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O Princípio da Precaução no uso de indicadores de riscos químicos ambientais em saúde do trabalhador

The Principle of Precaution in the use indicators of environmental chemical risks to occupational health

1 Pesquisador-Adjunto do Núcleo de Estudos emSaúde Coletiva, Centro dePesquisa Aggeu Magalhães,Fundação Oswaldo Cruz.2 Pesquisador-Adjunto do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, EscolaNacional de Saúde Pública,Fundação Oswaldo Cruz.

Lia Giraldo da Silva Augusto 1

Carlos Machado de Freitas 2

Abstract Taking the Principle of Precaution asa reference, this article reviews critically the in-tensive use of isolated biological and environ-mental indicators to assess chemical exposition.Vigilance and monitoring occupational chemi-cal risk relies mainly on analytical laboratorytechniques. The need to develop interdiscipli-nary and participative approaches is felt by theauthors, who propose the surpass of traditionalmonitoring health practices, and it’s trend tosubordinate the complex to the simple. Accord-ing to the Principle of Precaution, biological aswell as environmental indicators of exposurecan only achieve their true value when appliedwithin a global view of the system under analy-sis. This demands a comprehensive change ofperspective in our scientific and social practicesof chemical risk’s control and prevention.Key words Health Monitoring; OccupationalExposition; Chemical Risk; Principle of Precau-tion; Interdisciplinarity

Resumo Tendo como referência o Princípio daPrecaução, o presente artigo faz uma aborda-gem crítica do uso isolado de indicadores bioló-gicos e ambientais no monitoramento e vigilân-cia em saúde frente ao risco de exposição ocu-pacional às substâncias químicas. Apontamospara a necessidade da abordagem interdiscipli-nar e participativa. Propomos uma reflexão naperspectiva da superação das tradicionais prá-ticas em saúde do trabalhador, que subordinamo complexo ao simples. Do ponto de vista doprincípio precaucionário, os indicadores bioló-gicos de exposição e efeito, bem como os de con-taminação ambiental, só possuem valor quan-do integrados à globalidade do sistema em es-tudo, obrigando-nos a repensar as práticascientíficas e sociais tradicionais de controle eprevenção de riscos de origem química.Palavras-chave Vigilância em Saúde; Exposi-ção Ocupacional; Risco Químico; Princípio daPrecaução; Interdisciplinaridade

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Quotidianamente defrontamo-nos com notí-cias referentes aos riscos que processos indus-triais ou produtos químicos podem causar anossa saúde e ao meio ambiente. O paradoxoé que, por um lado, se os avanços científicos etecnológicos contribuíram para a redução daprevalência de determinadas doenças associa-das à fome e às pestilências, por outro, eles fi-zeram surgir novos riscos, como os de origemquímica, cujo aumento contribui para o cres-cimento das concentrações dessas substâncias– normalmente inexistentes em ambientes nãoindustrializados –, a elas expondo todos os diasmilhões de pessoas nos seus locais de habita-ção ou trabalho, na cadeia alimentar, no soloem que pisam, no ar que respiram e nas águasque consomem (Freitas e Gomez, 1997; Portoe Freitas, 1997).

Mesmo que consideremos apenas a dimen-são biológica, podemos afirmar que a saúdehumana das populações expostas a estas subs-tâncias químicas está sujeita a uma multipli-cidade de possíveis efeitos, tais como a terato-gênese, a carcinogênese, a mutagênese e danosa órgãos-alvo específicos.

Atualmente, cerca de 70 mil destas subs-tâncias são utilizadas no quotidiano pelo ho-mem, das quais perto de 40 mil, em significa-tivas quantidades comerciais (IPCS and IRPTC,1992). Calcula-se que aproximadamente 6 milsubstâncias apenas tenham sido avaliadas co-mo minimamente adequadas no que diz res-peito aos riscos que oferecem ao homem e aomeio ambiente, ou seja, tenham passado porestimativa que inclua não somente testes detoxicidade aguda, mas também subcrônica ecrônica, testes eco-toxicológicos e estudos epi-demiológicos convenientes após seu empregoem larga escala social. A este quadro, acrescen-te-se a capacidade de inovação tecnológica noramo químico, que não só vem tornando maiscomplexos os sistemas tecnológicos de produ-ção, como vem colocando disponíveis no mer-cado, a cada ano, entre mil e 2 mil novas subs-tâncias (Porto e Freitas, 1997).

Foi em resposta à crise ambiental criadapor tecnologias como a de processos indus-triais e produtos químicos que se desenvolve-ram os métodos científicos de avaliação de ris-cos, refletindo a tendência para prever, plane-jar e alertar quanto aos riscos – em vez de darrespostas ad hoc às crises que elas geraram –,bem como a idéia de que as decisões regula-mentadoras sobre os mesmos seriam politica-mente menos controversas se pudessem ser

tecnicamente mais rigorosas e fundadas emfirme base ‘factual’, como, por exemplo, o de-senvolvimento e o emprego de indicadoresbiológicos de exposição. Essa base deveria serconstruída a partir dos dados disponíveis deexposição às substâncias químicas, além de su-plementados por cálculos, extrapolações teó-ricas e julgamentos ‘objetivos’, oriundos deanálises estatísticas, de modo a obter-se umvalor esperado, o qual seria utilizado para pro-cessos decisórios que envolvessem a utiliza-ção de tecnologias consideradas perigosas emlarga escala social e seu controle (Starr et al.,1976; Otway, 1985; Renn, 1985 e 1992).

Neste contexto é que se desenvolve a ava-liação dos riscos à saúde e ao meio ambiente,a qual, para o caso das substâncias químicas,tem como seus pilares, no campo da saúde, aToxicologia (experimentos em animais de la-boratório) e a Epidemiologia (populações ex-postas aos agentes perigosos comparadas comas não expostas), que procuram identificar equantificar as relações entre os potenciaisagentes de riscos químicos e os danos bioló-gicos observados nos seres vivos, humanos enão-humanos. Mediante modelagens, o agen-te causal é isolado das variáveis intervenien-tes ou confounders. O que há de comum entreessas perspectivas é o fato de reduzirem o ris-co à dimensão única, representando a médiacom base em espaços e tempos estáveis (Renn,1992).

Entretanto, nas últimas décadas, o reco-nhecimento e a aceitação dos inerentes limi-tes do conhecimento científico acerca de pro-blemas ambientais e das incertezas que oacompanham, assim como dos perigos asso-ciados à capacidade de inovação e emprego emlarga escala social de produtos e processos in-dustriais perigosos – que é maior do que a ca-pacidade de avaliar adequadamente seus ris-cos – têm provocado mudanças nas políticasambientais, científicas e tecnológicas em di-reção à filosofia preventiva, fundada em prin-cípio regulatório particular que lhe dá efeitoprático: o Princípio da Precaução (Wynne,1992).

Princípio da Precaução

De acordo com Wynne (1992), o Princípio daPrecaução foi desenvolvido de início na Ale-manha, como meio de justificar a intervençãoregulamentadora para a restrição das descar-

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gas de poluição marinha na ausência de provasconsensuais quanto aos danos ambientais. Es-te princípio tem sido tomado como referên-cia em outras áreas – incluindo as mudançasclimáticas globais – e caracteriza-se por reque-rer que as decisões acerca de processos indus-triais e produtos perigosos sejam deslocadasda ponta final do processo – ou seja, quandouma inovação tecnológica já é empregada emlarga escala social – para a ponta inicial doprocesso – ou seja, quando uma inovação tec-nológica ainda se encontra em teste para ava-liar seu desempenho em termos de eficácia esegurança.

A aplicação do Princípio da Precaução en-volve não só o reconhecimento e a exposiçãodas inerentes incertezas no que diz respeitoaos eventuais efeitos das substâncias químicassobre os seres humanos e o meio ambiente,mas também a admissão de nossa ignorânciaem relação ao problema e à indeterminância.A complexidade e uma série de limites e in-certezas quanto às avaliações técnicas de ris-cos ampliam-se quando levamos em conta queos processos saúde-doença ligados à exposi-ção a substâncias químicas envolvem intera-ções não-linerares de aspectos biológicos, psi-cológicos e sociais que são altamente acopla-dos, possibilitando múltiplas e inesperadas in-terações, as quais se tornam, muitas vezes, in-compreensíveis e invisíveis aos seres humanosa curto prazo. Junto a isto temos ainda queconsiderar o número e a diversidade de espé-cies de seres vivos que, por vezes, apresentamgrande variabilidade genética, além das dife-renças entre as composições químicas de so-los, águas e atmosferas em ambientes específi-cos, que contribuem para aumentar a comple-xidade do problema e as incertezas a seu res-peito. Nesta perspectiva, as limitações do co-nhecimento científico disponível, no que con-cerne aos riscos, são potencialmente mais sé-rias, porque, como observa Wynne (1992), ossistemas em questão, não sendo artefatos tec-nológicos, não podem ser projetados, mani-pulados e reduzidos dentro dos limites do co-nhecimento analítico existente, obrigando-nosa ir além dos conceitos de risco e incertezas.

O conceito de risco faz supor que o com-portamento do sistema em questão é basica-mente bem conhecido e que as chances de di-ferentes resultados podem ser definidas equantificadas por meio de análises estrutura-das de mecanismos e probabilidades. As incer-tezas – que lhe são associadas e estão na sua

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origem – surgem quando conhecemos os im-portantes parâmetros do sistema, porém não adistribuição de probabilidades, existindo mé-todos sofisticados para estimá-las e aos efei-tos de seus resultados. Nas incertezas conhe-cemos o que ainda não conhecemos. A igno-rância, por definição, refere-se ao que escapaao reconhecimento, sendo ela endêmica ao co-nhecimento científico, o qual tem de reduzira estrutura do saber ao que é mais adequadopara os métodos e modelos de análise. Na in-determinância, a cadeia causal de conhecimen-to é aberta não só por conta das interaçõesnão-lineares de aspectos que são altamenteacoplados e não se restringem somente à di-mensão biológica, mas também pela variabi-lidade genética dos seres vivos e pela diversida-de social e ambiental dos contextos em que asexposições químicas ocorrem (Wynne, 1992).

Assim, o reconhecimento e adoção doPrincípio da Precaução não só tem como con-seqüência mudar a responsabilidade das pro-vas científicas para o gerador de riscos, pas-sando-se a exigir que este desenvolva estudoscompletos antes do emprego de uma substân-cia. Deste modo tenta-se evitar que, como namaioria dos casos, venha a constituir mais umexperimento em larga escala social em temporeal. Tem implicações também na própria es-trutura do conhecimento científico adotadonas avaliações de risco, convertendo-se em umdos pontos de referência para mudança para-digmática na ciência e nos processos decisó-rios que envolvem riscos.

Assim, para os casos de substâncias em queseja razoável antecipar que podem ocasionardanos irreversíveis à saúde e ao ambiente e quehá ausência de provas científicas suficientesquanto aos danos potenciais, ao invés de con-tinuar produzindo e manipulando o produtoaté que se prove que ele é danoso, como ocor-re na atualidade, a aplicação do Princípio daPrecaução coloca a necessidade de parar a pro-dução e o manuseio até que se desenvolvamconhecimentos suficientes sobre a inoquida-de do produto.

Indicadores biológicos de riscos químicos ambientais

Os indicadores biológicos de exposições am-bientais aos riscos de origem química nos lo-cais de trabalho, que servem de base ‘factual’para as avaliações de risco e vigilância em saú-

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de, compõem elementos privilegiados para adiscussão do Princípio da Precaução. Ademais,o debate crítico do uso destes indicadores re-veste-se de importância fundamental, uma vezque constituem os parâmetros básicos – os li-mites de exposição ocupacional – da legisla-ção para controle e prevenção dos riscos asso-ciados às substâncias químicas.

Os indicadores biológicos de exposição sãoo resultado da estimativa da inalação, inges-tão ou dermo-absorção de compostos quími-cos presentes no meio ambiente, muitos dosquais suspeitos de propriedades teratogênicas,mutagênicas e carcinógenas para humanos(Howe et al., 1986). A significância de avalia-ções individuais e coletivas desses indicado-res está na possibilidade de identificar aque-les que possam servir ao monitoramento dedanos precoces, principalmente em nível ce-lular. Nesse sentido, a identificação de indica-dores de exposição é importante auxiliar daEpidemiologia em programas de vigilância àsaúde.

Para alguns tipos de efeitos biológicos pos-síveis, pode-se ter um ou mais indicadores deefeito específico. A média da concentração bio-lógica de uma substância química em fluidosorgânicos, por exemplo, pode constituir umbom indicador de exposição aguda e, portan-to, de risco para a saúde. Entretanto, em rela-ção aos efeitos crônicos – por exemplo, o cân-cer – os dados do monitoramento biológicosão absolutamente insuficientes para seremusados como demonstrativos da exposição in-dividual ou coletiva, atual ou pregressa, em es-pecial para dimensionar o risco e garantir asaúde dos grupos vulneráveis (Ashby, 1988).

Além disto, deve-se levar em conta que,tradicionalmente, os indicadores construídosa partir de dados provenientes de monitora-mentos ambiental e biológico de exposição ede efeito são utilizados na avaliação de riscode forma isolada e descontextualizada, sematentar para as inter-relações e interdependên-cias de todos os elementos que compõem o es-paço socioambiental no qual se desenvolve aatividade de trabalho, constituindo isto umadas maiores limitações à estimativa de riscospara a saúde humana.

Considerando-se que as diferenças indivi-duais e as características da exposição deter-minam a necessidade de abordagem integra-da na avaliação de riscos e de efeitos, os indi-cadores biológicos – úteis ao monitoramentode efeitos adversos – deveriam ser emprega-

dos de forma integrada com outros elementosde avaliação da saúde, fazendo-se acompanharde medidas de prevenção e controle. Assim,esses indicadores deveriam ser utilizados ape-nas como garantia de que o ambiente se en-contra sob controle e não como garantia desegurança à saúde, pois os fenômenos bioló-gicos envolvidos nesses processos são comple-xos, de nível superior – isto é, hierarquicamen-te superiores na escala filogenética –, não sepodendo subordiná-los, por exemplo, aos pro-cedimentos elementares da química analítica.Estes, na verdade, são medidas de concentraçãode agentes químicos e seus metabolitos no am-biente ou nos fluidos humanos e pertencem aníveis inferiores na escala da complexidade,pois se reduzem a equações tipo: concentra-ção = massa/volume (Novaes, 1992). Seme-lhantes questões têm sido polêmicas, em es-pecial, as relativas aos chamados limites de ex-posição ocupacional.

A toxicidade crônica de determinadas subs-tâncias – manifestada, por exemplo, pelo cân-cer e hipersensibilidade – nem sempre tem re-lação com outras propriedades tóxicas agudasda mesma substância e que, com freqüência,são muito graves, exigindo também vigilânciapermanente. No entanto, as intoxicações agu-das, por seu dano imediato e clinicamente evi-dentes, têm recebido mais atenção e obtidoconsiderável grau de sucesso dentro da abor-dagem linear de dose-efeito que ganhou legi-timidade.

Já as manifestações crônicas, que são mas-caradas por outros fenômenos e mediados pe-la variável tempo e susceptibilidade indivi-dual, exigem da metodologia de análise ummodelo explicativo não linear. As dificuldadesmetodológicas para aproximação a esses pro-blemas é fato da atualidade que surge pela for-ça que vem assumindo o paradigma da pre-venção nas ações de vigilância em saúde. Tam-bém desenvolve-se maior consciência sanitáriae ecológica dos trabalhadores de nossa épocaem relação aos problemas de exposição ocu-pacional.

Embora haja consenso da comunidadecientífica internacional de que não existem ní-veis seguros de exposição aos cancerígenos,por exemplo, uma vez que, teoricamente, umasimples mutação celular pode levar ao câncerem seres humanos (IARC, 1982), na práticaimpõe-se o modelo dose-efeito da bioquímicapelo tradicional monitoramento da saúde dostrabalhadores.

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Para avaliação dos efeitos crônicos, os da-dos biológicos-individuais e os coletivos de-correntes do monitoramento de exposiçãoocupacional para substâncias químicas deve-riam ser coletados periodicamente em um sis-tema de vigilância epidemiológica. No entan-to, tais informações são entendidas como per-tencentes ao espaço privado das empresas, asquais, em nossa realidade, ocultam-nas ou aelas dificultam o acesso.

Idealmente, um indicador poderia ser aconcentração do composto tóxico nos diver-sos tecidos do organismo. Mas como há res-trições éticas e técnicas para sua realização invivo, utiliza-se a determinação das concentra-ções do agente e de seus metabolitos no san-gue, o que deve refletir sua concentração nosoutros tecidos (Monster, 1988). No entanto,esta limitação à avaliação toxicológica fica nadependência de mais um mediador comple-xo no processo de análise. Sabemos que in-fluências endógenas – algumas não plena-mente conhecidas – são variáveis de difícilcontrole. Aqui, também, o modelo linear nãose aplica com tanto grau de certeza, mas o ra-ciocínio simplista impõe decisões que nãocorrespondem à complexidade dessa realida-de e que, com freqüência, acarretam novosriscos.

Uma perspectiva crítica dos indicadores biológicos

Os chamados indicadores biológicos de expo-sição e de efeito merecem profunda reflexãoconceitual. Sua utilização só é eticamente sus-tentável se contar com o conhecimento daque-les que estiverem potencialmente expostos ese os efeitos monitoráveis forem de alteraçõesprecoces, que permitam o completo reparo dosdanos. Caso contrário, não serão indicadorespara fins de monitoramento ou de vigilânciavoltados à prevenção em saúde, mas, sim, exa-mes complementares – próprios da clínica enão da saúde pública – para diagnóstico daspatologias decorrentes das exposições aosagentes nocivos ambientais (Tarlau, 1990;Waldman, 1991).

Faz-se necessário apresentar a diferençaconceitual entre Vigilância em Saúde e Moni-toramento. Neste sentido, os conceitos pro-postos por Waldman (1991) parecem-nos maispróximos da abordagem sistêmica defendidaneste artigo. Para esse autor, a vigilância em

saúde é constituída de três subsistemas inte-grados:• “Subsistema de informação para ações decontrole”: com atribuições de coleta e análisesistemática de dados relativos a eventos espe-cíficos adversos à saúde e/ou respectivos pro-gramas de controle para indicar as medidasimediatas de controle, com fundamento nasrecomendações técnicas disponíveis, divulgan-do-as amplamente;• “Subsistema de inteligência epidemiológi-ca”: incorpora os conhecimentos científicos etecnológicos disponíveis para análise sistemá-tica de informações, a fim de elaborar reco-mendações e oferecer as bases técnicas paraações de controle, divulgando-as amplamente;• “Subsistema de pesquisa”: tem por atribui-ção desenvolver pesquisas científicas e tecno-lógicas voltadas à solução de problemas prio-ritários e/ou emergentes em saúde pública,identificados nos demais subsistemas.

O termo monitoramento ou ‘monitoriza-ção’ significa procedimentos contínuos demensuração e análise dos indicadores de saú-de e de riscos ambientais integrados ao sistemade vigilância à saúde, com o objetivo de ofe-recer subsídios para aplicação de medidas pre-ventivas, de controle e de avaliação (Waldman,1991). Portanto, para a definição das linhas deação em vigilância da exposição química de-vem ser consideradas as seguintes dificulda-des e restrições: 1) a determinação de um ris-co aceitável, pois, além dos fatores capazes deprecisar um estado patológico relativo tantoao ambiente como à dimensão biológica dohospedeiro (Vesel, 1987) há os que dependemda dimensão política (Vanhoorne, 1988); e 2)a extrapolação de dados entre espécies não po-de proceder por simples equação matemáticarelacionada ao peso corporal e à taxa metabó-lica específica (conceito de coeficiente de se-gurança), conforme alertam Tyler & Balanty-ne (1988).

A Dose Letal (DL-50) exemplifica esta apli-cação linear. Esta tem configurado o principalfundamento da toxicologia a sustentar práticasde monitoramento de exposição aos produtosquímicos e a dar apoio à legislação em vigor,com seus Limites de Tolerância que servemmais aos interesses econômicos da produçãodo que à prevenção em expostos.

Outro fator que não é em geral pondera-do nos estudos de efeito ou no estabelecimen-to de indicadores de exposição é a ação sinér-gica das substâncias presentes no ambiente de

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trabalho (Veerbeek et al., 1986). A Toxicolo-gia tem sido, portanto, uma disciplina cujomodelo linear presta-se a tais interesses. Se-gundo Lieber (1991) “o desenvolvimento da to-xicologia sempre exigiu muito mais que experi-mentação, observação e reconhecimento cientí-fico... ela sempre foi uma ciência associada aopoder e, inevitavelmente, sujeita a interesses emconflito ou a segredos, por vezes de importânciaestratégica.” Neste sentido, Doull & Bruce(1986) concluem no que diz respeito às indús-trias: “o desenvolvimento dessa disciplina estárelacionada às condições sócio-políticas”.

Estas citações têm por objetivo enfatizarque, para a prevenção em situações de expo-sição química, outro fator a ser levado em con-ta, além da dimensão biológica, é a complexi-dade dos fenômenos bio-socioambientais quepossuem mais incertezas do que se suspeita ecuja desconsideração amplia a ignorância con-cernente aos processos saúde-doença na ex-posição às substâncias químicas (Wynne,1992).

Restrições ao uso dos limites de exposição ocupacional

Outra questão ligada aos programas de vigi-lância à saúde diz respeito aos limites de ex-posição, os quais representam papel impor-tante na questão ocupacional, do ponto de vis-ta da efetiva proteção dos trabalhadores sujei-tos ao risco.

Castleman & Ziem (1988) vêm acusando ainfluência empresarial nos valores dos limitesde tolerância – Threshold Limit Values – TLVs– e o uso de procedimentos irregulares e não-científicos pelo Comitê do TLV da AmericanConference of Governmental Industrial Hygie-nists-ACGIH. A esse respeito, denunciaram:

“Comunicações não publicadas de empresasforam importantes no desenvolvimento de TLVspara 104 substâncias. Para 15 delas, a documen-tação do TLV foi baseada somente em tais in-formações... Aos representantes de empresas, lis-tados como consultores do comitê, desde 1970,foi dada a responsabilidade principal no desen-volvimento de TLVs para produtos químicos, depropriedade das companhias que os emprega-vam... Não foram feitas pesquisas bibliográfi-cas sistemáticas na preparação das documenta-ções sobre centenas de produtos químicos...”

Em razão desses reclamos, a ACGIH ado-tou um ‘código de honra’, no qual os membros

do comitê de TLV meramente declaram, me-diante termo de compromisso, que não têmconflitos de interesse (Tarlau, 1990). Essa au-tora propõe com convicção que “dada a limi-tação de nossa ciência, controles podem e devemser colocados no local (de risco), mesmo quan-do as causas não são bem conhecidas ou com-pletamente entendidas e muito menos quanti-ficadas”. Segundo Tarlau, a realidade é que, pa-ra a vasta maioria dos produtos químicos, te-mos poucos ou nenhum dado sobre toxicida-de crônica. Mesmo quando os temos, não sa-bemos ao certo os efeitos químicos na funçãopulmonar, no sistema nervoso, no endócrinoou no imunológico, no reprodutivo ou em ou-tras funções vitais do organismo. Sem tais da-dos, são falsas as afirmações de que conhece-mos quais exposições são permitidas por nãoprejudicarem os trabalhadores.

Nos ambientes de trabalho – em especial,nos das indústrias químicas – existe a práticado relativismo do risco, isto é, ele ser ou nãoaceitável, e decorre de interpretação não maisvinculada aos eventos naturais, mas associa-da aos processos produtivos do interesse eco-nômico (Sharlin, 1989).

O episódio da Portaria no 3, de 10/03/94,editada pelo Ministério do Trabalho, referen-te ao benzeno, exemplifica esse relativismo.Sua publicação deu origem a conflito com se-tores empresariais por revogar o Limite de To-lerância estabelecido pela Portaria 3.214/78(NR-15, ANEXO-13) que permitia exposiçãode 8 ppm (partes por milhão) para jornadasde 48 horas semanais de trabalho.

A nova Portaria foi motivada pelo reco-nhecimento (tardio) de que o benzeno é can-cerígeno e que não se poderia mais admitir li-mite legal de exposição ocupacional a esseagente químico (Augusto,1991; M.T., 1993).A interpretação dada por empresários foi deque se estava definindo ‘risco zero’, que cons-titui situação ideal, sem correspondência coma realidade da vida, mostrando-se, portanto,inexeqüível. No argumento empresarial afir-mou-se que, em virtude de ser impossível eli-minar tal risco, ele só pode ser minimizado(C.N.I., 1994; Freitas & Arcuri, 1996).

No entanto, a referida portaria foi elabo-rada após ampla revisão do tema e estava con-ceitualmente fundamentada. Neste sentido,podemos citar Sass (1988), para quem um ris-co não pode ser aceitável, em se tratando desubstâncias comprovadamente tóxicas, e o ob-jetivo deverá ser sempre o de reduzir a exposi-

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ção a zero. Desta forma, até é possível definir-se limite de tolerância para avaliar as medidasque objetivem o controle do risco e sua elimi-nação, mas ele não deve ser empregado paragarantir segurança à saúde e nem para desca-racterizar os efeitos nocivos decorrentes dacontaminação ambiental nas situações de con-centração abaixo do limite estabelecido.

Os efeitos decorrentes das exposições quí-micas só podem ser definidos, em geral, den-tro das limitações dos instrumentos adotadose sob limitado número de expostos. Neste sen-tido, o conceito de exposição segura não po-de ser considerado positivo, isto é, o valor acei-tável para um grupo não pode ser extrapola-do com certeza para outros (Castleman &Ziem,1988). Semelhante afirmação contrastacom a prática de monitoramento de risco que,com freqüência, busca firmar a segurança pa-ra aquilo que, na verdade, tem alto grau de in-certeza. Esta tem sido fonte de conflito para amaioria das situações que enfrentamos na vi-gilância em saúde dos trabalhadores.

Quando se trata de risco, outra questão dediscórdia é a de sua percepção, a qual tambémé relativa e depende de fatores sociais. Nestesentido, é freqüente o conflito decorrente dachamada evidência científica versus a percep-ção popular. Cada vez mais, a solução para es-tas questões tem sido a negociação entre aspartes interessadas. Parece-nos que esta di-mensão social deva ser incorporada como sa-ber legítimo, sem a contraposição do sabercientífico como o único capaz de dar respos-tas aos problemas enfrentados na exposiçãoquímica. Na perspectiva do Princípio da Pre-caução, é na fronteira destes saberes que es-tão os espaços para a construção da interdis-ciplinaridade e de processos decisórios maisamplos em seu escopo e impacto (Wynne,1992).

Contribuição da epidemiologia na avaliação de exposição química

Os estudos epidemiológicos são consideradosas melhores fontes de informação a respeitodos efeitos de exposição a agentes nocivos:“uma vez que estão baseados nas condições darealidade a que estão expostos os seres huma-nos” (Wunsch, 1992). Nesta orientação, osmarcadores biológicos de exposição e efeitosão auxiliares preciosos da Epidemiologia, quepode assim trabalhar com efeitos mais preco-

ces e permitir real intervenção preventiva(Ashby, 1988).

Para Thomas (1979), a Epidemiologia temlimitações quanto ao estabelecimento do ris-co determinado por novas substâncias ou no-vas condições de trabalho. Isto ocorre não tan-to pelo método, mas porque as informaçõesficam na dependência das empresas e dos pro-fissionais de saúde – muitas vezes, por elascontratados –, sujeitos aos conflitos de inte-resse e à interferência de condições particula-res, observadas nos expostos ou nos locais detrabalho, que restringem sua aplicação. Porsua vez a Organização Mundial da Saúde(OMS, 1977, 1980 e 1981) enfatiza que as ex-posições múltiplas a diversos agentes nocivosno ambiente de trabalho são fatores interve-nientes e restritivos dos estudos epidemioló-gicos, bem como os fatores individuais, como,por exemplo, a suscetibilidade individual econdições de vida. Entende-se como suscep-tibilidades individuais, as variações biológi-cas em virtude de gravidez, variações hormo-nais, diferenças genéticas, sexo, idade, raça,nutrição e doenças prévias ou atuais.

O conceito de risco e as variáveis que ado-tamos para seu estudo são importantes paraas ações de prevenção em situações de expo-sições químicas. Classicamente, define-se ris-co como a probabilidade de ocorrência de umevento. Aqui residem outras dificuldades me-todológicas dos estudos epidemiológicos con-cernentes a especificidades das populações(MacClean, 1979) e que surgem tanto no mo-mento da definição do nível de dano quantoao fato de se lidar com grupos de expostosmuito pequenos.

Mais recentemente, no entanto, métodosespecíficos têm sido desenvolvidos na Epide-miologia para análise de exposições múltiplas(Kundiev & Navakatikyan, 1986). Esperamosque a força explicativa da Epidemiologia sejaampliada, uma vez que entendemos ser ins-trumento fundamental para a compreensãodos processos saúde-doença nas coletividades.Nesse caminho, duas correntes dentro da Epi-demiologia destacam-se no sentido de dar con-ta dessa complexidade: 1) Susser (1985) apre-senta, como ponto de partida de todo o estu-do da causalidade, um método que desembo-ca na necessária e constante diferenciação doobjeto de estudo (ou ação) em variáveis (Du-val, 1995). Consciente da variabilidade dos fe-nômenos biológicos e sociais, Susser (1985)recomenda cinco estratégias para elaborar in-

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ferências causais relativas a eles: “as caracte-rísticas do recorte que se faz da realidade, a de-puração dos modelos causais hipotetizados, aanálise das associações observadas, o uso do cál-culo de probabilidade para estimar sua signifi-cação e os critérios do investigador”. 2) Breilhet al. (1990) ponderam as evidências em saú-de como conjunto integrado de processos e as-sinalam que não se pode assumir cada umadas variáveis e indicadores do estudo ou ava-liação como entidade isolada, senão como pro-cesso concatenado e que forma a unidade glo-bal a ser considerada.

As questões que temos enfrentado na prá-tica são: como fazer a vigilância em saúde dotrabalhador nas situações de exposição aosagentes nocivos nos ambientes de trabalho –em particular, os referentes aos químicos – ecomo a prevenção de danos à saúde poderá serauxiliada pelo monitoramento ambiental ebiológico?

Enfoque sistêmico

Tem crescido a fundamentação filosófica deenfoque ‘holístico’ para fixação de limites deexposição. Zielhuis & Wibowo (1989) listaramdez princípios gerais para essa nova aborda-gem (Quadro 1).

Analisando esse quadro, assinalamos cer-tos princípios que julgamos relevantes para avigilância da exposição química nos proces-sos produtivos: 1) a falácia da crença no ho-mem médio. Na realidade, há necessidade dasconsiderações relativistas das condições so-cioeconômicas, sanitárias, culturais e circuns-tanciais na análise da exposição dos trabalha-dores a produtos químicos; 2) a insuficiênciacientífica para dar conta de todos os elemen-tos desse sistema; 3) a necessidade de partici-pação política; e 4) a superação da racionalida-de instrumental das análises ambientais, naqual as decisões não podem ser restritas aosdados quantitativos.

A proposta desses autores é ressaltar o as-pecto ético na distribuição de benefícios e deriscos, em particular, o direito à informação eà eqüidade.

Entre os aspectos éticos, Lieber (1991) co-menta que “a garantia de estar plenamente in-formado e de participar daquilo que lhe diz res-peito é um direito universal consagrado ao ho-mem. O estabelecimento de limites de exposiçãodeve deixar claras as diferenças entre o que cien-

tificamente é aceitável e o que de fato deve seraceito”.

Entre as questões econômicas que estão napauta do enfoque holístico acerca dos custos,pergunta-se: quem paga a conta do descontro-le ambiental? Em Saúde do Trabalhador, ob-servamos que aqueles que ocupam funçõeshierárquicas inferiores assumem maior risco.E estes se sobrepõem ao fato de possuírem pio-res condições de vida e maior dependência daempresa (menor liberdade). Portanto, quemtem pago a conta são os próprios trabalhado-res e a sociedade em geral, que acabam deman-dando maior investimento público para cor-rigir os danos provocados ao sistema socioam-biental.

As questões ético-econômicas envolvidasno problema do risco ambiental vão aindamais longe. Quando estamos tratando da saú-de da mulher trabalhadora, por exemplo, ca-be questionar: por que se deve aplicar à mulhero mesmo limite de exposição? Iguais direitos aotrabalho não implicam equivalência de riscos àsaúde, principalmente quando estes riscos sãonecessariamente diferentes, em relação à pró-pria diferença biológica. Além disto, ao feto e aolactente cabem os seus próprios direitos, inde-pendentemente daqueles devidos ao pai ou àmãe trabalhadora (Lieber, 1991).

Considerações finais

Existe um custo social e ambiental decorrentedo modelo simplista aqui questionado e cri-ticado e que não é assumido pelos setores on-de os riscos são gerados. Aprofundar a discus-são da eficácia desse modelo de monitoramen-to – limitado aos métodos analíticos quanti-tativos e fetichizados pela parafernália instru-mental – é fundamental para os trabalhado-res expostos, no sentido de definição da polí-tica de prevenção dos danos à saúde e ao meioambiente. Repensar o modelo não depende de“novo tipo de teoria”, como afirma Stengers(1990), mas de “nova visão de mundo”, que seconstrói no compromisso ético com a vida,pois o conhecimento científico, no qual cons-truímos os riscos e os sistemas ambientais, étambém atravessado por julgamentos sociaistácitos sobre o próprio mundo em que vive-mos. Como observa Wynne (1992), a ausên-cia de reconhecimento disto distorce o debatepúblico e o entendimento das próprias rela-ções entre o conhecimento de especialistas,

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Quadro 1Princípios gerais no estabelecimento de limites de exposição ocupacional.

Princípio Comentário

1) Critério ergonômico e higiênico • Minimizar a presença de xenobióticos que não contribuem para a saúde humana.

2) Saúde humana e ecologia • Minimizar a presença de xenobióticos que põem em risco a sobrevivência da espécie .

3) Variações intra e interpessoal • Não existe homem médio; proteger a maioria não temna exposição e resposta significado se não se estabelecem as circunstâncias; o fator

socioeconômico é o preponderante.• O risco assumido deve estar claramente explícito.

4) Saúde e danos à saúde • O padrão estabelecido deve prevenir danos à saúde; a respostahumana aos vários fatores internos é limitada a um número de expressões. Estas nem sempre podem ser automaticamente relacionadas à exposição, sem considerar outros fatores de vida.

• Critérios baseados em saúde ou efeito adverso são relativos notempo e entre as nações, pelas suas condições próprias.

5) Desconforto • Efeito subjetivo também é efeito; o trabalhador é um indivíduoe reage como um todo.

• Prevenir desconforto é manter saúde.

6) Exposição e dose • Exposição externa não pode ser genericamente relacionada à exposição interna (dose interna) pela individualidade nos fatores cinéticos e pelas particularidades da ação dinâmica.

• A média ponderada de concentração pode ser indicador de exposição, mas não de risco à saúde.

• As variações cronobiológicas determinam diferenças cinéticas e dinâmicas.

• Limites de exposição se aplicam ao controle da exposição externa, mas, em geral, não do risco à saúde, se estiverem expressos em média ponderada.

7) Limite biológico • Desestimulariam o controle do ambiente, conflitos éticos de exposição (LBE) na preservação dos direitos individuais.

• LBSs devem ser aplicados como forma complementar e rotineiraestimulados na fixação de novos valores.

8) Extrapolação de animais para • Modelos halométricos como alternativa ao coeficiente fixoos homens tradicional de segurança (100 vezes)

• Considerar aspectos toxicocinéticos e toxicodinâmicos distintos entre espécies.

9) Estimativas, opções, decisões • Balanço de risco e benefícios, mas benefícios a quem:e “valores ao homem” trabalhador, empresa ou sociedade?

• Conflito de diferentes interesses, em diversos países; decisãodos homens para os homens não pode restringir-se a números.

• Chances e decisões devem ser explicitamente discutidas.

10) Medo do risco e risco do medo • Ênfase da mídia, limitação e inadequação do medo,conhecimento, conflito entre a expectativa absoluta e a realidade relativa na ocorrência de doença (o conceito probabilista de risco).

• O risco ao trabalhador pode, em geral, ser pequeno, mas não se aceita viver com risco imposto por outros.

• A informação do risco deve ser clara e profissional.

Zielhius & Wibowo (1989) apud Lieber, 1991.

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bem como a escolha de valores públicos naconstrução dos processos decisórios que re-gulamentam tecnologias ambientalmente sus-tentáveis, limitando o escopo da concepção demudanças sociais e ambientais. Nesta pers-pectiva, a adoção do Princípio da Precauçãopode desempenhar papel importante ao reo-rientar tanto o conhecimento científico co-mo os processos decisórios que envolvem ris-cos químicos.

Parcela significativa dos trabalhadores ex-põe-se, na atividade de trabalho, a uma com-binação de cargas ambientais e sociais. O des-gaste que estas impõem a sua saúde não podeser captado por indicador único, uma vez quefenômenos muito complexos estão envolvidosnesse sistema (Laurell & Noriega, 1989). Des-

ta forma, as questões que envolvem a vigilân-cia em saúde dos trabalhadores – em particu-lar, nas situações de risco de exposição a pro-dutos químicos – exigem abordagem coeren-te com a compreensão da realidade como sis-tema aberto em que todos os seus elementossão interdependentes, interdefiníveis, e cujasrelações não são lineares (Garcia, 1986). A con-tribuição disciplinar seja da Epidemiologia,da Clínica, da Toxicologia ou de qualquer ou-tro âmbito não pode ficar descolada da globa-lidade do problema. As dimensões bio-ético-sociais que, em geral, estão anuladas no mo-delo simplista de monitoramento de risco sãoincorporadas na abordagem sistêmica, resul-tando disto maior eficácia nas ações de pre-venção.

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