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Pesquisa em Debate, edição especial, 2009 ISSN 1808-978X O PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA: UMA AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO NO MUNICÍPIO DE BOTUCATU 1 FAMILY HEALTH PROGRAM: A PERFORMANCE EVALUATION IN BOTUCATU. Geraldo Galendi Júnior Mestre em Educação, Administração e Comunicação José Américo Martelli Tristão Doutor em Administração de Empresas pela EAESP-FGV e professor da Universidade São Marcos Regiane Aparecida Cardoso de Paula Doutora em Ciências Aplicadas à Saúde e professora da Universidade São Marcos 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor.

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Pesquisa em Debate, edição especial, 2009 ISSN 1808-978X

O PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA: UMA AVALIAÇÃO DO

DESEMPENHO NO MUNICÍPIO DE BOTUCATU1

FAMILY HEALTH PROGRAM: A PERFORMANCE EVALUATION IN

BOTUCATU.

Geraldo Galendi Júnior

Mestre em Educação, Administração e Comunicação

José Américo Martelli Tristão

Doutor em Administração de Empresas pela EAESP-FGV e professor da Universidade

São Marcos

Regiane Aparecida Cardoso de Paula

Doutora em Ciências Aplicadas à Saúde e professora da Universidade São Marcos

1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor.

Geraldo Galendi Júnior, José Américo Martelli Tristão, Regiane Aparecida Cardoso de Paula

2 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

Resumo

Este artigo descreve a trajetória de construção e desenvolvimento das políticas públicas

de saúde, tendo como principal eixo de análise o Sistema Único de Saúde – SUS e o

Programa de Saúde da Família - PSF como estratégia de descentralização do sistema de

atendimento á saúde e conseqüentemente a expansão e reorientação da atenção básica à

saúde no país. Os dados utilizados no estudo foram coletados a partir de fontes de dados

secundários e entrevistas. A pesquisa bibliográfica foi feita a partir de livros, revistas,

periódicos, teses e dissertações, os quais foram utilizados como fundamentos teóricos

com o objetivo de compreender e descrever as políticas de saúde, situando a gestão

pública municipal em relação ao contexto da reforma do Estado, identificando os

principais elementos da gestão municipal da política de saúde.

Palavras-chave: Programa Saúde da Família, Sistema Único de Saúde, Botucatu.

Abstract

This article describes the path of reconstruction and development of public health

policies, with the main centers on the Health System - SUS, and the Family Health

Program - FHP as a strategy of decentralization of the health care system and therefore

will expansion and reorientation of primary health care in the country. The data used in

the study were collected from secondary data sources and interviews. The literature

search was done from books, magazines, journals, theses and dissertations, which were

used as theoretical foundations in order to understand and describe the policies health,

placing the municipal public administration in relation to reforming the state,

identifying the main elements of the municipal management of health policy.

Keywords: Programa Saúde da Família, Sistema Único de Saúde, Botucatu.

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Introdução

O Programa Saúde da Família teve início no Brasil em junho de 1991, com a

implantação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde. A partir daí, começou-se

a enfocar a família como unidade de ação programática de saúde e não mais o

indivíduo. Todavia, foi a experiência realizada em Niterói, em 1992, com o nome de

Programa Médico da Família, numa parceria com o Ministério da Saúde Pública de

Cuba, que trouxe o esboço do que, atualmente, se discute em termos de Programa de

Saúde da Família, pela incorporação de médicos e enfermeiros ao Programa de Agentes

Comunitários de Saúde.

O Programa de Saúde da Família veio contribuir para: reorientar o modelo de

assistência do município, ampliar a cobertura de áreas desassistidas pelos serviços de

saúde e rearticular a proposta de hierarquização da rede.2

Em 1993, o Ministério da Saúde iniciou a implantação do PSF no Brasil, por

meio da Portaria nº 692. Nela pode-se observar que: O Programa de Saúde da Família –

PSF tem como propósito colaborar decisivamente na organização do SUS e na

municipalização da integralidade e participação da comunidade.

Em 1994, o PSF foi, finalmente, assumido pelo Ministério da Saúde, com o

objetivo, também, de reorientação do modelo assistencial, mediante: Uma nova

dinâmica para a estruturação dos serviços de saúde, bem como para sua relação com a

comunidade e entre os diversos níveis de complexidade assistencial. Assume o

compromisso de prestar assistência universal, integral, equânime, contínua e, acima de

tudo, resolutiva à população, na unidade de saúde e no município, sempre de acordo

com suas necessidades, identificando fatores de riscos aos quais ela está exposta e neles

intervindo de forma apropriada.3 No mesmo ano de implantação, já havia 328 equipes

de PSF por todo o país e com a implantação efetiva da NOB 01/96, cresceu ainda mais

o número de equipes de PSF no país, conforme dados do Ministério da Saúde referido

na figura 1.

2 M.T.M Mascarenhas; A.C. Pires; G.S. Oliveira. Os redesenhos do Estado e das agendas políticas – O

programa de médico da família de Niterói e a construção de um novo modelo de atenção à saude.

Congresso de Saúde Pública. Anais. São Paulo, 2000. v. 2, p. 137-138. 3 BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 1994.

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Figura 1. Evolução histórica da implantação do programa de saúde da família, de acordo

com o número de municípios, Brasil, 1994 a 2005.

Fonte: Ministério da Saúde, 2006.

Em 1997, o PSF passou a ser entendido pelo Ministério da Saúde como:

continuidade ao processo iniciado com as Ações Integradas de Saúde, o qual foi seguido

pelo movimento denominado Reforma Sanitária, amplamente debatido por ocasião da

VII Conferência Nacional de Saúde, cujas repercussões culminaram na redação do

artigo 196 da Constituição de 1988.4 A partir de 1997, o Ministério da Saúde

compreendeu que a reversão do modelo assistencial tradicional curativo só seria

possível por meio da mudança do objeto de atenção, da forma de atuação e da

organização geral dos serviços, reorganizando a prática assistencial em novas bases e

critérios.5

Propunha o Ministério da Saúde que, mesmo rotulado como programa, o PSF

não fosse visto como uma intervenção vertical e paralela às atividades dos serviços de

saúde, mas, sim representando uma estratégia que visava à integração e a organização

das atividades em um território definido, com o propósito de propiciar o enfrentamento

e a resolução dos problemas previamente identificados, com objetivos de:

4 BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 1997. 5 BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 2001.

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Prestar, na unidade de saúde e no domicílio, assistência integral, contínua,

com resolutividade e boa qualidade às necessidades de saúde da população

adscrita;

Intervir sobre os fatores de riscos aos quais a população está exposta;

Humanizar as práticas de saúde mediante estabelecimento de parcerias por

intermédio do desenvolvimento de ações intersetoriais;

Contribuir para a democratização do conhecimento do processo

saúde/doença, da organização dos serviços e da produção social de saúde;

Fazer com que a saúde seja reconhecida como um direito de cidadania e,

portanto, expressão da qualidade de vida;

Estimular a organização da comunidade para o efetivo exercício do controle

social.6

Todavia, em 1998, o Ministério da Saúde, descaracterizou a atuação de cunho

preventivo ao propor que cada equipe do PSF pudesse atender até 4.500 pessoas e, cada

agente comunitário de saúde, cerca de 450 a 750 pessoas.7

O Programa de Saúde da Família em Cuba

Em Cuba, a atual estrutura do sistema de saúde teve início a partir de 1959, com

a Revolução Socialista, pelo surgimento de políticas de saúde e de governo, dispostas a

modificar as condições então existentes e agravadas pela perda de cerca de 3.000

médicos (50% do total) por emigração e pelo fato de que a maioria dos restantes estava

radicada em Havana (em torno de 2.000 médicos) e nas capitais das províncias.8

Em decorrência dessa situação, o nascimento do modelo sanitário cubano se

baseou, inicialmente, na aplicação dos cuidados ao dano à saúde de modo

“hospitalocêntrico”, apesar de este tipo de atendimento ainda muito incipiente. Tal

circunstância, embora muito distante de modelo atual, permitiu o crescimento das

6 BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 2001. 7 BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 1998. 8 F.P. Ares. O Programa Saúde da Família em Cuba. In: Seminário de Experiências internacionais em

saúde da família. Brasília, 1999. Departamento de atenção básica. P. 37-38.

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faculdades de medicina, das unidades hospitalares e das unidades de atenção primária,

com melhoria na qualidade e na quantidade dos recursos humanos disponíveis.9

Em 1973 foram elaborados “Los Programas Básicos de Área de Salud”, que

passaram a ser aplicados em todas as policlínicas e hospitais rurais do país, por

intermédio de um documento nacionalmente conhecido com “Livro Rojo”, contendo

inclusive, um capítulo sobre a organização do trabalho nessas instituições.10

Introduziu-se, nessa época, o atendimento à população por equipes compostas de

um médico e um enfermeiro, alocadas dentro das diversas policlínicas do país, e

executando atividades de promoção de saúde. Cabiam, a cada uma delas, em média,

5.000 pessoas.

A partir de 1975, as policlínicas foram reconfiguradas como unidades sanitárias

e de ensino, passando cada equipe a atender cerca de 2.500 pessoas, dando início à

intensificação das ações preventivas e de promoção à saúde.11

Em janeiro de 1984, surgiu o modelo de medicina familiar, destinado à

integralidade entre a prática, os serviços e o ensino médico, mediante a instalação de 10

equipes do Programa de Medicina Familiar, no bairro Lawton, na cidade de Havana, e o

início da residência de medicina familiar na capital com 19 médicos.

Valendo-se do sucesso dessa experiência, o governo cubano decidiu ampliar o

número de equipes, chegando a 200 no final de 1985, em consultórios modulares de

dois andares, sendo o primeiro destinado às atividades de saúde e o segundo, para

moradia do médico.

O Programa de Medicina Familiar propiciou a mudança administrativa e

organizativa do sistema de saúde cubano, uma vez que o consultório do médico da

família passou a ser considerado como base de entrada e base estrutural do sistema

nacional de saúde de Cuba.

Cada consultório, com a configuração estabelecida de um médico e um

enfermeiro, passou a ter como referência a policlínica, a qual continha os especialistas

(nível de atenção secundária). As diversas policlínicas por sua vez, faziam referência

aos hospitais regionais (nível de atenção terciária) e estes, quando necessário, a um dos

cinco hospitais nacionais (nível de atenção quaternária).

9 F.P.Ares, Op. Cit. P. 37-38 10 CUBA. Ministério de Salud Publica de Cuba. Libro rojo. La Habana, 1992. 11 CUBA. Ministério de Salud Publica de Cuba. Op. Cit.

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Tal transformação permitiu que, em 1997, a mortalidade infantil cubana

estivesse em 7,2 por mil nascidos vivos e que 50% dos óbitos ocorressem acima dos 60

anos de idade, com uma resolutibilidade, nos consultórios de família de 95%. Em 2000,

o Programa de Medicina da Família atingiu a cobertura de 97% da população cubana

(11,4 milhões de pessoas), com cerca de 30.000 equipes.12

Programa de Saúde da Família em Botucatu

A partir de dezembro de 2001, a Secretaria Municipal de Saúde de Botucatu

começou a discutir a proposta de implantação do PSF incluindo a participação de

profissionais de saúde e de lideranças comunitárias. O objetivo inicial do grupo foi

estabelecer áreas prioritárias para a implantação do Programa. Após alguns encontros, o

objetivo foi ampliado para ações de divulgação do PSF junto às populações-alvo e

definição das características necessárias aos agentes comunitários de saúde. Elaborou-se

o perfil dos agentes comunitários de saúde pensando nas atividades que a eles seriam

atribuídas, reduzindo o foco àquelas consideradas “muito importantes” e, por

conseqüência, as habilidades que seriam priorizadas nos critérios de seleção.

No início do ano de 2002 lideranças comunitárias foram convidadas para

discussões sobre o PSF/PACS, ficando definida a importância de sua implantação. Com

o objetivo de esclarecer à comunidade sobre o PSF e debater as possíveis alterações a

partir da implantação do novo modelo assistencial foram realizadas reuniões com as

comunidades de algumas áreas pré-selecionadas. A partir desses encontros, acordou-se a

respeito dos editais e datas para o início do processo seletivo para contratação das

equipes e dos Agentes Comunitários de Saúde.

Com prioridade na agenda de saúde, em maio de 2003 o PSF teve início efetivo

no município de Botucatu, com as contratações e as composições das oito equipes

planejadas na etapa I, em regiões com dificuldade de acesso à rede municipal de saúde.

Trata-se de bairros ainda não assistidos por outras unidades de saúde em virtude de

constituírem áreas de expansão urbana e áreas rurais. (BOTUCATU, 2001) Em 2006,

tendo em vista o Projeto de Expansão do Programa Saúde da Família, o município

amplia suas equipes para um total de oito até o momento (etapa II), conforme a tabela 1.

12 F. P. Ares, Op. Cit. P. 37-38

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Tabela 1. Cobertura populacional de bairros atendidos pelo Programa de Saúde da

Família em relação ao total de habitantes em 2000, Botucatu, 2006. Localidades

Ano de implantação População atendida %

Jardim Aeroporto

Bairro César Neto Rubião Júnior

Vitoriana

Parque Marajoara Jardim Santa Elisa

Jardim Iolanda

Jardim Peabiru I e II

Total

2003

2003 2003

2003

2003 2003

2003

2006

4.666

906 3.244

2.663

4.000 1.544

3.677

7.914

28.614

4,31

0,84 3,00

2,46

3,69 1,43

3,40

7,31

26,44

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde de Botucatu, 2006.

A Gestão do Programa de Saúde da Família em Botucatu

Na arena de estudos da gerência na Atenção Básica/Saúde da Família, o

enfermeiro tem sido amplamente requisitado a ocupar espaços estratégicos para a

implementação de políticas sociais e de saúde e, em especial, coordenar equipe

multiprofissional no âmbito do PSF.

Nas unidades do Programa de Saúde da Família no município de Botucatu, a

coordenação das equipes multiprofissionais, ou seja, equipes de Saúde da Família, de

Saúde Bucal e de Agentes Comunitários de Saúde é atribuída ao profissional de

enfermagem, o qual possui as seguintes atribuições13

:

Realizar assistência integral (promoção e proteção da saúde, prevenção de

agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde) aos

indivíduos e famílias na USF e, quando indicado ou necessário, no domicílio

e/ou nos demais espaços comunitários (escolas, associações, etc.), em todas

as fases do desenvolvimento humano: infância, adolescência, idade adulta e

terceira idade;

Conforme protocolos ou outras normativas técnicas estabelecidas pelo gestor

municipal ou do Distrito Federal, observadas as disposições legais da

13 Ministério da Saúde. Portaria nº 648, 28de março de 2006, edição nº61.

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profissão, realizar consulta de enfermagem, solicitar exames

complementares e prescrever medicações;

Planejar, gerenciar, coordenar e avaliar as ações desenvolvidas pelos ACS;

Supervisionar, coordenar e realizar atividades de educação permanente dos

ACS e da equipe de enfermagem;

Contribuir e participar das atividades de Educação permanente do auxiliar de

enfermagem, ACD (auxiliar de cirurgião dentista) e THD (técnico de higiene

dental);

Participar do gerenciamento dos insumos necessários para o adequado

funcionamento da USF.

Como podemos observar, as atribuições dos enfermeiros que atuam na ESF são

bastante amplas, possibilitando ações muito variadas que se completam na visão da

integralidade, apontando para práticas interdisciplinares, constituindo dessa forma, na

visão do autor, um grande desafio, pois, existem algumas atribuições referentes ao

campo da administração como planejamento, gestão de pessoas, que muitas vezes, não

condiz com a formação do profissional de enfermagem, resultando uma dificuldade de

gestão das unidades de saúde da família, permitindo vários debates, estudos sobre a

necessidade de inserção de um administrador em cada unidade de saúde da família, ou

então, aprimorar a formação do profissional de enfermagem num contexto que

privilegie á área de administração.

Não podemos deixar de enfatizar que a enfermagem, profissão historicamente

marcada pelo compromisso com a saúde pública, tem grande capilaridade social,

estando presente na maioria das ações desenvolvidas na Atenção Básica/Saúde da

Família do Sistema Único de Saúde (SUS).

A Saúde Pública tem se constituído em um importante campo de conhecimento

de diversas áreas do saber: epidemiologia, antropologia, ciências humanas e sociais,

administração, entre outras, para, compreender os determinantes sociais do processo

saúde-doença, bem como compreender as práticas de gestão dos serviços14

.

14 C. A. Spagnol. Da gerência clássica à gerência contemporânea: compreendendo novos conceitos para

subsidiar a prática administrativa da enfermagem. Revista Gaúcha de Enfermagem, v.23, nº1, p.114-131,

2002.

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Indicadores de desempenho

A mudança de foco para resultados da administração pública está refletida não

somente na concepção moderna do orçamento, como também na utilização de

indicadores sociais e de desempenho. A utilização de indicadores auxilia a gestão

pública de saúde no atendimento das demandas da comunidade pela qual é responsável,

tanto na fase de diagnóstico da situação econômica e social quanto na avaliação dos

programas implementados. Considerando, ainda, o processo de redemocratização do

país em que é ressaltada a importância da participação e controle social, os indicadores

têm sido avaliados como uma forma de promover a transparência e a gestão.

No setor público, podem ser observadas diversas iniciativas e experiência de uso

de indicadores sociais. A mais conhecida delas é a da Organização das Nações Unidas –

ONU que, na década de 90, criou o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH,

apresentando uma inovação ao introduzir, em sua concepção, as variáveis longevidade e

educação, além da renda, para comparar o grau de desenvolvimento dos países.

Para o cálculo do IDH são utilizados três índices, aos quais são atribuídos pesos

iguais: longevidade (esperança de vida ao nascer), educação (número médio de anos de

estudo e taxa de analfabetismo) e renda (Produto Interno Bruto – PIB per capita).

O IDH varia entre 0 e 1 e classifica os países segundo três níveis de

desenvolvimento humano: países com baixo desenvolvimento humano (IDH até 0,5);

países com médio desenvolvimento humano (IDH entre 0,5 e 0,8) e países com alto

desenvolvimento humano (IDH acima de 0,8).

Outras experiências surgiram a partir do IDH, sendo o caso do Índice de

Desenvolvimento Municipal – IDHM, Índice de Condições de Vida – ICV e do Índice

Paulista de Responsabilidade Social – IPRS.

O IDHM é semelhante ao IDH, mas não idêntico. Inclui as três dimensões

mencionadas (renda, longevidade e educação, com pesos iguais), mas com algumas

adaptações metodológicas para adequação dos indicadores básicos (por exemplo,

substituição do PIB per capita pela Renda Familiar per capita) com o intuito de ajustar

o índice (concebido para comparar países) à unidade de análise que é o município15

.

15 PNUD et al. Desenvolvimento humano e condições de vida: indicadores brasileiros. Brasília:

PNDU,1998.

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O ICV, por sua vez, utiliza metodologia básica idêntica à do IDH, mas incorpora

um conjunto maior de indicadores que retratam realidades sociais, econômicas e

ambientais, de modo a captar o processo de desenvolvimento humano sustentável de

forma mais abrangente possível. Para isso, ampliou-se o número de indicadores que

compõem as dimensões renda, educação e longevidade e introduziram-se duas novas

dimensões com o objetivo de retratar a situação da infância e da habitação.

O Índice Paulista de Responsabilidade Social – IPRS foi construído pela

Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE em resposta à solicitação

dos líderes e conselheiros do Fórum São Paulo – Século XXI para construção de índices

que permitissem captar continuamente o progresso ou não do desenvolvimento dos

municípios paulistas.

O IPRS tem como objetivo a classificação dos municípios do Estado de São

Paulo segundo a qualidade de vida dos seus habitantes. Para isso, foram consideradas as

três dimensões abrangidas pelo IDH (renda, longevidade e escolaridade), mas

utilizando-se outras variáveis mais condizentes com a realidade municipal. A idéia

inicial era usar indicadores que permitissem a avaliação não somente dos resultados e

esforços empreendidos pelo poder público em prol do desenvolvimento em âmbito

local, mas também a mensuração do grau de participação e controle da sociedade civil

sobre tais ações.

Os municípios do Estado de São Paulo foram classificados em grupos com

características similares de riquezas, longevidade e escolaridade por meio de

agrupamentos, com as seguintes denominações: 1) Municípios-pólo; 2)

economicamente dinâmico e de baixo desenvolvimento social; 3) saudáveis e de baixo

desenvolvimento econômico; 4) de baixo desenvolvimento econômico e em transição

social e 5) de baixo desenvolvimento econômico e social.

A avaliação de programas e projetos sociais é um tema presente. De maneira

implícita ou explícita, os indivíduos sempre realizam algum tipo de avaliação ou

julgamento de valor em relação aos programas sociais. Entretanto, no contexto das

entidades públicas, a avaliação deve ser entendida como um exercício permanente de

comparação entre o planejado e o executado com a finalidade de contribuir para tomada

de decisão em relação aos programas e melhorar planejamento futuros.

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Para quem está trabalhando em programas e/ou serviço de saúde, a avaliação é

um processo técnico-administrativo destinado à tomada de decisão que envolve

momentos de medir, comparar e emitir juízo de valor.16

O cerne da avaliação é a expressão “juízo de valor”. Para medir esse juízo e

preciso buscar parâmetros, como optimum desejável para cada objeto a ser avaliado. A

escolha desse parâmetro pode ficar na subjetividade individual do avaliador ou na

consensualidade dos peritos e entendidos em cada objeto a ser avaliado.17

A avaliação dos projetos sociais tem como objetivo maximizar a eficácia dos

programas na obtenção de seus fins e a eficiência na alocação de recursos para

consecução dos mesmos. Os conceitos utilizados em avaliação foram desenvolvidos

pela economia e estão associados à função de produção que vincula recursos, insumos,

processos e produtos.18

Os indicadores sociais podem ser classificados em três tipologias relevantes para

análise e formulação de políticas sociais segundo as diversas aplicações a que se

destinam: quanto à natureza do ente indicado (indicadores insumo, processo e produto),

quanto à temporalidade do processo analisado (indicadores de estoque e de fluxos ou

perfomance) e quanto aos três aspectos relevantes da avaliação de programas sociais

(eficiência, eficácia e efetividade).19

Na classificação quanto à natureza, os indicadores-insumo correspondem as

medidas associadas à alocação de recursos financeiros, humanos e equipamentos

empregados em um processo ou programa, por exemplo, número de leitos por mil

habitantes. Os indicadores-processo são a tradução em medidas quantitativas dos

esforços operacionais de alocação insumos para a obtenção dos objetivos dos

programas, por exemplo, numero de consultas pediátricas por mil crianças na faixa

etária entre 0 e 14 anos. Os indicadores-produto são medidas indicativas da presença,

ausência, avanços ou retrocessos das políticas sociais formuladas, estando vinculados ás

dimensões empíricas da realidade social, por exemplo, diminuição da mortalidade

16 Oswaldo Y. Tanaka e Cristina Melo. Avaliação de programas de saúde do adolescente: um modo de

fazer. São Paulo: EDUSP – Editora Universidade de São Paulo, 2001. 17 Gilson Carvalho et al. Avaliação de ações e serviços de saúde. O mundo da saúde. São Paulo. V.24.

p.72. fev.2000. 18 Ernesto Cohen e Rolando Franco. A avaliação de projetos sociais. 6ª ed. Petrópolis-RJ. Ed. Vozes,

2004. 19 Paulo de Martino Jannuzzi. Considerações sobre o uso, mau uso e abuso dos indicadores sociais na

formulação e avaliação de políticas públicas municipais. Revista de Administração Pública. Rio de

Janeiro, v. 36, n.1, p.51-72, Jan./Fev. 2002.

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infantil. Em alguns contextos, os indicadores de insumo e processo costumam ser

chamados de indicadores de esforços, e os indicadores de produtos de indicadores de

resultados.

A classificação quanto à temporalidade do processo analisado separa as medidas

referentes a uma dimensão social em um momento específico (indicadores de estoque)

das relativas a mudanças entre dois momentos distintos (indicadores de performance ou

fluxo). Como exemplo do primeiro caso tem-se números de óbitos infantis e do segundo

caso diminuição de óbitos infantis.20

A avaliação de produtos ou resultados analisa a eficácia do sistema em atingir

seus objetivos finais e propiciar, no caso da saúde, melhora das condições de saúde da

clientela. A avaliação de impacto é vista enquanto um desdobramento da avaliação de

resultados, cujo surgimento se dá quando se trabalha com um conceito mais amplo de

saúde do que o de simples ausência de doença, abrangendo aspectos de bem-estar do

indivíduo no desempenho de suas funções e vivência em seu meio ambiente. Nesse

sentido, avaliar saúde é avaliar o conjunto de políticas sociais ao mesmo tempo,

tornando mais complexo o estabelecimento de indicadores para o processo de

avaliação.21

O fluxograma abaixo (Figura 2) sintetiza o referencial teórico-conceitual

concernente ao uso de indicadores sociais na determinação e avaliação de políticas

públicas, sobretudo as setoriais (saúde, educação, assistência e meio ambiente).

20 Jannuzzi. p. 60. 21 Gilson Carvalho, p. 80.

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Figura 2. Fluxograma Teórico-Conceitual de Referência

Adaptado de Januzzi, 200b.

Os programas e ações de governo, neste trabalho, o Programa de Saúde da

Família, são delineados em conformidade com os objetivos estratégicos de médio prazo

definidos pelo Plano Plurianual – PPA. Este plano constitui o ponto de partida para o

cadastro dos programas e ações da proposta orçamentária, de acordo com a indicação do

que será desenvolvido no período. O levantamento das informações concentra-se na

identificação dos atributos que permitem traçar o perfil característico dos projetos,

atividades e operações especiais que os tornam singulares no universo da programação.

Além disso, as informações provenientes das propostas orçamentárias setoriais centram-

1. Diagnóstico da realidade:

Indicadores de produtos sobre

diferentes aspectos sociais.

2. Formulação de soluções:

Indicadores de insumos referentes a

recursos a empregar.

3. Implementação de soluções:

Indicadores de processos referentes

ao uso de recursos alocados

(eficiência e eficácia).

4. Avaliação de resultados:

indicadores de produtos referentes às

mudanças observadas na sociedade

(efetividade).

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se nos aspectos de quantificação física e financeira das ações no exercício de referência,

no grau de importância das demandas, em sua priorização e nos resultados operados.22

Em relação especificamente às medidas que proporcionam a avaliação, foi

estabelecido que cada programa deve conter indicador que quantifica a situação que o

programa tenha por fim modificar, os valores e metas das atividades e projetos

componentes do programa. Definiu-se que a cada atividade e projeto só poderá estar

associado um produto, cuja quantificação pela sua unidade de medida dará origem à

meta.

O indicador do programa é definido como elemento capaz de medir a evolução

do problema, geralmente apresentado como uma relação ou taxa entre as variáveis

relevantes, a qual permite a mensuração dos resultados alcançados com a execução do

programa. Por exemplo, para um programa que tenha como objetivos reduzir a

mortalidade infantil, o indicador correspondente é “Taxa de Mortalidade Infantil”

(relação ente o número de óbitos em menores de um ano e o número de nascidos vivos).

A meta física de atividade ou projeto é a quantidade de produto a ser ofertada

num determinado período, de forma regionalizada quando for o caso. Considera-se

como produto o bem ou serviço que resulta da ação, destinado ao público alvo ou o

investimento para produção deste bem ou serviço. Em situações especiais, expressa a

quantidade de beneficiários atendidos pela ação.23

No Plano de Gestão do PPA 2004-2007, diante da tendência do Estado em

orientar sua atuação para resultados diretos na sociedade, foi colocado como relevante a

necessidade de incorporar a cultura dos controles gerenciais e de avaliação em três

dimensões das ações governamentais:

1. Efetividade: Grau de alcance do objetivo do programa;

2. Eficácia: Capacidade de alcance das metas previstas nas ações do programa;

3. Eficiência: Uso otimizado, com economia e qualidade, dos bens e recursos

empregados na execução das ações.24

22 BRASIL. Ministério do Planejamento e Gestão – MPOG. Manual Técnico de Orçamento – MTO 02.

Brasília-DF, 2003. 23 BRASIL. Ministério do Planejamento e Gestão – MPOG. Gestão pública para um Brasil de todos:

plano de gestão do governo Lula. Brasília, 2003. 24 BRASIL. Ministério do Planejamento e Gestão – MPOG. Gestão pública para um Brasil de todos:

plano de gestão do governo Lula. Brasília, 2003.

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16 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

A figura 3, a seguir, mostra de forma estruturada a inserção do processo de

avaliação na gestão pública:

Figura 3 – Modelo Integrado Plano/Orçamento/Execução/Avaliação.

Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG, 2006.

Como visto na figura 3, o programa é o elemento de integração entre o plano e o

orçamento, sendo assim, as ações governamentais são organizadas em programas, cujo

objetivo é resolver algum problema identificado na sociedade, como no caso, o

Programa de Saúde da Família, a necessidade de expandir o acesso aos serviços de

atenção básica da saúde da população, e consolidar a descentralização, integralidade

com a incorporação efetiva do controle social no Sistema Único de Saúde.

REVISÃO

VISÃO / OBJETIVOS:

IDENTIFICAÇÃO DE

PROBLEMAS

PROGRAMAS,

AÇÕES

EXECUÇÃO

Objetivos e

Indicadores EFETIVIDADE

Produtos e

Metas

Produtos e

Custos

EFICÁCIA

EFICIÊNCIA

AVALIAÇÃO

PLANO,

ORÇAMENTO

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17 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

O impacto do PSF como indicador de processo e resultado no município de

Botucatu

Acredita-se que a atenção básica é uma estratégia eficaz de melhoria dos

resultados de saúde em virtude do aumento do acesso aos serviços básicos, pelo impacto

resultante sob a justiça social e no processo de empoderamento das comunidades-alvo.

Entretanto, para serem efetivos, os sistemas de atenção básica devem ser baseados em

conhecimento científico acumulado e devem utilizar métodos social e culturalmente

aceitos, que possam estar disponíveis para os indivíduos e as famílias nas comunidades

onde elas residem, de modo que os programas estejam alinhados com os princípios

ideológicos, organizativos e de filosofia de atenção à saúde que norteiam esse sistema.25

Para que um modelo de impacto do PSF na saúde da população brasileira

pudesse facilitar as abordagens científico-avaliativas futuras, desenvolveu-se um

modelo que teoriza dois níveis de ação positiva do PSF sob a saúde da população, um

intermediário (de processo) e um final (de resultado), que estariam hierarquicamente

associados, na medida em que, para que se possa alcançar uma mudança nos

indicadores de resultados, o PSF teria que necessariamente exercer algum tipo de

influência sob os indicadores de processo.

Esse modelo sugere que o PSF tenha uma influência positiva na saúde da

população não só de curto prazo, com uma expansão inicial de acesso à atenção básica,

mas também sustentada quando se criam garantias para uma gestão alinhada com o

sistema em o PSF está integrado e uma transferência de recursos, autonomia de gestão e

de poder de decisão para as comunidades, mais especificamente quando são criados

mecanismos diretos e indiretos de participação comunitária efetiva 26

.

O alinhamento e a consolidação com os princípios de descentralização,

integralidade e controle social garantem uma perspectiva de integração do PSF com o

resto do sistema e possibilitam uma atenção à saúde dos indivíduos e famílias,

completa, integrada e responsiva às demandas identificadas localmente. Já o

empoderamento permite o fortalecimento das comunidades no processo de

reconhecimento daquilo que as afeta e na capacidade de ter acesso ao poder e aos

25 Luiz Odorico Monteiro de Andrade. Sistemas Locais de saúde em municípios de pequeno porte: a

experiência de Icapuí. Fortaleza, 1992. 26 Luiz Odorico Monteiro de Andrade.

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18 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

mecanismos que possam transformar suas realidades, assim permitindo a

sustentabilidade de programas e políticas considerados efetivos e geração de estratégias

próprias aos problemas identificados27

.

Figura 4. Modelo lógico proposto para o impacto do PSF sob os indicadores de processo

e resultado de saúde.

Fonte: Bezerra, 2004.

Esse modelo tem por intenção uma explicação teórica dos mecanismos sociais

que moderam a ação do PSF sobre a saúde das comunidades em que as equipes estão

inseridas. A busca dessa modelação teórica é fundamental para nortear as futuras

expedições avaliativas de larga escala, quantitativas e qualitativas, especialmente

aquelas que permitam uma compreensão adicional às informações descritivas

27 N. Goya. Promoção da saúde, poder local e saúde da família. P. 51-56, 2003.

Consolidação dos princípios do SUS:

Descentralização, Integralidade e

Controle Social

Programa de Saúde da

Família:

Aumento de acesso aos

serviços de atenção básica de

saúde da população.

Melhoria de Resultados

Empoderamento da Comunidade:

Educação/Informação a respeito das condições

de saúde;

Participação nos processos decisórios de saúde;

Ação comunitária organizada

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19 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

disponíveis atualmente, que servem mais como ilustração do que mesmo verdade

científica.

A análise dos dados permite observar que embora seja prematura a

implementação do Programa de Saúde da Família no município de Botucatu que se

iniciou em 2003, e não apresentar um impacto absoluto, constatamos uma tímida

mudança de perfil da saúde dos munícipes de Botucatu, que coincide com o período de

implementação do PSF no município. Destacamos para o número de mortalidade

materna que apresentava uma evolução acentuada e após a inserção do PSF diminui

significativamente, não apresentando nenhum óbito materno no ano de 2003 e 2004,

como apresentado no gráfico nº 03, devido conscientização e ações das equipes do PSF

para as gestantes sobre a importância de se realizar consultas de pré-natal, e que

conseqüentemente, apresentou uma redução nos números de óbito infantis. A cobertura

vacinal na população manteve uma estabilidade, demonstrando sinais de que necessita

de acompanhamentos constantes de campanhas e ações de vacinação.

Ressaltamos também para o declínio do número de nascidos vivos que

apresentou uma ligeira queda, provavelmente pelas campanhas de prevenção à gravidez

na adolescência realizadas pelas equipes do PSF. Com relação ao número geral de

óbitos, praticamente o mesmo por todo o período, sugerem o desvio da época pelo

envelhecimento da população, uma vez que morreram menos crianças.

Considerando a história e os resultados obtidos do Programa de Saúde da

Família como estratégia de atenção à saúde do Sistema Único de Saúde, no município

de Botucatu, é possível afirmar que sua continuidade e aperfeiçoamento são essenciais

para que o município caminhe na implementação de sua política de saúde nos níveis

municipais, estaduais e federais, com vistas a conquistar a atenção universal, integral e

equânime à saúde de sua população.

Considerações finais

A presente pesquisa voltou-se para uma abordagem empírico-analítica com a

condução de um Estudo de Caso da gestão da política de saúde do município de

Botucatu. Adotou-se, como referencial teórico de análise, as concepções de reforma do

Geraldo Galendi Júnior, José Américo Martelli Tristão, Regiane Aparecida Cardoso de Paula

20 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

aparelho do Estado, das últimas décadas. Isso porque se entendeu que é relevante tratar

o tema “Inserção Municipal no Sistema Único de Saúde”, considerando os aspectos

contemporâneos da administração pública brasileira, pois a compreensão das realidades

municipais depende do conhecimento das mudanças que estão sendo implementadas, o

que, normalmente se inicia no governo federal.

Os debates acerca da descentralização, um dos argumentos utilizados contra a

municipalização é o de que teria conseqüências negativas, tais como desperdício ou má

utilização de recursos, ou ainda baixa qualidade dos serviços prestados à população

devido à falta de capacitação de gestores dos pequenos municípios.

A proposta de descentralização, num primeiro momento, surgiu como uma

dimensão essencial do processo de redemocratização com a abertura política, após um

longo período de centralização política e fiscal típica dos governos militares. A agenda

democrática têm reivindicados novos direitos sociais e políticos, equidade nos

resultados das políticas públicas, participação social e transparência.

Os municípios pós Constituição Federal de 1988, passaram a possuir maior

autonomia política e administrativa e, ao mesmo tempo, tiveram que assumir novos

encargos na área social, a promoção do desenvolvimento econômico dentro de sua área

de abrangência e o desafio de estabelecer novas formas de relacionamento com a

sociedade civil com o intuito de aprofundar a democracia.

O contexto da redemocratização e reforma do Estado geram impactos diferentes

na condução. Na implantação do Sistema Único de Saúde – SUS, observam-se ações

voltadas para a garantia do acesso integral e universal a todos os cidadãos e promoção

da participação social, e contraditoriamente, políticas de financiamento restritivas

inerentes ao ajuste fiscal.

A descentralização foi adotada como um dos eixos condutores de consolidação

do Sistema Único de Saúde – SUS. A transferência de poder é o elemento central na

caracterização desse processo. A abdicação de poder pelo governo central, por sua vez,

implica na redefinição de atribuições e redistribuição de recurso entre as esferas do

governo.

A decisão política de se reorganizar a rede de assistência à saúde com uma

política que apontasse para a universalização do acesso da população brasileira à

atenção básica e consolidasse o recente processo de descentralização implantado no

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21 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

Sistema Único de Saúde, resultou-se na implementação do Programa de Saúde da

Família – PSF nos mais diversos municípios brasileiros.

A experiência inovadora do Programa de Saúde da Família – PSF no nível

municipal proporcionou inegavelmente a expansão de acesso da população brasileira às

ações de saúde primária no município de Botucatu-SP, à medida que houve um

comprometimento de recursos federais para a expansão da rede assistencial local e uma

autonomia municipal na orientação do programa, entretanto é inegável que o Programa

de Saúde da Família – PSF também impôs novas responsabilidades de gestão e

demanda por profissionais qualificados e comprometidos com a filosofia inovadora

inaugurada por essa política.

Das análises realizadas nota-se que o ideal buscado acerca do trabalho em

equipe, mostra uma convergência ao destacar a dimensão dos problemas e dificuldades

intrínsecas ao trabalho em equipe em relação ao exercício de sua coordenação.

As coordenadoras reforçam as dificuldades encontradas no trabalho do PSF, a

dificuldade da população em entender e aceitar a ideologia da PSF e, também, a

aceitação da própria enfermeira na assistência, especialmente quando fazem consulta de

enfermagem, solicitação de exames complementares e prescrição de medicações

segundo protocolo da Sistematização da Assistência de Enfermagem implantado neste

município.

Para os gestores das esferas federal, municipal e estadual, fica nossa

contribuição no enfrentamento desse desafio que é o trabalho em equipe enquanto fio

condutor do Programa Saúde da Família: proporcionar uma gestão mais participativa,

compartilhada, através da formação de colegiados multiprofissionais representativos

que possam auxiliar os conflitos existentes desde a implantação de uma nova equipe,

seja em substituição ao modelo tradicional, seja uma nova equipe no modelo de

Unidade de Saúde da Família, pois notamos a existência de um sofrimento emocional

inter-equipes que tem prejudicado a implantação e o desenvolvimento do novo modelo

de atenção em saúde no município de Botucatu; utilizar o trabalho de supervisionar

equipes do PSF como um importante dispositivo a seu favor, pois, proporciona se bem

realizado, o discernimento das condições de trabalho, quais as condições em que se tem

trabalhado, proporciona a possibilidade de analisar os conflitos, os sentimentos de

impotência, os mal-entendidos, os ditos e não-ditos, os sentimentos de frustração

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22 Pesquisa em Debate, edição especial, 2009

ISSN 1808-978X

presentes no interior do processo de trabalho, não os tomando mais como naturais ou do

campo dos conflitos pessoais. Neste ponto de vista, pode o gestor intervir de forma

eficaz no processo de trabalho, sendo um agente facilitador para ação e criação de

múltiplas possibilidades de crescimento e amadurecimento do trabalho em equipe

multiprofissional a partir da desconstrução das próprias matrizes sobre as quais também

foi formado, viabilizando a produção de cuidados nesse novo modelo que está sendo

construído.

As modificações ocorridas no sistema de saúde de Botucatu permitiram a

evolução positiva dos indicadores de saúde do município inclusive com melhora dos

indicadores da cobertura vacinal, diminuição dos óbitos maternos e da mortalidade

infantil.

Apesar do desconhecimento da população em torno da ideologia do Programa de

Saúde da Família em Botucatu, gerando muita insegurança pela mudança do modelo de

Unidade Básica de Saúde pela Unidade de Saúde da Família há de se concordar que o

novo modelo de atenção à saúde básica ampliou consideravelmente o acesso às pessoas

de menor poder aquisitivo a terem maior acesso aos serviços de saúde.

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