O PODER DO PETRÓLEO NA FORMAÇÃO DE TERRITÓRIOS
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Nº 2, janeiro de 2012
O PODER DO PETRÓLEO NA FORMAÇÃO DE TERRITÓRIOS1
Gicélia Mendes2
Resumo
A exploração do petróleo tem sido, há mais de quarenta anos, elemento significativo para a
economia sergipana. Neste artigo apresentamos os territórios identificados na Região
Petrolífera Sergipana (RPS), cuja constituição é motivada pela presença do petróleo em solo
sergipano e pelos desdobramentos sociais, econômicos e políticos desta atividade altamente
significativa no cenário da economia mundial. O estudo foi desenvolvido a partir da análise
e cruzamento das informações disponíveis na Agência Nacional do Petróleo (ANP), Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Tribunal de Contas da União (TCU) e
PETROBRAS, dentre outros setores públicos e privados. Concluímos que a exploração
petrolífera exerce forte influência na formação de territórios que demarcam os poderes dos
atores envolvidos no processo de exploração.
Palavras-chave: Território, petróleo, royalties, Sergipe.
Abstract
The exploitation of oil has been a significant element for the economy of the state of Sergipe
for over forty years. This paper focuses on the identified oil areas (RPS)
of Sergipe and highlights social, economic and political aspects of their development. The
study is based on information available in the National Petroleum Agency (ANP), Brazilian
Institute of Geography and Statistics (IBGE), the Court of Audit (TCU) and
PETROBRAS, among other public and private sectors. We conclude that the oil industry has
a strong influence in the formation of territories as well as in the powers of the
actors involved in the process of exploitation.
Keyword: oil, territory, Sergipe, Brazil, development, royalties
Introdução
Os recursos minerais, em seus aspectos mais gerais, são considerados de grande
importância na configuração do espaço geográfico. A exploração de jazidas de minerais em
determinado ponto da superfície terrestre traz uma série de transformações que interferem
na organização do espaço. A exploração do petróleo é uma das atividades mais impactantes
do ponto de vista das transformações que consegue provocar. A partir da descoberta do
mineral no subsolo de determinada área, são adotados procedimentos para a viabilização da
1 Adaptação do capítulo 4 da tese de doutorado Territórios do Petróleo em Sergipe. 2 Professora Adjunto do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e do Mestrado em
Desenvolvimento e Meio Ambiente –PRODEMA/UFS. Pesquisadora do GEOPLAN/UFS e do LACTA/UFF.
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exploração em escala comercial, o que demanda uma série de alterações naquela área,
acarretando modificações na produção do espaço para além da escala local.
O espaço produzido é aqui compreendido como o lugar onde se manifestam os
conflitos e contradições das relações capitalistas de produção. No dizer de Santos (1991), isso
implica um movimento de produção de objetos geografizados (as formas), que obedece a
uma determinada lógica econômica (determinando-lhes as funções), respeitando os
interesses de reprodução das relações sociais de produção. Em A Natureza do Espaço, Santos
(1996, p. 21) considera que o espaço consiste em um ‚*...+ conjunto indissociável de sistemas
de objetos e sistema de ações‛.
Dentro desta perspectiva, a questão central colocada neste artigo é a análise da
formação de territórios impulsionada e gerada pela repartição do espaço regional em blocos
de jazidas que são concedidos para a exploração do petróleo.
Para responder à formação ou não de territórios dentro do espaço regional delimitado
pelos municípios produtores de petróleo no Estado de Sergipe, a abordagem teórico-
metodológica desenvolvida por Santos (1996), que entende o território a partir do seu uso, foi
o referencial utilizado para analisar a Região Petrolífera Sergipana (RPS) destacando as
verticalidades e horizontalidades. Nessa abordagem, o território ora aparece como norma,
ora normatizado. Neste sentido, procuramos explicar as relações com os diversos atores que
interferem, atuam e vivenciam bem como as formas de interação da população ao longo do
processo de produção dos hidrocarbonetos.
A sucessão de tempos em um mesmo espaço imprime à RPS a configuração de
territórios a partir dos diferentes tempos e das diferentes formas de atuação dos atores sobre
o espaço. Estes tempos simultâneos constroem-se a partir verticalidades e horizontalidades
(SANTOS, 2000; 2002) que caracterizam o uso do espaço a partir de interesses e normas que
resultam em territórios. ‚As verticalidades e as horizontalidades são espaços superpostos e
complementares do espaço geográfico atual‛ (SANTOS, 2000, p. 105).
As ações verticalizadas serão aqui entendidas como aquelas oriundas das normas e
usos impostos aos municípios produtores de petróleo em Sergipe sem que haja participação
dos habitantes das áreas de exploração mineral ou mesmo dos gestores públicos. As
horizontalidades serão tomadas como aquelas ações que, mesmo com a intencionalidade de
domínio que subjaz as atitudes, revelam, de certo modo, a interferência e a participação dos
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atores locais. A delimitação escalar dos aconteceres dentro das horizontalidades permite
identificar ações verticalizadas que funcionam num esquema à forma de rizomas3, dentro da
RPS.
O território pode, assim, ser compreendido como um processo social que ‚*...+
envolve um feixe de inter-relações mediadas por acordos entre distintos agentes que se
interessam por algum(s) tipo(s) de objetos(s) comum a eles, localizado(s) numa porção do
espaço geográfico que se torna território‛ (BRITO, 2004, p. 36)
As verticalidades podem ser entendidas como um espaço de fluxos formado por um
sistema de pontos porque:
O sistema de produção que se serve desse espaço de fluxos é
constituído por redes- um sistema reticular exigente de fluidez e
sequioso de velocidade. São os atores do tempo rápido que
plenamente participam do processo, enquanto os demais tiram todo
proveito da fluidez (SANTOS, 2000, p. 105)
Na RPS os atores dos tempos rápidos são os responsáveis pela imposição das normas
que vêm de cima. São os que mandam. Os atores dos tempos lentos são os que obedecem. Os
macroatores são aqueles que de fora da área determinam as modalidades internas de ação.
Nesse sentido,
É a esses macroatores que, em última análise, cabe direta ou
indiretamente a tarefa de organizar o trabalho de todos os outros, os
quais de uma forma ou de outra dependem da sua regulação.
.........................................................................................................
Tomando em consideração determinada área, o espaço de fluxos tem
o papel de integração com níveis econômicos e espaciais mais
abrangentes. Tal integração, todavia, é vertical, dependente e
alienadora, já que as decisões essenciais concernentes aos processos
locais são estranhas ao lugar e obedecem a motivações distantes.
(SANTOS, 2000, p. 107)
Os territórios são estratos que se sobrepõem e se interconectam direcionados pela
ação dos atores hegemônicos. Estes estratos territoriais remetem ao que Haesbaert (2004)
classifica como multiterritorialidade ou multiplicidade de territórios que se justapõe
convivendo lado a lado.
3 Todo rizoma compreende linhas de segmentaridade segundo as quais ele é estratificado, territorializado,
organizado, significado, atribuído, etc.; mas compreende também linhas de desterritorialização pelas quais ele
foge sem parar. Há ruptura no rizoma cada vez que linhas segmentares explodem numa linha de fuga, mas a
linha de fuga faz parte do rizoma. Estas linhas não param de se remeter uma às outras. (DELEUZE e
GUATTARI, 1995, vol. 2, p. 18)
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Assim,
Multiterritorialidade [...] implica assim a possibilidade de acessar ou
conectar diversos territórios , o que pode se dar tanto através de uma
‚mobilidade concreta‛, no sentido de um deslocamento físico, quanto
‚virtual‛, no sentido de acionar diferentes territorialidades mesmo
sem deslocamento físico, como nas novas experiências espaço-
temporais proporcionadas através do ciberespaço. (HAESBAERT,
2004, p. 343)
Estes múltiplos territórios são variáveis e se formam a partir das relações entre os
agentes sociais que ocorrem no espaço. De acordo com o contexto, com o espaço geográfico
estes territórios variam do concreto até o ciberespaço. No primeiro caso estão os territórios
dos que ainda dependem diretamente do meio físico e, no segundo, os territórios controlados
à distância, por computadores (HAESBAERT, 2004, p. 343).
O petróleo é elemento gerador de territórios concretos e cibernéticos, controlados
presencialmente e à distância justapondo-se ou convivendo lado a lado no cenário das
injunções políticas e econômicas.
Territórios do petróleo em Sergipe
A Região Petrolífera Sergipana (RPS), recorte definido para análise, é formada pelos
municípios produtores de petróleo onshore e offshore: Aracaju, Areia Branca, Barra dos
Coqueiros, Brejo Grande, Capela, Carmópolis, Divina Pastora, General Maynard, Itaporanga
D’Ajuda, Japaratuba, Laranjeiras, Maruim, Nossa Senhora do Socorro, Pacatuba, Pirambu,
Riachuelo, Rosário do Catete, Santo Amaro da Brotas, São Cristóvão e Siriri.
Ao longo dos 40 anos de exploração de petróleo a RPS presenciou a substituição dos
sistemas de objetos tradicionais pelos mais modernos, comandados por um sistema de ações.
A exploração do petróleo trouxe não só novos objetos e novas técnicas, mas também ações
estranhas ao espaço local. Este novo cenário é definido por verticalidades e horizontalidades
de universos escalares diferentes e múltiplos.
Os recortes e definições territoriais são uma abstração empreendida pelo pesquisador
que decide o tamanho do recorte e as tessituras de sua composição. A escala de análise dos
fenômenos é desta maneira, subjetiva do que se conclui que:
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[...] a escala é a escolha de uma forma de dividir o espaço, definindo
uma realidade percebida/concebida, é uma forma de dar-lhe uma
configuração, ma representação, um ponto de vista que modifica a
percepção mesma da natureza deste espaço, e, finalmente, um
conjunto de representações coerentes e lógicas que substituem o
espaço observado. As escalas, portanto, definem modelos espaciais
de totalidades sucessivas e classificadoras e não uma progressão
linear de medidas de aproximação sucessivas (CASTRO, I, 2001, p.
136).
Nesta perspectiva, são identificados cinco territórios na RPS:
1- Territórios petrolíferos: formados pelos campos onde estão localizadas as jazidas;
2- Territórios fronteiriços: compostos pela área de domínio dos limites territoriais
dos municípios sobre os campos de petróleo.
3- Territórios normatizados: definidos a partir das normas da Agência Nacional do
Petróleo que divide os territórios petrolíferos minerais em blocos que são licitados
para a exploração.
4- Territórios empresariais: formados pelas áreas de atuação direta das empresas
exploradoras.
5- Territórios políticos: compostos pelas ações políticas da escala global à local com
poderes de interferência, influência e modificação nos quatro territórios
anteriores. Os territórios petro-polítícos são fluídicos e suas ações estão
entranhadas nos territórios anteriores.
Os Territórios do Petróleo em Sergipe, resultado das múltiplas relações no espaço,
oferecem a possibilidade de compreensão de parte da totalidade configurada pelos diversos
atores e mediada pelas ações políticas.
Territórios Petrolíferos
Os territórios são projeções das relações sociais no espaço que é apenas substrato
material da territorialidade. Estas projeções, em movimentos lentos ou rápidos, formam-se,
dissolvem-se, constituem-se e dissipam-se. ‚Podem ser antes instáveis que estáveis ou,
mesmo, ter existência regular mas apenas periódica, [...] isto apesar de que o substrato
espacial permanece ou pode permanecer o mesmo (SOUZA, 2001, p. 87)
Os territórios petrolíferos em Sergipe circunscrevem os campos de petróleo onshore e
offshore cuja determinação da extensão e potencial energético é definida a partir dos
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resultados das pesquisas e dos investimentos empreendidos e das vontades políticas
direcionadas ao setor. A capacidade das descobertas, o conhecimento do potencial e a
localização destes campos de petróleo vinculam-se não só à capacidade técnica e econômica,
mas também aos direcionamentos estratégicos e políticos do Governo e das empresas. O
controle dos territórios petrolíferos proporciona poder. O poder resulta do controle dos
atores hegemônicos sobre os espaços luminosos da informação e do conhecimento dos
potenciais dos territórios petrolíferos e do controle das técnicas que permitem chegar às
jazidas.
A descoberta de petróleo na bacia Sergipe-Alagoas foi resultado da campanha
exploracionista do Governo brasileiro que, a partir de 1953, estendeu as atividades de
pesquisa pelas bacias sedimentares do país. Estas descobertas demarcam a existência das
jazidas de petróleo, com destaque para as descobertas da bacia sedimentar Sergipe-Alagoas.
Em 2007 os estados de Sergipe e Alagoas produziram juntos, 18.644.620 barris de
petróleo, incluídas os campos onshore e offshore, o que equivaleu a 2,92% da produção
nacional. Excetuando-se o estado do Rio de Janeiro que, individualmente, é responsável por
81,65% da produção total, a produção do estado de Sergipe é representativa no Nordeste e
entre os demais estados produtores de petróleo no Brasil. (Figura 01)
Figura 01: Participação dos Estados na produção nacional de
barris de petróleo, 2007
Fonte de dados: ANP, 2008
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A existência das jazidas é, a priori, natural, mas as interferências políticas subjacentes
à pesquisa direcionam os investimentos para uma ou outra área.
Até o momento, os territórios minerais de petróleo em Sergipe são os campos:
a) Onshore: Carmópolis, Riachuelo, Siririzinho, Castanhal, mato Grosso, Aruari,
Angelim, Aguilhada, Brejo Grande, Atalaia Sul, Ilha Pequena e Tartaruga4;
b) Offshore: Piranema, Guaricema, Tatui, Dourado, Camorim, Caioba, Tartaruga e
Salgo. (Figura 02)
Os territórios petrolíferos estão sob o estrato dos territórios fronteiriços que
demarcam o alcance das compensações financeiras dentro de cada domínio administrativo.
Os territórios fronteiriços têm relativa estabilidade, apesar de estarem sujeitos a alterações
motivadas por interesses econômicos e políticos. Há nos territórios fronteiriços áreas
litigiosas que ainda permanecem no aguardo de definições judiciais.
Territórios petrolíferos
CarmópolisRiachuelo
Siririzinho
Camorim
Caioba
Dourado
Piranema
Guaricema
Salgo
Ilha Pequena
Atalaia Sul
AngelimAruariMato Grosso
Castanhal
Aruari
Aguilhada
Tartaruga
Brejo Grande
Figura 02: Territórios Petrolíferos, 2008
Fonte de dados: ANP, 2008.
Elaboração própria.
4 O campo tartaruga está na interface onhore/offshore.
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Figura ilustrativa sem correspondência com a
localização exata dos campos.
Territórios Fronteiriços
O território fronteiriço é a linha demarcatória das normatizações legais que são
impressas verticalmente nos territórios fronteiriços. Quanto mais extensos os campos, mais
perfurações dentro dos limites territoriais e mais participações governamentais adentram os
cofres públicos.
O estrato dos territórios fronteiriços se superpõe aos campos de petróleo que se
encontram no subsolo. É formado pelos limites territoriais dos municípios. Estes limites
definem os valores a serem recebidos em participações governamentais, pela produção de
cada poço que se encontre dentro da fronteira e também pelas fronteiras estabelecidas pelas
linhas ortogonais e paralelas para aqueles municípios litorâneos que são confrontantes com
campos de petróleo.
Os territórios petrolíferos extrapolam os limites territoriais. Contudo, as normas
estabelecidas para o pagamento das compensações financeiras são efetuadas considerando o
critério de localização das jazidas e da localização dos campos e dos poços de petróleo
(Figura 03).
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N
S
W E
interestadual
intermunicipal
Territórios fronteiriços
Onshore
Offshore
limite municipal
Territórios petrolíferos
Figura 03: Territórios Fronteiriços, 2008
Fonte de dados: ANP, 2008
Elaboração própria
Os poços estão espalhados pelos campos de petróleo. Há municípios nos quais a
perfuração de poços e a produção é relativamente pequena comparando-se aos municípios
que apresentam maior produção. A produção em terra permite que sejam visualizas as ações
mais diretas sobre os territórios fronteiriços (Tabela 01).
TABELA 01
REGIÃO PETROLÍFERA SERGIPANA
TERRITÓRIOS FRONTEIRIÇOS
POÇOS TERRESTRES DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL
2008
Município Quantidade de poços %
Aracaju 02 0,25
Brejo Grande (1) 08 0,99
Carmópolis 276 34,4
Divina Pastora 06 0,73
General Maynard 08 0,99
Japaratuba 338 42,1
Maruim 31 3,86
Pirambu 02 0,25
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Rosário do Catete 81 10,1
Santo Amaro das Brotas 19 2,37
São Cristóvão 07 0,87
Siriri 24 3,00
Total 802 100
Fonte de dados: ANP, 2008.
(1) Poço produtor apenas de gás natural
As informações são referentes aos poços que apresentaram produtividade em outubro de
2008.
A maior concentração de poços está nos municípios de Japaratuba e Carmópolis,
municípios que têm boa parte de seus limites administrativos sobre o Campo de Carmópolis,
maior campo de petróleo terrestre do Brasil. A quantidade de poços existentes em cada
município dão uma idéia do potencial de produção mas não deve ser tomada como único
parâmetro avaliativo porque a produção dos poços varia mensalmente. Além da garantia das
participações governamentais pela existência do poço alguns municípios ainda pleiteiam
junto ao poder judiciário o direito de receber as compensações financeiras pelos demais
critérios que não os de localização da exploração. Dentre estes municípios pode-se listar:
Laranjeiras, Pirambu, Santo Amaro das Brotas, Capela, São Cristóvão, Itaporanga D‛Ajuda,
dentre outros.
Os territórios fronteiriços estendem-se sobre a plataforma continental e determinam o
poder destes municípios sobre os campos offshore, conforme os percentuais de confrontação
que são definidos pelo IBGE (Tabela 02).
TABELA 02
REGIÃO PETROLÍFERA SERGIPANA
PERCENTUAL MÉDIO DE CONFRONTAÇÃO
2008
Campo Contrato de concessão
Município
% Médio de
Confrontação
TATUI 48000.003834/97-72-TTI Aracaju 100,0000
CAIOBA 48000.3836/97-06-CB Aracaju 50,0000
CAIOBA 48000.3836/97-06-CB Barra dos
Coqueiros
50,0000
CAMORIM 48000.003837/97-61-CM Aracaju 50,5675
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CAMORIM 48000.003837/97-61-CM Barra dos
Coqueiros
49,4325
DOURADO 48000.003838/97-23-DO Aracaju 85,8776
DOURADO 48000.003838/97-23-DO Barra dos
Coqueiros
10,7660
DOURADO 48000.003838/97-23-DO Itaporanga
D‛Ajuda
3,3564
GUARICEMA 48000.003839/97-96-GA Aracaju 59,7223
GUARICEMA 48000.003839/97-96-GA Itaporanga
D’Ajuda
40,2777
SALGO 48000.003841/97-38-SG Pacatuba 93,2615
SALGO 48000.003841/97-38-SG Pirambu 6,7385
PIRANEMA 48000.003495/97-89-PRM Estância 49,2426
PIRANEMA 48000.003495/97-89-PRM Itaporanga
D’Ajuda
32,2128
PIRANEMA 48000.003495/97-89-PRM Aracaju 18,5446
Fonte: ANP, 2008
O percentual de confrontação determina os valores correspondentes em participações
governamentais a cada um dos municípios confrontantes. Os percentuais de confrontação
são divulgados mensalmente pela ANP, em razão das possíveis mudanças que podem
ocorrer resultantes das determinações judiciais. Os territórios fronteiriços obedecem à lógica
das perdas e ganhos nas disputas pelo domínio territorial.
Territórios Normatizados
Até a quebra do monopólio do setor de petróleo e gás no Brasil, todas as atividades
relacionadas à exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás eram
exclusivamente efetuadas pela PETROBRAS. A partir da promulgação da Lei n° 9.478/97, a
Lei do Petróleo, passaram a ocorrer rodadas de licitações para exploração desenvolvimento e
produção de petróleo e gás natural. A ANP, órgão regulador, é responsável legal para a
organização da tramitação para a concessão do direito de exercício dessas atividades
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econômicas por parte das empresas que estejam habilitadas para participar da concorrência.
Conforme o Artigo 177 da Constituição Federal, alterado pela Ementa Constitucional n° 9/95,
a União passa a contratar com empresas estatais e privadas a realização das citadas
atividades ligadas ao setor petrolífero (ANP, 2007).
Os contratos são celebrados em nome da União pelo órgão regulador do setor. A
ANP tem a função também de fiscalizar a execução dos contratos celebrados. As licitações
são efetuadas a partir do oferecimento de blocos5 integrantes das bacias sedimentares
brasileiras. O Brasil possui 29 bacias sedimentares com interesse para pesquisa de
hidrocarbonetos, totalizando 7,5 milhões de km2, dos quais aproximadamente 2,5 milhões de
km2 na plataforma continental. Segundo a ANP, menos de 4% dessas áreas estão sob
concessão para atividades de exploração e produção (ANP, 2007).
Todo processo de licitação é feito a partir dos regimentos legais expostos na Lei do
Petróleo e das diretrizes da Resolução n° 8, de agosto de 2003, do Conselho Nacional de
Política Energética (CNPE). Os blocos a serem oferecidos, além das questões legais, estão
submetidos a questões de ordem técnica no tocante à disponibilidade de dados geológicos e
geofísicos sobre a presença e disponibilidade de petróleo e gás natural e também avaliações
ambientais.
Segundo a ANP,
‚*...+ empresas nacionais e estrangeiras devidamente habilitadas
podem participar das licitações para exploração, desenvolvimento e
produção de hidrocarbonetos. Entretanto, para se tornarem
concessionárias devem ser constituídas sob as leis brasileiras, com
sede e administração no País. Os processos licitatórios transcorrem
sob regras claras e ampla transparência‛. (ANP, 2007)
Conforme estabelecido pela ANP, o processo de organização de uma rodada de
licitações inclui as seguintes etapas:
- Definição de blocos;
- Anúncio da Rodada;
- Publicação do pré-edital e da minuta do Contrato de Concessão;
- Realização da Audiência Pública;
5 Os blocos são partes de uma bacia sedimentar onde são desenvolvidas atividades de exploração ou produção de
petróleo e gás natural. (ANP, 2007)
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- Recolhimento das taxas de participação e das garantias de oferta;
- Disponibilização do pacote de dados;- Seminário Técnico-Ambiental;
- Seminário Jurídico-fiscal; - Publicação do Edital e do Contrato de Concessão;
- Abertura do prazo para a habilitação das empresas concorrentes;
- Realização do leilão para apresentação das ofertas;
- Assinatura dos Contratos de Concessão.
Conforme informações disponíveis no sito da ANP6, após a oferta das empresas para
o processo licitatório, o julgamento é feito observando-se três itens:
a) Bônus de Assinatura, valor em dinheiro oferecido pelo bloco;
b) Programa Exploratório Mínimo, em Unidades de Trabalho que serão convertidas em
atividades exploratórias como sísmica 2D e 3D, métodos potenciais e poços
exploratórios;
c) Compromisso com aquisição de bens e serviços na indústria nacional.
Entre 1998 e 2007 ocorreram nove rodadas de licitação. A bacia sedimentar Sergipe-
Alagoas teve blocos ofertados para licitação em seis das nove rodadas que ocorreram: nas
segunda, terceira, quarta, sexta, sétima e oitava rodadas (Quadro 01).
Os blocos são definidos, licitados e explorados sem que haja nenhuma participação
dos municípios. É neste ponto que os Territórios Normatizados são caracterizados pela
imposição de normas sobre os dois territórios anteriormente descritos. Os territórios
normatizados são um terceiro estrato da configuração territorial na RPS. A população dos
municípios integrantes da região é encoberta pelas ações verticalizadas que são impostas aos
municípios que têm suas áreas territoriais repartidas, leiloadas e concedidas para exploração.
Rodada Ano Participação da bacia Sergipe-
Alagoas
Zero 7- Concessões à
Petrobrás
1998 -
6 www.anp.gov.br
7 A chamada Rodada Zero foi o conjunto de negociações realizadas após a promulgação da Lei do Petróleo para
definir a participação da Petrobras após a abertura do mercado de petróleo. Consolidada em agosto de 1998, a
Rodada Zero ratificou os direitos da Petrobras na forma de Contratos de Concessão, conforme a Lei do Petróleo,
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Primeira8 1999 Não
Segunda 2000 Sim
Terceira 2001 Sim
Quarta 2002 Sim
Quinta 2003 Não
Sexta 2004 Sim
Sétima 2005 Sim
Oitava9 2006 Sim
Nona 2007 Não
Quadro 01: Bacia Sergipe-Alagoas- Participação nas rodadas de licitação
Fonte de dados: ANP, 2007
Elaboração própria
Este é um procedimento que ocorre em todas as bacias sedimentares brasileiras
produtoras de petróleo. O mosaico desenhado sobre as áreas de exploração dão a medida
exata do poder das normas sobre as áreas de exploração. O que está expresso
cartograficamente, representa a realidade da superposição das normas sobre os dois
territórios anteriormente descritos. Os territórios normatizados formam o terceiro estrato da
composição da Região Petrolífera Sergipana. (Figura 04)
Os territórios normatizados são colocados para aquisição pelas empresas por meio de
licitações de blocos exploratórios. Até a sexta rodada foram licitados, em todas as bacias
sedimentares, um total de 1.978 blocos dos quais 343 foram concedidos para exploração.
Na bacia sedimentar Sergipe-Alagoas, entre 1998 e 2007, foram concedidos cinqüenta
e sete blocos que foram arrematados por empresas nacionais e estrangeiras em sistema de
consórcio ou individualmente. Os contratos permitem que blocos arrematados sejam
devolvidos desde que sejam observados os critérios acordados.
sobre 115 blocos exploratórios e áreas em desenvolvimento em que a empresa houvesse realizado investimentos.
(ANP,2007) 8 A Primeira Rodada de Licitações foi realizada pela ANP, no Rio de Janeiro, nos dias 15 e 16 de junho de 1999,
com 38 empresas habilitadas. Desde então, as Rodadas vêm sendo promovidas anualmente. 9 Por questões judiciais a oitava rodada que ocorreria em 2006 foi suspensa
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Bacia Sergipe
Setores- sétima rodada
Blocos oferecidos na sétima rodada
Campos em desenvolvimento ou produção
Rodada 2
Rodada 4
Rodada 6
Territórios Normatizados
N
S
W E
0 40 Km
Aracaju
Figura 38 : Bacia Sedimentar de Sergipe- Territórios Normatizados, 2007Fonte: base cartográfica adaptada de ANP, 2007
Figura 04: Bacia Sedimentar Sergipe- Territórios Normatizados, 2007
Fonte: base cartográfica adaptada de ANP,2007
Na sétima rodada foram oferecidos 1.151 blocos com riscos operatórios e em áreas
inativas com acumulações marginais. Destes, 137 blocos foram ofertados na porção Sergipe
da Bacia Sergipe-Alagoas, dos quais apenas 43 foram arrematados.
A entrada de empresas estrangeiras ou nacionais tem ocorrido, com frequência, por
meio de consórcios. A sétima rodada apresentou maior número de empresas que
manifestaram interesse e também o maior número de empresas vencedoras. Os números
podem ser explicados tanto pelo número significativo de blocos ofertados quanto por serem
blocos com riscos exploratórios e também áreas inativas com acumulações marginais. Estas
características proporcionam às empresas a possibilidade de apresentarem valores
relativamente baixos para a concorrência das licitações. Enquanto nas rodadas anteriores o
bônus de assinatura dos blocos ofertados na Bacia Sergipe-alagoas, variou entre R$
105.000,00 e R$ 40.000.000,00, nas áreas com riscos exploratórios e marginais a variação
esteve entre R$ 11.000,00 e R$ 1.900.00,00. Nas rodadas de licitações que foram efetuadas até
2007, 375 empresas manifestaram interesse; 344 efetuaram pagamento de taxa de
participação; 244 foram habilitadas; 207 apresentaram ofertas e 107 venceram as licitações.
(Tabelas 08 e 09)
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TABELA 08
RODADAS DE LICITAÇÕES
N° DE EMPRESAS HABILITADAS E OFERTAS VENCEDORAS
Roda
da 1
Rodada
2
Rodada
3
Rodada
4
Rodada
5
Rodad
a
6
Rodada
7
Blocos
Licitados
27 23 53 54 908 913
Blocos
Concedid
os
12 21 34 21 101 154
Blocos
com risco
exploratór
io
licitados
1134
Blocos
arrematad
os
251
Áreas
inativas
com
acumulaç
ões
marginais
licitadas
17
Áreas
inativas
com
acumulaç
ões
marginais
arrematad
as
16
Bônus de
assinatura10
321.6
56.63
7,00
468.259.
069,00
594.944.
023,00
92.377.9
71,00
27.448.4
93,00
665.196
.028,00
1.085.802.800
,00(A)
3.045.804,00(
B)
Fonte: ANP, 2007
TABELA 09
10
Em virtude dos contratos de concessão ainda estarem sendo assinados, até 8/5/200 foram arrecadados R$
1.085.802.800,00, parte A e 3.045.804,00, parte B
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RODADAS DE LICITAÇÕES
Nº DE EMPRESAS PARTICIPANTES
1998-2007
R
1 R 2 R 3 R 4 R 5 R 6 R 7 Total
Manifestação
de interesse
58 49 46 35 18 30 Parte A - 53
Parte B -113
375
Pagamento de
taxa de
participação
39 48 44 33 14 27 Parte A- 47
Parte B- 92
344
Habilitadas 38 44 42 29 12 24 Parte A- 46
Parte B- 91
244
Apresentaram
ofertas
13 27 26 17 66 21 Parte A- 32
Parte B- 53
207
Vencedoras 11 16 22 14 6 19 Parte A- 30
Parte B- 16
107
Fonte de dados: ANP, 2008
Apesar da abertura do mercado do petróleo no Brasil a participação da PETROBRAS
como empresa exploradora ainda é preponderante na atividade de exploração de petróleo no
país. A bacia Sergipe-Alagoas participou de quatro das oito rodadas realizadas no período
1998/2007. Na segunda rodada de licitações foram arrematados cinco blocos na bacia
Sergipe-Alagoas que ficaram assim distribuídos entre as empresas: 20% com a PETROBRAS,
20% PETROBRAS/consorciada; 20% outras empresas consorciadas; 40% outras empresas
individualmente. Na quarta rodada de licitações 100% das concessões foram feitas a
consórcios entre a PETROBRAS e outras empresas. Na sexta rodada de licitações, 62,5% das
concessões ficaram sob a tutela da PETROBRAS e 37,5% com a PETROBRAS consorciada
com outras empresas. Na sétima rodada a participação de outras empresas de exploração foi
maior, pelas razões colocadas anteriormente. A PETROBRÁS obteve 18,6% das concessões;
16,27% foram concedidos à PETROBRÁS em consórcio com outras empresas; 27,9% a
empresas individualmente e 37,2% a consórcios de outras empresas (Figura 05)
A despeito de a rodada zero ter representado a ratificação da exploração das áreas já
sob o domínio da PETROBRÁS, observa-se que a PETROBRÁS ainda é a empresa que exerce
controle sobre as áreas produtoras de petróleo na bacia Sergipe-Alagoas e em Sergipe,
particularmente.
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4ª Rodada
6ª Rodada
7ª Rodada
EMPRESAS VENCEDORAS
PETROBRAS OUTRAS
EMPRESAS
PETROBRAS/CONSÓRCIO
OUTRAS
EMPRESAS/
CONSÓRCIO
Figura 05: Empresas vencedoras nas rodadas de
licitações dos blocos da Bacia Sedimentar
Sergipe-Alagoas.
Fonte de dados: ANP, 2007
As empresas representam a ação mais efetiva das verticalidades impostas aos
municípios produtores de petróleo, assim como a ação das horizontalidades. Verticalidades e
horizontalidades se entrecruzam no território de atuação das empresas. São as empresas que
agem sobre os territórios petrolíferos extrapolando os territórios fronteiriços. Os territórios
empresariais caminham horizontalmente imprimindo, efetivamente, os comandos
verticalizados dos territórios normativos e criando outros resultantes das relações do
processo de exploração.
Territórios Empresariais
Os territórios empresariais são os que, de fato, entram em contato com os territórios
petrolíferos e com os territórios fronteiriços. No primeiro caso ocorre por meio da exploração
2ª Rodada
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do minério e, no segundo, pelo trânsito e pelo uso e instalação de equipamentos dentro dos
limites territoriais dos municípios. A ação e a interferência dos territórios empresariais dão
uma noção exata do quão impactante são atividades de exploração mineral.
Na exploração ohshore o território das empresas se sobrepõem aos territórios
fronteiriços. A entrada é agressiva e obriga a população a adequar-se por entre os espaços
deixados em meio à rede de dominação da atividade que domina a área dos municípios
produtores através de pontos de exploração ligados por redes físicas, informacionais e de
poder que retiram dos atores locais qualquer possibilidade de participação efetiva. Aos
poucos que dela participam restam os papéis de coadjuvantes.
Os territórios empresariais representam a concretização dos territórios normatizados.
Os resultados das rodadas de licitação demonstram que as empresas buscam o controle de
áreas promissoras e de menor risco. As áreas próximas às já comprovadamente
economicamente viáveis são as mais concorridas (Figura 06).
Os territórios empresariais, enquanto efetivação das verticalidades da cadeia
produtiva do petróleo implanta nos territórios fronteiriços sistemas de objetos técnicos e
implementam ações que servem ao desenvolvimento da atividade produtiva. Ao tempo em
que impõem a convivência dos habitantes com objetos estranhos, obriga-os à neutralidade
diante do sistema de ações. Os objetos técnicos (poços, oleodutos, gasodutos, plataformas,
sondas de perfuração, redes de alta tensão), por mais que estejam instalados nos territórios
fronteiriços há décadas, ainda são objetos estranhos à maior parte das pessoas da RPS, já que
poucos compreendem e participam do complexo funcionamento entre eles.
Ocorre que
Toda criação de objetos responde a condições sociais e técnicas
presentes num dado momento histórico. Sua reprodução também
obedece a condições sociais. Algumas pessoas adotam a novidade em
breve espaço de tempo, enquanto outras não reúnem as condições
para fazê-lo, ou preferem recusá-la, permanecendo com modelos
anteriores (SANTOS, 2002, p. 68).
Os objetos que no passado correspondiam aos interesses e propósitos de cada
sociedade, hoje representam os interesses e racionalidades vindas de fora. Hoje os objetos
estão colocados para favorecerem a fluidez. Estes objetos ganham sentido a partir das ações
e dos comandos que são direcionados a eles.
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Bacia Sergipe
Setores- sétima rodada
Blocos Exploratórios sob Concessão
Campos em desenvolvimento ou produção
Territórios Empresariais
Aracaju
PETROBRÁS
PETROBRÁS/CONSÓRCIO
OUTRAS EMPRESAS
OUTRAS EMPRESAS/CONSÓRCIO
400 Km
N
S
W E
Figura 40: Bacia Sedimentar de Sergipe- Territórios Empresariais, 2007Fonte: base cartográfica adaptada de ANP, 2007
Figura 06: Bacia Sedimentar Sergipe- Territórios Empresariais, 2007
Fonte: base cartográfica adaptada de ANP,2007
A inserção de investimentos de grande porte em uma região/território provoca
mudanças socioespaciais que, em certa medida, passam a normatizar as relações
socioeconômicas oriundas do processo de implantação de tais empreendimentos por meio de
ações, geralmente vindas de fora por que:
As ações são cada vez mais estranhas aos fins próprios do homem e
do lugar. Daí a necessidade de operar uma distinção das ações e a
escala do seu comando. Essa distinção se torna fundamental no
mundo de hoje: muitas das ações que se exercem num lugar são
produtos de necessidades alheias, de funções cuja geração é distante e
das quais apenas a resposta é localizada naquele ponto preciso da
superfície da Terra (SANTOS, 2002, p. 80).
As respostas pontuais das necessidades alheias podem ser demonstradas através de
alguns exemplos das ações PETROBRAS em Carmópolis. São sistemas de objetos técnicos
comandados por sistemas de ações que constroem uma rede complexa de eventos sobre a
qual os atores dos movimentos lentos transitam exaustivamente sem que se chegue a lugar
algum.
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Carmópolis é o município que, ao lado de Japaratuba, comporta a maior quantidade
de poços de petróleo em seus limites políticos. Atualmente há, no município, 274 poços de
petróleo. Em Japaratuba, município vizinho e também acentado sobre o campo Carmópolis o
número de poços de petróleo alcança 338 unidades. Os poços de petróleo se espraiam ao
longo dos territórios fronteiriços oferecendo aos municípios, numa relação
proporcionalmente quantitativa, royalties e impactos. (Figuras 07 a 10).
Figura 07: Vista parcial do Campo
Carmópolis/SE.
Fonte: Google Earth 2008.
Acesso em outubro de 2008.
Figura 09: Vista parcial de poços de
petróleo do Campo Carmópolis/SE
Fonte: Google Earth 2008.
Acesso em outubro de 2008.
Figura 08: Vista parcial de poços de
petróleo do Campo Carmópolis/SE
Fonte: Google Earth 2008.
Acesso em outubro de 2008.
Figura 10: Vista de poços de petróleo na área
urbana do município de Carmópolis/SE
Fonte: Google Earth 2008.
Acesso em outubro de 2008.
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Os objetos técnicos estão espalhados por todo o município. Os cavalos-de-pau são
comuns no território e estão espalhados por toda a área. O território das empresas é invasivo
e excludente porque tira dos habitantes a possibilidade de manutenção de atividades
econômicas anteriores à exploração mineral e impede a inserção na atividade atual (Figura
12).
O gado divide o espaço com os ‚cavalos-de-pau‛, demonstrando que os territórios
empresariais se sobrepõem aos territórios petrolíferos e fronteiriços numa relação de
desigualdade de forças porque aonde chegam o petróleo e todos os objetos técnicos que o
acompanham, desaparecem atividades econômicas tradicionais e não surgem outras
substitutivas que congreguem a mão-de-obra local (Figura 13).
Figura 12: Vista Parcial do Campo
Carmópolis/SE. No primeiro plano
cavalos-de-pau e linhas de transmissão
elétrica. Ao fundo estação coletora.
Figura 13: Gado bovino em área de campo
de produção em Carmópolis
As convergências e as divergências entre os territórios do petróleo são mediadas pela
ação política. O mesmo poder das ações que agem sobre os objetos dando a eles
características peculiares de exclusão deverá ser o mesmo a promover alterações nas relações
de produção nos territórios do petróleo. Do contrário, mantidas as atuais relações entre o
sistema de objetos, os sistemas de ações e as populações dos municípios produtores,
presenciar-se-ão o crescimento da pobreza e da exclusão nos municípios que produzem
riquezas e cultivam desesperanças.
Territórios Políticos
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O território é recorte e conteúdo configurado a partir de interesses políticos.
(CASTRO, I. 2005). A presença do petróleo em solo sergipano promove disputas, conflitos e
negociações, impulsionadas por vontades diversas, que vêm transformando e criando
territórios em diversas escalas. Os Territórios do Petróleo em Sergipe podem ser entendidos
como ‘meio’ e ‘fim’ das relações políticas que se organizam a partir das e para as atividades
petrolíferas.
As relações políticas agrupam normas impostas aos territórios petrolíferos definindo
o poder de ação dos atores hegemônicos e controlando a ação dos demais porque ‚*...+ o
espaço geográfico é intrinsecamente político, ou seja, ele é arena de conflitos e,
conseqüentemente, de normas para a regulação que permite o controle‛ (CASTRO, I., 2005,
p. 139).
Os territórios políticos não possuem configuração espacial definida. Ele é fluídico e
perpassa os demais:
a) Nos territórios petrolíferos quando determinam a aplicação espacial dos
investimentos em pesquisas e para descobertas de jazidas;
b) Nos territórios fronteiriços quando interferem nos limites territoriais dos
municípios, por meio de disputas políticas e judiciais para a permanência ou
alteração de fronteiras;
c) Nos territórios normativos alterando, criando ou revogando normas que serão
implantadas nos demais territórios;
d) Nos territórios empresariais promovendo articulações tanto na escala macro
quanto na micro de decisões que interferem positiva ou negativamente na atuação
das empresas sobre os territórios petrolíferos e fronteiriços.
Há alguns exemplos práticos que demonstram a força de atuação da política, em suas
várias conotações, sobre os territórios do petróleo. Tem se tornado comum na RPS, grupos
políticos movimentarem-se pelos territórios fronteiriços com pretensões eleitorais. Os grupos
políticos externos aos municípios instalam-se e se fixam, geralmente, utilizando-se das
fragilidades e necessidades da população. Como as carências sociais dos municípios
petrolíferos são significativas e carecem de resolução urgente, a entrada e permanência dos
que chegam com promessas de emprego, saúde ou assistência social não é dificultada. O
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grande atrativo para a instalação dessas ‚novas‛ lideranças políticas parecem ser as rendas
petrolíferas, uma vez que, não se verifica a disputa pela gerência de prefeituras com
potencial econômico baixo. Nas últimas eleições municipais estes grupos políticos
concorreram ao pleito e alguns saíram vencedores (Figura 14).
N
S
W E
Grupos políticos
A
B
C
D400 Km
Figura 14: RPS- Movimento de grupos políticos, 2008
Estas disputas retratam o grau de aleijamento da estrutura social dos municípios
petrolíferos. Estivessem os atores locais munidos dos requisitos para a condução dos seus
próprios destinos a situação seria inversa. Estas disputas poderiam representar,
parafraseando Castro, I. (2005), uma expressão concreta da territorialidade dos conflitos que
existem em todas as sociedades complexas e desiguais. Elas seriam resultado da disputa
política por interesses vinculados aos territórios em que os atores sociais habitam, trabalham,
produzem riqueza e lutam para se apropriarem de parte dela. Contudo, a realidade posta aos
municípios petrolíferos de Sergipe é a de um povo carente de participação tanto na
construção da estrutura econômica de seus municípios quanto da decisão de seus próprios
destinos. Aos estranhos é dado o poder de controle e dominação sobre os homens e sobre as
coisas. Raffestin (1993) refere-se a três trunfos ao se referir ao domínio sobre os homens e
sobre as coisas: a população, o território e os recursos. A população é colocada em primeiro
lugar porque ‚*...+ nela residem as capacidades virtuais de transformação; ela constitui
elemento dinâmico de onde procede a ação‛ (RAFFESTIN, 1993, p. 58). Raffestin (1993)
prossegue afirmando que o território é importante porque é nele onde o poder é exercido e
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onde as relações ocorrem mas que sem a população é apenas potencialidade. Os recursos,
segundo ele, determinam o alcance da ação. São eles que direcionam os caminhos a seguir as
conexões a realizar.
Tudo isso para dizer que os Territórios do Petróleo em Sergipe estão imbricados de
pessoas e que devem ser tomadas como trunfos porque o ‚*...+ território é o espaço político
por excelência, o campo da ação dos trunfos‛. (RAFFESTIN, 1993, p.60)
Isso porque,
Quando Bulding fala da urgente necessidade de uma ‚economia
heróica‛, baseada numa ‚ética heróica‛, poder-se-ia acrescentar que
se torna igualmente urgente encontrar homens de boa fé para uma
‚geografia heróica‛ baseada numa ‚ética heróica‛. Isto significa que
se deve estar preocupado, com o espaço social, o espaço de todos, e
não com espaço de empresas, o espaço de alguns, erroneamente
chamando de ‚espaço econômico‛ (SANTOS, 2003, p. 34).
As mudanças estruturais que as populações dos municípios produtores de petróleo
em Sergipe reclamam dependem de mudanças no quadro político, aqui entendido de forma
ampla já que é a partir do político que os encontros e desencontros entre os territórios
acontecem.
Considerações finais
As verticalidades e horizontalidades presentes nos territórios dão a eles um caráter
particular em razão da associação e formas diferenciadas apresentadas por estes processos.
Estes arranjos e relações permitem desnudar a relação de elementos diversos que agem
individualmente ou em grupo, numa trama de relações por onde passam informação e poder
ignorados pela maior parte dos atores envolvidos no processo de formação dos territórios.
A exploração do petróleo é uma atividade que imprime às áreas de exploração
relações bastante diferenciadas do ponto de vista não só da logística, mas, sobretudo, dos
comandos que são direcionados aos setores da cadeia de produção. Na Região Petrolífera
Sergipana tais relações resultaram na formação de territórios que são originados a partir das
horizontalidades e verticalidades representadas pelas normas, pelos objetos técnicos, pelo
recurso e pela política. Os cinco Territórios do Petróleo identificados na RPS atestam o grau
de pressão existente na área. Os territórios se superpõem obedecendo a uma lógica movida
por relações de poder que obedecem a normas geralmente vindas de fora e de cima.
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