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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO UNISAL CAMPUS MARIA AUXILIADORA Karlan Ricomini Alves O PROJETO JOVEM HACKER DO INSTITUTO FEDERAL DE SÃO PAULO CAMPUS CAPIVARI: um estudo de caso em educação sociocomunitária. Americana 2017

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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO

UNISAL – CAMPUS MARIA AUXILIADORA

Karlan Ricomini Alves

O PROJETO JOVEM HACKER DO INSTITUTO FEDERAL DE SÃO

PAULO – CAMPUS CAPIVARI: um estudo de caso em educação

sociocomunitária.

Americana

2017

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Karlan Ricomini Alves

O PROJETO JOVEM HACKER DO INSTITUTO FEDERAL DE SÃO

PAULO – CAMPUS CAPIVARI: UM ESTUDO DE CASO EM

EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Educação, do Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Educação. Linha de Pesquisa: A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis. Orientação: Prof. Dr. Renato Kraide Soffner

Americana

2017

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Alves, Karlan Ricomini

O projeto Jovem Hacker do Instituto Federal de São Paulo,

Campus Capivari: um estudo de caso em educação

sociocomunitária / Karlan Ricomini Alves. – Americana: Centro

Universitário Salesiano de São Paulo, 2017.

104 f.

Dissertação (Mestrado em Educação). UNISAL – Centro

Universitário Salesiano de São Paulo.

Orientador: Prof. Dr. Renato Kraide Soffner.

Inclui Bibliografia.

1. Educação sociocomunitária. 2. Autonomia -Brasil. 3.

Educação. I. Título. II. Autor.

CDD – 370.115

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KARLAN RICOMINI ALVES

O PROJETO JOVEM HACKER DO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO – CAMPUS CAPIVARI: UM ESTUDO DE CASO EM EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação – área de concentração: Educação Sociocomunitária. Linha de pesquisa: A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis. Orientador: Prof. Dr. Renato Kraide Soffner

Dissertação defendida e aprovada em 03 de março de 2017, pela comissão julgadora: __________________________________________ Prof. Dr. Eduardo Oscar Epprecht e Machado Campos Chaves – Membro Externo Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP

__________________________________________

Prof. Dr. Antonio Carlos Miranda – Membro Interno Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL __________________________________________ Prof. Dr. Renato Kraide Soffner – Orientador Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL

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RESUMO

A presente pesquisa analisa as aproximações da educação sociocomunitária com a

ética hacker dentro do projeto social e educacional Jovem Hacker, com o propósito

de entender se este projeto é um caso de educação sociocomunitária que possibilita

o desenvolvimento humano. Assim, utilizamos, como metodologia de pesquisa, o

estudo de caso, tendo como método de obtenção de dados a observação

participante e direta, num viés qualitativo. Essa troca dialogada aconteceu nos

encontros do projeto. Também utilizamos entrevistas não estruturadas, entretanto,

vale ressaltar que esse instrumento foi utilizado de forma secundária. Os dados

apontam que o Projeto Jovem Hacker constitui um ambiente educacional

democrático sociocomunitário que se soma à ética hacker, proporcionando um

aprendizado além do instrumental aos jovens e permitindo que estes se posicionem,

com suas ideias e opiniões. Tal realidade propicia o desenvolvimento da autonomia e

do protagonismo.

Palavras-chave: Educação sociocomunitária; ética hacker; autonomia.

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ABSTRACT

This research analyzes the approaches of the socio-communitarian education with

the hacker ethic within the social and educational project “Jovem Hacker”. The

purpose of this analysis is understanding whether this project is a case of socio-

communitarian education that enables human development. Thus, as a research

methodology, we use a case study, using as a method of data collection a direct and

participative observation, in a qualitative bias. This dialogue took place in the

meetings of the project. We also used unstructured interviews, however, it is worth

mentioning that this instrument was used in a secondary way. The data show that the

“Jovem Hacker” project is a democratic socio-communitarian educational

environment that joins the hacker ethic, providing a learning beyond the instrumental

education for young people and allowing them to position themselves with their ideas

and opinions. This reality fosters the development of autonomy and protagonism.

Keywords: Socio-communitarian education; hacker ethic; autonomy.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1 – Trabalho e Desenvolvimento Humano. ............................................... 19 Ilustração 2 - Pilares da Ética Hacker ....................................................................... 36 Ilustração 3 -Vista do Bairro São João Batista do Laboratório de Informática ........... 52 Ilustração 4 - Vista do Bairro São João Batista ......................................................... 53 Ilustração 5- Recorte com o foco no Bairro São João Batista ................................... 53 Ilustração 6 - Papel do Mediador ............................................................................... 59 Ilustração 7 - Interação dos Participantes do PJH. .................................................... 60 Ilustração 8 - Passeio pelo Bairro São João Batista .................................................. 68 Ilustração 9 - Vista do campus do IFSP do bairro São João Batista. ........................ 68 Ilustração 10 - Boa tarde ........................................................................................... 70 Ilustração 11 - Jovem Preparando a parede para pintura. ......................................... 73 Ilustração 12 - Resultado Final da Pintura. ................................................................ 75 Ilustração 13 - Participantes da Pintura do PJH. ....................................................... 75 Ilustração 14 - Construção dialogada uma constante no PJH. .................................. 76 Ilustração 15 - Participantes formados no PJH - Capivari, Edicação 2015. .............. 81

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LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

ADS – Análise e Desenvolvimento de Sistemas

GNU - “GNU’s Not Unix”, em português GNU Não é Unix

GPL – General Public License, em português Licença Pública Geral

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

NIED - Núcleo de Informática Aplicada à Educação

MIT - Instituto de Tecnologia de Massachusetts

PIB – Produto Interno Bruto

PJH – Projeto Jovem Hacker

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas

TIC – Tecnologia da Informação e Comunicação

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10

2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 16

2.1 INTRODUÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO ............................................... 16

2.1 EDUCAÇÃO COMO DESENVOLVIMENTO HUMANO ................................... 16

2.3 EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA ............................................................... 22

2.4 A ÉTICA HACKER ........................................................................................... 31

2.5 CONSIDERAÇÕES SOBRE O REFERENCIAL TEÓRICO ............................. 47

3 PROJETO JOVEM HACKER ................................................................................ 48

3.1 BASES DO PROJETO JOVEM HACKER ....................................................... 48

3.2 DESCRIÇÃO DO PROJETO JOVEM HACKER – EDIÇÃO CAPIVARI 2015 .. 50

3.2.1 Capacitação dos Bolsistas ........................................................................ 57

3.2.2 Processo seletivo dos participantes .......................................................... 61

3.3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS ..................................................................... 62

3.3.1 Análise das redações do processo seletivo dos participantes do PJH ...... 62

3.3.2 Primeiro encontro – conhecendo os participantes e o bairro..................... 66

3.3.3 Boa tarde – Prática para desenvolver aproximação .................................. 69

3.3.4 Biblioteca - uma iniciativa criativa.............................................................. 71

3.3.5 Pintura do espaço PJH .............................................................................. 72

3.3.6 Montagem da Rede elétrica e a Rede de Computadores ......................... 76

3.3.7 Discussões das entrevistas ....................................................................... 77

3.3.8 Desenvolvimento do Projeto Final – Olhares para o social ....................... 80

3.3.9 Problema do PJH ...................................................................................... 81

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 83

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 86

APENDICE A – Análise das redações individualmente. ....................................... 92

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1 INTRODUÇÃO

A formação humana, em nossa visão, é a mais importante dentre todas

finalidades da educação. Não desmerecendo as outras, mas é através dela que

podemos desenvolver uma sociedade mais justa, pautada por valores sociais e

éticos. Em meio a tantas ferramentas tecnológicas, que instrumentalizam e dão

suporte para a vida cotidiana, é de se esperar que a formação humana e o

desenvolvimento humano tenham propiciado o surgimento de novos instrumentos

para potencializar as conquistas das pessoas.

Pensar em uma sociedade conectada e suas possibilidades, pensar na

formação humana e não somente na instrumentalização, pensar em um contexto

social construído pelos participantes e não por seus governantes, trazer para si a

responsabilidade das transformações sociais desejadas. Perante tantos desafios,

nos sentimos motivados a pesquisar modelos educacionais que fogem ao modelo

tradicional. Para tanto, faz-se necessário olhar para novas perspectivas de educação

e estudá-las dentro de seus contextos.

Nesse contexto, apresentamos as linhas de sustentação desta pesquisa, que

são: Ética hacker aplicada no Projeto Jovem Hacker; Educação Sociocomunitária e

Educação para Desenvolvimento Humano. Ressaltamos, porém, que, para este

estudo de caso, muitos outros conceitos importantes para a delimitação, composição

e elucidação das questões aqui apresentadas serão discutidos. Acreditamos ser

possível sintetizar o tema desta pesquisa da seguinte forma: A ética hacker, aplicada

em um projeto social/educacional, constitui-se em caso da educação

sociocomunitária para o desenvolvimento humano.

Na Educação Sociocomunitária vemos as possibilidades de intervenções

sociais realizadas por meio da compreensão de contextos e diálogos afetivos, para a

construção coletiva e local. Nesta concepção educacional, temos a busca

intencionada da transformação, tendo em perspectiva a construção significativa de

conhecimentos para e pela comunidade. Apresenta, ainda, características como: a

geração de laços sociais; desenvolvimento do sentimento de pertencimento; atuação

democrática; promoção do equilíbrio do poder; escuta respeitosa e ativa; respeito

pelas diversidades; busca da emancipação. Nesse sentido, parece consubstanciar

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uma alternativa inovadora aos modelos tradicionais.

Na ética hacker, temos, a partir do referencial teórico adotado, setes pilares:

Paixão; Liberdade; Valor Social; Cuidar; Atividade; Abertura; Criatividade. Esses

pilares são estruturados para propiciar ao hacker uma vida plena, numa busca

intencionada para superar a sobrevivência e dedicar mais tempo e esforços nas

realizações significativas, tanto na sua vida social quanto na diversão. São

características que norteiam a ética hacker, dentre outras: superação de

diversidades; colaboração, conhecimento e liberdade; abertura das informações;

preocupação com o social e com as subjetividades e partilha. Na perspectiva

criativa, temos a união de inspiração e trabalho para efetivar as ideias, não somente

na construção do novo, mas na utilização do que já existe nos contextos sociais que

necessitam de mudanças, ou seja, podem-se gerar novas

informações/conhecimentos por meio da utilização de recursos disponíveis para

realizar transformações para o desenvolvimento humano.

Já o Projeto Jovem Hacker (PJH) é uma atividade de extensão do Instituto

Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, campus Capivari-SP

(IFSP – Campus Capivari) junto ao NIED – Unicamp. Mais informações serão

trazidas no capítulo 6 - Projeto Jovem Hacker. Nessa iniciativa, temos o foco de

trabalhar no bairro onde se encontra o IFSP – Campus Capivari. No PJH, a

formação humana é a grande finalidade, tendo na instrumentalização um meio de

alcançar os jovens e na ética hacker um norteador para a formação humana.

Características como ambiente educacional participativo e livre de punições, criação

de laços sociais, escuta aberta, tarefas desafiadoras, aplicação da teoria na prática e

diálogos compõem o PJH. Tem-se, assim, como objetivo, auxiliar na formação de

uma geração que seja autônoma tecnologicamente e se empodere dos rumos da

nossa sociedade, segundo o relatório final do projeto.

A partir da observação das diretrizes da PJH e das características da

Educação Sociocomunitária e por meio da aproximação com os valores éticos

apresentados por Himanen (2001) contidos no projeto, definimos a problemática de

pesquisa, a saber: Pode o Projeto Jovem Hacker se constituir em caso de educação

sociocomunitária?

Justifica este trabalho a necessidade de romper com a ideia da educação

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tradicional, que, na visão dos autores, persiste em nossas escolas, mesmo em plena

era da informação. Acreditamos que as vertentes deste trabalho caminham em

direção oposta ao sistema utilizados em nossas escolas. De modo macro, temos a

concepção educacional sociocomunitária que olha para os educandos e vê sua

presença de corpo inteiro, pois observa e respeita sua subjetividade e seu contexto

social. Vemos, na ética hacker, uma possibilidade para tirar dos educandos a

passividade, tornando-os responsáveis pela construção de sua vida, levando em

consideração o estabelecimento de um mundo melhor, por meio de ações

colaborativas. Assim, podemos balizar o estudo de caso por uma educação que

forneça instrumentos para o desenvolvimento humano.

Num primeiro momento, a pesquisa objetiva apresentar as características da

ética hacker, da educação para o desenvolvimento e da educação sociocomunitária,

por meio de revisão bibliográfica. Após isso, pretende-se delinear a experiência do

Projeto Jovem Hacker – Edição Capivari – SP, para possibilitar reflexões sobre a

ética hacker em um ambiente educacional. E, por fim, tenciona-se discutir se o PJH

é um caso de educação sociocomunitária, tendo em perspectiva a visão de

desenvolvimento humano, e ainda causar reflexões para a construção de saberes e

novas práticas na comunidade.

Acreditamos que pode haver aproximações das áreas estudadas neste

trabalho, pois toda educação se fundamenta, ou, pelo menos, deveria se

fundamentar, em valores éticos/morais norteadores de determinado contexto

espaço/histórico. Com este pensamento, temos a principal hipótese deste trabalho:

O Projeto Jovem Hacker se constitui em caso de educação sociocomunitária.

O trabalho está dividido da seguinte forma: No primeiro capítulo, temos a

introdução do tema, a justificativa, a problemática e em um subcapítulo a

metodologia seguida para este estudo de caso. No segundo capítulo, temos o

referencial teórico que é embasado em três eixos, sendo a Educação como

Desenvolvimento, A Educação Sociocomunitária e a Ética Hacker.

No terceiro capítulo, temos o Projeto Jovem Hacker, sendo apresentado em

um primeiro momento e depois temos a apresentação do dados da edição que

estudamos neste trabalho. No quarto capítulo, temos a aproximação dos temas

desta pesquisa e, por fim, as considerações finais.

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1.1 Metodologia de Pesquisa

Esta pesquisa é de cunho qualitativo, assim baseamos nossa metodologia

com instrumentos que dialogam com este princípio. Vemos que a...

...pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ ou medir os eventos

estudados, nem emprega instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou focos de interesses amplos, que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve. Envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo (GODOY, 1995, p. 58).

O estudo de caso é uma investigação empírica tendo em “sua essência a

motivação de esclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões: o motivo pelo

qual foram tomadas, como foram implementadas e com quais resultados”

(SCHRAMM, 1971 apud YIN, 2001, p. 21). “Estudos de caso podem ser usados em

avaliação ou pesquisa educacional para descrever e analisar uma unidade social,

considerando suas múltiplas dimensões e sua dinâmica natural” (ANDRÉ, 2013,

p.97). Sua estratégia de pesquisa compreende um método que abrange tudo com a

lógica de planejamento, incorporando abordagens específicas à coleta de dados e à

análise de dados (YIN, 2001).

O estudo de caso começa, segundo André (2013), com um plano aberto que

irá se delimitar à medida que o estudo avança, sendo que a problemática do estudo

pode ser uma indagação do pesquisador, ter origem na literatura ou mesmo a

continuidade de pesquisa anteriores. A autora ainda alerta sobre o fato da limitação

de tempo para a pesquisa e por isso a importância de delimitar os focos de

investigação.

Yin (2001) defende que o estudo de caso pode incluir tanto um único caso

quanto diversos casos. Ainda na visão deste autor, o estudo de caso está ligado a

questões que envolvem os termos “como” ou “por que” sobre um conjunto de

acontecimentos sobre o qual o pesquisador tem pouco ou nenhum controle. Assim, o

pesquisador deverá evidenciar suas descobertas tendo o cuidado de não manipular

os dados com a intenção de produzir resultados.

Se o interesse é investigar fenômenos educacionais no contexto natural em que ocorrem, os estudos de caso podem ser instrumentos valiosos, pois o contato direto e prolongado do pesquisador com os eventos e situações investigadas possibilita descrever ações e comportamentos, captar

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significados, analisar interações, compreender e interpretar linguagens, estudar representações, sem desvinculá-los do contexto e das circunstâncias especiais em que se manifestam (ANDRÉ, 2013, p.97).

Para a coleta de dados, serão utilizados como instrumentos nesta pesquisa a

observação participante, observação direta e a entrevista não estruturada. Para Yin

(2001), a observação participante coloca o pesquisador em um papel ativo no local

da pesquisa, o que pode resultar no tendenciamento dos resultados durante o

processo. Para um estudo de caso educacional que é o caso deste projeto de

pesquisa, que pretende estudar e observar a construção do protagonismo e da

autonomia nos educandos, acreditamos que a intervenção do pesquisador não será

prejudicial desde que seja registrada.

Sobre os métodos de coleta de dados, Stake (1995 apud ANDRÉ, 2013)

esclarece que a entrevista deve ser feita com muito cuidado, pois fazer perguntas e

ouvir as respostas é fácil, mas elaborar uma entrevista para compreender o que

deseja para o estudo de caso exige método e, se possível, a construção de um

grupo para testar a entrevista.

Já as observações, segundo Stake (1995 apud ANDRÉ, 2013), tem a

finalidade de conduzir o pesquisador para compreender o caso e deve possibilitar a

análise futura, com a pretensão de proporcionar aos leitores a imersão ao contexto

do estudo. É um instrumento que oportuniza a observação dos comportamentos e

condições ambientais, além de possibilitar o registro por fotografia, áudio ou mesmo

vídeo do ambiente estudado, além do registro dos momentos relevantes para a

pesquisa (NETO; BARBOSA; CENDON, 2006).

Também utilizamos a análise de conteúdo para compreender as redações

produzidas no processo seletivo dos participantes, sendo que:

a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações (Baroln, 1979, p. 31).

Na primeira regra Baroln (1979, p. 215), nos apresenta “o processo de

produção de um discurso (num determinado estado) resulta da composição das

condições de produção deste discurso com um determinado sistema linguístico”.

Diante disso, refletimos que os candidatos escreveram suas redações frente a um

processo seletivo, o que pode ter alterado o seu discurso. Mesmo diante de tal fato,

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acreditamos que os dados não foram invalidados.

Ainda em Baroln (1979), é possível levantar o aspecto de proximidade de

conteúdo, que pode pertencer a um mesmo grupo de domínio semântico. Após esse

levantamento, inicia-se a análise das relações entre os grupos. Para este trabalho,

podemos fazer, por exemplo, o grupo “sonhos”, em que cada participante irá

discorrer sobre seus sonhos, que provavelmente não permanecerão os mesmos,

mas, mesmo assim, não deixam de constituir um grupo de domínio semântico.

Para a revisão bibliográfica deste trabalho, utilizamos como base de buscas o

site scholar.google.com.br e scielo.br, com palavras-chave como: hackerismo;

hacker; ética hacker; educação sociocomunitária; e, educação para o

desenvolvimento. Tais pesquisas tiveram como principal objetivo a obtenção de

conteúdos em portais brasileiros que publicaram sobre assuntos pertinentes a esta

pesquisa. Para exemplificar, de modo micro, publicações que fomentam e ampliam o

pensamento de Himanen (2001). A partir disso, analisamos trabalhos que permeiam

a ética hacker pela política, ativismo, educação, entre outros assuntos.

Feita a coleta de dados, passa-se a parte de análise dos dados, sobre a qual

André (2013, p. 101) alerta que devemos ter cuidado, pois não é um trabalho

somente de categorização, como podemos verificar:

A categorização por si só não esgota a análise. É preciso que o pesquisador vá além, ultrapasse a mera descrição, buscando realmente acrescentar algo ao que já se conhece sobre o assunto. Para isso, terá que recorrer aos fundamentos teóricos do estudo e às pesquisas correlacionadas, estabelecer conexões e relações que lhe permitam apontar as descobertas, os achados do estudo (ANDRÉ, 2013, p.101).

Ao analisar os participantes do PJH em sua individualidade usaremos

somente a primeira letra de cada nome para distingui-los, tendo como principal

objetivo proteger suas identidades/nomes. Acreditamos que, mesmo utilizando de

recursos imagéticos, que acreditamos ser necessários para marcar questões de

tempo e espaço, os sujeitos da pesquisa não serão expostos. Vale ressaltar que a

atitude de proteger os jovens é uma conduta intrínseca do pesquisador e da própria

missão do PJH.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 INTRODUÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO

Temos o desenvolvimento humano como o principal fator para se falar em

educação, pois a educação é, em sua essência, capaz de mudar contextos e

realidades sociais. Trabalhamos a educação como desenvolvimento humano, como

um motor para o desenvolvimento das capacidades e competências dos indivíduos,

pautadas na liberdade de que os educandos dispõem. Assim, a Educação seria a

forma de possibilitar a construção de projetos de vida que satisfaçam as

subjetividades presentes em nossa sociedade.

Utilizamos a concepção educacional sociocomunitária para facilitar, incentivar

e apoiar os projetos de vida que partem do sujeito e podem beneficiar a comunidade

de modo micro e a sociedade de modo macro. Se as comunidades de determinada

sociedade são construídas pelos seus participantes de forma democrática vemos

que há um potencial de realização voltado para o sucesso.

E, por fim, temos a obra norteadora desta pesquisa no que diz respeito à ética

hacker, que é do filósofo finlandês, Pekka Himanen1: A Ética dos Hackers - e o

espírito da era da informação, tradução de Fernanda Wolff, lançado no ano de 2001

pela editora Campus. Esta obra é dividia em três partes, sendo: I Parte – A Ética no

Trabalho; II Parte – A Ética do Dinheiro; e, III Parte – A Ética da Rede. O prefácio do

livro foi escrito por Linus Torvalds e o Posfácio por Manuel Casttels. Num primeiro

momento, discutimos a obra desse autor e depois passamos a trabalhos

relacionados que tomaram a ética hacker como base para a formação do indivíduo e

da sociedade.

2.1 EDUCAÇÃO COMO DESENVOLVIMENTO HUMANO

Vamos desenvolver o pensamento de educação para o desenvolvimento

humano numa perspectiva que rompe com as barreiras que estabelecem só haver

desenvolvimento humano se materializado em recursos financeiros, ou em modo

amplo, em bens do capital. As discussões sobre capacidades são importantes para a

1 - Pekka Himanen, nascido em 1973, se doutorou em Filosofia pela Universidade de Helsinki aos

20 anos de idade, atualmente é professor das Universidades de Helsinki e Berkeley (USA).

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construção do estilo de vida e de mundo, mantendo um estreito laço com a

educação. Acreditamos que é, ou deveria ser, a educação a ferramenta de

desenvolvimento de capacidades.

Pautamo-nos no conceito de desenvolvimento humano apresentado por Haq

(1995 apud MACHADO; PAMPLONA, 2008), que esclarece que não devemos

analisá-lo sob a ótica dos modelos tradicionais, em que o foco se encontra nos

recursos criados, como: Produto Interno Bruto (PIB) ou renda per capita, e sim nas

pessoas e suas capacidades. O desenvolvimento humano defendido nos relatórios

do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) trata o

desenvolvimento humano como um processo de aumentar as escolhas das pessoas,

tendo o objetivo de criar um ambiente em que as pessoas possam viver com saúde,

desfrutar de uma vida longa, de forma feliz e criativa (MACHADO; PAMPLONA,

2008).

Haq (1995 apud MACHADO; PAMPLONA, 2008) elenca quatro componentes

essenciais para o paradigma do desenvolvimento humano: Equidades;

Sustentabilidade; Produtividade; e Empoderamento. Vale ressaltar que na visão

deste autor a produtividade é alcançada por meio de investimentos nas pessoas

para que elas alcancem seu potencial humano máximo. No que diz respeito ao

empoderamento, as pessoas têm um papel ativo e uma participação real no

processo de determinar suas vidas. Em todas as questões vemos que as

capacidades devem serem desenvolvidas para garantir o funcionamento deste

paradigma.

De acordo com este conceito de desenvolvimento humano, voltamos aos

argumentos de Himanen (2001) sobre o dinheiro. O dinheiro não seria um fim em si

e, sim, um meio de conquistar o que realmente interessa, ou seja, o dinheiro seria

um capacitador para os indivíduos conquistarem o que realmente importa para suas

vidas. Nesse contexto, trazemos o pensamento de Sen (2000, p. 28), que trata, em

sua obra, do desenvolvimento como forma de liberdade. Sobre riqueza, ele discute:

Se temos razões para querer mais riqueza, precisamos indagar: quais são exatamente essas razões, como elas funcionam ou de que elas dependem, e que coisas podemos “fazer” com mais riqueza? Geralmente temos excelentes razões para desejar mais renda ou riqueza. Isso não acontece porque elas sejam desejáveis por si mesmas, mas porque são meios admiráveis para termos mais liberdade para levar o tipo de vida que temos razão para valorizar.

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O pensamento de que o dinheiro é meio e não fim, encontra-se na obra dos

dois autores, Himanen (2001) e Sen (2000), mesmo que sob perspectivas diferentes.

Essa abordagem abre a discussão sobre o que é realmente importante. Os recursos

financeiros não são importantes em si, mas importantes para a aquisição dos

recursos/bens significativos para o indivíduo, numa comunicação direta com seu

estilo de vida e sua subjetividade.

Refletimos, para exemplificar, que o indivíduo deseja adquirir um carro.

Devido à construção de nossa sociedade, ele trabalha e acumula dinheiro para que

possa transformá-lo em seu objeto de desejo. Assim, o dinheiro foi a ponte até ao

carro, o capacitador, contudo a construção deste recurso, o dinheiro, se deu por

meio do trabalho, outro capacitador. Podemos perceber, então, com um pequeno

esforço, que o carro foi conquistado por meio do trabalho. Nessa perspectiva, tendo

o dinheiro como meio, podemos trocar o desejo, o carro, por exemplo, por uma casa,

uma moto, uma viagem, um curso, uma faculdade, e teremos o dinheiro como meio.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) emitiu seu

Relatório de Desenvolvimento Humano 2015: O trabalho como motor do

desenvolvimento humano e é neste contexto que acreditamos no trabalho, como:

provedor do crescimento econômico sustentável; inclusivo; digno para todos; e,

como força capacitadora dos indivíduos. Neste documento, ainda encontramos a

diferenciação do trabalho e do emprego. A definição de emprego, aqui, em nada nos

interessa. Nosso interesse se concentra no conceito de trabalho, tido como

fenômeno que “...liberta o potencial humano, a criatividade humana e o espírito

humano”, propiciando uma qualidade de vida elevada e proporcionadora de

dignidade (PNUD, 2015, p.1).

A qualidade do trabalho passa também pela dignidade subjacente a esse trabalho, pelo sentimento de orgulho que proporciona e pelas portas que abre à participação e interação. O trabalho, para poder fortalecer a correlação com o desenvolvimento humano, deve também reforçar a sustentabilidade ambiental. O trabalho fortalece a sua relação com o desenvolvimento humano quando vai além dos benefícios individuais e contribui para os objetivos sociais comuns, como a redução da pobreza e da desigualdade, a coesão social, a cultura e a civilização (PNUD, 2015, p.7).

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Na ilustração 2, visualizamos quanto é amplo a discussão do

desenvolvimento humano e trabalho, são várias as áreas que o trabalho consegue

atingir e transformar. Podemos ver que através do trabalho alcançamos a

criatividade e inovação numa expectativa de criar mais conhecimento e

competências, numa analise das correlações entre os dois quadros da ilustração 2.

Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano, 2015.

Himanen (2001) trata o trabalho, em sua obra, como atividade. Seu esforço,

no entanto, é desvincular o pensamento de trabalho explorador para uma atividade

dignificante no mesmo viés apresentando pelo relatório PNUD (2015). Assim,

percebemos que o trabalho apresentado pelo relatório ou a atividade apresentada

por Himanen (2001) têm como finalidade levar os indivíduos ao desenvolvimento

humano. Soffner (2005, p. 21) diz que “trabalhar quer dizer aprender, compartilhar

saberes e produzir conhecimentos”, dando destaque ao significado do trabalho para

o desenvolvimento humano.

Até o momento, fundamentamos nossa argumentação no desenvolvimento

humano, nos recursos financeiros e no trabalho num contexto em que não é apenas

o recurso capital que é importante. Nessa perspectiva, passa-se a mais um

Ilustração 1 – Trabalho e Desenvolvimento Humano.

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20

argumento que se liga ao desenvolvimento humano: a liberdade.

Himanen (2001) discutiu a liberdade do hacker. Os hackers exerceriam suas

atividades em harmonia com seu estilo de vida, sendo essa liberdade refletida no

tempo como fator de possibilidades de vida e projetos. Sen (2000, p.32) aborda as

liberdades dos “indivíduos com um elemento constitutivo básico para possibilitar a

expansão das capacidades das pessoas de levarem o tipo de vida que elas

valorizam”. Sen (2000) ainda argumenta que somente uma pessoa livre de certos

condicionantes, tais como fome, doenças e governos autoritários, podem exercer

sua liberdade com a finalidade do desenvolvimento. Nesses dois autores, a visão de

liberdade caminha para o desenvolvimento das capacidades humanas. No primeiro,

há um sentido restrito e pragmático da liberdade hacker em fazer escolhas. No

segundo, um sentido amplo de pensar a liberdade como uma forma de construção

de mundo, em que os estilos de vidas e as subjetividades sobrepõem o

determinismo, as medições/comparações e os condicionantes degradantes.

Para compreendermos melhor esse contexto, vemos que Sen (2000) defende

que as medições de rendas, PIB e industrialização são relevantes, mas devem ser

integradas a um quadro mais amplo e completo, que contemple as medições das

capacidades, êxito e privação que os indivíduos sofrem. Capacitar as pessoas é de

fundamental importância. Baseamo-nos, para estabelecer o significado de capacitar,

no trabalho de Soffner (2005, p. 24), que esclarece que que capacidade “é uma

qualidade que uma pessoa ou coisa tem de possuir para um determinado fim:

habilidade, aptidão”. Assim podemos compreender melhor o contexto que se aplica o

conceito, uma vez que capacitar se condiciona a dar condições para as pessoas

realizarem o que desejam, por exemplo: A pessoa tem a capacidade de se alimentar

bem. Sendo assim ela tem acesso a uma boa fonte de alimento, o que a torna capaz

de se alimentar, não sofrendo nenhum tipo de privação, além de ter a liberdade de

se alimentar bem ou não.

Em se tratando de privações, podemos ver que na visão de Sen (2000) o

desenvolvimento ocorrerá se houver a libertação do indivíduo.

“O desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência excessiva de Estados repressivos” (SEN, 2000, p.18).

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Após restaurar a liberdade, a próxima etapa é desenvolver as capacidades.

Essa etapa só terá validade se os indivíduos desfrutarem de poder de escolha, sem

a castração dos condicionantes apresentados. Somente mediante a satisfação

dessa condição podemos pensar nas capacidades. Sen (2000), após fazer a

argumentação em sua obra, interpreta o desenvolvimento como liberdade, como um

desenvolvimento de capacitações no sentido de ampliar visões de mundo, sendo

que a liberdade permite fazer as escolhas que condizem com o estilo de vida do

indivíduo. Kang (2011, p. 366) analisa a obra de Sen e esclarece que “o conceito de

desenvolvimento aqui empregado tem seu foco na vida das pessoas e, portanto,

justiça e desenvolvimento, com a defesa da igualdade e da expansão de

capacitações estão integradas na abordagem de Sen”.

Os argumentamos que utilizamos até o momento são para irmos ao encontro

de uma educação para o desenvolvimento, tendo como finalidade da educação o

conceito proposto por Soffner (2005, p. 17) “de fazer o ser humano capaz de

transformar potenciais em competências para viver”. Dentro de um contexto que o

educando não sofra qualquer tipo de privações, físicas ou mentais, e tenha a

liberdade de escolher e pautar sua vida conforme desejar, mas, também que tenha a

oportunidade de desenvolver seu potencial humano ao máximo, num sentido de ter

a possibilidade de desenvolver as suas: capacidades, competências e valores

(SOFFNER, 2005).

Soffner (2005) trabalha duas visões da educação, a primeira ligada à

transmissão de informações e a segunda como formação do indivíduo. Essa

segunda é relevante para este trabalho, pois não queremos só transferir informações

para o educando. Isso ele tem em abundância devido às tecnologias sociais. O que

desejamos é que o educando com acesso as informações possam ser capazes de

transformar suas vidas, conforme seu estilo, e, consequentemente, transformar a

sociedade.

Chaves (2004 apud SOFFNER, 2005) argumenta que a escola tem que

mudar para atender às necessidades da sociedade da informação e, com isso,

aumentar a qualidade da educação. Por meio desse conceito, Soffner (2005, p.18)

reflete “que a escola deve preparar pessoas para viver suas vidas de forma

competente na sociedade da informação”.

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Para viver suas vidas de forma competente no contexto atual, as pessoas precisam se tornar capazes de mobilizar, de maneira integrada, as habilidades, as informações, os conhecimentos, os valores e as atitudes que sejam necessários ou pertinentes para transformar seu projeto de vida em realidade (SOFFNER, 2005, p.18).

Analisando sob a ótica do desenvolvimento humano, à medida que as

pessoas têm capacidade de escolha, no contexto social em que elas vivem, elas têm

a abertura de escolherem as competências que desejam desenvolver em sintonia

com seu projeto de vida. Soffner (2005) trata isso como a educação para o

desenvolvimento humano, tendo em perspectiva uma educação capaz de

desenvolver competências e, por meio disso, proporcionar o desenvolvimento

humano. Para esse autor, desenvolver competências se relaciona com o saber fazer

algo utilizando de suas habilidades, tendo sua aplicação tanto no plano físico quanto

no mental.

Os indivíduos conseguem prosperar se possuírem as qualificações, conhecimentos e competências necessárias para tirar partido das novas tecnologias e capitalizar as oportunidades emergentes. Proporcionar aos trabalhadores novas competências e educação. Serão necessárias qualificações mais elevadas e específicas para o trabalho nos setores da ciência e da engenharia, bem como em muitos outros, assim como o serão a aptidão para a criatividade, a resolução de problemas e a aprendizagem ao longo da vida (PNUD, 2015, p. 23).

Pelos trabalhos estudados, constatamos que a educação como

desenvolvimento humano centra seus esforços para desenvolver as competências

das pessoas em uma ligação direta com o projeto de vida de cada um e rompe com

a educação tradicional, não havendo divisão da educação em etapas etárias, e, sim,

em projetos de vida, em constante evolução para “... reforçar as competências de

base da população. Esta tarefa exigirá uma abordagem de ciclo de vida, que

reconheça o carácter cumulativo das intervenções que contribuem para a

aprendizagem” (PNUD, 2015 p. 27).

2.3 EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA

A concepção da educação sociocomunitária transita por muitos contextos e

nuances, sendo que tal concepção não nega as outras modalidades/definições de

educação e se aproxima, segundo Gomes (2008), da Educação Não Formal e da

Educação Social. A Educação Sociocomunitária não deseja, tampouco, assumir o

posto de ser a luz sobre todas as outras em um momento que vários modelos

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tradicionais de educação são questionados e novos contextos de sociedades são

inventados e reinventados. Essa concepção educacional está estreitamente liga à

educação para o desenvolvimento, partindo da comunidade para a sociedade.

Podemos afirmar que todos os modelos educacionais buscam transformar a

sociedade como um todo, sendo que a educação sociocomunitária realiza sua

intervenção mais próxima das comunidades para empoderá-las na busca de

transformações locais que, por consequências, geram transformações no todo,

neste caso, na sociedade.

Mas o que compreendemos por comunidade e sociedade? Por comunidade,

entendemos que a palavra é dotada de um sentido, ou melhor, sentimento de

bondade, referindo-se apenas às ações e construções benéficas de um determinado

grupo de indivíduos (GOMES, 2008). Em comunhão com esse pensamento, Isaú

(2007) contribui para o debate, afirmando que, quando utilizamos o termo

comunidade, existe um inerente sentimento de proximidade e afetividade, num

sentido mais íntimo de criação de laços para ações comuns e coordenadas em

busca de algo maior.

Para Carmo (2007), a comunidade pode ser utilizada em diversos contextos,

tendo dimensões do micro ao macro. Nos integrantes de uma comunidade, deve

haver uma semelhança, uma identidade que limita o que está dentro ou fora da

comunidade. A comunidade seria um grupo de pessoas com diversas

características, ligadas por laços sociais de confiança, que compartilham

perspectivas comuns e se engajam em ações conjuntas, em espaços geográficos ou

virtuais (CARMO, 2007). Isaú (2007, p. 6) segue a mesma ideia de Carmo (2007),

dizendo que “a união de muitos com o objetivo de alcançar a realização do fim

comum com as forças construtivas de todos é o que constitui a comunidade em

sentido estrito”.

A comunidade contribuiu para a construção do indivíduo, sendo que o

indivíduo é autor na construção de uma comunidade, e nesse processo envolve toda

a sua subjetividade. Para contribuir com a reflexão que este texto tenta provocar

sobre a comunidade, Lévy (1993, p.135, grifo nosso):

A inteligência ou a cognição são o resultado de redes complexas onde interagem um grande número de atores humanos, biológicos e técnicos. Não sou “eu” que sou inteligente, mas “eu” com o grupo humano do qual sou membro, com minha língua, com toda uma herança de métodos e

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tecnologias intelectuais.

Já quando utilizamos o termo sociedade os laços são elásticos e dentro da

sociedade existem e coexistem várias comunidades, com seus interesses próprios e

particulares, que somente seus membros defendem (ISAÚ, 2007). Ainda no

pensamento de Isaú (2007), o que une e ordena a sociedade é sua estrutura jurídica

e estatutária, que todos devem seguir dentro de um contexto de espaço/tempo.

A sociedade é o âmbito em que se dá a produção social da existência humana, em que os homens entram em relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade. Essas relações para Marx correspondem a um grau determinado do desenvolvimento das forças produtivas materiais (NORONHA, 2006, p. 64).

Isso basta para a definição de sociedade para este trabalho, pois o que nos

interessa é o sentimento de pertencimento que é desenvolvido na comunidade, por

algo que está próximo dos ideais destes indivíduos. São diversos espaços que um

indivíduo transita durante sua vida, começando na maioria das vezes pela família.

Depois, passa a conviver na vizinhança de sua residência e segue outros passos,

frequentando outros espaços: a igreja, a creche, a escola primária, a escola

secundária e muitos outros. O pertencimento, aqui tratado, só se consumará se o

indivíduo conseguir se desenvolver ao ponto de se colocar no lugar do seu próximo

na comunidade e desejar o melhor para ele (ANTÔNIO, 2012). Antônio (2012, p. 63)

trata do pertencimento com empatia que possibilita “nos reconhecemos uns aos

outros, uns nos outros, tanto no sentido do que temos em comum, como no sentido

do que temos de diferente”.

A educação sociocomunitária trabalha questões de escopo comunitário e é fundamentada em práticas educativas que levam a mudanças sociais, a partir também de indagações do modelo tradicional de educação formal, em geral criticado pelas comunidades (SOFFNER, CHAVES, 2012, p.128).

Para este trabalho, não pretendemos e nem necessitamos discutir os espaços

de atuação da educação sociocomunitária, contudo podemos afirmar que, onde

houver uma comunidade que deseja ações para transformações comunitárias e/ou

sociais, poderá ocorrer a utilização de recursos desta concepção educacional para

fomentar tais ações. Ainda, neste pensamento, podemos esclarecer que a educação

sociocomunitária vai ao encontro da comunidade e se adapta para atendê-la. Nisso

se apoiam as intervenções sociocomunitárias que ainda serão discutidas.

A educação sociocomunitária tem em seu cerne a educação para o

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desenvolvimento, que segundo Carmo (2007), é tida como estratégica, pois

determina caminhos, como, por exemplo, para a gestão de recursos disponíveis ou

para a solidariedade para com os outros, além de trabalhar áreas-chave, por

exemplo: mudança, autonomia, democracia, solidariedade. E, ainda em Carmo

(2007), como também é aceito na concepção educacional sociocomunitária, os

caminhos estratégicos serão traçados com o envolvimento da comunidade que deve

se articular para melhor aproveitar/utilizar seus recursos e meios, tanto físicos

quanto humanos. Devem ocorrer decisões estratégicas, baseadas na democracia,

para identificar recursos, estabelecer prioridades e articular recursos.

Neste momento, trazemos a contribuição de Lima (2012, p. 124):

Acredita-se que uma educação sociocomunitária seja uma proposta de criação coletiva, local, inusitada, um ensaio, potencializando-se espetáculos tão criativos quanto possam tornar-se os seus atores, autores, protagonistas que se atualizam em cada nova cena, em cada novo cenário, frente a novos enredos e dramas.

Ainda, neste viés, podemos refletir com o suporte de Ferreira (2012, p. 166)

que aposta na “potencialidade da educação sociocomunitária enquanto uma

possibilidade criativa, uma alternativa inovadora com tendência ao sucesso, se

referenciada pelo reconhecimento da diferença e pela ênfase à singularidade

humana”. Criatividade e inovação, duas palavras-chave, que em nosso credo

trabalham para potencializar qualquer concepção educacional e estão presentes na

ética hacker, sendo uma grande inovação da educação sociocomunitária a “escuta”

das comunidades que recebem uma intervenção.

Abrir escuta é uma das práticas diferenciais da educação sociocomunitária.

Escuta essa baseada em Paulo Freire, tanto nas intervenções, quanto nas

pesquisas. É de fundamental importância tal prática libertadora, criadora de sentido

e compreensão, quando a escuta se potencializa, criando diálogos empáticos.

Antônio (2012) contribui ao dizer que é importante escutar o outro e nos escutar,

bem como ver nossas criações por meio do diálogo. Assim, nos constituímos como

sujeitos humanos.

Os registros das escutas são de relevante importância, não por simples e

mecânica arquivação, e, sim, por proporcionar e potencializar a práxis educacional,

pois “é através da reflexão, enfim, que os profissionais se apropriam de e se

reconhecem nas suas práticas” (FERNANDES, 2012, p.78). O treinamento de olhar

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para si e olhar para o outro é importante tanto para a ética quanto para a educação.

Ter a possibilidade de rever essas escutas por meio de instrumentos que permitem

perceber o que ocorreu durante a escuta e torna viáveis novas inferências e

aprendizados.

Para compreender os indivíduos, é necessária a análise de seu contexto,

contudo Kloos (2012) afirma que que contextos que valorizam o equilíbrio de poder

nas relações pessoais, o desenvolvimento pessoal e que promovem o bem-estar

individual e coletivo são os mais funcionais. Podemos verificar isso em escolas

menores, onde os pesquisadores encontraram maiores níveis de estudantes

envolvidos em atividades acadêmicas (KLOOS, 2012).

Podemos afirmar que toda intervenção, desde a micro até a macro, deve

primar pela “ética da intervenção, sendo fortemente respeitadora da liberdade e da

integridade do sistema-cliente” (CARMO, 2007, p. 152). Mesmo o autor tendo ligado

essa fala à intervenção de contexto meso, entendemos que tal ética deva ser

aplicada a qualquer escala de intervenção, sendo importante para as intervenções

que se norteiam pela educação sociocomunitária.

E, nesta linha de pensamento, o interventor sociocomunitário exerce um papel

chave neste processo, uma vez que o interventor sempre será participante e deve

ter acesso aos capitais de informações de forma fluídica. Este interventor não deve

adentrar no local da intervenção com preconceitos sobre a realidade em questão e,

como um pesquisador, deve se afastar dos problemas para melhor compreendê-los.

Portanto, temos dois sistemas: o sistema interventor e o sistema cliente, que devem

dialogar para negociar o que deve ser feito e como deve ser feito, já que os dois

sistemas passam pela fase da contratualização de papéis claros e objetivos que

cada sistema terá na intervenção, assumindo suas responsabilidades e deveres um

para com outro (CARMO, 2007).

Para que o desenvolvimento comunitário ocorra, umas das principais

iniciativas é investir na educação dos indivíduos pertencentes à comunidade. A

educação deve ter o intuito formativo, que permita que o indivíduo aprenda novos

conhecimentos a partir de uma base inicial (CARMO, 2007). A informação está

disponível em diversos meios de comunicação, como internet, determinados canais

de televisão, revistas. Contudo, é necessário que o indivíduo consiga transformar

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esta informação em conhecimento e é por meio de uma educação/intervenção que

se constrói o aprender para aprender, que garantirá a autonomia de uma

comunidade.

Assim, temos a possibilidade de reestruturar a dicotomia opressor/oprimido,

pois quando não se tem uma formação emancipadora o desejo do oprimido é se

tornar opressor e para quebrar este vício é necessária uma educação libertadora

(FREIRE, 2014). No entanto, como fazer uma educação libertadora com tantos

problemas de relação de aluno/escola tais como os trabalhados por Carmo (2007):

absenteísmo, insucesso e abandono? Neste momento é oportuno que pensemos em

outros locais de formação e aprendizado que não sejam castradores, e um ambiente

possível para isto é a comunidade e todas as possibilidades que existem dentro

dela.

É importante que o aluno se sinta bem em seu ambiente escolar e se tiver

algum problema que este seja resolvido o mais breve possível. Vemos em Carmo

(2007) que uma intervenção precoce contribuí para que não ocorra o abandono do

ambiente escolar por parte do aluno. Algumas ações podem ajudar a resolver estes

problemas, como: possibilitar ao aluno uma rede de apoio com aprendizagem

intercultural, numa relação da comunidade com a escola, tornando os ambientes

escola/comunidade harmônicos. Nesse convívio, a escola pode prover ao aluno o

conhecer o Eu e o conhecer o Outro, como vimos em Antônio (2012). Esses

conhecimentos são fundamentais para o viver em comunidade e sociedade.

A construção de uma rede social de apoio também contribui para a

permanência do aluno na escola (CARMO, 2007). A abertura da informação para a

construção do conhecimento deve ser total. Para além disso, deve haver

contribuições da comunidade para aprimorar essas informações e possibilitar a

construção do capital informacional com diversas perspectivas de conhecimento.

Esta abertura do capital informacional é importante a partir da ideia de que que todos

podem tomar parte do processo com seus conhecimentos, gerando a participação

como sujeito da história da comunidade, despertando o empenho de todos em ter

sua identidade respeitada como cidadão de corpo inteiro (CARMO, 2007).

Defendemos que o cidadão deve ser respeitado e ouvido. Apenas assim

iremos criar um ambiente propício ao desenvolvimento comunitário e social, pautado

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pela educação e pelo valor social. Há a necessidade de se quebrar a relação de

opressor/oprimido e isso não se dará levando os valores do sistema interventor para

uma comunidade em que se irá combater esse tipo de relação de poder. Temos que

trabalhar de forma cooperativa e colaborativa na intervenção, para que todos deixem

um pouco de si e doem de si para a construção de um ambiente sadio e próspero.

Em seu trabalho, Jaconi (2012) demonstra um cenário em que a educação

sociocomunitária, uma formação humana, vai ao encontro da educação profissional

e da alfabetização profissional, no sentido de entender o contexto social do

educando e possibilitar a redução da evasão. O sentimento do aluno perante o

aprendizado, quando ele não alcança os patamares desejados pelo currículo, é de

desmotivação e frustração, o que ocasiona a evasão. Podemos analisar que a

formação humana, pautada na educação sociocomunitária, é de extrema

importância para potencializar a convivência tão necessária ao processo de

aprendizagem.

Na concepção educacional sociocomunitária, percebemos que o discurso vai

ao encontro da afetividade, se transformando em ações e rompendo com as falácias

dos grandes discursos, por vezes, opressores. A educação só pode acontecer se for

de forma dialógica, afinal, “ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho: os

homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo” (FREIRE, 2005, p. 39). As

transformações fomentadas pela educação sociocomunitária começam com a

aproximação das pessoas, incluindo os líderes das comunidades, geralmente por

um objetivo que os afetam. O início desta aproximação é mecânico, em volta de

determinado objetivo ou problema. Com o tempo, ganha aspectos além dos afetivos

tornando-os sentimentais, que permitem criar amizade, sentido de pertencimento e

habilidade de empatia.

Para Freire (1979 apud JACONI, 2012), a educação é uma busca

intencionada e realizada por sujeitos, não na perspectiva de relação de sujeitos e

objetos. Alunos não devem e não podem ser objetos da educação e muito menos

ser seu produto final. Resende (2006 apud ISAÚ, 2007) concebe a educação

sociocomunitária como a construção de uma instituição educativa pela comunidade

e dá credito não só aos educadores e, sim, a todos que participam desse processo,

dando relevada importância aos educandos.

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Por falar em educandos, se faz necessário falar sobre subjetividade, pelo

menos para situar no que acreditamos sobre o assunto para este trabalho. Em seus

estudos, Ferreira (2008), citando Gattari (2000) e Foucault (1979), define que o

processo de subjetivação passa pelo poder disciplinar e por agenciadores coletivos

de enunciação, que criam uma subjetivação das massas. Por vezes, este processo

de subjetivação se faz por processos de reproduzir modelos preconcebidos,

transformando a subjetivação em assujeitamento. É necessário a rejeição deste

processo de subjetivação hegemônica para a criação da subjetividade singular, que

tem o respeito a diversidade humana (FERREIRA, 2008).

Para Lévy (1993, p.161), “o sujeito transcendental é histórico, variável,

indefinido, compósito”. A fala de Lévy (1993) trata dos sistemas cognitivos, afirmando

que são combinações sujeito/objeto. Contudo, tal afirmação também proporciona a

reflexão sobre a subjetividade e se aproxima de Larrosa, que afirma que (1994,

p.54) “o sujeito, sua história e sua constituição como objeto para si mesmo, seriam,

então, inseparáveis das tecnologias do eu. Foucault define as tecnologias do eu

como aquelas nas quais um indivíduo estabelece uma relação consigo mesmo”.

Nesta perspectiva de subjetivação, a educação sociocomunitária pretende

reconhecer as diversidades humanas e permear os diversos conhecimentos dos

sujeitos para a construção significativa de conhecimentos, tanto

instrumentais/técnicos quanto de formação/humanos. Permite, ainda, reflexões do

sujeito sobre si e sobre o que o afeta, em contextos que vão do micro ao macro, da

comunidade à sociedade, sem omitir as tensões que tal prática gera.

Junta à subjetivação, se faz necessária a definição de protagonista. Esses

termos são chaves para analisar o Projeto Jovem Hacker. Etimologicamente, a

palavra protagonista tem sua origem no idioma grego, protagonistés, sendo o sujeito

que ocupa o centro de um determinado acontecimento e no teatro o detentor do

papel principal (FERREIRA apud PIRES; BRANCO, 2007). Soffner (2014, p.312),

baseando em Gadotti e Freire, reflete sobre o termo, dizendo que é o “consumidor

que se torna produtor de tecnologia. Aquele que não é apenas reprodutor e receptor,

mas produtor em termos de publicação”. Tal fala se dá em um trabalho que trata dos

meios digitais, mas o protagonismo que defendemos na educação sociocomunitária

percorre não só, mas também, este caminho de compreender a participação de

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determinado indivíduo em sua comunidade e expandir seu mundo com protagonismo

e autonomia.

A autonomia aqui tratada é baseada no pensamento de Freire (1996 apud

JUNIOR, 2012) que repeita o ser educando e oportuniza a liberdade a ele para

aprender respeitando seu limite, sua cultura, sua linguagem. Tal pensamento, em

nosso ver, se liga à ética na educação. Acredita Junior (2012) que o ato de aprender

com autonomia possa gerar prazer ao educando. Assim, pode-se estabelecer um

caminho mais afetivo durante o processo de aprendizado, que por vezes terá

significado.

O protagonismo e a autonomia, internalizados pelas subjetivações são

processos importantes para propiciar e potencializar as transformações sociais

intencionadas que Gomes (2008, p. 56) discute dentro da educação

sociocomunitária.

É preciso, portanto, compreender que ao se propor o estudo da educação sócio-comunitária, a proposta não é feita como hipótese de resolução de todos os problemas sociais e educativos, mas como problematização das possibilidades de emancipação de comunidades e pessoas em constituir articulações políticas, expressas em ações educativas, que provoquem transformações sociais intencionadas.

Neste trabalho temos a proximidade com o virtual, com tecnologias que

permitem a distribuição das informações sem considerar limites geográficos e

políticos. Assim, se faz necessária a definição de comunidade perante este universo

virtual, e para isto recorremos a Lévy (1999, p. 127): “uma comunidade virtual é

construída sobre as afinidades de interesses, de conhecimento, sobre projetos

mútuos, em um processo de cooperação ou de troca, tudo isso independentemente

das proximidades geográficas e das filiações institucionais”. Tal definição é

complementar das apresentadas até aqui por Gomes, (2008), Carmo (2007), Isaú

(2007) sobre o tema.

Assim, podemos criar uma rede comunitária social que prime pelo

desenvolvimento pessoal e social, servindo de apoio a todos (CARMO, 2007). No

hackerismo temos o cuidado com o outro e não importa seu nível de conhecimento

ou sua posição dentro da comunidade. Esse cuidado deve fazer parte da conduta

dos membros da comunidade, seja ela uma comunidade material ou virtual.

Nessa ética, deve-se buscar a “...aprendizagem colaborativa, na qual os

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alunos aprendem, horizontalmente, uns com os outros, em muitos casos sem a

mediação do professor” (SOFFNER; CHAVES, 2010, p. 502). Ainda falando de

aprendizagem, temos o ensino aberto e à distância, que Carmo (2007, p. 265) define

como “modalidade de ensino que obriga a um processo de mediatização para suprir

a descontinuidade entre ensinante e aprendente”. Nesse contexto, o aprendente, por

meio da filosofia da aprendizagem aberta, pode escolher os seguintes fatores que

Carmo (2007, p. 265) define: “1. O que quer aprender; 2. Onde quer aprender; 3.

Como quer aprender; 4. Quando quer aprender; 5. O ritmo a que quer aprender; 6. A

quem recorrer para aprofundar conhecimentos; 7. A que sistema de creditação se

quer submeter”.

2.4 A ÉTICA HACKER

Em um primeiro momento, temos que compreender a origem da palavra

hacker e a motivação para sua criação. Iniciamos com o trabalho de Aspis (2012),

que esclarece que:

A palavra hacker surge juntamente com a primeira geração de hackers nos EUA no final da década dos anos 50 do século XX advinda de hack, que em inglês significa talhar, talhar detalhes em madeira, com preciosismo. Quando alguém produz um trabalho criativo, inovador, com estilo e excelência técnica, diz-se que esse trabalho foi executado com talento de hacking (ASPIS, 2012, p.13).

Vale destacar que esse surgimento se deu com os estudantes e professores

do Massachusetts Institute of Technology (MIT) que já utilizavam o termo hack para

descrever suas realizações (VILELA, 2006).

A palavra hacker é contraditória, devido ao mau uso da palavra, sendo que os

hackers em outro momento criaram o termo cracker (VILELA, 2006), com o principal

intuito de desvincular as pessoas que utilizavam sua alta capacidade técnica para

causar qualquer tipo de dano a outras pessoas, pois tais indivíduos utilizam sua

inteligência somente em beneficio próprio, não envolvendo qualquer tipo de

cooperação e partilha, enquanto os hackers utilizam sua inteligência e seu tempo

para a construção de conhecimentos a serem partilhados. De modo macro, os

crackers utilizam seu tempo de forma egoísta e se gabam dos seus feitos

(GACHARNÁ, 2011).

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O modo de vida do hacker, sempre pautados pela paixão e liberdade2 ,

instigaram a curiosidade de Pekka Himanen, situação que resultou na obra já citada.

Por definição, um hacker deve partilhar seus programas, conhecimentos e

experiências, sempre que possível (HIMANEN, 2001). Assim, a sala de aula deve,

ou deveria ser, um ambiente de partilha de conhecimentos e experiências dos mais

diversos enfoques, como: projeto de vida, contextos sociais, informações, entre

outros. Assim, percebemos que a prática docente pode se enriquecer com um viés

hacker, pois o docente partilha com os educandos um pouco do seu ser.

Para definir trabalho hacker, Himanen (2001), fez uma contraposição do

trabalho hacker com o trabalho apresentado na obra de Max Weber, Ética

Protestante e o Espírito de Capitalismo, discutindo o que é relevante para a

sociedade: a renumeração ou a obra resultante do trabalho. Questionamentos como

“Todo trabalho deve produzir um bem capital?” direcionam a discussão. Chegou-se à

conclusão de que uma transformação social é, por vezes, muito melhor que somente

a renumeração. O autor relativiza o conceito, defendendo que o hacker tem que

vencer as barreiras da sobrevivência para poder atuar neste nível de trabalho, mas a

finalidade do hacker sempre será a construção de uma obra relevante para a

sociedade.

Assim, Himanen (2001) definiu as principais motivações para os hackers,

concebendo a Lei de Linus. Nessa lei, temos na base da pirâmide a

“sobrevivência”, neste item o hacker deve sanar suas necessidades primárias, por

exemplo: alimentação; moradia; bem-estar moral. Somente após isso ele pode se

dedicar aos níveis superiores da pirâmide. Contudo, para cada hacker, as

necessidades contidas na categoria sobrevivência são diferentes. Isso se dá devido

ao respeito às características de cada um.

Já na segunda categoria, “vida social” estão os laços emocionais entre

pessoas. Himanen (2001) não trabalhou este lado do hacker a fundo. Apenas disse

que há pessoas que estão dispostas a morrer por outras, citando a história de

Romeu e Julieta, o que mostra que a sobrevivência não é tão importante para

algumas pessoas se comparada com as relações sociais e afetivas.

Por último, a “diversão”, sendo este o objetivo dos hackers. Himanen (2001)

2 - Liberdade permitida pelas tecnologias, principalmente pela Internet, onde os hackers trabalham

e definem que é o novo campo de atuação da mente humana.

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cita o exemplo de Einstein, que trabalhou não só para sobreviver ou para fazer um

bem social, mas, sim, trabalhou pelo puro prazer de descobrir coisas sobre a física.

Por meio do seu trabalho, conseguiu ir onde nenhum outro homem foi capaz naquele

momento, trilhando um caminho próprio e único. Ainda a respeito da diversão,

estabelece uma crítica ao dinheiro, afirmando que ninguém deseja dinheiro por

dinheiro. A motivação que envolve dinheiro não é por ele em si. Ele é, na verdade,

uma “ferramenta definitiva para obter o que realmente desejamos” (HIMANEN, 2001,

p. 15).

Para Himanen (2001), a diversão envolve um sentimento, uma força

arrebatadora, pois potencializa o hacker a permanecer fazendo o que lhe causa

prazer, sendo que sua energia é quase inesgotável neste tipo de tarefa. A motivação

intrínseca de um hacker passa, segundo Himanen (2001), pelo desafio, que seria o

combustível de muitas construções, tanto individuais como em grupos.

A sobrevivência é o ponto de partida, básico e necessário, e deve ser

conquistada pelo hacker, mas tendo como objetivo realizar as outras etapas que na

visão hacker são mais importantes. O que realmente importa são a Vida Social e a

Diversão, lugares onde o hacker deseja passar mais tempo. Vale reiterar que isso só

ocorre depois de o hacker vencer as barreiras impostas pela sobrevivência. Somente

depois de superadas essas barreiras, o hacker poderá passar para as etapas

superiores da pirâmide. Em resumo, na Lei de Linus a sobrevivência é necessária e

deve ser conquistada o mais rápido possível, pois o que realmente importa são as

etapas superiores da Lei de Linus.

O primeiro pilar da ética hacker apresentada por Himanen (2001, p. 21) é a

paixão que se resume na “dedicação a uma atividade que é intrinsecamente

interessante, inspiradora e lúdica”. Nessa fala, se resume a primeira parte da obra

do autor. Tendo a paixão ligada ao trabalho, percebemos o esforço de Himanen

(2001) para desenvolver um conceito de trabalho hacker ligado à paixão e não à

obrigação, sendo que “o trabalho árduo e a dedicação passam a ser uma espécie de

jogo intenso em vez de trabalho pesado” (HIMANEN, 2001, p. 31).

Para que o ideal hacker seja realizado, é necessária a liberdade. Segundo

pilar da ética hacker, Himanen (2001) tratou da liberdade ligada à prática acadêmica,

que deixa o indivíduo responsável por organizar seu tempo, compreendendo o ritmo

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de cada um para desempenhar uma tarefa, a partir de momentos de inspiração que

combinam o ócio e o trabalho árduo. A busca do hacker é equilibrar estes dois

pontos: inspiração com o trabalho árduo. Isso não é feito em tempo cronológico, mas

em momentos livres facultados ao ato de pensar. Entendemos que o ócio é

importante para potencializar a criatividade, pois dedicar algum tempo ao “fazer

nada” traz em si momentos prazerosos que tiram o foco da tarefa atual. Assim,

permite-se a expansão dos horizontes por meio do ato de pensar/refletir, num viés

de dar asas à imaginação.

Utilizar o tempo com liberdade é essencial para que o hacker potencialize

suas ações e realize suas paixões. Himanen (2001) critica a forma de estruturar a

semana em dias e os dias em horas: hora para alimentar, hora para exercitar, hora

para trabalhar, hora para descansar, hora para brincar com os filhos, hora para

conversar com a esposa. A vida é compartimentalizada conforme os mosteiros e isto

não respeita a subjetividade individual. Para finalizar estes pilares, liberdade e

paixão, Himanen (2001, p. 38) apresenta a definição “minha vida é minha vida”, que

deve ser pautada na plenitude e possibilidades inerentes a cada indivíduo,

respeitando o potencial contido em cada um.

Dentro da ética hacker, existe a abertura. Himanen (2001) trabalhou este pilar

também ligado à academia, pois na academia o acesso à informação deve ser livre.

Seria impossível, perante a ética hacker, tornar a informação inacessível ou

acessível somente a um grupo de pessoas. Na visão hacker, todos devem ter

acesso às informações, pois as criações de novos conhecimentos são baseadas em

informações já criadas e disponibilizadas. Propiciar condições das informações

receberem críticas, serem aceitas ou refutadas dentro da comunidade/sociedade é

uma atitude hacker, pois sem essa abertura a transformação da sociedade fica

restrita a um grupo seleto de pessoas.

Ainda no pilar abertura, o partilhar é uma característica e uma atitude dos

hackers, pois não partilham só informações, mais do que isso, partilham seu tempo

em trabalhos colaborativos. Podemos exemplificar essa partilha utilizando a

construção de softwares livres, em que os hackers compartilham recursos, como

tempo, ideias e informações.

Assim, uma comunidade hacker aprimora-se através da partilha, sendo que

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todos os hackers estão dispostos a doar suas informações e seu tempo para ajudar

a sua comunidade. O principal motivo dessa postura é aperfeiçoar a comunidade,

isso se comunga com o pensamento acadêmico de abertura das informações. Vale

salientar que em uma comunidade hacker as informações são abertas para toda a

sociedade e não só para seus membros. O principal motivo para tanto é que todos

possam experimentar, testar, aprender e se empoderar e, a partir disso, proporcionar

novas criações e conhecimentos.

O valor social, mais um pilar da ética hacker, é potencializado com a abertura

das informações. O principal objetivo do valor social é a criação de uma sociedade

pelas pessoas para as pessoas. O valor social se ligado à abertura, pois possibilita

a criação de novos contextos sociais e tem como finalidade potencializar o

desenvolvimento humano. Na visão de Himanen (2001), o hacker sempre atua para

a construção de uma sociedade melhor, pautada na liberdade e no respeito às

diversidades/subjetividades. Por essa razão, a abertura é importante para o

processo de criação do valor social. Sem as informações, o aprender ficaria

debilitado e o retrabalho seria uma constante nas comunidades hackers e, por

consequência, na sociedade.

Na atividade, outro pilar da ética hacker, encontramos a determinação do

hacker para buscar suas paixões e proteger seu estilo de vida, numa busca

constante para ir além da sobrevivência e da agenda. Observamos ainda que no

estilo de vida do hacker, romper com a passividade é uma constante (HIMANEN,

2001). Compreendemos que a atividade apresentada por Himanen (2001) se liga ao

trabalho para o desenvolvimento humano apresentado pelo Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2015) em seu relatório anual.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) é a agência líder da rede global de desenvolvimento da ONU e trabalha principalmente pelo combate à pobreza e pelo Desenvolvimento Humano. O PNUD está presente em 166 países do mundo, colaborando com governos, a iniciativa privada e com a sociedade civil para ajudar as pessoas a construírem uma vida mais digna (NACOESUNIDAS, 2017).

Como já falamos, é importante partilhar não só as informações, mas também

o tempo com os outros, em benefício de um projeto. O hacker também partilha um

projeto de vida e de transformação social. Himanen (2001) apresenta o pilar Cuidar,

tendo a ajuda ao próximo como um fim em si, deixando de lado o contexto de

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sobrevivência e competitividade da sociedade atual. Essa transformação parte do

mundo virtual, possibilitando a criação de novos contextos sociais. Cuidar é:

preocupar, proteger e capacitar o outro para desenvolver sua autonomia e

protagonismo na construção de uma nova sociedade, utilizando todos os recursos

disponíveis.

E, por fim, o último pilar da ética hacker: a Criatividade. Criar um novo projeto,

criar um novo meio de ensinar, criar um novo grupo para ajudar o próximo.

Criatividade, para Himanen (2001, p. 41), é o pensamento do hacker em ação, “é a

utilização imaginativa das habilidades de cada um, a surpreendente superação

contínua de si mesmo, e a doação ao mundo de uma nova contribuição

genuinamente valiosa”. Lançar um novo pensamento e investir seu tempo e recursos

para fazer que este pensamento se transforme em um projeto viável e a partir disso

buscar colaboradores.

Para sintetizar, o pensamento de Himanen (2001) iremos utilizar a ilustração 1

para demonstrar os sete pilares da ética hacker e sua divisão dentro da obra do

autor.

Fonte: Adaptação de Himanen (2001).

A partir daqui, desenvolvemos a ética hacker a partir de outros autores que

trabalharam sobre a ética hacker e o modo de vida hacker, ao pensar sobre a

sociedade, sistemas hegemônicos, as informações e a educação. Em 1984, Steven

Ilustração 2 - Pilares da Ética Hacker

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Levy descreveu alguns valores éticos do hacker que são seguidos até hoje:

1º – A informação deve ser livre; 2º – Desconfie das autoridades e promova descentralização; 3º – Julgue as pessoas pelo que elas criam e não por suas credenciais; 4º – O acesso aos computadores deve ser ilimitado; 5º – As pessoas podem criar arte e beleza com os computadores; 6º – Os computadores podem mudar a vida e o mundo para melhor (FIGUEIREDO; FERREIRA; BAPTISTA, 2012, p.37).

No primeiro e segundo valores citados por Steven Levy (apud FIGUEIREDO;

FERREIRA; BAPTISTA, 2012, p.37), vemos que a liberdade da informação e o

receio quanto aos sistemas autoritários estavam presentes no modo de vida do

hacker, mesmo antes do nascimento da Internet. No terceiro valor, vemos que a obra

de uma pessoa vale mais que sua aparência e que o poder concedido a ela por

qualquer tipo de instituição. Até aqui, podemos ver que o autor apresentou valores

relacionados à postura do hacker. Já no quarto, quinto e sexto itens, vemos a parte

instrumental da época em que esses valores foram escritos. Tais valores foram

pertinentes para a construção das atitudes mencionadas.

Figueiredo, Ferreira e Baptista (2012) reforçam o pensamento de Himanen

(2001), ao dizer que existe uma cultura e uma ética por trás desta palavra, pois ser

hacker é uma questão de atitude, que denota a crença na liberdade e na

colaboração para a resolução de problemas. Qualquer pessoa que desejasse ser

hacker poderia fazê-lo, desde que incorpore as atitudes hacker.

Tornar-se hacker só será possível se houver rompimento com as

necessidades básicas apresentadas por Maslow (1970 apud VARGA; DIAZ, 2012),

que são as fisiológicas e a segurança. Somente assim poderá dedicar-se às etapas

superiores como a sociabilidade e a cooperação, reconhecimento de seus pares e

autorrealização, que, nesse caso, é compreendida pelos autores como criatividade.

Para Varga e Diaz (2012 p. 41), a ética hacker tem três pilares fundamentais

que são: “colaboração, conhecimento e liberdade”. Esses pilares também são

percebidos e compreendidos na obra de Himanen (2001). Já Steve Mizrach3,

descreveu em seu trabalho a ética hacker moderna para os hackers pós-anos 90:

1º - Acima de tudo, não cause danos; 2º - Projetar a privacidade; 3º - Não desperdice (os recursos computacionais); 4º - Exceda limitações; 5º - O imperativo da comunicação; 6º - Não deixe vestígios; 7º – Compartilhe!; 8º - Combata a tirania cibernética; 9º - Confie, mas teste (FIGUEIREDO; FERREIRA; BAPTISTA, 2012, p.36).

3 - O documento de Steve Mizrach está, em sua integra, no sítio: http://www2.fiu.edu/~mizrachs/hackethic.html

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Percebemos que os trabalhos que balizam a ética hacker, antes de Himanen

(2001), já demostravam uma rebeldia em relação à sociedade formada por sistemas

hegemônicos. Além de evidenciar uma postura voltada para o cuidado de si e o

cuidado com o outro, com algumas ressalvas, como vemos na nona norma de Steve

Mizrach: mesmo sendo um trabalho hacker os outros hackers devem ter o cuidado

de testar, antes de divulgar ou disponibilizar alguma informação/software de

terceiros. Essa atitude é necessária para gerar valimento dos softwares construídos

pelos hackers.

No trabalho de Aspis (2012), o hackerismo é visto como uma forma de

resistência política. O autor argumenta que cultivar o pensamento próprio, o olhar e

o expressar diante dos demais é uma forma de resistência diante de sistemas que

tentam pensar por você. A partir disso, refletimos que para que haja o

desenvolvimento do pensamento próprio, é necessário que as informações estejam

acessíveis.

Entendemos a informação como a base para a ciência, para a cultura e

principalmente para a educação, conforme os autores Pretto, Cordeiro e Oliveira

(2013). Sua importância para a educação é vital, pois somente através da

informação compartilhada e criticada é possível gerar conhecimento de qualidade.

Assim, o potencial de transformação de determinada informação está no

conhecimento que os indivíduos possam conceber a partir dela. Todavia, ainda

temos que percorrer alguns caminhos, como podemos verificar no pensamento a

seguir.

Instaura-se, dessa forma, uma verdadeira ditadura das corporações transnacionais através das Políticas de Propriedade Intelectual (PI), pelas quais o conhecimento torna-se mercadoria com alto valor, sendo suplantados os direitos sociais de acesso livre e aberto ao conhecimento. Entendendo que o cerceamento do conhecimento como propriedade particular de poucos é incompatível com o desenvolvimento da ciência, da cultura e da educação, verificar-se-á que os movimentos contra hegemônicos, especialmente os ligados aos softwares livres, acessos livres e licenças abertas, têm criado várias alternativas, nas últimas décadas, por meio das diversas ações entre pares na rede, ressignificando os usos e as normas de distribuição e acesso dos bens resultantes da produção cultural coletiva, com significativa contribuição para a implantação de processos abertos de produção cultural e científica na educação (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p.19).

E, falando do cerceamento do conhecimento, Garnham (2000) citado por

Brant (2008), analisou a lógica produzida pelo mercado para se manter competitivo.

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A lógica é criar uma escassez de informações, para preservar o valor das

informações já criadas. Este autor ainda citou quatro métodos para proteção da

informação, que por forças não naturais aparenta ser uma mercadoria, um produto:

1. Proteção dos direitos de cópia; 2. Controle de acesso; 3. Obsolescência

programada; 4. Associação do produto a um outro que tem valor de troca. Se por um

lado os hackers desejam romper com os sistemas fechados, do outro existem

sistemas tentam se proteger e se perpetuar no poder na visão deste autor.

Nessa perspectiva, e com colaboração de Brant (2008), o custo de produção

de um software é fixo e se refere à primeira unidade produzida, sendo seu custo

marginal quase inexistente. Ainda neste autor, a informação é dotada de duas

características fundamentais, se tratando de valores econômicos, que são: intangível

e não rivais. Sua intangibilidade se refere que não podemos tocá-la, exemplo,

conseguimos tocar o CD, mas não as músicas que estão nele, que são as

informações. E a não rivalidade é o conceito de que todos podem consumi-la, sem

esgotá-la, o que não acontece, por exemplo, com o petróleo.

Em vista disso, presenciamos uma atitude antidemocrata que é a proteção

das informações, que são tratadas como mercadorias, através das leis de copyright

representadas por um “©” (STEVÃO et al, 2012). Ainda neste autor, um movimento

contrário foi criado, pois em um mundo conectado, instrumentos de

compartilhamento de arquivos quebram o “©”, como, por exemplo, o peer-to-peer

(P2P) que permite que usuários disponibilizem arquivos entre si, utilizando seus

próprios computadores em uma rede distribuída de informações, em que todos são

provedores e receptores de conteúdo.

Os hackers vão na contramão deste movimento excludente. As empresas

desejam fechar e proteger, em compensação os hackers desejam abrir e

movimentar, para que todos possam, através das informações, criar novos contextos

sociais. Em uma carta de Don Hopkins para Richard Stallman, foi criado o trocadilho

Copyleft, no início do movimento do software livre GNU GPL (General Public

License). Nessa licença, a obra deve permanecer livre de restrições. A máxima

dessa licença é “proibido proibir” (STEVÃO et al, 2012).

Ainda no trabalho de Stevão et al (2012), temos a apresentação de outra

licença. Criou-se uma versão atualizada do Copyleft, a Creative Commons (criação

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comum), que surgiu em meados de 2001. Nesse modelo, o autor de determinada

informação pode escolher como deseja que seu trabalho seja publicado, dentre uma

gama de opções de direitos autorais. “Quando estiver navegando e vir, ao invés de

um “©”, “CC By”, saiba que você tem direito a, no mínimo, copiar, distribuir, exibir e

executar a obra, respeitando algumas condições, como, por exemplo, dar os devidos

créditos ao autor original” (STEVÃO et al, 2012, p.9). O movimento do software livre

é uma forma de resistência política por produzir softwares equiparáveis com as

grandes corporações que seguem o “copyright”. Por exemplo, podemos citar o

software Whatssap de comunicação e o Telegram. O Telegram é a versão livre para

este modelo de comunicação, que apresenta igual qualidade, se comparada ao

Whatssap.

A privatização dos saberes e práticas das produções artísticas, científicas ou tecnológicas, definida pelas grandes corporações mundiais, determina os modos como os governos nacionais passam a gerir suas políticas normativas relacionadas à produção e circulação de cultura, incluindo-se aí, obviamente, ciência e tecnologia, e, com isso, ocasionando graves consequências para o uso na educação, em todos os níveis (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p.19).

Vale ressaltar que classificamos como nocivos os governos que tentam

produzir artificialmente cultura para seu povo, como elucidados pelos autores Pretto,

Cordeiro e Oliveira (2013), uma vez que inibem a potencialidade de seus indivíduos

na criação de uma cultura valorosa, por eles e para eles. As potencialidades

proporcionadas pelas tecnologias de comunicação facultaram aos hackers não se

prenderem a territórios delimitados pela geografia e/ou política, muito menos por

qualquer tipo de hegemonia dos governos. Vemos também que a busca do hacker

por ideologias significativas perante sua subjetividade é a impulsora da criação de

novos grupos/comunidades que, ao exercerem suas atividades, tentam quebrar com

sistemas fechados e excludentes.

Na era da informação, ainda refletindo com os autores Pretto, Cordeiro e

Oliveira (2013), pensar somente em bens financeiros, diante da possibilidade de

produzir/fomentar uma transformação social, é tentar manter nossa sociedade na era

industrial, em que a produção era feita por muitos para manter as riquezas de

poucos. Para evitar tal aprisionamento das informações, os hackers lutaram para

manter a Internet livre da atuação de governos e de grupos, tais como os militares,

os científicos e os de grandes corporações (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA,

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2013).

Um marco desta ação contra os poderes hegemônicos se deu no ano de

1996, em Davos na Suíça, quando John Perry Barlow publicou a Declaração de

Independência do Ciberespaço.

Governos do Mundo Industrial, vocês gigantes aborrecidos de carne e aço, eu venho do espaço cibernético, o novo lar da Mente. Em nome do futuro, eu peço a vocês do passado que nos deixem em paz. Vocês não são bem-vindos entre nós. Vocês não têm a independência que nos une. Os governos derivam seu justo poder a partir do consenso dos governados. Vocês não solicitaram ou receberam os nossos. Não convidamos vocês. Vocês não vêm do espaço cibernético, o novo lar da Mente. Não temos governos eleitos, nem mesmo é provável que tenhamos um, então eu me dirijo a vocês sem autoridade maior do que aquela com a qual a liberdade por si só sempre se manifesta (BARLOW, 1996, np.).

Aspis (2012), pensa que uma possível solução contra sistemas econômicos e

sociais hegemônicos é a colaboração praticada pelos hackers. Assim, concebe-se

um mundo em que, em vez de uma competição acirrada entre as pessoas produzida

por tais sistemas, estabelece-se a criação de um ambiente no ciberespaço propício

ao relacionamento humano, pautado na ética hacker. Esse seria o caminho

apresentado pelo autor para libertar a sociedade das amarras impostas por tais

sistemas.

Contudo, é necessária uma ação, um movimento, para tirar as pessoas da

passividade, para que ocorra a “...construção das nossas próprias versões do mundo

e de nós mesmos” (ASPIS, 2012, p. 21). Ter a liberdade de pensar em um território

não governado, compartilhado e construído por todos, livre para a exposição de

ideias seria uma realidade defendida pelos hackers.

As potencialidades de construção de uma nova sociedade, tendo a virtual

como meio instrumental, é uma proposta e uma atividade hacker, sendo o processo

de produção e compartilhamento das informações um sustentáculo deste

movimento, uma vez que é importante, nesse viés, a “...mobilização das

comunidades, até então excluídas dos processos hegemônicos de comunicação de

massa, tornando possível uma maior difusão e promoção da cultura e do

desenvolvimento científico e tecnológico como um bem comum...” (PRETTO;

CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p. 29).

Muitas das construções hackers são realizadas em ambientes colaborativos,

onde nascem muitos dos softwares livres de código aberto:

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De softwares e licenças proprietários aos softwares e licenças livres e abertos muitos passos foram necessários. Esse percurso tem demonstrado a importância de se pensar em uma concepção de conhecimento e cultura não mais aprisionada no interior de modelos monopolistas, mas como livres jogos lincados a valores e práticas que compreendam essas esferas como públicas, a serem coletivamente apropriadas e configuradas em novas formas de cultura (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p. 35).

Como o intuito de compreender como são as dinâmicas dentro das

comunidades de softwares livres que desenvolvem os sistemas operacionais

Slackware, Debian, Fedora e Ubuntu, Machado (2009) diagnosticou que apesar de

terem a mesma base, o núcleo do sistema operacional Linux, cada comunidade tem

o seu ideário. O autor, contudo, ainda nos esclarece que as bases hackers são

comuns em todas comunidades. E mais, “pode-se citar o fato de todas se valerem

de um modelo aberto e colaborativo, dinâmico e flexível, calcado na espontaneidade

e na voluntariedade” (MACHADO, 2009, p.15).

Nesse movimento de produção de software livre, pautado na liberdade e no

desenvolvimento social, hoje não se tem mais, como única realidade, o centro

produzindo as informações consumidas pela periferia. Todos que têm um ponto de

acesso à internet tem a chance de mostrar ao mundo o mundo que os cerca, além

da possibilidade de compartilhar seus pensamentos e suas necessidades (PRETTO;

CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013). Esse autor ainda cita os exemplos de Richard

Stallman e Linus Torvalds, que com suas atitudes possibilitaram que “muitos outros

se tornassem colaboradores de uma ampla rede, contribuindo para criar, distribuir e

aperfeiçoar aplicativos livres, partindo de uma ação coletiva e colaborativa...”

(PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p. 32).

A busca pela perfeição de um software livre é constante, e dentro da

comunidade Debian o simples fato de um usuário utilizar o software e reportar os

erros já faz deste usuário um colaborador (MACHADO, 2009). Essa afirmação

alinha-se ao diagnóstico de Machado (2009), Pretto, Cordeiro e Oliveira (2013, p.

12), ao dizer que “o processo de se detectar falhas e produzir soluções é sempre

aberto, estabelecendo-se não só a criação de laços sociais, mas a busca coletiva de

melhores soluções para o desenvolvimento dos softwares”.

Ainda, nessa linha de pensamento, com a contribuição de Pretto, Cordeiro e

Oliveira (2013) em concordância com Machado (2009).

Identificar erros não significa apenas resolvê-los, mas criar outras soluções

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para cada projeto, uma vez que, na lógica hacker, a intenção não é poupar os usuários dos erros, e sim compartilhar com eles todas as fases de construção, abrindo possibilidades para que todos possam livremente usar para qualquer fim (princípio 0), estudar o código (princípio 1), compartilhar e ou modificar cópias (princípio 2) e distribuir as cópias, modificadas ou não (princípio 3), através do pleno acesso ao código. Esses princípios foram, pouco a pouco, sendo apropriados por usuários/desenvolvedores, criando-se uma teia global, descentralizada e colaborativa, constituindo-se naquilo que hoje se conhece como o Movimento Software Livre (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p. 34).

A atividade hacker dentro do Movimento de Software Livre explana sobre o

trabalho colaborativo que é feito para a construção dos diversos softwares deste

movimento. Isso nos leva a conjecturar sobre a aprendizagem dentro das

comunidades, sendo uma aprendizagem pautada na colaboração dos pares. Varga e

Diaz (2012) fazem uma distinção da colaboração com a cooperação, pois a

colaboração tem o foco no indivíduo, com relacionamentos informais. Já a

cooperação, ainda nesses autores, tem como base o objeto a ser desenvolvido e

foco no resultado, por vezes, em ambientes hierárquicos e com tarefas bem

definidas. Nesse sentido, pensamos em um ambiente educacional democrático

colaborativo, com ênfase no caminho percorrido e nas transformações que esse

possibilita e não somente no resultado.

Nesta perspectiva de aprendizagem entre pares, Cavalcanti et al (2012) diz

que tal realidade é um fenômeno social de democratização do ensino, pois adota

novos paradigmas educacionais que terão impactos na sociedade, pois concebe

indivíduos autônomos e críticos, mediados pelas tecnologias sociais. Complementar

a esse pensamento podemos utilizar os autores Pretto, Cordeiro e Oliveira (2013)

sobre os processos de aprendizagem dentro de ambientes escolares.

Processos esses que busquem superar definitivamente a ideia de uma escola que forma apenas consumidores de produtos ou informações. Assim, ao se levar a filosofia hacker para o campo educacional, somam-se, também, as possibilidades trazidas pelo digital para a criação de um ecossistema pedagógico de aprendizagem e produção de culturas e conhecimentos, sempre com esse plural pleno (PRETTO; CORDEIRO; OLIVEIRA, 2013, p. 36).

Já dissemos, e reforçamos, que é essencial as informações serem livres, pois

é importante para a construção de uma boa educação. Todavia, somente isso não

basta como alerta. Figueiredo, Ferreira e Baptista (2012) dizem que a capacitação

nas novas tecnologias é de fundamental importância para que todos possam usufruir

de toda sua potencialidade, dentre elas a transformação social. Vão além, dizendo

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que “como elemento transformador, a educação deve proporcionar às pessoas

condições para enfrentarem os desafios do mundo virtual” (FIGUEIREDO;

FERREIRA; BAPTISTA, 2012, p. 37). Acreditamos que a atividade hacker e o modo

de enfrentar desafios do hacker por meio da colaboração podem contribuir com a

educação, pois a abertura e a postura hacker pode efetivar o dito por esses autores.

Ao se fundamentar na utilização de uma ferramenta de alcance mundial,

como a Internet, Varga e Diaz (2012), citando Paulo Freire (1996), elucidam que a

postura do professor na atualidade deve ser aberta a aprender com a realidade dos

alunos. Freire (1996) fala sobre como devemos escutar o outro, com paciência e

criticidade. Somente assim conseguimos realmente conquistar a escuta. A escuta é

um instrumento da aprendizagem com o outro. Os professores modernos têm um

desafio de desenvolver a escuta em seus educandos, pois com as tecnologias

sociais todos ganharam o poder de fala, porém poucos estão escutando com a

qualidade que Freire (1996) observou.

Assim, os professores que escutam ampliam sua atuação docente, pois lidam

com diversos contextos que os alunos trazem para dentro dos ambientes

educacionais, tanto formais quanto não formais. São tarefas do professor trabalhar

as tensões, aproximações e afastamentos dos educandos.

Entretanto, a incorporação do modo de vida e da ética dos hackers à prática pedagógica de autoria em ambiente colaborativo de aprendizagem passa necessariamente pela figura do professor. Espera-se que não somente o aluno incorpore o espírito da ética dos hackers, como também o professor, e que ambos se tornem autores (SOUZA et al, 2012, p. 51).

O estilo de educação que tem o professor no centro do processo, como

provedor das informações e detentor de todo o conhecimento, não tem espaço numa

concepção hacker. O hacker é o autor da construção de seu conhecimento e busca

dentro das possibilidades pares e informações que irão auxiliá-lo a obter o resultado

desejado. Segundo Souza et al (2012, p. 58), os professores que promovem aulas

de pesquisa fomentarão a autoria de seus alunos, pois “...apresentam novos

cenários, as coordenadas de um determinado problema para que elabore, compare,

reflita, formule suas hipóteses, aplique, comprove, convalidando-as ou desvalidando-

as”.

A importância do papel da educação, que deve estimular e trabalhar de maneira positiva as habilidades nas crianças e jovens para que saibam como se portar, agir e criar dentro desse universo de infinitas possibilidades,

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onde a criatividade e a vontade de aprender podem resultar em hoje inimagináveis soluções para grandes problemas sociais que vivemos (GÂMBARO; BATALHA; AMARAL, 2012, p. 75).

Ainda falando da atuação de professores e alunos e seus papéis dentro do

processo de aprendizagem, Soffner e Chaves (2010) apontam que o professor

detém o papel de protagonista e o alunado de figurante e isso deve ser revisto para

melhorar a atuação de ambos nesse processo. Ponderando sobre o modo hacker de

educação, o aluno sempre será o protagonista em seus projetos, tanto de vida

quanto de construção de mundo. Essa assertiva dialoga com os autores

supracitados. Hoje os alunos querem...

“...aprender de forma ativa, por meio de projetos e de desafios significativos que lhe apresentem problemas, que sirvam de teste para sua criatividade, engenhosidade, e competência e que requeiram pesquisa, discussão crítica e colaboração para sua solução” (SOFFNER; CHAVES, 2010, p. 502).

Contudo, ao olhar para a escola, Souza et al (2012) se deparam com uma

realidade não condizente com a ética hacker e com a sociedade da informação, pois

discutem que as escolas não se preocupam em construir habilidades autoras e

autônomas; apenas estão focadas na reprodução e na utilizando de métodos

punitivos e castradores. Assim, temos que mudar a concepção educacional dentro

das escolas, uma mudança de paradigma, como, por exemplo, da reprodução para a

produção, da passividade para a atividade, para que através dos anos a sociedade

colha os benefícios dessa mudança.

O aprendizado ativo é o desejo de professores e alunos, situação em que

todos teriam seu papel definido e o processo se tornaria deleitoso para todos os

envolvidos. Segundo Souza (2012), os professores devem trabalhar as questões do

hackerismo no que diz respeito à motivação humana e vida social. Ainda de acordo

com este autor, o aprendizado deve ser interessante, estimulante, alegre e

compatível com os desejos dos alunos, ligado ao pertencimento e reconhecimento

dos mesmos. Assim, através das tecnologias sociais, podemos construir o

conhecimento de uma nova forma, quebrando as amarras da passividade e

englobando vários colaboradores.

No contexto de autoria na escola mediada pelas redes sociais, existe a possibilidade de ressignificação do conhecimento do aluno e valorização da sua experiência como ser, onde sua autoria pressupõe novas maneiras de produção mediadas por novos mecanismos mediadores auxiliados pelos professores com intervenções pontuais. (SOUZA, 2012, p. 80).

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Nesse contexto de educação, o docente assume o papel de mediador além

de ter uma transparência na relação com os educandos ao incentivar e direcionar as

discussões sempre de forma democrática e cordial (SOUZA, 2012). Assim, o

professor apoia o aluno a produzir o seu próprio conhecimento, potencializando sua

autoria e autonomia, além de produzir habilidades durante este processo (SOUZA et

al, 2012). Como já falamos da informação de qualidade neste trabalho, aqui vale

pontuar que o professor pode ser o grande filtro das informações com qualidade a

serem trabalhadas pelos alunos para a produção de conhecimento.

Com a ajuda de Souza (2012), vemos o quão imenso são as possibilidades

no contexto educacional com suporte das...

…tecnologias, além de trazerem várias possibilidades estratégicas de motivação dos nossos alunos a ética hacker nesse complexo contexto dos dispositivos tecnológicos, será incorporada através da busca pelo conhecimento, da liberdade de escolha dentre centenas de possibilidades, além do compartilhamento das descobertas em tempo real, a solução de problemas coletivamente desta forma favorecendo o estímulo a pesquisa, a produção textual, artística, musical, a oralidade, desenvolvimento de cidadãos críticos com vivência em diversas realidades culturais e sociais (SOUZA, 2012, p. 80).

Segundo a ideia de produção biopolítica, conceito discutido no trabalho de

Hard e Negri (PRIMO, 2008), a produção de bens imateriais é a própria sociedade

materializada. Concebemos, através dos pensamentos dos autores supracitados,

que a educação é um tipo de produção biopolítica que por meio de ideias, produções

imagéticas, comunicação, cooperação e relações afetiva, transforma a realidade.

Diante disso, refletimos que, no processo de aprendizagem, os envolvidos, tanto o

produtor quanto o receptor de produtos biopolíticos, detêm a possibilidade de

transformação por meio da partilha de informações e de modos de vida.

Ao utilizar a internet, várias fontes de informação são disponibilizadas e o

educador pode utilizar de trabalhos colaborativos, que na visão de Cavalcanti et al

(2012, p. 29), são necessários para “construir uma formação social, humana e até

jurídica que dê conta das especificidades desse contexto, prevendo e possibilitando

uma ética da rede”. Com essa abertura, já apresentada por Himanen (2001), seria

possível transformar a sociedade em um espaço em que todos têm seu lugar de

pensar e agir para si e para seus pares.

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2.5 CONSIDERAÇÕES SOBRE O REFERENCIAL TEÓRICO

Com base no que foi exposto no referencial teórico, levantamos alguns pontos

para que essa parte da pesquisa seja finalizada com harmonia e integração. Assim,

destacamos que o processo de desenvolvimento do indivíduo seja baseado na

liberdade, liberdade para ter um estilo de vida que seja significativo para sua

subjetividade. Liberdade de escolhas das mais variadas possíveis, pois, acreditamos

que isso vá possibilitar a construção de uma sociedade respeitadora, que seja

construída pelos seus participantes e leve em si um pouco de cada indivíduo.

A liberdade que discutimos neste trabalho leva em consideração que o

indivíduo tenha capacidades e competências para desenvolver o seu projeto de vida

em harmonia com seu estilo de vida. Sempre pautado pela equidade,

sustentabilidade, e democracia no contexto social em que habitam. Também

destacamos o trabalho, ou atividade, como fator de desenvolvimento humano.

Passamos a discutir a educação sociocomunitária, do macro ao micro, ou

seja, da sociedade à comunidade, enfatizando a participação do indivíduo dentro

desse contexto social, no sentido de que se promova um convívio que possibilite a

mudança. Mudança que leve a uma criação coletiva, ao desenvolvimento da

autonomia e da solidariedade, sempre apoiando, promovendo e incentivando os

indivíduos pertencentes ao contexto sociocomunitário.

E, por fim, focalizamos a ética hacker com seus pilares, dando ênfase ao

indivíduo e suas motivações. Há a preocupação com o estabelecimento da

construção de uma sociedade aberta, tanto em relação a informações quanto ao que

diz respeito aos recursos. A Internet é, nesse contexto, o meio fomentador da mente,

para que, a partir daí, materializarem-se as ideias no mundo material. De forma

ativa, interativa, colaborativa, assim o hacker trabalha para construir ora um

software, ora uma produção biopolítica, sempre pautado pelos seus valores éticos.

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3 PROJETO JOVEM HACKER

3.1 BASES DO PROJETO JOVEM HACKER

O Projeto Jovem Hacker (PJH) é um experimento em formação, sendo uma

iniciativa do Núcleo de Informática aplicada à Educação (NIED) da Unicamp em

parceria com o Coletivo Revoada, sendo uma iniciativa não formal que apoia

projetos sobre a cultura digital (JOVEMHACKER, 2015). Cabe destacar que ambos

têm como objetivo propiciar à presente geração uma formação tecnológica voltada à

autonomia, pois é necessário preparar os jovens para a sociedade que cada vez

mais faz uso de recursos tecnológicos (JOVEMHACKER, 2015).

Foram feitas pesquisas para caracterizar a participação do NIED neste

projeto, contudo não foram localizadas quaisquer informações que pudessem ajudar

a compreender o projeto no sítio do NIED. Assim, as informações do PJH utilizadas

nesta apresentação do PJH estão em três fontes distintas, saber: 1º - o sítio do

projeto com a seguinte citação JOVEMHACKER (2015); 2º - PJH - Edição Piloto

disponível nos artigos dos autores Arantes, Amiel e Fedel (2014), e Amiel et al

(2016); 3º - e última, os documentos relacionados à edição do PJH – Edição Capivari

2015, e na publicação dos autores Aguado e Alves (2015). Assim, pudemos analisar

de forma ampla quais são os pressupostos do projeto para depois focar na edição de

Capivari objeto deste estudo de caso.

Os preceitos básicos do PJH são focados na ética hacker e têm como objetivo

trabalhar/desenvolver nos participantes do projeto o uso de tecnologias sociais,

como, por exemplo, o uso e desenvolvimento de software livre. O PJH não foca

somente o uso das tecnologias, mas a construção da ética hacker nos participantes,

que tem como finalidade a internalização de comportamentos, como:

compartilhamento livre de código, o trabalho colaborativo e aberto, entre outros

(JOVEMHACKER, 2015). Em sua essência, o Projeto Jovem Hacker buscar

compartilhar e construir conhecimento em diversas áreas, como: cultura digital,

software livre, trabalho colaborativo, dentre outros (AGUADO; ALVES, 2015).

No intuito de promover a autonomia tecnológica, o PJH “busca encontrar

formas alternativas de construir conhecimento na área de informática” (ARANTES;

AMIEL; FEDEL, 2014, p. 309). Esses autores acreditam que o conhecimento deve

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ser construído de forma coletiva e descentralizada, como nos grupos hackers que

desenvolvem programas livres e de código aberto. Assim, essas características

foram introduzidas na elaboração do PJH, com o objetivo de desenvolvê-las nos

participantes.

O objetivo da nossa iniciativa com o Projeto Jovem Hacker não é necessariamente contribuir com o futuro do mercado de trabalho. Entretanto, se isso acontecer, será bem-vindo em um mercado com déficit de mão de obra. Acreditamos que saber programar não seja útil apenas para ser um programador no futuro. A programação ajuda em outras habilidades, como resolver problemas, desenvolver o raciocínio lógico, o que pode contribuir com o cidadão em diversos momentos de sua vida. Saber programação pode possibilitar, inclusive, desenvolver soluções de software para problemas do dia a dia, ou mesmo dar manutenção em softwares que utiliza (ARANTES; AMIEL; FEDEL, 2014, p. 309).

Na fase de configuração do curso piloto, os encontros estavam divididos em

dois momentos. O primeiro momento para o ensino de lógica de programação e

noções de hardware; no segundo momento, o desenvolvimento de programas

significativos para os jovens (ARANTES; AMIEL; FEDEL, 2014). Contudo, ainda

nesses autores, devido às dificuldades de aprendizagem da lógica de programação,

a alocação de mais tempo foi necessária para proporcionar uma melhor

aprendizagem em lógica de programação. O primeiro momento teve maior alocação

de tempo, o que prejudicou a segunda etapa.

A edição piloto aconteceu em Campinas, no espaço denominado CIS-

Guanabara. Foram selecionados nove jovens de escolas públicas, com idade entre

16 e 18 anos (AMIEL et al, 2016). Não localizamos informações de como ocorreu o

processo seletivo. A divulgação do projeto piloto informava que a meta do PJH era o

desenvolvimento de um jogo utilizando a ferramenta Scratch4. Os encontros

ocorreram entre abril e maio de 2014. Foram no total 8 encontros com duração de

1h30min cada, tendo o curso uma carga horária de 12 horas.

A turma se apresentava com o perfil que esperávamos: jovens usuários de Internet, redes sociais e jogos, com acesso a computadores e dispositivos móveis, mas com praticamente nenhum conhecimento sobre como o hardware funciona ou como os softwares são desenvolvidos (ARANTES; AMIEL; FEDEL, 2014, p. 312).

4 - O Scratch é um software que se utiliza de blocos lógicos, e itens de som e imagem, para você

desenvolver suas próprias histórias interativas, jogos e animações, além de compartilhar de maneira online suas criações. O Scratch é um projeto do grupo Lifelong Kindergarten no Media Lab do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusets), onde foi idealizado por Mitchel Resnick. Fonte: Disponível em: <http://www.scratchbrasil.net.br/index.php/sobre-o-scratch.html>. Acessado em: 01 nov. 2016.

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No decorrer dos encontros, alguns pontos limitantes foram levantados pelos

autores Arantes, Amiel e Fedel (2014) como: a falta de Internet; falta de espaço físico

da sala; falta de lousa e pincel. Segundo esses autores, a falta de internet ocasionou

prejuízo para a aprendizagem coletiva, ponto chave do projeto dos participantes,

pois não utilizaram a última versão do software Scratch que possibilita compartilhar e

visualizar, em tempo real, o que está sendo feito pelos usuários que utilizam este

software. Apesar das limitações e da carga horária pequena, o projeto piloto

forneceu material de reflexão para a elaboração das futuras edições, escutando

junto aos jovens alunos o que deveria ser enfatizado durante os encontros do PJH

para as futuras edições.

Os autores perceberam que algumas características deveriam ser seguidas

para as futuras edições, como: “Menor uso de atividades expositivas; Promover a

socialização; Usar exemplos em crescente nível de complexidade; Encontros mais

longos; e, Alunos precisam se sentir capazes” (AMIEL et al, 2016). De todos os

encontros, o que chamou mais a atenção foi o quinto, pois nesse encontro foi

realizada uma dinâmica e os alunos mostraram-se motivados a realizá-la. Na

dinâmica, houve a simulação da execução de um programa, sendo que um aluno

afirmou que “foi melhor para explicar, porque no computador você só explicava com

voz e aqui você mostrou” (ARANTES; AMIEL; FEDEL, 2014, p. 314). Outra

informação importante é que, no final do curso, dos noves participantes que

iniciaram o projeto, apenas cinco estavam frequentando o PJH – edição piloto

(ARANTES; AMIEL; FEDEL, 2014, p. 314). Assim, terminamos a apresentação do

PJH e seus preceitos gerais, passando então para a descrição e análise do PJH –

Edição Capivari, 2015.

3.2 DESCRIÇÃO DO PROJETO JOVEM HACKER – EDIÇÃO CAPIVARI 2015

O Projeto Jovem Hacker chegou no IFSP – Capivari pelas mãos do professor

Alexandre G. Aguado, que o propôs no início do ano de 2015 como projeto de

extensão5. Salientamos que “em 2015, o projeto foi conduzido em duas cidades,

5 - Eu, Karlan Ricomini Alves, docente do Instituto Federal São Paulo – Campus Capivari, fui

convidado pelo Prof. Alexandre G. Aguado para participar do projeto ao mesmo tempo que iniciava meus estudos para ingressar no Programa de Mestrado em Educação da Unisal, tamanho foi o interesse que pedi autorização para estudar e realizar um projeto de mestrado em torno deste projeto e da ética hacker, à qual o prof. Aguado havia me apresentado.

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Campinas e Capivari, com experimentações e currículos distintos, porém, com

planejamento conjunto” (JOVEMHACKER, 2015, np.).

Vale ressaltar que o planejamento ocorreu de forma conjunto nas duas

edições do PJH, pois contou com a interação do coordenador do projeto em

Capivari, Alexandre G. Aguado, com a equipe do projeto em Campinas, que teve

como líder Gabriel Fedel. Foi utilizado um grupo de e-mails, que englobou todos os

participantes para a troca de informações, e que, por consequência, fomentou as

discussões pertinentes ao projeto, aproximando as duas equipes e promovendo um

aprendizado coletivo sobre os desafios, dificuldades e frustrações do PJH em ambas

as edições.

A finalidade do projeto não era formar exímios programadores, mas despertar

a curiosidade e o protagonismo destes jovens, de modo a possibilitar que os

participantes pudessem se tornar tinkerers, ou seja, curiosos, “fuçadores” de

determinado conhecimento (JOVEMHACKER, 2015). Neste contexto o PJH –

Edição Capivari, de forma ampla, pretendia educar e instrumentalizar os jovens para

serem autônomos e protagonistas de suas vidas, utilizando da ética hacker para

isso, além de contribuir para tirá-los da passividade.

Os fatores norteadores e de motivação do PJH – Edição Capivari - estavam

ligados às questões sociais, de acordo com as seguintes razões: 1º. As

vulnerabilidades às quais nossos adolescentes são expostos; 2º. Vivemos em uma

sociedade tecnológica, porém o acesso às tecnologias e às oportunidades não são

igualitários; 3º. A subutilização das TICs por parte dos adolescentes (AGUADO;

ALVES, 2015). Ademais, tínhamos o desejo de realizar o projeto no bairro São João

Batista, pois é neste bairro que se localiza o campus do IFSP - Capivari.

Na ilustração 3, temos a vista do bairro através de uma janela do Laboratório

de Informática. Em momento de reflexão, o Professor G. Aguado levantou a hipótese

de levar o PJH para o centro do bairro e aproveitar a oportunidade de estreitar os

laços entre os moradores e o IFSP - Campus Capivari. Outro dado que causou

reflexão foi que no início de 2015, levantou-se junto à secretária de registros

escolares, que somente um aluno do IFSP – Campus Capivari - residia no bairro em

questão.

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Fonte: Fonte própria, 2015.

Iniciamos os trabalhos do PJH – Edição Capivari 2015 - com a participação

em um edital de extensão do IFSP. Para participar desse processo seletivo,

começamos as discussões e aproximação com as pessoas que, naquele momento,

iriam ajudar no projeto. Na elaboração do projeto, já contávamos com uma pequena

equipe, sendo: dois docentes, uma pedagoga e uma técnica em assuntos

educacionais. Neste tipo de edital, o projeto passa pela avaliação de uma comissão

e, se aprovado, recebe apoio institucional, sendo que o PJH – Edição Capivari foi

aprovado.

Realizamos uma parceria com a Prefeitura Municipal de Capivari para

possibilitar o uso do espaço Telecentro Capivari Digital, no bairro São João Batista.

Para situar onde fica o bairro, em relação ao centro, iremos utilizar a ilustração 4.

Com isso, demonstramos o quão periférico o bairro é em relação ao centro da

cidade. No censo de 2010, foi levantado pelo IBGE (2016) que neste bairro havia

346 domicílios com uma população local de 1376 indivíduos, representando 2,8% da

população total do município.

Ilustração 3 -Vista do Bairro São João Batista do Laboratório de Informática

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Fonte: Google Maps, 2015.

Na ilustração 5, temos o recorte do bairro em questão, para possibilitar a

visualização da distância do campus do IFSP para as casas do bairro, sem qualquer

tipo de ligação pavimentada. Além disso, o bairro só conta com uma entrada, que

fica do lado oposto ao campus, a uma distância entre a entrada do campus e a

entrada do bairro de, mais ou menos, três quilômetros.

Fonte: Google Maps <maps.google.com>, 2015.

Ilustração 4 - Vista do Bairro São João Batista

Ilustração 5- Recorte com o foco no Bairro São João Batista

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Identificamos, através de observação direta, dois pontos em que o governo

municipal faz presença no bairro: na unidade do Telecentro do Capivari Digital e na

escola de ensino fundamental de tempo integral José Annicchino Fu Paulo. Foram

observados, em meados de abril, antes do início do PJH, vários problemas na

pavimentação asfáltica do bairro e alguns problemas de saneamento básico. Isso

reflete um certo descaso das autoridades com o bairro e seus moradores.

Também observamos, ao transitar pelo bairro, que existem dois pontos de

convivências. Um campo de futebol que reúne tanto pessoas que vão jogar futebol

quanto pessoas que vão apenas observar. Entretanto, o que chama a atenção, é que

as mães com crianças pequenas, que aparentam entre 1 a 4 anos, se reúnem na

calçada para conversar e cuidar de seus filhos. Apesar de vários problemas pelo

bairro, foi possível verificar que há um convívio entre os moradores. Acreditamos que

isso pode ocasionar a ajuda mútua e o compartilhamento de informações. Neste

contexto social desenvolvemos o PJH, com o intuito de aproximar o IFSP à

comunidade de seu bairro.

Na fase de planejamento do PJH, decidimos que a população a ser atendida

pelo PJH em Capivari seriam alunos da rede pública de ensino que estavam

cursando o nono ano do ensino básico, residentes neste bairro, com idade média de

quatorze anos, sendo que nesta edição seriam disponibilizadas vinte vagas em

turma única. Havia a motivação por atender este público baseada no fato de haver

possibilidade dos participantes se interessarem por algum curso do IFSP – Campus

Capivari, principalmente pelos cursos do ensino técnico profissionalizante, e assim

continuarem seus estudos nesta instituição.

Os encontros foram realizados no Telecentro Capivari Digital – Unidade São

João Batista, com suporte da Secretária de Desenvolvimento Social do município,

havendo um espaço reservado especificamente para os encontros. “O Capivari

Digital consiste em unidades de inclusão digital que contam com internet gratuita e

cursos de informática de curta duração, com o objetivo de qualificar pessoas para o

mercado de trabalho e para o acesso ao mundo digital” (CAPIVARI, 2016, np.). Os

encontros foram realizados no período vespertino, das 14:00 às 17:00 horas, nas

terças e quartas-feiras, conforme cronograma do PJH que seguiu a estrutura a

adiante descrita.

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A primeira fase do PJH envolveu: Fase de Inscrição de candidatos a bolsista:

09/02/2015 a 20/02/2015, e de participantes do PJH - Período de Seleção:

21/02/2015 a 25/02/2015. Já a segunda fase – Formação e Construção dos Objetos

de Aprendizagem: Preparando os alicerces, envolveu bolsistas, Coordenador,

Docentes, Técnicos Administrativos e Colaboradores, com a duração de 10 semanas

- 02/03/2015 a 08/05/2015; os bolsistas dedicariam um total de 200 Horas e os

docentes 80 Horas. A participação dos Técnicos Administrativos não foi pautada pela

menção de uma carga horária fixa.

O PJH - Edição Capivari foi dividido em quatro módulos, os quais vamos

descrever. No módulo 1 – Introdução ao computador e à lógica: Construindo o meu

computador; os envolvidos, seriam: Bolsistas, Coordenador, Docentes, Técnicos

Administrativos, Colaboradores e jovens participantes do projeto. Tendo a duração: 8

semanas – 11/05/2015 a 03/06/2015 – num módulo que contou com a carga horária

total de 64 horas. Os participantes tinham como objetivo compreender o

funcionamento das peças dos computadores e, por meio deste conhecimento,

montar seu próprio computador. As peças dos computadores foram ofertadas

separadas e a montagem deveria ser realizada pelos jovens, incluindo a instalação

do sistema operacional Debian.

A proposta do PJH em relação ao uso dos recursos de informática utilizados

pelos alunos teve em si o pilar da ética hacker: liberdade. Assim, os participantes

terriam a possibilidade de construir de forma singular seus programas e, dentre os

recursos de hardware disponíveis, montar seus computadores. Uma versão do

sistema operacional Debian foi preparada com todos os programas, como por

exemplo Scratch e Python. Para atender os requisitos planejados do PJH, o sistema

operacional foi distribuído a todos os participantes via pen drive, sendo o pen drive

um presente para os participantes.

O Módulo 2 – Redes de computadores e a Web: Conectando-nos com o

mundo, os envolvidos: Bolsistas, Coordenador, Docentes, Técnicos Administrativos,

Colaboradores e jovens participantes do projeto. A duração foi de 4 semanas –

03/08/2015 a 28/08/2015, total de 32 horas. Nesse módulo, o principal objetivo foi

introduzir os participantes no mundo da internet e da rede de computadores.

Entender de forma básica como funciona uma rede de computador e, mais do que

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isso, auxiliar os participantes a montarem a rede de computador do laboratório do

PJH.

Nesta etapa, tivemos a parte física da rede, que envolve a distribuição e

crimpagem dos cabos, teste dos cabos e ligação dos cabos no concentrador (switch)

e nos computadores. Já na parte lógica, tivemos de configurar todos os

computadores para que trocassem dados entre si e com a internet, de modo que

todos os computadores estivessem utilizando um mesmo padrão de comunicação.

No módulo 3 – Desenvolvimento de projetos e aplicativos: Autores e

Protagonistas! Envolvidos: Bolsistas, Coordenador, Docentes, Técnicos

Administrativos, Colaboradores e jovens participantes do projeto, tendo a duração: 8

semanas – 31/08/2015 a 23/10/2015. Com carga horária de 64 Horas, o objetivo era

aprimorar os conhecimentos sobre desenvolvimento de software iniciados no módulo

anterior, permitindo que eles entendessem que são autores perante as tecnologias e

não meros receptores. Era intenção desenvolver noções gerais das linguagens que

estão presentes na web, exemplos de HTML, CSS, JavaScript, PHP, Python, de

forma prática, por meio das quais cada um poderia desenvolver seu próprio site com

os conhecimentos adquiridos ao longo dos encontros. Foram apresentados,

também, algum CMS (Content Management System) de código livre.

No quarto e último módulo – Solucionando problemas da nossa comunidade:

As tecnologias a serviço da Comunidade! Envolvidos: Bolsistas, Coordenador,

Docentes, Técnicos Administrativos, Colaboradores, jovens participantes do projeto,

familiares dos jovens e membros da comunidade local; Duração: 8 semanas –

26/10/2015 a 18/12/2015, num total de 64 horas. Este módulo contou com horas

adicionais de trabalho junto à comunidade: 20 horas. Dessas, 16 Horas de trabalho

de campo, identificando problemas locais e 4 Horas de oficinas feitas pelos

participantes do projeto para a comunidade e Install Fest. O objetivo era contribuir

com a comunidade local, aprimorando nos participantes o desejo de serem

participantes ativos em suas comunidades, identificando problemas, analisando de

forma colaborativa e desenvolvendo soluções que melhorassem de fato a vida da

sociedade.

Utilizamos uma dinâmica de grupo para os encontros do PJH intitulada “Boa

tarde”, que é uma prática salesiana. Essa dinâmica consistia em uma contribuição

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individual que causasse reflexão no grupo. Todos foram convidados a participar,

sendo que a cada encontro um participante ficaria responsável pela dinâmica do

próximo encontro. Tínhamos o objetivo de deixar que o participante se candidatasse

a esta tarefa, e, para a primeira dinâmica, foi responsável o Prof. Alexandre G.

Aguado. O tempo reservado para essa dinâmica foi de cinco minutos

aproximadamente, sempre no final dos encontros. Os principais objetivos eram a

aproximação dos participantes e a criação de laços de pertencimento ao grupo.

Na primeira, tivemos a tarefa de selecionar e capacitar os bolsistas para

atuarem na preparação dos materiais instrucionais em concordância com a ética

hacker que seriam utilizados no projeto. Neste período, foram construídas as

primeiras versões dos Objetos de Aprendizagem, os quais foram disponibilizados

como Recursos Educacionais Abertos no blog do projeto.

Em relação aos procedimentos para a seleção dos bolsistas, definimos como

método que seria viável a realização de entrevistas para observamos os perfis dos

candidatos e se estes perfis se relacionavam ao PJH. Delimitamos a participação, no

processo seletivo dos bolsistas, aos alunos do curso Analise e Desenvolvimento de

Sistemas (ADS), uma vez que alunos desse curso já demostram interesse pela

informática têm contato com a parte instrumental do PJH. Outro fator decisivo foi a

disponibilidade na parte vespertina para a participação dos encontros. No IFSP

Capivari, todas as turmas do curso de ADS são noturnas. Foram realizadas cinco

inscrições para o processo dos bolsistas, sendo que três, dentre esses, foram

selecionados.

A equipe PJH se utilizou de alguns encontros para definir como seria o

processo seletivo dos participantes do PJH. A maior preocupação era haver um

processo igualitário. Não estávamos selecionando pessoas técnicas para

desempenhar determinada função, e sim selecionando alunos do nono ano do

ensino fundamental para realizar um projeto que, em sua essência, deveria

ocasionar transformação social. Assim, decidimos que seria apropriado utilizar como

método a elaboração de uma redação com o título: “O projeto Jovem Hacker é a

minha cara e eu sou a cara do Jovem Hacker”.

3.2.1 Capacitação dos Bolsistas

Com os bolsistas selecionados, começaram os trabalhos para a construção

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de uma consciência hacker, além de envolver a aprendizagem do conteúdo sobre

didática. Assim, todo material informacional utilizado no PJH deveria carregar em si

algum pilar da ética hacker, ilustração 1, para propiciar uma atividade entre os

participantes, tirando-os da passividade no processo de aprendizagem e tendo em

mente que a construção do conhecimento requer ação e protagonismo de nossos

jovens.

Para desenvolver alguns conceitos educacionais nos bolsistas do PJH,

realizamos encontros para esclarecer qual seria o papel dos bolsistas, sendo que

toda a equipe PJH seria mediadora. Às vezes, os bolsistas liderariam os encontros,

sendo de sua responsabilidade desenvolver os conteúdos didáticos, ou adequá-los

às atividades práticas. Nesse sentido, eram necessários alguns conhecimentos que

fugiam ao escopo da parte instrumental do curso de ADS. Contamos com a ajuda

das pedagogas, participantes do PJH, para realizar tal tarefa, contribuindo muito

para a expansão do pensamento educacional dentro do PJH.

Para desenvolver o pensamento educacional, utilizamos alguns autores,

sobre os quais iremos tratar a seguir. Para contextualizar o que desejávamos para a

metodologia de ensino no PJH, vale ressaltar que toda a equipe, tanto os

funcionários do IFSP quanto os bolsistas, eram considerados mediadores no PJH.

Em seu trabalho Tarouco, Moro e Estabel (2003) discutem o protagonismo dos

educadores e alunos frente à educação bancária, que é representada por

metodologias de ensino que realizam depósitos de informações e tratam o educando

como um mero tarefeiro diante da sociedade, coibindo nele atitudes tais quais

questionar e pensar.

No PJH, em consonância com os autores supracitados, tínhamos a

determinação de utilizar da interação qualitativa entre todos os envolvidos no

processo, promovendo a interação dos mediadores com os participantes, processo

em que ambos seriam emissores e receptores de informações em um papel de

mediadores da construção do conhecimento, tanto do próprio conhecimento quanto

do conhecimento de seus pares.

Tentamos criar uma rede de aprendizado no PJH, embasando nossa ação

docente de formar amigável e próxima dos participantes. Nessa perspectiva, nosso

papel de mediadores se aproximou ao exposto pelo autor Salmon, citado por Dias

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(2008), pois, a todo momento, tínhamos preocupação em promover o envolvimento

dos participantes para a construção de novos conhecimentos, que poderiam ser

utilizados de diversas formas, não apenas como o planejado pelos mediadores.

Fonte: Inspirado por Dias (2008).

Como vemos na ilustração 6, o mediador está em contato direto com os

participantes do projeto, sendo que o conhecimento do mediador sobre as

informações apresentadas nos encontros já ocorreu em momento anterior, em um

momento de planejamento e preparação do material utilizado. Contudo, o mediador

se mantém atento e aberto para novas interpretações que os participantes irão

proporcionar. Somente o material instrucionista foi preparado de maneira prévia. Os

conhecimentos provenientes deste material foram construídos pelos participantes.

Neste projeto, o mais importante eram as novas interações que seriam realizadas no

decorrer da apresentação dos materiais.

Primar pela visão do todo para as partes; Ler os conteúdos com criticidade

com o foco na aprendizagem do pensar certo, se baseando em Freire (1996);

Descobrir informações ao em vez de aprendê-las e focar na engenhosidade de cada

educando; Priorizar os objetivos coletivos aos individuais; Oportunizar o aprendizado

através de problemas dos próprios alunos; e, Instigar a reconstrução coletiva da

história de cada um solidarizada com todos (TAROUCO; MORO; ESTABEL, 2003).

Os autores citados fizeram um contraponto do professor educador com o professor

tradicional, as características apresentadas do professor educador vão ao encontro

do PJH e acreditamos que tais características propiciam a construção do

protagonismo pelos educandos.

O papel desse “novo professor” é compreender que o conhecimento não é padronizado e estático e que seus alunos deverão ser preparados com discernimento e independência diante de um mundo que muda velozmente. O professor deve procurar descobrir o seu lugar de verdadeiro educador.

Ilustração 6 - Papel do Mediador

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Deve estar constantemente atualizado em função da velocidade das mudanças e de novos paradigmas, pois o que é novo hoje amanhã poderá estar superado (TAROUCO; MORO; ESTABEL, 2003, p. 38).

Ainda argumentando sobre este perfil do novo professor, que trabalha e

ensina em tempos de tecnologias sociais que proporcionam abundância de

informações, Soffner e Chaves (2010, p. 502) apontam que não é mais a

transmissão de informações o ponto importante deste educador e sim o educador

que é “... um mentor, um orientador, um conselheiro, um instigador, um motivador,

um problematizador, um facilitador da aprendizagem”. Acreditamos que não só o

PJH precisa deste tipo de educador, mas a sociedade como um todo necessita deste

tipo de trabalho docente, que, acreditamos, irá proporcionar uma educação

emancipadora.

Fonte: Inspirado em Dias (2008) Freire (1996).

Acreditamos que a mediação é importante para a construção do

conhecimento, bem como a interação entre os interessados por um mesmo

conteúdo. Assim funciona com as comunidades hacker. Freire (1996) já disse que a

construção da educação é feita por mediatização do mundo, numa visão que o

mundo educa. Dentro do PJH, viabilizamos este tipo de postura dos participantes,

não só a visão que temos na ilustração 6, mas também a participação entre pares

vista na ilustração 7. As vias de diálogos vão além dos encontros dos participantes

no PJH. Nesse processo, também foram utilizadas redes sociais, com o propósito de

aproximar os participantes e facilitar a comunicação.

Tanto a ética hacker quanto a educação sociocomunitária trazem em si um

contexto de sujeitos ativos no processo de aprendizagem e na transformação social.

Há, nesse quesito, uma aproximação destes dois arcabouços teóricos já estudados.

Vale ressaltar que, para desenvolver a autonomia e protagonismo, tínhamos de

Ilustração 7 - Interação dos Participantes do PJH.

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desenvolver no PJH a aprendizagem ativa e colaborativa, pois acreditávamos que

essas questões estariam no cerne da ética hacker e da educação sociocomunitária.

Assim, acreditamos que para acontecer um aprendizado ativo, segundo

Bzuneck e Guimarães (apud BERBEL, 2011, p.27), é necessário um ambiente que

permita o “envolvimento pessoal, baixa pressão e alta flexibilidade em sua execução,

e percepção de liberdade psicológica e de escolha”. Configura-se, assim, um espaço

democrático de participação e construção de informações e conhecimento.

Em seus estudos sobre metodologia ativa, Berbel (2011) trata da autonomia

que o aluno deve ter perante o processo de aprendizagem, pois permite novas

formas de diálogos com as informações e com o professor. Outro ponto importante

desta metologia é seu “...potencial de despertar a curiosidade, à medida que os

alunos se inserem na teorização e trazem elementos novos, ainda não considerados

nas aulas ou na própria perspectiva do professor” (BERBEL, 2011, p. 28).

As Metodologias Ativas baseiam-se em formas de desenvolver o processo de aprender, utilizando experiências reais ou simuladas, visando às condições de solucionar, com sucesso, desafios advindos das atividades essenciais da prática social, em diferentes contextos (BERBEL, 2011, p. 29).

Vemos que as metodologias ativas vão ao encontro do aprender a aprender,

contido no relatório para a Unesco - Educação um tesouro a descobrir. Vemos que o

aprender a aprender se relaciona diretamente com o aprender a conhecer, mas não

despreza os outros pilares que são: aprender a fazer; aprender a conviver; aprender

a ser (DELORS et al, 2010). Tais pilares são importantes para este trabalho, e como

disse Demo (2007), é essencial que possamos aprender conhecimentos que

possibilitem a aprendizagem de outros conhecimentos. Cremos que isso acontece

na ética hacker.

3.2.2 Processo seletivo dos participantes

O processo seletivo mostrou que a divulgação, o processo seletivo e o início

da execução do projeto deveriam ocorrer em um curto espaço de tempo, pois

tivemos durante a divulgação nas escolas mais de cento e sessenta (160) inscritos

para a realização do processo seletivo, porém, como a aplicação da redação

demorou a ser realizada, um intervalo de aproximadamente trinta (30) dias, houve

ampla desistência dos inscritos, sendo que somente vinte e oito (28) inscritos

realizaram a redação.

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Diante desse fato, a equipe PJH decidiu que todos que realizaram o processo

seletivo poderiam participar do projeto. Isso levou à ampliação do número de vagas.

Devido à dificuldade de locomoção até o bairro, nem todos que participaram do

processo seletivo fizeram a inscrição do PJH. Junto a isso, ainda tivemos algumas

queixas por realizar o PJH em um bairro tão distante, considerado pela população de

outros bairros como um lugar violento e perigoso. Quanto à violência e

periculosidade, a equipe PJH não teve nenhum tipo de problema no bairro. Sempre

transitamos no bairro em segurança.

Aqui vale o registro de que tanto a parceira, Prefeitura Municipal, quanto

alguns pais de participantes, gostariam que o projeto fosse realizado em um lugar

mais central e acessível. Nossa equipe, porém, insistiu que o lugar de realização do

projeto deveria ser o bairro em questão por motivos já explanados. Contudo, com a

desistência de grande parte dos inscritos para o processo seletivo, tivemos que rever

a faixa etária, aceitando participantes também do ensino médio. Assim, tivemos

participantes que cursavam do nono ano do ensino fundamental até o terceiro ano

do ensino médio. Vale ressaltar que não constatamos qualquer prejuízo com esta

alteração.

3.3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS

Neste subcapítulo, apresentaremos os dados referente ao PJH à luz do

referencial teórico. Assim, iremos descrever os dados, em um primeiro momento, e,

num segundo momento, fazer as análises dos mesmos. Num esforço de facilitar a

compreensão dos dados, os estruturamos em subcapítulos e, dentro destes,

teremos a apresentação dos dados para depois passarmos a análise dos dados.

Vale ressaltar que teremos o cuidado de manter os dados isentos de qualquer

interferência do pesquisador.

3.3.1 Análise das redações do processo seletivo dos participantes do PJH

Dos vinte e oito participantes do processo seletivo, dezesseis são do sexo

masculino e doze do sexo feminino. Os textos analisados, em sua grande maioria,

apresentavam erros ortográficos e gramaticais. Além disso, alguns textos

demonstraram alguma dificuldade dos participantes em seguir uma linha de

raciocínio na escrita. Isso, no entanto, não foi problema para realizar a análise do

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discurso, e vale ressaltar que os participantes estavam sob a pressão de um

processo seletivo.

Os dados que serão apresentados sobre os participantes do processo seletivo

serão agrupados, sendo que determinado participante pode ser apresentado em

vários grupos. A participação não exclusiva de um grupo representa que todos os

dados informados pelos participantes foram pontuados, pois temos compromisso

com a qualidade dos dados, já que se trata de uma pesquisa qualitativa. O modelo

adotado para a seleção dos participantes, a redação, se faz necessário para

compreender as aspirações dos participantes e poder trabalhar com as informações

já disponíveis antes do início do PJH.

O primeiro agrupamento é relacionado à parte instrumental do curso, em

que os participantes demostraram um interesse em aprender sobre informática,

especificamente. Neste grupo, tivemos oito participantes focados no que podiam

aprender sobre os assuntos relacionados à parte instrumental do curso, não

demostrando abertura/interesse a outros conhecimentos que poderiam compor o

PJH. Analisamos que a busca pela parte instrumental é um ponto de partida para a

conquista do participante pelo PJH. Entretanto, era importante mostrar para estes

participantes que podemos aprender conteúdos diversos, desde que tenhamos a

mente aberta a novos conhecimentos. Acreditamos que essa busca pela técnica

hacker está vinculada às informações que a mídia divulga em torno do termo, o que

aguça a curiosidade dos jovens participantes. Devia haver, no entanto, um esforço

para que, por meio do trabalho educacional formativo, o participante pudesse se

interessar pelos outros conhecimentos presentes no PJH.

Em outro agrupamento, selecionamos os participantes que desejam adquirir

conhecimento. Neste agrupamento, tivemos um total de sete participantes

interessados em ampliar seus conhecimentos não só na parte instrumental, mas em

outras áreas que o PJH pudesse contribuir, demonstrando abertura a outros

conhecimentos não apresentados na divulgação do PJH. Acreditamos que essa

distinção mostra como o primeiro agrupamento era fechado para as outras

aprendizagens possíveis no programa, enquanto o segundo grupo evidenciou uma

abertura maior para que isso aconteça. A aproximação desses dois grupos era

importante, para que, realizando trabalhos juntos, trocassem experiencias e

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aspirações.

Dez participantes discursaram sobre como o aprendizado é importante, pois

para eles a finalidade do programa era aprender para ensinar, ensinar a parte

instrumental para os familiares e amigos. Isso refletiu uma preocupação em colocar

o aprendizado a serviço dos outros, em uma atividade e dinâmica em que o

participante pudesse partilhar o seu conhecimento com os demais. Era necessário

permitir que esse grupo explorasse o aprender para depois ensinar. Vê-se uma

oportunidade de ajudá-los a construir as competências necessárias para ensinar, em

uma perspectiva empírica de ensino/aprendizado sendo o próprio PJH a

oportunidade de desenvolver essas competências.

Dez participantes informaram que gostam de computadores e tecnologias,

desses alguns expressaram como paixão esse gostar. Optamos por não analisar a

intensidade com que os participantes se referiram a este sentimento, pois

acreditamos que os dados demostram que os jovens procuram o que gostam e o

que faz sentido para o seu desenvolvimento, principalmente no que querem

aprender. Neves e Boruchovitch (2007, p.1), nos informa que o ser humano

apresenta uma prontidão natural em aprender, pois “um aluno é intrinsecamente

motivado quando se mantém na tarefa pela atividade em si, por esta ser

interessante, envolvente e geradora de satisfação”. Refletimos que os participantes

que estão nesse grupo têm uma motivação conforme explanado pelos autores

citados.

A curiosidade foi citada por três participantes, no sentido de que são curiosos

em aprenderem sobre diversas coisas. Percebemos que a curiosidade destes jovens

os motivou a aprender sobre informática por meio do PJH. Com a ajuda de Savi e

Ulbricht (2008) refletimos que a curiosidade é um ponto importante da aprendizagem

por descoberta, sendo que o ambiente deve ser livre de riscos para provocar a

experimentação e exploração. Assim, o PJH devia proporcionar um ambiente em

que seria permitido errar durante o processo de aprendizagem, sem ter como

consequência qualquer tipo punição e castração, o que está em consonância a

educação sociocomunitária.

Nove participantes se preocupam com o mercado de trabalho e

demonstraram em seu texto que estão à procura de qualificação para poder

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conseguir uma colocação. No PJH, nossa preocupação maior era com a parte social,

contudo não foi desprezável a parte técnica/instrumental utilizada no decorrer do

curso, o que possibilitaria a esses jovens a iniciação de uma carreira na área de

informática e, principalmente, conhecer um pouco do que se faz e como se faz

dentro da informática.

Outro ponto citado por sete participantes foi à carreira, contudo somente dois

desses também citaram mercado de trabalho em seus textos e os outros cinco com

um pensamento de carreira mais amplo, não apenas no campo da informática.

Demonstraram, assim, preocupação com a parte instrumental da informática que

permeia outras áreas do conhecimento e que o curso pode ser um diferencial em

sua carreira. Outros dois falaram em diferencial para o futuro em geral,

comentários que não deixam de se relacionar à carreira e ao mercado de trabalho.

O curso era gratuito, o que levou três participantes a falarem sobre isso,

sendo que outros três candidatos falaram em oportunidade, todos levando em

consideração que realizar um curso deste no município de Capivari-SP era uma

oportunidade única, devido à falta de ofertas desse tipo de cursos. Levaram em

consideração que há oferta de cursos na cidade, mas são pagos e citaram uma

empresa que fechou as portas sem dar qualquer tipo de satisfação aos alunos, o que

causou grande decepção.

Outro relato que levamos em consideração é que dois participantes falaram

sobre o bem e o mal contido na internet, discursando sobre esta dualidade de

proporcionar coisas boas, mas também de potencializar coisas más. Demonstraram

uma preocupação de utilizar essa ferramenta para atitudes que fomentassem o bem

para os outros e para si. Pensamos que, para estes jovens, mesmo que a

ferramenta internet tenha um potencial dual, a subjetividade contemplava o desejo

de fazer a diferença para a construção de coisas boas utilizando a internet como

instrumento.

Analisamos que a escolha do processo seletivo baseado em redação

possibilitou aos participantes se expressarem, o que caracterizou a abertura da

escuta já no processo seletivo. Além do que o tema da redação possibilitou a coleta

de informações relevantes para o início do projeto, possibilitando uma construção

diretiva e assertiva do PJH no quesito social que desejava atender. Com isso,

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pensamos que, neste ponto, havia uma ligação com a característica da educação

sociocomunitária em reconhecer o contexto da comunidade que sofre uma

intervenção.

3.3.2 Primeiro encontro – conhecendo os participantes e o bairro

De todos que participaram do processo seletivo, dezoito jovens começaram o

PJH, não sendo participantes exclusivos do bairro São João Batista. Percebemos

que problemas como o distanciamento entre a divulgação e o processo seletivo, a

escolha de realizar o PJH em uma região periférica e o preconceito com o bairro

cooperaram para a baixa adesão dos participantes ao curso. Contudo, não vemos

esse fato como um problema. Ponderou-se que, no final, tínhamos os jovens que

realmente desejavam realizar o projeto, e de certo modo, superaram essas

adversidades e quiseram se capacitar.

No primeiro encontro, em que se apresentaram, fizemos algumas dinâmicas

de grupo para iniciar as conversas e possibilitar descobertas de interesses em

comum entre os participantes. Neste primeiro momento, queríamos escutar e

compreender qual seria o perfil do grupo como um todo, se o que estava nas

redações seria trabalhado e qual a melhor maneira de trabalhar as áreas de

interesse do grupo.

Realizamos uma dinâmica que demonstrasse as atitudes que não

gostaríamos que acontecesse no PJH. Utilizamos uma disputa como meio de

interação. Dividimos a turma em dois grupos, A e B, e, por meio de perguntas sobre

computação e hackerismo, fomos pontuando os dois grupos. No resultado final, não

poderia ocorrer o empate das equipes, pois precisávamos de um grupo vencedor

para essa disputa que ganharia uma recompensa. Neste processo, ficou claro um

ambiente de competição, em que um queria ser melhor que o outro, queria se

sobressair. Realizadas todas as perguntas, o grupo A teve a maior pontuação e

como prêmio ganhou uma caixa trancada com um cadeado. O grupo B também

ganhou um prêmio, uma chave de cadeado.

Apresentadas as premiações, começou no ambiente uma conversa, sem

interferência dos mediadores, se a chave do grupo B abriria a caixa do grupo A.

Assim, os dois grupos confabularam e concordaram que seria, de bom tom, a

divisão do prêmio, sem saberem qual era o prêmio até o momento. Através do

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diálogo decidiram que o prêmio deveria ser partilhado igualmente para todos, porém

houve a tentativa de um participante do grupo A em ter um pouco mais do que o

grupo B, o que foi rejeitado pelos demais integrantes do grupo A. Vale informar que o

grupo A não cogitou em quebrar a caixa para pegar seu prêmio.

Nesta dinâmica foi possível verificar, por meio da observação direta, como os

participantes estavam condicionados a ambientes competitivos, em que o resultado

final é mais importante que o caminho percorrido. Nessa dinâmica, os mediadores

mostraram de forma ativa que o PJH é uma iniciativa para desenvolver a

colaboração e a partilha hacker, tendo o percurso de aprendizagem elevada

importância, e não somente os resultados alcançados. Não desprezamos as

conquistas cognitivas, mas para que essas ocorram acreditamos que o ambiente

educacional deve ser amistoso e sem pressão, cada um respeitando o seu ritmo e o

ritmo dos outros participantes. Por fim, observamos que a democracia, a

solidariedade e o diálogo superaram as diversidades de pensamentos entre os

participantes e todos usufruíram do prêmio.

Nesta primeira dinâmica, características da ética hacker foram demonstradas

para os participantes, com maior ênfase no diálogo e na partilha. Foi possível ver

que os participantes compreenderam que naquele ambiente o convívio voltado ao

desenvolvimento de capacidades seria uma construção coletiva e que a colaboração

deve estar presente em todos os momentos.

No segundo momento deste encontro, os jovens residentes do bairro ficaram

responsáveis por organizar um passeio pelas ruas do bairro, apresentando-o aos

participantes que vieram de outros bairros. Saímos em grupo da unidade do

Telecentro Capivari Digital e, ao caminhar, pequenos grupos foram formados em

torno de diversos assuntos. A medida que passávamos por determinada rua, um ou

outro participante informava que é a casa de um amigo ou parente, até mesmo a

residência de algum participante, sempre num tom agradável e amistoso. Ao sair da

parte central do bairro e irmos para as partes marginais, vimos que o bairro ainda

carece de infraestruturas, como podemos ver na ilustração 8.

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Fonte: Fonte própria, 2015.

Outra reflexão que este passeio nos proporcionou, ao passar pelas ruas

marginais do bairro, foi visualizar o IFSP – Campus Capivari, conforme a ilustração

9, ao longe, distante e sem significado para o contexto do bairro. Uma escola que

não faz parte de seu bairro como já dissemos.

Fonte: Fonte própria, 2015.

Analisamos que a presença no bairro pode aproximar esses moradores da

escola ali presente, sendo um apoio a educação sociocomunitária. Essa postura

afirmativa se faz necessária, pois a escola não está ligada por vias pavimentadas

próximas ao bairro e os moradores não a reconhecem como uma escola do bairro.

Já o passeio pelo bairro permitiu, tanto para os mediadores quanto para os

participantes não residentes do bairro, conhecê-lo e divulgar o PJH, pois alguns

moradores questionaram o que estava acontecendo. Assim, num viés

Ilustração 8 - Passeio pelo Bairro São João Batista

Ilustração 9 - Vista do campus do IFSP do bairro São João Batista.

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sociocomunitário, caminhar proporcionou conhecimentos sobre o que nos cerca,

dificuldades do bairro e das pessoas que ali moram, tudo isso faz parte de nosso

contexto educacional sociocomunitário. Pudemos aferir que a escola (IFSP) saiu dos

seus muros e alcançou, de forma modesta, uma presença no bairro.

No final deste encontro, tínhamos um contrato tanto pedagógico quanto de

postura que deveria ser seguido pelos participantes e mediadores. Decisões

tomadas neste primeiro encontro, através de um processo democrático, geraram

consciência. Para citar uma das coisas que ficaram decididas, houve o acordo de

que as conversas paralelas iriam existir, mas não poderiam atrapalhar o aprendizado

dos outros participantes. Sobre o intervalo, cada um iria observar o tempo

necessário para se alimentar e relaxar com os demais participantes. Um tempo ficou

acordado, sendo algo em torno de quinze minutos. Os participantes optaram em ter

avaliação do aprendizado, sendo que os mediadores aconselharam que a primeira

avaliação seria do próprio participante em relação ao seu aprendizado em cada

encontro. Ainda assim, optaram por ter outros tipos de avaliações como, por

exemplo, provas.

Explorar essa dinâmica de aproximação dos participantes, mostrando um

ambiente de competição que no final resultou em um momento de partilha vai ao

encontro de um aprender com empatia, uma característica da educação

sociocomunitária que possibilita, em nosso ver, o desenvolvimento humano, pois

causa uma reflexão de como o outro se sente. Assim, vemos a aproximação da

concepção educacional com a ética hacker.

3.3.3 Boa tarde – Prática para desenvolver aproximação

Como já dissemos, o “Boa Tarde” é uma proposta que visa à partilha de

conhecimentos e vivências dos participantes do PJH, ilustração 10, introduzida pelo

professor Alexandre G. Aguado, que se baseou na prática salesiana. No final de

cada encontro, cinco minutos eram dedicados a essa prática. Um participante ficava

responsável por expor algum fato que aconteceu em sua vida e que demonstrasse

um pouco de si para os outros participantes, tendo como objetivo proporcionar

reflexões para os ouvintes.

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Fonte: Fonte própria, 2015.

A prática salesiana em si envolve um contexto evangelizador e politizador

como verificamos no trabalho de Nascimento, Perreira e Oliveira (2017, p.3):

O bom dia e o boatarde têm caráter evangelizador e politizador, ainda que não diretamente. Podem ser exibidos filmes, slides ou vídeos musicais, realizadas dinâmicas que permitam a interação das crianças e jovens, realizadas leituras ou contações de histórias, ou mesmo apresentações de esquetes teatrais. Essas atividades visam criar uma integração entre as crianças e adolescentes, bem como fazê-los refletir sobre suas ações e suas vidas, corrigindo comportamentos que os estejam prejudicando ou que sejam considerados inapropriados.

Contudo para o PJH, o intuito do boa tarde era de trazer para o PJH: sintonia;

aproximação; o reconhecimento das particularidades dos participantes; uma audição

com respeito; e propiciar o desenvolvimento da empatia. Refletimos com a ajuda de

(FREIRE, 2014, p.39), para quem a educação precisa da empatia dos que dialogam

para assim “nutrir-se de amor, de humanidade, de esperança, de fé, de confiança”.

Assim, colaborar para a construção de um grupo em que estivessem presentes as

características de uma comunidade. Assim, foram passando os encontros, sendo

que em todos os encontros houve contribuições dos participantes, ouvimos sobre:

casos de vida; de superação; de sucesso; de derrotas; sobre estilo de vida, entre

outros.

Para exemplificar, trazemos o relato do jovem P. H. C., este relato aconteceu

em meados de outubro de 2015. No relato, o jovem falou sobre ir até o final de um

projeto/tarefa, além de discursar sobre utilizar os recursos disponíveis até o final e

não os desperdiçar simplesmente por não serem mais novos. Vale mencionar que no

momento de sua fala o grupo já estava reduzido devido à evasão e, após sua fala,

Ilustração 10 - Boa tarde

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confirmamos que ele estava afetado/incomodado pelo fato. Outro relato foi do

mediador Karlan R. Alves, vendo que todos falavam de sucesso e boas

experiências, utilizou do “Boa tarde”, no final do primeiro módulo, meados de junho

de 2015, para expor um relato de derrota/fracasso, que girou em torno de concursos

públicos em que não tivera êxito, na perspectiva de que se pode encarar seus

fracassos como aprendizado e que só se é derrotado quando se desiste.

Verificamos que apesar da turma ter se separado em pequenos grupos por

afinidade, o boa tarde possibilitou que todos se conhecessem. Observamos

(observação participante, durante todo o PJH) que um ambiente democrático e de

partilha foi construído entre os participantes. Concluímos que o boa tarde foi uma

ferramenta/método para ajuda a criar e fortalecer vínculos, pois possibilitou a escuta,

ver o outro e sua subjetividade, o que relaciona-se diretamente com a educação

sociocomunitária e a ética hacker no cuidado com o outro.

3.3.4 Biblioteca - uma iniciativa criativa

A montagem de uma biblioteca para o espaço Telecentro - Capivari Digital foi

uma iniciativa da jovem T. M. S., que envolveu o empenho de todos. O bairro não

conta com uma biblioteca pública, sendo que através de doações os participantes

reuniram vários livros, algo em torno de cem livros, em diversas áreas do

conhecimento, incluindo livros infantis. Os livros infantis são destacados neste texto,

pois nos encontros vimos, através de observação direta, que muitas mães e

cuidadoras iam até o telecentro com crianças, assim havia a possibilidade de os

livros fazerem parte da infância dessas crianças.

Pensamos e decidimos que para tomar emprestado os livros não seria

necessário qualquer tipo de cadastro ou anotação, mesmo tendo o risco de perdas

de livros. Acreditamos que tal atitude poderia ocasionar maior frequência nas

retiradas de obras. Assim, acreditamos ter surgido a possibilidade de os moradores,

ao irem ao telecentro, verem os livros ali disponíveis os pegarem emprestado, sem

qualquer tipo de coerção, tendo a liberdade como inspiração.

Entendemos que aquela modesta biblioteca pôde despertar em todos o

sentimento de partilha e colaboração, pois os frequentadores poderiam tanto pegar

livros emprestados quanto doar livros para a biblioteca. Assim, tivemos uma

intervenção singela no bairro que não havia antes do PJH, sendo uma iniciativa

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relevante dos jovens participantes do projeto. Acreditamos que a grande mensagem

para os participantes foi que devemos pensar e realizar, senão os bens que advém

do pensamento não se materializam em nosso mundo material. Devemos nos

manter ativos para transformar nossa realidade.

3.3.5 Pintura do espaço PJH

Em um momento de diálogo, durante o primeiro módulo, questionamos os

participantes de como poderíamos deixar o nosso local de convívio mais agradável e

deixar a marca Jovem Hacker naquele espaço. Fomos surpreendidos pelo jovem L.

V. S. C., que cogitou a possibilidade de pintar as paredes. Essa ideia criou força

entre todos os jovens, restando aos mediadores a tarefa de verificar com os

responsáveis pelo espaço do Capivari Digital se poderíamos dar continuidade a este

projeto. Tivemos a autorização e demos início ao planejamento da pintura.

Estipulamos a data em que aconteceria a pintura, que seria entre o primeiro e

segundo módulo, após o recesso de julho. Vale salientar que o recesso foi

concomitante às férias escolares dos jovens e que pensamos no bem-estar deles,

em terem um momento de descanso das atividades escolares.

No retorno das atividades, tanto escolares quanto do PJH, os jovens

conversaram sobre o que realizariam na pintura do nosso espaço. Questões

afloravam a todo momento, como: quais cores utilizaremos?; como se pinta?;

podemos fazer desenhos?. Nesse clima envolvente, fomos desenvolvendo o diálogo

e as ideias com os jovens, em um clima de descoberta, sempre refletindo sobre o

que faríamos e como faríamos. Decidimos as cores, as paredes a serem pintadas,

os materiais a serem utilizados, buscamos conhecimentos sobre pintura de paredes.

Tudo isso fora do contexto dos encontros, para que não houvesse atraso no módulo

e no cronograma.

Organizamos e protegemos os computadores para começarmos a preparação

das paredes para receberem as tintas. Todos os computadores já estavam montados

e funcionando quando iniciamos a pintura. Os mediadores deixaram os trabalhos

ocorrerem de forma fluida, se envolvendo também nas tarefas, mas, sem ordens,

sem pressa, sem imposição. Os jovens se reuniam e decidiam o que fariam.

Podemos ver na ilustração 11 que até mesmo no intervalo do lanche o jovem J. V. S.

R. L. não quis interromper a sua tarefa e continuou a lixar a parede sozinho, mas

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convicto de que só iria descansar após o término, sendo que ele mesmo havia

definido a tarefa e tomado essa postura.

No início do quarto encontro da realização da pintura, os mediadores foram

direto realizar as tarefas e não houve qualquer tipo de chamamento ou interação

com os jovens, que se reuniram e ficaram conversando na parte externa ao nosso

espaço. Passados em torno de vinte minutos, alguns jovens ficaram incomodados

com a situação e foram se aproximando dos mediadores e pedindo por tarefas.

Neste processo, um a um foi realizando alguma tarefa. Mesmo tendo demorado um

pouco para perceber que ninguém os chamaria, os jovens perceberam que era

necessário sair da passividade e agir. Assim, cada um reconheceu que para a

realização dos trabalhos, dependiam de um esforço individual e de seu

comprometimento. Vale mencionar que em nosso acordo prévio não havia

delegação de tarefas e chamamentos para os trabalhos.

Fonte: Fonte própria, 2015.

Com as dificuldades que esperávamos, pois não havia conhecimento sobre

pintura, os trabalhos foram se desenvolvendo. Tivemos problemas, por exemplo,

com a aplicação da tinta à base de água, que ficou muito rala; uma parede não ficou

bem lixada; não lavamos os pinceis e a tinta endureceu neles e assim por diante.

Contudo, esses problemas foram encarados como parte da aprendizagem e não

como um problema, pois todos foram resolvidos. Refletimos que essa tarefa, apesar

Ilustração 11 - Jovem Preparando a parede para pintura.

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de séria, possibilitou brincar com o desconhecido e também permitiu o trabalho fora

do computador, além de proporcionar a mudança de nosso espaço feito por nós

mesmos.

Questões foram levantadas para ocasionar a reflexão da ética hacker com a

atividade de pintura que estava sendo desenvolvida. Como, por exemplo, qual foi um

grande artista da pintura? Nomes de pintores famosos foram apresentados, como,

por exemplo, Da Vinci e Tarsila do Amaral. Eles pintavam em troca de algum retorno

financeiro? Houveram resposta que sim e que não, discutimos se eles pintavam por

prazer ou para vender suas obras. Esse contexto de diálogo era para promover uma

reflexão de que não basta ser bom em algo, pois precisamos do trabalho para

possibilitar qualquer tipo de realização/transformação.

O processo de pintura durou duas semanas, o que envolveu quatro encontros

com os jovens. Na segunda semana da pintura, fomos questionados pela jovem G.

R., no grupo de comunicação que utilizávamos pela ferramenta Whatssap, “quando

vai acabar essa bagunça?”, isso se referindo à pintura de nosso espaço. Os

mediadores dialogaram com ela para esclarecer que o processo foi democrático e

que todos estavam empenhados para terminar o mais breve possível a tarefa para

retornar ao cronograma do curso. A equipe conversou sobre o ocorrido e decidimos

não levar a conversa adiante devido ao fato de que os outros participantes estavam

envolvidos e empenhados, além do que acreditamos que esse aprendizado é

importante para a construção da ética hacker. A jovem G. R só voltou a frequentar as

atividades depois da pintura concluída, não se envolvendo nas tarefas. Optamos por

não conversar com ela novamente sobre isso, pois compreendemos que foi uma

atividade extracurricular e que ela decidiu por não participar. Vimos nessa atitude

uma postura antidemocrática perante ao que foi discutido e acordado em encontros

anteriores sobre a realização da pintura.

Entre poeira, sujeira de tinta, cansaço, momentos de desânimo e momentos

de euforia, a tarefa de pintar a sala foi finalizada, ilustração 12. Mostrar essa tarefa

como desafio aos jovens foi relevante para o PJH, uma transformação exterior de

nosso espaço permitiu refletir junto aos jovens de como devemos agir para

transformar informações em conhecimento. Ainda permitiu mostrar a eles que temos

a capacidade de transpor obstáculos de nosso dia a dia. Vimos no decorrer dos dias

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que nessa tarefa houve compromisso individual e coletivo, busca por conhecimento

de pintura, discussão entre grupos de como resolver determinados problemas,

parcerias na execução de tarefas, brincadeiras e por fim uma sala pintada e com a

marca dos jovens hacker.

Fonte: Fonte própria, 2015.

Acreditamos que essa atividade aproximou os participantes, ilustração 13, e

iniciou a construção do que os hackers chamam de cuidado com o outro dentro do

nosso grupo de aprendizado. Já no contexto educacional, possibilitou-se a busca de

informações para a construção de um conhecimento significativo que colocamos em

prática e constituiu-se um fim comum para todos os envolvidos na pintura, que era a

sala pintada, demonstrando o trabalho de cada um. Analisamos que essa pintura

possibilitou aos jovens a construção de habilidades e competências num viés da

educação como desenvolvimento, num momento de escolha e realização que em

outros ambientes educacionais não seria possível.

Ilustração 13 - Participantes da Pintura do PJH.

Ilustração 12 - Resultado Final da Pintura.

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Fonte: http://capivari.jovemhacker.org/pintando-o-capivari-digital/.

3.3.6 Montagem da Rede elétrica e a Rede de Computadores

O próximo passo envolveu determinados conhecimentos, que os mediadores

não dominavam, como no caso da pintura, mas, utilizando de aprendizagem ativa,

buscamos informações sobre como montar uma rede elétrica para os computadores

do PJH. Houve diálogo constante com os participantes sobre quais informações

eram relevantes e como encontrá-las para construirmos a rede elétrica. Como havia

o risco de descarga elétrica, tivemos o cuidado de só energizar os fios quando todo

o trabalho tivesse terminado. Não encontramos dificuldades para a construção da

rede elétrica e todos se envolveram nesta tarefa. Acreditamos que essa atividade foi

benéfica devido ao aprendizado durante o processo de pintura, pois as posturas

durante a construção da rede foram mais tranquilas e fluídas, sendo que os jovens já

demostravam muita atividade assertiva para a construção da rede.

Com o término da construção da rede elétrica, demos início à construção da

rede de comunicação de dados, conteúdo programático do curso. Os participantes

puderam construir e realizar a comunicação de seus computadores uns com os

outros, além da ligação com a Internet.

Ilustração 14 - Construção dialogada uma constante no PJH.

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Fonte: Projeto Jovem Hacker – 2015 – Edição Capivari.

Para isso tivemos uma constante no PJH, que foram as trocas dialogadas de

informações e experiências, ilustração 14, mesmo nos momentos de exposição de

conteúdo instrutivo, tínhamos na sala uma dinâmica circular que permitia a conversa

paralela e consequente uma maior participação dos alunos. Também servia de

termômetro para sabermos se o conteúdo despertava a curiosidade nos

participantes. A disposição circular dos participantes nos permite um olhar para o

outro. Uma aproximação e observação singular para com os participantes, sendo

que seria difícil, ou mesmo impossível, desenvolver essa postura em uma sala de

aula onde as carteiras fossem enfileiradas, contexto que só permite a observação da

nuca de quem está à sua frente. Vale ponderar que a nossa busca constante era

desenvolver uma postura ativa em todos os participantes.

3.3.7 Discussões das entrevistas

Foram realizadas duas entrevistas não estruturadas, sendo a primeira no dia

24 de novembro de 2015 e a segunda no dia 9 de dezembro de 2015, contudo as

entrevistas tiveram dinâmicas diferentes. Na primeira entrevista não estruturada, os

participantes estavam dispostos em duplas, sendo que houve uma questão

norteadora: “Qual a sua visão hoje do hackerismo?”. A partir dessa questão,

desenvolveu-se a entrevista. Ambas as entrevistas contaram com o recurso de

gravação em áudio das falas, para possibilitar posterior análise e transcrição. Foi

utilizado um smartphone como gravador de áudio. Já na segunda entrevista, um

participante era colocado no centro das atenções e teria que responder três

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questões norteadoras: 1. “Por que você venho fazer o PJH?”; 2. “O que é um

hacker?”; “Dos pilares da ética hacker, quais você incorporou durante o PJH?”.

Nessa dinâmica, todos os participantes e mediadores podiam questionar. Como

recurso foi realizada uma filmagem, tanto do entrevistado quanto da plateia,

utilizando como instrumento o gravador de vídeo de dois smartphones.

O público que chegou ao fim do PJH era formado por seis jovens, sendo

quatro jovens rapazes e duas jovens moças, com média de idade de 15 anos. Todos

os alunos frequentavam escolas públicas, quatro participantes no primeiro ano do

ensino médio e dois participantes no segundo ano do ensino médio. Destes jovens,

dois são moradores do bairro São João Batista, dois de bairros próximos e dois de

um bairro distante.

Percebemos que os alunos mudaram o conceito sobre o que é ser hacker,

pois podemos ver nos relatos dos participantes P. H. C.: “queria sair hackeando

geral”; N. R. T. pensava em hackear os programas; L. V. S. C. tinha formado sua

concepção hacker baseando-se no que a mídia divulga. No final do projeto, com os

fundamentos hackers trabalhados, os participantes tinham consciência do que se

tratava e vemos isso, por exemplo, no relato de L. V. S. C. “dá uma certa dor no peito

por estarem usando a palavra errada”.

O participante P. H. C. relatou a mudança de hábito, “de terças e quartas eu

não fazia nada, às vezes andava de skate, agora me dedico mais, lembro do que o

Alexandre G. Aguado falava, você aprende mais fazendo, estou programando mais

em casa, para cada vez evoluir mais”. Este tipo de mudança é essencial, pois tira o

jovem da passividade e o torna ativo perante suas vontades, sendo que o PJH

auxiliou o participante a conquistar tal autonomia e levar para sua vida cotidiana a

postura de realização de projetos.

Os jovens P. H. C. e N. R. T. relataram a dificuldade de irem para o PJH, “nós

procuramos ônibus e não achamos, mas deu pra vir”, eles residiam em um bairro

distante e só foi possível devido ao avô do jovem P. H. C. se disponibilizar pra levá-

los até o PJH. A jovem T. M. S. também falou da acessibilidade e do horário que era

realizado o PJH como dificultadores para a realização do projeto. Apesar das

dificuldades de os jovens frequentarem o PJH, percebemos que o esforço para

participar do PJH foi grande, mas não uma barreira intransponível.

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Os jovens também destacaram a colaboração dentro do método de

aprendizagem ativo, D. J. S. “tendo a liberdade para colocar nossas ideias em

prática… há colaboração porque o trabalho em equipe e tá fazendo o projeto

funcionar”. Para o jovem L. V. S. C. “o jeito que o Alexandre G. Aguado ensina, ele

não te ensina tudo, ele te dá uma base e te faz querer saber mais, ele te faz correr

atrás de algo para você fazer”.

Para a jovem T. M. S. “a gente sempre vai trabalhar com outras pessoas,

então a gente nunca vai poder ser individual… existe compartilhamento de

ensinamentos, então o que eu aprendi os outros também podem aprender. E o que

eles aprendem eu também posso aprender junto com eles”. Analisamos que

possibilitar aos jovens um espaço de colaboração faz com que eles aprendam a

relacionar-se com o objetivo de aprenderem entre si, num contexto de partilha. A

jovem T. M. S também menciona que as habilidades aprendidas no PJH serão

utilizadas em outros espaços.

Através do PJH, pudemos ajudar os jovens a se sentirem livres e atuantes em

um espaço democrático. O jovem D. J. S., ao ser questionado se teria uma voz ativa

em casa, ele responde: “Eu não tenho porque eu sou quieto e em casa eu me sinto

excluído, eu não me sinto eu em casa”. Pesquisador, “No PJH, você se sente

como?”, “Aqui no PJH, eu sou bem mais eu”. Este participante mora com o irmão

mais velho e é órfão de pais. Acreditamos que essa declaração confirma que no PJH

existia um ambiente saudável, em que este jovem pôde se expressar e atuar

conforme seu pensamento. Foi caro para o PJH, como projeto social, este relato.

Ainda falando do jovem D. J. S., por meio da observação direta, constatamos

que sempre que desafiado, ele reagia com mais ímpeto para realizar uma tarefa.

Diante disso, sempre que possível, dentro de determinados limites, ele era desafiado

pelos mediadores, tendo sempre êxito em suas tarefas. Isso foi importante para

demonstrar do que ele é capaz. Alexandre G. Aguado fez a seguinte questão: “O que

é o PJH para você?”, D. J. S. respondeu: “Uma oportunidade nova que eu gostei

muito, aprendi muito, e foi algo que eu não esperava de mim.” Alexandre G. Aguado:

“Não esperava, por quê?” D. J. S.: “Porque eu sempre achei que eu não era capaz

de muitas coisas e o PJH me fez perceber que sou”.

Assim, compreendemos que por meio de desafios podemos mostrar aos

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jovens suas capacidades, acreditamos que isso se comunica com a concepção

educacional sociocomunitária. Como explana o jovem P. H. C., “eu gosto de desafio.

Quanto mais difícil, mais eu vou querer fazer”. Nesse contexto, é importante o

suporte das metodologias ativas, que possibilitam aos jovens a colaboração e

diversos meios de aprender e conhecer. Para o PJH, fatores de aprendizado como o

aprender a aprender e o aprender a conhecer a si mesmo são fundamentais na

questão tanto de projeto de ensino quanto do projeto social.

As entrevistas não estruturadas possibilitaram compreender o público do PJH

e o que afetou suas individualidades. Com o exposto, analisamos que os pontos

citados pelos entrevistados são relevantes para compreender e delimitar os métodos

utilizados pelo projeto, tanto na parte de ensino/instrumentalizadora, quanto

social/emancipadora.

3.3.8 Desenvolvimento do Projeto Final – Olhares para o social

Como já dito, o último módulo do curso envolvia o desenvolvimento de um

projeto. Nele devia haver o que foi aprendido na parte instrumental do curso. Em

princípio, devia envolver alguma iniciativa para o desenvolvimento social do bairro

São João Batista, contudo houve algumas objeções dos três grupos, o que levou a

liberação para que cada grupo escolhesse seu tema sem qualquer tipo de

intervenção da equipe PJH.

Dentro os três grupos, houve o desenvolvimento de uma ferramenta social

para o bairro. Este trabalho foi desenvolvido pela jovem T. M. S. O trabalho envolvia

tanto a parte instrumental quanto social, pois se tratava de uma ferramenta que

possibilitava aos não residentes do bairro uma compreensão dos problemas do

bairro, e aos residentes exporem seus problemas. De modo amplo, a ferramenta é

um portal, contendo vídeos e relatos dos moradores que expunham os problemas e

opiniões sobre o bairro. Acreditamos que essa iniciativa de dar voz aos moradores

do bairro é importante, pois nela vemos traços tanto da ética hacker, da educação

sociocomunitária e da educação como desenvolvimento.

A apresentação dos projetos foi realizada no auditório do IFSP - Campus

Capivari, no mês de dezembro de 2015, para a comunidade acadêmica e

convidados, incluindo representantes da prefeitura municipal e vereadores da cidade

de Capivari e Rarfard-SP. Logo em seguida, realizou-se a formatura da primeira

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turma do Projeto Jovem Hacker em Capivari-SP, como podemos visualizar na

ilustração 15.

Fonte: Projeto Jovem Hacker – 2015 – Edição Capivari.

3.3.9 Problema do PJH

Tivemos vários participantes que deixaram o PJH, devido a outros

compromissos que não eram compatíveis devido aos horários de nossos encontros.

Por exemplo, o jovem J. V. S. R. L., que estava cursando o nono ano do ensino

fundamental e que através do PJH conheceu os cursos do IFSP – Campus Capivari,

teve que escolher entre continuar no projeto ou fazer um curso preparatório para

prestar o processo seletivo para o curso do ensino médio integrado com informática.

Esse jovem optou por se preparar para o processo seletivo e em 2016 se tornou

aluno regular do curso do ensino médio integrado com informática.

Também tivemos o caso especifico do jovem G. L. S., morador do bairro São

João Batista, que não se identificou com o curso e após o recesso do mês de julho

não voltou aos encontros. Esse foi o único caso de evasão em que o participante

não quis mais participar dos encontros mesmo tendo a possibilidade, pois os outros

que não foram até o final tiveram motivos, como emprego, estudos, dentre outros,

para deixar o PJH.

Quando questionada sobre o que a teria incomodado no PJH, a jovem T. M.

Ilustração 15 - Participantes formados no PJH - Capivari, Edição 2015.

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S. respondeu: “As pessoas saindo dele, vendo outra oportunidade e saindo. Porque

eu sei que me esforcei, eu poderia ter saído, mas eu decidi ficar. Aí eu penso que as

pessoas, meio que fizeram descaso ou que elas viram alguma coisa mais

importante, não que elas sejam erradas por isso, mas se eu começo alguma coisa,

penso que os outros também tem que começar e terminar, como eu penso”. O maior

impacto para o PJH com a evasão foi a perca de ideias e visões de mundo, que os

jovens, ao saírem do projeto, levavam embora, reduzindo assim os debates e a

possibilidade do aprender com o outro.

Constatamos, por meio das desistências, que a duração do PJH foi muito

alargada, envolvendo dois semestres do ano de 2015. Isso resultou em apenas seis

participantes terminando o projeto, o que revela o comprometimento desses

participantes. Vale mencionar que em nenhum momento estávamos preocupados

em promover a quantidade, sempre mantendo o foco na qualidade do ensino para os

participantes.

A equipe PJH refletiu que, para a realização da próxima edição, o projeto seja

realizado em um único semestre. Para isso, a parte instrumental será afetada. Em

relação à parte social, acreditamos que será realizada sem problemas. Pensando

em atingir o maior público possível durante a realização de uma edição do PJH,

essa revisão do tempo do curso para as próximas edições é necessária, e se for o

caso, realizar a continuação do projeto, com divisão de módulos, assim envolvendo

dois semestres de capacitação. Tudo isso visando à entrada e permanência dos

jovens durante a edição do PJH. Acreditamos que essas ações irão diminuir a

evasão do curso, contudo deverá ser observado se realmente apresentarão

resultados tais modificações.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O PJH leva em si todas as características da ética hacker, para exemplificar,

citamos a paixão pela vida social e o trabalho, o esforço consciente para a

superação das adversidades, o foco na cooperação/colaboração dos indivíduos.

Vemos uma aproximação do PJH e da Educação Sociocomunitária, à luz da

Educação como Desenvolvimento Humano, pois realiza-se um trabalho para a

promoção da transformação social, tendo nas pessoas a força necessária.

Assim, acreditamos que há uma potencialização, tanto da educação

comunitária quanto da ética hacker, pois ocorre a união de uma concepção

educacional que valoriza a escuta e da busca de transformações sociais por meio de

intervenções nas comunidades, além da utilização e valorização do trabalho das

pessoas pertencentes à comunidade. Já na ética hacker pretende-se tirar as

pessoas da passividade e fomentar ambientes de colaboração, conhecimento e

liberdade.

A metodologia de ensino utilizada no PJH é ativa, o que se relaciona

diretamente à educação sociocomunitária, pois contar com a atividade dos

indivíduos é necessário para fomentar as transformações sociais desejadas. Faz-se

necessário o respeito ao estilo de vida e subjetividade de cada um que participa de

determinada comunidade. Apresenta-se, também, a possibilidade de trabalhar a

discussão e o respeito às opiniões alheias de forma democrática, por exemplo, a

pintura da sala no PJH, que acreditamos ter possibilitado a criação de competências

para discussões democráticas fora do ambiente educacional. Assim, acreditamos

que a atividade contida na ética hacker fornece instrumentos para o

desenvolvimento das competências de forma ativa, sendo que a educação

sociocomunitária pode se beneficiar deste instrumento. Fatores como: motivação,

autoria, valorização e desafio estavam presentes no PJH e podemos concluir que

isso gerou ensaios individuais para uma criação conjunta e coletiva, o que configura

uma característica da educação sociocomunitária.

O contexto social do bairro que recebeu o PJH vai ao encontro da educação

sociocomunitária. Fazer presença no bairro é uma forma dos moradores

conhecerem a escola que faz parte de sua comunidade, apesar da distância que os

separa. Vemos um ponto positivo do PJH, pois analisamos que é um ponto de

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partida para futuras intervenções e aproximações. Porém, sugerimos que outras

intervenções junto ao PJH sejam realizadas com o envolvimento dos moradores que

fomentem a transformação do bairro como um todo.

O PJH tem como finalidade o empoderamento tecnológico dos jovens, já a

educação sociocomunitária atua para ocasionar o empoderamento dos indivíduos

em um contexto social que passa pelo comunitário, micro, e se estende até a

sociedade, macro. Assim, refletimos que o PJH colabora com a educação

sociocomunitária ao permitir que os jovens façam uso das tecnologias de forma

plena e que utilizem das tecnologias sociais para auxiliar e potencializar as

transformações sociocomunitárias.

Que por meio de projetos, como o desenvolvido pela jovem T. M. S., o centro

possa conhecer a periferia. Que, indo além, comunidades possam visualizar outras

comunidades, tendo assim uma rede de comunicação que visa à partilha de

informações e perspectivas para fomentar as transformações desejadas. Nesse

cenário, o olhar para o outro e o aprender com o outro são recursos possíveis por

meio das tecnologias sociais.

E, por fim, a educação como desenvolvimento é relevante ao pensarmos que

a formação das capacidades dos indivíduos sobrepõe a instrumentalização, sendo

que tanto a educação sociocomunitária e quanto o PJH trabalham para propiciar a

formação e não somente a instrumentalização dos indivíduos. Acreditamos que

trabalhar as competências dos participantes do PJH de forma ativa em contexto

educacional sociocomunitário se comunica com a educação para o desenvolvimento.

No fim deste este estudo de caso, em que a hipótese de o PJH ser um caso

de educação sociocomunitária poderia ser confirmada ou não, inferimos que há uma

grande aproximação da educação sociocomunitária com o PJH, sendo um caso de

projeto educacional sociocomunitário que carrega em si as características dessa

concepção educacional.

Contudo, analisamos que deveria haver maiores intervenções do PJH no

bairro para ocasionar a transformação do mesmo. O público atendido pelo PJH não

foi exclusivo de moradores do bairro, assim analisamos que isso trouxe para o PJH

vivências e olhares de outras regiões, o que consideramos enriquecedor. Não

houve, entretanto, nenhuma intervenção junto às famílias dos participantes, e, se

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houvesse, deveria compreender os contextos dos diversos bairros em que os

participantes residiam.

Também não podemos concluir se existe um sentimento de pertencimento

entre os moradores que leve o bairro a ser uma comunidade. Assim, o PJH como

projeto social voltado ao desenvolvimento comunitário deverá sofrer algumas

adequações, sendo as principais: 1º. abrir a escuta para a comunidade; 2º. envolver

lideranças comunitárias, se não houverem lideranças, desenvolvê-las; 3.º realizar a

articulação dos poderes públicos para o desenvolvimento comunitário.

A respeito de futuras edições do PJH, em 2016 ocorreram duas edições com

o apoio do IFSP-Campus Capivari, uma edição no município de Rafard-SP e outra

em Capivari-SP. Outra informação que podemos citar é que houve o fechamento de

todos os doze telecentros do Capivari Digital, sendo assim o bairro São João Batista

não está usufruindo da biblioteca e dos computadores frutos do PJH.

Para trabalhos futuros, há a necessidade de pesquisar sobre metodologias de

ensino que dialogam com a educação sociocomunitária, com o objetivo de trazer à

luz os métodos de ensino que compõem e potencializam essa concepção

educacional. Neste trabalho, por meio do PJH, houve a demonstração de que as

metodologias ativas podem nortear essa busca.

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APENDICE A – Análise das redações individualmente.

Começaremos a analisar alguns participantes do processo seletivo em sua

individualidade, como o jovem V. G. que tinha o sonho de montar uma linha de

computadores, além de ser curioso e apaixonado por computadores. Seus sonhos

foram findos no segundo semestre de 2015, em um acidente de trânsito em

Capivari-SP, envolvendo um carro e a bicicleta em que ele estava. Uma perda para

todos que estavam participando do PJH, compartilhando sonhos e ensinamentos

nas tardes de terças e quartas, uma dura lição que tivemos que conhecer e refletir

com os jovens e que ficou marcada em nossas vidas.

Acreditamos que os jovens gostam de desafios e isso ficou marcado no

processo seletivo e em toda participação do D. J. S., que sempre que desafiado

tinha um empenho extraordinário para resolver situações de problemas que envolvia

programação ou lógica, além de aguçar toda sua inteligência e determinação para

obter o êxito e sair vitorioso dos desafios. Será que os processos de ensino devem

utilizar de tal recurso, os desafios? No PJH utilizamos disso para obter o empenho e

a atenção dos participantes. Por meio dos desafios, conquistamos uma participação

ativa e consideramos isso essencial para o processo cognitivo.

O jovem D. J. S., em sua redação para o processo seletivo, fala que seu

interesse é aprender e superar os seus limites. Isso dialoga com a postura hacker da

fundamentação teórica e da revisão bibliográfica deste trabalho, além de mostrar a

atitude deste jovem perante o conhecimento e sua ânsia por aprendizagem. Em uma

sociedade da informação, ter este desejo é ter potência perante os desafios que

envolvem o aprender e superar limites em busca de aperfeiçoamento, que só

depende da disposição de cada um.

O participante G. V. G. C. escreveu sobre a visão do PJH no que diz respeito a

vivenciar, aprender e compartilhar, além de falar das facilidades e das coisas ruins

que o mundo apresenta ao jovem, como as drogas. Também relata que é necessário

a construção de um mundo melhor, além de mostrar em sua redação uma

preocupação com a questão extracurricular e social. Os pontos relatados por este

jovem, juntos, podem levar os jovens a construir um mundo melhor, pois ao

apresentar outras possibilidades, os jovens podem trilhar um caminho diferente em

uma postura hacker de construção social.

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O jovem G. L. S. também espera dar o máximo de si, contudo tem uma

postura perante a tarefa de aprender e a relata: o aprendizado deve ocorrer com

calma. Observamos neste discurso que a calma no aprendizado pode proporcionar

ganhos para este jovem e os demais, pois gera uma postura livre de pressão e

cobranças tanto internas quanto externas, tornando o ato de aprender prazeroso.

Diante disso, pensamos que o PJH deve proporcionar um ambiente dinâmico, porém

calmo para os participantes poderem dar o seu máximo.

A jovem G. R. demonstra preocupação em ocupar umas das vagas no PJH,

pois estaria tirando a oportunidade de outro jovem. Assim, relatou que, se

participasse do PJH, entraria com vontade de aprender e foco no que interessa.

Duas preocupações hacker são vistas nesta jovem: a ação e o cuidar do outro. Antes

mesmo do PJH acontecer podemos pensar em trabalhar características dos jovens

perante a ética hacker em um ambiente de educação sociocomunitário.

Voltando a falar de oportunidades, mas desta vez direcionados pela jovem J.

F. M. C., que relata que há pouca oferta de cursos em sua comunidade. Vemos que

na cidade de Capivari-SP existe um déficit na oferta de cursos direcionados ao

público jovem. Vemos que não só a parte instrumental de um curso é importante,

mas todo o contexto de inserção do curso na comunidade, como facilidade de

acesso, proximidade do curso à comunidade e suas características, incentivos de

permanência, conteúdos e metodologias que agradam aos jovens. O PJH é uma das

poucas oportunidades que os jovens da cidade podem usufruir, mas temos em

mente as limitações de espaço, recursos e vagas do projeto.

Podemos ver que os jovens estão tendo contato com a tecnologia cada vez

mais cedo e com isso aprendendo de forma autônoma a utilizar este recurso. O

jovem J. V. S. R. L. relatou em seu texto que aos noves anos ganhou o seu primeiro

computador e a partir daí o pai sempre o incentivou a aprender computação. Por

gostar de jogos, às vezes, o jovem trocava a senha do computador para poder jogar

e não ser descoberto pelo pai. Uma pequena transgressão que o incentivou a

aprender, mas que requer algumas orientações, pois deve respeitar os limites

impostos pelos responsáveis.

Será que os jovens anseiam por coisas novas? Em seu relato, a jovem L. S.

S. responde essa questão de forma positiva. Os jovens querem coisas novas. E o

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PJH é a cara dela devido ser um projeto novo. Iremos ensinar os jovens com coisas

antigas? Com metodologias antigas? Com certeza não, temos que reinventar,

conquistar novamente os jovens e motivá-los a criarem novas formas de interações

que favoreçam a aprendizagem. O PJH é uma tentativa de dar escuta a estes jovens

e levar a eles um método de aprendizagem que os hackers utilizam para

desenvolver seus projetos, pautado no protagonismo e na autonomia.

O PJH necessita escutar os jovens e aprender com eles. Assim, o jovem L. B.

S. deseja levar para o projeto o seu conhecimento e se esforçará ao máximo para se

tornar um auxiliar do curso. O que o PJH pode proporcionar aos jovens? Essa é uma

ótima questão que norteia a construção do percurso do projeto. Mas, no que o PJH

pode aprender com os jovens? Quais conhecimentos dos jovens serão utilizados do

decorrer do PJH? A atenção a este tipo de questão e ao conhecimento do alunado

dialoga com a concepção educacional sociocomunitária, além de oportunizar uma

reflexão sobre o papel dos educadores e educandos.

Já o jovem L. V. S. C. diz, “Sou um aluno dedicado e me esforçarei para obter

as melhores notas.” Nesta transcrição podemos perceber que o sistema de ensino

formal e a construção desta ditadura por notas e rendimentos a este jovem foi

tamanho que o mesmo relacionou o bom aluno ao conquistar as melhores notas.

Ponderamos que não é só o ensino formal que faz com que isso aconteça, mas

também a contribuição dos responsáveis através de cobranças de um boletim “azul”.

Acreditamos que as notas refletem alguma capacidade em resolver sobre pressão

determinados problemas, problemas em forma de questões, contudo não basta para

construir um mundo social melhor. No PJH, primamos pelo empenho e dedicação

para a construção de um ambiente educacional criativo e libertário. Esse jovem

ainda relatou que gosta de se divertir. Acreditamos que o aprendizado deve ser

divertido e dinâmico e assim que o hacker aprende.

Vamos relatar mais alguns fatos que achamos interessantes. Como o jovem P.

H. C. que soube diferenciar o hacker do cracker em seu texto, enquanto diversas

mídias ainda utilizam a palavra de forma errônea. Outro fato interessante citado pela

jovem P. P. é que em sua opinião a Internet é subutilizada para acessar redes sociais

e jogos. Já a jovem T. S. aprendeu sozinha coisas sobre informática e “corre” atrás

do conhecimento. A jovem T. M. S. gosta de colocar o conhecimento em prática, no

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sentido de dar uso ao que se aprende e repassar esses conhecimentos. Nessa

mesma linha de pensamento, a jovem R. C. S. deseja passar suas experiências para

o próximo, além de provar para si mesma sua capacidade frente ao desafio PJH.

Assim, começamos o PJH com tamanha diversidade e com o desafio de trabalhar

todas as individualidades para que se tornem um grupo hacker e que desenvolvam

sua autonomia e protagonismo perante suas vidas.

Entrevistas não estruturadas.

Realizamos uma entrevista não estrutura no dia 24 de novembro de 2015 com os

cinco (5) participantes presentes neste dia no PJH, dois seis que foram até o fim do

PJH. Segue a transcrição dos áudios, vale ressaltar que foi avisado aos participantes

que haveria a gravação das conversas, ciente disso todos autorizaram a gravação,

que utilizou de instrumento um smartphone.

Visão geral de quando você entrou no PJH sobre o hacker e agora que já decorreu

alguns meses de convívio?

P. H. C.: “Quando eu entrei queria sair hackeando geral, minha visão agora é

bem diferente dá de quando eu entrei, hacker faz uma coisa totalmente diferente. O

Alexandre falou uma vez, o cracker destrói o hacker constrói.

N. R. T.: Eu pensei que ia ser outras coisas, quando eu entrei pensei que seria

essas coisas de hackear programas, essas coisas. Não imagina que ia montar um

computador, aí me surpreendeu.

Dá ética hacker o que vocês levam, para fora do espaço hacker?

P. H. C.: Levo um pouco de tudo, quando eu entrei eu tinha certas coisas que

eram mais que as outras, agora deu uma equilibrada entre todas.

N. R. T.: Vou levar mais a criatividade.

E de estar aqui neste ambiente, todas as terças e quartas, como vocês se

sentiram?

P. H. C.: Legal, uma equipe legal, não tenho o que falar mal, se você quer

fazer um coisa, você vai lá no google e procura eu acho que é bem legal está aqui

no meio você interagir com as pessoas e saber a opinião da outra. Porque você

pode fazer de um jeito que você vai conseguir, mas o outro pode fazer de um jeito

bem mais fácil, e para você é até melhor. Estar neste ambiente é bem melhor

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Em todo o projeto o que mais impactou na vida de vocês fora do projeto?

P. H. C.: Tudo né, de terças e quartas eu não fazia nada, as vezes eu andava

de skate, agora eu me dedico mais, lembro do que o Alexandre G. Aguado falava,

você aprende mais fazendo, estou programando mais em casa, impacto nisso para

cada vez evoluir mais. Por acho que com a prática é melhor.

N. R. T.: Antes eu ficava dormindo, agora eu fico procurando mais

conhecimento, sempre tentar aprender mais, evoluir.

Se fosse para vocês fazerem uma pontuação, isso eu não gostei no PJH,

quais seriam os pontos?

N. R. T.: Foi um pouco da programação, porque muita lógica. Pesquisador - É

difícil abstrair? É.

P. H. C.: Pra mim não teve pontos negativos, porque eu gosto de desafio,

quanto mais difícil mais eu vou querer fazer, principalmente o python, o python foi

bem difícil e foi o que eu pesquisei mais em casa, o que eu estudei mais, o que eu

tentei mais fazer, o que e eu fiz mais exercícios. Pesquisador – o que te motiva é o

desafio? Sim. (Pesquisador)– Se fosse para você chegar no PJH e o projeto não te

desafiasse, você ficaria até o final? Eu acho que eu ia parar, eu ficaria muito

entediado, se fosse uma coisa se desafio, uma coisa que eu já conhecesse. Se

fosse para o professor pegar e falar ehh e ensinar a fazer isso, eu acho que ficaria

entediado, porque quando eu cheguei, ele (mediador Alexandre) falou, eu não vou

ensinar direito vocês vão aprender na prática. Eu nunca tinha aberto o computador e

visto como é, eu acho que foi um desafio fazer ligar.

Você partilha dessa opinião N. R. T.? Também.

Vocês vê na ética hacker uma possibilidade de levar isso para a sua vida

cotidiana?

P. H. C.: Totalmente.

N. R. T.: Pelo jeito sim, porque vai ajudar muito a sociedade, principalmente

para mim, no trabalho vai ajudar, ter que montar o computador não sabia e tem

trabalho que vai precisar disso, montar rede sempre vai precisar.

Vocês conseguem ver melhoras em relação a colaboração, um com o outro,

antes do PJH e depois do PJH? O contexto desta pergunta é que os dois

entrevistados já se conheciam antes do PJH e trabalharam juntos durante todo o

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PJH.

P. H. C.: Ahhh todo dia é um novo dia para você aprender, né. Para você

evoluir em cada coisa.

E sobre o que a mídia fala do hacker, vocês partilham?

P. H. C.: É errado o que ela (mídia) fala, a mídia só fala para causar para dar

ibope, mas é errado.

E se fosse para vocês irem até uma mídia, por exemplo, a Globo e falar sobre

o hacker, o que vocês falariam?

P. H. C.: Explicaria o que é na verdade um hacker, principalmente as éticas do

hacker, o que é mais importante na minha opinião. Pesquisador – qual é mais

importante na sua opinião? Todas, mas a ética em si, todas são importantes para o

hacker, para alguém que quer ser hacker, que quer aprender, antes de mexer no

computador você deve saber aquilo (referindo-se aos pilares da ética hacker).

O que você gostaria de melhorar no PJH?

N. R. T.: O lugar, para as pessoas terem mais facilidade para ir no PJH.

P. H. C.: Pra gente é difícil vir, a gente vem de carro, mas vem do outro

lado da cidade, isso porque meu avô se dispões a trazer. Nós procuramos ônibus e

não achamos, mas deu para vir.

E, referente ao curso PJH?

P. H. C.: Pra mim tá tudo bom, não tem o que melhorar.

N. R. T.: Tá bom. As próximas gerações vão gostar.

P. H. C.: Melhorar o tempo, o tempo foi muito curto, é como o Alexandre

falou é mais uma introdução, acho que devia crescer mais o tempo para aprofundar

mais no assunto, porque nos vimos um pouco de tudo e foi muito rápido. Era duas

semanas para um assunto só, até menos. Acho que devia melhorar isso. Às vezes,

você não dava tempo de aprender e você já tinha que esquecer porquê já vinha

outro assunto, que daí você não aprendia o primeiro e o outro assunto ia precisar do

primeiro, aí confundia, tava tudo atrasado e tinha que pegar.

Gente eu quero saber de vocês a visão que vocês têm hoje do hackerismo?

L. V. S. C.: Antigamente eu pensava que hacker, assim nos jornais apareciam,

as pessoas que inventava de invadir site, copiar as coisas, e eu nunca pensei o que

era mesmo um hacker, aí quando o Alexandre chegou, dentro da sala de aula

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falando do PJH (Isso na parte de divulgação), eu comecei a ter uma visão diferente

do que é um hacker. Eu comecei a pensar mais sobre o que aparece na televisão e

conforme o tempo quando os jornais falavam a palavra hacker me dava uma certa

dor no peito é assim que eu vejo. Dá uma certa dor no peito por estarem usando a

palavra errada. Antes do PJH eu não tinha essa noção

D. J. S.: Que bom que eu não sou o único (Referindo-se a dor no peito do

colega). E a mídia utilizar a palavra errada, gera um certo preconceito. Porque

quando você chega para uma pessoa e fala que participa do PJH, a reação das

pessoas e falar: nossa para que fazer isso, vai sair invadindo o site de todo mundo.

Gente não é assim, calma. A gente quer ajudar a sociedade e não ferrar com ela.

Hoje a visão de hacker e de quem ajuda a sociedade e não de quem a quer destruí-

la.

E, essa construção você acha que vai se dá como?

L. V. S. C.: Na minha visão é quando as pessoas começarem a ver o que é

um hacker, saber a diferença de hacker e cracker, e também começar a pensar mais

no outro, além de você mesmo.

E, hoje quais são os pilares da ética hacker que você mais se aproxima?

L. V. S. C.: Os pilares que eu tô, bem tem horas que a gente faz as coisas e

nem repara que fez, né. Bem eu acho que: ação (atividade), colaboração (cuidado

com o outro), abertura, paixão, valor social.

D. J. S.: Criatividade, porque a gente tava tentando usar o que a gente sabe

para fazer o nosso projeto (final do curso) funcionar. Tendo a liberdade para colocar

nossas ideias em prática, e ação principalmente, ação e colaboração, acho que mais

a colaboração porque trabalho em equipe e tá fazendo o projeto funcionar. Mesmo

com algumas coisas erradas que estamos tentando resolver (referindo-se a parte

técnica do projeto).

O que vocês levam do PJH?

D. J. S.: Então, muita coisa boa. Principalmente o trabalho em equipe.

L. V. S. C.: O que hoje deveria acontecer muito, mas certas pessoas

não veem isso. A paixão por você fazer algo, faz com que você tenha cuidado com

aquilo, você queira ter carinho e muitas pessoas não tem.

D. J. S.: Tipo, quando eu estou vendo alguém escrevendo alguma

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coisa errada.

Mas, qual é sua atitude quando você vê essa coisa errada?

D. J. S.: Eu tento corrigir a pessoa, o problema é quando essa pessoa

não aceita essa correção, daí eu nem insisto muito. Porque se eu insistir vai dá

briga.

Observação: Essa fala do D. J. S. sobre a escrita, foi devido ao L. V. S. C. ter

escrito algo errado e ele ter visto isso.

Em resumo o que foi estar aqui no PJH? O que é chegar no final do PJH?

L. V. S. C.: Chegando no final sempre dá aquela ansiedade, tipo quando você

está no final do ano, tem certas horas que parece que o começo do ano passou

rápido e o final que tá demorando, bem. Essa sensação de no final tá sendo tá

sendo muito rápido pra mim e eu estou tentando aproveitar ao máximo.

E, o após PJH, hoje você ocupa duas tardes da semana e depois do projeto?

L. V. S. C.: Eu acho que vou tentar usar tudo que aprendi e procurar

saber mais, durante as tardes, vê se eu consigo fazer algo que ajude o outro.

E sobre o processo de aprendizagem do PJH, que você é atuante/ativo?

Aqui no PJH vocês tem uma voz ativa que é respeitada democraticamente,

como foi no caso da pintura da sala, em família vocês teriam este tipo de espaço?

D. J. S.: Eu não tenho porque eu sou quieto e em casa eu me sinto excluído,

eu não me sinto eu em casa. Pesquisador – no PJH você se sentiu como? D. J. S.:

Aqui, no PJH, eu sou bem mais eu.

L. V. S. C.: Ao contrário do D. J. S., lá em casa tudo é eu, eu tenho que meio

que corro de um lado para outro e não dá tempo para fazer muita coisa e geralmente

quando estou jogando que é no meu tempo livre e eu aproveito, meu pai vive

falando, vive pegando no meu pé que eu só faço aquilo, então as vezes me dá uma

certa raiva e aqui quando eu estou jogando de certa forma todo mundo está jogando,

aqui não tem o L. V. S. C. faça tal coisa, L. V. S. C. faça outra coisa. Aqui no PJH é o

contrário de casa, aqui é: L. V. S. C. faça isso que eu irei te ajudar; L. V. S. C. faça

aquilo que depois eu termino aqui. No PJH não tem aquela pressão em cima de mim

(no sentido de ter punição em casa por não ter feito alguma obrigação), se eu não

fizer ficarei sem tal coisa.

Sobre colaboração, vocês trabalharam junto durante todo o PJH, vocês

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construíram isso aqui?

D. J. S.: Não, nós já trabalhávamos juntos em outros ambientes

educacionais.

Agora depois de apresentados todos o pilares da ética hacker, vocês notaram

alguma diferença do antes para o agora no sentido de colaboração?

L. V. S. C.: Diferença sempre tem o duro é enxergar.

D. J. S.: Acho que a gente sempre foi assim, né L. V. S. C..

Vocês aprenderam entre si no PJH?

L. V. S. C.: Bastante coisa.

D. J. S.: Aprendi muito.

L. V. S. C.: Eu não consigo aprender lendo, eu aprendo melhor com

alguém me ensinando, eu aprendo mais rápido assim.

D. J. S.: Muitas perguntas que fizeram eram dúvidas minha também.

Com isso eu fui aprendendo e coletando o que era importante. Às vezes há uma

zoeira (bagunça) aqui outra ali, mas você descarta e pega o que é importante.

L. V. S. C.: Até porque certas pesquisam falam que o aluno aprende

mais rindo do que só naquela aula seria.

E, se fosse para repetir o PJH?

L. V. S. C.: Não pensava duas vezes.

E, se fosse para repetir melhorando o PJH, qual ponto você melhoraria?

L. V. S. C.: De certa forma minha dedicação, sabendo certas coisas eu

tentaria me esforçaria ainda mais, pegava algumas coisas que eu não peguei

(aprendi) muito bem. E, melhorar minha colaboração com todos.

D. J. S.: Eu faria e melhoraria o meu trabalho em equipe, trabalharia

com todos e me dedicaria ao máximo para aprender o que eu não aprendi logo de

cara.

Agora eu quero que vocês falem o que vocês melhorariam no curso e na

estrutura do curso?

L. V. S. C.: Bom eu acho que nada, do jeito que o Alexandre ensina, ele

não te ensina tudo, ele te dá uma base e te faz querer a saber mais, ele te faz correr

atrás de algo para você fazer. Então ele, meio que não fica igual os professores que

ficam te ensinando, ele quer que você aprenda por vontade própria e pra mim é uma

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forma muito boa de ensinar.

D. J. S.: É como o L. V. S. C. disse, aqui a gente aprende por vontade e

não por obrigação, diferente da escola, aqui a gente se sente a vontade, então não

tem muita coisa pra mudar.

Bom, consegui entender o que agradou no PJH, e o que desagradou?

Teve algum dia que não foi legal?

L. V. S. C.: Acho que nada me desagradou, mesmo quando acabou a

luz (energia elétrica) eu consegui aprender. Foi perfeito.

D. J. S.: Pra mim também nada desagradou.

No PJH quais são os pontos fortes deste projeto?

T. M. S.: União e também a proximidade das pessoas, quanto a gente tá com

alguma dificuldade as pessoas querem saber se a gente tá bem ou não. E, a união

quando a gente trabalha diariamente com isso.

Aí você expande tanto os mediadores quanto aos participantes?

T. M. S.: Sim.

E sua visão de hacker, mudou?

T. M. S.: Sim.

Como que mudou?

T. M. S.: Primeiro eu nem sabia o que era hacker, eu não tinha visão de

hacker, né. Aí depois que eu aprendi o que é ser um, foi mudando bastante, agora

eu sei quais são os princípios, o que eu tenho que fazer, como eu ajudo uma pessoa

como ela precisa, e como eu consigo fazer amizades sem só pensar em mim e

pensar como um hacker.

Você consegue vislumbra isso para fora do PJH?

T. M. S.: Sim, porque quando a gente aprende a gente continua

tentando fazer funcionar.

Hoje sabemos que você estuda no IFSP-Campus Capivari cursando o curso

técnico concomitante em química. Você aplica a ética hacker neste novo curso?

T. M. S.: Sim, porque no curso de química o que a gente faz é bastante

projetos juntos, visualizando o lado de trabalho na área de empresa. E, a gente

sempre vai trabalhar com outras pessoas, então a gente nunca vai poder ser

individual. E, no PJH eu aprendi isso também, então de lá pra cá os dois (cursos)

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foram ensinando o mesmo caminho.

No PJH você consegue perceber sua construção do conhecimento com o

outro?

T. M. S.: Sim, porque existe compartilhamento (partilha) de

ensinamentos, então o que eu aprendi os outros também podem aprender. E, o que

eles aprenderam eu também posso aprender juntos com eles.

Na ética hacker o que mais te chamou atenção?

T. M. S.: Eu acho que a colaboração, porque quando se pensa em

hacker a gente não pensa em uma pessoa que se importa com o outro. Pensa mais

em uma pessoa individualista, então quando a gente percebe que nunca nada vai

funcionar com o outro ajudando, então meio que a gente fica surpreendido por esse

lado.

Então essa construção do hacker ser colaborativo é? (O pesquisador não

terminou a pergunta)

T. M. S.: ...é o que intui a pessoa a ser um hacker.

E, para os próximos passos o que você gostaria para o PJH?

T. M. S.: Que eu seja bolsista (Como aluno do IFSP-Campus Capivari,

existe a oportunidade de a mesma ser bolsista em uma próxima edição). Eu gostaria

que tivesse mais pessoas, pra gente compartilhar mais ensinamentos do que a

gente teve. E, pudesse abranger mais outros lugares, não somente o bairro São

João Batista.

Alguma coisa que te incomodou no PJH?

T. M. S.: As pessoas saindo dele, vendo outra oportunidade e saindo.

Porque eu sei que me esforcei, eu poderia ter saído mas eu decidi ficar. Aí eu penso

que as pessoas, meio que, fizeram descaso ou que elas viram alguma coisa mais

importante, não que elas sejam erradas por isso, mas se eu começo alguma coisa,

penso que os outros também tem que começar e terminar, como eu penso.

E, se fosse para melhorar o PJH?

T. M. S.: Acessibilidade, é muito longe e o horário não dá muito certo.

Porque como é no meio da semana e tem gente que estuda de manhã, meio dia e

como é longe, a gente sai quase uma hora (pós manhã) para vir para cá, fica bem

apertado, daí as vezes não dá muito certo. No caso se fosse mais perto ou se

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tivesse mais acessibilidade, tipo ônibus para o bairro, porque não tem, então seria

mais fácil se deslocar lá do centro para o interior (se referindo como da capital ao

interior do estado) praticamente.

Você se intitularia Hacker?

T. M. S.: Sim, porque eu consegui fazer todos os pilares da ética

hacker.

Sobre aprendizagem que você teve no PJH, o que você leva pra vida?

T. M. S.: Aprendizagem eu vou levar com certeza, mas eu também vou

levar amigos. Eu não só fiz aprendizagem, fiz mais amigos do que eu imaginei que

ia ser e ter. Pesquisador – o relacionamento é importante. T. M. S.: É importante.

Teve algum dia que não foi legal?

T. M. S.: Porque assim, se uma coisa está chata eu tenho que fazer ela

ficar legal, então eu não vou ficar pensando, minimalizando o PJH porque uma coisa

chata aconteceu, se uma coisa ruim acontece pode acontecer coisas boas também,

não é só pensar no lado ruim é pensar o lado bom também. E, as coisas boas

sempre sobressaem em tudo.

No último encontro do PJH realizado no Telecentro - Capivari Digital, no dia 09

de dezembro de 2015, o mediador Prof. Alexandre G. Aguado, conduziu uma

entrevista filmada com os seis participantes que chegaram até ao final do projeto. O

clima desta entrevista, não estruturada, era descontraído e repleto de brincadeiras,

sendo que todos podiam perguntar para o entrevistado do momento. Realizamos a

gravação para podermos mostrar para as edições futuras do PJH, os primeiros

jovens hackers e também para ser objeto de estudo desta pesquisa. Salientamos

que várias colocações repetidas dos participantes não serão levadas em

consideração nesta transcrição.

Alexandre: Deixe um recado para os jovens que terão a oportunidade de fazer

o PJH ano que vêm.

P. H. C.: Para ir atrás que vale a pena, tem que fazer.

Alexandre: O que é o valor social e o que você tem a dizer sobre isso?

T. M. S.: Quando a gente veio para o jovem hacker, não veio uma pessoa de

só um lugar, vieram várias pessoas de vários lugares, isso já cria um valor social,

cultural e ético. A gente sabe que um aprende com o outro. Alexandre: Quanto custa

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o valor social? Custa a nossa vida, o valor social o dinheiro não compra.

Alexandre: O que o PJH é para você?

D. J. S.: Uma oportunidade nova que eu gostei muito, aprendi muito, e

foi algo que eu não esperava de mim. Alexandre: Não esperava, por quê? Porque eu

sempre achei que eu não era capaz de muitas coisas e o PJH me fez perceber que

sou.

L. V. S. C. pergunta para D. J. S.: Qual é o pilar da ética hacker que

você ainda não conseguiu aprender?

D. J. S.: A abertura, porque eu sou muito fechado em mim mesmo, eu

não consigo distribuir todas as minhas ideias, e isso acaba me prejudicando um

pouco.

Alexandre: O PJH no fim, o que você fará da vida?

D. J. S.: Eu estou pensando em fazer faculdade em Analise e

Desenvolvimento de Sistemas, porque eu vi que o projeto vai me ajudar bastante,

mesmo que eu não faça este curso, eu vou tentar fazer um curso na área de

informática para aprofundar tudo que eu aprendi aqui. Alexandre: E, ganhar bastante

dinheiro com a informática? Na verdade eu não pensei em ganhar dinheiro não,

porque a informática é o que eu gosto, então eu faço por gostar e não por dinheiro.

P. H. C.: Se fosse para você escolher um dia do PJH, qual seria?

D. J. S.: Difícil! Bom, seria o dia que eu faltei, porque eu não queria ter

faltado, mas minha falta não teve como evitar.