida, mas para muitos dos entrevistados esse conhecimento é apenas superficial. Alguns dos pesquisados afirmam conhecer “de ouvir falar” a proposta apresentada pelo governo brasileiro na Conferência de Bali. Poucos souberam discorrer sobre ela:

“Conheço muito superficialmente, não tenho opinião a respeito.” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“Conheço assim, por cima, acho até que é uma obrigação do país. É estranho você trocar uma coisa que é a tua obrigação, que é cuidar da tua biodiversidade em prol de recompensas, mas se “colar” é uma coisa boa; só não sei se os outros vão cair nessa conversa. (...) Veja bem, eu não conheço especificamente.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

A afirmação abaixo explica como funcionaria essa proposta:

Page 159: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 5 9

“Uma das coisas mais importantes que o Brasil pode fazer proximamente é avançar com o projeto de desmatamento evitado. (...) Os serviços que a floresta presta se, de um lado, são as suas matérias primas óbvias tais como madeira, os outros serviços ambientais que a floresta presta não são contabilizados.

Quais são esses serviços? Esses serviços vão dos produtos não madeiráveis, tais como óleos, frutos, essências etc., os produtos ambientais propriamente ditos, tais sejam a capacidade da floresta de manter o equilíbrio entre emissões e absorção de carbono, de um lado, e do outro lado os equilíbrios meteorológicos com relação à manutenção de clima.

Exemplo: quer dizer, hoje, a rápida evaporação da área amazônica, é aquela que mantém o sistema de chuvas que temperam e produzem o concerto hidrológico, que nos dá as condições de um ecossistema equilibrado. Se você desmata, esse serviço desaparece.

Então, o que é o desmatamento evitado? É aquele que fará com que esses serviços não madeiráveis de uma floresta, sobretudo as florestas tropicais, seja contabilizado, tenha um valor. Com esse, então, valor haveria um mercado pelo qual esses recursos em boa parte voltariam a ser utilizados na manutenção, não apenas do ecossistema, mas também das populações locais.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

Não há consenso entre alguns dos entrevistados sobre a viabilidade da proposta, uns entendendo que não há condições operacionais nem financeiras para sua implementação, outros acreditando que, com pequenos ajustes, ela poderá ser viabilizada.

O primeiro grupo, dos críticos, considera necessário um projeto financeiro mais elaborado:

“Eu estava lá vendo a ministra apresentar. A proposta é ingênua, muito ingênua. É uma proposta que me parece bastante carente de mecanismos financeiros, se você quer trabalhar com desmatamento evitado, se você quer evitar desmatamento você tem que dar sistemas de compensação para as pessoas evitarem o desmatamento. As pessoas não desmatam a Amazônia porque elas odeiam a Amazônia, elas não chegam lá e derrubam uma árvore porque ela odeia uma árvore, mas porque elas não têm uma outra forma de vida. Então acho que você tem que buscar uma forma de compensação financeira pro desmatamento evitado que hoje não existe.” (ONG, ECONÔMIA, M.A.F., 48, ENG. AGRÔNOMO)

“Compensação pelo desmatamento evitado é uma boa idéia. O problema das dificuldades das barreiras que ela encontra é a fonte de recursos para financiá-la e, também, a idéia de que deve ser colocado no mercado, a floresta. O Brasil advoga que não, devia ter uma compensação de política publica. Eu concordo com a posição brasileira que deve ser política pública.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO)

Também consideram que não está em conformidade com o Protocolo de Kyoto:

“Eu até acompanhei um pouco...Só que o desmatamento evitado não preenche os requisitos do Protocolo de Kyoto – pelo menos é a minha percepção, posso estar equivocado –, porque quando você quer benefícios ambientais, reclamar e ser restituído, pelos benefícios ambientais que você produz, você teria que atuar não sobre novos impactos, que vai gerar no futuro, mas sobre impactos que estão sendo evitados, que estão sendo mitigados e que estão existindo.

Você não poderia reclamar um crédito de carbono sobre o impacto que você ainda vai gerar. A rigor, é só não fazer aquela atividade que você já estaria evitando o impacto...a rigor, a mata está lá.” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

Page 160: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 0

O segundo grupo, otimista, acha que a proposta é uma excelente oportunidade para o Brasil:

“Eu acho que é uma grande oportunidade para o Brasil e o mundo, a gente conseguir viabilizar, diminuir emissão de gases de efeito estufa e viabilizar projetos de conservação na Amazônia. Você vai aliar a parte econômica, pagamento por serviços ecológicos para determinadas áreas. Então eu acho que é super importante uma proposta que vai viabilizar um monte de coisas, mas de novo, para que seja sério, tem que ter uma ação do governo mais pesada, se não nós caímos em descrédito rápido, e acaba perdendo uma oportunidade rara para o país. E não tem duas oportunidades: você tem uma e não vai ter a segunda.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

Alguns dos entrevistados gostam da proposta, mas acham que ainda precisa ser aprimorada para que funcione eficientemente.

“Eu acho que é cheia de boas intenções. As questões aqui no Brasil, para você lidar com desmatamento, têm menos a ver com o sistema legislativo porque, por um lado, favorecer o ponto de vista de políticas e o sistema de incentivos, práticas que sejam mais conservadoras, como ter um sistema de punição, um sistema efetivo de vigilância e fiscalização, quer dizer punição para aqueles que têm praticas destruidoras. Como aqui ninguém fiscaliza coisa nenhuma, você pode fazer quantas políticas quiser, porque a probabilidade de ter efeito é muito pequena.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

14. CONFERÊNCIA DE BALI

Muita discussão e pouco avanço

Há, ainda, desconfiança em relação à efetividade das reuniões para discutir políticas com relação às mudanças climáticas no âmbito internacional. Muito pouco avanço e alguns entraves, como a situação dos Estados Unidos, são algumas das opiniões mais freqüentes. Grande parte desses entrevistados não ficou satisfeita com os resultados. Seis consideraram que “houve avanços”, e o restante relativizou os resultados, considerando que “essas reuniões são assim mesmo”.

Mudança de posição dos EUA traz esperança

Poucos (6) vêem algum avanço e apontam os resultados positivos. Os que reconheceram avanços citaram a mudança de posição dos EUA, tida agora como mais flexível, a agenda de discussão que está proposta para até 2012 e a atitude pró-ativa do Brasil ao apresentar a proposta do desmatamento evitado:

“Eu vejo de forma muito positiva; o esforço, na minha opinião, nessa Convenção do Clima de Bali, foi manter os Estados Unidos no jogo, dentro de uma perspectiva de uma mudança de posicionamento futura dos Estados Unidos com o novo governo que será eleito neste ano.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, M.M., 47, ECONOMISTA)

“Havia uma expectativa muito grande em torno dela. Aqui no Brasil a gente comemorou pouco os resultados. É obvio que poderíamos ter progressos maiores, mas o mapa do caminho por si só já foi um passo muito importante. Nos 45 do segundo tempo a mudança da posição americana foi muito importante, ainda mais num ano que a gente tem agora de sucessão política lá. Abre boas perspectivas.” (SOCIEDADE CIVIL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.F., 36, ENGENHEIRO FLORESTAL)

Page 161: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 1

“(...) Teve alguns avanços que a meu ver é aumentar as informações sobre o papel do Brasil para que o governo brasileiro assuma compromisso mais forte no que se refere ao combate do efeito estufa.” (ONG, USO DO SOLO, M.D.R., 59, CIENTISTA POLÍTICA)

Próximas eleições americanas criam expectativa positiva

Os entrevistados parecem acreditar firmemente que com a eleição de um novo presidente, seja ele republicano ou democrata, os EUA devam assumir uma postura mais pró-ativa:

“A boa nova é sobre a posição dos Estados Unidos, que não queria assinar os compromisso e, no final, ele topa conversar sobre isso. Acho que agora, com a mudança de liderança dos Estados Unidos vai ajudar bastante nisso. A era Bush vai ficar para trás mesmo que entre alguém do partido republicano... O país chave para isso [liderar movimentos mitigatórios] são os Estados Unidos.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

Argumentos dos descontentes

Outros entrevistados apontaram as falhas desses encontros internacionais: o predomínio do discurso político sobre o técnico, a falta de inovação e a insuficiência das propostas diante do tamanho do problema:

“Essas reuniões, na realidade, não são reuniões técnicas, são reuniões muito mais políticas do que técnicas, então, na prática, eu não acredito que a gente tenha grandes resultados derivados dessas reuniões. A própria reunião do IPCC em fevereiro, orientou e concluiu que nós somos os culpados em noventa e cinco por cento dos casos isso é tudo, e infelizmente não existe um poder de decisão que você vá falar para os países poluentes que tem formas de você evitar a poluição sem perder economicamente tempo.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

“Bali para mim não surpreendeu, Bali confirmou que a comunidade internacional não está pronta para assumir as responsabilidades, que a problemática apresenta do ônus que é gerado por esse processo não está resolvida e em cima dessa ambigüidade de quem vai pagar a conta, vai se adiantar qualquer decisão até que o outro aceite, ou até que o outro resolva pagar e Bali foi mais uma etapa desse processo, ou da diplomacia e mostrou que está refém de uma série de relações comerciais e de uma incapacidade de negociação das relações comerciais.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.S., 46, JORNALISTA).

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Conter queimadas e manter matriz energética limpa

Metade dos entrevistados respondeu que as principais responsabilidades do Brasil num programa mundial de redução de emissão de gases de efeito estufa seria controlar as queimadas e o desmatamento e fazer uma boa gestão da Amazônia, confirmando a percepção de que a Amazônia ocupa um lugar privilegiado na preocupação das lideranças do setor. Muitas das menções às queimadas associam-nas ao uso na lavoura, principalmente de soja e cana. Manter a matriz energética limpa e ingressar em responsabilidades internacionais também figurou entre as respostas.

A responsabilidade do Brasil, portanto, passa também pela necessidade de tomar uma nova postura frente aos problemas climáticos e ambientais. Como expressa a declaração abaixo, o país precisa assumir um compromisso mais sério e não se conformar com o pensamento de que países em desenvolvimento não têm responsabilidades.

Page 162: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 2

“Eu acho que o Brasil deveria se considerar um Anexo 1. Parar com esse papo de dizer “não preciso fazer nada”. Tem que ser um pouco mais maduro e parar com esse papo de que precisamos crescer. O Brasil já é mais maduro do que isso. Se a gente fosse a China ou Índia talvez.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, C.W., 47, CIENTISTA POLÍTICA)

O controle efetivo do Brasil sobre a Amazônia daria maior credibilidade ao país frente às comunidades internacionais:

“Acho que o papel principal do Brasil é ter governança sobre a Amazônia. Uma vez que tenha governança até aumenta o poder de pressão de se tornar um líder, que já é, mas um líder mais forte. Se você mostra que você tem poder, pode favorecer o mercado de carbono, favorecer todos esses processos de sustentabilidade.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

Não basta proteger: é preciso compreender a Amazônia

Para boa parte dos entrevistados, a Amazônia além de grande é diversa, e um dos erros é “pensar que ela é uma coisa só, só floresta, não é”. Para os nossos entrevistados, a Amazônia tem a maior bacia hidrográfica do Brasil, o maior número de nações indígenas, tem minérios e outra riquezas importantes para o desenvolvimento da própria região e do Brasil. Sem falar na riqueza da sua biodiversidade pouco conhecida:

“Depois de anos e anos de pesquisa nós conseguimos compreender melhor como é que se dá o processo de formação da biodiversidade da Amazônia; antes, se imaginava que a biodiversidade da Amazônia era distribuída de forma homogênea na região e hoje a gente sabe que não é. Que cada setor da Amazônia tem seu conjunto de espécies único e isso é extremamente importante...

Também com base nos estudos feitos no campo e mais os estudos moleculares nós começamos a perceber que a biodiversidade amazônica é muito mais antiga do que se pensava até a década de 70, ou 80. Imaginava-se que a grande maioria das espécies tinha surgido ha 18, 20 mil anos atrás mas esses estudos mostram que não, que as espécies são muito mais antigas, talvez de 2 a 3 milhões de anos. Elas se originaram num período muito mais antigo do que se pensava (...) É que se, realmente a gente quiser proteger de forma efetiva a biodiversidade regional, nós temos que entender muito bem a distribuição dessas espécies e a compreensão da distribuição dessas espécies é um desafio constante.” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

Além disso, nos chama a atenção o mesmo entrevistado, a exploração sustentável da biodiversidade pode ser uma saída economicamente viável para a região:

“Então, se a comunidade internacional reconhecer que as florestas fazem a ligação entre mudanças climáticas e conservação da biodiversidade, eu acho que nós teríamos pela primeira vez um mecanismo financeiro muito forte (...) eu acho que pela primeira vez o Brasil está vislumbrando a necessidade, a possibilidade de que a comunidade financeira internacional, a comunidade global possa fazer um investimento concreto em conservação por causa desse receio das mudanças climáticas.” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

Conservar e preservar são conceitos diferentes

Os conceitos de preservação e conservação são distintos, conforme nos explica um dos pesquisados:

“Preservação seria uma conservação mais antiga, preservação é a linha das pessoas que acham que tem que ser tudo parque, você fecha uma área e ninguém entra, nada é

Page 163: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 3

permitido, você não pode usar, você não pode tirar nada, não pode ter gente morando, não pode ter visitação é uma área restrita, são santuários.

Conservação já é uma coisa mais dinâmica, você pode interferir, vai ter áreas, por exemplo em algumas unidades de conservação de uso absolutamente restrito ou não, e outras que você vai ter atividade, você vai ter um mosaico de coisas é uma coisa moderna com um pensamento muito mais moderno, muito mais dinâmico, você pode interferir.

Acabou aquela coisa romântica, a natureza é bonitinha, é bonitinha, mas para quando você está na cidade; quando está no mato você também quer ter energia, água, todo conforto.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

A tese do “desmatamento zero”

A questão do desmatamento e das queimadas devem ser enfrentadas a todo custo, não só porque ele é a maior causa de emissões de CO2, mas também porque impedi-lo é uma forma de conservar a biodiversidade. Alguns entrevistados falam em “desmatamento zero”:

“Como grande parte das nossas emissões é por causa do desmatamento, das queimadas, a principal responsabilidade do Brasil é justamente o desmatamento zero que também evita a perda da biodiversidade. Daqui em diante, essa é a grande contribuição que o Brasil pode fazer.” (ONG, USO DO SOLO, J.M.C.S., 42, BIÓLOGO)

“Nós somos, hoje, o quarto ou quinto maior produtor de CO2 do mundo, porque nós queimamos florestas de uma maneira indiscriminada, não que queimar floresta seja pecado, pecado é você queimar floresta de maneira indiscriminada, como está sendo feito no país, desde que se racionalize as atividades de exploração de madeira, da agricultura da pastagem, da soja, que tendem a avançar para a Amazônia de maneira indiscriminada, então isso poderia ser contido de uma maneira bastante clara, é o que esta sendo pensado atualmente, mas de qualquer maneira nós somos os culpados, porque agimos de forma indiscriminada da flora vegetal.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

“Eu acho que o primeiro deles é evitar o desmatamento e implementar reflorestamento. Quer sejam reflorestamentos econômicos, está certo, quer sejam reflorestamentos de preservação da própria fauna e flora.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

Queimar é “natural”

Temos, entretanto, dois entrevistados que discordam que as queimadas na Amazônia devam ser erradicadas, pois o fogo é um elemento natural. Reproduzimos aqui os trechos em que exprimem seu ponto de vista:

“A mata existe há milhares de anos e uma parte de carbono é liberada, realmente queimando-se a floresta para deixar entrar luz. Ninguém queima a floresta por esporte, custa dinheiro, ninguém gasta dinheiro para brincadeira. Queima a floresta para deixar entrar luz ou para fazer pastagem ou mais tarde agricultura.

Isso custa dinheiro. O sujeito não vai lá, dá um assoprão e derruba a floresta, não; ele tira o dinheiro do banco dele, pega o cheque, paga, paga para a derrubada.

O assunto floresta é muito mal estudado, porque ninguém contabiliza a retenção de carbono pelas plantas que substituem a floresta.

Page 164: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 4

Você tira a floresta, queima, libera carbono; você planta, aquelas plantas retraem, seqüestram uma boa parte, não toda. Mas eu diria que essa parte que e liberada é pequena comparando com a queima dos fósseis.” (ONG, AGRONEGÓCIO, F.P.C.F., 93, ENG. AGRÔNOMO)

“Todo o meu trabalho é fundamentado em pesquisa de campo, vou muito para ver, medir as coisas, e meus resultados mostram uma coisa mais otimista, os animais tem muito mais adaptação, aos novos cenários que a gente esperava. Você tem o impacto? Tem, mas isso não é tão negativo como a gente esperava, as previsões eram muito pessimista. E em curto para médio prazo a gente vai conseguir avançar um pouco mais nisso para ver como a gente pode fechar este pacote, social, econômico e ambiental (...)

O fogo não é tão prejudicial à fauna. A exploração madeireira, se você fizer com cuidado, você está mantendo a biodiversidade.

Caça, conforme você faz também não tem problema.

Fazenda de soja? É possível ter fazenda de soja e ter biodiversidade no mesmo lugar: então eu acho que é uma coisa muito mas otimista do que o cenário que tem se mostrado.” (ONG, USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

Mexer na matriz de transportes

Além da Amazônia, controlar as emissões das fontes veiculares automotoras também apareceu fortemente nas entrevistas desse setor como uma obrigação do Brasil:

“Primeira responsabilidade do Brasil é controlar o aumento de suas emissões, ou seja, se nós hoje não somos os principais emissores, nós temos que cuidar para não vir a sê-lo.” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

“Hoje, no Brasil, o produto interno bruto é medido pelo aumento de vendas dos veículos o que significa queima de combustíveis fosseis. O Brasil tem uma malha rodoviária imensa. Então as autoridades deveriam primeiro repensar esse tipo de pilar da economia brasileira, o que a queima de combustíveis fosseis representa.” (ONG, USO DO SOLO, M.D.R., 59, CIENTISTA POLÍTICA)

“O Brasil tem também que cuidar da questão da frota de veículos, apesar de termos o álcool, o carro hídrico, nós temos ainda uma emissão por veículos nas grandes cidades muito grande, acho que a gente precisa fazer nossa lição de casa no sentido de ter um sistema transporte mais eficiente, transporte público, porque o sistema de transporte no Brasil é absurdamente ultrapassado — o carro individual. Então é isso, atuar nesse sentido de melhorar o transporte publico, substituir o máximo que nós pudermos o combustível fóssil por biocombustível.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.D., 52, JORNALISTA)

Incentivar as energias limpas

O incentivo ao uso de energias limpas e a eficiência energética também foram citados como responsabilidade do Brasil no enfrentamento das mudanças climáticas:

“Nós temos aqui, principalmente no Nordeste, uma quantidade de ventos enorme e a gente podia ter plantas eólicas, geradoras de energia. Nós temos uma quantidade de luz solar também enorme que a gente poderia usar. Só no Brasil tem essa história de chuveiro elétrico, 6% da energia produzida no Brasil é para chuveiro elétrico.” (ONG, USO DO SOLO, M.M., 58, MÉDICO)

Page 165: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 5

“A nossa responsabilidade, evidente, é a de todo o mundo. No nosso caso, aqui nós temos tido esse tipo de preocupação, aliás, o governo tem tido. Se você pega uma matriz como a nossa, é uma matriz pensada no sentido de evitar ao máximo a poluição, tanto que nós temos contratado muitos técnicos, mas não tivemos resultado nisso. Lamentavelmente, estamos vivendo um momento circunstancialmente infeliz. O governo mudou, em 96 houve um fracasso, porque nós tivemos um racionamento muito grande, e com isso nos estamos vivendo agora uma barriga no processo, mas eu acho que em pouco tempo a gente dá a volta por cima e o Brasil volta na questão energética, especialmente na questão especifica de meio ambiente, ele volta a cumprir um papel digno de nota.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.C.G., 66, ENGENHEIRO ELÉTRICO).

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

Em casa, no trabalho, na sociedade

Na questão sobre a importância das ações individuais, houve quase unanimidadade entre os entrevistados: nada menos que 53 deles declararam que ações as individuais são, sim, importantes no enfrentamento das questões climáticas. Apenas dois dos entrevistados não compartilham da opinião da maioria, acreditando que as ações individuais “ajudam, mas não resolvem”.

Diversas são as formas com que os indivíduos podem vir a colaborar nas questões climáticas, seja praticando um consumo consciente, seja exercendo o poder de influenciar. Essa influência pode ser exercida na família, entre os amigos, colegas de trabalho e, se o indivíduo é formador de opinião, junto à própria sociedade:

“Eu acho que você chegar num nível da conscientização pessoal, individual, seria o ideal. Por que se você viver num regime democrático e os indivíduos perfeitamente esclarecidos disso eles vão saber escolher que política a ser estabelecida. (...)” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, E.S., 74, AGRÔNOMO)

“Eu acho que começa pela ação individual, passa pela ação coletiva e transborda para todos os modelos de governança pública e privada. Economia de energia doméstica, mudanças na construção civil de casas que passa porque a água quente, por exemplo, possa ser através da energia solar e não elétrica. Tem uma série de pequenos dados que com o comportamento de quem tem consciência desse problema.” (SOCIEDADE CIVIL, USO DO SOLO, I.K., 60, CIENTISTA SOCIAL)

O poder dos consumidores

A criação de uma massa de consumidores que influencie um novo modelo de comportamento quanto ao consumo, o chamado “consumo consciente”, foi destacado:

“[A ação individual] pode [ajudar], eu só acho que certamente se você consegue criar, um movimento, não um só individuo, mas se você tem uma massa de consumidores capazes de adotar práticas que influenciem a própria oferta de serviços de produtos de tal forma que contemplem este impacto, você vai ter resultados, embora eu ache essas coisas pouco significativas para o tamanho do problema.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA).

“Claro que ações individuais podem ajudar na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas... resumindo, a nossa economia é baseada no uso de recursos naturais, através dos produtos finais que chegam à mão do consumidor e o desperdício vai indo, vai indo, a mídia estimula, quanto mais desperdício, mais se vende, quanto mais se vende, mais se

Page 166: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 6

demanda a fabricação, quanto mais se demanda a fabricação, mais extrações de recursos naturais ou seja água, energia, petróleo...

Então as mudanças das pessoas como consumidores, na verdade, se isso acontecesse seria uma coisa mais rápida que forçaria o mundo a pensar sobre o efeito estufa, reduzindo o seu consumo, isso giraria para traz no ciclo de vida dos produtos, uma mudança assustadora mas esta mudança passa por questões complexas e ela é vencida por um modelo de produção e de consumo estimulado no dia-a-dia pelo marketing e a propaganda.” (ONG, USO DO SOLO, M.D.R., 59, CIENTISTA POLÍTICA)

Atitude faz diferença

O indivíduo também pode servir como exemplo para a sociedade e, aliado ao poder de liderança, pode transformar atitudes de seus seguidores:

“A atitude individual serve para derrubar certos tabus e liderar o efeito demonstrativo, geralmente quem toma atitudes de vanguarda são pessoas que têm algum tipo de liderança. Essas pessoas são as que têm mais chances de usar as suas atitudes para que haja um efeito (...), por natureza elas são mais ousadas, portanto a atitude individual, para mim, é determinante.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.F.C., 55, ECONOMISTA)

Consumir somente o necessário

E, finalmente, um entrevistado ressaltou que, se cada indivíduo não consumir mais do que o necessário, o resultado pode ser muito grande:

“Eu acho que essa educação individual para reduzir o consumo lembra o discurso agora do Walt Disney no Menino Mogli. O urso canta junto com o Mogli e repete “não mais que o necessário”, e aí ele faz o discurso dizendo que “mais que o necessário é demais”, ou seja, aquela visão de que você deve procurar administrar, viver com o mínimo necessário. (...)

Aí eu reporto a pessoas como o Imperador Augusto: a história diz que Augusto recusava tudo a mais além do que ele precisava para viver, comer era o mínimo, repousava ao máximo para poder governar, as roupas eram tecidas em casa. Ele se recusava a comprar um linho ou uma seda, ou um produto luxuoso que viesse de outros países, dourado, Augusto nunca se vestiu de dourado.

Segundo contam os historiadores, a presença de Augusto chocava Pilatos, simplicidade nas vestimentas. E eu digo que bom seria se tivéssemos alguns Augustos.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, S.C., 59, ENGENHEIRO MECÂNICO).

Uma multa individual muda pouco

Mas ouvimos duas opiniões que relativizam o poder da ação individual. Na opinião desses entrevistados, ação individual é pouco expressiva diante da magnitude do problema:

“Não creio que somente uma luta individual vá mudar a situação da Amazônia, está aí o exemplo do Chico Mendes. Chico Mendes lutou sozinho, mas Chico Mendes deixou vários Chico Mendes. Eu sou um deles. Nós não precisamos de heróis na Amazônia. Nós precisamos de uma ação coletiva do governo, dos cientistas, da comunidade internacional, e da própria conscientização dos grandes empresários para parar essa destruição.” (ONG, USO DO SOLO, J.B.S.M., 31, FUNC. PÚBLICO)

Page 167: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 7

“Por exemplo, eu tenho procurado, eu e minha mulher, levar nossa sacola de pano no supermercado, entendeu… Mas, só com esse gesto é quase impossível você reduzir a demanda por plástico. A gente não compra em hipótese nenhuma água em garrafa PET, a gente não compra mas a consciência de um é anulada pela não consciência de outro. Então, isso sempre vai acontecer. Acho que a gente tem que ir pela definição de regras, do que é certo e do que é errado. A gente tem que definir convenções, a gente tem que seguir isso ou aquilo e tem que fazer com que a sociedade vá gradualmente entendendo, mas o que resolve mesmo é política pública.” (ONG, ECONÔMIA, A.N., 35, ECONOMISTA)

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

A atividade agrícola em primeiro lugar

Para a maior parte dos entrevistados deste setor, a mudança no uso do solo, o setor industrial baseado em combustíveis fósseis, o transporte de carga e urbano, a atividade agropecuária e, finalmente, o modelo econômico capitalista figuram entre as atividades que mais contribuem para a emissão de CO2 e outros gases de efeito estufa.

“Certamente a agricultura é uma, porque não só os sistemas agrícolas já implantados têm um efeito contínuo na produção de gases de efeito estufa. Como nós estamos num processo de expansão da fronteira agrícola, nós temos um duplo efeito, não só você desmata, o que tem um efeito sobre o efeito estufa como também você implanta o sistema de produção que também vai ter efeitos.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, J.M.V D.W., 61, ECONOMISTA)

“A produção agropecuária da forma como esta é concebida, com a utilização de agro químicos, com a utilização dos desmatamentos, com a utilização com a queima da cana, queima das matas, a queima da vegetação para produção de pastos para alimentar os rebanhos.” (SOCIEDADE CIVIL, AGRONEGÓCIO, F.M.L., 55, AGRICULTOR)

“Eu acho que é a produção de soja e gado, o agronegócio como um todo.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Eu vou dizer, uma delas é a agricultura, tanto no agronegócio, como na agricultura tradicional de queimadas, que todas as duas têm uma contribuição muito negativa.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.A.B.F., 53, SOCIÓLOGO)

Frota de veículos é o segundo vilão

Na opinião dos entrevistados, as emissões causadas pelas fontes veiculares, é o segundo grande vilão na questão das emissões dos gases do efeito estufa. Por diversas vezes, os entrevistados, citam a malha rodoviária brasileira como ultrapassada e ineficiente:

“(...) eu diria que é o nosso sistema de transporte – que é o maior emissor – o sistema de transporte ultrapassado. Nós poderíamos ganhar muito dinheiro se usássemos melhor os nossos recursos, de ferrovias, de hidrovias, transporte marítimo etc.” (ONG, AGRONEGÓCIO, A.S., 57, ECONOMISTA)

“(...) o desmatamento é uma coisa que contribui, mas eu acho que as emissões de gases por todos os veículos, tanto na produção industrial, tanto na própria vida humana civilizada é o fator que mais contribui.” (ONG, ECONOMIA, A.M.S., 44, SOCIÓLOGA)

“É a questão da utilização dos combustíveis fósseis, seja por meio de veículos ou por outros meios. Nós estamos tendo um crescimento da nossa frota de veículos assustador,

Page 168: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 8

em termos de produção e de venda. Então isso faz com que também essas emissões, elas aumentem.” (ONG, ENERGIA, M.A.Z., 42, ENG. PRODUÇÃO)

Atividade industrial é identificada como grande emissora

As indústrias foram bastante citadas. O processo produtivo, utilizando-se de energia fósseis, contribui em larga escala para as emissões. As indústrias mais citadas foram as petroleiras, as metalúrgicas, as mineradoras, as químicas, as petroquímicas e as de alumínio. As indústrias automobilísticas foram citadas por incentivar o aumento no uso da frota veicular.

“Eu continuo achando que o setor industrial, principalmente da indústria química, é um dos mais impactantes e aí vem a química, não somente da área da petroquímica, mas na área de outros produtos como o ferro, de outros produtos derivados da pedra, da própria água, acho que um dos setores que impacta.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, H.S., 65, METEOROLOGISTA)

“Eu acho que o grande vilão continua sendo a indústria automobilística e o lucro que está por traz disso, é a indústria armamentista tem ligações, na verdade passa a ser uma coisa só, então aí está o grande vilão.” (SOCIEDADE CIVIL, ECONOMIA, R.F.C., 55, ECONOMISTA)

“Mineração, as mineradoras. Acho que é visível o impacto delas. Eu acho também que as que atuam com florestas, eucalipto, produção de papel, celulose. E o petróleo, é claro. São realmente as mais impactantes.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, M.G., 49, ECONOMISTA)

“Ah, é o alumínio, uma só. Porque se você olhar, eu tenho dados muito interessantes, uma hidrelétrica você desmata uma vez só. Então as 30 maiores hidrelétricas do Brasil, elas desmataram 10% do que foi desmatado nos últimos 10 anos para o alumínio.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, M.M., 63, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Desenvolvimento não é crescimento

Mais de dois terços dos pesquisados garantem que é possível sim, produzir desenvolvimento econômico de forma sustentável, fazendo uso dos recursos naturais de forma a garantir condições de vida saudável para as futuras gerações. Contudo, desenvolvimento e crescimento são dois conceitos diferentes. A diferença estaria em que desenvolver é melhorar a qualidade de vida. Crescer é fazer a economia crescer percentualmente sem se perguntar sobre que tipo de desenvolvimento está ocorrendo:

“O que é desenvolvimento sustentável? Não é uma negação do desenvolvimento, tem que ter desenvolvimento econômico, tem que ter desenvolvimento social, mas tem que ter prudência ecológica. Desenvolvimento sustentável é socialmente justo, economicamente viável e ecologicamente responsável. Naturalmente estou falando de outro modelo, certo? Não deste que está aí, neste modelo onde vender carro, PIB a base de carro é que vale, neste eu não acredito.” (ONG, ENERGIA, R.B., 56)

Page 169: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 6 9

Selecionamos a seguir vários depoimentos que repetem o mesmo raciocínio: no modelo atual, desenvolvimento e enfrentamento das mudanças climáticas são incompatíveis. No “novo modelo”, porém, que para muitos é emergente, não há incompatibilidades:

“Hoje tem mais celulares no Brasil que vasos sanitários... A família não quer pagar uma faculdade mas tem um carro na porta... Eu acho que o desenvolvimento que eu desejo para o meu país é incompatível com o que este que está aí, e este que está aí vai agravar o fenômeno das mudanças climáticas, não tenho dúvida.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.S.P.R., 32, ARQUITETO)

“Se falamos desse modelo consumista de desenvolvimento econômico, o peso da palavra desenvolvimento está mal utilizado, não é desenvolvimento. Desenvolvimento, penso, numa palavra positiva, de avanço, não de retrocesso. Isso de certa maneira é um retrocesso e tem a ver um pouco com uma visão talvez velha do que era, do que se aspirava antes, nos anos oitenta.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, C.C., 59, EPIDEMOLOGISTA)

Na visão desses setores, o modelo econômico vigente hoje no país não é sustentável. Alguns entrevistados apontam que não é impossível compatibilizar o desenvolvimento com o enfrentamento das mudanças climáticas: a questão é que o Brasil tem um modelo de desenvolvimento baseado no consumo desenfreado, muito inspirado nos Estados Unidos. Então essa combinação do desenvolvimento com a redução das emissões é possível, mas requer uma mudança de paradigma. Não é possível mais desenvolvimento sem comprometer o ambiente, sem pensar em como trabalhar para reverter o fenômeno das mudanças climáticas:

“Essa perspectiva do crescimento em cima do consumo, como a única forma de gerar benefício para a população é suicida, porque ela vai nos colocando no fundo do poço da crise ambiental. Ela acelera a crise ambiental e climática. Então se a gente não tiver condição de repensar o que a gente considera como desenvolvimento no país e ter outros indicadores de desenvolvimento e outras formas de melhorar qualidade de vida das pessoas, que não seja garantindo que elas tenham que ampliar a sua forma de consumo, é um processo de aceleração do fim. Aceleração do crescimento no modelo atual, é a aceleração do fim.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.R., 40, JORNALISTA)

“Isso não é impossível. É claro que um país, como o Brasil, se coloca num contexto mundial e, neste contexto, o desenvolvimento está associado a um consumo grande de energia. Esse é o problema e, como eu digo, os fabricantes de automóveis, de equipamentos são mundiais.

E mesmo o comportamento do mercado brasileiro, principalmente classe média, não é diferente do mercado dos Estados Unidos. É diferente, mas não quantitativamente. Busca-se um mesmo tipo de padrão de vida e não se consegue porque os outros são muito mais ricos.

E mesmo para a população em geral, a expectativa, que é transmitida biologicamente, pelo marketing, pelas empresas de venda de coisas, é também um consumo nesse padrão nas famílias, mesmo mais pobres, têm intenção de ter o padrão de consumo. Isso é muito complicado.

Acho que este é um obstáculo enorme. O Brasil não escapa disso, está dentro do mesmo contexto.” (SOCIEDADE CIVIL, ENERGIA, L.P.R., 64, FÍSICO)

Page 170: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 0

Desenvolver diferente

Os entrevistados sugerem uma série de iniciativas que poderiam incrementar um desenvolvimento diferente. Sem dúvida nenhuma, nesse cardápio está o incentivo para a produção de energias limpas ou menos impactantes. Além da sugestão de aumentar o parque eólico e solar, ou mesmo a produção de biomassa, as soluções passam por “unir problema e solução”, dizem dois entrevistados, citando o exemplo do manejo sustentável do lixo produzido nas cidades:

“Vou dar um exemplo simples, por exemplo, a questão do lixo. O lixo é um dos grandes emissores de gás metano, que é um gás muito forte, muito potente que colabora bastante para o aquecimento global. A questão do lixo, se nós tivermos uma destinação, se nós tivermos mais programas de coleta seletiva, reciclagem de reuso e etc., você gera um monte de empregos, e você gera empregos em um setor para uma determinada população que normalmente não acha emprego.” (ONG, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.D., 52, JORNALISTA)

“Toda cidade produz lixo orgânico na faixa de 55%, 50%. Lixo orgânico é degradável, então, você tem um potencial enorme de produção de gás e esse gás pode ser utilizado, seja na indústria ou nos veículos, caminhões e mais, isso já acontece em alguns lugares.

Isso significa que todo aquele gás que iria para atmosfera sob a forma de metano através dos aterros sanitários corretos ou dos lixões tanto faz, esse gás é produzido, ele passa a ser encapsulado e utilizado para atividade produtiva. (...)

E ao mesmo tempo você não queimou, você substitui. Então você tem um potencial monstruoso de produção de gás se você considerar as cidades de médio e grande porte, não vamos pensar nem nas pequenas de 50.000 habitantes em diante.” (ONG, ENERGIA, R.B., 56, ENG. HIDRÁULICO)

Alguns justificaram suas respostas com exemplos de meios de produção tais como a agroecologia, o plantio direto ou o desenvolvimento de tecnologia. Outros enfatizaram a vantagem que o Brasil tem nesse quesito relativamente aos outros países em desenvolvimento, por ter uma matriz energética “limpa”. O que restaria mesmo ao Brasil seria combater as emissões provenientes das mudanças no uso do solo.

As lideranças entrevistadas sustentam que é essencial unir políticas de desenvolvimento com políticas sociais e ambientais. Enquanto o tema das mudanças climáticas for responsabilidade de dois ministérios que não dialogam com as políticas econômicas, será difícil:

“Eu acho que deveria ser um tema só, um tema da política de desenvolvimento econômico e socioambiental. Acho que o fato disso [mudanças climáticas] estar entre o Ministério de Ciência e Tecnologia e Ministério do Meio Ambiente já é um problema, já torna a questão ambiental uma coisa marginal e já enfraquece a possibilidade dela ser uma discussão levada a sério, na raiz do problema como deveria estar. Acho que esse é o grande problema, esse modelo estrutural que a gente tem de política do meio ambiente...” (ONG,DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, A.R., 40, JORNALISTA)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ambos os setores – ONGs e sociedade civil – são marcados por forte heterogeneidade, mas revelaram que há muito consenso em suas opiniões. Os mais importantes são em relação à responsabilidade do Brasil de cuidar da Amazônia e de promover políticas públicas, principalmente na área de energia, que possam colocar o país em situação mais confortável diante da cobrança internacional.

Page 171: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 1

Os membros desse setor podem ser caracterizados como moderadamente críticos do “modelo capitalista de produção e consumo” e das desigualdades políticas e econômicas que dividem o mundo entre Norte e Sul, entre países ricos e pobres, com exceção de algumas poucas organizações de perfil político mais radical presentes na amostra. Talvez por incluir muitas associações empresariais, a sondagem não revelou posições muito radicalizadas contra o setor privado ou as “forças de mercado”.

Apesar das cores e tintas políticas variadas, há portanto mais consensos do que dissensos neste setor em relação às questões que cercam a discussão sobre o problema das mudanças climáticas. Os entrevistados consideram que as mudanças climáticas tornaram-se uma questão crucial que não pode ser ignorada por nenhuma política setorial: seja no combate ao desmatamento na Amazônia, seja repensando a matriz energética ou a destinação do lixo produzido nas grandes cidades. A preocupação de fundo deve ser como reduzir emissões ou diminuir os efeitos das mudanças climáticas.

Os entrevistados deste setor se mostraram fortemente interessados e mobilizados pelo tema das mudanças climáticas, pois acreditam que elas afetarão mais as populações pobres e países como o Brasil, que fizeram a ocupação do território ao longo da costa e dos grandes rios.

Faz parte da “competência política” dessas lideranças estarem sintonizadas com os temas mais importantes da pauta política, social e ambiental. Esses setores são os que mais enfatizam em seu discurso a necessidade de promover um desenvolvimento “socialmente justo e ecologicamente responsável”.

Os representantes da sociedade civil e das ONGs se mostraram bastante otimistas quanto ao poder das ações individuais, embora não se distingam dos demais ao considerar que cabe ao Estado brasileiro a responsabilidade de liderar um processo de maior engajamento do país no combate ao agravamento das mudanças climáticas.

Page 172: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 2

PERFIL DO SETOR

Nas ONGs e na sociedade civil, unificadas nessa análise, predominaram representantes de entidades da área social (18 entrevistados). Representantes de entidades empresariais como fundações, associações, federações ou confederações figuram em segundo lugar com 13 entrevistados. Em terceiro e quarto lugar vêm as instituições das áreas ambiental e agrícola, com 11 e 8 entrevistados, respectivamente. Os demais entrevistados se pulverizam entre entidades ligadas ao desenvolvimento da ciência (4), economia (3), religião (2) e energia (1).

Área de atuação Área de atuação Total

Social 18 Empresarial 13 Ambiental 11 Agricultura 8

Ciência 4 Economia 3 Religião 2 Energia 1 Total 60

Dos 60 entrevistados, 48 são homens e 12 mulheres.

Sexo M F Total

48 12 60

Mais de dois terços dos entrevistados pertence à faixa etária entre 40 e 69 anos. Outros 5 entrevistados têm entre 30 e 39 anos, e 4 têm acima de 70 anos. A distribuição dos entrevistados por faixa etária está representada no quadro a seguir:

Faixa etária 30-39 40-49 50-59 60-69 80 ou + Total

6 19 21 10 4 60

Este setor foi o que apresentou mais estrangeiros na amostra: 8, entre 60 entrevistados. Entrevistados naturais da região Sudeste compõem mais de um terço da amostra. A segunda região mais representada é a Sul, com 14 entrevistados. Os demais entrevistados são das regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte.

Naturalidade

Page 173: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 3

SP RJ SC PR RS MG GO AM ES MS PA CE MA PE Ext. Tot. 11 7 7 4 3 4 2 1 1 1 3 1 1 6 8 60

A amostra deste setor é composta por profissionais de alta formação acadêmica: metade possui superior completo, 8 são mestres, 14 doutores, 3 pós-doutores e 8 completaram algum tipo de pós-graduação lato sensu. Apenas 3 não possuíam curso superior completo na ocasião da entrevista.

Escolaridade Superior Mestrado Doutorado Pós Ensino Médio Superior incomp. TOTAL

30 8 16 4 1 1 60

Os entrevistados deste setor são formados em profissões diversas. As profissões mais representadas são engenharia (18) e economia (11), que juntas representam quase metade da amostra. As demais profissões são menos freqüentes, como se pode verificar pela tabela abaixo.

Formação Engenheiro 18 Economista 11 Jornalista 4

Meteorologista 2 Médico 2 Filósofo 2

Matemático 1 Sociólogo 3

Cientista social 1 Agricultor 1 Agrônomo 2

Cientista política 2 Advogado 1

Funcionário Público 1 Arquiteto 1

Epidemiologista 1

Administrador 1 Físico 1

Geógrafo 1 Biólogo 1

Psicólogo 1 Total 60

Page 174: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 4

EMPRESÁRIOS

RESUMO

Foram entrevistados donos do próprio negócio, presidentes de empresas multinacionais e nacionais e executivos envolvidos na alta gerência de empreendimentos em vários ramos de negócios. Estão presentes na amostra representantes do setor do agronegócio, incluindo soja e pecuária, de empresas de energia e de mineração, entre outros.

“O fenômeno das mudanças climáticas é um fenômeno relacionado ao modelo econômico perdulário que usa recurso natural como se fosse algo gratuito”: esta declaração, de autoria de um dos empresários entrevistados, bem poderia ser atribuída a um ambientalista, e mostra que a associação entre o fenômeno das mudanças climáticas e o modelo de desenvolvimento econômico atualmente em vigor é clara e bastante presente no discurso do setor amostrado na pesquisa.

Os entrevistados foram veementes em afirmar que o modelo de desenvolvimento e de consumo modernos são os dois principais vetores que colaboram para a situação atual do clima. Mudar isso é um dos desafios mais importantes da humanidade.

Para os empresários ouvidos na pesquisa, 30 ao todo, a temática ambiental, e a das mudanças climáticas em particular, vem ganhando cada vez mais espaço na agenda nacional e internacional, assim como nos discursos e nas ações do próprio empresariado brasileiro que na sua visão “tem muito a contribuir”.

A maioria apresenta um bom conhecimento das questões ligadas ao meio ambiente e às mudanças climáticas. A motivação para aprender mais sobre mudanças climáticas é bastante elevada.

Contudo, entendem que o mesmo não acontece com a população brasileira de um modo geral, nem com os demais setores. Conscientizar os demais atores sociais, segundo eles, “é tarefa do Estado brasileiro”.

A maioria absoluta dos 30 entrevistados considera que a temática é de vital importância e acredita fortemente na tese do agravamento do fenômeno das mudanças climáticas, recentemente divulgada pelos relatórios Stern e do IPCC, amplamente citados. Também acredita que os impactos sobre as sociedades humanas, e em especial sobre as economias nacional e mundial, serão significativos no médio e longo prazos. Encaram o assunto com seriedade e preocupação.

Apenas uma minoria aproveitou para criticar o “catastrofismo” dos ambientalistas e o sensacionalismo da mídia, bem como para relativizar a importância da problemática. Seus argumentos, no entanto, são fracos e não possuem os elementos de análise que a maioria apresenta. Podem, portanto, ser considerados residuais na amostra.

O setor, de um modo geral, independentemente do ramo de negócio ou atividade, está consciente de que o empresariado deverá levar em consideração que um programa de redução de emissões individual (de cada setor e/ou empresa) e coletivo é absolutamente indispensável. Como isso afetará a competitividade de cada setor é ainda um cálculo a fazer. Para eles, quem se adiantar estará se colocando melhor no mercado de uma economia de baixo carbono, que será a nova economia.

Lamentam o fato de que o Brasil não tenha ainda uma política nacional do clima. Sem isso, os empresários não têm parâmetros para priorizar investimentos nem trabalhar para a conformidade.

Com relação às responsabilidades internacionais do Brasil, há uma divisão de opiniões. Uma minoria acha que o Brasil deve adiantar-se e assumir a liderança, propondo metas de redução. A maioria não

Page 175: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 5

concorda com isso: embora reconheçam que o Brasil “deve fazer a sua parte”, este grupo de entrevistados acredita que cabe aos países de economia desenvolvida fazer os maiores sacrifícios. Acreditam que não é justo nem ético pedir ao Brasil que sacrifique o seu desenvolvimento.

Ressaltaram que a responsabilidade pela situação atual do clima no planeta é dos países de economia desenvolvida que traçaram um modelo econômico de estímulo ao consumo insustentável e demonstram desconforto “quando nações que já consumiram de forma muito irresponsável seus recursos naturais se sentem no direito de ditar as regras de como deve ser agora o consumo do chinês, do indiano e do brasileiro”. Segundo esses empresários, os EUA cometeram um erro histórico não ratificando o Protocolo de Kyoto anos atrás, e agora temos a China e a Índia reticentes. Por que o Brasil deve tomar a dianteira?

Para eles, o Brasil deve tirar vantagens econômicas dos acordos internacionais. Manter a floresta em pé e manter a matriz energética limpa custam dinheiro, e uma regulação impositiva só aumentará as desigualdades sociais e econômicas globais.

A “parte do Brasil”, de acordo com a maioria, é controlar o desmatamento e as queimadas na Amazônia: para o setor empresarial, falar de emissões no Brasil é principalmente falar de Amazônia, “não dá para separar uma coisa da outra”. As demais fontes de emissão citadas são o transporte e a indústria, com destaque para o agronegócio.

Muitos empresários mencionaram sua preocupação com a competitividade de seus negócios, manifestando receio de que o comércio internacional seja profundamente afetado pelas barreiras e tarifas não alfandegárias “em nome do problema climático”.

Não se apresentando como um setor que adota o discurso catastrófico, os empresários não são pessimistas e acreditam que uma política de mitigação dos impactos das mudanças climáticas surgirá rapidamente, e que o setor empresarial estará apto para dela participar.

Page 176: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 6

ANÁLISE DETALHADA

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

Uma consciência recente

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez? Antes da década

de 1980 Na década de

1980 Na década de

1990 De 2000 para cá Não responderam TOTAL

2 5 12 7 4 30

Como mostra o quadro acima, a maioria dos entrevistados neste setor tomou conhecimento da problemática há menos de 20 anos, com 12 entrevistados declarando que foi na década de 90 e 7 a partir de 2000. A maioria admite ter um conhecimento “bom”, mas incompleto sobre o assunto e se declara altamente motivada a “aprender mais”.

Para quase totalidade da amostra, as mudanças climáticas deixaram de ser um problema acadêmico ou de governo. Quem, no mundo empresarial, não prestar atenção ao assunto estará “morto” no mercado em poucos anos:

“Hoje não é mais uma questão restrita ao universo acadêmico ou ao ambiente governamental. O empresariado do mundo inteiro tem uma mudança de postura muito grande, porque eles sabem que é uma questão de sobrevivência econômica também. Foram feitas várias avaliações dos impactos na economia mundial destas mudanças climáticas e todas as avaliações são bastante pessimistas em relação ao dano que isto pode causar na atividade econômica do planeta de uma maneira geral.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Empresários declaram conhecer bem o assunto

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é: Bastante abrangente

Bom, mas incompleto.

Está explorando e aprendendo mais

TOTAL

8 13 9 30

Mais de dois terços dos entrevistados desse setor consideram seu conhecimento “bastante abrangente” ou “bom, mas incompleto”. Outros 9 entrevistados declararam estar explorando e aprendendo mais. Conclui-se claramente que os entrevistados consideram seus conhecimentos satisfatórios, mas que o assunto não se esgota por ser tão atual e dinâmico, e por isso reconhecem a necessidade de uma constante “reciclagem”.

“O meu conhecimento, eu diria que é a primeira e a segunda alternativa, bastante abrangente mais incompleto, seria impossível, uma estupidez intelectual, achar que você tem um conhecimento ou uma ótima visão do todo, cada descoberta é uma descoberta.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.T., 58, SOCIOLOGA)

“Eu diria que eu estou explorando e aprendendo mais, a gente está sempre aprendendo mais.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENG. ELÉTRICO E AMBIENTAL)

Page 177: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 7

“Olha, vou te dizer uma coisa, toda vez que eu assisto a uma palestra, um programa de televisão ou que leio algum livro eu aprendo alguma coisa sobre mudança climática. Então eu acho que sou uma aluna nesse campo. É bom, mas incompleto.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, C.C., 43, ENGENHEIRA E ADVOGADA)

3.GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Maioria se sente altamente motivada

Como se sente em relação ao tema: Altamente motivado

Motivado, mas tem outros assuntos mais importantes

TOTAL

25 5 30

A maior parte dos entrevistados, 25 de 30, afirma possuir um alto nível de motivação relativo ao tema “mudanças climáticas”:

“Eu sou altamente motivado por esse assunto que faz parte aqui do meu setor, o agronegócio.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, I.W., 54, ENG. AGRÔNOMO)

“Uma pessoa altamente motivada a entender do assunto, a aprender sempre mais. Eu sempre gostei dessa área ambiental. (EMPRESARIAL, ENERGIA, J.C.G.M., 52, ENG. DE PRODUÇÃO)

“Eu me considero uma pessoa altamente motivada a entender do assunto. Eu sinto isso porque como eu participo de estudos de energia, inclusive de fontes alternativas, sei da viabilidade que existe na substituição de energia de fontes procedentes de fósseis por energia de fontes alternativas que hoje já são bastante conhecidas e possíveis de serem fabricadas.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, J.A., 54, ENG. DE PRODUÇÃO)

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Pobreza e crescimento populacional destacados como maiores desafios

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos? Distribuição de renda /

desafios sociais / produção de alimentos

Desenvolvimento sustentável / Preservação recursos naturais

Enfrentamento das questões climáticas

Outros TOTAL

18 5 4 3 30

Para a maioria absoluta dos entrevistados, o combate à pobreza, desigualdade social, à fome e ao próprio crescimento populacional – que aumenta a demanda sobre o consumo de recursos e bens de um modo geral – constituem o grande desafio da humanidade nas próximas décadas:

“É alimentar e dar condições de vida para um monte de gente que está nascendo, acho que o mundo está muito cheio.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

“Dos 10 maiores problemas da humanidade nos próximos 50 anos, 5 serão resolvidos pela agricultura: alimentação, fome... energia, água e a pobreza. Outro desafio é o tema da saúde... esses são os grandes problemas... os demais temas são, digamos assim, políticos como o terrorismo e tal...” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.R., 65, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Page 178: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 8

Mas a problemática ambiental não está ausente na maioria das falas: menções ao colapso dos recursos hídricos, à falta de saneamento básico e ao assustador padrão de consumo são abundantes nas argumentações:

“Eu acho que o maior desafio da humanidade para os próximos 20 anos vai ser trazer grandes massas da população, que vivem em situação de baixa renda, poucas oportunidades, com baixos níveis de saúde, para níveis de países mais elevados, com indicadores mais elevados sem causar uma tragédia ambiental. São todos os indicadores que denotam uma melhoria de qualidade de vida. Então, você tem renda, educação, saúde, quer dizer, o acesso a mais oportunidade trazendo mais renda com mais educação e mais saúde para uma grande massa de pessoas na humanidade. Essa massa coloca, sem dúvida nenhuma, uma pressão maior sobre os ecossistemas, sobre os recursos naturais.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.B., 52, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

“Acho que o grande desafio que nós já estamos vivendo, esse grande desafio é o impacto desse contingente humano que está vindo com padrões de consumo semelhantes ao que se tem no Ocidente. Americano tem um carro, um, dois, três carros, consome energia para burro tem cinco, seis televisões em casa, enfim, esse padrão está sendo, de certa forma, espalhado pelo mundo, então você não pode chegar agora pro chinês ou pro indiano, ou pro brasileiro e dizer, não, agora, daqui para frente o jogo é diferente.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, J.C.M., 58, ECONOMISTA).

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Distribuir renda e melhorar a educação

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Distribuição de renda Educação Mudar modelo de consumo Outros TOTAL

11 5 3 11 30

Segundo a maior parte dos entrevistados do setor, a questão de distribuição de renda e a melhora da qualidade da educação, tornando-a acessível a todos, são nossos maiores desafios para os próximos 20 anos.

“Agora tem, no caso do Brasil, um problema crasso que é a distribuição de renda. E que também vai ser certamente potencializada com o problema do aquecimento global. Os sessenta por cento da população que têm precário acesso ás utilidades da sociedade moderna vão ficar mais precarizados ainda porque o aquecimento global vai estratificar ainda mais. Seguramente, seguramente. Quem tem vai se defender melhor.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, L.G., 47, PUBLICITÁRIO)

“Acho que tem um desafio assim para ontem que é a pobreza. Por isso que eu não colocaria que mudanças climáticas é um tema fundamental, básico e pobreza tem tudo a ver com mudanças climáticas. As pessoas hoje vivem nas cidades. A população é urbana no mundo, a nível mundial e a capacidade das pessoas viverem na cidade é diretamente proporcional a essa capacidade de melhorar o nível de renda, o nível de vida das pessoas. A pobreza hoje é o nosso maior entrave para viver.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, C.C., 43, ENGENHEIRA)

“Educação é o grande desafio. Você muda a sociedade quando você põe todos para mudar, e você põe todos para mudar na educação. A educação leva à preservação

Page 179: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 7 9

ambiental, leva à ética e leva ao melhor entendimento e à inclusão de todos. Hoje os nossos filhos são muito melhores do que nós em termos de incluir as diferenças, mas ainda há muito por fazer.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, M.G.A., 53, ENGENHEIRO QUÍMICO)

“A educação tem um papel importantíssimo nisso tudo. A educação, não digo só da universidade, mas digo desde criança como a gente pode criar uma geração que venha a ter respeito por isso (...) acredito que a escola e a universidade têm um papel importantíssimo nessa mudança. Não na mudança climática, mas na mudança de comportamento da sociedade toda. Essa é uma coisa que eu considero bastante importante.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.V., 52, ENGENHEIRO)

Mudar o modelo é um dos grandes desafios

Além das respostas nomeando problemáticas específicas, com a predominância dos temas socioambientais, muitos entrevistados responderam que o maior desafio, tanto da humanidade como brasileiro, é “mudar o modelo”, considerado perdulário, predatório, insustentável:

“Olha, a questão do uso dos recursos naturais de forma dispendiosa, de forma irracional, provoca efeitos diretos no meio ambiente e é uma relação de causa-efeito inquestionável. Esse mal gera outros males ambientais. Por exemplo, o tamanho do lixo que circula nos oceanos. A massa de lixo flutuando circunscrito na mesma região de paralelos acima do trópico de câncer é quase duas vezes o tamanho dos EUA, só no Pacífico. Quer dizer, a quantidade de resíduos, de lixo que a humanidade está produzindo é enorme e a terra não está conseguindo condições de processar, de absorver.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, F.M., 60, GEOFÍSICO)

“O fator primordial no agravamento da mudança do clima é o padrão de desenvolvimento, entenda-se por isso os padrões de produção e consumo, que as sociedades criaram nos últimos cento e cinqüenta anos. Então, é importante que haja uma série de políticas, não só do ponto de vista econômico, mas que também trate dos impactos sociais e das relações políticas por trás disso.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.N., 29, RELAÇÕES INTERNACIONAIS)

Água é o maior desafio ambiental

Qual será o maior desafio ambiental do Brasil nos próximos 20 anos? Preservar e recuperar

recursos hídricos Desenvolvimento

sustentável Enfrentamento das questões

climáticas Outros Não

responderam TOTAL

8 7 6 4 5 30

Quando perguntados especificamente sobre o problema ambiental mais grave a ser enfrentado nos próximos 20 anos, um problema específico se destaca: a água “sem a qual a gente morre”. Em seguida, aparece “implementar o desenvolvimento sustentável”:

“Água, é claro, veja bem, porque sem ela o cara morre... tudo é um ciclo, existe água, porque existe floresta...mas o grande desafio é mudança de cabeça... tudo isso tem se existir agentes transformadores para fazer isso, eu volto a falar, falo 10 vezes, não existe nada, sem ter o homem gerindo, cuidando, vai ter água se a gente se preocupar com a água.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, M.G.A., 53, ENGENHEIRO QUÍMICO)

“E se não tiver uma gestão responsável, ética e honesta em mais 20 anos a gente vai ter problema de água, mas com certeza também vai ter problema de ar e isso vai agravar

Page 180: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 0

bastante as mudanças climáticas.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.V., 52, ENGENHEIRO)

“Eu acho que o grande desafio, no Brasil, é produzir com sustentabilidade. E com sustentabilidade não pode ser apenas um assunto ambiental. Implica no econômico, no social... Então, o balanço entre o Econômico, o Social e o Ambiental é o desafio do Brasil.”(EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.R., 65, ENG. AGRÔNOMO)

O percentual de respostas diretas mencionando “mudanças climáticas” ou “aquecimento da Terra” é expressivo, bem como fatores a eles relacionados:

“Acho que para mim são três: é a manutenção das florestas, a disponibilidade de água de boa qualidade e é o clima. Esses são os três desafios. Agora, tem uma questão que é meio transversal a todas elas, que é a questão energética porque o assunto da energia, quer dizer, para esse grande afluxo de crescimento, de melhor qualidade de vida você precisa de energia. A energia passa pela questão da terra, passa pela questão do clima, passa pela questão da água. (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.B., 52, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

“Eu não tenho dúvida que são as mudanças climáticas. Não existe um problema, em minha opinião, mais global do que a mudança do clima. Ela afeta todo mundo, todo mundo tem a sua parcela de responsabilidade apesar de que ela é diferente por cada histórico e cada situação específica de país e também de nível pessoal, mas todos nós somos responsáveis e todos nós sentiremos os impactos, uns mais outros menos...

Você pode ter pressões migratórias, por exemplo, pressões de falta de água em algum lugar, de seca, de mudanças abruptas das condições sanitárias inclusive, por causa do deslocamento de espécies, pragas etc. Isso pode desandar inclusive questões de conflito. Então, por esse apelo, não só social, econômico e ambiental, mas também em termos de segurança, é que eu acho que é o problema mais grave que a comunidade sente de uma maneira coletiva.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.N., 29, RELAÇÕES INTERNACIONAIS).

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Apenas minoria discorda sobre o grande impacto das mudanças climáticas

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas. Concorda fortemente

Concorda Discorda Não respondeu TOTAL

16 9 2 3 30

Apenas 2 (dois) entrevistados afirmaram discordar da tese de que as mudanças climáticas causarão grande impacto nas sociedades humanas, contra 19 que acreditam “fortemente”.

O argumento para discordar é baseado na idéia de que as atividades humanas apenas participam, mas não são a causa principal que agrava o fenômeno:

“Tem uma corrente de cientistas que diz que efetivamente o aquecimento global existe em função da atividade humana, o próprio IPCC. Tem uma outra corrente de cientistas renomadíssimos que entende que a atividade humana participa, mas não é tudo isto que se anuncia, é muito menos e que a própria radiação solar faz acontecer muito do que acaba

Page 181: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 1

gerando o aquecimento global. E claro, a atividade humana participa aí com 20, 30% mas, não com 80% como se anuncia.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, V.H.K., 58, ADVOGADO)

“Os nossos cálculos de mudanças climáticas foram feitos em cima da realidade australiana e não da realidade brasileira e querem que eu acredite. São dois ecossistemas absolutamente diferentes. Enquanto a Austrália não tem água e já tem uma parte seca que eles têm de canalizar para beber água, no Brasil eu tenho uma Bacia Hidrográfica, é um espanto quando se olha um Atlas hidrográfico brasileiro, dá impressão que não se tem espaço para caminhar, só tem rio! Então, são duas realidades totalmente diferentes e nós usamos a mensuração australiana.” (IDEM)

“Sempre tem aqueles catastrofistas de plantão: o mundo vai acabar, a religião diz que vai acabar o mundo... eu acho que um terço é uma preocupação razoável, um terço é sacanagem e outro terço é falta do que fazer... eu acho que a questão ambiental está super dimensionada. Nós sempre resolvemos os problemas..., eu já ouvi que o mundo ia acabar por causa de AIDS, por causa de frio em 1975, agora diz que é por causa de calor e eu vejo atrás disso também um forte interesse comercial por parte de alguns países, principalmente na Europa, e por parte de políticos e outros que são eminentemente anti-capitalistas e anti-desenvolvimentistas.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.S.H., 77, CAFEICULTOR)

A afirmação a seguir expressa a visão compartilhada pela maioria dos que disseram concordar com convicção:

“Concordo fortemente, esse é exatamente o principal desafio que a humanidade está encontrando. É um assunto um pouco técnico, um pouco complexo, mas vamos lá:

primeiro temos a questão da distribuição de água na Terra, quer dizer, a distribuição de água vai mudar, já está mudando na verdade, então, os rios, por exemplo, que hoje têm uma certa vazão e correm dentro de uma certa situação geográfica vão ter um deslocamento. A questão da disponibilidade então para populações que hoje estão estabelecidas nos lugares onde tem água disponível, vai mudar dramaticamente: não vai ter água disponível mais nesses lugares, então já temos um problema aí.

A segunda questão é a questão da agricultura, quer dizer, as áreas agriculturáveis estão mudando de lugar, seja por causa de temperatura seja por regime de chuvas. Então a agricultura está relacionada com a produção de alimentos. As duas questões agora se cruzam e essas pessoas que não vão ser atendidas por disponibilidade de água poderão também ser afetadas por indisponibilidade de alimentos.

Aí nós vamos ter um problema de deslocamento de população. E toda questão vai ter desdobramentos políticos porque o clima não conhece fronteira políticas entre os países, certo? Então as pessoas vão ter uma tendência de fluxos migratórios que vão para além das regiões internas dos países, irão de um país para o outro.

Então é isso, uma mudança brusca de situação e uma questão geopolítica que acaba resultando...” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, R.G.N., 51, ENGENHEIRO)

A gravidade do problema não deve levar ao fatalismo

Embora reconheçam a gravidade do fenômeno das mudanças climáticas, os empresários ouvidos se recusam a compartilhar de uma visão fatalista. Acreditam que há enormes desafios a enfrentar e que a redução de emissões não é um problema ambiental clássico, porque não se trata de promover a

Page 182: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 2

conservação dos recursos nem o gerenciamento de resíduos, mas uma mudança estrutural. Daí a necessidade de uma política “que é maior do que a política ambiental”:

“Política de mudança climática não é uma política ambiental comum, primeira coisa importante. A questão ambiental na mudança climática é apenas o impacto final, certo? Então a política de mudança climática, como eu estava falando, ela é uma política econômica, ela é uma política habitacional, é uma política urbana, é uma política de infra-estrutura e logística, de transportes, certo?

Então é pensar tudo isso sob uma nova ótica, uma nova forma de se usar energia, em que você tem, por exemplo, que considerar a geração de energia mais próxima do local de consumo para evitar menos perdas, que você tenha que racionalizar transportes, que você tenha, enfim, que utilizar menos recursos naturais para fazer o que você faz. Dar destinação aos resíduos mais adequada, gerar processos mais sinérgicos que utilizem esses resíduos...

Então eu acho que é um impacto muito grande, exige uma política de mudança climática. Ela é como se fosse um termômetro de um novo modelo de desenvolvimento.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, V.F., 51, GEÓLOGO)

“É uma questão que extrapola a questão ambientalista, é uma questão que está relacionada com a nossa sobrevivência nesse planeta, manter nossa sobrevivência viável e garantir que ela seja viável para o futuro.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, J.A.R., 54, QUÍMICO INDUSTRIAL).

7. IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

Maioria considera o tema estratégico para os negócios

Importância do tema em seu setor de atuação: Muito importante Importante Pouco importante TOTAL

25 3 2 30

A quase totalidade dos entrevistados, 25 em 30, avaliou como muito importante a questão das mudanças climáticas na sua área de atuação, reconhecendo que a regulação futura, previsível, deverá afetar todos os negócios. O principal fator, segundo a maioria, é o fato de que a economia é ainda baseada na matriz dos combustíveis fósseis. Isso obrigaria quase todos a um programa de redução de emissões.

Sem dúvida alguma, reconhecem, a questão das mudanças climáticas não é só ética, mas econômica. Para muitos negócios, inclusive, passou a ser questão extremamente estratégica, e mesmo de sobrevivência:

“A questão dos biocombustíveis passou a ser estratégica dentro do campo das energias renováveis. Porque além do ganho ambiental, das emissões, tem a questão social. O Nordeste do Brasil é muito sensível às alterações de clima, ano chove, ano não.

Nós estamos, portanto, investindo para procurar uma melhor estabilidade, inclusive, nós temos alguns convênios com Universidade Federal Rural de Pernambuco, a UFRPE, que integra uma rede inter-universitária do país para que a gente desenvolva um trabalho de buscar variedades de canas mais resistente às pragas, evitando tanto produto químico.

Page 183: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 3

A gente tem essa consciência de melhorar a produtividade a partir de um cultivar que use menos produtos químicos. Isso certamente vai beneficiar o meio ambiente, quer dizer, há uma consciência e também uma atitude prática.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.C., 49, ADVOGADO)

Você pode ter perdedores e ganhadores dependendo da competição de cada setor, de cada empresa.

Na minha, especificamente, isso já está sendo visto como uma oportunidade. Então, como nós iniciamos esse processo de ajuste, inclusive estimulados pelo Protocolo de Kyoto, desde 2005.

Nós desenvolvemos um projeto, aprovado pelo Banco Mundial, justamente para propiciar o uso de carvão vegetal renovável, proveniente de florestas plantadas para a siderurgia. Então, para a gente isso não vai ser mais uma ameaça, pelo menos no curto prazo, porque nós nos antecipamos a esta barreira, cientes de que ela ocorreria.

Hoje em dia temos até um crédito para vender no mercado. Então, quer dizer, a história se transformou em oportunidade.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.N., 29, RELAÇÕES INTERNACIONAIS)

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

Adotar metas de redução de emissões assusta empresários

A maioria dos entrevistados se diz contrária à adoção de um programa de metas de redução por parte do Brasil. Acham que o país tem responsabilidades sim, mas diferenciadas, e que a adoção de metas de redução afetaria gravemente a competitividade do Brasil:

“Eu acho que todos nós seríamos afetados porque nós provavelmente teríamos taxações, provavelmente teríamos metas setoriais que limitariam muito a nossa capacidade de competir no mercado internacional e não necessariamente conseguiríamos dar a mesma contribuição do que se nós não tivéssemos metas... O país tendo que cumprir metas passaria a demandar isso dos setores mais promissores, o nosso é um deles, e você perderia muito da competitividade, da possibilidade e não contribuiria, a meu ver, para mitigação do efeito global.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, V.F., 51, GEÓLOGO)

“Caso isso aconteça o efeito é de redução de competitividade, não há dúvida.

Existem outras questões, o processo de discussão que começou em Bali é para definir quem deve reduzir o quê. Para mim não há dúvida que o problema é conjunto, as responsabilidades são conjuntas, mas diferenciadas.

Eu não tenho dúvida de que a questão da responsabilidade de um país como o Brasil são diferentes de países como Estados Unidos, outros países da Europa etc. e tal, por um motivo simples:

a vida útil do gás, de qualquer gás do efeito estufa, é de cerca de 30 a 50 anos, portanto, o que nós estamos vivendo hoje como problema e que vai durar mais 30, 50 anos, acontecerá independentemente do que se fizer a partir de agora, não é uma causa brasileira.

Page 184: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 4

O que não quer dizer que você não tenha que tomar ações de mitigação, ações... o fato de eu não ter metas não significa que eu não tenha responsabilidade, elas são compartilhadas, mas há uma tendência a simplificar responsabilidades.

Isso eu acho perigoso, se você olhar as emissões, por exemplo, da China que é a grande vilã no momento, vai passar os EUA, se você olhar as emissões per capita da China, você vai ver que a situação é absolutamente distinta da situação americana...

Se você estabelecer metas que sejam draconianas para um país, você está ferindo o próprio conceito, o próprio conceito de sustentabilidade, acho perigoso pessoalmente restringir a discussão apenas à questão de metas ou não-metas e é exatamente isso que Bali não fez” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.M., 46, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

Alguns poucos privilegiados nesta amostra não temem metas de redução porque, segundo dizem, se anteciparam e estão à frente:

“Não tememos porque estamos anos luz na frente. Para você ter uma idéia do total de energia que a gente usa no negócio todo, quando eu falo negócio todo, é desde a produção lá do fumo até a entrega do cigarro no varejo que a pessoa vai comprar, o carro que transporta, tudo.

Se eu pegar toda energia que eu gasto desde o início até o final é algo de 80% renováveis. Ela já é sustentada pelo que a gente vem fazendo ao longo do tempo. Nós não vamos ter grande impacto em termos de restrição nenhuma porque, na verdade, nós já alcançamos esse patamar, nós já estamos muito a frente.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, J.A., 54, QUÍMICO INDUSTRIAL)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Dificuldades e limites

Ganância, ambição desmedida, “capitalismo desenfreado”, lógica de curto prazo e uma espécie de falta de fé nas políticas em vigor povoam as falas dos nossos entrevistados, que mencionam uma “cultura que não ajuda”, onde não há coerência metodológica, “direção”.

Foi largamente mencionada a incapacidade de planejar e implementar planos estratégicos. Em termos mais objetivos, as dificuldades são de três ordens.

A sociedade inteira funciona contra a redução de emissões

Esse raciocínio se refere sobretudo à natureza do modelo de produção e consumo e ao aumento da demanda por energia, claramente presente em países como China, Índia e Brasil:

“O que pode agravar o fenômeno das mudanças climáticas? Bom, a resposta técnica seria, de imediato, o aumento das emissões dos gases que causam o efeito estufa, resposta óbvia. Mas a gente tem que olhar o que está por trás disso, o que gera essas emissões. E, na verdade, o que gera essas emissões são padrões de desenvolvimento que a sociedade criou ao longo dos últimos dois séculos, principalmente a partir da revolução industrial.

“Esse modelo de desenvolvimento está muito relacionado aos padrões de produção e consumo. Não se trata das emissões da indústria. As pessoas às vezes imaginam que as emissões só ocorrem na indústria. Não, na verdade, é na sociedade inteira. Transporte,

Page 185: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 5

desmatamento, até mesmo em alguns serviços. Mas é, sobretudo, na demanda energética que está o problema. (...)

Aqui no Brasil a gente está caminhando para o padrão de consumo de energia mais ligado ao americano, e aí temos a história das emissões do chinês e do americano; bom, a China e os EUA emitem a mesma coisa, só que o chinês é de 3 toneladas por habitante por ano e o americano é de 19 tonelada por ano. Então que padrão de consumo é este? Acho que esta discussão não está sendo feita... Fala-se da produção, da qualidade da energia produzida, mas e a demanda?” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

“Talvez a principal barreira ou dificuldade para reduzirmos emissões seja o paradigma que a humanidade adotou, adotou um modo de viver que depende da queima de combustíveis fósseis e de carvão, e isso é uma coisa de natureza cultural e muito arraigada, então para mudar isso, é preciso fazer essa transformação na cabeça das pessoas, convencê-las a mudarem o seu modo de vida de maneira a reduzir a dependência dessas questões. A outra barreira são os interesses econômicos que já estão estabelecidos em cima disso. Então você tem as pessoas que têm que mudar de cabeça e é difícil mudar porque todo mundo tem que mudar de cabeça, certo? E o outro são interesses econômicos que vão evidentemente se desfazer em função disso. Ainda vão surgir outros novos, mas as duas barreiras mais fortes são essas.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, R.G.N., 51, ENGENHEIRO).

O modelo adotado de transporte e de mobilidade é “pré-histórico”

A crítica aqui é ao modelo rodoviarista adotado pelo Brasil a partir dos ano 60, considerado devorador de óleo diesel, identificado com a idéia de “carregar tudo nas costas de um caminhão”. O sistema de transporte urbano também foi criticado por sua natureza irracional, pré-histórica:

“Nosso transporte de carga, é o mais energivo [intensivo em energia] do planeta, transportamos tudo nas costas de um caminhão, nós praticamente... nossa rede de ferrovias é ridícula, não temos uma navegação de cabotagem, nem fluvial, nada.

É ridículo o que a gente tem: sistemas de transporte específicos como a ferrovia da Vale do Rio Doce, coisas assim, mas ligadas a uma empresa; mas o resto é vergonhoso, o sistema de transporte que temos é extremamente devorador de óleo diesel, e junto com isso, o transporte urbano é pré-histórico, os nossos ônibus são paleontológicos, nosso sistema de distribuição da malha de transporte urbano é uma vergonha, você concebe ficar parado numa esquina da Copacabana e passarem 30 linhas de ônibus diferentes, todas indo para o centro da cidade

E cada uma com meia dúzia de passageiros? Num ônibus da pior qualidade, nem um pouquinho eficiente, tudo montado em cima de óleo diesel; nós temos minúsculas redes de metrô, alguns trens urbanos, não temos bondes ou sistema de VLT, enfim nosso sistema de transporte, é uma contribuição pesadíssima.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Você está vendo a solução e eu estou vendo o problema. Ninguém está avaliando o que significa este ufanismo de dizer que a indústria brasileira está produzindo X de carros, o que significa 1000 carros/dia sendo emplacados em S. Paulo e Rio? Ninguém discute isto, então este é um problema, o ordenamento urbano, a ocupação do solo, do rodoviarismo, isto é dramático. Vamos analisar o custo de um engarrafamento, custo econômico, custo stress de uma pessoa, compromisso que você perde, a irritação de uma pessoa, sem contar

Page 186: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 6

a poluição ambiental, não tem ninguém calculando isso para a sociedade.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

Incapacidade de planejar e gerenciar a implementação de planos estratégicos

Vários entrevistados citaram que há mais de uma década se fala em uma “Amazônia sustentável”, sem que nenhum plano tenha sido implementado de forma coerente. O que se viu foi ambientalistas insistindo em reservas extrativistas e empresários insistindo em continuar um modelo predatório, lucrativo a curto prazo.

Sobre essa incapacidade de planejar, foi citada, por exemplo, a falta de método:

“O que falta é método, falta transparência, falta objetividade em quem tem que fazer a aplicação das leis (de regulação) nos órgãos ambientais. Acho que este é o problema. O problema do entrave ambiental não é pela questão ambiental. O entrave ambiental, e estou falando de uma maneira geral, petróleo, energia em geral, é uma falta de coerência, falta de metodologia, falta de conhecimento específico. Este é o problema... os órgãos ambientais são extremamente limitados em termos de planejamento e aplicação das leis.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

Fala-se muito em zoneamento para a soja, para o boi. Instalou-se uma “histeria” em torno dos biocombustíveis, mas e as madeireiras? A pergunta é de um representante do setor do agronegócio. Elas agiram impunemente por mais de 10 anos, criando uma riqueza espúria, e agora o agronegócio é que está sendo demonizado.

O trecho selecionado abaixo dá uma idéia de como os empresários do agronegócio vêem, por exemplo, o que chamam de falta de coerência metodológica e falta de capacidade de gerenciamento:

“O empecilho é ausência de planejamento. Veja bem: na década de 1960, o Brasil teve que enfrentar um problema muito sério que foi a baixa qualidade da lavoura de café e no momento em que o café ainda representava sei lá, 80% ou 75% da pauta de exportações do Brasil.

Atacou-se o problema erradicando os cafezais improdutivos, não houve outro jeito. Por quê? Tinha que concentrar a produção nos cafezais que produziam café de boa qualidade. A teoria está certa. A implementação foi um desastre, porque substituíram os cafezais erradicados por pastagens.

Então, nas regiões como sul de Minas, o leste de Minas, regiões montanhosas, botar o gado para pisotear o morro já degradado. Fábrica de deserto! Ou seja, a idéia original era muito boa, a implementação foi desastrosa.

A única coisa que resolve essas disputas, esses impasses com relação ao agronegócio e o imperativo de não desmatar, é um bom projeto, com uma agenda de implementação bem feita (...) É o governo que tem que liderar essa coisa.

O plano de implementação, ninguém quer gastar tempo com ele. Plano de implementação é que é a coisa importante. Eu conheço alguns exemplos de projetos bem concebidos e magnificamente bem implementados: o plano de fruticultura no Vale do São Francisco...

Na área agropecuária, nós temos a ventura de termos um órgão como a Embrapa, um órgão científico, sério, um dos melhores que há no mundo, dos mais capacitados. Agora, enquanto ficar na mão dos políticos, Ibama, Incra, não sei o que, então, não vai a lugar nenhum!” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, C.S., 69, CONSULTOR)

Page 187: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 7

Para o agronegócio o problema está nos setores industrial e energético

Para os empresários do agronegócio ouvidos na pesquisa, as barreiras à adoção de um programa consistente de redução de emissões não estão no seu setor:

“As barreiras agrícolas são mais fáceis de remover. As maiores barreiras estão na área industrial e na área energética. É preciso um entendimento maior das fontes de energia do mundo. A questão do carvão precisa ser encarada com mais responsabilidade, a gente vê grandes empresas que operam nesse ramo de combustíveis falando como se existisse algum mérito, como se houvesse hipocrisia nesse mercado, mas o consumidor não é bobo.

Então, é preciso encarar essa questão com mais seriedade e com maior nível de investimento nas energias limpas, nas energias alternativas, nas energias fotovoltaicas, solar, eólica, o biodiesel... tem várias fontes. Pode ser o hidrogênio, sem dúvida alguma. A era do hidrocarboneto vai conviver de forma mais forte com as energias renováveis.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.C., 49, ADVOGADO)

Mas como os outros vêem o agronegócio?

Em contrapartida, alguns empresários de outros setores apontaram o agronegócio como uma potencial ameaça:

“[O agronegócio] tem importância tanto no bem se for pensar do lado da geração dos novos combustíveis renováveis, quanto para o mal na pecuária que tem o gado ou devastação, remoção da camada da Amazônia para plantio da soja, então pro bem ou pro mal o agronegócio está na frente. Se você pensar no biodiesel, no álcool é pro bem, se você for desflorestamento para entrada de agropecuária que também faz parte já do negócio naquela região é pro mal. Então o agronegócio para mim é o primeiro [dos setores que mais emitem]” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, J.C.M., 58, ECONOMISTA)

“A agricultura que também é a grande menina dos olhos do governo brasileiro, mas que devasta demais. Hoje é o grande responsável pelo desmatamento nas nossas florestas para colocar mais bois e ainda com a história de geração de energia que é uma boa conversa que está aí. Gerar energia de biodiesel, do álcool e tudo o em nome dessa coisa de geração de energia, eles têm realmente feito um grande estrago no meio ambiente e com emissões significativas para a atmosfera.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.V., 52, ENGENHEIRO).

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Em 30 entrevistas, foram mapeadas cerca de 10 propostas em torno das quais quase todos convergiram.

Algumas são de cunho genérico ou de esfera global, tais como “fazer uma campanha de conscientização mundial para reduzir e mudar padrões de consumo”, esforço que deveria incluir a ONU e as organizações globais. Também se mencionou a criação de uma “CPMF mundial”, como um grande fundo para salvar o planeta.

Concatenar ações, unir esforços, irradiar a idéia de sustentabilidade via educação ambiental e combater o discurso fragmentado é uma proposta presente em várias entrevistas:

“Primeiro fiscalização, é óbvio, é um incentivo para acabar com a predação. Em segundo, políticas de estímulo à energias alternativas. Não sei, energia, culturas renováveis, mais

Page 188: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 8

alternativas; exploração racional dos recursos naturais; regulamentações mais modernas; botar esse tema na programação curricular no PCN — Programa Curricular Nacional. Tornar nas escolas públicas essa discussão obrigatória, a conscientização da educação ambiental, os efeitos dela. Tem algumas ações, em diversos campos, que podem ser tomadas de uma maneira concatenada, aí seriam, em muito, potencializadas.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, L.G., 47, PUBLICITÁRIO)

Em termos mais específicos, eis as propostas mencionadas:

Ajustar tributação para biocombustíveis

“Nós, do setor do agronegócio, temos desincentivo, porque o regime tributário do governo brasileiro colocou como eixo do seu programa a produção de biodiesel no Nordeste brasileiro, vinculado à agricultura familiar que tem vantagens tributárias. Por outro lado, o biodiesel de soja, feito no Sudeste, no Centro-Oeste brasileiro tem uma penalização: tem mais tributo que a soja para outros usos. Então tem uma irracionalidade tributária que precisa ser corrigida.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, I.W., 54, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Fundo Nacional de Compensações

“O grande ponto é o seguinte, qualquer interferência no meio ambiente, tem dano ambiental, isto não tem por onde. Então, você tem que ter um bom processo de compensação, de mitigação. Nós, por exemplo, precisamos de energia elétrica do rio Madeira e não tem jeito, vamos fazer uma devastação lá. A hidroelétrica vai devastar a área. Então, você tem que compensar. O grande problema é que não sei se as compensações são justas, não sei se elas são visíveis, o problema é que todo mundo acha que não está sendo feita uma compensação.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, M.G.A., 53, ENGENHEIRO QUÍMICO)

Rediscutir o modelo rodoviarista brasileiro

“Tem que ter políticas claras: penalizar o que polui e beneficiar o que não polui. Transportes: você subsidiar transporte urbano, de massa e penalizar o automóvel, é imperativo. Mas o que você vê é o contrário. Veja o caso da Prefeitura do Rio de Janeiro, ela está fazendo um estacionamento subterrâneo no centro da cidade, isto é criminoso. É antítese de tudo que se está fazendo minimamente no mundo. É isto que a Prefeitura está fazendo no Rio, dizendo: “Venha de carro para a cidade”. Vai fazer em Ipanema um monte de estacionamento, já não se anda mais, polui, e ele está fazendo ao contrário.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

Avançar nos processos de certificação

“Eu acho que o mercado nacional e internacional pode exercer um papel disciplinador nessa questão, por exemplo, poderia haver reduções de tarifas de exportação, impostos de importação reduzidos para produtos que são ambientalmente corretos e que tem certificações de origem, atestadas por empresas com idoneidade, certificadoras internacionais, que atestem que são produtos clean, produtos dentro dos conceitos político e ambientalmente corretos.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.C., 49, ADVOGADO)

Tornar mais acessível o que é ambientalmente mais indicado

“O que funciona é o sinal econômico. O grande desafio é o de tornar mais acessível o que é ambientalmente mais indicado... Então, é o que eu estava falando antes, dessas fontes de

Page 189: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 8 9

energia renovável, aquela que eu acho que poderia ser usada mais rapidamente, com mais eficiência, com custos competitivos, é a biomassa de bagaço de cana...” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

Investir em novas tecnologias

“Seria muito importante apoiar, criar incentivos para pesquisa e desenvolvimento, fortalecer quem fica no campo de desenvolvimento de tecnologias... Quer dizer, hoje uma pessoa ou empresa que se dedique ao desenvolvimento de uma tecnologia nova, que ajude nessa área da sustentabilidade, ela tem relativamente poucos incentivos... Falta um programa nacional de tecnologias sustentáveis, não são oferecidos incentivos, e o Brasil fica no papel de se satisfazer em ser um produtor de commodities ambientais, mas a tecnologia?” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, R.G.N., 51, ENGENHEIRO)

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Governo deve liderar o processo

À indagação sobre quais agentes, atores, deveriam tomar à frente, ou seja, liderar o processo de planejar e implementar programas de redução de emissões e mitigações dos efeitos do agravamento das mudanças climáticas, o governo (Estado brasileiro) foi citado pela maioria dos entrevistados como o principal ator, como protagonista:

“Só a vontade governamental política séria consegue enfrentar isso, porque o cidadão comum não consente.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, C.S., 69, CONSULTOR)

“Bem público tem que ser tratado pelo governo junto com o setor privado e a sociedade civil, mas é o governo que tem que tomar a liderança.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.N., 29, RELAÇÕES INTERNACIONAIS)

É interessante notar que por governo, em geral, se entende a esfera federal. No entanto, alguns atores empresariais também se referiram à importância da ação por parte dos governos locais, isto é, das prefeituras. Segundo os nossos entrevistados, sem a sua colaboração “nada acontece”. Enquanto a prefeitura assume aqui um papel decisivo, estranhamente a esfera estadual está completamente ausente das considerações:

“As prefeituras, sobretudo as prefeituras. Eu entendo que o governo federal tem que ter uma atuação compartilhada, e tem que delegar às prefeituras esses programas e essas ações. As coisas nascem nas prefeituras, os lixões das prefeituras estão bastante fora do padrão, tem muito erro aí, muita gente se aproveitando de uma coisa que não pode ser, que é um absurdo.

[A implementação de] programas de eficiência energética nas prefeituras seria uma contribuição importante.

Eu acho que as prefeituras têm que ter uma forte auditoria, elas deveriam de ser punidas e só deveriam receber dinheiro do governo federal se fossem certificadas, se atendessem a certos requisitos.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.C., 49, ADVOGADO)

“Temos um foco muito grande na questão da reciclagem, fomos o primeiro banco a adotar o papel reciclado em larga escala e temos hoje uma coleta seletiva na organização em 92% das agências, com certificação dos processos, garantias, é o único programa de

Page 190: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 0

cunho nacional efetivamente funcionando, a duras penas, com muita, muita, muita dificuldade, porque há municípios que não têm interesse nenhum em fazer coleta seletiva. Dos 5564 seguramente 40% ou 45% dos municípios não querem ouvir falar em coleta seletiva...

Então, luta-se com muita dificuldade... os prefeitos não querem fazer parcerias, enfim temos 19 projetos que não andam melhor porque as prefeituras não têm interesse em colaborar. Nosso programa de reciclagem é focado no terceiro R, notadamente redução que é o R mais importante. O nosso programa papa-pilhas é um sucesso de marketing, todo mundo acha importante, mas as prefeituras não querem nem saber...acho que falta uma política de indução, na ponta.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, V.H.K., 58, ADVOGADO)

“A gente tem uma deficiência, por exemplo, nos municípios. Os municípios não têm o esgoto, eles não têm tratamento adequado nos rios... Eu diria que os municípios e as cidades precisam ter uma consciência mais evoluída. O segmento privado, como ele é muito patrulhado, inclusive pelo Ibama e pelos órgãos de gestão ambiental, eu acho que avançou muito. Era importante que os municípios, que os Estados e os municípios, também atuassem assim de forma mais pró-ativa...

A gente faz cultura irrigada, mas a irrigação não resolve todos os problemas. A gente tem que mostrar que a irrigação tem que ser ajudada pelas chuvas, pelo regime hídrico. E para isso é muito importante existir investimento de recuperação das matas ciliares dos rios e haver uma colaboração dos municípios, da sociedade como um todo...” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.C., 49, ADVOGADO)

A idéia central é a de que o governo conduza em parcerias, principalmente com o setor empresarial, o processo de mitigação. Os outros atores vão juntos.

“Não é governo que toma essa decisão, são as pessoas. E acho que os governos têm papéis importantes e incentivadores; os governos são o motor de arranque, o motor de partida, mas o motor que move o trator é o povo, é a gente.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, M.L., 49, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

“Eu acho que são os atores que estão emitindo e liderados pelo governo. Eu acho que como o assunto tem uma grande oportunidade para o Brasil, eu estou falando no Brasil especificamente, e ele tem a capacidade de moldar vários setores no Brasil. Eu acho que um grande fórum, uma grande discussão liderada pelo governo, com alguém com uma capacidade e competência altamente reconhecida podia fazer uma diferença, pode fazer uma diferença.

Mas aí ele vai ter que chamar todo mundo, não é? Vai ter que chamar a indústria, vai ter que chamar os cientistas, vai ter que chamar os ambientalistas, o pessoal da floresta, o pessoal do etanol. Vai ter que botar todo mundo na mesa e talvez entendendo o ciclo energético todo, achar um novo arranjo, um novo caminhar.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, M.B., 52, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

Em segundo lugar, os empresários

“O empresariado também [tem responsabilidades], você não pode fugir da tua responsabilidade, suas atribuições. Não adianta nada o governo criar regras se os caras [os empresários] não seguem a regra ou não atentam para essa necessidade.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, J.C.M., 58, ECONOMISTA)

Page 191: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 1

“Hoje não é mais uma questão restrita ao universo acadêmico ou ao ambiente governamental, mas o empresariado do mundo inteiro já tem uma mudança de postura muito grande, porque eles sabem que é uma questão de sobrevivência econômica também, já foram feitas várias avaliações dos impactos na economia mundial destas mudanças climáticas e todas as avaliações são bastante pessimistas em relação ao dano que isto pode causar na atividade econômica do planeta de uma maneira geral. (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

E, em terceiro, a sociedade

“Eu penso que a sociedade. Somos muitos infantis e irresponsáveis de pensarmos que a responsabilidade é só dos governos e das empresas. Eu acho que a responsabilidade maior é nossa de reagirmos, mobilizarmos e exigirmos políticas públicas que contemplem essa questão.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, F.M., 60, GEÓLOGO)

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

EUA duramente criticados

Poucos empresários declararam estar acompanhando a discussão no nível internacional além do que lêem nos jornais ou vêem no noticiário da televisão. Os empresários entrevistados que demonstraram um maior conhecimento criticaram, como outros setores o fizeram, a posição dos Estados Unidos (em não assinar o Protocolo de Kyoto) e reclamaram da falta de ações mais concretas:

“A grande mudança vai ocorrer quando os Estados Unidos começar a levar a sério. Enquanto os Estados Unidos, o maior poluidor do planeta, não tomar uma atitude concreta de decidir reduzir os gases de efeito estufa, eu acho muito complicado. A China, também, era tratada como emergente e hoje já polui tanto quanto os Estados Unidos. (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, J.P., 38, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

“...o que incomoda é a posição dos EUA, como um país tão relevante que é, trata tão mal a questão? (...) Ele é o maior poluidor. O fato dele não assinar o acordo de Kyoto, é um mal exemplo e não só não assina, como não dá uma alternativa. Como esse cara acha que isso não é importante? (EMPRESARIAL, ECONOMIA, M.G.A., 53, ENG. QUIMICO)

“Acho que não se evoluiu muito, infelizmente, mais uma vez a posição de alguns países como os EUA, atrapalhou bastante. Acho que para mim, a grande evolução foi a adesão da Austrália ( ao Protocolo de Kyoto), que tinha uma posição muito alinhada com os EUA e desvirtuou. Os EUA chegaram com um discurso um pouco diferente, mas de concreto não apresentaram nada e você considerando, vamos dizer, o peso que o mercado norte-americano tem nesta história, é claro que a gente não vai deixar de fazer só porque eles não fazem, mas, primeiro é um grande desmotivador e segundo, por mais que a gente faça tudo que a gente tem que fazer, se eles não fizerem a parte deles, o desastre vai acontecer de qualquer jeito. (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENG. ELÉTRICO E AMBIENTAL))

“Eu vejo isso como uma conversa muito política e de pouca ação. Eu acho que a grande massa mundial ainda ta falando nisso a nível de liderança mas praticando pouco, a começar pelos Estados Unidos. Ele participa e vêm e tal, conversa, vê os impactos, mas não age.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, M.L., 49, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

Page 192: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 2

Empresários estão se engajando no mundo inteiro

Para uma boa parte, as evidências visíveis de que o clima do planeta está mudando estimularam uma evolução no debate nos últimos cinco anos, e a questão não está sendo levada a sério somente por acadêmicos ou por governos; empresários no mundo inteiro estão se envolvendo cada vez mais nas discussões que a questão suscita:

“Hoje não é mais uma questão restrita ao universo acadêmico ou ao ambiente governamental, mas o empresariado do mundo inteiro já tem uma mudança de postura muito grande, porque eles sabem que é uma questão de sobrevivência econômica também. Já foram feitas várias avaliações dos impactos na economia mundial destas mudanças climáticas e todas as avaliações são bastante pessimistas em relação ao dano que isto pode causar na atividade econômica do planeta de uma maneira geral. (EMPRESARIAL, ENERGIA, H.P., 54, ENG. ELÉTRICO E AMBIENTAL)

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE "DESMATAMENTO EVITADO"

Maior parte dos entrevistados desconhece a proposta

A proposta de desmatamento evitado, apresentada pelo governo brasileiro na 13ª Conferência das Partes da Convenção do Clima, realizada em Bali, não é conhecida pela grande maioria dos entrevistados. Apenas um terço dos entrevistados tem opinião a respeito dessa proposta, considerando-a em geral uma boa iniciativa, embora polêmica:

“Sim, conheço. A gente fala muito em desmatamento evitado. Eu acredito muito mais no desmatamento evitado até do que na recuperação de áreas degradadas, principalmente no Brasil, porque nós ainda temos boas áreas conservadas e que estão caindo muito rapidamente. Então assegurar que essas áreas permaneçam intocadas e que esse carbono fique ali. (...) É muito mais objetivo do que recuperar áreas. (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, G.G., 38, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

“É uma proposta boa, mas ainda não tem a consistência que ela precisa ter, certo? Porque o desmatamento evitado é quanto que o proprietário vai receber por aquele hectare que ele (não) desmatou. Ele tem que receber algo que seja maior do que ele receberia se ele desmatasse e plantasse soja ou gado ali, ou criasse gado ali. Então isso tem que ser uma política forte, clara, bem definida.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, V.F., 51, GEÓLOGO)

“Eu acho que é muito interessante, mais é feio dizer 'me dá um dinheiro aí pra eu não desmatar', que isso é um pouco 'você paga para eu não desmatar' (...)” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.T., 58, SOCIOLOGA)

“Acho boa, uma proposta importante, acho que pode ser por aí, acho que pode ser eficaz. O problema é que os países querem permissão para poluir, eles preferem pagar pelo desmatamento e continuar poluindo lá fora.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, C.P.C., 31, ENG. ELETRICISTA E AMBIENTAL)

14. CONFERÊNCIA DE BALI

Resultado positivo

Page 193: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 3

Menos da metade dos entrevistados opinou sobre os resultados da 13ª Conferência das Partes da Convenção do Clima, realizada em Bali.

Dentre esses, prevaleceu a idéia de que os resultados foram positivos:

“Eu acho que do ponto de vista geral ela foi um avanço no sentido de no sentido de dizer para o mundo que nós temos que caminhar mais e melhor e mais rápido nessa direção, então o essencial é no ponto de vista da mobilização em torno da causa.” (EMPRESARIAL – AGRONEGÓCIO, I.W., 54 , ENG.AGRÔNOMO)

“Bali foi resultado muito positivo, houve um reconhecimento de que as responsabilidades são comuns, mas diferenciadas. Não foi imposto naquele momento metas para países em desenvolvimento, foi aceito que os países em desenvolvimento vão ter, no futuro, que aceitar metas...” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.M., 46,ENG. DE PRODUÇÃO)

Nem todos ficaram contentes

Dois entrevistados se queixam dos resultados da conferência, um dizendo que ela foi “confusa” e outro que ela não foi satisfatória para quem esperava ver resultados concretos; ela apenas sinalizou a continuação das “negociações”.

“Eu achei um pouco confuso o resultado da conferência. Esperava, sinceramente, talvez mais publicidade, mais transparência no que foi discutido, mas eu achei a coisa um pouco confusa.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, G.G., 38, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

“A convenção de Bali é nada se você for realmente realista. Em Bali as pessoas concluíram que vão concluir uma negociação, é isso. Ou seja, nos combinamos que nos vamos combinar foi exatamente isso que aconteceu...” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.T., 58, SOCIOLOGA)

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Essa discussão adquiriu, neste setor, uma complexidade relacionada não só à visão sobre as responsabilidades o Brasil na redução das emissões, mas também uma visão sobre o próprio país, sobre o seu desenvolvimento e o papel que ele deve assumir como ator continental e global. Nenhum entrevistado argumentou contra as responsabilidades do Brasil, mas dois enfatizaram a necessidade de evitar a emotividade nessa discussão:

“(o papel do Brasil é) evitar que a discussão seja emocional, manter a discussão em um ponto de vista técnico.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.S.H., 77, CAFEICULTOR)

“O Brasil tem uma responsabilidade muito grande na questão da Amazônia, que não pode ser misturado com passionalidade. Tem que ter um projeto que contemple a questão econômica, comercial. Temos sim uma grande responsabilidade em relação à Amazônia, mas não se pode culpar o agronegócio. Há muitas Amazônias e nelas cabem todas as atividades.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.R., 65, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

O protagonismo da Amazônia

Nas entrevistas com os empresários, o tópico da redução de emissões e da responsabilidade climática evocava imediatamente a questão da conservação da Amazônia. Isso indica que, para esse setor, os dois temas estão necessariamente relacionados.

Page 194: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 4

“Eu acho que o Brasil tem um compromisso muito grande em implantar políticas públicas que equacionem o problema do desmatamento, principalmente da Amazônia. Políticas públicas essas que precisam entender a dinâmica, claramente a dinâmica do desmatamento, como ela se dá, onde está aquele que promove o desmatamento, aquele que acende o fogo. E fazer com que esse, bem como o proprietário rural, tenha uma percepção de valor da biodiversidade que ele tem. E que sejam até remunerados por isso... Porque setenta e cinco por cento das emissões do Brasil derivam de queimadas. Então nós precisamos ter um foco muito forte nisso e entender que necessita haver remuneração do proprietário rural que preserva floresta e biodiversidade.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, V.F., 51, GEÓLOGO)

Todos, sem exceção, reconhecem a necessidade de evitar o desmatamento da Amazônia e se referem à maneira como os recursos naturais florestais estão sendo utilizados como um “modelo burro”, ineficiente:

“Políticas, eu acho que faltam políticas públicas bem definidas, tomar uma posição mais firme em relação à Amazônia. Não é ficar combatendo madeirinhas ilegais em alguns pontos, colocando isso no jornal nacional e aí o problema da Amazônia não é Tailândia ou um município ou outro. Você tem que ter um programa muito serio, um investimento pesado.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, J.P., 38, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

O Brasil deve assumir um papel de liderança

“O Brasil é o líder da América e tem que ter atitude. Que é difícil é, hoje em dia a gente até vive um bom momento, mas falta comando, o esquema político atual é muita conversa, compartilhar tudo, eu até acho bom. Mas uma hora alguém tem que falar que a responsabilidade é sua, a estrutura de responsabilidade tem que funcionar. Então, por exemplo, a Marina da Silva, ministra do Meio Ambiente, eu não sei se ela tem tanta autoridade hoje.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, M.G.A., 53, ENGENHEIRO QUÍMICO)

“Preocupa-me uma posição de mero espectador. Em minha opinião o Brasil deveria ter, em alguns sentidos já tem, uma posição mais ativa nesse âmbito, deveria assumir papel de líder.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.F., 56, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS)

O desenvolvimento sustentável da Amazônia é possível

“[os incentivos] têm que vir do orçamento público e uma parte pode vir do setor primário, quer dizer, não vejo razão histórica e econômica para internacionalização da Amazônia, que é um debate que se tem por aí, eu acho que se a gente tiver um orçamento público, uma organização pública adequada e se nós tivermos incentivos para a exploração sustentável desses recursos naturais, especialmente da Amazônia, pode ser da mata atlântica e de outras biomas brasileiros, nós estaríamos fazendo aí um casamento de interesses entre o capital e o meio ambiente, é preferível ter o legal que ter programas de incentivo que facilitem a exploração dos recursos farmacêuticos, alimentares, que tem nessas nossas florestas, do que assistir a pirataria.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, I.W., 54, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

“Então, se isso realmente não for controlado de uma forma política sustentada, se fala muito em sustentabilidade, mas não se formula nada sustentável em longo prazo. Quer dizer, podemos produzir mais alimentos, aumentar a produtividade agrícola sem avançar na floresta, sem avançar na Amazônia. É o grande desafio do país hoje, se não fizermos isso todo mundo vai sofrer conseqüências. (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.M., 46, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

Page 195: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 5

As responsabilidades não são só do Brasil

“A responsabilidade do Brasil é igual à de qualquer outro país, eu acho que é menos do que os países do Anexo 1, porque os países do Anexo 1 já destruíram tudo e agora querem que todo mundo trabalhe igual e não dá para ser assim. Eu acho que quem destruiu tudo tem um direito maior, porque como eu falei para você, não se consegue implantar nada sem causar alguma modificação ambiental, então você tem que causar alguma modificação ambiental.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, J.C.M., 58, ECONOMISTA)

“De alguma forma o Brasil tem responsabilidades e etc., mas eu acredito que em relação ao mundo, pelo fato de haver uma divisão histórica, cultural, econômica entre países mais desenvolvidos e países menos desenvolvidos, é muito importante que haja um equilíbrio no tratamento deste problema.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.N., 29, RELAÇÕES INTERNACIONAIS)

Falta política estratégica

“Eu acho que a gente não tem claramente uma política integrada dessa questão associada às conseqüências das mudanças climáticas.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, D.Z., 58, ECONOMISTA)

“Nosso horizonte é muito promissor para que a riqueza reine no país. Tudo isso depende de um conjunto grande de dificuldades ligadas à política estratégica que atualmente não existe, que incorpore uma política de renda para o campo, que não existe, que incorpore toda a logística e infra-estrutura que é um desastre, caótico no país” e, evidentemente, tem de ser considerado o problema ambiental nesse cenário (...) tem de ir buscando o bom senso e o equilíbrio... me perguntam se o desmatamento da Amazônia é por causa da soja. Não. O desmatamento se dá por causa das madeireiras. Depois da terra desocupada, vem o pasto e depois vem a soja... Ninguém vai derrubar árvores para plantar cana na Amazônia...e se fizer é errado porque é uma estupidez econômica e agronômica.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, R.R., 65, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

“Precisa ter uma política racional no avanço da fronteira agrícola, avançar numa política para estruturar a de produção de alimentos e reduzir, estabelecer metas efetivas de redução do desmatamento.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, F.M., 46, ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO)

“Cinqüenta por cento das emissões vem do desmatamento, então é tomarmos medidas para redução do desmatamento, porém temos que fazer análise de quanto a gente quer de desmatamento e acho que isso ninguém faz. A gente só quer reduzir, mas não se fala o quanto a gente ainda quer desmatar. O problema é que todo mundo fala para não desmatar mas todo mundo desmata, se você compra um sítio todo mundo desmata para criar sua vaquinha, ter área para correr com seu cavalo nesse caso quer lazer e no caso do produtor como é que ele vai fazer para sobreviver com a floresta em pé, ninguém quer pagar caro para ter uma cadeira de madeira sustentável, vai se comprar uma cadeira típica do produto chinês, por isso que a China polui porque todo mundo quer um produto barato e polui lá.” (EMPRESARIAL, USO DO SOLO, C.C., 31, ENGENHEIRO)

Page 196: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 6

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

O indivíduo pode fazer alguma coisa?

Para um pouco mais da metade dos entrevistados (16), os indivíduos podem, sim, contribuir com suas ações e iniciativas neste momento dramático em que o agravamento do fenômeno das mudanças climáticas é inequívoco e seus efeitos já se fazem sentir. Cinco dos entrevistados consideraram que não, pois as ações de mitigação que podem fazer diferença estão nas mãos de entes coletivos, como o governo e o empresariado, que deveriam trabalhar em parceria.

Alguns, ao discorrer sobre a importância do papel individual, destacaram o impacto de líderes como Al Gore. Para nossos entrevistados, são esses indivíduos – líderes em suas áreas de atuação – os que mais podem ter impacto, pois o cidadão comum ainda não tem informação suficiente para, por exemplo, redirecionar seu consumo de uma maneira informada. Muitas ações têm efeito simbólico, mas não existem ainda ações efetivas por parte dos indivíduos.

Descolada da figura do líder, a ação individual é vista sobretudo como uma “atitude” de consumo consciente.

A conscientização para essa atitude começa em casa, na família, para depois ecoar nas empresas e nos espaços coletivos:

“Eu já falei, acho que o governo é o resultado do coletivo, e não vice-versa. Cada indivíduo tem que mudar. (...) O governo pode acelerar algumas coisas, o próprio biodiesel o governo está com esse plano aí de formar uma indústria brasileira de biodiesel como fez com o álcool. Na época, ele subsidiava o álcool para gerar uma massa crítica de produtores. Agora, está fazendo isso com o biodiesel, então o governo pode estruturar melhor essas questões e ao fazer isso, alia uma opção ambiental a uma opção econômica, o que facilita para o consumidor...

Toda ação, antes de ser coletiva, partiu de indivíduos. Eu acredito que não existe uma ação, qualquer ação empresarial convincente e conveniente, se não houver uma ação pessoal... evolução pessoal começa em casa, na pessoa física, na família. Se não houver isso em casa, ele não fará na empresa. Essa experiência eu trago já de muito tempo.

Então, eu tenho uma preocupação muito grande das pessoas aqui levarem isso para casa, pro seio da família. Eu tenho filho de oito anos, que tem isso dentro dele hoje como tem a sua agenda, sua caneta, os seus desenhos, de dizer pras pessoas onde que deve colocar aquela garrafinha de pet, como aconteceu no outro dia no shopping, ele me dizer na cara que eu deixei papel na mesa e ele me disse ‘Tu és responsável pelo lixo que tu geras. Não vai levar esse lixo pro lugar certo?’, é isso. Começa por lá.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, F.M., 60, GEOFÍSICO)

A questão do consumo consciente também foi lembrada: estaria na esfera de cada cidadão-consumidor decidir sobre que carro utilizar, que tipo de programa individual de redução de energia implementar etc.

Mas, neste caso, seriam mais estruturantes e eficazes os programas casados, onde o poder público faz a sua parte e a população responde de maneira adequada:

“Uma política que podia casar o poder público com a resposta do cidadão seria o transporte, um gerador de emissões significativo... A gente estava falando também na própria empresa onde a gente trabalha, quando vai trabalhar, ninguém quer ir pro trabalho junto com ninguém. Não se usa transporte solidário, pois transporte público é

Page 197: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 7

muito ruim no Brasil, o transporte coletivo no Nordeste então é péssimo. E ainda tem o cara que passa fome, mas anda num carrão!

Não existe um transporte solidário, não tem transporte da empresa para levar os funcionários e tem isso nas nossas obras, se você pegar, tem cinco engenheiros trabalhando na mesma obra e morando na mesma casa. Mas todo mundo vai no seu carro, vai para obra e volta de tarde, cada um no seu carro. Todo mundo faz aquela passeata de carro, sai todo mundo na mesma hora, é uma coisa desenfreada mesmo. Isso podia mudar com uma política nacional de transporte.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.V., 52, ENGENHEIRO)

“Entendo a conservação de energia em dois paradigmas ou em duas perspectivas: a perspectiva da eficiência e a perspectiva da redução da intensidade energética. É uma coisa meio estranha, porque nós trabalhamos nessa orientação de que é mais importante para o país reduzir sua intensidade energética de forma global, produzir mais energia, onde eficiência energética é apenas um dos elementos, entre outros elementos, dos quais os mais importante seria a questão do hábito e atitude do consumidor, as escolhas do consumidor, tá certo?

A nossa visão é bastante ampla, no sentido de que não adianta abordarmos a questão da mudança climática só do ponto de vista da eficiência energética. Temos que atuar fortemente numa perspectiva econômica, induzindo novas atitudes, novos padrões de consumo e de comportamento do consumidor, do usuário final de energia.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, F.M., 60, GEOFÍSICO)

O que poderia fazer diferença, mas ainda é raro em nosso país, seria uma espécie de vigilância, por parte da população e da opinião pública, sinalizando para os governantes e empresários a necessidade de serem mais responsáveis. Mas ainda estamos longe disso.

Para o empresariado aqui amostrado, os cidadãos comuns são bombardeados por informações contraditórias da mídia, que atribui o mesmo peso a comer menos carne, reciclar vidros e reduzir o consumo de energia. Não há uma escala de prioridades que possa guiar o cidadão comum.

Todas as ações “ambientalmente corretas” têm um valor de “exemplo”, são educativas, para os nossos entrevistados. Entretanto, o fenômeno das mudanças climáticas está exigindo políticas governamentais mais concatenadas e estruturantes:

“Na minha visão, o papel indutor cabe primeiro ao governo federal, envolvendo os Ministérios das Minas e Energias, do Meio Ambiente, das Cidades, da Agricultura, os diversos órgãos estaduais, municipais. Depois, em segundo, o empresariado também, você não pode fugir da sua responsabilidade, suas atribuições. (...)

Por último, eu acho que é a população de uma maneira geral, então os três segmentos têm que trabalhar com o mesmo propósito... que cada um, em casa mesmo, você está escovando o dente, deixando a bica ligada, deixando a luz, eu to falando isso porque acontece na minha casa também, eu tento evitar mas não é tão fácil assim.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, J.C.M., 58, ECONOMISTA).

Page 198: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 8

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

Desmatamento, novamente

Nesta questão, de respostas múltiplas, os entrevistados apontaram como principais responsáveis pelas emissões a agricultura, responsabilizada pelo desmatamento (avanço da fronteira agrícola e queimadas), e a atividade industrial de um modo geral:

“Desmatamento, porque a grande contribuição está no desmatamento. É, eu combateria desmatamento, que tem que ser combatido com a formação de uma política agrícola mais consistente e estruturada. Não se pode deixar do jeito que está.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, F.M., 60, GEOFISICO)

“Há o grande problema é o uso do solo é o avanço da agricultura, porque o avanço da agricultura pode ter um efeito no desmatamento e isso é grave porque o desmatamento é o maior emissor brasileiro.” (EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.T., 58, SOCIOLOGA)

“Eu acho que a indústria como um todo desde a indústria de serraria e todo tipo de indústria, de cimento, de alumínio, siderúrgicas, todo o tipo de indústria. Todas são bem poluentes. Segundo, o transporte também. O transporte brasileiro que é uma coisa louca, quase totalmente rodoviário e polui bastante...” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO, F.R.V.B., 52, ENG. CIVIL)

“Eu cito as siderúrgicas, que necessitam desmatar para ter o carvão vegetal na sua redução de carbono. Esse é um problema gravíssimo. É preciso incentivar essas siderúrgicas para que elas tenham as suas próprias matas sustentáveis....” (EMPRESARIAL, ENERGIA, J.A.D., 58, ENG. PRODUÇÃO)

“A indústria da transformação, a siderurgia, a química, a petroquímica, chama-se indústria da transformação; a indústria de papel celulose e geração de energia mesmo.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, V.F., 51, GEÓLOGO)

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Desenvolver sem destruir é crença unânime

A totalidade dos entrevistados do setor empresarial acredita que é possível compatibilizar desenvolvimento com o enfrentamento das questões climáticas:

“O desenvolvimento sustentável passa necessariamente pelo desenvolvimento econômico ou ao contrário, o desenvolvimento econômico passa necessariamente pelo envolvimento sustentável, ou como quiser.” (EMPRESARIAL, ECONÔMICO, V.H.K., 58, ADVOGADO)

Mas, para que esse “casamento” ocorra, é preciso envolver o setor econômico. O argumento do empresário abaixo questiona a localização do tema no Ministério do Meio Ambiente, sugerindo que ele seja incorporado à agenda dos ministérios que realmente decidem sobre os processos de desenvolvimento econômico:

“Na realidade, mudança climática no Brasil está com o viés errado. Ela está lá no MMA, ela está na Secretaria de Mudança Climática, porque o pessoal está achando que isso é problema de meio ambiente. E isso não é problema só de meio ambiente, é uma conseqüência ambiental de um problema econômico. Então, eu acho que isso aí deveria estar numa área de ciência e tecnologia, está certo? Tendo a atuação das áreas de meio ambiente junto com a de desenvolvimento econômico, com as áreas de desenvolvimento

Page 199: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

1 9 9

social, em que você pense, por exemplo, em bolsa família voltado para a questão do uso adequado da terra, ou dos recursos naturais. Então você não faz isso sem ter uma área econômica envolvida, uma área de planejamento, pensar na área de logística sem ter uma área de transporte. Enfim, isso é algo que é integrador dos temas.” (EMPRESARIAL, ECONOMIA, V.F., 51, GEÓLOGO)

Deus é brasileiro

Dois entrevistados apontam as vantagens brasileiras, projetando um cenário favorável ao desenvolvimento com responsabilidade ambiental. Destacam a grande disponibilidade de terras e a oportunidade de investir em energias renováveis:

“Completamente, no caso brasileiro completamente. O Brasil é o país que tem mais possibilidade de fazer isso com facilidade, porque Deus é brasileiro. (...) No Brasil a gente parte de uma base de onde mais de uma metade de toda energia consumida no país é renovável e isso é um diamante, então na verdade a gente precisa só capitalizar isso, otimizar isso (...)”(EMPRESARIAL, AGRONEGÓCIO, L.T., 58, SOCIOLOGA)

“Eu acho que o Brasil é um dos poucos países no mundo que tem a oportunidade de ter um desenvolvimento sustentável. Com uma população pequena em relação ao seu território, totalmente controlada, uma agricultura que pode muito bem ser feita com as terras já disponíveis, sem necessidade de mais desmatamento, é um país com muitas chances.” (EMPRESARIAL, ENERGIA, J.A.D., 58, ENG. PRODUÇÃO)

“Eu acho que o Brasil está fazendo isso de uma maneira muito sólida e substanciada né? Esses projetos cada vez maiores, o desenvolvimento cada vez maior do álcool que o governo está dando prioridade de uma maneira geral e do biodiesel, da geração do biocombustível, de biodiesel, essa geração mais sustentável... O Brasil está crescendo de maneira sustentável, evitando o aumento da poluição, por exemplo...” (EMPRESARIAL, ENERGIA, J.C.G.M., 52, ENG. PRODUÇÃO)

Como vimos, nosso empresariado é otimista quanto à possibilidade de desenvolver o país sem destruir a natureza, considerando que o enfrentamento das mudanças climáticas pode abrir um leque de oportunidades de negócios:

“É possível, é possível, a partir do momento que todas essas externalidades começam a ter um custo e passam a ser um risco para o negócio, as empresas desenvolvem soluções. Tanto soluções tecnológicas quanto soluções de mudanças, reconfigurando seus negócios. Por outro lado, eu acho que evitar o desmatamento, ou evitar as emissões vai abrir um amplo campo de negócios também. Já tem um monte de gente trabalhando nisso.” (EMPRESARIAL, DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÕMICO, M.B., 52, ENG. DE PRODUÇÃO)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O setor empresarial aqui amostrado, com um número considerável de representantes de atividades relacionadas ao agronegócio e à energia, está ciente da sua responsabilidade perante a sociedade no que tange às mudanças climáticas.

Acreditam que o empresariado tem muito a contribuir, mas demonstram forte preocupação com a possibilidade de perda de lucro ou diminuição da competitividade dos seus negócios ou do Brasil, caso as políticas de redução não sejam bem planejadas e bem implementadas.

Page 200: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 0

No limite, reconhecem que o “desenvolvimento sustentável”, conceito ao qual se remetem, insistindo na “sustentabilidade econômica” das medidas, só será alcançado se houver uma mudança gradual no paradigma de produção e consumo.

Esse problema (mudança de paradigma) é visto como um problema global, não só do Brasil. O último relatório do IPCC (2007) previu um horizonte menor de tempo para que os países formulem políticas mais eficientes de combate às mudanças climáticas.

Eles sabem que essas políticas devem afetar o setor produtivo. Estão, até certo ponto, ansiosos para que as políticas sejam definidas “o quanto antes”, pois consideram que haverá um custo envolvido na transição do uso de combustíveis fósseis para outros tipos de energia.

Desse cenário, de restrições ao uso dos combustíveis fósseis e de taxação de emissões, emerge a necessidade de investir em novas tecnologias e ampliar a oferta de energia limpa. Em outras palavras, para o empresariado, falar de mudanças climáticas hoje é discutir a matriz energética brasileira e o modelo de transição.

Para os empresários, falta liderança, tanto interna (do Brasil) quanto externa, para que as medidas sejam mais rápidas e efetivas. A queixa do empresariado é a de que não há, ainda, uma política nacional do clima; faltam, portanto, diretrizes que possam melhor orientar o setor sobre os programas e ações prioritários.

Page 201: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 1

PERFIL DO SETOR

Os entrevistados deste setor ocupam cargos de alto escalão nas empresas às quais pertencem. Mais de um terço dos entrevistados (11) desse setor ocupam cargos de direção. Outros 8 são presidentes, e 7 gerentes. A tabela abaixo discrimina os cargos de todos os empresários da amostra:

Cargo Cargo Freq.

Diretor 11

Presidente 8

Gerente 7

Conselheiro 2

Chefe de divisão 1

Consultor 1

Total 30

A amostra do setor empresarial, como nos demais setores, teve uma altíssima concentração do sexo masculino (28).

Sexo M F Total

28 2 30

Os entrevistados na faixa etária entre 50 e 59 anos representam mais de metade da amostra. Apenas um entrevistado estava na faixa dos 20 e outro, na faixa dos 70.

Idade 20-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70 ou + Total

1 3 5 16 4 1 30

Mais de dois terços da amostra são naturais da região Sudeste: 10 de São Paulo, 8 do Rio de Janeiro, 3 de Minas Gerais e 1 do Espírito Santo. A segunda grande região mais representada é a Nordeste, com 4 entrevistados, seguida da Sul, com 4 entrevistados. Um dos entrevistados desse setor é estrangeiro.

Naturalidade SP RJ MG PE PR PB ES RS EXT Total

10 8 3 3 2 1 1 1 1 30

No que tange à escolaridade dos entrevistados, apenas dois não concluíram o ensino médio. Quase dois terços têm nível superior completo, 4 têm algum tipo de pós-graduação lato sensu, 3 têm mestrados, 2 são doutores e um é pós-doutor.

Escolaridade Ensino Médio Superior Pós Mestrado Doutorado Pós-doutorado TOTAL

2 18 4 3 2 1 30

Os entrevistados deste setor são formados em profissões diversas. A profissão mais representada é engenharia, com 13 entrevistados. A segunda profissão mais recorrente foi administração, com 4 entrevistados. O restante da amostra é pulverizado em outras profissões, como mostra a tabela abaixo:

Page 202: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 2

Formação Formação Freq.

Engenheiro 13

Administrador 4

Economista 2

Advogado 2

Consultor 1

Assessor 1

Relações públicas 1

Geofísico 1

Químico industrial 1

Sociólogo 1

Publicitário 1

Cafeicultor 1

Geólogo 1

Total 30

Page 203: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 3

CIENTISTAS

RESUMO

Uma série de informações coletadas ao longo das entrevistas com cientistas nos permite formar uma visão bastante abrangente de como o setor científico está atuando no país: suas conquistas, limitações e perspectivas em relação à problemática das mudanças climáticas.

Diferentemente dos demais, esse setor lida com questões e temas que visam aumentar o conhecimento do problema no país, através do desenvolvimento de pesquisas e estudos nas diversas especialidades e disciplinas a ele relacionadas. Muitos fazem parte de comissões e centros especialmente dedicados à questão climática, como os fóruns nacional e estaduais do clima.

Para esse tipo de entrevistado, o fenômeno das mudanças climáticas não é somente uma matéria de opinião, mas objeto de suas pesquisas e estudos, seu dilema intelectual ou esforço cotidiano. Através de procedimentos próprios, investigam as causas e os efeitos do fenômeno, compartilham seus estudos e angústias com seus pares dentro e fora do país e, através da publicação de relatórios e artigos, tornam o assunto mais conhecido no mundo leigo, não especializado, da opinião pública.

Cabe aos cientistas apontar os caminhos mais prováveis e viáveis de como lidar com o fenômeno das mudanças climáticas.

Eles são, em certa medida, o nosso “oráculo”: é do mundo da ciência que a maioria de nós considera que virão as “respostas” aos desafios do nosso tempo.

Os cientistas entrevistados demonstraram confiar plenamente nos prognósticos e resultados das ciências a que se dedicam. Em relação ao tema das mudanças climáticas, o cidadão e o cientista tornam-se um só em termos das opiniões que manifestam.

Todos, sem exceção, acreditam que o fenômeno existe, é grave e que serão dramáticas as suas conseqüências para a humanidade.

Ele pode, conforme disseram, ser revertido: a solução passa necessariamente por um esforço global, por atitudes firmes e cooperativas nos níveis multinacional, multisetorial e multidisciplinar.

Segundo os entrevistados, o Brasil tem um setor científico bem preparado e equipado. O que falta é uma política nacional do clima que possa embasar um bom programa científico e tecnológico. A disposição para formular esse projeto existe, “mas ainda não chegamos lá”.

Na opinião dos entrevistados, falta liderança, sobretudo por parte do governo, que deveria estar se ocupando de políticas indutoras e sinalizando para os demais atores, empresas e sociedade civil, que todos devem fazer a sua parte.

Consideram, ainda, que o Brasil tem por responsabilidade conter o desmatamento e reduzir as emissões.

A Amazônia é problema e solução. Embora não reconheçam uma ação eficaz, uma “ação de governo”, para deter o desmatamento, é da Amazônia que virá o desenvolvimento sustentável, pois é lá que existem recursos abundantes para promover esse processo. Toda a questão reside em convencer a sociedade – através de ações concretas e de sinais econômicos vigorosos – de que a floresta vale mais em pé.

Page 204: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 4

Nossa matriz energética pode ser salva se avançarmos em regulações, se isso não ocorrer, dizem os cientistas, a tendência para sujar a matriz já existe e deve se expandir nos próximos anos. Estaremos, então, na “contramão da história”.

Para o setor, os principais entraves ou barreiras para combater efetivamente o fenômeno e chegar à sua reversão não estão nos limites da ciência, pois estes poderão ser expandidos rapidamente com investimentos em pesquisas e tecnologias.

Os principais entraves estão no próprio modelo de vida, comportamento e consumo, que é predatório e resistente a mudanças, pois “ninguém está disposto a se sacrificar e reduzir o conforto que a sociedade do consumo proporciona”.

Os cientistas também identificam que os países desenvolvidos têm dificuldades de assumir metas rigorosas por razões econômicas: os interesses econômicos estão majoritariamente ancorados na base energética fóssil e os custos da transição são altos.

Falta ainda uma instituição ou um modelo sistêmico de ação global, de cooperação, que tire os países de seus marcos e interesses individuais e os coloque para cooperar efetivamente. Um dos entrevistados chegou a mencionar que falta “um plano Marshall” para a questão das mudanças climáticas.

Para eles, os limites de uma sociedade e de uma economia baseadas em combustíveis fósseis estão dados. Ademais, o problema não é somente a esgotabilidade desse tipo de recursos, o que já era sabido, mas a ecologia do planeta. Ignorar esse fato é caminhar, rápida ou vagarosamente, para o desastre. As iniciativas para a conversão do modelo precisam ser tomadas agora: a economia de baixo carbono precisa florescer, afirmam.

Nesse novo cenário, diz um cientista que já ocupou a pasta de ministro por três vezes, “se o Brasil detiver a destruição da Amazônia, mantiver sua matriz energética limpa e produzir biomassa em bases sustentáveis, aí então o futuro do país será brilhante”.

Page 205: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 5

ANÁLISE DETALHADA

A certeza científica

Sabemos que durante muitos anos várias correntes, dentro do próprio mundo científico, contribuíram para a controvérsia sobre se o clima estava “esquentando” ou “esfriando”, se os aumentos de temperatura observados nas últimas décadas eram devidos ao aquecimento global, por uma simples questão de “variabilidade climática”, ou como causa direta das atividades humanas que jogam na atmosfera todos os dias toneladas dos gases do “efeito estufa”: dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O), perfluorcarbonetos (PFCs) e vapor d’água.

Em 2008, ano da nossa sondagem, esta é uma questão aparentemente superada para a maioria dos nossos entrevistados. Estamos na era da certeza científica sobre o agravamento do fenômeno das mudanças climáticas, e da certeza de que as atividades humanas têm um importante papel nesse processo, se não o principal.

A questão da dúvida, portanto, não está presente entre os amostrados como falta de evidências. Se alguma incerteza há, ela se dá em outro nível, relacionada aos “modelos” utilizados para medir e interpretar os dados, e sobre a possibilidade ou não de reversão do processo.

As declarações abaixo demonstram, de um lado, que o IPPC cumpriu o seu papel gerador de consenso e, de outro, que a questão agora gira em torno das possibilidades de mitigação e reversão:

“Começaram a surgir uma série de trabalhos e nós ficamos absolutamente convencidos de que os modelos do IPCC são modelos seríssimos e estão nos alertando para coisa importantíssima que devem ser levadas em conta levadas daqui para frente.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“O IPCC e outros órgãos reconheceram que o clima realmente está mudando, a uma velocidade inicialmente devagar mas agora, ao que parece, devido às últimas medições e ao aperfeiçoamento dos modelos, parece que essa mudança está sendo bastante rápida...

O medo da comunidade cientifica e modeladoras de movimentos atmosféricos, é que a gente chegue ao ponto de não retorno, quer dizer depois de ultrapassada certa curva, não tem mais o que fazer, não interessa mais, vai para um outro ponto de equilíbrio; o clima vai ser definitivamente diferente daquele clima que nós conhecíamos até agora.

Então isso aqui pode ser alguns graus de temperatura a mais, ou distribuição de chuvas diferente pelo mundo e também acontecimento de fortes ventos como tempestades tropicais, ou então chuvas fortes, frios fortes, nevascas fortes, coisas deste tipo, eventos extremos.

Então, antes de chegar nesse ponto de não retorno, temos que fazer alguma coisa...

O mesmo cientista chama atenção para o fato de que o mundo científico tem seus limites; a partir do consenso, a sociedade precisa se mover na direção que deseja:

Isso é um desafio no mundo inteiro, não tão somente da comunidade cientifica, porque a comunidade cientifica só indica possibilidades. A partir daí, naturalmente, são os políticos, os engenheiros, outros profissionais, economistas, enfim, todo mundo tem que trabalhar em cima da possibilidade para não chegarmos no ponto do não retorno. (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, P.S., 65, METEOROLOGISTA)

Page 206: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 6

A ciência precisa de liberdade

Mas alguns cientistas manifestam desconforto com o fato de que a mídia e a publicidade induzem à percepção de que a certeza científica é isenta de controvérsias. Para os cientistas, a objetividade da ciência é mal compreendida e muitas vezes confundida com uma verdade absoluta que deverá levar a resultados absolutamente certos. Não é assim:

“É importante que as pessoas saibam que a ciência não é tão objetiva, que ela também induz a erros. Muitas vezes os resultados esperados não se concretizam, então, eu acho que a gente deveria continuar a pesquisa, mas essa publicidade com relação a mudanças climáticas que é feita, para mim é bastante negativa, eu não gosto do jeito que a coisa é vendida. Tem mais, do ponto de vista da ciência, é bom que a ciência tenha dicotomias. Tem uns que apóiam um lado e outros apóiam outro; a ciência perde quando você não pode fazer trafegar livremente as idéias, de certa forma as idéias estão sendo patrulhadas. Alguns que são contra, são discriminados.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, A.M.D.A.Jr., 52, METEOROLOGISTA)

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

Preocupação com a mudança do clima é antiga: longa história

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez? Antes da

década de 80 Na década de 80 Na década de 90 De 2000

para cá Não citou ano TOTAL

6 10 8 2 4 30

Um renomado cientista explica que a preocupação com o fenômeno das mudanças climáticas tem uma longa história, quando no século XIX já havia sido estabelecida uma relação entre o esquentamento do planeta e os gases emitidos pela queima de carvão, principal fonte de energia da época:

“Primeiro, foi em 1896: o mesmo químico sueco que descobriu o PH também calculou quanto devia estar esquentando o planeta. Não tinha computador nem nada, obviamente, então era um cálculo muito simples, de quanto gás carbônico estava sendo emitido com toda a queima de carvão na época, usado como principal fonte de energia, e quanto isso deve estar aumentando a temperatura do planeta... A essência do calculo estava certa, a propriedade desse gás de reter o calor e não deixar escapar para o espaço, é mais ou menos a mesma coisa que a gente entende hoje.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, P.M.F., 60, ECÓLOGO)

Anos 80 e 90

O assunto se torna sistêmico na agenda dos cientistas entre os anos 80 e 90.

Ainda assim, o tema das mudanças climáticas foi sendo construído em seus elementos mais contemporâneos depois de um período em que os cientistas basicamente se dividiam em correntes/estudos em torno de uma série de questões associadas: efeito estufa (estabelecimento do “core” de gases mais relevantes; depleção da camada de ozônio pelos CFCs (clorofluorcarbonetos); variabilidade climática, que basicamente estuda a história natural do clima no planeta Terra, com suas evoluções e fases de resfriamento e esquentamento; e, por fim, “mudanças climáticas”, associando o “efeito estufa” à mudança drástica do clima:

Page 207: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 7

“Vinte e cinco anos, trinta anos, já estava sendo falada e também muitas pessoas confundiam entre as duas frases, variabilidade climáticas e mudanças climáticas. Na prática, variabilidade climática é verificar a variação da quantidade de chuva; a de um ano não é igual à quantidade de chuva do outro ano e depôs, no terceiro ano é um pouco diferente; então quer dizer nunca é igual e se fosse igual não precisava de meteorologistas; o papel de quem estuda a variabilidade é verificar se a série histórica indica uma tendência fora da curva... então, com esta variabilidade que existe, os cientistas pensaram inicialmente que fosse alguma oscilação natural, cíclica, que o clima voltaria para a sua situação normal depois de passado algum tempo.

O homem já estudou, já sabe das eras glaciais, das eras glaciais pequenas e grandes, então ele pensava: isso é uma oscilação e depois passa, mas de repente o que diferencia agora o acontecimento dos últimos vinte, trinta a quarenta anos para aquelas eras glaciais é a quantidade de gás carbônico e outros gases que são jogados na atmosfera.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, P.S., 65, METEOROLOGISTA)

O início da década de 80 parece ter sido decisivo para os cientistas amostrados. Antes desse período, o problema parecia estar confinado a algumas especialidades científicas:

“Foi na década de oitenta, mais precisamente em 1983 ou 84. Mudança climática tinha muito a ver com a variabilidade natural do clima, inclusive em 1982, 1983, nós passamos por um “El Niño” muito forte no Brasil; naquela época nós tivemos grandes problemas de inundações em Tubarão, em Santa Catarina. Mas, nessa época, eu já tinha lido alguns textos que falavam dos problemas que o aumento da concentração de gases do efeito estufa poderia trazer para o clima ou já estariam trazendo, só que nós não dávamos tanta importância, não enxergávamos o tamanho do problema.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, A.O.M., 47, FÍSICO)

“Durante muito tempo, mudanças climáticas não estava no nosso vocabulário. Tratava-se somente de alguns aspectos das mudanças climáticas, mas não havia sido recomendado um foco... até o momento em que a ficha caiu: não vai dar para imaginar ou planejar uma agricultura daqui a 40 ou 50 anos, ou uma produção animal para uma sustentabilidade alimentar, sem nos prepararmos para questões sobre as mudanças climáticas. Obviamente que isso é um tema amplo, que vai de acordo com a coletividade, e que não é trivial. Por muito tempo muita gente duvidou achando que não estavam ocorrendo as mudanças, porque alguns modelos indicavam e outros não.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, J.G.E., 51, AGRÔNOMO)

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Alto nível de conhecimento

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é: Bastante abrangente

Bom, mas incompleto

Está explorando e aprendendo mais

TOTAL

10 12 8 30

É consenso entre os entrevistados que o assunto é fascinante e envolvente, pois em última análise se trata do destino das atuais civilizações no planeta.

Page 208: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 8

Embora dez cientistas tenham declarado que o seu conhecimento atual é “bastante abrangente”, a maioria absoluta, dois terços da amostra, disse ter um bom conhecimento, mas estar em processo de “explorar mais”. Mas aqui é preciso realmente relativizar as respostas, uma vez que é próprio da atividade científica estar sempre avançando em seus conhecimentos.

Tema integra atividades do dia-a-dia dos entrevistados

“Acho que é um conhecimento abrangente. Tema que está na minha leitura diária, mas é um tema em que você está sempre descobrindo nuances.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“Bastante abrangente. Eu acho que me situo na cauda superior da distribuição. Sou uma pessoa que tem acompanhado o assunto já, digamos, há uns 18 anos...” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, E.R., 60, ECONOMISTA)

Sempre se pode aprender mais

“Bom, mas incompleto. Eu preciso estudar mais, eu nunca assumo a posição de que sei tudo. A cada dia que passa eu aprendo mais ainda, está faltando muita coisa.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“Eu diria que é bastante abrangente, mas eu ficaria entre o um e o dois, porque sempre acho que tem alguma coisa para conhecer, sempre acho que está incompleto. Você precisa ir atrás, entender que a coisa esta acontecendo.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, C.B., 55, ENG. ELÉTRICO)

“É bom, mas tem lacunas que certamente eu precisaria preencher.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

3. GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Cientistas são altamente motivados pelo tema

Como se sente em relação ao tema: Altamente motivado

Interessado em outros temas mais importantes no momento

TOTAL

26 4 30

O mundo científico, segundo eles próprios, é cada vez mais especializado: “não dá para um indivíduo ser apenas um opinador”. Quando declaram uma opinião, ela é normalmente embasada em alguma evidência encontrada em seus próprios estudos ou de pares com alta credibilidade.

Por isso, quanto à motivação, foi bastante surpreendente que quase a totalidade, 26 de 30, tenha se declarado altamente motivada a aprender mais, enquanto 4 declararam estar ocupados com outras problemáticas.

“Altamente motivada, hoje eu vejo que nos próximos dez anos não vou trabalhar em outra coisa.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“Eu fico na primeira, altamente motivado. Eu tenho interesse. Eu diria que nos últimos anos eu aprendi muito sobre esse tema e ele realmente é fascinante e muito importante, eu

Page 209: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 0 9

diria vital para nossa própria sobrevivência agora. Portanto, tenho sempre interesse em aprender mais.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

Mesmo coadjuvante, o tema está sempre presente na agenda científica

“Eu diria interessado. Tenho outros temas importantes, mas não outros temas mais importantes, e sim tão importantes quanto.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, B.B.Jr., 50, ENG. CIVIL)

“Interessado, mas tenho outros temas mais importantes no momento, e que dão conseqüência inclusive a ele.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, F.L., 69, ADVOGADO)

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Mudança da matriz energética e redução da pobreza

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos? Mudanças urgentes na matriz

energética mundial com redução de emissão de CO2.

Diminuir as desigualdades sociais (distribuição de renda, diferenças

raciais e culturais)

Diminuir o consumo de bens industrializados

13 8 6

Computadas todas as alternativas citadas espontaneamente pela totalidade dos entrevistados, verificou-se que há quase uma equivalência entre os desafios propostos pelas questões climática e social, o que é bastante surpreendente nesse estrato, onde costumam prevalecer as visões científicas e técnicas dos problemas.

Associando todos os que responderam “diminuir as emissões”, “mudar a matriz energética” e “conservar as florestas”, temos mais da metade da amostra; o restante mencionou problemas de ordem social ou cultural: diminuir as desigualdades, redistribuir renda, acabar com as diferenças e reduzir o consumo.

Se avançarmos no raciocínio de que diminuir o consumo, significa, ao fim e ao cabo, reduzir o consumo energético, podemos concluir que as questões que estão na pauta climática foram as mais apontadas.

Agir diferente, mudar o modelo

Para os cientistas ouvidos, a questão é, antes de tudo, de entendimento sobre a questão planetária, de saber o que está em jogo, se destruir nossas condições de vida ou construir uma nova alternativa.

“O maior desafio para a humanidade é convencer todos os governos, convencer todos os setores da sociedade, para que eles adotem maneiras diferentes para não prejudicar ainda mais o nosso clima da Terra...

Eu acho que, se nós somos a espécie mais inteligente desta biosfera, então não podemos estragá-la de repente. Toda essa biosfera que levou talvez milhões, talvez bilhões de anos para evoluir e chegar a este ponto, agora para estragar é muito fácil, não precisa de séculos, não precisa de milênios. Para chegar neste ponto de evolução foram precisos milhões e milhões de anos, mas para chegar numa destruição é rápido. Essa é a diferença realmente entre construção e destruição.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, P.S., 65, METEOROLOGISTA)

Page 210: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 0

A necessidade de mudar o modelo de vida que adotamos, altamente intensivo em energia baseada nos combustíveis fósseis, é imperativa. O desafio, portanto, é mudar os valores e o modelo de desenvolvimento socioeconômico vigente, baseado em alto consumo de bens, alimentos e energia:

“Temos que mudar o padrão de vida. Ou mudamos o nosso modelo de vida, ou nós estamos condenados. Qual é aspiração do mundo subdesenvolvido? Ser igual ao mundo desenvolvido. O Brasil é mestre nisso. Ah, o primeiro mundo! Vai lá ver o primeiro mundo. O modelo do primeiro mundo é um modelo de conforto e de gasto de energia negativo...

Você tem quatrocentos milhões de pessoas que vivem no primeiro mundo -- Europa e Estados Unidos -- que emitem CO2 demais, que emitem um desequilíbrio total em alimentação, comem muito mais do que precisam... Não tem energia no mundo que suporte isso, não tem água no mundo que suporte isso. Nós temos que mudar o nosso modelo, o modelo que o homem adotou depois do inicio do século XIX é um modelo que foi muito bom nos primeiros cinqüenta anos, mas hoje ele precisa ser repensado. Nós não podemos continuar vivendo desse jeito, não dá. O grande desafio é mudar os nossos valores. Isso não é um discurso ambientalista não, é discurso de sobrevivência. Nós temos que mudar os nossos valores.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“O problema das mudanças climáticas é decorrente, na minha visão, da natureza que caracteriza a produção humana nos últimos dois séculos, de um produtivismo, uma ênfase exacerbada na produção de bens e serviços com enormes custos ambientais. E veja que a questão ambiental só começou a ganhar força nos últimos anos. Fala-se muito em como lidar com as conseqüências, mas não se tem pensado como mudar o modelo com a devida urgência que a questão climática está impondo.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, C.B., 55, ENG. ELÉTRICO)

A idéia de que não é possível estender a toda a humanidade o atual padrão de consumo que vigora nos países desenvolvidos é largamente citada e parece ser um consenso indiscutível. O mesmo se dá com relação à necessidade urgente de mudar a matriz energética:

“Existem sim vários programas de substituição de matriz energética ou de diversificação da matriz energética, e estão em andamento e em diferentes países. Até países que atualmente são considerados grandes poluidores, como a China, estão fazendo programas dessa natureza. A China está desenvolvendo novos painéis solares, está desenvolvendo uma série de outras tecnologias que a médio prazo têm o potencial de fazer diminuir as emissões por queima de combustíveis fósseis. (...)

Outros países, na Europa, por exemplo, no Reino Unido, na Alemanha, principalmente esses, Holanda, estão substituindo ativamente a sua matriz energética, estão partindo mesmo para outras alternativas – biomassa, eólica, uma série de alternativas – para mexer na matriz energética. O grande problema é a queima de combustíveis fósseis, que está ligada à matriz energética, e há vários países, sim, atuando, fazendo programas quanto a essa parte de mitigação.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

A questão climática antecipa disputas políticas de grande monta

Além de constituir, por si só, um desafio “nunca antes enfrentado pela humanidade”, a questão climática engloba outras questões complexas, que estão na esfera humana, tais como as maneiras de tomar decisões e implementar mudanças. Os cientistas ouvidos apontam a necessidade de cooperar, mas acrescentam que não temos ainda um modelo bem sucedido de cooperação, e nos alertam para

Page 211: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 1

o possível acirramento em torno da posse e controle dos recursos, principalmente das fontes de energia fósseis, que são ainda “o motor da nossa civilização”:

“Ele [problema das mudanças climáticas] exige um grau de cooperação entre países e setores que a gente nunca experimentou em nossa história...” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“(...) se esse modelo de civilização americana for amplamente adotado, o que vai acontecer é que haverá uma disputa enorme por acesso aos combustíveis fósseis, que são o motor do tipo de civilização que nós temos. Além de provocar problemas ambientais muito sérios, está dado um impasse: não há simplesmente combustíveis fósseis em quantidade suficiente para atender esse tipo de demanda, então vai ser preciso procurar alternativas, e é na procura dessas alternativas que eu trabalho no momento.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

Conservar água e florestas também é desafio mundial

Além das fartas menções ao problema energético, os cientistas também mencionaram, como desafio mundial, a conservação da água e das florestas; não somente as brasileiras, mas também as asiáticas:

“O Brasil é um pais chave, porque tem grande emissão com o desmatamento. E a floresta, a maior parte da floresta, ainda está lá em pé. Uma parte é derrubada todo ano, mas o grosso está lá... É diferente dos outros paises tropicais. A Indonésia, por exemplo, tem um desmatamento igual ou maior que o Brasil, só que a floresta está acabando, quase já acabou.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, P.M.F., 60, ECÓLOGO)

Nenhum recurso é inesgotável

Mas, pelo caráter incisivo das afirmações, percebe-se que a questão chave não é somente como a humanidade lidará com as conseqüências do modelo de produção e consumo que nos levou a acelerar o problema das mudanças climáticas. Uma questão maior, de fundo, é como a humanidade lidará com o fato de que não existe nenhum recurso inesgotável, nem mesmo o ar ou a água, como acreditávamos:

“Eu tenho 55 anos, a minha geração estudou no livro chamado O mundo em que vivemos, que era um supra-sumo da geografia, e dizia: ‘água, uma fonte inesgotável’. E a primeira gravura que tinha no livro era o ciclo da água, dizendo que ela era renovada e purificada pela chuva. Então, ela jamais acabaria. O grande desafio para mim não é lidar com as conseqüências do nosso padrão de produção e consumo. O grande desafio é como a humanidade vai enxergar daqui para frente que não há uma inesgotabilidade garantida de nenhum recurso, e que somos todos, sem exceção embora em diferentes graus, poluidores.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, L.B., 53, MÉDICO)

Problemas sociais preocupam

Quase um terço dos nossos cientistas manifestaram grande preocupação com os problemas sociais e apontaram-nos como o grande desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos:

“O grande desafio é o lado social humano e, em minha opinião, por mais que a gente possa degradar o meio ambiente, se a gente tem um entendimento social, a gente consegue contornar todos os outros aspectos. (...) Então, eu não tenho que pensar no que é bom para mim. Eu tenho que pensar no que é bom para a comunidade e trabalhar dessa maneira... Então, nesses próximos anos, a gente tem que trabalhar muito é no lado social

Page 212: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 2

humano, de respeito ao próximo. O resto é conseqüência.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, B.B.Jr., 50, ENG. CIVIL)

Por questão social, entendem uma melhor distribuição de renda, a redução das desigualdades sociais e a diminuição da discriminação social, religiosa e racial:

“Eu acho que [o desfio mundial] é o aumento da pobreza, da desigualdade, da intolerância racial étnica e com certeza o agravamento da crise ambiental... (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Reduzir desigualdades e garantir abastecimento de água

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Melhor uso da água e dos recursos naturais 10

Diminuir as desigualdades sociais 10

Diminuir, controlar ou extinguir o desatamento na Amazônia; recuperar áreas 9

Diminuir emissão de gases / combate ao aquecimento global 4

Formação de mestres e doutores 4

Saneamento básico 2

Melhorar a educação formal e ambiental 2

Perguntados sobre o principal desafio do Brasil, e depois sobre o principal desafio ambiental do país nos próximos 20 anos, os cientistas mencionaram, sem titubear, a questão social e os recursos hídricos, seguidos da necessidade de um melhor uso dos recursos naturais. Em seguida veio a Amazônia, com citações que contemplam diferentes abordagens. Também foi mencionado por quatro cientistas que o principal desafio do país é diminuir as emissões. Somente dois cientistas mencionaram que fornecer saneamento é o principal desafio.

Redução das desigualdades

“(...) nós temos um problema sério de distribuição de renda, um problema sério de educação. Enquanto esses problemas não forem resolvidos, nós não vamos conseguir colocar nas cabeças das populações pobres, menos favorecidas, que precisam mudar de vida. Em uma escala menor, eles querem ser iguais aos ricos. Os ricos estão fazendo besteira, eles têm que mudar o padrão.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“A maneira mais fácil das pessoas pobres acumularem bens é ter filhos, e ter os filhos ocupando, se apropriando de recursos naturais. Então, quer dizer, esse é o desafio fundamental, e isso traz algumas conseqüências e incômodos do ponto de vista das bandeiras ecológicas brasileiras, certo?” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, E.R., 60, ECONOMISTA)

S.O.S. recursos hídricos

“O grande desafio é a água, eu não tenho dúvida disso, a água, você já vê na Europa, hoje, em alguns países, a reciclagem, três, quatro, cinco vezes. Nos Estados Unidos não chegou ainda nesse nível. No Brasil é um desperdício extraordinário, um país abençoado

Page 213: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 3

por Deus na questão da água e nós não tomamos o devido cuidado com isso. E isso está intimamente relacionado com temperatura. Se nós não conseguirmos reverter o quadro de desperdício de água, nós vamos ter problemas.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

Amazônia como problema e solução

“Eu quero ver como é que a Amazônia pode ser parte da solução e não do problema. Agora, ela é parte do problema, porque ela está desmatando, emitindo CO2, ela está contribuindo com a mudança climática. Se o desmatamento na Amazônia cessa, ou é reduzido num nível tolerável e a Amazônia vira também um celeiro de reflorestamento, de negócios que fixam carbono, a Amazônia faz parte da solução do mundo. Essa transição de sair da linha do problema para a linha de solução é um desafio...

Se a Amazônia entrar em colapso, o planeta entra em colapso, porque a quantidade de carbono que a Amazônia detém no solo e acima do solo é monumental. Se ela faz o seu dever de casa e cria uma agenda sustentável, vai estar perto da solução. Tem escala planetária. Qualquer coisa que a afeta, afeta o planeta para pior ou melhor. Então, estar aqui na Amazônia é estar no centro nervoso desse debate de mudanças climáticas.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“No Brasil, eu acho que nós temos grandes desafios nos próximos 20 anos. Um é, de fato, fazer uma política mais integrada e muito melhor elaborada, que mantenha a Amazônia numa condição bem razoável de preservação ou de conservação, ligada a um desenvolvimento racional. E no caso da Amazônia eu diria que o desenvolvimento racional precisaria ser de fato perseguido, para evitar que se continue derrubando florestas. Seria desenvolver grandemente o potencial de uso da biodiversidade, o potencial tecnológico que a biodiversidade tem e no qual se tem investido muito pouco; muito pouco tem sido feito.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Cientistas concordam, com ressalvas

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas. Concorda fortemente

Concorda Não respondeu TOTAL

19 7 4 30

A maioria absoluta, quase dois terços dos entrevistados, concorda “fortemente” com a afirmação de que as mudanças climáticas causarão grandes impactos. Sete entrevistados disseram apenas “concordar”. Já entenderemos a diferença de intensidade:

“Eu concordo que afetará, concordo. Não vou dizer que concordo fortemente. Concordo que afetará as sociedades em geral, porque se trata de um processo global. Agora, não dá para dimensionar, não temos ainda como dimensionar quanto seremos afetados.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

“Eu concordo bastante. Vai haver isso. Mesmo porque a gente não sabe, com segurança, se vai haver impactos positivos ou negativos, depende. Nós não sabemos ainda precisar onde os impactos serão positivos, porque essa mudança do clima pode favorecer algumas

Page 214: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 4

regiões e pode prejudicar muito outras. Então, é esse balanço que ainda é difícil de fazer.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, G.J., 52, ENG. ELÉTRICO)

Os cientistas que concordam fortemente fazem alusão aos relatórios do IPCC e também aos indicadores que têm sido publicados. Segundo eles, já é possível dimensionar os efeitos das mudanças climáticas, e esses efeitos serão dramáticos, sobretudo entre as populações mais pobres do planeta:

“Concordo fortemente. Eu tenho indicadores, já medi. Tenho indicadores no Brasil que mostram claramente isso, e o impacto vai ser principalmente nas populações pobres.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“Bem, eu trabalho em um projeto que lida bastante com isso [mudanças climáticas], e pelo meu conhecimento eu diria que concordo fortemente, embora eu reconheça que exista um ou outro exagero, uma ou outra previsão que é claramente exagerada. Mas, tirando os exageros, a situação é realmente muito séria...” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

7. IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

Importância do tema para o setor é inquestionável

Importância do tema em seu setor de atuação: Muito importante Importante TOTAL

27 3 30

Praticamente todos os entrevistados estudam, pesquisam ou participam de comissões, grupos de trabalho ou projetos em que o tema está presente. Por isso, a maioria atribuiu importância máxima ao tema, como podemos ver na tabela acima.

O impacto mais imediato do crescimento da importância do tema no setor científico foi o surgimento de mais recursos e mais oportunidades para os cientistas que têm carreiras em áreas relacionadas aos temas das mudanças climáticas. Cresceu a procura por áreas científicas como clima, energia, química de gases e fisioquímica em geral. Para os cientistas entrevistados, o maior impacto se dará na ampliação das especialidades científicas e na área tecnológica. Proliferam, nos últimos anos, a criação de novos centros e grupos de pesquisas:

“Eu acho que houve muito avanço da pesquisa. Se eu falo da pesquisa, eu acho que houve muito avanço da pesquisa na área ambiental. Hoje [os pesquisadores] estão com um conhecimento muito maior da região amazônica, na produção tanto da área das ciências sociais como da área das ciências naturais...” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

“Se nós olhássemos 10 anos atrás, quase 100% da nossa busca de cooperação era como receptor de tecnologia. (...) Agora a EMBRAPA está com clareza de que a nossa relação com países desenvolvidos, tanto EUA quanto Europa, e também alguns países asiáticos, é de um outro tipo de parceria, que é a que chamamos de laboratórios remotos, Labex [laboratórios no exterior]...” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, T.D.A.S., 58, BIÓLOGA)

Segundo nossos entrevistados, assim que uma política nacional do clima for elaborada, a tendência é que haja uma correspondência de programas na área científica e tecnológica. Nesse sentido, a formação de doutores e especialistas é uma necessidade e uma oportunidade para quem está investindo em carreiras científicas:

Page 215: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 5

“(...) temos o outro grande desafio, que é a formação de uma quantidade muito maior de mestres e doutores capazes de lidar com esses problemas. Nós temos um direcionamento, não muito bom ainda, de formação de pessoal para essa parte de gestão ambiental, de engenharia ambiental, de fazer e produzir realmente ações que vão nessa direção.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

Cientistas são favoráveis à adoção de um programa de metas

A grande maioria dos entrevistados declarou que a regulamentação e a adoção de um programa de metas afetaria positivamente tanto o seu setor quanto a sociedade brasileira.

Com relação aos benefícios que poderia trazer ao setor, o destaque está na ampliação do mercado de trabalho e no desenvolvimento de metodologias e de pesquisas:

“Afetaria positivamente, porque criaria um mercado de serviços para organizações e profissionais que trabalham nesse monitoramento, desenvolvendo metodologias e tal.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“Eu acho extremamente importante ter um programa de redução de emissões com metas e tudo, principalmente para países tropicais como o nosso, em desenvolvimento, e que tem uma forte dependência da produção agrícola. Vai ser uma questão crucial; pode parecer uma ameaça no início, assustar, mas se for bem tratado, com bastante equilíbrio e bom senso, é uma das maiores oportunidades que o Brasil pode ter.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

Os argumentos mais utilizados são os de que um programa de redução pode trazer foco, incentivar a pesquisa e ainda funcionar como um impeditivo à expansão da tendência, já observável, de sujar a nossa matriz energética:

“Acho que a regulação afeta sim, mas de uma forma positiva. Quando você tem metas, você tem foco, e também pode elaborar melhor um programa de compensações. As regras ficam claras e você então sabe como reduzir, tem como medir, enfim, as metas nos obrigam a melhorar os instrumentos de controle... Nós temos que reduzir as emissões através de biodiesel ou através de etanol, que é uma maneira para reduzir o CO2. Com a regulação, você gera uma produção de cana mais eficiente, um etanol de melhor qualidade...

(...) além disso, a cana é um exemplo de possíveis plantas melhoradas, como a planta chamada C4, de excelente captação de CO2. Ela, por si só, já é uma planta também de captação e você aproveita, além do etanol que é produzido, toda a palhada daquela cultura para bioenergia, para gerar termoeletricidade. É uma cultura que pode ser usada para reduzir a emissão de CO2. Assim como esse exemplo, temos outros, como o eucalipto e a seringueira, mas o potencial da cana é muito grande.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, A.B.F.O., 49, ENTOMÓLOGO)

“Um programa de metas de redução no cenário Brasil eu acho que tem um impacto menor do que no cenário mundo, porque a matriz energética brasileira é peculiar... Avaliando o impacto de possíveis restrições de emissão, dentro da forma como a nossa matriz é montada hoje, não vejo problemas, mas a tendência de sujar a nossa matriz é grande, nós já estamos sujando a matriz... Isso é paradoxal, é como se estivéssemos na contramão da

Page 216: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 6

história. Enquanto todo mundo fala: eu quero limpar a minha matriz, nós estamos sujando a nossa... É por isso que é importante assumir metas de redução, para evitar sujar demais...” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, M.A.S., ENG. ELÉTRICO)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Principais barreiras são falta de consciência e interesses econômicos

Os entrevistados tiveram liberdade para discorrer sobre qualquer tipo de entrave que julgassem apropriado comentar. Houve, então, um amplo leque de respostas. Entre os diversos entraves citados, destacam-se os interesses econômicos fortemente assentados em uso de energia fóssil, principalmente nos países desenvolvidos, mencionados por nove entrevistados:

“Olha, o que tem conduzido as reuniões, no meu modo de ver, são os interesses econômicos. Você vê os Estados Unidos, por exemplo, eles sabem da necessidade, precisam evitar a poluição, as emissões, mas o problema da economia [é que] os grandes grupos não deixam. Nem participaram dos acordos internacionais.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, F.L., 69, ADVOGADO)

“(...) o que vale mais é o interesse. Veja só, a indústria bélica, de uma maneira geral, tem um interesse muito maior do que essa questão ambiental. [Essas empresas] mantêm suas posições, atingiram este status de empresas muito poderosas e na realidade se esta questão [climática] for um entrave para elas, elas superam de qualquer maneira, usam seu poder, sua influência, sua maneira de reagir ao parlamento, governantes, [usam] toda forma de pressão para fazer valer seus direitos. Acho que as grandes corporações nessa área bélica, que é a indústria da guerra e a indústria petrolífera, são corporações invencíveis. (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.U.D., 51, ENG. NUCLEAR)

Além, disso foi muito lembrada a atitude dos Estados Unidos, que não se dispuseram a ratificar o Protocolo de Kyoto, reforçando uma atitude de resistência por parte dos países emergentes como Brasil, China e Índia:

“Acho que o fato dos EUA estarem se esquivando de certa maneira de assumir compromissos tem dificultado, ou pelo menos tem servido de desculpa para outros ficarem na defensiva, inclusive o Brasil. O Brasil sempre ficou um pouco na defensiva com relação ao desflorestamento, o nosso maior problema nesse caso.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, A.O.M., 47,FÍSICO)

Quatro entrevistados citaram, ainda, barreiras diplomáticas e questões geopolíticas:

“Acho que a barreira se dá no plano internacional de negociação, acho que é isso... [Não há negociação com] os maiores emissores, exatamente, que não querem abrir mão de suas metas e comprometer seu desenvolvimento econômico.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, N.M.S., 51, ENTOMÓLOGO)

Também a falta de consciência, tanto por parte das elites e governos como por parte da população, “que desconhecem o tema, sua complexidade” e não compreendem o “desastre que pode significar continuar a praticar o modelo atual de produção e consumo”, foi mencionada por cinco entrevistados:

“Um entrave, sem dúvida, é a falta de conhecimento ainda generalizada, claro. Nos dois últimos anos temos conseguido avançar um pouco, o tema das mudanças climáticas ganhou uma visibilidade maior. Essa falta de conhecimento, de consciência do problema,

Page 217: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 7

leva a que o indivíduo, os grupos, as empresas continuem a reagir com as mesmas práticas. Fala-se muito, mas a prática continua a mesma, então eu acho que muito investimento ainda é necessário para poder romper esse entrave: mais educação ambiental, mais debate na sociedade, mais produção e difusão de conhecimento por vários canais.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

O assunto é bastante comentado, mas ele vem acompanhado de muitos mitos e inverdades. Por ser relativamente novo na agenda e na mídia, há dificuldades em “separar o joio do trigo”. Publica-se muitas inverdades ou verdades apenas parciais:

“... se foi positivo o tema ir para mídia, a maneira como ele aparece é confusa, confusa até para quem lida com a temática ambiental, que tem um certo instrumental. Imagine para a sociedade como um todo. Por outro lado, é uma sociedade que não está sendo preparada para lidar com esse tipo de informação, e então fica confusa. Ou se tem uma visão apocalíptica ou uma visão de que ‘é besteira, nada vai acontecer, já fizeram alarde antes e não deu em nada’...” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 41, GEOGRAFA)

Em termos culturais, a questão ambiental só ganhou destaque há poucos anos e somente há pouco tempo as escolas e universidades passaram a abordar o tema, e ainda assim inserido em outras disciplinas.

Na opinião de nossos cientistas, é preciso incrementar as ações de informação e educação em relação ao tema das mudanças climáticas, aumentando a incidência de educação ambiental com esse foco:

“Em primeiro lugar, eu acho que é a necessidade de uma conscientização da sociedade como um todo. Eu acho que a imprensa vem fazendo um bom trabalho nesse sentido, mas ainda existem resistências, dúvidas dos agentes, dos atores que de fato atuam contribuindo para o aquecimento global.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, J.A.G.Y., 58, CIENTISTAS FLORESTAL)

Com três menções cada uma, ainda foram citados a falta de políticas públicas com foco em questões climáticas e a falta de pesquisas e investimentos em novas tecnologias:

“(...) o governo deveria despender de um quadro técnico mais preparado e de uma atividade jurídica do ponto de vista punitivo. Porque o que nós temos, é que a gente detecta o problema, mas esse problema não trás conseqüências, de tal maneira que o infrator entende que o mal compensa... E nesse sentido [são necessárias] ações de maior envergadura, envolvendo um quadro técnico, a força policial, envolvendo o poder público na efetiva punição no caso da infração.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, J.K., 53, HISTORIADOR)

“(...) mas eu acho que um dos impasses é realmente [falta de incentivos à] a produção de conhecimento. ” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Cientistas sugerem incentivos para o setor e para a sociedade

Os investimentos em pesquisa e tecnologia foram apontados como importantes incentivos ao enfrentamento das questões climáticas:

Page 218: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 8

“É preciso fazer grandes investimentos em novas tecnologias, tecnologias que sirvam para explorar sustentavelmente nossa biodiversidade, gerando produtos na área alimentar, na área de cosméticos, ou mesmo de energia, produtos medicinais que façam a floresta em pé render economicamente. Isso não se faz de uma hora para outra. Envolve a iniciativa privada, envolve institutos de pesquisa, cientistas, engenheiros, os governos, não sei quando isso vai acontecer.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, A.O.M., 47,FÍSICO)

“Eu acredito que um país é forte na medida em que ele é competente em pesquisa e ciência, nunca perdendo de vista aquela ciência básica, mas sempre procurando ter aplicações da ciência básica para o cotidiano, e isso são tecnologia e conhecimento. Eu acho que o nosso país deve caminhar por aí. Sempre que possível, investir em soluções cientificas e tecnológicas. (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, A.M.D.A.Jr., 52, METEOROLOGISTA)

Oito dos cientistas entrevistados sugerem que o investimento em pesquisas e novas tecnologias, a serem aplicadas nos diferentes segmentos da economia, é a melhor forma de incentivar o enfrentamento das questões climáticas.

“Eu acho que o investimento em ciência e tecnologia, nessa área, tem que ser vultoso. Eu acho que nós temos muito pouca coisa. O respaldo que nós temos, por exemplo, do INPE, é enorme, mas [nós não temos] pesquisas, não temos recursos suficientes para produzir conhecimento.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

Outros quatro entrevistados apontaram como incentivo importante um investimento maior em educação formal e educação ambiental, como estratégia para despertar, junto à população em geral, uma melhor compreensão da problemática, aumentando dessa forma a conscientização acerca de sua seriedade e aceitação em relação dos sacrifícios que deveremos fazer num futuro próximo:

“Eu penso que são questões diretamente relacionadas à educação ambiental. Então não tanto o combate de sintomas, mas uma educação que vise uma conscientização...” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, J.K., 53, HISTORIADOR)

Uma presença mais clara e firme do Estado, regulando as atividades econômicas e suas próprias atividades, poderia funcionar também como incentivo, pois sinalizaria para a sociedade que há um esforço sendo feito, o que poderia ampliar o engajamento de todos os setores:

“Elas [atividades que mitigam] deveriam ter um tratamento em certa medida diferenciado; deveriam ser estimuladas, e estímulos podem ser fiscais, isenção de imposto de renda, reduzindo taxas, por exemplo, de juros de mercado ou criando bonificações. Qualquer mecanismo que pudesse estimular as atividades que trabalham com responsabilidade social ou responsabilidade ambiental e com a questão da sustentabilidade. Eu acho que é fundamental que as entidades públicas sejam entidades de créditos, [e que] os próprios governos, atuando, criem estímulos ou bonificações que venham a estimular essas atividades.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, J.A.G.Y., 58, CIENTISTAS FLORESTAL)

Também seria importante intensificar os programas de crédito de carbono:

“Uma política que deveria ter sido incrementada é a política de credito de carbono, onde o mundo passa a comprar... Vamos supor, há o país que desmatou, e o que ele tem que fazer é o reflorestamento de vinte por cento de uma área. Tudo bem se ele não tem um lugar lá, ele pode fazer em outro país.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, A.B.F., 49, ENTOMÓLOGO)

Page 219: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 1 9

Uma ONU para cuidar do aquecimento global

Para um dos cientistas entrevistados, falta uma ação sistêmica e eficiente no enfrentamento das mudanças climáticas. Por isso, sugere a criação de uma ONU “ambiental”, voltada exclusivamente para regular e monitorar essa questão. Segundo ele, o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) estão perdidos em milhares de programas sem a significância global do problema das mudanças climáticas:

“Uma ONU ambiental devia ser criada, que tenha como orçamento uma coisa equivalente ao modelo Plano Marshall, porque se for uma ONU ambiental com o orçamento atual de organismos como PNUD, PNUMA, com o engessamento da ONU, com a burocracia da ONU, com a lentidão de tomarem decisões, não dá conta.

Se não criar um organismo planetário com essa agenda, nós não vamos resolver os problemas dos países individualmente, até porque o problema se estende em tempos muito lentos, por meio de acordos que são impedidos de funcionar justamente pela lógica dos países que deveriam estar fazendo seu dever de casa... .

Sem um acordo político mínimo, enquanto o cidadão não perceber que isso é um problema sistêmico e que exige uma ação planetária, não vamos conseguir reverter nada do que está colocado para nós.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

Várias vezes o autor da idéia insiste em que o Plano Marshall foi vitorioso e reconstruiu em 30 anos uma Europa arrasada. Por que não fazer o mesmo e impedir a destruição que as sociedades humanas vão enfrentar em poucas décadas?

“É como se a gente estivesse diante de uma guerra, e precisa sair dessa guerra com um plano vigoroso de investimento.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO).

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

Para cientistas, falta liderança e engajamento dos governos

Perguntados sobre que atores deveriam ser engajados para que se consiga um esforço mais eficiente no enfrentamento do fenômeno das mudanças climáticas, metade da nossa amostra, 15 entrevistados responderam enfaticamente que não há, nos governos federal, estaduais e municipais, uma liderança conduzindo o país nessa questão:

“No estágio em que estamos hoje, temos que passar por regulamentação. O principal ator é o governo. (...) Hoje você tem que ter o governo incentivando políticas, o governo tem que ser o regulador, o formulador de uma política de agricultura limpa, política de um transporte coletivo energeticamente responsável, política de geração de energia menos dependente do petróleo, política de redução do desmatamento. O grande ator hoje é o governo.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

“No caso do desmatamento, o fator de maior pressão [quanto às emissões] é o Ministério do Meio Ambiente e o da Agricultura. Esses dois ministérios vêem o problema de uma situação totalmente oposta, quer dizer, o Ministério do Meio Ambiente tem uma visão conservacionista e o Ministério da Agricultura tem uma visão de desbravamento e de expansão da cultura da soja. Falta consenso, ação integrada e sobretudo uma liderança.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

Page 220: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 0

Notadamente, vemos que, para os entrevistados, devem partir do setor governamental as ações indutoras mais fortes. Em geral, os entrevistados fizeram referência à escassez de políticas públicas que levem a ações efetivas, capazes de produzir resultados palpáveis no que diz respeito às questões do clima:

“Bom, eu acho que primeiro nós não podemos prescindir da forte participação governamental. Então, deveria ter uma agência governamental ocupada em traçar essas políticas e colocá-las em prática... Efetivamente em prática, ou seja, ter a responsabilidade de fazer acontecer. E ela seria um elemento articulador de outros segmentos nacionais. (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, M.A.S., ENG. ELÉTRICO)

Com três menções cada um, a seguir foram citados o setor privado, as empresas e a sociedade civil.

Os empresários do setor de mineração, do setor energético e do agronegócio devem assumir responsabilidades, segundo o grupo de entrevistados, “porque são os que, com suas atividades, mais contribuem para o agravamento da questão”:

“Empresários. Empresários que eu digo, por exemplo, fazendeiros, não precisa ser uma empresa formal, formalizada.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

“O empresariado tem que ser, quer dizer, as empresas têm que ser chamadas a colaborar, elas são atores importantíssimos nesse processo, não é? (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, M.A.S., ENG. ELÉTRICO)

Mas o empresariado também deve pressionar o governo:

“[os empresários] vão ter que fazer pressão no próprio governo para que ele crie ambiente de negócio. Porque não adianta uma empresa fazer isso e aquilo se o seu concorrente não faz. É uma questão de vantagens e desvantagens competitivas. Então você precisa de alguns marcos regulatórios, como a Europa fez. A Europa estabeleceu, por exemplo, redução no continente de 20% de emissões. Isso obrigou toda a indústria, a economia, a se mover nessa direção. (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

A sociedade civil deve também participar ativamente, de forma a cobrar de seus governos ações mitigatórias. Segundo os entrevistados, a cobrança deve se manifestar sob diversas formas: no voto, no apoio às ONGs e até através da mídia:

“Eu acho que a sociedade civil organizada tem a maior força de ação para assumir esse papel. (...) A sociedade, e eu justifico o porquê: é ela, na verdade, que tem um poder muito maior que o de todos, que o do próprio governo, que é quem compra, né? Então a gente sabe, tem exemplos claros aí, o que significa quando uma sociedade faz um boicote a um determinado produto? (...) Eu acho que os atores são a sociedade civil organizada e pressionando em relação ao tema...”(CIENTÍFICO, USO DO SOLO, J.A.G.Y., 58, CIENTISTA FLORESTAL)

Um dos entrevistados citou a igreja como um ator que poderá ajudar na conscientização da população, uma vez que tem penetração em todo o território nacional e tem poder de influencia entre seus fiéis:

“Aqui no Brasil temos setores importantes além da sociedade, da mídia, há outros como as igrejas, que atuam muito em pequenas comunidades, as mais distantes, onde a imprensa às vezes não chega, porque quando a gente fala imprensa, só tem impacto nos grandes setores urbanos, uma força somente nos setores mais escolarizados, mais dinâmicos ...

Page 221: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 1

(...) Nas pequenas comunidades, e este país é grande, temos outros agentes para veicular esse tipo de informação, para introduzir nas práticas de trabalho e nas comunidades novas idéias, novas tecnologias, a educação e a igreja, suas duas forças, duas formas muito chave... Eu acredito que as igrejas de uma maneira geral, em nosso país, da forma como elas estão organizadas, chegam nas comunidades, podem exercer um papel, ser um agente muito importante.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.U.D., 51, ENG. NUCLEAR)

E, naturalmente, alguns afirmaram que “todos os setores devem ser engajados”, pois cada qual tem o seu papel:

“Todos os setores. Cada um dos setores, porque existem figuras que se sobressaem em seus diversos setores, no setor industrial, no setor político, e esses eles podem comandar.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, F.L., 69, ADVOGADO)

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

A dimensão internacional

Muita discussão e pouca ação, eis é a conclusão da maioria dos cientistas ouvidos:

“Há pouco empenho na busca de soluções. Acho que a Europa colocar uma meta de redução de emissões de vinte, vinte e cinco por cento é uma boa idéia, mas enquanto os Estados Unidos não se definirem claramente, a coisa fica muito sujeita à discussão. Muita discussão e pouca ação. Muitos acordos internacionais e pouca ação. (...) Pouca coisa está sendo feita, e [nem] de longe está à altura dos desafios que o problema das mudanças coloca.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

Mas há quem no conjunto discorde, dizendo que as negociações são ativas, embora essa seja uma posição minoritária:

“No âmbito internacional existem negociações muito ativas e polêmicas, porque os principais emissores são os Estados Unidos e a China. Ambos emitem aproximadamente a mesma quantidade. Cada um deles emite aproximadamente 25% do total, então a China e os Estados Unidos juntos representam 50% do total.

Não pela mesma razão, mas ambos são contrários às metas obrigatórias de redução, o que envenena completamente qualquer negociação internacional.

Mas existe uma grande pressão para que eles cheguem a um acordo, e essas negociações estão ocorrendo todos os anos. Existem megaconferências das Nações Unidas para discutir esse assunto.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

A aceitação de que as mudanças climáticas são uma realidade é o único ponto em comum nas comunidades internacionais, dizem os entrevistados. As formas como as comunidades internacionais tratam da problemática diferem fortemente entre si:

“Temos posições distintas dos EUA, da Europa, do Japão, da Rússia, digamos assim, são os grandes posicionamentos, e países como o Brasil, China, Índia e etc.

Fundamentalmente, eu acho que essas posições são orientadas pelos problemas energéticos de cada um, de cada região. A Europa, por uma questão de carência de fontes energéticas, tem que necessariamente elevar os preços, e ela vai ter que se adaptar a um mundo de pouca energia, porque ela não tem petróleo e o carvão se esgotou. (...) Por isso adotam posturas mais radicais.

Page 222: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 2

Os EUA têm fontes energéticas, controlam militar e politicamente as fontes energéticas (...) e portanto tendem a ter uma posição mais liberal, digamos assim, mais irresponsável. Essa é a minha perspectiva, certo?”

O mesmo entrevistado continua sua análise do cenário internacional:

(...) A Rússia, naturalmente, por questões de desmoronamento da União Soviética, ficou, no contexto de Kyoto, com excesso de capacidade, e então pode adotar uma postura menos radical. Já o Japão ficou muito ambíguo, porque é um país muito pobre de recursos naturais, muito pobre de recursos energéticos...

A China, obviamente, tem uma postura radical de não negociação, e vai continuar a ter, o que representa um desafio diplomático para todos nós. Ela tem uma matriz energética bastante maléfica, digamos assim, do ponto de vista de aquecimento global, porque está baseada no carvão...”

E finaliza observando que o problema é que não dispomos de um modelo pós-Kyoto para enquadrar os países:

O embate que eu vejo está colocado dentro dos termos do Kyoto, quer dizer, o que está sendo discutido é Kyoto. Ainda não temos nenhum modelo pós-Kyoto para que possamos avançar.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, E.R., 60, ECONOMISTA)

A União Européia está à frente em todos os campos: tanto nos investimentos em pesquisa e tecnologia quanto nas ações de seu empresariado. O mesmo se dá na postura ambiental de suas populações:

“(...) há alguns países europeus, que parecem estar levando muito a sério essa questão, estabelecendo metas, metas de redução, metas de substituição de fontes de energia mais avançadas e com maior exigência do que os protocolos internacionais de fato exigem.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

“Então, temos países que estão vendo isso com mais ênfase, e aí são mais alguns países da Europa que estão conseguindo fazer isso mais rapidamente. Alemanha, Dinamarca, são alguns exemplos...” (CIENTÍFICO, ENERGIA, G.J., 52, ENG. ELÉTRICO)

Os países em desenvolvimento, agora chamados de “emergentes”, como Índia, China e Brasil, precisam encontrar um difícil equilíbrio entre continuar o seu desenvolvimento e compatibilizar as bases desse crescimento com as exigências ambientais e as do aquecimento global.

Em termos concretos, dizem, as ações desses países, incluindo o Brasil, têm sido lentas e tímidas na implantação de políticas ambientais consistentes:

“A participação do Brasil, a meu ver, é marginal e de modo geral tende a tirar as casquinhas do fogo para a China. O Brasil não é uma emissão insignificante de gás que provoca efeito estufa devido ao que está ocorrendo na Amazônia. Não é um grande emissor, mas não é um emissor desprezível. Mas, basicamente, ele segue as posições da China com base em uma retórica nacionalista que é completamente absurda.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

Posição americana é indefensável

Embora alguns entrevistados tenham mencionado a atitude positiva de alguns Estados americanos, como a Califórnia, por exemplo, que aderiu a um programa de reduções, eles consideram que a política americana para o aquecimento do planeta é no mínimo desanimadora, indefensável para uma país-líder de tamanha importância para a estabilidade global:

Page 223: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 3

“Acho que o fato de os EUA estarem se esquivando de assumir compromissos tem dificultado, ou pelo menos tem servido de desculpa para outros ficarem na defensiva, inclusive o Brasil.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, A.O.M., 47, FÍSICO)

Atribuem essa atitude à falta de visão, ao egocentrismo de um país que deseja manter seus níveis de crescimento a qualquer preço.

Os entrevistados sentem-se esperançosos de que o próximo governo americano, seja ele democrata ou republicano, adotará uma postura mais cooperativa, abrindo espaço para uma discussão mais ampla sobre as ações necessárias:

“Os EUA também não querem fazer muito neste momento, mas também não querem aparecer como vilão planetário. Acredito que eles mudarão de posição e as próximas eleições serão fundamentais na nova postura.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“(...) É possível até que os EUA, que estão vivendo agora um processo eleitoral, retomem esta questão [Kyoto] pela cobrança da própria sociedade americana, que não pode continuar sendo a sociedade perdulária de energia, a maior dissipadora de energia e a maior emissora de gases poluentes. (...) Os governantes, principalmente o presidente Bush, não têm essa preocupação com o tratado de Kyoto, que controlava essa emissão de gases.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.U.D., 51, ENG. NUCLEAR)

China preocupa

Como vimos acima, a China foi mencionada diversas vezes como um país que, depois dos EUA, será o fiel da balança na questão das mudanças climáticas. Segundo uma visão alarmista, a China estaria licenciando “uma termoelétrica a carvão por semana”, e manter seus níveis de crescimento com esse custo energético para o planeta não aponta um horizonte promissor:

“Cobram do Brasil, mas não há, por exemplo, mecanismos eficientes para que a China reveja o modelo dela... Tem um dado que preciso verificar, assustador: a China estaria criando uma usina termoelétrica por semana. Isso é altamente impactante, joga CO2 direto na atmosfera. Tem que reverter isso, acho que a discussão está muito tímida no nível internacional. (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE "DESMATAMENTO EVITADO"

Discordâncias sobre a eficácia da proposta

O Brasil apresentou, na 13ª Conferência das Partes (COP) da Convenção do Clima, realizada em Bali, uma proposta de desmatamento evitado. Perguntamos aos entrevistados se conheciam essa proposta e qual sua opinião sobre ela.

A metade (15) dos cientistas ouvidos declarou conhecer; a outra metade não opinou (4) ou disse não conhecer (11).

Entre os cientistas que opinaram a respeito encontramos, em geral, opiniões não tão otimistas:

“Eu acho que essa proposta, isoladamente, não vai pegar, porque vai exigir mudança de comportamento, mas ela é um passo para mostrar que as externalidades ambientais podem ser convertidas em um ativo para quem está mantendo a floresta em pé. Não deixa de ser um ponto de partida.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, W.A., 44, BIÓLOGO)

Page 224: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 4

“Conheço, acho que foi uma proposta ambiciosa que o Brasil apresentou, mas não entusiasmou a ninguém. Uma proposta de desmatamento, estabelecendo ainda um limite de desmatamento permitido, é quase como aceitar um crime, porque o desmatamento é contra a lei no código florestal. (...) Eu acho que a proposta do Brasil devia ser de desmatamento zero. Não vamos desmatar mais nada.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, S.T.C., 60, ENG. QUÍMICA)

“É uma proposta que precisa ter uma discussão ampliada para que possa ser incorporada na própria sociedade, para que a sociedade possa tirar proveito, mas é preciso que os outros países também se conscientizem de que salvar a Amazônia também precisa de uma boa vontade do ponto de vista econômico; não é só exigir, é também compensar o Brasil, os proprietários da biodiversidade conservada.

Quanto que eu ganho para conservar? Eu não tenho nada, eu tenho as minhas atividades econômicas que me permitem desmatar, mas quanto eu recebo para manter uma floresta em pé?O mecanismo sugerido pelo Brasil pode ter imperfeições, mas é preciso considerar coisas parecidas com isso. Enfim, assim como se investe na produção, deve-se investir também na conservação?” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, J.A.G.Y., 58, CIENTISTA FLORESTAL)

Para um renomado cientista, que já ocupou por duas vezes o cargo de ministro e secretário de Estado, a proposta é mal formulada e corresponde mais ao sentimento do que à razão. Eis a sua crítica:

“Mal formulada, é uma proposta que corresponde muito mais a sentimentos do que à razão. Quer dizer, o Brasil fez uma proposta que se baseia na filantropia internacional, ou seja, o desmatamento evitado. Seria evitado o desmatamento em troca de doações que governos e entidades privadas fariam para um fundo de desenvolvimento. Isso não existe, filantropia é algo que não existe no nível de alguns milhões de dólares. Quando se fala em evitar o desmatamento da Amazônia, o tipo de recursos necessários são bilhões de dólares e não creio que exista experiência prévia nenhuma de filantropia nessa escala.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

O ceticismo em relação à proposta deve-se principalmente à sua difícil operacionalização. Quem controlará? De que forma? Como o dinheiro será repassado aos interessados? Haverá seriedade e transparência na gestão dos recursos? As declarações selecionadas abaixo refletem as dúvidas dos entrevistados:

“É a primeira vez em que o Brasil apresenta uma proposta, e isso já é por si alentador. (...) Mas ela tem algumas dificuldades. Uma delas é que não sinaliza como os recursos serão distribuídos. Eventualmente, com esse fundo arrecadado, quem vai ser beneficiado? Não pode ser só o governo. Tem que ser de fato o proprietário, a comunidade lá na ponta. Então, a imprecisão do mecanismo de distribuição do que pode ser arrecadado é um grande problema e com certeza inibe esse fundo que o Brasil está propondo.

A segunda dificuldade é um mecanismo que ficou muito brasileiro. Precisa-se de um que funcione no mundo inteiro. Porque aí os outros países vão falar: pode funcionar, mas não só no Brasil. Quero que funcione na Costa Rica, Nova Guiné. Então isso dificulta muito o mecanismo proposto pelo Brasil.

Mas mesmo com imperfeições, acho que deveria ser testado... No entanto, parece que não decolou, pelo menos não apareceu ninguém dizendo 'vamos apostar nisso'...

Quer dizer, a proposta do Brasil está na mesa, não pode ser descartada, pode até ser aperfeiçoada... A expectativa do governo era de que aparecessem pessoas que dariam 100

Page 225: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 5

milhões, e não apareceu ninguém até agora. Então, a proposta não foi sedutora o suficiente para os compradores, mas não conheço os detalhes.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“Eu acho que a proposta do desmatamento evitado é um problema sério. Porque, primeiro, você precisa determinar o que ocorreria naturalmente, a partir do que você mediria o que foi evitado. É uma questão complicadíssima de projeção, que vai ser colocada. (...)

De que maneira você vai conseguir implementar isso em um nível micro também não é simples, por mais que você determine qual será a meta no nível nacional, certo? Teremos que conseguir passar isso para o madeireiro na Amazônia, e aí é outra conversa, totalmente diversa.

A quem que você vai pagar e como é que você vai garantir a perpetuidade desse desmatamento evitado. Porque um outro indivíduo pode vir e desmatar, posteriormente, você entende?

Então, amarrar todos esses compromissos não é um mecanismo muito simples. São contratos futuros que você está assumindo.

Existe um problema de soberania também: é que os recursos, de certa maneira, serão entregues e imobilizados por um governo internacional. Colocam-se problemas de soberanias que não são problemas ilegítimos não.

Mas, para esse cientista que levanta tantas dúvidas sobre o mecanismo proposto pelo Brasil em Bali, a questão mais séria diz respeito ao futuro do que está sendo vendido, o futuro da própria Amazônia, que é incerto. Vejamos seus argumentos:

Existe um outro problema mais sério ainda, que as pessoas não levam em consideração. É que, se acontecer o que os cientistas predizem com grande alarde, se o aquecimento seguir seu curso, a Amazônia deixará de ser essa floresta que conhecemos; haverá uma savanização de toda aquela região...

A savanização da Amazônia significa o seguinte: que aquilo que foi vetado, impedido de desmatar, vai ser de qualquer jeito destruído. Então o que você está comprando quando está comprando desmatamento evitado?

A Amazônia vai continuar a ser o que é. Somente se as políticas de combate ao aquecimento global derem certo... Só teremos desmatamento evitado porque aí não houve aquecimento global, então houve um desmatamento que foi evitado e que contribuiu para que não houvesse desmatamento global. Caso contrário, é uma conversa absolutamente sem sentido. Quer dizer, não adianta o Brasil fazer tudo certo se os EUA não fizerem. A Amazônia vai desaparecer de qualquer jeito, segundo os próprios cientistas, se as ações não forem concatenadas.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, E.R., 60, ECONOMISTA)

14. CONFERÊNCIA DE BALI

Ecos de uma conferência

Praticamente todos os entrevistados que opinaram sobre a Conferência de Bali compartilham a opinião de que os resultados foram regulares ou fracos. Tivemos 14 entrevistados nessa categoria. Apenas 3 consideraram os resultados bons e 13 não se manifestaram, dizendo não ter participado, e só terem acompanhado pela imprensa, pela internet.

Page 226: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 6

Falta de liderança, resultados que não se traduziram efetivamente em ações, ficando apenas na intenção, e a posição americana de não adesão aos programas internacionais foram os principais motivos para a insatisfação geral sentida no meio científico e acadêmico:

“Acho que a gente precisaria de muito mais liderança, rapidez, menos timidez, decisões fortes para fazer essa transição de um padrão, isso no campo da energia, de um padrão de consumo de energia, para outro. Na minha perspectiva, os avanços são modestos. Acho que precisamos assumir metas, prazos mais rigorosos, talvez até ambiciosos, mas que valeria a pena tentar, mobilizar mais o governo para enfrentar isso de uma maneira um pouco mais impopular num curto prazo, mas eu acho que é importante. Meu desapontamento é mais nessa área: uma ausência de grandes lideranças assumindo compromissos mais ambiciosos e em prazos mais curtos.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, G.J., 52, ENG. ELÉTRICO)

“Resultados sofríveis: Bali quase foi um fracasso total. Ela só não foi um fracasso total porque Bali diz o seguinte: vamos nos reunir de dois a dois. Vamos deixar que alguns assuntos entrem. Vamos trabalhar minimamente nisso, para que daqui a dois anos a gente converse. Isso foi uma vitória. O fato de florestas tropicais terem entrado para ser conservadas é, talvez, nesse mundo complicado, um avanço.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“Houve recentemente uma conferência em Bali que basicamente tomou a seguinte decisão: dentro de dois anos, esses dois países [EUA e China], e os outros evidentemente, terão que chegar a um acordo, e há uma certa expectativa de que efetivamente se consiga chegar a um acordo dentro de dois anos. (...) Os resultados não foram bons. A única coisa que a Conferência de Bali estabeleceu foi cronograma de reuniões... Teremos que esperar para fins de 2009 a conclusão dessas negociações.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

Para três entrevistados, os resultados de Bali foram os “esperados”, pois não existem mecanismos multilaterais que possam enquadrar os países sem longas negociações. Vivemos um mundo em que a geopolítica é complexa e não se pode atribuir responsabilidades de modo autoritário:

“Acho que o resultado de Bali foi o esperado para o padrão de dificuldades, ou seja, não foi, como muitos idealistas esperam, um momento de inspiração planetária em que aqueles diplomatas de carreira que estão acostumados com discussões complicadíssimas foram tocados pela magia de um discurso unificado...

O mesmo entrevistado nos oferece uma perspectiva interessante para entendermos o que estava em jogo em Bali e aponta o que é, para ele, a essência do desapontamento sentido por todos: “o mecanismo é lento em relação ao tamanho do desafio e à urgência que temos”:

“Eu acho que havia três coisas em Bali: a) avançar muito, que era o desejável e não aconteceu; b) não fazer nada, que seria um fracasso completo, mas isso poderia representar um constrangimento tão grande que forçaria também um outro mecanismo; ou c) aquilo que foi obtido: deixar a porta aberta para o debate e nos reunirmos novamente daqui a dois anos.

Qualquer cenário, mesmo o cenário em que acordos fossem mais vigorosos do que o esperado, ainda assim seria muito pouco para o tamanho do problema. A resposta de Bali foi muito tímida diante do tamanho do desafio.

Eu estou com muitas dúvidas [quanto a] esses mecanismos laterais, típicos da ONU, para lidar com esse tipo de problema. Reunir-se de dois em dois anos, três em três anos, com esse tipo de avanço... Nós vamos ser engolidos pelo problema. Já estamos sendo.

Page 227: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 7

Tem gente lá muito boa: os negociadores saíram de lá razoavelmente felizes diante da catástrofe que poderia ser, mas eu acho que é uma área onde a gente não pode ser modesto. O problema não é modesto. É gigantesco. (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

Para outro cientista, presente à Conferência, a boa notícia foi a adesão do Canadá e da Austrália ao Protocolo de Kyoto, o que deixa os EUA cada vez mais isolados:

“A Conferência, nas últimas edições, tem se repetido nas dificuldades de entendimento. A de Bali é conseqüência das últimas, não teve grandes novidades. O que foi importante foi a decisão da Austrália e a decisão do Canadá de assinar o Protocolo de Kyoto. Isso acabou deixando os Estados Unidos sozinho na discussão. (...)

Essa, na minha opinião, foi a contribuição mais importante da Conferência, porque ela acabou fazendo com que a posição americana ficasse em uma situação cada vez mais difícil, embora a gente conheça as dificuldades da administração Bush, mas o modo de vida americano é um limitador, e ele efetivamente é referência internacional, ele precisa ser modificado.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, C.B., 55, ENG. ELÉTRICO)

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

As responsabilidades do Brasil são conservar Amazônia e não sujar a matriz energética

Com relação às responsabilidades do Brasil no esforço global de combate ao agravamento do fenômeno das mudanças climáticas, todos os entrevistados entendem que todos os países têm responsabilidades, mas que elas são diferenciadas, não entre países ricos e países pobres – esse tipo de raciocínio é maniqueísta e simplista –, mas porque cada país tem características naturais diversas, sistemas econômicos distintos e necessidades também distintas em termos energéticos. Mas eles concordam que o Brasil não é um emissor desprezível e tem um papel chave em qualquer que seja a solução global:

“O Brasil está no centro do debate. Quer dizer, o Brasil, a China, a Índia, os EUA, a Rússia. Esses são os cinco países que estão no alvo. Ninguém está olhando a Bolívia ou a Venezuela. O Brasil está no alvo. O Brasil é América Latina, e América Latina, em termos ambientais, é Brasil e México... O Brasil reconhece isso e a postura mudou um pouco, mas a postura do Itamaraty é muito refratária a um compromisso maior... Nós ficamos no papel desagradável de espectadores, vendo como vai evoluir a coisa, sem nos prevenirmos, sem termos uma estratégia, o que não é bom.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

14 entrevistados disseram que “conservar a Amazônia, manter a floresta em pé” é a nossa principal responsabilidade:

“O problema do Brasil é a Amazônia. O Brasil não consegue saber o que vai fazer com a Amazônia e a Amazônia tem, então, um passivo ambiental enorme. Brasília está muito distante da Amazônia. Embora você tenha, em Brasília, pessoas com a intenção boa, desejando fazer a coisa certa... Acredito que estão virando a noite para fazer algo certo, mas não é suficiente. A Amazônia é muito grande e, para qualquer município da Amazônia, é como se Brasília fosse outro planeta. A Amazônia tem sido um problema para a imagem do Brasil, porque aumenta a emissão e o Brasil não sabe o que fazer com a Amazônia concretamente.´ (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

Page 228: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 8

Outros 11 mencionaram a necessidade de realizar um planejamento energético que não nos leve a sujar nossa matriz. Para eles, temos uma matriz limpa e devemos mantê-la assim:

“A grande contribuição que o Brasil vem dando é a sua própria matriz energética; se nós analisarmos, 90% da nossa matriz energética provêm da hidroeletricidade. O Brasil dá uma contribuição fantástica.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, N.M.S., 51) “No Brasil, temos uma matriz energética limpa, se tomamos como referência a matriz energética mundial. Temos uma presença muito forte do álcool, do etanol, e qualquer aumento vai ser pouco significativo em relação ao contexto atual. O próprio biocombustível, de uma forma geral o biodiesel, também vai promover uma mudança, uma alteração pequena, puramente em função dos programas de governo. Estamos com dois por cento obrigatório do biodiesel, cinco por cento a partir de 2012; essas condições são escalas pouco significativas e uma participação da energia hidráulica na matriz energética também é importante. Nosso problema é evitar o licenciamento de termoelétricas a carvão, ainda que seja de carvão renovável, vegetal.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, C.B., 55, ENG. ELÉTRICO)

Os demais fizeram menção conjunta à Amazônia e ao desenvolvimento dos biocombustíveis, para o qual estaríamos “naturalmente vocacionados, desde o sucesso do etanol da cana”:

“O Brasil também tem um histórico favorável, especialmente na área de biomassa e de ter sido capaz de criar um mercado grande para um novo combustível. Então, são questões que o país tem e pode capitalizar muito em cima delas. Como transferir esse tipo de experiência para outros lugares, para outras regiões, e mesmo a questão de tecnologias? Então, acho que tem um papel importante nessa área de fontes renováveis, especialmente biocombustíveis, e não só da tecnologia, mas também de instrumentos de criação de mercado, de saber como colocar esse tipo de tecnologia numa escala grande.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, G.J., 52, ENG. ELÉTRICO)

Não sujar a matriz significa desenvolver rapidamente uma outra fonte energética. O biocombustível aparece como a solução mais simples: temos terras, tecnologia e a experiência anterior com a cana. Ainda assim, é preciso planejar para que o efeito não seja perverso, inverso ao esperado:

“O biocombustível pode ser solução, mas depende da forma como você faz. Se ele está sendo feito para empurrar a pecuária para a Amazônia, para a pecuária derrubar a floresta, isso terá um efeito dominó, aí não é um bom negócio. Então algumas dessas idéias são interessantes, mas o diabo mora nos detalhes. É preciso ver os detalhes, quem é beneficiado, qual é o mecanismo de acompanhamento, qual é a dissonância. Ou seja, realmente eu estou solucionando, ou eu estou removendo o problema de um ponto para o outro?” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“Se fosse adotado um programa de redução, isso causaria um enorme impacto, a meu ver positivo. Por exemplo, as autoridades governamentais dariam muito mais ênfase às energia renováveis do que estão dando hoje. Se a gente olhar a matriz energética nacional hoje, se verifica que o Brasil tem uma matriz energética boa, porque a energia elétrica é gerada por meio de hidroeletricidade. Mas as outras energias renováveis, que são as energias dos ventos, a captação direta da energia solar, tanto para calor quanto para eletricidade, ou a essência energética, que são praticamente desconsideradas do planejamento governamental... A fixação de metas evidentemente mudaria essas prioridades.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

Para quase metade da amostra, o Brasil é sem dúvida alguma uma potência ambiental, e sua grande contribuição é exercer uma boa gestão da floresta amazônica:

Page 229: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 2 9

“O desmatamento não gera riqueza, o desmatamento destrói as bases culturais da região. Já tem desmatamento demais.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

Ações individuais com ações estruturais

A quase totalidade dos entrevistados (25) acredita que os indivíduos fazem diferença e que o seu engajamento nas questões climáticas é importante.

Sugeriram que mudanças de comportamento e nos hábitos de consumo, maior responsabilidade na escolha de candidatos e cobrança da presença dos órgãos públicos nas questões ambientais são atitudes individuais importantes, seja para fazer avançar a mudança de cultura, seja para promover o novo pacto necessário para o desafio global das mudanças climáticas.

Um dos entrevistados lembrou que é um perigo ficar apenas na visão macro dos problemas. Quem se ocupa da dimensão micro?

“É o começo, é como eu digo, tudo começa na família: é a célula mínima da sociedade; sem mudar a família você não muda uma sociedade por cima; você muda uma sociedade através da sua menor célula . Eu acho que sim, que as ações individuais podem ajudar muito.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, B.B.Jr, 50, ENG. CIVIL)

“Quem convence o vizinho, o sindicato dele? O indivíduo é um elemento importante, não somente na reforma de si mesmo, quando ele então funciona como um exemplo, mas normalmente o indivíduo age no seu entorno. (...) eu acho que a história do comportamento individual influencia no comportamento corporativo e depois no comportamento público. As coisas estão interligadas. O desafio do indivíduo é acelerar esse comportamento pró-ativo, responsável.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

Rever hábitos de consumo, preferir o produto que tenha o selo verde, diminuir o uso do ar condicionado, diminuir o uso do plástico e usar carro movido a biocombustível são algumas das contribuições individuais mencionadas pelos entrevistados para a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Eles destacaram, entretanto, que educação formal e ambiental é condição imperativa para que o individuo consiga agir em seu benefício próprio e em benefício da sociedade que o abriga:

“Eu acho que ajuda, porém a magnitude do problema é tamanha que é preciso um engajamento forte dos governos. Só as atitudes individuais eu acho que acaba sendo meio inócuo. É importante essa posição individual, mas acho que é preciso programas especiais dos governos, muita educação ambiental, muita formação direcionada à redução do consumo, das emissões.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, S.T.C., 60, ENG. QUÍMICA)

Tivemos um único entrevistado, renomado cientista, que afirmou não acreditar em ações individuais como forma eficiente de mitigar as emissões:

O que é preciso são medidas estruturais. Ações individuais só funcionam em época de crise. Em 2001, quando houve uma falta de energia, a população se mobilizou e tomou providências, né?

É como o cristianismo, levou 300 anos para implantar... Quer dizer, você quer mudar as pessoas por dentro, né? Demora.

Page 230: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 0

Eu acho que certamente não é uma estratégia. Seguramente, não vai dar tempo. Estamos enfrentando um problema cuja escala de tempo é a de uma vida humana: 40, 50 anos e conquistar, reformar as pessoas por dentro para que elas não comam tanta carne, não tenham tantos automóveis etc., vai levar mais tempo do que isso.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.G., 80, FÍSICO NUCLEAR)

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

Ações e atividades que mais contribuem para emissões

Para os nossos cientistas, são o “consumo exacerbado de bens e serviços” e “a queima de combustíveis fósseis” os responsáveis pelo agravamento do fenômeno das mudanças climáticas. Ambos os fatores estão disseminados por todas as atividades e são inerentes ao modelo atual de desenvolvimento adotado pela maioria dos países do Ocidente: dois terços da nossa amostra mencionaram esses fatores.

Entre as atividades econômicas, as emissões oriundas da atividade industrial e dos transportes são as principais para os cientistas ouvidos:

“Aí é uma questão de teste. Temos um inventário das emissões de efeito de gás estufa que é publicado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, e efetivamente é o transporte e o setor industrial. (...)” (CIENTÍFICO, ENERGIA, C.B., 55, ENG. ELÉTRICO)

“Seria a atividade industrial, que lança mais gases, principalmente a indústria automobilística.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, J.U.D., 51, ENG. NUCLEAR)

Em terceiro lugar, o agronegócio:

“Eu acho que o Brasil por ser um país ainda muito ligado ao setor primário. Eu diria ser a atividade agrícola, a agropecuária, porque a agropecuária no nosso caso tem um peso muito grande...” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 41, GEOGRAFA)

“Infelizmente a minha querida agricultura vai estar nessa aí. Como atividade produtiva ela fica no olho do furacão...” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, G.D., 64, ECONOMISTA)

O desmatamento e as queimadas apareceram em quarto, mencionados por quatro entrevistados. De acordo com um deles, isso se deve ao fato de que conter o desmatamento é uma questão de política e fiscalização. Já a matriz energética industrial e de transportes exige ações estruturais de alto custo.

Um dos entrevistados, renomada consultora do governo na área climática, questiona a imagem de que a floresta é a vilã das emissões:

“Há um erro aí muito comum, inclusive na literatura leiga, que diz que desflorestamento nos trópicos é responsável por 20 ou 30% das emissões. Não é. É 9%. É 9%. E não estou dizendo que é muito ou que é pouco. É 9. É 9 e não 20%.

Porque historicamente, esses números não foram levantados de uma forma objetiva. Foram levantados pelas estatísticas aí, mantidas pelos governos dos paises tropicais. E essas estatísticas são de má qualidade.

É uma questão de metodologia: o pessoal mistura a pesquisa de campo em áreas onde tem floresta, cujo caso você teria talvez 80, 90 toneladas de carbono por hectare, com mato mais ralo, uma savana, onde talvez você tenha 10 ou 20 toneladas de carbono por hectare. E aí você pega a área de expansão da agricultura e multiplica pela quantidade de carbono

Page 231: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 1

por hectare das florestas, aí o número dá errado.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, S.T.C., 60, ENG. QUÍMICA)

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

É possível compatibilizar desenvolvimento e responsabilidade climática

Embora tenham apontado, em outros momentos da pesquisa, o “modelo” de desenvolvimento como estruturalmente condenado, por induzir ao consumo exarcebado e ser ainda totalmente ancorado na queima de combustíveis fósseis, quando perguntados se é possível compatibilizar metas de desenvolvimento com metas de redução climática, 21 deles disseram responderam que sim, o que nos pareceu surpreendente.

Ainda que algumas ressalvas tenham sido feitas por parte de uns poucos, como a de que é “difícil, mas possível”, ou “não sei responder”, fica a certeza de que, para os cientistas ouvidos, é possível promover simultaneamente o desenvolvimento e a sustentabilidade.

Examinemos as declarações. A primeira delas alude a uma “profissão de fé”, acreditar que o equilíbrio entre desenvolver e preservar é possível:

“Essa é a nossa profissão de fé: buscar o equilíbrio [entre desenvolvimento e preservação] é dizer ‘olha eu tenho que trabalhar, eu tenho que explorar as minhas riquezas minerais, porque tenho que sobreviver ou vou morrer de fome’. É esse equilíbrio que a gente tem que tentar buscar, esse é o grande desafio, a grande responsabilidade da gente. Não pode parar o desenvolvimento, a gente quer continuar comendo, a gente tem que continuar crescendo mas não pode destruir. Temos que buscar o equilíbrio. Exatamente como, não há respostas satisfatórias em nenhum lugar do mundo ainda. Mas e daí? Quando a revolução industrial começou na Inglaterra, ninguém sabia também no que ia dar. Cem anos depois, toda a Europa já era industrializada.” (CIENTÍFICO, ECONOMIA, B.B.Jr., 50, ENG. CIVIL)

Uma cientista menciona um instrumento concreto, o zoneamento econômico-ecológico, sugerindo que a partir de um correto ordenamento territorial é possível promover o desenvolvimento na Amazônia:

“Acabamos de concluir um relatório enorme sobre o zoneamento ecológico-econômico da BR163 (Amazônia). Pensar o território com uma área de intensa produção de gado, de agronegócio nem tanto, não é muito nessa área, a não ser mais para cima, em Santarém, onde há terra, mas é uma área de exploração madeireira, exploração mineral. Então, pensar um programa de desenvolvimento sustentável que respeite um ordenamento territorial, que priorize o aproveitamento das áreas, que verticalize a produção, o uso desses recursos como, por exemplo, a madeira, derivados da pecuária, a cadeia leiteira. Então, desenvolver a economia, gerar empregos, gerar pequenos empreendimentos, médios empreendimentos, é possível, dentro de uma perspectiva de sustentabilidade.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, E.R.C., 55, CIENTISTA SOCIAL)

Conter o desmatamento da Amazônia não impediria o crescimento econômico da região, visto que o desmatamento não contribui para desenvolvimento. Afirmar que o controle das emissões prejudica o nosso desenvolvimento é uma “falácia”:

“É uma falácia você dizer que o controle de emissões no Brasil prejudica o desenvolvimento. Faça-me o favor! Na pátria dos biocombustíveis renováveis isto não é

Page 232: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 2

verdade. Pelo menos nesse setor de energia isso não é verdade. A produção de biocombustíveis renováveis – seja etanol, biodiesel, carvão vegetal renováveis, ou seja, de eucalipto plantado, tudo isso em áreas sem desmatar a Amazônia - isso é ótimo para o Brasil e totalmente possível. Gera emprego em lugares onde não há emprego.

O pessoal planta eucalipto no vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais, uma das áreas mais pobres do Brasil. E ela é pobre não por acaso. Ela é pobre porque não dá nada lá. Só dá pedra no chão. No sertão, você consegue plantar eucalipto lá. Você gera emprego. O pessoal há séculos não tem emprego. O solo é ruim. O clima é ruim. Falta água. Falta tudo, né? Então você gera emprego, quer dizer, é bom socialmente.

Não é emprego aqui na Avenida Paulista. Você gera emprego onde precisa. Lá nos rincões, no grande sertão, como diria o Guimarães Rosa. É bom para combater a pobreza. Eu vejo que não há nenhum problema de compatibilização entre desenvolvimento e gestão ambiental responsável.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, S.T.C., 60, ENG. QUÍMICA)

Os entrevistados sugerem diversas formas de como fazer essa compatibilização, e todas elas passam pela sustentabilidade: “não há outra escolha”. Mas lembram que certas decisões “tomadas no passado”, tais como adotar o modelo rodoviarista, precisam ser revistas:

“Claro, claro que dá. O Ministério da Agricultura inclusive tem discutido isso... E é perfeitamente possível, resgatando outras políticas de desenvolvimento que foram feitas no passado, resgatando melhoria para o homem do campo, para incentivar a produção agrícola. Pode ter uma produção agrícola mais limpa, a própria pecuária, tudo isso está sendo discutido. Agora, não é um setor apenas. Em 1956 o Brasil tomou uma decisão de que o transporte seria rodoviário, encheram o país de estrada. Ótimo, foi muito bom, o país cresceu e abandonamos as ferrovias. Hoje nós estamos percebendo que precisamos de ferrovias.” (CIENTÍFICO, AGRONEGÓCIO, E.A., 50, HIDRÓLOGO)

Os cientistas entrevistados defendem que o Brasil é o país que tem mais condições de gerir um desenvolvimento sustentável, pois tem um grande território com diversidade de recursos naturais, além de uma economia estável.

Por fim, acreditam que a Amazônia é uma importante peça no jogo do desenvolvimento. Conservá-la é diferente de preservá-la:

“Preservação seria uma conservação mais antiga, que prega uma linha de ação que deseja ver a Amazônia como um santuário, um lugar onde nada é permitido. Isso está superado: conservação já é coisa mais dinâmica. Você pode interferir, vai ter áreas, por exemplo, em algumas unidades de conservação de uso absolutamente restrito ou não, e outras em que você vai ter atividade. Você vai ter um mosaico de coisas, é uma coisa moderna com um pensamento muito mais moderno, muito mais dinâmico. Você pode interferir. Acho que acabou aquela coisa romântica [de que] a natureza é bonitinha quando você está na cidade, mas quando está no mato você quer ter energia, água, todo o conforto.” (CIENTÍFICO- USO DO SOLO, O.C.J., 43, ENG. AMBIENTAL)

A Amazônia contém imensas riquezas, não só florestais, mas também minerais. Sua biodiversidade é ainda pouco conhecida e pouco explorada:

“Não tem saída para a Amazônia sem o mercado, sem a economia, sem o desenvolvimento. Não é qualquer mercado, não é qualquer desenvolvimento, mas a região precisa de geração de emprego e renda; então, sem uma economia de mercado vigorosa, que valorize as florestas, os ativos da natureza, que a gente está discutindo agora, serviços ambientais, produtos da floresta com alto valor agregado, não tem saída para a Amazônia. Não tem saída para a Amazônia que não passe por um desenvolvimento rigoroso com base na

Page 233: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 3

floresta, e não tratando a floresta como inimiga.” (CIENTÍFICO, DES. SOCIOECONÔMICO, A.V., 42, AGRÔNOMO)

“A vocação da Amazônia, é uma vocação florestal. É o lugar para ter árvores. Então, teria que ter uma economia baseada em árvores, produzir madeira de maneira racional, de uma maneira correta, e isso geraria muita riqueza para o país. Madeira está valendo ouro.

Ao mesmo tempo, se tem uma biodiversidade imensa na Amazônia, teria que ter excelentes centros de aproveitamento da biodiversidade, biotecnologia baseada em recursos naturais, especialmente em plantas. Nós exploramos pouquíssimo disso até hoje. Ou seja, não ficaríamos na miséria por manter a floresta em pé. Talvez ao contrário, ganharíamos muito como ganham os países da Escandinávia, que têm 70%, 80% do seu território coberto de florestas que eles plantaram e estão entre os maiores exportadores de madeira do mundo, e estão entre os países que têm o maior nível de vida do mundo. Portanto, floresta não é sinônimo de pobreza. Se for bem usada, bem explorada, pode exatamente ser o contrário.” (CIENTÍFICO, USO DO SOLO, F.J.L., 58, CIENT. FLORESTAL)

Para os nossos cientistas, até mesmo biodiesel pode ser produzido na Amazônia:

“Na Amazônia você tem muitas folhas oleaginosas, e estas podem ser exploradas para produzir óleos vegetais, que podem ser transformados em biodiesel. Com isso, [é possível] diminuir o uso de óleo diesel, óleo combustível, derivados do petróleo que emitem gases no efeito estufa, certo?

Não é que usando biomassa você não vai emitir CO2: você emite. A questão é que você considera essa emissão como nula na medida em que a biomassa absorve, na fase de crescimento, essa mesma quantidade de CO2...

Bom, na Amazônia, concretamente, você tem cerca de 70 milhões de hectares já desmatados ao longo de muito tempo e por diferentes atividades econômicas. Essas regiões podem ser reflorestadas com espécies nativas da Amazônia, mas aí você tem que ter um estudo maior, um conhecimento técnico mais preciso. Uma espécie que não é amazônica, mas que se adapta muito bem às condições da Amazônia é o dendê, que pode servir como espécie para reflorestamento, mas a lei atualmente não permite, sendo ela não amazônica. Mas isso pode ser visto, de forma que essa área toda possa ser reflorestada e, com isso, captar mais CO2, e com o óleo de dendê fazer biodiesel, usar energeticamente, evitando consumir derivados do petróleo. Ou seja, soluções existem, é preciso pensar em opções que aproveitem as características florestais da região.

A Embrapa estima que 1 milhão de hectares são queimados, desmatados anualmente por causa dessa agricultura primitiva. São pequenos espaços mas, se somados, são uma grande coisa, né? E se você for ver o modo de vida deles, ver o que é essa atividade, a queimada para a plantação de mandioca, para a produção de farinha, o que isso muda na vida deles? Então, essas plantações de floresta visando exploração de óleo e outros produtos da floresta dariam empregos e poderiam evitar esse tipo de queimadas.” (CIENTÍFICO, ENERGIA, O.C.S., 48, GEÓLOGO)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O setor científico foi o que mais revelou domínio sobre as causas e conseqüências das mudanças climáticas. Mostrou-se também o mais bem informado sobre como o Brasil vem conduzindo a questão nos diversos fóruns nacionais e internacionais.

Page 234: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 4

Para o setor, as evidências apontadas pelos últimos relatórios divulgados já fornecem uma base suficiente para que o governo e os demais tomadores de decisão dos setores público e privado formulem políticas de redução das emissões.

Quanto à questão da “certeza científica”, os entrevistados insistem que “há base científica” consistente sobre a qual agir; no entanto, frisam que a ciência precisa de liberdade e que é próprio do meio científico buscar novas teorias, refutar teses e buscar a precisão que ainda não se tem em vários conteúdos.

O importante é não usar a tese da “controvérsia científica” (que sempre haverá no meio acadêmico) como álibi para a negligência e a inação nesse momento em que há tanto em jogo, talvez a sobrevivência da própria espécie humana.

Para o segmento científico brasileiro, o Brasil tem território, recursos de biodiversidade e economia capazes de sustentar um novo modelo de desenvolvimento. Tem, além disso, base tecnológica avançada nas questões da sustentabilidade e poderá melhorá-la ainda mais, desde que seja formulada uma política nacional do clima que oriente os investimentos em ciência e tecnologia.

Em geral, os cientistas mostram-se entusiasmados com a possibilidade de que o Brasil se torne um grande produtor de energias limpas. Além disso, para eles, a Amazônia é simultaneamente nosso problema e nossa solução: ela é “o ouro verde do Brasil”.

Page 235: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 5

PERFIL DO SETOR

Mais de dois terços da amostra do setor científico são coordenadores, chefes de pesquisa, professores e pesquisadores. Outros entrevistados ocupam cargos de diretoria, presidência, reitoria ou secretaria executiva.

Cargo Cargo Freq.

Coordenador 6

Chefe de pesquisa 6

Professor 5

Pesquisador 5

Diretor 3

Presidente 3

Reitor 1

Secretário executivo 1

Total 30

Dos 30 entrevistados, a predominância foi de homens (26).

Sexo M F TOTAL

26 4 30

A faixa etária predominante é entre 51 e 60 anos, com 14 entrevistados, seguida da faixa entre 41 e 50, com 10 entrevistados. Nota-se, portanto, que a grande maioria dos entrevistados concentra-se na faixa etária entre os 41 e 60 anos.

Faixa etária 41-50 51-60 61-70 Acima de 71 Não respondeu TOTAL

10 14 4 1 1 30

Um terço dos entrevistados dessa amostra são naturais da região Sudeste. A segunda região mais representada é a Nordeste, com 7 entrevistados. A região Norte vem em seguida, com 6 entrevistados, e a região Sul com 4. A amostra ainda incluiu 2 entrevistados estrangeiros.

Naturalidade SP PA PE RS PB MG AM PR RJ SC N/R Ext. TOTAL

8 5 5 2 2 1 1 1 1 1 1 2 30

O grau de escolaridade é altíssimo entre os entrevistados, sendo 18 doutores, 5 pós-graduados, 4 graduados e 3 doutores:

Page 236: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 6

Escolaridade Doutorado Pós Graduado Pós Doutorado Total

18 5 4 3 30

Os entrevistados deste setor são formados em profissões diversas. As profissões mais representadas são engenharia (9), biologia (5), física (4), ecologia (3) e economia (3). Os demais entrevistados se dividem em outras áreas de especialidade, como mostra a tabela abaixo:

Formação Formação Freq.

Engenharia 9

Biologia 5

Física 4

Ecologia 3

Economia 3

Medicina 2

Geologia 1

Sociologia 1

Direito 1

História 1

Total 30

Page 237: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 7

GOVERNO

RESUMO

Para a análise do setor governamental, contemplamos gestores e técnicos das esferas federal e estadual, situados, em geral, no chamado alto escalão, isto é, nos cargos e posições onde estão os tomadores de decisão, os formuladores e os executores de políticas públicas.

No conjunto das entrevistas, percebe-se um alto nível de conhecimento sobre as questões ambientais e de sustentabilidade. Por outro lado, não é possível afirmar que o domínio do tema das mudanças climáticas seja uma regra.

Contudo, independentemente do grau de conhecimento, todos manifestaram preocupação pessoal com o tema proposto. E o setor como um todo demonstra estar num movimento crescente de busca por maior compreensão e de envolvimento na elaboração de políticas, programas e projetos relacionados direta ou indiretamente ao enfrentamento das mudanças climáticas.

Os entrevistados evitaram adotar uma visão catastrofista e acreditam fortemente na possibilidade de reversão do fenômeno através de medidas de prevenção e mitigação. Sabem que cabe ao setor o protagonismo e estão convictos de que a esfera governamental é a instância que deve ter o papel de liderar, em nível nacional, uma grande articulação que vise colocar o país em um esforço mais significativo no enfrentamento da questão.

A pauta desse setor, no que tange às questões relacionadas às mudanças climáticas, é extensa e complexa: abrange desde a discussão sobre modelos de produção e consumo, regulação e legislação, até propostas de como promover o desenvolvimento de novas tecnologias capazes de responder aos desafios. Esses assuntos são, naturalmente, parte das discussões em torno da Amazônia, da nossa matriz energética, da agricultura sustentável e dos biocombustíveis.

“O governo está em tudo” no Brasil, segundo um deles. E, “se não está, o povo não leva a sério”.

A posição brasileira nas rodadas de negociação internacional e o tema da governança são fundamentais para o setor, que participa ativamente de cada impasse, de cada avanço obtido nos encontros no âmbito da Convenção do Clima, que ocorrem de dois em dois anos.

Eles sabem que o tema tem uma ressonância interna e externa e que, a despeito de ser global, o enfrentamento das mudanças climáticas passa por clivagens muito diferentes nos diversos países. O fato de o Brasil “estar na lista dos 10 maiores emissores”, na quarta posição, por conta das queimadas na Amazônia, é desconfortável.

Esses representantes do governo brasileiro, em qualquer das áreas abordadas – energia, economia, uso do solo, agronegócios e desenvolvimento socioeconômico – reconhecem a importância crucial do problema das mudanças climáticas e acenam com um leque amplo de propostas para diminuirmos nossas emissões.

Surpreendentemente, os gestores e técnicos ouvidos têm uma postura aberta, pouco estadista, associando muitas das soluções ao ingresso das forças de mercado.

Para os entrevistados, as questões climáticas e sociais são os maiores desafios da humanidade. Entre as questões sociais, destacaram a pobreza e a falta de eqüidade. Entre os desafios ambientais, a questão mais citada foi a dos recursos hídricos e, em segundo lugar, o “aquecimento global”.

Page 238: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 8

Entre os desafios especificamente brasileiros, os mais significativos, para o setor, são de ordem social, e combater a desigualdade seria uma “prioridade máxima”. Entre as questões ambientais, nossos maiores desafios são evitar o desmatamento, cuidar da água e poupar os solos.

Outro desafio mencionado diz respeito à matriz energética. Para o setor, há uma demanda crescente por energia, e o governo vai ceder à pressão. O setor considera que será bastante difícil não sujar a matriz. Os licenciamentos recentes de termoelétricas e os novos campos de petróleo descobertos pela Petrobras colocam à disposição uma energia barata, “a não ser que as emissões sejam taxadas”. Mas, para os nossos entrevistados, uma política nacional de taxação só virá depois de muita “queda de braço entre o executivo e o Congresso”.

Para os entrevistados, o maior desafio “de longo prazo”, para além dos 20 anos que a pesquisa colocou como horizonte, é trilhar os caminhos para chegar ao desenvolvimento sustentável, ou seja, promover o desenvolvimento ancorado na base triangular: social, ambiental e econômica.

A importância das mudanças climáticas para o setor governamental é evidente: são eles os negociadores nos fóruns internacionais, e são também eles os formuladores das políticas e programas hoje existentes, embrionários em sua maioria, como admitem.

As maiores barreiras identificadas para enfrentar as mudanças climáticas são econômicas: a insegurança suscitada por um tema novo, ainda em estudo, acaba afastando possíveis investimentos. “Os negócios dependem das políticas, e ainda não temos políticas maduras, consistentes”, observa um técnico do Ministério de Ciência e Tecnologia, e que expressa bem a opinião do setor. Em outras palavras, faltam diretrizes que possam orientar investimentos de longo prazo.

Os entrevistados citaram vários projetos já implantados, que levam em consideração a redução das emissões: PRONAF, PROINFA, PROCEL, o plantio direto, o programa de reflorestamento Plantar, o programa brasileiro de biodiesel e, mais recentemente, o programa Territórios da Cidadania, do governo federal.

Outros projetos estão a caminho, “é só uma questão de tempo, de amadurecimento”. Acreditam que em breve o governo dará melhor formulação à proposta do desmatamento evitado e reduzirá tarifas para a biomassa do bagaço de cana, além de ampliar o crédito para a produção de biocombustíveis na agricultura familiar.

O setor governamental está plenamente consciente de que cabe ao governo o protagonismo no esforço nacional para a redução das emissões. Ressaltaram também a importância do empresariado: “Nós fomentamos, mas os empresários é que sabem do negócio.”

Segundo eles, para engajar a sociedade é necessário conscientizar a mídia de seu papel, diminuir o tom catastrófico “que não constrói” e incorporar nas grades curriculares as questões climáticas como tema central da sustentabilidade.

A ação individual é muito importante, segundo os entrevistados, como promotora de uma nova consciência e como incubadora de movimentos sociais mais amplos.

O setor acompanha as discussões internacionais e foi, entre todos, o que mais positivamente avaliou a Conferência de Bali. Acreditam que os Estados Unidos mudaram de postura e ressaltam a liderança européia em programas de redução. Para eles, o Brasil dará sua contribuição e 2009 será um ano decisivo para a agenda do clima.

A proposta de desmatamento evitado é conhecida em detalhe somente pelos entrevistados que lidam diretamente com o assunto das mudanças climáticas no seu dia-a-dia. De modo geral é apreciada, mas os entrevistados reconhecem que requer ajustes, por apresentar muitas ambigüidades quanto aos seus objetivos.

Page 239: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 3 9

A principal responsabilidade atribuída ao Brasil pelo setor no que tange às mudanças climáticas é a redução do desmatamento. Urge uma tomada de posição mais dura e inibidora desta prática por parte do governo. Além da Amazônia, devemos cuidar do nosso modelo de transportes e da nossa matriz energética.

Ao discorrer sobre o cenário futuro, consideraram que o Brasil tem muitas vantagens comparativas: a matriz energética predominantemente limpa, à base de recursos hídricos, a larga difusão dos veículos flex e o alto desenvolvimento em pesquisa de energias alternativas, como biodiesel, etanol e biomassa. E temos ainda território, de modo que podemos expandir nossa fronteira agrícola sem ameaçar a floresta, que tem um valor incalculável. A Amazônia é o nosso “ouro verde”, vaticinou um importante gestor da área de recursos hídricos.

O setor governamental revelou-se um dos mais otimistas. “Recursos nós temos”, o que estamos precisando é de um “choque de gestão”.

Page 240: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 0

ANÁLISE DETALHADA

1. QUANDO OUVIRAM FALAR EM MUDANÇAS CLIMÁTICAS PELA PRIMEIRA VEZ

Tema surgiu no Brasil com “cidades sustentáveis”, mas Rio-92 o colocou na agenda

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez? Antes da década de 80 Na década de 80 Na década de 90 De 2000 para cá Não respondeu TOTAL

3 5 12 3 7 30

Quase um terço dos entrevistados afirmaram ter ouvido falar no problema do clima pela primeira vez na década de 80 ou antes. O debate ainda não tinha a configuração atual, mas já se falava no esquentamento do planeta e nos “gases estufa”. Essa entrada se deu via discussão do “ar nas cidades”, e o contexto era “cidades sustentáveis”, com mais urbanistas preocupados com a qualidade do ar do que ambientalistas ou líderes mundiais.

Mas o tema só entrou na pauta dos gestores e técnicos governamentais, ocupados com questões ambientais ou de sustentabilidade, a partir da Rio-92, quando a Convenção do Clima criou uma agenda de discussão. E foi a partir daí, com todo o histórico de tentativas de fazer os Estados Unidos aderirem ao Protocolo de Kyoto, que o “problema das emissões” passou a freqüentar as agendas do setor. No Brasil, afirma uma técnica da secretaria de Estado do Rio de Janeiro, que já ocupou alto cargo no Ministério do Meio Ambiente: “o tema só esquentou nos anos 90”. Segundo um técnico do Ministério de Ciência e Tecnologia que virou, no Brasil, o ponto focal da Convenção, “só entramos mesmo no problema quando tivemos que realizar o primeiro inventário de emissões, isso foi em 1994”:

As falas a seguir recuperam esse “encontro com o tema” nas décadas de 80 e 90:

“Na década de 80, eu era servidor federal na prefeitura municipal de Porto Alegre e a gente já trabalhava muito com a idéia de uma cidade sustentável. Nós começamos, então, um tipo de experiência com coleta de lixo, separação de lixo, ainda na década de 80, exatamente quando começaram os seminários preparatórios à Rio92. Foi ali que começou a preocupação com os impactos das emissões, das incineradoras e os gases do efeito estufa... Ali começou o debate sobre a não adoção de políticas que poderiam ter impacto não só no local, mas, como elas contribuem, somando-se a várias outras iniciativas, com efeitos positivos ou perversos (...), para o conjunto do clima.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

“Desde 1992 que se discute. No caso era ainda efeito estufa. Basicamente se começou na época do Eco-92. Antes disso já se discutia também, mas eram discussões sobre micro-clima, sobre cidades como México, São Paulo, que precisavam fazer monitoramento do ar. Então, era uma coisa mais restrita, mais especializada, enfim, desde os tempos de estudos sobre urbanismo, como a transformação do espaço urbano contribuía para as mudanças do clima, da temperatura, enfim, isso é conhecido há muito tempo, mas não com a dimensão atual, acho que o primeiro divisor de águas foi a ECO.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

“Foi na Câmara dos Deputados, em um seminário, na década de 90, antes disso quando fiz mestrado, aí li alguns textos a respeito, apesar de não ser minha área de especialidade, mas foi a primeira vez em que ouvi sobre o Protocolo de Kyoto, efeito estufa, entre 95 e 99.” (GOVERNAMENTAL,USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

Page 241: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 1

“Eu entro nessa discussão pelo setor energético. Em 94, com o compromisso do Brasil de preparar o inventário, o primeiro inventário.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO)

Pelos depoimentos de nossos entrevistados, verificamos que a problemática viveu três diferentes momentos: na década de 1980, marcado por um aparecimento precoce, ligado à agenda das cidades; na década de 90, já no contexto das discussões do clima; e em 2007 com a ressonância na mídia global do relatório Stern.

Mas para um dos nossos entrevistados, o fenômeno El Niño colocou pela primeira vez o tema na mídia, explorando a possibilidade de catástrofes iminentes:

“No Brasil, enquanto fenômeno, ele apareceu com o surgimento na imprensa dos artigos sobre El Niño e La Niña, e foi bastante objetivo na abordagem, mostrando como a mudança do clima estava tornando esses fenômenos cíclicos cada vez mais severos e imprevisíveis. E a tradução disso, em uma mudança na expectativa de produção agrícola, na expectativa de segurança mesmo das populações e isso foi bastante trabalhado, traduzido na nossa realidade, e isso há mais de dez anos. (...)

O que acho novidade no processo atual é o enfoque na questão das emissões, dos efeitos, de uma forma mais iminente, produzindo efeitos diretos muito de curto prazo, embora eu considere que esse é um dos aspectos que, no senso comum, estão sendo mal compreendidos. Eu acho que o senso comum tem traduzido isso como iminência de uma catástrofe.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA,M.C., 50, ADMINISTRADORA)

2. NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O TEMA

Técnicos e gestores alegam ter bom conhecimento e sentir-se altamente motivados a aprender mais

Seu conhecimento sobre mudanças climáticas é: Bastante abrangente Bom, mas incompleto. Está explorando e

aprendendo mais

10 12 8

Mais de dois terços dos amostrados (22 entrevistados) declararam ter conhecimento “bastante abrangente” ou “bom, mas incompleto” sobre mudanças climáticas. Oito outros posicionaram-se como “procurando aprender mais”.

“Meu conhecimento eu acho que é o suficiente para perceber que o assunto é sério, absolutamente grave e urgente e que todos os setores têm que fazer algo.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, H.L., 69, ENG. ELÉTRICO)

“Bom mas incompleto. É Claro! Eu acompanho, mas eu não sou um técnico da área.” (GOVERNO, AGRONEGÓCIO, W.G.R., 65, ADMINISTRADOR DE EMPRESAS E ECONOMISTA)

“Eu diria que o meio científico ainda está no meio do processo de construção, de informações, indicadores, modelos de simulação de alterações climáticas, que ainda não são capazes de nos dar certezas das mudanças ou principalmente sobre a escala das mudanças ou a escala dos efeitos. Portanto, eu acho que esse é um tema que teremos

Page 242: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 2

inevitavelmente que continuar muito a estudar, muito a continuar pesquisando e muito a aprender.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, W.G. O, 40, GEÓLOGO)

“Eu acho que estou estudando e aprendendo mais, mas eu ainda tenho muito para aprender.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.F.B., 53, ADMINISTRADOR DE EMPERSAS)

3. GRAU DE MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MAIS SOBRE A TEMÁTICA DO CLIMA

Governantes têm alta motivação para aprender sobre o tema

Como se sente em relação ao tema: Altamente motivado

Motivado, mas tem outros assuntos mais importantes

Não opinou TOTAL

21 8 2 30

Em sua maioria, os entrevistados declararam sentir-se “altamente motivados” a compreender ou tratar do tema das mudanças climáticas. Nenhum deles se declarou desinteressado, mas oito disseram estar envolvidos com outros temas “mais importantes no momento”.

“Altamente motivado, até por obrigação de ofício.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, W.G.R., 40, GEÓLOGO)

“Altamente motivada, não tenho outra palavra, até pela própria característica da função que eu exerço.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, T.K., 56, MATEMÁTICA)

“Eu acho que eu sou o primeiro, porque eu vivo disso, eu vivo de agricultura; vamos dizer, dentro das limitações de tempo, eu sou muito interessado no assunto e estou numa função, hoje, de tomador de decisões ligadas a esse tema, e eu não perco oportunidades para evoluir nisso.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.F.B., 53 , ADMINISTRADOR DE EMPERSAS)

O tema agrada mesmo aqueles que não lidam diretamente com o assunto

“Eu tenho outros temas mais importantes, mas considero esse um dos mais importantes que existem. Eu não sou assim um ambientalista no sentido de cuidar disso profissionalmente. Cuido profissionalmente de outras coisas, mas considero isso uma questão chave, uma questão fundamental.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, H.L., 69, ENG. ELÉTRICO)

4. MAIOR DESAFIO DA HUMANIDADE PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

As mudanças climáticas e as questões sociais

Qual o maior desafio que a humanidade enfrentará nos próximos 20 anos?

Questões Sociais

Mudanças climáticas

Questões ambientais

Desenvolvimento Sustentável Energia TOTAL

7 7 7 6 3 30

Page 243: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 3

Tanto as mudanças climáticas como as questões sociais foram citadas por 7 entrevistados como maior desafio da humanidade. Como questões sociais, a desigualdade é a mais citada, além da fome e da pobreza. As questões ambientais como água, desmatamento e recursos naturais vêm em terceiro lugar. As soluções propostas giram em torno da busca da sustentabilidade e da mudança dos padrões de consumo e modelo de desenvolvimento.

O aquecimento global altera a importância da dimensão histórica da humanidade

“A conseqüência disso, na forma mais radical do problema, são as mudanças climáticas... E as respostas, as soluções para evitar isso, não estão acontecendo nem na velocidade, nem na intensidade com que o tema se coloca. Então, é um momento crítico nesse sentido. Porém, é uma grande oportunidade, porque finalmente a questão ambiental não se coloca mais numa situação onde ela deveria ser enfrentada. Ela deverá ser enfrentada. Está claro que se eu não enfrentar isso, eu não tenho solução. Então, embora essa ficha não tenha caído ainda para todo mundo, ela está caindo a cada dia que passa.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C., 51, BIÓLOGO)

Interlocução, diálogo e consenso para combater desigualdades

O problema da eqüidade, do acesso à alimentação e da fome figuraram entres os desafios mais críticos para a humanidade.

“Incluir os que não estão incluídos, os pobres no Brasil, na América Latina, eles são muitos, estão no campo, então o grande desafio é dar mais equidade, tratamento que inclua essas pessoas e inclua em todos os sentidos: eles têm pouco acesso a educação, pouco acesso aos serviços de saúde, e todos os demais serviços, não é? A grande dificuldade de desenvolvimento, eu falei de extensão rural, mas aquilo que vem antes, que é a informação básica, a educação básica, a informação dos agricultores, o trabalho de apoio de infra-estrutura, de saneamento, de estradas, de comunicação, em grande parte das comunidades rurais ainda não chegou, e é ali que está concentrada a pobreza, então, há de fazer um programa de inclusão dos grandes excluídos, esse é o grande desafio.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, J.G., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

“O grande desafio da humanidade para as próximas gerações é, de um lado, estabelecer uma situação de interlocução, de diálogo que compreenda, que consiga promover a tolerância, o respeito, as diferenças, e ao mesmo tempo combater as desigualdades e a inclusão, que eu acho que são as questões que marcam nosso planeta e a humanidade do ponto de vista histórico nesse período.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA,M.C., 50, ADMINISTRADORA)

Alimentar e educar milhões para uma melhor qualidade de vida futura

“Tentar resolver a questão da alimentação. Eu acho que esse já é de algum tempo. Acho que nesses próximos 20 anos é claro, sem perder a perspectiva de outro. A questão da desigualdade, social, no fundo reflete nisso, a questão da educação. Se você não resolve as suas questões básicas, e a alimentação é questão básica, acho que fica difícil resolver as outras questões.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, A.G., 52, ENGENHEIRO)

“É você fazer com que a gente tenha uma melhor qualidade de vida, de forma distribuída, de forma mais justa com toda a sociedade e ao mesmo tempo não prejudicar as gerações futuras para que elas possam, também, ter a mesma qualidade de vida. Ou melhor, se Deus quiser, essa é a grande meta, é você conseguir distribuir condições de vida, de forma justa e que isso não prejudique as gerações futuras e faça com que elas tenham, na verdade, condições de cada vez evoluir mais, socialmente, culturalmente e assim por

Page 244: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 4

diante, economicamente.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

Garantir as reservas de água

“Eu acho que a água certamente será um deles. Acho que o desafio da humanidade é combater a escassez dos elementos naturais, a água talvez seja um dos principais deles, assim também como a degradação de solo. Estamos falando da questão da poluição, ou seja, da indisponibilidade de determinados recursos em função dos processos poluidores da sociedade industrial e da perda de biodiversidade, acho que talvez esse seja um dos principais fatores a nos afetar, independentemente ou não das mudanças climáticas, acho até que essas mudanças podem vir adicionalmente a isso, mas o processo de exaurimento, ele já esta se dando independentemente de qualquer outra novidade.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

“O problema de aquecimento da terra, do buraco de ozônio, um fator, e um grande que a gente usa e abusa e não pensa como usar, é a água. A água é um grande problema, e o país é gratificado com isso, o Brasil, tem muita água. Mas também, é finita. Se a gente não cuidar daquilo que a gente tem hoje, acaba rapidinho.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.C., 43, ECONOMISTA)

Sustentabilidade

“Desafio é a sustentabilidade, porque hoje você tem o uso de recursos do planeta muito acima da sua capacidade de suporte. Isso aí é o caminho da inviabilidade. A sociedade humana, se continuar nesse caminho, para mim é suicida, porque ela vai tornar a vida no planeta cada vez mais difícil em função da questão da indisponibilidade de água, da questão global, da concentração de gases de efeito estufa na atmosfera. E a gente desenvolveu uma forma de ver que foi estruturada com a idéia de que tudo é inesgotável. As relações de produção e consumo, como estão estabelecidas, elas não são sustentáveis, isso aí é uma coisa clara.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, M.B.P., FUNCIONÁRIO PÚBLICO)

Mudanças no padrão de consumo

“Eu sou otimista quanto ao futuro. Eu acho que o maior desafio não é a gestão dos limites dos recursos naturais. Estes talvez sejam o sinal pelo qual nos vamos enfrentar o nosso maior desafio, que é mudar o padrão de consumo. É mais fácil mudar instituições do que mudar padrões de consumo. É mais fácil recriar modelos de organização social e de representação social e, portanto, reformatar as instituições, e aqui eu penso muito fortemente na questão de refundar a democracia, e ainda acho que ainda é o elemento central dos desafios dos próximos anos. (...)

Se todos quiserem ter um padrão de renda e consumo europeu e americano o mundo não agüenta. Talvez seja assim que se coloca em questão o problema quando ele emerge no mundo, na China e nos países grandes, como o Brasil, ao padrão de consumo grande. Aí o que acontece? Eu diria que a questão, menos que redistribuir, é saber que economia que a sociedade quer.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Questionar o próprio modelo

“Eu acho que a questão climática coloca em xeque o modelo de desenvolvimento, o modelo de crescimento econômico adotado pela humanidade a partir da Revolução Industrial, e que chegou num ponto crítico com essa questão do aquecimento global.

Page 245: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 5

Quando o tema emergiu nos anos 80, se achava que era maluquice de cientista, mas agora, nos últimos dois anos, se tem visto que não, que é um problema sério. Agora mesmo nos EUA, aqueles furacões com força potencializada; aqui no Brasil é muito clara essa questão das enxurradas, as chuvas fortes, cada vez mais freqüentes, e que são fenômenos claros, de acordo com os cientistas, do aquecimento global...

Então, isso impacta, como sempre impactou, muito mais fortemente na população pobre, não é? Quer dizer, quem sofre mesmo com essas enxurradas, com esses transtornos, é justamente a parcela da população mais carente, que vive na periferia, sem infra-estrutura adequada.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

5. MAIOR DESAFIO DO BRASIL PARA OS PRÓXIMOS 20 ANOS

Desigualdade é o grande desafio brasileiro

Qual o maior desafio que o Brasil enfrentará nos próximos 20 anos? Questões

sociais Desenvolvimento

Sustentável Questões Ambientais

Mudanças climáticas

Energia

Outros

TOTAL

13 7 4 3 2 1 30

Um terço dos entrevistados no setor governamental apontaram, como maior desafio para o Brasil, as questões sociais. As questões ambientais também são importantes e figuram em segundo lugar. Alguns associam-na ao desafio do Brasil a sustentabilidade.

“(...) é exatamente equilibrar a relação entre o crescimento econômico, não o desenvolvimento, o crescimento econômico e o desenvolvimento humano. E aí você passa por todas as linhas de crescimento e desenvolvimento da sociedade, seja na área social, ambiental, você distribuir a riqueza de forma mais justa, a hora em que você conseguir quebrar esse eixo, essa espiral que nós temos hoje no Brasil, de o rico cada vez mais rico e o pobre cada vez mais pobre, a gente consiga um maior equilíbrio e, aí sim, conseguir pensar em coisas que são necessárias à sociedade moderna, como também a própria questão de encontrar o equilíbrio do homem no meio que ele vive.” (GOVERNAMENTAL,USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

“Eu acho que o grande desafio brasileiro é reduzir as desigualdades. Acho que a síntese é essa. Acho que o Brasil é um país com um enorme potencial. Eu particularmente não me conformo com um país que tem um potencial tão grande quanto o Brasil ainda ter essas enormes desigualdades sociais, que se refletem nas condições de habitação, de alimentação, saúde e educação. Acho que o grande desafio brasileiro é construir uma sociedade menos desigual.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, L.C.P., 65, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Questões estruturais também foram mencionadas, como educação, segurança e a questão institucional.

“Eu acho que o povo brasileiro tem um grau de entendimento muito próprio, mas o grande desafio brasileiro, na minha opinião, é vencer aspectos educacionais e de segurança.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

“No Brasil, também é o principal, eu acho que no Brasil existe um desafio, que é antigo, mas que é um desafio de concertação política e é um desafio de nível mundial, porque nós temos nossas instituições e elas estão atrasadas com relação às necessidades atuais. Então, isso é um desafio que está ligado ao outro. Talvez esse seja mais importante que as

Page 246: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 6

mudanças climáticas, porque isso tem a ver com governança mundial. Essas novas instituições são muito difíceis de serem realizadas, talvez mais difíceis do que fazer um plano de mitigação razoável sobre mudanças climáticas. Eu acho que são esses dois os principais desafios para as próximas décadas.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, F.B., 50, ECONOMISTA)

O calcanhar de Aquiles ambiental brasileiro é o desmatamento

O principal desafio ambiental brasileiro é controlar o desmatamento, dado que o Brasil figura entre os maiores emissores mundiais de gases de efeito estufa, justamente devido à alteração no uso do solo. O desmatamento, como um entrevistado ressalta, é uma atividade perversa: beneficia poucos e prejudica milhões, quiçá o mundo todo.

“A grande emissão do Brasil é o desmatamento. Então, o grande desafio do Brasil é como parar as emissões por desmatamento, que, na verdade, é um problema, na minha visão, maior do que o que o governo tem colocado. O Ministério do Meio Ambiente, não é o governo, tem colocado, porque eles partem da hipótese que é equivocada, que você controla o desmatamento. E, na verdade, é um processo difícil de controlar, porque é um processo, se você olhar a Europa e a América do Norte, todos eles passaram por esse processo. É um processo associado ao desenvolvimento, daí à ocupação do solo... Isso não quer dizer que a gente deva repetir o que os países desenvolvidos fizeram, mas é um processo difícil, complexo, e acho que não é a solução mais ideal.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO)

“(...) Agora, por outro lado, tem dificuldades dramáticas, tem o processo de desmatamento que, apesar do esforço enorme, apesar das reduções constantes nos últimos três anos, ainda atinge patamares absurdos, o que é uma desvantagem enorme, pois coloca o Brasil como grande emissor para uma atividade que é condenada no próprio país. Quer dizer, nós não somos grandes emissores para produzir energia, o que beneficia a todos – mas não que isso justifique. Mas somos grandes emissores por uma atividade de desmatamento que é condenável no país, que beneficia uma minoria e gera dano para uma grande maioria.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

Preservar os recursos naturais

“Acho que isso inclui exatamente isso: água, biodiversidade. Recursos naturais de uma maneira geral. Água e biodiversidade despontam mais preocupantes (...). A água é um elemento vital para qualquer atividade do ser humano; a biodiversidade se corre o risco de perder antes mesmo de conhecer seu potencial de utilização.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

O Brasil tem um gargalo estrutural

“No Brasil, é a questão de energia. Então, tem a questão da alimentação, saneamento, educação, transporte, quer dizer, infra-estrutura, transporte especialmente.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, A.G., 52, ENGENHEIRO)

Em busca da sustentabilidade

“É... O grande futuro desafio do Brasil é, exatamente, acelerar esse processo que se iniciou de um crescimento sustentável, com redução da desigualdade e que esse crescimento sustentável, com redução da desigualdade, dialogue com as questões ambientais, dialogue com a conservação e preservação da nossa biodiversidade, que transforma o Brasil num país único... nesse novo milênio, do ponto de vista de poder, é transformar os seus recursos naturais num potencial de crescimento numa referência

Page 247: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 7

diferenciada de crescimento e desenvolvimento.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 3, ECONOMISTA)

“Acho que no Brasil essa questão que diz respeito a esse aspecto histórico e filosófico, também esta colocado, agora para que a gente materialize esses objetivos [temos], um desafio muito grande em relação a... constituir uma base econômica, social, política de valores para assentar um projeto nacional e esse projeto nacional, ele inclui tanto os aspectos do relacionamento político, na sociedade, os aspectos da cidadania, enfim, como os aspectos objetivos, da inclusão social. Para mim, essa é a questão mais importante para o nosso país.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA,M.C., 50, ADMINISTRADORA)

Consolidar as instituições é um bom começo

“Então, eu diria que o desafio dos próximos anos será, de fato, consolidar as instituições, sejam da esfera publica governamental, seja da sociedade civil, no sentido de assegurar o efetivo controle ambiental, efetiva construção de uma sociedade saudável.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

O discurso da sustentabilidade prevalece quando o assunto é desafio ambiental

Maiores desafios ambientais Desenv.

sustentável Mudanças climáticas

Questões ambientais

Energia

Questões sociais

Outros

TOTAL

10 6 5 3 1 5 30

A preocupação com o meio ambiente é uma realidade e as perspectivas futuras quanto aos desafios apresentados, apontam caminhos na busca por uma sustentabilidade que associa os temas ambientais com o enfrentamento da pobreza. 10 entrevistados citaram o desenvolvimento sustentável ou sustentabilidade e 6, as mudanças climáticas, como o maior desafio ambiental para as próximas décadas.

“Bom, nós temos diferentes elementos, acho que, inclusive, o nosso debate, ele não observa essas diferenças (crescimento e desenvolvimento), principalmente, relacionadas aos impactos, vamos pegar um caso específico da Amazônia, e algumas entidades tratam, por exemplo, a presença de populações na Amazônia como tivesse o mesmo impacto de grande projetos.

Acho que um equívoco brutal, dificulta o debate, atrapalha debate, e o que a gente tem que conseguir a ter mais clareza de quem são os reais impactantes e, um processo cada vez mais contínuo de conscientização e preparação técnica, tecnológicas, na perspectiva exatamente desse conceito desse desenvolvimento do que nós queremos avançar .

Especialmente, por exemplo, na Agricultura Familiar na Reforma Agrária, nós temos muito que acumular nesses sentido, mas acho que construímos bons sinais, boas iniciativas, que nos permitam o aumento da produtividade, não esteja desconectados da conservação dos recursos naturais, que é o conceito fundamental da sustentabilidade.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

“Então, para mim as questões ambientais, elas estão dentro desses enfoques de valores, de conceber a inclusão social, de conceber os aspetos da sustentabilidade, em relação aos recursos naturais, enfim, para mim, esses desafios estão dentro desse conceito que eu já coloquei. Inclusive os desafios ambientais.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, M.C., 50, ADMINISTRADORA)

Page 248: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 8

Quem paga a conta?

Na opinião de alguns entrevistados, além das instabilidades meteorológicas e eventos naturais incomuns, as mudanças climáticas podem ter um efeito devastador nas sociedades humanas, principalmente aqueles mais pobres, que não têm a capacidade de adaptar às novas condições climáticas. Então, as emissões provocadas por países desenvolvidos podem acabar por prejudicar mais aqueles em desenvolvimento.

“Mudança climática... da incerteza que ela traz.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, I.T., 47, BIÓLOGA)

“Eu acho que grande desafio é a contenção da poluição, da emissão de gases, pela indústria do primeiro mundo. Não há dúvida de que a questão ambiental é gerada pelo progresso no primeiro mundo. A Inglaterra no século XIX, os Estados Unidos, no início dos séculos XIX e XX, a Inglaterra no século XVIII, enfim…

E é natural, que aquilo que se fez de destrutivo ao lado do progresso econômico com a Revolução Industrial, com industrialização acelerada, com o desmatamento generalizado nos países do primeiro mundo, acaba sobrando uma conta para o mundo em desenvolvimento, quer dizer, o que eles nos cobram hoje, eles não fizeram na sua própria existência.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, W.R. 65, ECONOMISTA).

6. IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE AS CIVILIZAÇÕES ATUAIS

Não é hora de alimentar com dúvidas a não-ação

As mudanças climáticas terão impacto nas sociedades humanas. Concorda fortemente Concorda Discorda Não tem informação TOTAL

9 16 2 3 30

A maioria dos entrevistados concorda que haverá impactos nas sociedades humanas e não levanta dúvidas sobre a gravidade do fenômeno. Mas 16 (mais da metade) escolheram a alternativa “concordo”, enquanto nove (menos de um terço) optaram por “concordo fortemente”, mostrando que há zonas a serem melhor entendidas na hesitação ou reticências. As falas abaixo apresentam um leque de ponderações que nos ajudam a entender a natureza das dúvidas expressadas:

“Concordo que o fenômeno é grave e causará impactos... Agora, por outro lado, um tempo atrás eu li um artigo de um físico, que inclusive foi reitor da UnB, o Azevedo, justamente falando que não existe nenhuma evidência científica de que o aquecimento levará a mudanças irreversíveis. Na verdade, o que estaria se passando é um ciclo que ocorre a cada, sei lá, dois mil anos, e a gente está agora justamente nesse ciclo de aquecimento. Depois as coisas podem mudar e vir novamente uma onda de resfriamento. Então, eu acho que as pesquisas continuam, não há graus de certeza sobre as causas, eu sou cauteloso...” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

“Olha, eu concordo, vai ter impacto sim, mas acho só que às vezes as pessoas exageram sobre o que causa esses efeitos. Tem coisas que são causadas pelo homem e outras não são; historicamente, a terra passa por ciclos de mudanças climáticas nem sempre causados pela devastação, tem outros fatores que acabam causando...

Não sou um profissional dessa área, não sei descrever, mas acho que isso tem que ser estudado por quem tem conhecimento e tem desconhecimento, e os políticos têm que saber encarar essas coisas com muita responsabilidade e não apenas politicamente, porque não

Page 249: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 4 9

é questão de ser só politicamente correto, é de realmente buscar um futuro sustentável, porque estaremos colocando o mundo em risco.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

Como vimos, o cerne da dúvida está em aceitar que são os seres humanos os causadores do agravamento do fenômeno das mudanças climáticas.

Selecionamos mais duas declarações que afirmam ser irrelevante do ponto de vista político considerar essas dúvidas, uma vez que o “custo social” e “civilizacional” pode ser alto. Para dois gestores, deve-se adotar o princípio de precaução: não é hora para alimentar a inação com dúvidas:

“Esse assunto é extremamente controverso. O que a gente escuta é que estamos experimentando um período de aquecimento global, e que isso é proveniente das atividades humanas ou não. Eu tenho uma forte desconfiança de que é. Eu aceito as conclusões do relatório da ONU... A minha visão pessoal, a minha crença é a de que a atividade humana faz sim parte desse processo e, por princípio de precaução, temos que tomar as atitudes, uma providência para que isso não se agudize nos próximos anos.” (GOVERNAMENTAL, DES.SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

“Não há duvida que causará impactos, alguns previsíveis e outros não. Eu, enquanto representante do governo, não tenho sequer o direito de pôr em dúvida isso. Eu tenho que agir da forma mais enérgica possível para trabalhar nas duas frentes, não é? Na mitigação dos efeitos e na adaptação, onde podemos já nos antecipar às conseqüências que virão de forma a preparar a sociedade, populações, mesmo ecossistemas e ambientes vulneráveis.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

Catastrofismo não ajuda

O setor, de uma forma geral, rejeita o “catastrofismo” (palavra bastante utilizada pelos nossos entrevistados) que parece imperar no modo como o fenômeno tem sido apresentado à sociedade. Nas afirmações abaixo, observa-se que os entrevistados acreditam na gravidade do impacto, mas têm uma série de dúvidas quanto às possíveis causas e efeitos do fenômeno:

“Eu não gosto muito da estratégia catastrófica que foi adotada nos últimos anos sobre as mudanças climáticas, mas eu tenho de reconhecer que ela tem gerado algum benefício do ponto de vista da sustentabilidade. Eu acho que o debate da Eco-92 em torno da Agenda 21 foi insuficiente para conquistar os corações daqueles que precisam se convencer de que o paradigma industrial e de crescimento econômico baseado no padrão de consumo que temos hoje não vai se sustentar em um mundo que não tem mais abundância de recursos naturais.

Mas tenho medo de que, mais uma vez, estejamos entrando numa rota dominada pelas ciências positivas, onde a ciência, e não a ética dá a palavra final. Ou seja, a catástrofe virá porque os cientistas proclamam...

(...) Eu acho que é de bom tom, para aqueles que militam em políticas públicas de governo, estar sempre com um pé na academia e outro no setor púbico, ficar com o pé no chão, não partir para essa visão terrorista do meio ambiente, pois isso gera um stress desnecessário... As pessoas desejam coisas razoáveis e não coisas extremas. (...)” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

”Os exageros, o tom catastrófico cansa, deixa as pessoas paralisadas de medo. Além disso, podem levar à atitude egoísta e totalmente indesejável em que o fulano pode pensar ‘Ah deixa eu aproveitar, comprar carro, consumir, são os últimos dias de Pompéia’. Pode

Page 250: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 0

ter até exercido um papel, mas devemos nos afastar desse clima de apocalipse que a mídia vem imprimindo [ao debate].” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, I.T.,47, BIÓLOGA).

7. IMPORTÂNCIA DO TEMA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS PARA O SETOR

A importância do tema cresceu nos últimos cinco anos e está na agenda pública

Importância do tema em seu setor de atuação: Muito importante Importante Pouco importante TOTAL

20 9 1 30

Praticamente todos afirmaram que o tema das mudanças climáticas é “muito importante” ou “importante” dentro das agendas do governo e de seu setor específico de atuação.

Independentemente da área selecionada para a sondagem, (energia, agronegócios, desenvolvimento socioeconômico, economia e uso do solo) as respostas foram enfáticas no sentido de afirmar a relevância do tema:

“Não tem como questionar, nas pautas dos parlamentares, nas pautas acadêmicas, em tudo, não tem mais jeito, mudanças climáticas entrou de uma forma muito significativa, porque o brasileiro assimila estas coisas com uma rapidez enorme.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, T.K., 56, MATEMÁTICA)

“De uma forma geral, eu diria que nestes últimos cinco anos, cresceu de uma forma bastante significativa a importância desse tema, tanto na área ambiental quanto fora dela, pois é uma questão que extrapola a agenda ambiental tradicional... Ao mesmo tempo há uma maior capacidade dentro do próprio aparelho de Estado, da esfera governamental, seja governo federal ou estadual, sejam os governos municipais, houve um avanço institucional bastante significativo no sentido da estruturação das secretarias estaduais, no sentido da criação e fortalecimento de secretarias municipais. (...)

As mudanças climáticas têm um rebatimento direto nisso tudo, nas dinâmicas de crescimento, pois em geral o modelo de desenvolvimento ainda é calcado em atividades fortemente impactantes. Por exemplo, fala-se muito de biocombustíveis, mas o que está ocorrendo na realidade, agora mesmo, é o licenciamento de uma porção de usinas hidrelétricas e termoelétricas. Tudo isso nos remete à discussão sobre emissões, sobre qual o modelo de desenvolvimento.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40,GEÓGRAFO)

Para alguns entrevistados, porém, a problemática não alcançou ainda “a devida importância”:

“A problemática ainda é tratada com incipiência, não com a importância que ela deveria ter, até porque ainda não foi concebida uma política, não foi definido qual o comportamento do governo com relação a ela, então nós estamos na fase de discussão e debate, e não ainda na fase de uma elaboração de condutas. Mas nós devemos, em um curto espaço de tempo, tratar esse assunto com maior seriedade. É que no dia-a-dia acabam surgindo outras coisas...” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

“Eu acho que a mudança do clima é um dos temas mais importantes para nós, falando sob o ponto de vista de um desafio global, porque eu acho que esta é a grande questão, ou seja, as questões pontuais eu acho importantes, mas por serem pontuais, elas talvez tenham um tratamento mais fácil, porque você tem um campo de ação muito mais

Page 251: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 1

delimitado. Na minha opinião, o tema ainda não foi abraçado pelos demais setores da sociedade com a devida seriedade que ele demanda... Talvez pela complexidade, talvez porque não seja fácil para alguns setores identificar que ações devem ser desenhadas para reduzir emissões ou mitigar os efeitos que estão sendo anunciados...

O mesmo se dá entre os países-membros da Convenção Quadro do Clima, quase 200. Quando você está falando de uma temática global, você está imaginando um processo de negociação e de consenso entre quase 200 países, o que nos traz uma dificuldade de chegar a um acordo.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, T.K., 56, MATEMÁTICA)

A mesma autora dessa afirmação, experiente negociadora, membro da delegação brasileira na Convenção, completa seu pensamento afirmando que há um hiato entre a urgência que a ciência tem apontado e a resposta dos países:

“(...) há um conflito entre o que a ciência tem apontado, ou seja, a urgência que a ciência tem apontado para a questão da mudança do clima, a necessidade de ações bastante abrangentes de mitigação e a nossa capacidade de resposta.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, T.K., 56, MATEMÁTICA)

8. EM QUE MEDIDA AS METAS DE REDUÇÃO DAS EMISSÕES AFETARÃO AS ATIVIDADES DOS ENTREVISTADOS

Metas de redução das emissões afetarão atividades relacionadas ao uso do solo, agronegócio e energia

As três declarações abaixo são de entrevistados que têm posições no governo relacionadas a setores como uso do solo, agronegócio e energia, e afirmam que esses setores sofrerão, sim, impactos com as metas de redução.

“Com certeza. No caso da secretaria, uma delas é a imposição de novas regras a processos de licenciamento [ambiental]. No caso da região amazônica em particular, metas relacionadas à questão do desmatamento.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, W.G.R., 40, GEÓLOGO)

“[Afetarão] muito, nós precisamos do programa para apoiar os agricultores que preservem, que façam uma agricultura agroecológica. Já temos muitos ingressando nisso...” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, J.L.G., 57, ENG. AGRÔNOMO)

“Poderia sim [ter impacto], lógico, sem dúvida, e é nesse sentido que a diversificação da matriz energética é conseqüência disso, aqui no Brasil.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, H.L., 69, ENG. ELÉTRICO)

9. BARREIRAS IDENTIFICADAS PARA O ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Dificuldades para lidar com o tema

Todos afirmaram que os fatores econômicos são as maiores barreiras para um efetivo comprometimento com a questão das mudanças climáticas pelo governo e pela sociedade de um modo geral. Muito associada à questão política internacional, a questão apresenta a imprescindibilidade de rever paradigmas de desenvolvimento dominantes no presente, como o americano e o europeu.

Page 252: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 2

“São as econômicas, o dinheiro fala mais alto. Então, os EUA, a Europa, ainda representam barreiras maiores. Para nós, por outro lado, também são as [barreiras] econômicas, porque acaba tendo outras prioridades para desenvolver. Eu diria que a principal barreira é a econômica. Antigamente talvez fosse correto dizer que a principal barreira era o desconhecimento, mas não é mais, o mundo inteiro já conhece.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

“Eu diria que nós já tivemos muitas barreiras, muitos impedimentos do ponto de vista institucional, de fragmentação de políticas públicas e iniciativas de enfrentar esse tema. Eu diria que continuamos tendo alguns destes problemas e temos um agravante a mais, hoje, que é o deslumbre pelo crescimento econômico.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

“Eu acho que o grande impedimento é você colocar em xeque todo padrão de desenvolvimento, de crescimento econômico que se tem até hoje; a questão do estilo dos países desenvolvidos, como os EUA, Japão, e a própria Europa. Eles cresceram dentro de um modelo, de um perfil de crescimento econômico baseado em poluição, e para você reverter isso é caro. A própria questão do petróleo, toda uma civilização montada em função do petróleo. Para você reverter isso demora gerações...” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

“Olha, acho que no âmbito mundial, principalmente a postura dos países mais poluidores, principalmente em não fazer uma crítica inteira ou uma autocrítica inteira do que vêm fazendo até então - isso, é claro, é o caso dos EUA. Os EUA virou a maior potência mundial, e deixou um rastro de degradação ambiental e social, brutal. É disso que nós estamos falando, ou seja, se exige um padrão agora para nações que não tiveram essa mesma oportunidade anterior, e os países que chegaram nessa condição não fazem a autocrítica necessária e as revisões. O primeiro elemento é esse. Acho que em segundo, dentro do conjunto das nações, nós temos uma correlação de forças que resistem ainda a esse ideal. Vamos perdendo cada vez menos força, mas vamos perdendo.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

Além da questão econômica, um entrevistado apontou para uma outra barreira que chamou de “fundamentalismo ambiental”:

“Eu acho que nós temos um terceiro elemento que na minha opinião não ajuda, que é um tal de fundamentalismo ambientalista. Que desconecta [os problemas] de um conjunto de uma realidade social, de um contexto social, e acha que à força vai resolver a questão ambiental. Independentemente de que as pessoas estejam passando fome ou não, aí voltamos o caso da Amazônia. Acho que a tese de que a Amazônia é uma redoma, de que não existe ninguém na floresta e não sei o que mais, é uma realidade de quem ignora ou de quem quer fazer a propaganda e quer se manter com seus financiamentos, para ficar fazendo mídia no mundo. Esse aspecto também não contribui para a gente poder enfrentar o tema com racionalidade... Eu acho que tem setores ambientalistas que perderam uma noção de quem pode ser seus aliados, o processo histórico de responsabilidade sobre o planeta e tal, acho isso muito ruim.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

Alguns entrevistados mencionam como barreira para o enfrentamento das mudanças climáticas o próprio discurso catastrófico que se constrói em torno do tema. Reclama-se muito também da desinformação que nutre esse tipo de notícia, por exemplo, sobre a má atuação do governo em relação às mudanças climáticas. E essa crítica recai principalmente nos ombros da mídia, que é acusada de usar esse tipo de notícia para atrair atenção da população.

Page 253: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 3

“Então o cenário. Eles são um pano de fundo de pior caso e a gente trabalha contra esse pano de fundo. A população e a imprensa não entendem isso. Ela, a imprensa, acha que, primeiro, nós não estamos fazendo nada, porque ela não entende o que está sendo feito pela complexidade do assunto. E depois ela não entende que os cenários são cenários de pior caso, que a gente está trabalhando contra eles. Eles acham que isso são previsões, que isso vai acontecer no futuro. E os cenários são para 2100, não são para amanhã. A imprensa passa uma mensagem de que isso vai acontecer amanhã. E um absurdo.”

“(...) a imprensa fala o que ela escuta de fora, o que ela entende, mas não procura o governo para ter uma visão independente. Então acaba expressando opiniões equivocadas. “(GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO)

“(...) eu acho que essas são questões que a gente tem que responder, que não estão respondidas e que a orientação dada hoje pelos setores que estão levantando o problema da iminência das mudanças climáticas com relação a emissões não contemplam. Não contemplam uma visão nacional, não contemplam os aspectos de soberania das decisões e, enfim, fazem uma simplificação que não é por desconhecimento, ela é orientada politicamente, essa é a minha opinião.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA,M.C., 50, ADMINISTRADORA).

10. INCENTIVOS IDENTIFICADOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Propostas do setor

Os entrevistados citaram uma gama de propostas que poderiam ser adotadas como medidas de adaptação e/ou mitigação das mudanças climáticas no Brasil. Onze propostas encontram-se listadas e ilustradas abaixo com falas dos entrevistados.

Desmatamento evitado

“(...) você tem uma realidade social, principalmente na Amazônia, uma realidade social [em que] nós temos lá as maiores jazidas de recursos naturais não renováveis, os minérios que dão todo o suporte, por exemplo, para o crescimento chinês; e junto a isso, em que por conseqüência o crescimento chinês sustenta o crescimento americano. Então essas coisas todas têm conexão, então isto, por exemplo, dada as diferentes realidades que nós temos, no nosso mundo rural, há um deslocamento, uma migração populacional para a Amazônia muito significativa, buscando oportunidades, e que nesse sentido, como essas oportunidades, vão aparecendo na mesma intensidade do que se propala, essas famílias vão buscando formas de sobrevivência. Então, essa é uma realidade que a gente enfrenta na Amazônia...

Então, o plano de desmatamento [evitado], a proposta que o governo brasileiro vem trabalhando, que o Ministério da Meio Ambiente vem trabalhando, ela dialoga muito com esses conceitos. E eu acho que nessa perspectiva, esses conceitos, que obviamente exigem aperfeiçoamentos na estratégia operacional, no entendimento e estão abertos para esse tipo de aperfeiçoamento, mas acho que o conceito é um conceito razoável para nós enfrentarmos o tema da complexidade que ele tem. Quando falamos na Amazônia, falamos em mais de 50% do território brasileiro. Quando estamos falando da Amazônia, estamos falando de 30% da população rural do país. Quando falamos da Amazônia, estamos falando de uma realidade diferente.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 3, ECONOMISTA)

Page 254: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 4

Redução de tarifas para biomassa do bagaço da cana

“A própria questão da energia produzida pela queima do bagaço. Hoje são alternativas que não podemos tratar simplesmente no grau de competitividade. Nada será mais barato que isso. Então, preocupados com a tarifa, o que é correto, nós temos que trabalhar para que a tarifa seja acessível para a população brasileira, para universalizar o acesso à energia elétrica, mas isso não pode ser desculpa para deixar de investir, estimular fortemente as energias alternativas renováveis, que são mais caras no primeiro momento. Aliás, é o investimento nelas o que as tornará competitivas em relação a outras alternativas. Então, o incentivo ao uso de energias alternativas tem que ser muito ampliado. Nós temos que ter muitos recursos públicos nessa área para que ela venha ganhar escala, e aí ela ganha uma dimensão e uma iconicidade próprias que a tornam viável comparada com alternativas como a energia hidrelétrica, por exemplo.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C., 51, BIÓLOGO)

Eficiência energética

“Tem um papel importante tanto pelo fato de que em geral a eficiência energética representa o melhor uso dos insumos, dos recursos de geração energética, e representa também patamares técnicos de segurança para a população e no Brasil. Nós temos ainda um programa de eficiência energética tênue que poderia ter tido uma concepção mais aprofundada e poderia ser expandido tanto tecnologicamente como do ponto de vista de adoção de hábitos de consumo. Esses dois aspectos tranqüilamente nós temos capacidade [de desenvolver] e poderemos avançar muito ainda.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA,M.C., 50, ADMINISTRADORA)

Adoção de projetos de biocombustíveis na agricultura familiar

“Nós estamos fazendo exatamente um estudo. O NEAD está desenvolvendo dois estudos na linha de impacto sociais da adoção, não só em especial do biodiesel, mas relacionado a cana-de-açúcar... Então, acho que à partir desse estudo nós vamos ter condições mais precisas de poder adotar. Na questão especificamente do biodiesel, (...) eu vivi uma experiência que nós ajudamos a implementar no Pará, a partir do óleo de palma, a partir da questão da convivência da agricultura familiar, evitando que se transforme numa monocultura. Eu acho que nós temos experiências interessantes que podem nos permitir não a forçar uma entrada de uma planta exótica, dentro de um ecossistema para gerar biocombustível, o biodiesel ou o etanol.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

Melhorar o transporte público

“O Brasil não tem explorado, infelizmente, até porque faz parte da cultura nas grandes cidades, o uso mais eficiente do transporte público. Nós somos muito ruins no transporte público, se você vê alguém de bicicleta indo para o trabalho você não tem uma visão muito positiva, sempre associa o individuo a não ter dinheiro para ter um carro, não ter dinheiro para o transporte e essas coisas culturais que têm que ser quebradas ao longo do tempo, e fazer como na Europa, [onde] o uso da bicicleta é vista como uma coisa muito positiva, todo mundo usa... Mas a gente tem que melhorar significativamente o nosso transporte ferroviário, o nosso transporte rodoviário, são coisas que o país poderia e teria que investir, e traria uma contribuição significativa em termos de emissões.” (GOVERNAMENTAL,ECONOMIA, T.K., 56, MATEMÁTICA)

Page 255: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 5

Medidas regulatórias e construção de indicadores a longo prazo

“Nesse sentido a combinação das medidas regulatórias e das medidas de incentivo, você vai poder constituir indicadores ao longo do tempo que vão permitir ter uma noção de se a política está correta ou não, se a política está equivocada ou ela não apresenta resultados. E para mim o terceiro aspecto fundamental, é o controle social. Nós temos cada vez mais a sociedade acompanhando, entendendo como é que funciona, estabelecendo uma consciência crítica e racional sobre os temas. A imprensa tem um papel importante; os mecanismos de controle social que o governo possa a vir a criar, a criação de conselhos colegiados, a internet têm um papel importante nesse sentido. Eu acho que são formas de criar mecanismos que não só incentivem a produção, mas gerem retorno efetivo, e que a sociedade saiba o que está sendo feito.” (GOVERNAMENTAL,AGRONEGÓCIO, C.G.G., 3, ECONOMISTA)

Incentivos financeiros

“A gente tem várias. Como eu acredito em incentivo econômico, em subsídios, acredito também em instrumentos econômicos para manter o controle de mercado, sejam eles ambientais ou não. Eu acho que uma política mais acertada é, ao invés de proibir emissão de dióxido em alguns produtos ou coisa assim, eu sou mais favorável a que aqueles que poluam menos sejam incentivados e aqueles que poluam mais sejam sobretaxados, como você faz com o cigarro, por exemplo: se você quer consumir cigarro o problema é seu. Nós estamos alertando, então em cada preço você vai pagar o triplo, o quádruplo de imposto, e aqueles que quiserem consumir isso vão ter que estar, vamos dizer assim, aptos a pagar o preço para consumir aquilo, porque aquele dinheiro recolhido vai ser para políticas que mitiguem o efeito daquele mal. Eu acredito que é por aí.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

Recursos para fiscalização

“Eu acho que esses incentivos já existem. Toda a gama de incentivos que tem aí a essa mudança de utilização de energéticos, todas elas estão sendo incentivadas, então os incentivos já existem nós temos é que ver o resultado. Agora, o que talvez esteja faltando e isso também depende de recursos, recursos humanos e financeiros, e para o acompanhamento e a fiscalização. Mesmo assim, nós temos acompanhamento, em termos de Brasil, acompanhamento até tecnologicamente avançado, via satélite, e que dá pelo menos uma série de informações que permitem ao governo adotar as suas providências. Agora, o problema é que o país é de dimensões continentais. Isto e um continente, não se compara com outros países; a nossa Amazônia ocupa mais de 50% do território nacional. Então realmente são muito difíceis, as dificuldades são imensas por causa das dimensões, e [há também] a falta de logística para fazer toda a fiscalização e um acompanhamento compatível com a sua necessidade.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, D.B.M., 65, ECONOMISTA)

Obrigar produção de renováveis proporcional à produção de não renováveis

“Para cada um... Se você colocar cem você tem mil... Não cem você tem que gerar... Não, para cada mil megawatts você gera quinze megawatts renováveis. É um fator de conversão que eu não sei te informar agora... O cara é obrigado a investir nisso. Ele não vai pagar: ele vai ter que investir numa planta de renováveis, entendeu? Se ele vai contratar alguém para construir uma planta e gerar eólica de quinze megawatts, supondo aqui, o problema é dele.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, I.T.,47, BIÓLOGA)

Page 256: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 6

Remuneração por serviços ambientais

“A remuneração por serviços ambientais há de se criar uma fórmula para remunerar aqueles que preservam as áreas de preservação permanente, que observam a área de reserva legal e que fazem uma agricultura sustentável, ecológica que preservem uma floresta não é?” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, J.G., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

Punição

“A gente trabalha para ter políticas que sejam políticas de incentivo a você fazer mais, não políticas de assustar ou de punir. Há uma mentalidade, e isso está se propagando aqui no Brasil, de que o Brasil tem que ter metas, o Brasil tem que punir tem que ter sofrimento. Eu acho que não é por aí. Eu acho que você tem que mobilizar as pessoas, fazer com que elas entendam, e entendam que o problema é um problema de aquecimento gradual, que você tem tempo para combater esse problema, e você tem que fazer, desde já, ações e criar incentivos para que essas ações ocorram; mas não assustar a população do jeito como está sendo feito pela imprensa e pela opinião pública.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO).

11. ATORES COM MAIOR RESPONSABILIDADE NO ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

Eles mesmos, governantes, são a salvação da lavoura

Na opinião de 25 entrevistados cabe ao governo a maior parcela de responsabilidade, mas ele não pode ser a única solução diante da escala do desafio. Todos os atores da sociedade foram citados: empresários, sociedade civil, políticos e a população precisam estar juntos para lidar com o problema. A mídia foi citada somente por um entrevistado.

Governo

“A gente sempre tem uma tendência a achar que o governo tem que fazer tudo. Em algumas áreas o governo tem mesmo que fazer uma boa parte, acho que a esfera governamental tem um papel fundamental seja na regulação, no controle e no fomento a políticas públicas adequadas. O que a gente percebe ainda são as políticas públicas incongruentes, em que falta integração, e o setor empresarial.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO).

“(...) eu acho que o governo tem uma responsabilidade muito grande porque cabe a ele fazer a política, as políticas públicas. A indústria também. Ela tem que se adaptar e ter uma boa vontade e consciência da questão ambiental e isso indica que tem que usar práticas menos poluentes, investir em maquinário mais moderno e menos poluente etc. E os cidadãos também, no sentido de ter educação, no sentido crítico de cobrança que isso seja aplicado etc.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

“Nós temos três ministérios que têm responsabilidade direta sobre isso: o Ministério do Meio Ambiente, o Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, que é o MDA. Esses três têm responsabilidade direta, em minha opinião, com o mesmo nível de responsabilidades, embora o MMA seja o principal encarregado. Mas estes três ministérios tem essa responsabilidade, em termos institucionais seriam estes três. O próprio empresário tem também, e eu colocaria um quarto ministério, que é o Ministério da Educação.” (GOVERNAMENTAL,AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

Page 257: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 7

Outros atores

“A indústria, os grandes industriais, os grandes banqueiros, ou seja, os detentores do grande capital, os políticos, podem começar a pensar nisso. Os grandes cientistas têm que parar de pensar apenas nas suas publicações internacionais, nos seus conceitos no CNPq e parar de brigar dentro da academia por besteira e começar realmente a estudar as questões do país a fundo, para poder apresentar propostas decentes, conhecimento básico para a tomada de decisões. Os grandes desportistas, sei lá quem forma a opinião.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.R.L., 45, FÍSICO)

“A indústria também. Ela tem que se adaptar e ter uma boa vontade e consciência da questão ambiental, e isso indica que tem que usar práticas menos poluentes, investir em maquinário mais moderno e menos poluente etc. E os cidadãos também, no sentido de ter educação, no sentido crítico de cobrança de que isso seja aplicado etc.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

Mudanças climáticas como um desafio social e cultural

“Olha, mudanças climáticas constituem um desafio social, não é um problema do governo... Passa, portanto, necessariamente por revisão de padrão de produção e consumo. Isso não é feito por decreto, não é feito por lei, nem com o exército na rua; isso é feito por opção, então envolve um debate, uma conscientização, um envolvimento da sociedade de forma objetiva. Depois você tem os setores econômicos, que são os que operam a lógica econômica e que precisam incorporar de forma objetiva padrões diferenciados tanto de emissões quanto de consumo para enfrentar o problema; você tem os governos que têm o papel de liderar e coordenar processos que levem às soluções. O governo tem o poder executivo, legislativo e judiciário, então é na verdade algo que exigirá uma ação... Não existe nenhum setor que tenha mais atribuições, na minha opinião, do que outro. Não dependerá do governo definir normas, dependerá do governo liderar processos. Mas não só o governo, esses processos não são processos de governo, são processos de governança, e o processo de governança é coletivo. Onde o governo tem uma parte, a sociedade tem outra, os setores econômicos têm outra...” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

“Então isso é a cultura que pode fazer, isso é a internet que pode fazer, isso é a mídia, os artistas, é a sociedade organizada.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

12. MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

O bom exemplo europeu

A percepção geral é de que muito pouco tem sido feito pelos países para enfrentar as mudanças climáticas. Poucos conhecem planos ou programas internacionais que visam à diminuição das emissões de CO2. As maiores referências, principalmente no que tange à redução de emissões, vão para a Europa, em especial Inglaterra, Alemanha, França e Noruega. Por outro lado, quando querem se referir à continuidade dos níveis de emissões, países como a China e Estados Unidos são sempre citados. Uma constante é a crítica à posição de negativa dos Estados Unidos perante o Protocolo de Kyoto: tornou-se lugar-comum atribuir culpa à posição norte-americana. Também foi lembrado o exemplo de alguns programas em andamento no Brasil.

“Hoje você tem iniciativas de alguns países que estão enfrentando isso, países como a Alemanha, que vêm enfrentando e assumindo um compromisso cada vez mais intenso,

Page 258: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 8

agora a União Européia também buscando soluções regionais e compromissos fortes, embora haja diferenças entre ações de países dentro da própria União Européia, mas no conjunto assumindo metas bastante rigorosa. Mas muito aquém do necessário, não é?” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

“Bom, com menos responsabilidade do que eu gostaria por parte dos paises desenvolvidos, principalmente os Estados Unidos, com menos responsabilidade. Mas vem sendo tratada nos principais fóruns internacionais, e então há uma discussão política internacional sobre o assunto e isso é bom. Gostaria que avançassem mais rápido, que estivessem mais abertos à agroenergia, ao biocombustível como formas de minimizar, mitigar esses problemas, mas infelizmente a questão econômica acaba pesando muito.” (GOVERNAMENTAL,AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

O mau exemplo americano e chinês

“Como se sabe, com barreiras muito grandes, e em particular a barreira americana. Eu acho um despropósito os Estados Unidos, país que mais polui e se recusa a dividir com os demais a despoluição... Como eu creio que essa fase está passando nos Estados Unidos, eu imagino que a curto prazo haverá outra postura dos Estados Unidos. A China, que também tem uma dívida em relação a isso, mas a atitude é diferente. Eu conheço razoavelmente bem a China e é o primeiro país em desenvolvimento, não é um país desenvolvido, é um país com setores, rincões bastante atrasados, e o que eles estão fazendo é um esforço de ultrapassar certos atrasos.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, H.L., 69, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Eu vejo com muita satisfação por um lado e tristeza pelo outro, porque na verdade o grande problema China – EUA, particularmente até a Rússia andou dobrando um pouco algumas posições, mas particularmente EUA e China ainda estão muito reticentes e têm problemas muito sérios se forem restringir ou seguir determinadas condutas. Ao mesmo tempo, eu acho que mais cedo ou mais tarde serão forçados a isso, apesar de hoje, por exemplo, você ter todo um poder militar bélico por trás [que] esconde uma série de coisas.” (GOVERNAMENTAL,USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

As iniciativas brasileiras

“O Brasil tem uma experiência importante. Agora, esse trabalho aqui no país é muito pequeno, muito concentrado em algumas grandes empresas, estão sempre voltados à questão da rentabilidade, ou seja, não há uma difusão da tecnologia, nem se procura trabalhar com alguns setores mais inovadores, por exemplo, a questão de sustentabilidade de florestas etc., Isso ainda não chegou ao Brasil. É ainda muito centrado na questão financeira, muito vinculado a esses lixões que não têm absolutamente nenhuma tecnologia; o máximo que se faz é “tacar” um cano e botar fogo no metano. Então, para nós aqui no Brasil, apesar de haver vários projetos sendo desenvolvidos, esses projetos são de baixo teor tecnológico. Então esse mecanismo trouxe pouco crescimento tecnológico, pouco repasse de tecnologia.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

“Acho que no Brasil, nós estamos fazendo esforços importantes. A ministra Marina vem conduzindo nesse sentido e nós vamos trabalhando, o governo tende aí, no próximo período, a lançar uma política focada principalmente nas mudanças climáticas,. O MDA está fazendo parte desse grupo, que está começando a debater esse tema dentro do governo. Agora, obviamente não é justo que se cobre de nações em desenvolvimento uma postura, enquanto que, nações mais desenvolvidas não assumem de uma forma mais contundente.

Page 259: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 5 9

Acho que o exemplo da Austrália, recentemente, é muito importante. Quer dizer, a Austrália é um país que sempre resistiu ao Protocolo de Kyoto, arca com suas mudanças climáticas e agora o novo governo da Austrália sinaliza exatamente um outro sentido. E isso nos anima muito do ponto de vista das posturas das nações, respeitadas na sua questão de soberania nacional, mas a preocupação que elas têm é [com a] preservação do planeta.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

13. NÍVEL DE CONHECIMENTO E OPINIÃO SOBRE A PROPOSTA DE "DESMATAMENTO EVITADO"

Poucos conhecem a proposta do desmatamento evitado

A proposta de desmatamento evitado ainda não é uma proposta de conhecimento geral, mesmo dentro do governo. A grande maioria associa essa proposta à idéia de manter a floresta em pé para, em seguida, tecer comentários sobre a complexidade da Amazônia. Na verdade, apenas aqueles que estão mais ligados à questão das mudanças climáticas – cinco entre os 30 entrevistados – demonstram conhecimento do assunto e são da opinião de que a proposta ainda precisa ser melhor formulada para ter o resultado que dela se espera.

“(...) a eventual emissão de bônus ou a conversão desse desmatamento evitado em recursos financeiros para apoiar projetos não pode ser tratada novamente como a criação de mais um imposto federal, a depender da boa vontade do governante da hora para distribuir isto em cotas para os entes abaixo, na escala federativa, se é que se poderia dar este tratamento equivocado à relação federativa.

Acho que a proposta brasileira apresentada em Bali tem um mérito importante de buscar mecanismos e criar esforços para a gente chegar ao bioma inteiro, mas falta ainda nós pactuarmos e construirmos instrumentos de execução de projetos dos recursos advindos do desmatamento, para que de fato sejam capazes de cumprir a promessa de reduzir o desmatamento.

(...) Apresentou-se uma solução muito simplista, de meramente emitir bônus, captar como fundo e esse fundo distribuir por edital. Acho que isso é pouco para ser capaz de responder ao desafio de mobilizar a sociedade no sentido mais amplo de enfrentar o tema e assegurar o cumprimento da meta de redução.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

Um entrevistado ressalta que a proposta de desmatamento evitado serve a um propósito: evitar queimadas. Já no que tange ao seqüestro de carbono da atmosfera para justificar a emissão de outros países, a proposta não faria sentido, porque uma floresta já constituída não seqüestra tanto carbono para ser considerada um mecanismo de desenvolvimento limpo.

“Eu tenho uma dificuldade teórica com esse assunto. Veja bem, dentro da lógica matemática de emissão zero o MDL diz que, se nós avançamos por duas retas com o seqüestro de carbono, isso permite um certificado que outros países podem emitir. Portanto, a soma seria zero para você. Emite mais num lugar, mas você compensa com o seqüestro do outro.

Pelos dados que a gente tem, uma floresta em pé e em equilíbrio não seqüestra carbono, ou seja, o seqüestro se dá num nível muito inferior. Então a manutenção dessa floresta como aval para outros países emitirem não faz sentido e nós não estaremos fechando essa conta.

Page 260: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 0

Agora, faz sentido manter essas florestas e evitar essas queimadas. Aí sim é algo em que o Brasil está buscando uma cooperação mundial que faça com que a floresta em pé tenha um valor econômico de ressarcimento que lhe permita ações internas de atenuação desse problema. Nesse sentido ele faz todo um esforço.

Agora ele não se insere nessa conta de que, portanto, alguém pode emitir mais porque a nossa floresta está em pé, isso não é aceitável.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

14. CONFERÊNCIA DE BALI

Somente aqueles diretamente envolvidos com a Conferência têm opiniões contundentes

Os resultados de Bali são pouco conhecidos por quem não está envolvido diretamente com os debates relativos às mudanças climáticas; estes ainda expressam frustração em relação à conferência, pois ela não trouxe nenhuma meta objetiva de redução das emissões.

Já na visão daqueles que efetivamente participam e acompanham as discussões, a Conferência do Clima em Bali foi positiva, sobretudo no que concerne aos avanços das negociações internacionais na busca de uma agenda de compromissos.

Esses avanços são especialmente valorizados quando se reconhece o grande esforço necessário para promover essas negociações e, como um entrevistado aponta, o consenso entre visões e realidades tão diferentes dos tantos países envolvidos.

“Então a negociação em Bali é necessariamente difícil por causa disso, porque os países olham o que o IPCC está falando, numa visão baseada nos nossos conhecimentos, que são necessariamente diferentes. A gente pensa em floresta, e a Arábia Saudita não sabe o que que é floresta, é um deserto. (...)

O que você busca em Bali é como você mantém essas visões diferentes dentro de um consenso, que leve para um objetivo comum para todos de tentar atenuar o problema gradualmente, mas seguramente ao longo do tempo.

Então, o fato de a gente ter conseguido sair com um cronograma de trabalho. Claro que, para a imprensa, de novo, com a visão de que o problema vai acontecer amanhã, e você tem que fazer tudo e resolver amanhã, foi um horror, um fracasso. Mas [existe outra] visão de que o problema é de 2100 e que você está trabalhando desde já para evitar que isso aconteça.

O fato de você ter um programa de trabalho para os próximos dois anos, para aprofundar a ação, é extremamente positivo. E que todos os países estejam envolvidos nessa negociação é mais positivo ainda. Inclusive, agora, os EUA. Então, eu acho que o problema vai ter um sucesso por isso. Claro que não é um sucesso do ponto de vista da imprensa, porque não tem metas. Tem que ter dor, tem que ter sofrimento. Lá ninguém está discutindo isso.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO)

“(...) quando o Brasil saiu daqui para Bali, saiu com duas expectativas principais: uma, era com relação a ter, em Bali, a definição de um roteiro que permita que a gente, até 2009, discuta o que vai ser o pós-2012.

Então, saímos daqui com expectativa de que se isso acontecesse, se esse roteiro de Bali saísse, já dando as diretrizes, o arcabouço para que nós, dentro do processo de

Page 261: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 1

negociação formal, possamos construir a base do pós 2012, até 2009, já seria, para nós, fantástico..

E a outra questão era a gente ter uma decisão com relação à temática de redução de emissões por desmatamento em Bali, que a Convenção previa que deveria ser terminada em Bali com uma decisão. Então, as duas questões eram muito prioritárias para o Brasil e, na nossa visão, o encaminhamento desses dois temas, em Bali, daria uma maior ou menor percepção de sucesso.

Ambos os temas tiveram uma decisão em Bali, o que não foi fácil com nenhum dos dois, mas efetivamente saímos de Bali com uma decisão tomada, tanto no roteiro a ser seguido, que não necessariamente será, mas foi o roteiro mais ambicioso, o mais encorajador que poderíamos ter, mas saímos, quanto com o acordo de todos, inclusive os EUA, certo?

E saímos com uma decisão das florestas também. Então, para mim, Bali deu inicio, nas nossas expectativas de negociadores e de pessoas que sabem como é que a dinâmica de negociação se dá. Nós achamos que os resultados foram positivos, pois nos dão a indicação de uma forma de operar nos próximos 24 meses, até chegarmos a dezembro de 2009. E é interessante também, porque a presidência dessa discussão, desse grupo que se constituiu para discutir então o pós 2012, ela ficou a cargo do Brasil, na figura do ministro Luiz Figueiredo, do Itamaraty.

Então, o Brasil vai estar à frente deste processo de negociação formal, na constituição deste grupo.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA,T.K., 56, MATEMÁTICA)

“A percepção de Bali depende da expectativa anterior que se tinha. Então, o resultado não é melhor ou pior do que vai acontecer no futuro, mas ele foi melhor ou pior para as pessoas, dependendo da expectativa que tinham.

Quem tinha expectativas realistas, base nos cenários que tinham, em geral tem uma opinião de que Bali foi um avanço importante. Eu estou nesse grupo. Quem acompanhou, nos dois últimos anos, o que estava acontecendo no debate, (...) era para ser um fracasso total – a lógica era de que não ia ter, não era para ter um acordo. E os muito otimistas, ou porque não estavam querendo ser realistas, podem ter sido decepcionados. O primeiro avanço, três coisas que eu acho que são chaves:

Primeiro, é que o que importa é que ele foi assumido com uma sinalização de que teremos que ter metas... Uma meta, uma visão de onde a gente quer chegar, mais agressiva com os EUA, assim on board, e numa situação em que ele não tem qualquer outra alternativa que não seja entrar para valer no sistema.

Segundo, os países, digamos, emergentes, que são a grande preocupação atual (leia-se China e Índia nesse caso, porque o Brasil sustentou uma posição neutra, naturalmente, durante a reunião); e China e Índia toparam que nós devemos ter também responsabilidades, ainda que não seja obrigatória e tal, mas vai ter, então ela vai se tornar algo mais forte. Essas duas convergências são importantes. Principalmente são mais agressivas e tal, e porque não tinha mais condições de fazer, mas nós vamos chegar nesse caminho.

E o terceiro tema é que floresta entrou de volta para este debate, como floresta e não como o debate sobre desmatamento, que eu acho que seria muito equivocado. Então, eu acho que esses três aspectos eles, digamos, deram um novo fôlego para esse debate .

Mas a solução real do campo vai acontecer por outros acordos que vão acontecer em torno disso, acho que iniciativas outras que vão acontecer, com os países líderes e coisas

Page 262: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 2

assim. É fundamental o processo multilateral, porque ele mantém, porque ele vai evoluindo, o conjunto da sociedade para, em estágios diferentes, ainda que são muito mais lentos do que a gente pode fazer.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, T.A., 35, ENGENHEIRO)

“(...) A dificuldade, o dilema, o fascínio dessa negociação é que ela tem que ser consenso. Então, eu não tenho como convencer na força, tem que convencer no argumento, na política, até no constrangimento. Mas eu tenho que convencer, não é? Então, são processos muito doloridos, demorados, irritantes para quem quer resultado, como a gente.

Mas havia, ali, um risco de, de fato, colapsar o sistema, por essa posição quase que intransigente de alguns países decisivos, de que não queriam entrar na agenda, mas também por um movimento que começava a se esboçar, de se criar um processo paralelo liderado pelos EUA, que queria abrir uma discussão envolvendo os maiores emissores e criar um processo em paralelo.

Então, havia dois movimentos ali muito complicados: uma dificuldade enorme da Convenção de evoluir e um movimento querendo descolar, levando esse debate para fora do multilateralismo, o que seria uma tragédia. E Bali, na minha visão, apesar de tudo foi capaz de reverter isso; ela matou as iniciativas bilaterais, tanto que a reunião que ocorreu liderada pelos EUA no Havaí foi uma boa reunião, não é? Uma surpresa para todo mundo...” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

15. RESPONSABILIDADE DO BRASIL DIANTE DAS QUESTÕES CLIMÁTICAS

Reduzir o desmatamento é a principal responsabilidade brasileira

Sem dúvida alguma, o desmatamento é visto como o maior problema brasileiro, e seu combate através de medidas regulatórias é a nossa grande responsabilidade no cenário internacional. O Brasil pode desempenhar outro papel importante: por ser líder em tecnologias de combustíveis renováveis e possuir grandes quantidades de recursos naturais, pode criar alianças frutíferas com outros países do “Sul”.

Outras responsabilidades mais pontuais envolvem reduzir as emissões provenientes da matriz energética e dos sistemas saneamento.

Um entrevistado, entretanto, adverte que as responsabilidades do Brasil não são tão grandes quanto as dos países desenvolvidos fato este que, segundo ele, é constantemente destorcido pelos interesses políticos de veículos de mídia internacionais.

Desmatamento

“Acho que primeiro cabe ao Brasil mesmo, não querendo assumir a postura do governo brasileiro, de responsabilidade solidária com o planeta, mas historicamente definido como um país que tem uma responsabilidade menor em relação às emissões históricas. Portanto, é cobrada a diferenciação das responsabilidades: todos somos responsáveis, mas diferentemente responsáveis;

(...) O combate ao desmatamento, sobretudo na Amazônia, talvez seja a ação de maior fôlego para redução das emissões, porque o desmatamento e a conversão de florestas no Brasil correspondem, hoje, seguramente a mais de 30% das nossas emissões internas.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

Page 263: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 3

“É, o Brasil precisa assumir isso como uma diretriz clara. Na realidade, a Convenção de Mudanças Climáticas, ao aprovar o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, criou esse princípio, que foi mal utilizado. Esse princípio prevê que todo mundo tem responsabilidade e todo mundo tem que reduzir; uns mais que outros em função da contribuição histórica.

Tudo bem, ele é um princípio que não pode ser considerado inaceitável e incorreto. Porém, o nosso problema não é mais saber quem emitiu mais, quem emitiu menos. O nosso problema é a sobrevivência da humanidade. Então, esse princípio, esse mecanismo, jogou países em desenvolvimento como o Brasil, que tem um peso importante, China e Índia, que têm um peso monumental, África do Sul etc., num processo de negar...

Embora sem negar explicitamente a responsabilidade, na prática, sem assumir responsabilidade. Então, o Brasil precisa sair dessa, mesmo porque o Brasil tem bons resultados. O Brasil tem processos positivos, ele tem uma matriz energética limpa, tem a questão dos biocombustíveis, que constituem uma alternativa caso a gente consiga efetivamente garantir a expansão em bases socioambientais adequadas. O esforço na redução do desmatamento, se a gente avançar de forma firme numa redução expressiva, é uma enorme contribuição.

Então, o Brasil tem uma situação muito positiva porque, na realidade, pode reduzir a sua emissão sem comprometer decisões que ele já tomou, ou seja, o Brasil já tomou a decisão que não quer desmatamento. Essa decisão foi tomada pela sociedade brasileira, foi manifestada permanentemente. Essa decisão foi tomada pelo governo brasileiro e pelo setor empresarial esclarecido.

Então, o desmatamento é algo que o Brasil reconhece como um equívoco que ele tem que eliminar. Se nós eliminarmos o desmatamento, nós passaremos a uma posição muito confortável em termos de emissão; nós cairemos lá para baixo.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

“Acho que deveríamos investir no controle do desmatamento, fortemente, e devemos fazer isso por conta própria, eu sou meio contrário a interferência internacional a esse respeito, até porque eles não são um bom exemplo e aturar palpite de mau exemplo é dose. A responsabilidade é nossa, o governo tem essa responsabilidade e deveríamos estar encarando isso com firmeza, acho até que estamos, o Ministério do Meio Ambiente, o Congresso.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

Cooperação Sul-Sul

“Em primeiro lugar, eu acho que não pode o Brasil ser tratado numa lógica de uma área internacionalizada, e aqui estamos falando especificamente da Amazônia, onde querem imputar restrições sem conhecer as condicionantes, sem saber de todos os fatores restritivos históricos.

Por outro lado, o Brasil tem sinalizado, em diversas manifestações, em diversas atitudes, a sua preocupação em não só, ser protagonista do tema, mas fazer a sua parte. Então, quando o Brasil se preocupa em estabelecer uma Política Nacional em relação às mudanças climáticas, quando já vinha adotando medidas restritivas importantes, na questão do desmatamento, seja aumentar ou aperfeiçoar os mecanismos que o CONAMA estabelece na questão de licenciamento ambiental, eu acho que são sinais importantes e relevantes que tem que ser observados.

Eu acho que nesse sentido o Brasil dá um bom exemplo, que pode ser usado como referência importante. Além disso, acho que o Brasil tem feito algo muito importante, que

Page 264: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 4

é poder dialogar com outras nações que se enquadram e que estão nesse mesmo patamar que o Brasil e todo o esforço do governo brasileiro tem feito em relação à África, por exemplo, ela nos permite estabelecer e construir novos paradigmas de produção e de crescimento econômico, já dialogando com essa questão da conservação da biodiversidade.

A África também é riquíssima nesses aspectos da questão dos recursos naturais, sejam renováveis ou não renováveis; e eu acho que o Brasil pode, nessa interlocução Sul-Sul, ir deixando cada vez mais claro aos demais países quem está fazendo a sua tarefa de casa, e, na minha opinião, vem fazendo de alguma forma, dadas todas condicionantes e restrições que tem.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 3, ECONOMISTA)

“Para você criar mecanismos que realmente dêem impactos. E uma outra coisa que o governo brasileiro é contra, mas eu particularmente sou a favor, é de que os países em desenvolvimento também tenham metas. Porque hoje os países em desenvolvimento, como China, Índia e Brasil, têm um grande potencial de poluição.

Então, por exemplo, se China e Índia tiverem o padrão que estão buscando, um padrão de desenvolvimento dos EUA e da Europa, a gente está “lascado”. É por isso que a gente, também, tem que se comprometer com metas, com mecanismos limpos etc. Nesse aspecto, o Brasil deu até um passo importante na questão de biocombustível.

O Brasil tem grandes vantagens: tem uma matriz energética muito limpa, baseada principalmente em hidrelétricas, tem estoque de petróleo grande, os biocombustíveis, os carros flex... Então, isso tem um impacto, pelo menos um efeito demonstrativo importante.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

Outras responsabilidades: fontes renováveis de energia, transporte coletivo, valorizar a floresta em pé, reduzir emissão dos lixões, otimizar o uso de recursos hídricos...

“Em segundo [lugar], ampliar a produção de combustíveis de fontes renováveis, a partir de sistemas de produção que sejam sustentáveis do ponto de vista ambiental e social e, em terceiro, fazendo um grande programa de reflorestamento capaz de seqüestrar volumes expressivos de gás carbônico, retirar da atmosfera volumes expressivos de gases que causam o efeito estufa.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.V., 47, ENGENHARIA FLORESTAL)

“Bom, eu acho que, no mínimo, privilegiar o transporte coletivo, ao invés do individual. Brasília, por exemplo, é uma cidade em que o transporte é muito individualista. E isso se faz basicamente por quê? Para mim, que moro perto, relativamente perto, é muito mais barato vir de carro e sozinho do que se eu pegasse um ônibus. Então, isso do ponto de vista ambiental é um absurdo. Teria que ter algo para fazer você pensar duas vezes: ir de carro para o trabalho é muito caro. E aqui em Brasília, você conhece, não é? O engarrafamento está ficando impossível, e isso aconteceu nos últimos dez anos.

Outra questão é a da Amazônia; eu acho que teria que ter uma política bastante rigorosa na questão da preservação, na questão de você criar mecanismos de auto-sustentabilidade; não deixar a região à mingua. Você tentar valorar, dar valor à mata em pé....

Desenvolver tecnologia para esses lixões, que são os grande emissores de metano, e as questões de dejetos suínos de empresas.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

Page 265: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 5

“É que recursos hídricos é uma espécie de área de conforto no que se refere ao exame dessa questão, porque, qualquer que seja a constatação, há evidências de mudanças climáticas, há indícios fortes de que essas mudanças decorram das atividades humanas. É importante se conhecer o cenário em que se trabalha. Mesmo que o cenário fosse o oposto, o nosso papel seria sempre o mesmo: observar a natureza na verdade. Observar e medir esses recursos hídricos para reforçar essas diferenças, esse é nosso papel primordial; monitorar chuvas e vazões, estabelecendo hipóteses reforçando linhas de pensamento presentes nas discussões.” (GOVERNAMENTAL, DES.SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

Mas a responsabilidade do Brasil não é tão grande assim...

“O Brasil tem uma responsabilidade muito pequena, porque a responsabilidade não é a emissão atual. Esse é um outro equívoco que as pessoas, aqui no Brasil, repetem muito. A responsabilidade pela mudança do clima, aí é a complexidade do tema. O que faz o aquecimento global, na verdade, a emissão se acumula na atmosfera, as moléculas ficam na atmosfera durante muito tempo.

Então, é diferente de poluição local... O que nós estamos discutindo, hoje, é tudo que foi feito desde a Revolução Industrial. O que nós estamos fazendo, hoje, vai ter implicações para as sociedades futuras. Então, a responsabilidade não é a emissão anual.

A imprensa associa, por causa da poluição local, a responsabilidade à emissão. No caso do efeito estufa, não. Você tem que fazer o cálculo dessa acumulação. O que é que você fez há 200 anos atrás, desde a Revolução Industrial, o que isso gerou de concentração e qual o dano que isso está causando agora e para o futuro? Então você vê que é difícil.

A imprensa e alguns países tendem a querer colocar a responsabilidade no Brasil pela emissão atual, porque a nossa emissão é alta. O que a gente fala é, olha, cuidado, porque a responsabilidade não é pela emissão. A responsabilidade é pelo que eu contribuí para aumentar a temperatura ou o que eu contribuí para aumentar a concentração.

E o quê as pessoas não entendem é isso, por causa disso. Nós contribuímos muito pouco, porque o nosso processo de desenvolvimento é recente. A industrialização no Brasil começa mais rigorosamente desde 1950, e mesmo o desmatamento começa em 1970. Se você comparar com a Europa, o desmatamento da Europa é no século XV, no século XVI, XVII. Dos EUA, no século XVIII. Então, eles contribuíram muito mais.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, J.M., 60, AGRÔNOMO)

Devemos exportar a experiência brasileira...

O Brasil é exaltado por alguns como um exemplo, um país capaz de mostrar ao mundo técnicas capazes de diminuir as emissões sem afetar o desenvolvimento. Afinal de contas, o Brasil ainda possui muitos recursos que os países desenvolvidos já esgotaram há muito tempo, e o país pode usá-los a seu favor.

“O Brasil protagoniza, em temos de políticas ambientais e setoriais. Temos sido marcados por sermos uma nação que ainda pode oferecer ao mundo algumas coisas que o mundo não consegue mais ter, nós temos ainda, apesar de todos os problemas de preservação ou conservação de nossas florestas, nossos rios, nós ainda temos os rios, temos as florestas, que alguns lugares do mundo já não têm mais, então, apesar de sermos acusados de muitas coisas, eu acho que não estamos em situação de ficar calados, porque eles já fizeram piores, agiram de forma pior e, claro, agora querem evitar que a gente faça, mas ou a gente assume um papel de protagonista ou vamos ficar levados a decisão alheia, e nesse ponto eu acho que, desde o inicio da década de 90, o Brasil vem se preocupando em

Page 266: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 6

tentar participar de forma efetiva dos fóruns internacionais, porque a gente cuida do meio ambiente, e nessa área, particularmente efeitos climáticos, está na hora de cair de cabeça e tomar a frente, e com a capacidade que a gente tem, criatividade que o povo brasileiro tem, procurar soluções mais reais, e menos assim.” (GOVERNAMENTAL,USO DO SOLO, C.S., 35, ECONOMISTA)

“No Brasil é uma coisa assim extraordinária, é o único país do mundo que vende álcool nos postos de gasolina como combustível sozinho e é o único que mistura com a gasolina na proporção de 25%, quer dizer, tudo isso é um combustível renovável, é um combustível de origem vegetal. Precisamos trabalhar por isso aí.

O que não podemos é não ter a pretensão de exportar a experiência. Certo discurso que existe por aí afora, que a produção do etanol termina prejudicando as áreas de produção de produtos hortigranjeiros, não é verdade para o caso brasileiro, mas é verdade para o caso deles, para o caso dos Estados Unidos, por exemplo; para produzir o milho, eles fazem o álcool na base do milho. Não é o nosso caso, nosso caso é bastante diferente, essa é uma coisa em que nós podemos avançar mais. Eu acho que outro problema é de ter uma posição ofensiva de liderança no fórum internacional defendendo esse tipo de comportamento.” (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, H.L., 69, ENGENHEIRO ELÉTRICO)

“Eu acho que o Brasil tem tido iniciativas bastante importantes, tem um imenso campo para avançar nesse tema de contribuição com as reduções. Uma delas, obviamente, tem sido o esforço de explorar novas matrizes energéticas, o próprio biocombustível, com todos os problemas associados que tem no campo social, fundiário ou outros, e o Brasil tem que encontrar meios de enfrentar estes riscos, agora obviamente uma matriz energética renovável como o Brasil já avançou bastante significativo, pode ser importante.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40,GEÓGRAFO)

“Eu acho que o Brasil pode ser um laboratório de uma nova sociedade por diversas razões. Primeiro porque somos uma sociedade plural, étnica e culturalmente. Somos também uma sociedade cujas as perdas materiais, por manter a sociedade em um padrão típico de consumo, são clássicas de um capitalismo do fim do século passado, século XX. [Reverter] isso nos custaria menos.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

16. IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES INDIVIDUAIS

A ação individual é de extrema importância

Apenas um entrevistado afirmou não acreditar no potencial das ações individuais como elemento importante na transformações de hábitos para o enfrentamento das mudanças climáticas.

“Não, eu não acredito nisso não. Eu acho que ações voluntárias são importantes, têm uma escala e tal, mas, temos vários exemplos onde não tem um esforço de coordenação de iniciativas, você não tem uma pactuação consistente, coerente, seja em âmbito planetário, seja em âmbito nacional. É muito difícil que aquele seu esforço individual tenha efetividade. Ele pode funcionar como um bom exemplo para aparecer numa televisão...” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

Os demais entrevistados concordam que a ação individual tem um efeito demonstrativo e contribui para a mudança de comportamentos e de “consciência” em escala mais ampla.

Page 267: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 7

“(...) O grande desafio futuro da humanidade vai ser mudar o seu padrão de produção e consumo, quer dizer, o padrão que o planeta aborda hoje, tem visivelmente um horizonte de curto prazo. E o principal elemento para tencionar a mudança no padrão de produção, é mudar o padrão de consumo.

E isso é uma ação que depende de cada individuo, claro. Ela é motivada pela coletividade, ela pode ser acelerada por ações coletivas, agora, só alcança a efetividade quando adotada individualmente.

Esse é um primeiro grande desafio, de criar um processo onde cada um de nós, seja a partir de sua ação pública, seja a partir da ação do cotidiano da sua vida privada, adotar um modo de vida e um modo de se relacionar com o meio que seja menos indutor de consumo, de combustíveis fósseis, por exemplo, menos emissor, menos degradador.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

“Eu acho que elas podem ser muito importantes, principalmente se elas tiverem a legitimidade de corresponderem a setores sociais que não estão sendo ouvidos. Então, eu acho que esse é um aspecto importante.

E outro aspecto importante desse papel individual é o papel do gestor. É indiscutível que os gestores públicos no país têm uma capacidade importante de curto prazo de interferir sobre decisões, então eu acredito que é importante também que exista, digamos assim, um setor que acaba sendo privilegiado nas decisões de importância para o tema.

Então, sem dúvida, a sua boa ou má condução é de grande repercussão”. (GOVERNAMENTAL, ENERGIA, M.C., 50, ADMINISTRADORA)

“Elas têm [importância], não pelo que elas fazem, mas elas têm pelo que elas conseguem mudar de consciência. Eu acho, por exemplo, que cuidar de lixo seletivo, cuidar de um nível de consumo individual que prescinda de insumos que são decorrentes desse processo industrial todo, tanto a dona de casa que vai fazer compras e abre mão do saquinho de plástico e leva sua sacola e traz, em tudo isso o impacto direto é quase nulo. No entanto, o impacto na consciência e na formação de opinião eu acho que é relevante, porque é a única forma da gente atingir os nossos dirigentes e conseguir mudar as escalas de intervenção do poder público, então é um trabalho de formiguinha, que mesmo sendo sem importância é transformador a longo prazo.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

17. ATIVIDADES ECONÔMICAS QUE MAIS CONTRIBUEM PARA AS EMISSÕES

Agropecuária é a que mais contribui para as emissões

As entrevistas ressaltaram um conjunto de atividades que mais contribuem para as emissões de gases de efeito estufa no Brasil.

Em primeiro lugar, isolada, situa-se a expansão da atividade agrícola, que provoca desmatamento e queimadas. Em segundo lugar vem a preocupação com o setor secundário de produção industrial e energética com recursos não renováveis. Em terceiro lugar, figurou uma preocupação com a questão urbana, não só pela matriz de transportes, mas pela lógica de consumo que ela promove. Alguns entrevistados também citaram o padrão de desenvolvimento atual como o maior problema para as emissões de gases de efeito estufa.

Page 268: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 8

Expansão da fronteira agrícola

“O desmatamento, que é resultado da expansão da fronteira agropecuária. A indústria automobilística... Não é a indústria automobilística, na verdade: é o transporte, a opção do transporte. A opção permanente e continuada de transporte individual em vez de coletivo. Esse é o segundo fator dramático. E o consumo de energia elétrica sem políticas de conservação da energia elétrica.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, J.P.C. 51, BIÓLOGO)

“Bom, o primeiro, aqui no Brasil, é a questão da queimada. Talvez a questão da poluição dos grandes centros, como São Paulo e Rio. E qual outra? Bom, essa questão seria a da poluição por área, e a outra a poluição industrial.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

“O desmatamento, a agropecuária, o transporte e a gestão pública inadequada, ou seja, o governo que não deixa de ser o setor, assim como a agropecuária, que seu comportamento tem reflexo, assim como os transportes, a estruturação estatal se reflete, o setor publico federal e estadual não estão prontos, preparados para o enfrentamento daquela situação.” (GOVERNAMENTAL, DES. SOCIOECONÔMICO, A.G.J., 52, ENGENHEIRO FLORESTAL)

“Se a gente for considerar o desmatamento como a ação que mais gera emissões, não tem como a gente escapar do agronegócio, agro pecuária, como a atividade, que, com todas as ressalvas que se possa fazer, que segmentos do agronegócio diretamente não tenham a ver com isso, é o motor da agro economia do pais que empurra uma atividade menos rentável para a fronteira. Então, uma hora é a soja, outra hora é a cana, é o biocombustível, mas o que a gente assiste historicamente, no meio rural brasileiro, é que as atividades de menor rentabilidade estão sempre sendo empurradas para a fronteira e esse processo de expansão ou tensão, das atividades de menor rentabilidade são feitas pelas atividades de maior rentabilidade.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

Uso industrial e energético de recursos não renováveis

“Evidentemente que é energia, a matriz energética, ela é um fenômeno que, no caso do Brasil, lamentavelmente, nós estamos caminhando para uma matriz térmica, ao invés de ser uma matriz hídrica. Mas o que mais me preocupa sobre esse tema, além desse aspecto lamentável, é o fato de não termos ainda na agenda, com a mesma força que deveríamos ter, duas iniciativas nesse campo temático da energia: o primeiro, a questão das energias alternativas, [e depois a] racionalização energética. Então penso isso.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

“(...) Recursos naturais não renováveis, principalmente minério, a questão da indústria de transformação em alguns setores específicos, elas têm impacto.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

A questão urbana

“Eu vou falar das cidades. Eu acho que é preciso rever as cidades, as cidades, a concentração urbana. O adensamento urbano do meu ponto de vista é crítico, do ponto de vista de mudanças climáticas....” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, A.P., 57, ENGENHEIRO AGRÔNOMO)

“Você tem um outro tipo de impacto, por exemplo, nos serviços, que não é o serviço em si, mas um conjunto de como [os serviços] estão organizados nos centros urbanos... Quer dizer, hoje a forma como a gente trabalha é [com] muito papel, então isso tem de fato

Page 269: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 6 9

gerado um impacto muito significativo.” (GOVERNAMENTAL, AGRONEGÓCIO, C.G.G., 37, ECONOMISTA)

Estilo de desenvolvimento e padrão de consumo

“Acho que é o nosso estilo de desenvolvimento, é a dificuldade que as nações historicamente tiveram de distribuir as suas riquezas, a cultura do desperdício, a cultura gerada nos países mais ricos, mas disseminada, hoje, para todo o mundo, uma cultura de obter coisas com muita rapidez, com grande gasto de energia, em detrimento de tecnologias mais racionais, ainda que isso retarde um pouco o resultado. Então, essa é a minha visão, a questão principal e mais grave desse processo todo, é algo que tende a acelerar e tornar mais aguda qualquer das nossas preocupações.” (GOVERNAMENTAL, DES.SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

“Eu diria que a raiz é o atual modelo de produção e consumo, que é fortemente demandador de recursos naturais e altamente emissor de gases de efeito estufa. Então esse é o núcleo, e é aí que temos de criar capacidade de intervir.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

18. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO E ENFRENTAMENTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

É a vontade política que possibilita compatibilizar desenvolvimento e enfrentamento das mudanças climáticas

Todos afirmam que é possível compatibilizar desenvolvimento e reduzir as emissões, principalmente no Brasil. Apesar de não proporem uma “fórmula”, os entrevistados do setor governamental acreditam que ela pode ser promovida por planejamento e metas promovidos por políticas públicas. Mas, para que isso ocorra, é necessário romper com o status quo, com os padrões atuais de desenvolvimento.

“O que faz falta é uma transformação de políticas públicas que, por um lado impeça o desmatamento daqueles parâmetros de comando e controle de fiscalização de coibição, e por outro gere oportunidades de desenvolvimento com floresta em pé ou corte seletivo, com aproveitamento dessa massa florestal de maneira mais coerente e diferente da forma como o empresariado tradicional brasileiro está acostumado a lidar. É uma transformação difícil, cara e que implica numa vontade política muito grande, que não esta presente.

Porque se você verificar as lideranças políticas das regiões florestadas, elas são extremamente atrasadas nesse sentido. Elas lutam é pela manutenção desse status quo, o mesmo processo, porque entendem que essa é a via de desenvolvimento. Então, tem que abrir espaço para algo novo que não é conhecido no detalhe. Tem que haver uma grande vontade política para pactuar com diferentes setores. A realização disso ainda não está presente nos elementos para isso; é meio desalentador.” (GOVERNAMENTAL, DES.SOCIOECONÔMICO, B.P., 58, ENGENHEIRO)

“(...) transformar o tema das mudanças climáticas num tema central da agenda, precisamos fazer com que o tema das mudanças climáticas globais e, portanto, em ultima escala, a manutenção da vida no planeta e sua qualidade de vida, esteja como tema vital em qualquer agenda de desenvolvimento que se vá discutir.” (GOVERNAMENTAL, USO DO SOLO, V.O., 40, GEÓGRAFO)

Page 270: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 0

“Então, acho que temos como corresponder a esses desafios, muitas vezes falta o enfrentamento político, a consciência dessa necessidade, a priorização do tempo. Aqui, a gente prioriza, mas aqui é a nossa área. A própria razão da existência da agroenergia implica que a gente tem que ter um conhecimento maior para esse respeito. Mas eu acho perfeitamente possível, e deve ser ponto de determinação dos poderes políticos mais elevados, que a gente execute isso.” (GOVERNAMENTAL,AGRONEGÓCIO, M.V.B., 53, ADMINISTRADOR)

“Em todos esses temas eu acho que o governo sempre está por trás, no sentido de viabilizar e criar políticas para tentar viabilizar esse tipo de movimento. O Brasil, eu acho, é o grande país para dar exemplo nesse processo. Tentar substituir paulatinamente e tornar viável economicamente outras formas de combustível, tipo biocombustível, biodiesel, essas coisas, que são menos poluentes e que já são viáveis.” (GOVERNAMENTAL, ECONOMIA, C.L., 49, ECONOMISTA)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os entrevistados deste setor, uma expressiva parte atuante na esfera federal, consideram as mudanças climáticas um assunto chave na pauta governamental.

O setor, de um modo geral, mostrou-se interessado, além de revelar um bom domínio dos assuntos, tanto do ponto de vista técnico quanto político, pois muitos dos entrevistados são coordenadores ou membros de comissões de alto nível nos Ministérios de Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia, ou ainda no Itamaraty.

As lideranças deste setor reconhecem que cabe a eles próprios sugerir ao executivo (Presidência e Casa Civil) medidas fundamentais (e rápidas) para mitigação e adaptação, propondo as bases de formulação de uma política nacional do clima. No âmbito internacional, admitem, há muitos interesses em jogo, cabendo ao Itamaraty defender os interesses do Brasil.

Para o setor, muitas das posições internacionais ocultam interesses comerciais e de influência geopolítica. Eles também entendem que as responsabilidades no enfrentamento das mudanças climáticas são comuns, mas diferenciadas. O Brasil é reconhecido como “potência ambiental” de primeira grandeza e importante ator no cenário internacional.

Com bastante freqüência se observou que o Brasil precisa de recursos para proteger a Amazônia, e que os países ricos devem pagar pelos serviços ambientais ofertados por esse importante bioma.

É o setor menos crítico do posicionamento do Brasil nas conferências internacionais do clima, bem como o mais otimista com relação às potencialidades do Brasil e à possibilidade de que o país se torne uma grande potência em produção de energias limpas (etanol de cana e produção de biomassa de origens diversas).

Page 271: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 1

PERFIL DO SETOR

Os gestores federais são maioria (23), seguidos dos da área estadual (7). No âmbito nacional, a grande maioria é composta por coordenadores de programas ministeriais e secretários nacionais de políticas setoriais. Na esfera estadual, três são secretários estaduais de meio ambiente.

CARGOS FREQ.

Coordenadores de políticas e programas setoriais dos ministérios

6

Secretário nacional de políticas setoriais 6

Diretor-geral de agência nacional 2

Presidente de companhia nacional 1

Presidente de agência nacional 1

Presidente de companhia nacional 1

Diretor nacional de competitividade industrial 1

Coordenador de agropecuária de órgão federal 1

Diretor de empresa estatal 1

Coordenador de agropecuária (federal) 1

Vice-presidente de agronegócios 1

Nível federal

Diretor do programa de agricultura familiar 1

Secretário estadual de meio ambiente 3

Subsecretária estadual de planejamento de política 1

Superintendente de agência regional 1

Diretor de agência estadual 1

Nível estadual

Presidente de banco estadual 1Total 60

A amostra do setor governamental retratou a predominância de homens na ocupação de cargos de alto escalão. Apenas três mulheres participaram da pesquisa.

Sexo M F Total

27 3 30

A metade dos entrevistados tem entre 50 e 59 anos. Outros 7 entrevistados têm entre 40 e 49. Cinco estão na faixa de 60 a 69 anos e três na faixa de 30 a 39 anos.

Faixa etária 30-39 40-49 50-59 60-69 Total

3 7 15 5 30

Page 272: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 2

Quase metade dos entrevistados deste setor é natural da região Sudeste. A segunda grande região mais representada é a Nordeste, com 5 entrevistados, seguida da Sul, com 4 entrevistados. Os demais são da região Centro-Oeste (3) e Norte (1). Três deles são estrangeiros.

Naturalidade SP RS RJ MG CE DF PE AC BA MS AM Ext. Total

9 4 3 2 2 2 1 1 1 1 1 3 30

O setor a apresenta um alto grau de qualificação profissional: 8 são doutores, 7 mestres, 5 pós-graduados e 10 possuem superior completo.

Escolaridade Superior Pós Mestrado Doutorado TOTAL

10 5 7 8 30

Os entrevistados deste setor são formados em diversas profissões. A profissão mais representada é engenharia (12), seguida por economia (8).

Formação Formação Freq.

Engenharia 12

Economia 8

Administrador 2

Biólogo 2

Hidrólogo 1

Matemática 1

Geógrafo 1

Funcionário público 1

Sociologia 1

Biólogo 1

Total 30

Page 273: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 3

COMENTÁRIOS FINAIS

Comparando os sete setores selecionados, verificamos que as opiniões são, em geral, razoavelmente semelhantes, tanto no tocante ao posicionamento político dos entrevistados quanto no que se refere à sua argumentação sobre o tema das mudanças climáticas. Naturalmente, dentro de cada setor, os grupos de opinião manifestam suas diferenças. Na amostra como um todo, é residual o número daqueles que se manifestaram com desinteresse em relação à questão das mudanças climáticas, considerada altamente relevante pela maioria absoluta dos entrevistados para os destinos do país e do mundo. Para essa maioria, trata-se de uma das mais cruciais questões contemporâneas.

Chama a atenção o fato de que, à exceção dos setores científico e governamental, que demonstram uma familiaridade maior com a problemática, para os demais setores trata-se de uma questão relativamente nova, mas enormemente mobilizadora.

Esse caráter mobilizador se deve ao fato de que a questão coloca em xeque a maneira como nossa sociedade tem se organizado para promover o bem-estar e a prosperidade. O dilema impõe a transição para um novo modelo civilizacional. Esse novo modelo é genericamente chamado de “desenvolvimento sustentável” pela maioria.

Independentemente da posição política ou do setor, a questão climática está envolta por uma dramaticidade que toca cada um dos ouvidos na pesquisa.

Cada setor traz, contudo, uma contribuição especial, que está relacionada à sua cultura setorial e aos traços peculiares ao papel de cada setor na sociedade. A seguir, resumimos essas especificidades.

MÍDIA

O setor define-se como generalista e praticamente nenhum profissional ouvido na pesquisa pode ser considerado, a rigor, especialista no tema. Ainda assim, mostrou-se de um modo geral preocupado e propenso ao otimismo, otimismo este baseado na crença fundamental de que a humanidade encontrará uma saída e de que a ciência, em grande medida, fornecerá as bases tecnológicas necessárias para tanto.

Como brasileiros e como jornalistas, os entrevistados desse setor se sentem motivados e declararam estar dispostos a um maior engajamento.

Estão em fase, como eles mesmos dizem, de “aprender mais”. Procuram ler livros, pesquisar na internet e, pela natureza de seu trabalho, ficam atentos ao noticiário internacional. Consideram que o papel mais importante a ser desempenhado pelo setor é o de veicular informação de qualidade e contribuir para a conscientização e para o processo de decisão tanto individual quanto coletivo.

Para eles, é o governo quem deve liderar o processo de engajamento da sociedade. Consideram ainda que o tema das mudanças climáticas está ganhando um espaço cada vez maior na mídia, tendência que acreditam deva perdurar e ganhar mais densidade nos próximos anos.

Page 274: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 4

CONGRESSO

Este setor, como a mídia, também se considera generalista, cuidando de uma pauta ampla e em geral contando com “assessores” ou “peritos técnicos” para questões mais complexas, como a do clima, por exemplo.

Apesar de reconhecer que a temática das mudanças climáticas será um problema cada vez mais crítico para a sociedade brasileira e mundial, o poder legislativo brasileiro não a vem tratando com a devida importância.

Segundo os parlamentares ouvidos, existem, no momento, outros problemas mais importantes em pauta, e o lobby de alguns setores não permite a tramitação de medidas ligadas ao tema com mais rapidez e objetividade. Apesar da morosidade e superficialidade com que o tema ainda é tratado no Congresso e nas Assembléias Legislativas Estaduais, aos poucos os parlamentares estão se familiarizando com o assunto, principalmente desde o advento da Comissão Mista das Mudanças Climáticas da Câmara dos Deputados e da criação dos fóruns estaduais de mudanças climáticas (criados em São Paulo, Minas e Bahia).

Ao admitir que o tema das mudanças climáticas não está entre as prioridades do legislativo, atribuem o fato à falta de ânimo do governo federal para lidar mais seriamente com o tema, bem como à ausência de uma preocupação expressa da sociedade.

Sem o executivo e sem a sociedade, o Congresso tem muito pouco a fazer, dizem. Em certos nichos, porém, especialmente naqueles em que os ambientalistas transitam com mais desembaraço (e citam a Frente Parlamentar Verde), vai surgindo um interesse maior. Segundo este setor, o tema não chegou ainda ao “coração do Congresso”.

SOCIEDADE CIVIL/ONGS

Ambos os setores – ONGs e sociedade civil – são marcados por forte heterogeneidade, mas revelaram que há muito consenso em suas opiniões. Os mais importantes são em relação à responsabilidade do Brasil de cuidar da Amazônia e de promover políticas públicas, principalmente na área de energia, que possam colocar o país em situação mais confortável diante da cobrança internacional.

Os membros desse setor podem ser caracterizados como moderadamente críticos do “modelo capitalista de produção e consumo” e das desigualdades políticas e econômicas que dividem o mundo entre Norte e Sul, entre países ricos e pobres, com exceção de algumas poucas organizações de perfil político mais radical presentes na amostra. Talvez por incluir muitas associações empresariais, a sondagem não revelou posições muito radicalizadas contra o setor privado ou as “forças de mercado”.

Apesar das cores e tintas políticas variadas, há portanto mais consensos do que dissensos neste setor em relação às questões que cercam a discussão sobre o problema das mudanças climáticas. Os entrevistados consideram que as mudanças climáticas tornaram-se uma questão crucial que não pode ser ignorada por nenhuma política setorial: seja no combate ao desmatamento na Amazônia, seja repensando a matriz energética ou a destinação do lixo produzido nas grandes cidades. A preocupação de fundo deve ser como reduzir emissões ou diminuir os efeitos das mudanças climáticas.

Os entrevistados deste setor se mostraram fortemente interessados e mobilizados pelo tema das mudanças climáticas, pois acreditam que elas afetarão mais as populações pobres e países como o Brasil, que fizeram a ocupação do território ao longo da costa e dos grandes rios.

Page 275: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 5

Faz parte da “competência política” dessas lideranças estarem sintonizadas com os temas mais importantes da pauta política, social e ambiental. Esses setores são os que mais enfatizam em seu discurso a necessidade de promover um desenvolvimento “socialmente justo e ecologicamente responsável”.

Os representantes da sociedade civil e das ONGs se mostraram bastante otimistas quanto ao poder das ações individuais, embora não se distingam dos demais ao considerar que cabe ao Estado brasileiro a responsabilidade de liderar um processo de maior engajamento do país no combate ao agravamento das mudanças climáticas.

EMPRESARIAL

O setor empresarial aqui amostrado, com um número considerável de representantes de atividades relacionadas ao agronegócio e à energia, está ciente da sua responsabilidade perante a sociedade no que tange às mudanças climáticas.

Acreditam que o empresariado tem muito a contribuir, mas demonstram forte preocupação com a possibilidade de perda de lucro ou diminuição da competitividade dos seus negócios ou do Brasil, caso as políticas de redução não sejam bem planejadas e bem implementadas.

No limite, reconhecem que o “desenvolvimento sustentável”, conceito ao qual se remetem, insistindo na “sustentabilidade econômica” das medidas, só será alcançado se houver uma mudança gradual no paradigma de produção e consumo.

Esse problema (mudança de paradigma) é visto como um problema global, não só do Brasil. O último relatório do IPCC (2007) previu um horizonte menor de tempo para que os países formulem políticas mais eficientes de combate às mudanças climáticas.

Eles sabem que essas políticas devem afetar o setor produtivo. Estão, até certo ponto, ansiosos para que as políticas sejam definidas “o quanto antes”, pois consideram que haverá um custo envolvido na transição do uso de combustíveis fósseis para outros tipos de energia.

Desse cenário, de restrições ao uso dos combustíveis fósseis e de taxação de emissões, emerge a necessidade de investir em novas tecnologias e ampliar a oferta de energia limpa. Em outras palavras, para o empresariado, falar de mudanças climáticas hoje é discutir a matriz energética brasileira e o modelo de transição.

Para os empresários, falta liderança, tanto interna (do Brasil) quanto externa, para que as medidas sejam mais rápidas e efetivas. A queixa do empresariado é a de que não há, ainda, uma política nacional do clima; faltam, portanto, diretrizes que possam melhor orientar o setor sobre os programas e ações prioritários.

CIENTÍFICO

O setor científico foi o que mais revelou domínio sobre as causas e conseqüências das mudanças climáticas. Mostrou-se também o mais bem informado sobre como o Brasil vem conduzindo a questão nos diversos fóruns nacionais e internacionais.

Para o setor, as evidências apontadas pelos últimos relatórios divulgados já fornecem uma base suficiente para que o governo e os demais tomadores de decisão dos setores público e privado formulem políticas de redução das emissões.

Page 276: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 6

Quanto à questão da “certeza científica”, os entrevistados insistem que “há base científica” consistente sobre a qual agir; no entanto, frisam que a ciência precisa de liberdade e que é próprio do meio científico buscar novas teorias, refutar teses e buscar a precisão que ainda não se tem em vários conteúdos.

O importante é não usar a tese da “controvérsia científica” (que sempre haverá no meio acadêmico) como álibi para a negligência e a inação nesse momento em que há tanto em jogo, talvez a sobrevivência da própria espécie humana.

Para o segmento científico brasileiro, o Brasil tem território, recursos de biodiversidade e economia capazes de sustentar um novo modelo de desenvolvimento. Tem, além disso, base tecnológica avançada nas questões da sustentabilidade e poderá melhorá-la ainda mais, desde que seja formulada uma política nacional do clima que oriente os investimentos em ciência e tecnologia.

Em geral, os cientistas mostram-se entusiasmados com a possibilidade de que o Brasil se torne um grande produtor de energias limpas. Além disso, para eles, a Amazônia é simultaneamente nosso problema e nossa solução: ela é “o ouro verde do Brasil”.

GOVERNAMENTAL

Os entrevistados deste setor, uma expressiva parte atuante na esfera federal, consideram as mudanças climáticas um assunto chave na pauta governamental.

O setor, de um modo geral, mostrou-se interessado, além de revelar um bom domínio dos assuntos, tanto do ponto de vista técnico quanto político, pois muitos dos entrevistados são coordenadores ou membros de comissões de alto nível nos Ministérios de Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia, ou ainda no Itamaraty.

As lideranças deste setor reconhecem que cabe a eles próprios sugerir ao executivo (Presidência e Casa Civil) medidas fundamentais (e rápidas) para mitigação e adaptação, propondo as bases de formulação de uma política nacional do clima. No âmbito internacional, admitem, há muitos interesses em jogo, cabendo ao Itamaraty defender os interesses do Brasil.

Para o setor, muitas das posições internacionais ocultam interesses comerciais e de influência geopolítica. Eles também entendem que as responsabilidades no enfrentamento das mudanças climáticas são comuns, mas diferenciadas. O Brasil é reconhecido como “potência ambiental” de primeira grandeza e importante ator no cenário internacional.

Com bastante freqüência se observou que o Brasil precisa de recursos para proteger a Amazônia, e que os países ricos devem pagar pelos serviços ambientais ofertados por esse importante bioma.

É o setor menos crítico do posicionamento do Brasil nas conferências internacionais do clima, bem como o mais otimista com relação às potencialidades do Brasil e à possibilidade de que o país se torne uma grande potência em produção de energias limpas (etanol de cana e produção de biomassa de origens diversas).

Page 277: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 7

TABELA-RESUMO DE TODAS AS ANÁLISE SETORIAIS

A tabela a seguir resume os resultados das análise setoriais para cada um dos 18 tópicos abordados, permitindo uma leitura transversal das respostas mais freqüentes. Nota-se claramente a heterogeneidade das respostas e posicionamentos – estão marcadas em laranja as respostas mais freqüentes em todos os setores; e em amarelo quando houve 2 tipos de respostas mais freqüentes. A única resposta que não pôde ser agrupada foi a visão dos entrevistados sobre a Conferência do Clima em Bali já que os posicionamentos dos setores foram bem variados.

Page 278: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 8

Nº TÓPICO MÍDIA CONGRESSO ONG/SOCIEDADE CIVIL EMPRESARIOS CIENTISTAS GOVERNO

1Quando ouviram falar emMudanças Climáticas pelaprimeira vez

(10) na decada de 80 (16) na decada de90

(31) na decada de 90 (12) na decada de 90 (10) na decada de 80 (12) na decada de 90

2 Nível de conhecimentosobre o tema

(14) Explorando eaprendendo mais

(18) Explorando eaprendendo mais

(21) Explorando eaprendendo mais

(13) Bom masincompleto

(12) Bom masincompleto

(9) bastanteabrangente; (9) bommas incompleto

3Nível de motivação paraaprender mais sobre atemática do clima

(18) Altamentemotivada

(18) Altamentemotivada

(43) Altamente motivada (25) Altamentemotivada

(26) Altamentemotivada

(21) Altamentemotivada

4Maior desafio dahumanidade para ospróximos 20 anos

Meio ambiente;água;aquecimento global;mudançaclimática

Questões sociais:desigualdade, distribuição derenda, e inclusão.

Mudanças climáticas/desigualdades sociais; mudanças nomodelo econômico;questões ambientais

Distribuição derenda/ desafiossociais/produção dealimentos

Mudanças urgentes namatriz energéticamundial com reduçãode emissão de CO2

Questões sociais

Maior desafio do Brasilpara os próximos 20 anos

Distribuição derenda/fome/oportunidade paratodos/cuidados com omeio ambiente

Sustentabilidade: equilibrio entrequestões sociais eambientais

Desigualdade/questões sociais/manejo sustentável recursosnaturais/conservação daAmazônia e controle dodesmatamento

Distribuição de renda/educação

Melhor uso da água edos recursos naturais/diminuir asdesigualdades sociais

Combater asdesigualdades sociaise a pobreza; cuidarda infra-estrutura e daeducação

Maior desafio ambientalpara os próximos 20 anos

Preservação daAmazônia

Mudanças climáticas Mudanças climáticas/questões hídricas

Preservar erecuperar recursoshídricos

Melhor uso da água edos recursos naturais

Desenvolvimento sustentável (associação dequestões sociais compreocupação com omeio ambiente)

6 Impacto das MC sobre ascivilizações atuais

(14) concordamfortemente; (14)concordam

(18) concordam (29) concordamfortemente

(16) concordamfortemente

(19) concordamfortemente

(16) concordam

7Importância do temaMudanças Climáticas parao setor

(22) muito importante (17) muitoimportante

(51) muito importante (25) muito importante (27) muito importante (20) muito importante

8

Quanto as metas deredução das emissõesafetarão as atividades dosentrevistados

Maioria não sabe Não afetaria Afetaria, ampliariapossibilidades denegociar créditos decarbono

Afetaria negativamente. Sãocontrários

Maioria aprovaregulação. Afetariapositivamente.

Aferaria atividadesrelacionadas aos seussetores de atuação nogoverno

9Barreiras identificadas para o enfrentamento dasMudanças Climáticas

1) Econômica 2)vontade política

1) Econômica 2)Ideológicas

1) Econômica 2) falta deeducação

1) Modelo deprodução e consumo

1) Interesseseconômicos

1) fatoreseconômicos

10Incentivos identificadospara o enfrentamento àsquestões climáticas

Taxar emissões;conscientizar populações.

Educação; investimento emdesenvolvimento tecnológico

Moratória contradesmatamento; reduzirimpostos de energiasalternativas; reformatributária que leve emconta produtosecológicos; valoração dafloresta em pé

Investimento emeficiencia energética;reforma tributária;crédito rural;investimento emtecnologia

Investimento empesquisas e novastecnologias

Incentivo ao bio-combustível; investimento emeficiência energética

11

Atores com maiorresponsabilidade noenfrentamento dasMudanças Climáticas.

1) Governo 2)Empresas

1) Governo 2)Empresas

1) Governo 2) Empresas 1) Governo 2)Empresas

1) Governo 2)Empresas

1) Governo 2)Empresas

12 Mudanças Climáticas noâmbito internacional

1) Pouca ação. 2)Críticas aos EUA

1) Pouca ação. 2)Críticas aos EUA eChina

1) Muito discurso, poucaprática; 2) Omissãoamericana; 3)preocupação com Índia eChina; 4) Europa está àfrente; 5) Brasil agetimidamente

1) Críticas aos EUA eChina 2) Pouca ação.

1) Muita discussão epouca ação.

Muito pouco tem sidofeito

13

Nível de conhecimento eopinião sobre a propostade "desmatamentoevitado."

Maioria não conheceou conhece pouco

Maioria não conheceou conhece pouco

A maioria conhecesuperficialmente, poucosa conhecem emprofundidade

Maioria não conheceou conhece pouco

Metade conhece.Opiniões não otimistas

Maioria não conheceou conhece pouco

14 Convenção do Clima emBali

Maioria nãoacompanhou ou sabepouco

Resultado ineficiente Desconfiância em relaçãoà eficácia dessasreuniões; grande parteinsatisfeita com osresultados; poucos vêmavanços significativos

Maioria não seposicionou. Minoriaacha que resultadosforam bons

Maioria conhece.Resultados regularesou fracos.

Conhecem pouco-sensação defrustação. Para os que participaram houveprogressos

15Responsabilidade do Brasilfrente às questõesclimáticas

1) Conservar aAmazônia; Melhorar amatriz de transporte

1) Conservar aAmazônia; Estabelecer metas p/emissões

1) controlar queimadas edesmatamento; 2) mantermatriz energética limpa

1) Conservar aAmazônia; 2) Brasildeve assumir papelde liderança

1) Conservar aAmazônia 2)conservar a matrizenergética brasileira.

1)Conter desmatamento

16 Importância das açõesindividuais

Maioria opinou queações individuaisfazem sim diferença.Atitude é uma formade educação

Todos opinaram queações individuaisfazem sim diferençaquando semultiplicam pelasociedade

Quase todos exaltam aimportância das açõesindividuais

Mais da metadeopinou que açõesindividuais fazem simdiferença. Atitudeseducam e sãodisseminadas nasociedade.

Maioria absolutaconsidera engajamento pessoalimportantíssimo. Mudanças de hábitos,responsabilidade novotar fazem adiferença positivamente.

Maioria absolutaconsidera engajamento pessoalimportantíssimo contribuindo para amudança decomportamentos e de“consciência” emescala mais ampla.

17Atividades econômicas que mais contribuem para asemissões

1) desmatamento/queimada; 2) transporte

1)Expansão dafronteira agrícolacausando odesmatamento 2)Emissões veiculares

1) Atividade agrícola; 2)transporte; 3) indústrias

1)siderurgia, agricultura e pecuáriacomo causa dodesmatamento 2)Indústrias etransporte

1) Modelo econômico -consumo - eatividades quequeimam combustíveis fósseis.

1)Expansão dafronteira agrícolacausando odesmatamento 2)Produção industriale energética

18

Compatibilização entredesenvolvimento eenfrentamento dasmudanças climáticas

Desenvolver eenfrentar asmudanças climáticas épossível, commudança no padrãode consumo

Desenvolver eenfrentar asmudanças climáticasé possível, atravésdo ‘conhecimento’,de pesquisa edesenvolvimento tecnológico,

Desenvolver e enfrentaras mudanças climáticas épossível, desde que seestabeleça um novomodelo a seguir; épossivel desenvolverdiferente

Desenvolver eenfrentar asmudanças climáticasé possível desde queseja tratada por todos os setoresgovernamentais esociais e commudança deparadigma deprodução e consumo.

Desenvolver eenfrentar asmudanças climáticas épossível, comressalvas no padrãode consumo

Desenvolver eenfrentar asmudanças climáticasé possível, comressalvas no padrãode consumo

5

Page 279: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 7 9

EQUIPE TÉCNICA

COORDENAÇÃO GERAL E ANÁLISE

Samyra Crespo

ASSISTENTES DE COORDENAÇÃO

Maria Rita Villela

Marcelo Nascimento

Maria Alice Falacio

PESQUISADORAS E ASSISTENTES DE ANÁLISE

Laila Mendes

Vera Lúcia Nascimento

Elisabete Meireles

Christina Vital

Maria Rita Villela

ENTREVISTADORES

Laila Mendes (Brasília)

Lívia Sales (Brasília)

Vera Lúcia Nascimento (São Paulo)

Maria Rita Villela (Rio de Janeiro)

Alexandre Acampora (região Norte)

Maluh Barciotte (São Paulo)

Aline Almeida (região Nordeste)

Jaqueline Nogueira (Minas Gerais)

Eduardo Campos (região Sul)

Fernanda Tussi (região Sul)

Neyla Vaserstein Jacobovscz (região Sul)

Page 280: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 0

NOTA TÉCNICA

Esta nota visa esclarecer as convenções utilizadas para a identificação das declarações dos entrevistados, citadas sempre entre aspas e formatadas com recuo, em itálico e na cor verde.

Os trechos transcritos reproduzem fielmente o conteúdo das opiniões expressas nas entrevistas gravadas e transcritas no decurso da pesquisa. Alguns deles foram editados com o objetivo de adequá-los à forma escrita, nunca, porém, alterando seu sentido.

Sempre que uma citação vem precedida de reticências, isso significa que ela foi condensada para um encaixe mais objetivo, feito, naturalmente, sem interromper a linha de raciocínio.

Sempre que uma citação vem precedida de reticências entre parênteses – (...) –, isso significa que a fala foi editada, agrupando trechos da mesma entrevista de modo a conferir mais densidade ao pensamento expresso pelo entrevistado no tópico destacado.

Após cada declaração, há uma identificação entre parênteses contendo o setor, a área temática a que pertence o entrevistado, suas iniciais, idade e profissão.

Page 281: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 1

ANEXOS

Page 282: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 2

ANEXO I

LISTA DE ENTREVISTADOS

Segue abaixo a lista de entrevistados por setor. Em anexo seguem os resumos bibliográficos dos entrevistados por ordem alfabética.

CIENTÍFICO

Adalberto Veríssimo Instituto de Pesquisas do Homem da Amazônia

Antonio Batista Filho Instituto Biológico

Antonio Ocimar Manzi LBA/INPA

Béda Barkokébas Junior Universidade de Pernambuco

Celio Bermann USP

Edna Ramos de Castro UFPA

Edneida Rebelo Cavalcanti FUNDAJ

Eduardo Assad EMBRAPA

Eustáquio Reis IPEA

Fernando Lyra FUNDAJ

Flavio Jesus Luizão LBA

Gilberto Jannuzzi UNICAMP

Guilherme Dias USP

João Klug Núcleo de Pesquisa de Migração e Meio Ambiente

Jorge Alberto Gazel Yared EMBRAPA Amazônia Oriental

José Geraldo Eugênio EMBRAPA

José Goldemberg Comissão Especial de Bioenergia – SP

José Ubiratan Delgado IRD

Lúcio Botelho UFSC

Luiz Gylvan Meira Filho IEA/USP

Marcio Pochmann IPEA

Marco Antonio Saidel GEPEA/POLI/USP

Neliton Marques da Silva IPAAM

Orlando Cristiano da Silva CENBIO- Instituto de Eletrotecnica e Energia/ IEE - USP

Page 283: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 3

Paulo Saldiva Lab Poluição/FMUSP

Prakki Satyamurty INPE/INPA

Rommel Benício Costa da Silva Museu Emílio Goeldi

Suani Teixeira Coelho IEE/USP

Tatiana Deane de Abreu Sá EMBRAPA

Weber Amaral Pólo Nacional de Biocombustíveis ESALQ/USP

CONGRESSO

Antônio Carlos Mendes Thame PSDB / SP Câmara dos Deputados

Atila Nunes Pereira Filho DEM / RJ Assembléia Legislativa

Augusto Silveira de Carvalho PPS / DF Câmara dos Deputados

Ciro Gomes PSB / CE Câmara dos Deputados

Cristovam Buarque PDT / DF Senado Federal

Eduardo Gomes PSDB / TO Câmara dos Deputados

Eduardo Valverde PT / RO Câmara dos Deputados

Elvino Bohn Gass PT / RS Assembléia Legislativa

Fernando Gabeira PV / RJ Câmara dos Deputados

Homero Pereira PR / MT Câmara dos Deputados

Jilmar Tatto PT / SP Câmara dos Deputados

João da Silva Maia PR / RN Câmara dos Deputados

José Carlos Aleluia DEM / BA Câmera dos Deputados

José Eduardo Vieira Ribeiro PT / BA Câmara dos Deputados

Julio Semeghini PSDB / SP Câmara dos Deputados

Luiz Castro Andrade Neto PPS / AM Assembléia Legislativa

Marina Terra Maggessi de Souza PPS / RJ Câmara dos Deputados

Neider Moreira PPS / MG Assembléia Legislativa

Paulo Roberto Dornelles Borges DEM / RS Assembléia Legislativa

Paulo Teixeira PT / SP Câmara dos Deputados

Raul Belens Jungmann Pinto PPS / PE Câmara dos Deputados

Rebecca Martins Garcia PP / AM Câmara dos Deputados

Renato Casagrande PSB / ES Senado Federal

Rita Camata PMDB / ES Câmara dos Deputados

Page 284: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 4

Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia DEM / RJ Câmara dos Deputados

Rodrigo Rollemberg PSB / DF Câmara dos Deputados

Sérgio José Grando PPS / RS Assembléia Legislativa

Serys Slhessarenko PT / MT Senado Federal

Sibá Machado PT / AC Senado Federal

Wellington Fagundes PR / MT Câmara dos Deputados

EMPRESARIAL

Carlos Salles Tormes Consultoria

Celina Carpi Grupo Libra

Christiano Pires de Campos CENPES/Petrobras

David Zylbersztajn DZ Negócios com Energia

Fabio Nogueira de Avelar Marques Plantar S/A

Fábio Romero Virgolino Barros Construtora Queiroz Galvão

Flavia Moraes Phillips do Brasil

Flavio Montenegro VALE

Franklin Feder ALCOA

Frederico Marinho CONPET/Petrobras

Giem Guimarães Grupo Positivo

Hamilton Pollis Eletrobrás

Hermes Jorge Chipp Operador Nacional do Sistema Elétrico

Ivan Wedekin Bolsa de Mercadorias & Futuros

João Antonio Prestes Grupo ORSA

Jorge Augusto Rodrigues Souza Cruz

José Arnaldo Delgado Queiroz Galvão

José Carlos Gameiro Miragaya PETROBRAS

José Carlos Martins VALE

Laura Tetti Consultoria Laura Tetti

Leonardo Gloor Arcelor Mittal Brasil

Luiz Suplicy Hafers Conselho Nacional do Café

Márcio Lopes de Freitas Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB)

Matheus Guimarães Antunes SIMASA

Page 285: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 5

Mauricio Born ALCOA

Renato Augusto Pontes Cunha SINDAÇUCAR

Ricardo Gustav Neuding ATA

Roberto Rodrigues FIESP

Victor Hugo Kamphorst ABN AMRO Bank

Vitor Feitosa SAMARCO

GOVERNAMENTAL

Aloysio Gonçalves Costa Junior Secretaria de Meio Ambiente de Pernambuco

Amílcar Guerreiro EPE

Ariel Pares Ministério de Planejamento de Longo Prazo

Bruno Pagnoccheschi ANA

Carlos Eduardo Lampert Costa Ministério do Planejamento

Carlos Mário Guedes de Guedes NEAD/MDA

Christian Perellier Schneider Ministério da Integração

Djalma Bezerra de Mello Agencia de Desenvolvimento da Amazônia

Edilson Guimarães Ministério da Agricultura

Flavio Bolliger IBGE

Haroldo Lima ANP

Izabella Mônica Teixeira Secretaria do Ambiente do Estado do RJ

Jerson Kelman ANEEL

João Luiz Guadagnin Ministério da Agricultura

João Paulo Capobianco Ministério do Meio Ambiente

Jomilton Costa Ministério da Saúde

José Miguez Ministério da Ciência e Tecnologia

José Roberto de Lima Ministério do Meio Ambiente

José Sydrião de Alencar Júnior ETENE

Luis Carlos Guedes Pinto Banco do Brasil

Manoel Vicente Fernandes Bertone Ministério de Agricultura e Pecuária

Márcia Camargo Ministério das Minas e Energia

Marcos Otávio Bezerra Prates Ministério de Desenvolvimento Ind. E Comércio

Robert Smith Banco do Nordeste

Page 286: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 6

Ronaldo Jucá CHESF

Tasso Resende de Azevedo Ministério do Meio Ambiente

Thelma Krug Secretaria de Mudanças Climáticas/MMA

Valmir Gaisrael Ortega Secretaria de Meio Ambiente do Pará

Virgilio Maurício Vianna Secretária de Meio Ambiente do Amazonas

Wagner Gonçalves Rossi CONAB

MÍDIA

Alexandre Mansur Revista Exame

Angela Crespo Jornal da Tarde

Angela Lindenberg TV Globo

Aristoteles Drummond Aristoteles Drummond Consultoria

Carlos Chagas SBT

Claudia Ribeiro Rádio Globo

Claudio Angelo Folha de São Paulo

Eleonora Pascoal Band

Elio Gaspari Folha de São Paulo

George Vidor O Globo

Herodoto Barbeiro TV Cultura

José Luis Datena Band

Juca Kfouri Folha de São Paulo

Juremir Machado da Silva Correio do Povo

Leandro Sarmatz Vida Simples

Luis Antônio Novaes O Globo

Luiz Henrique Yagelovic Sistema Globo de Rádio/CBN

Marcelo Sirangelo TV Cultura

Mario Motta Grupo RBS

Matthew Shirts National Geographic Brasil

Miriam Leitão O Globo

Moacir Pereira Diário Catarinense

Neide Duarte Rede Globo

Paulo Cabral Band

Page 287: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 7

Renato Machado TV Globo

Ricardo Boechat Band

Rosane Marchetti RBS

Sérgio Abranches CBN

Sergio Gwercman Superinteressante

William Bonner TV Globo

SOCIEDADE CIVIL/ONG

Alexandre Sávio Pereira Ramos FASE

Ana Maria Schindler ASHOKA

Andre Nassar ICONE

André Rocha Ferreti Fundação O Boticário

André Urani IETS

Arnulfo Alves Barbosa Filho Diaconia

Carlos Covalan OPAS/NOS

Carlos Nobre Grupo IAG do Prg. Piloto PPG7

Chrsitopher Wells FEBRABAN

Claudio Weber Abramo Transparência Brasil

Cleia Anice da Mota Porto CONTAG

Enéas Salatti FBDS

Fernando Henrique Cardoso Instituto Fernando Henrique Cardoso

Fernando Penteado Cardoso Filho AGRISUS

Francisco Miguel de Lucena FeTRAF

Guilherme dos Santos Carvalho AIMEX-PA

Hilton Silveira Pinto FCO

Ian Samuel Thompson TNC

Israel Klabin FBDS

Jean Mark Von Der Weid AS-PTA

Jecinaldo Barbosa Saterê Mawé COIAB

José Aldo dos Santos Centro Sabiá

José Maria Cardoso da Silva CI

Page 288: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 8

Lucia Ortiz FBOMS- GT Energia

Luis Carlos Guimarães ABRADEE

Luis Felipe Lacerda Pacheco IBAM

Luiz Pinguelli Rosa Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas

Marcelo Mezel Sociedade de Nordestina de Ecologia

Marco Antonio Fujihara Instituto Totum

Marco Antonio Raupp Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

Marco Aurélio Ziliotto Ecoclima

Marcus Vinicius Pratini de Moraes Associação Brasileira de Exportadores de Carne Bovina

Maria Alice Setubal CENPEC

Maria Dalce Ricas AMDA

Marilena Lazzarini IDEC

Marina Freitas Grossi CEBDS

Mário Menel ABIAPE

Marli Gondim de Araújo CEDS Pernambuco

Mauricio Mendonça CNI

Mauro Passos IDEAL

Miguel Sedediuk Milano AVINA

Miriam Dualibi Ecoar para Cidadania

Oded Grajew Instituto Ethos

Oswaldo de Carvalho Junior IPAM

Patrícia Helena G. Boson FIEMG

Paulo Dimas Rocha Menezes Instituto Cidades

Pedro Ivan Christoffoli MST

Peter May Rede Brasileira Agroflorestal

Renault de Freitas Castro ABRALATAS

Ricardo Braga SNE/UFPE

Roberto Smeraldi Amigos da Terra/Projeto Ecofinances

Rodrigo Justus de Brito CNA

Sérgio Colle LABSOLAR

Page 289: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 8 9

Teófilo Artur de S. Cavalcante Neto VivaCred

Thais Corral REDEH

Valério Turnês Acolhida na Colônia

Wilson Schmidt AGRECO

Zilda Arns Neumann CEDS

Page 290: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 0

ANEXO II

ROTEIRO DE ENTREVISTA

A entrevista contém três blocos gerais e um específico (direcionado ao segmento social específico a que pertence o entrevistado) e foi estimada para durar 1 hora.

As questões estão classificadas como P1 (prioritárias) ou P2 (prosseguir somente se o tempo não estiver esgotado).

I. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS (2 QUESTÕES)

O Sr. poderia nos falar resumidamente sobre sua trajetória profissional? (Se o entrevistado não citar, perguntar sobre formação e grau de instrução – perguntando: mas que universidade o sr. cursou? Lembrar que nos casos dos representantes do setor social, é comum as pessoas não serem formadas.)

Agora, nós gostaríamos que o Sr. (Sra.) fizesse uma apreciação geral sobre o seu setor e área de atuação (Se o entrevistado se alongar, pedir que a apreciação seja dos anos mais recentes – 5 anos por ex.)

II. QUESTÕES GERAIS

II.1 – A visão geral do entrevistado sobre o problema (1 a 10 = P1 – aplicação obrigatória)

Na sua opinião, qual é o principal desafio que a humanidade vai enfrentar nos próximos 20 anos? (Se já falar em Brasil, ir para pergunta 3.)

E no Brasil, qual será o maior desafio nos próximos 20 anos? (Depois das perguntas 1 e 2, se o assunto mudanças climáticas não sair espontaneamente, ir para 3, se não, pular para 4)

Qual será o maior desafio ambiental nos próximos 20 anos?

Cientistas sustentam que o fenômeno das mudanças climáticas causará grande impacto na vida de todas as sociedades humanas. O(A) senhor(a) concorda com essa visão? (assinalar 1 opção) (a) concorda fortemente (b) concorda (c) discorda (d) não tem informação ou opinião suficiente

Na sua opinião, o que mais contribui para agravar o fenômeno das mudanças climáticas e suas conseqüências?

Você considera que o seu conhecimento sobre as mudanças climáticas é (assinalar 1 opção) (a) bastante abrangente (b) bom, mas incompleto (c) está explorando e aprendendo mais (d) conhece pouco (e) inexistente (neste caso, devemos interromper a entrevista)

Page 291: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 1

Em que posição o(a) senhor(a) se veria nas quatro que vou citar? (assinalar a opção escolhida) (a) uma pessoa altamente motivada a entender do assunto (neste caso, perguntar sobre a natureza da motivação) (b) interessado(a), mas tem outros temas que considera mais importantes no momento (c) apenas interessado(a), mas sem intenção de aprofundar (d) desinteressado(a)

Quando ouviu falar em mudanças climáticas pela primeira vez? (a idéia aqui é localizar no tempo, ano se possível)

Essa problemática é, para o seu setor ou área de atuação: (assinalar a opção escolhida) (a) muito importante (b) importante (c) pouco importante

No seu setor de atuação, a regulação relacionada às metas de redução de emissão de gases de efeito estufa afetaria a sua atividade? (Em caso positivo, continuar.) De que maneira?

(Quando terminar esse primeiro conjunto, iniciar o bloco específico. Se o entrevistado já tiver “coberto” as questões ao discorrer sobre o seu setor, entrar direto no bloco seguinte.)

II.2 – A problemática no nível internacional (11 a 16 = P1 aplicação obrigatória)

Na sua opinião, como vem sendo tratada a necessidade de diminuir as emissões de dióxido de carbono na atmosfera no âmbito internacional?

O(A) senhor(a) conhece algum programa internacional ou nacional, em andamento, que vise mitigar os efeitos das mudanças climáticas?

Quais são, na sua opinião, as principais responsabilidades do Brasil no programa mundial de redução das emissões?

Que barreiras (limitações, impedimentos) o Sr. (Sra.) identifica para o enfrentamento das questões climáticas?

Na sua opinião, que incentivos poderiam ser criados para melhorar nossa contribuição (brasileira) à redução de emissões de gases de efeito estufa?

O(A) senhor(a) conhece a proposta de desmatamento evitado apresentada pelo governo brasileiro na Convenção do Clima? (Caso positivo, continuar.) Qual é a sua opinião sobre ela?

(P2 – aplicação condicionada) Como o(a) senhor(a) vê os resultados da recém terminada Conferência do Clima em Bali? (Para aqueles que mostram conhecimento amplo e/ou detalhado da problemática.)

II.3 – Brasil

Como compatibilizar as o desenvolvimento com o enfrentamento das mudanças climáticas?

Na sua opinião, quais atividades econômicas no Brasil têm mais impacto, por ordem de importância, sobre o fenômeno do agravamento das mudanças climáticas? (solicitar 3 e anotar a ordem) 1)_________________; 2)_________________; 3) ___________________

Page 292: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 2

Quais são os atores que devem assumir maior responsabilidade em programas e medidas para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas no Brasil? (solicitar que cite algumas ações prioritárias para um maior engajamento desses atores)

III. QUESTÕES FINAIS

A ação individual pode ajudar a enfrentar as mudanças climáticas? (Caso a resposta seja positiva: Como? – e que atitudes ou hábitos devem ser adotados por pessoas como o senhor (ou sra.) por exemplo?

Que fontes de informação o(a) senhor(a) costuma utilizar para ficar melhor informado sobre este assunto? (escolher 3 principais) (a) livros em português/traduzidos (peça para citar 1) (b) livros em língua estrangeira (c) artigos em jornais impressos (d) artigos acadêmicos (e) revistas especializadas (f) newsletter on-line (g) documentos disponíveis na internet (h) sites

Agradecer e finalizar: Na sua opinião, quem poderia contribuir com essa pesquisa sobre percepção das mudanças climáticas? (pedir para citar 3 nomes no Brasil – se a pessoa for simpática a essa abordagem, ver se pode fornecer e-mail ou telefone)

IV. QUESTÕES COMPLEMENTARES POR ÁREA TEMÁTICA

IV.1 – Agronegócio

O(A) senhor(a) acha que as mudanças climáticas poderão ter impacto sobre a agricultura, a criação de gado ou a agro-indústria? (Entrevistador: caso a resposta seja positiva, continuar.) De que maneira?

(Somente considerar essa questão caso a resposta anterior tenha sido positiva.) Existem medidas que podem ser tomadas para diminuir esses impactos setoriais?

O(A) senhor(a) acha que existe relação entre a produção de biocombustíveis e as mudanças climáticas?

IV.2 - Desenvolvimento socioeconômico

Na sua opinião, as mudanças climáticas poderão trazer impactos ao desenvolvimento social? (Se sim, explorar impactos positivos e/ou negativos, de curto e longo prazos).

Quais populações o(a) senhor(a) considera que estariam mais vulneráveis com o aumento das eventuais catástrofes ligadas às mudanças do clima no Brasil? Por que?

Políticas de mudanças climáticas devem ser incorporadas às de desenvolvimento social ou trata-se de duas questões de natureza e objetivos distintos?

IV.3 – Energia

As mudanças climáticas poderão causar algum impacto na matriz energética brasileira?

A eficiência energética tem papel no combate às mudanças climáticas?

Page 293: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 3

O(A) senhor(a) conhece programas governamentais e privados de eficiência energética e uso de energias renováveis? (Caso a resposta for afirmativa, continuar) Como avalia tais iniciativas?

Page 294: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 4

ANEXO III

GLOSSÁRIO DAS SIGLAS

ABIAPE – Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia

ABRADEE – Associação Brasileira de Distribuição de Energia Elétrica

ABRALATAS – Associação Brasileira de Fabricantes de Latas de Alta Reciclabilidade

ADA – Agência de Desenvolvimento da Amazônia

AGRECO – Associação dos Agricultores Ecológico das Encostas da Serra Geral

AIMEX-PA – Associação da Industrias de Madeira do Estado do Pará

ALCOA – Alcoa Alumínio S.A

AM – Amazonas

AMDA – Associação Mineira de Defesa do Ambiente

ANA – Agência Nacional de Águas

ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica

ANP – Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis

AS-PTA – Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa

ATA – Ativos Técnicos e Ambientalistas

AVINA – Fundação Brasil Cidadão para a Educação, Cultura e Tecnologia

BAND TV – Rede Bandeirantes de Televisão

BSB – Brasília

CBN – Sistema Globo de Rádio

CE – Ceará

CEBDS – Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável

CEDES – Conselho Estadual de Desenvolvimento Social

CENBIO – Centro Nacional em Referência da Biomassa

CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária

CENPES – Centro de Pesquisas da Petrobras

CEPA – Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada- SP

CHESF – Companhia Hidroelétrica do São Francisco

CI – Conservation International

Page 295: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 5

CIOAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia

CNA – Confederação Nacional de Agricultura

CNI – Confederação Nacional das Indústrias

CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento

CONPET – Programa Nacional de Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás Natural

CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

COP – Conference of the Parties (Conferência das Partes)

DF – Distrito Federal

DZ Negócios e Engenharia – David Zylbertajn

EE – Efeito estufa

ELETROBRAS – Centrais Elétricas Brasileira S. A.

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EPE – Empresa de Pesquisa Energética

ESALQ – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”

ETENE – Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste

EUA – Estados Unidos da América

FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social Educacional

FBDS – Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável

FBOMS – Fórum Brasileiro de Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento

FCO – British Foreign Commonwealth Office

FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos

FECOMERCIO/RJ – Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro

FETRAF – Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar

FIEMG – Federação das Indústrias de Minas Gerais

FIESP – Federação das Industrias do Estado de São Paulo

FUNDAÇÃO AGRISUS – Agricultura Sustentável

FUNDAJ – Fundação Joaquim Nabuco

GEPEA– Grupo de Energia do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétricas

POLI – Escola Politécnica

Page 296: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 6

GRUPO ORSA – Grupo de Empresas Brasileiras do Setor de Madeira e Celulose

GRUPO RBS – Grupo de comunicação multimídia que opera no Rio Grande do Sul e Santa Catarina

IAG – Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas

IBAM – Instituto Brasileiro de Administração Municipal

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICONE – Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais

IDEAL- Instituto IDEAL

IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

IEA/USP – Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo

IEE/USP – Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo

IETS – Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade

IMAZOM – Instituto de Pesquisas do Homem da Amazônia - PA

INPA – Instituto Nacional de Pesquisa na Amazônia

INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

IPAAM – Instituto de Proteção ambiental do Estado do Amazonas

IPAM – Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

IPCC – International Panel on Climate Change

IRD – Laboratório Nacional de Metrologia e Radiação Ionizantes *

ISA – Instituto Socioambiental – DF

ISER – Instituto de Estudos da Religião

LABSOLAR/UFSC – Laboratório de Energia Solar da Universidade do Estado de Santa Catarina

LBA – Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (Large Scale Biosphere-Atmosphere Experiment in Amazônia)

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MC – Mudanças climáticas

MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia

MDA – Ministério de Desenvolvimento Agrário

MDIC – Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio Exterior

MDL – Mecanismo de Desenvolvimento Limpo

Page 297: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 7

MG – Minas Gerais

MMA – Ministério do Meio Ambiente

MME – Ministério das Minas e Energia

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

NEAD – Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural

OCB – Organização das Cooperativas do Brasil

OMS – Organização Mundial da Saúde

ONG – Organização não-governamental

ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico

OPAS– Organização Pan-Americana de Saúde

PA- Pará

PE – Pernambuco

PETROBRAS – Petróleo Brasileiro S. A.

PPG7 – Programa Piloto para a Proteção de Florestas Tropicais do Brasil

PPS – Partido Popular Socialista

PR – Paraná

PT – Partido dos Trabalhadores

PV – Partido Verde

REDEH – Rede de Desenvolvimento Humano

RJ – Rio de Janeiro

RS – Rio Grande do Sul

SAMARCO – Samarco Mineração S .A.

SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

SBT – Sistema Brasileiro de Televisão

SC – Santa Catarina

SIMASA – Siderurgia do Grupo Queiroz Galvão, em operação no Maranhão

SINDAÇUCAR – Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool

SNE – Sociedade Nordestina Ecológica

SP – São Paulo

TNC – The Nature Conservancy do Brasil

UFPA – Universidade Federal do Pará

Page 298: o Que as Lideranças Brasileiras Pensam

2 9 8

UFPE – Universidade Federal de Pernambuco

UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas

UNFCCC – Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudança do Clima

USP – Universidade de São Paulo

VALE – Companhia Vale do Rio Doce

VIVA CRED – É um projeto da organização não-governamental Viva Rio, na área de geração de renda e ocupação.