O professor da rede pública não é despreparado

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O PROFESSOR DA REDE PÚBLICA NÃO É DESPREPARADO Albertino Servulo Professor (SEDUC-CE) De modo geral o conhecimento pop é uma designação que se apresenta como sendo a análise não aprofundada e humorística de temas filosóficos a partir de questões atuais da cultura e do cotidiano. Seus arautos têm a pretensão de dar ênfase ao senso comum diluindo a erudição e a densidade própria do conhecimento filosófico. O filósofo, segundo esta visão distorcida, é alguém que não pensa, não investiga; mais se arrisca, lançando as tradições de modo não sistemático, como se não houvesse problemas entre pensar e ser. E o professor, em geral da rede pública, é considerado um despreparado. Os arautos deste movimento afirmam, sobre o genuflexório, que pretendem somente reconectar o conhecimento que se encontra desplugada do mundo. Todavia todo esse palavrório tem oculto o seu verdadeiro propósito, a saber, replicar o ensino público no Brasil. Estes ‘paladinos’ tem a contraposição anacrônica de considerar o ensino de filosofia no Brasil uma metodologia tradicional e caudatário do pensamento estrangeiro. Esquecem estes ecléticos tagarelas que o termo pop é atribuído ao francês Gilles Deleuze e em especial ao estadunidense Andy Warhol. Nesta abordagem a filosofia é esvaziada de seu objetivo essencial, a busca do conhecimento. Os 'pops' indicam que a filosofia tem que se dedicar a problematizações do cotidiano, porém apresentam temáticas superficiais que nada tem a ver com a realidade que interessa ao todo social. Por exemplo, a discussão da “psiquê dos vendedores de raquete mata mosquito”, ou ainda, “se debruçar sobre a ‘importante’ questão de como deve ser o uso do controle remoto pelos membros de uma família”. Eu prefiro temas que dizem respeito à sociedade como um todo, como por exemplo, a importante questão da degradação ambiental e aqueles que levaram milhões de manifestantes as ruas. Os 'pops' indicam que o problema da filosofia em relação aos temas do cotidiano é a abordagem de superioridade filosófica. Que tagarelice! Como podemos considerar a atitude de instruir, isto é, o professor perante a ignorância do estudante? Ele não deve ensinar o que é correto, pois tal atitude é uma abordagem de superioridade? Quem comete o erro é sempre inferior aquele que faz a coisa correta, ou é o contrário? E o que dizer daqueles que afirmam que o ensino público no Brasil é anacrônico? Creio que abordagem soberba é afirmar através de um meio de comunicação de massa que há levas de professores despreparados e que se valem de pedagogias muito tradicionais para alunos impacientes. Ademais é também uma contradição e uma afronta ao Estado, pois esses professores da rede pública é que estão no cotidiano e não em laboratórios separados da prática de ensino. Além disso, eles conseguiram o direito de lecionar através de concurso realizado pelo Estado, que outorga o direito somente aos mais preparados. Portanto, é silogismo básico, se há levas de professores despreparados e o Estado é quem outorga o direito de lecionar, então os arautos do conhecimento pop estão considerando o Estado despreparado em matéria de educação. Deve-se ter muita cautela, pois, afirmar que os professores da rede pública são despreparados suscita a execração pública destes profissionais. Uma coisa é certa o

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O PROFESSOR DA REDE PÚBLICA NÃO É DESPREPARADO

Albertino Servulo Professor (SEDUC-CE)

De modo geral o conhecimento pop é uma designação que se apresenta como sendo a análise não aprofundada e humorística de temas filosóficos a partir de questões atuais da cultura e do cotidiano. Seus arautos têm a pretensão de dar ênfase ao senso comum diluindo a erudição e a densidade própria do conhecimento filosófico. O filósofo, segundo esta visão distorcida, é alguém que não pensa, não investiga; mais se arrisca, lançando as tradições de modo não sistemático, como se não houvesse problemas entre pensar e ser. E o professor, em geral da rede pública, é considerado um despreparado. Os arautos deste movimento afirmam, sobre o genuflexório, que pretendem somente reconectar o conhecimento que se encontra desplugada do mundo. Todavia todo esse palavrório tem oculto o seu verdadeiro propósito, a saber, replicar o ensino público no Brasil. Estes ‘paladinos’ tem a contraposição anacrônica de considerar o ensino de filosofia no Brasil uma metodologia tradicional e caudatário do pensamento estrangeiro. Esquecem estes ecléticos tagarelas que o termo pop é atribuído ao francês Gilles Deleuze e em especial ao estadunidense Andy Warhol. Nesta abordagem a filosofia é esvaziada de seu objetivo essencial, a busca do conhecimento. Os 'pops' indicam que a filosofia tem que se dedicar a problematizações do cotidiano, porém apresentam temáticas superficiais que nada tem a ver com a realidade que interessa ao todo social. Por exemplo, a discussão da “psiquê dos vendedores de raquete mata mosquito”, ou ainda, “se debruçar sobre a ‘importante’ questão de como deve ser o uso do controle remoto pelos membros de uma família”. Eu prefiro temas que dizem respeito à sociedade como um todo, como por exemplo, a importante questão da degradação ambiental e aqueles que levaram milhões de manifestantes as ruas. Os 'pops' indicam que o problema da filosofia em relação aos temas do cotidiano é a abordagem de superioridade filosófica. Que tagarelice! Como podemos considerar a atitude de instruir, isto é, o professor perante a ignorância do estudante? Ele não deve ensinar o que é correto, pois tal atitude é uma abordagem de superioridade? Quem comete o erro é sempre inferior aquele que faz a coisa correta, ou é o contrário? E o que dizer daqueles que afirmam que o ensino público no Brasil é anacrônico? Creio que abordagem soberba é afirmar através de um meio de comunicação de massa que há levas de professores despreparados e que se valem de pedagogias muito tradicionais para alunos impacientes. Ademais é também uma contradição e uma afronta ao Estado, pois esses professores da rede pública é que estão no cotidiano e não em laboratórios separados da prática de ensino. Além disso, eles conseguiram o direito de lecionar através de concurso realizado pelo Estado, que outorga o direito somente aos mais preparados. Portanto, é silogismo básico, se há levas de professores despreparados e o Estado é quem outorga o direito de lecionar, então os arautos do conhecimento pop estão considerando o Estado despreparado em matéria de educação. Deve-se ter muita cautela, pois, afirmar que os professores da rede pública são despreparados suscita a execração pública destes profissionais. Uma coisa é certa o

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tema da ética não é anacrônico, isto é, o certo é certo sempre, e o errado não é certo nunca.