O perfil conceitual e a compreensão de conceitos físicos

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O Perfil Conceitual e a Compreensão de Conceitos Físicos Renato P. dos Santos

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Neste trabalho, discuto o modelo de Perfil Conceitual, sua utilidade para o ensino de Física, sua relação com a interpretação das concepções alternativas e com a psicogênese da Física de Piaget & Garcia.

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O Perfil Conceitual e a Compreensão de Conceitos Físicos

Renato P. dos Santos

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Conceitos Físicos

massa, força, luz, eletricidade, etc.

apesar de quotidianos, não são simples

têm longa evolução histórica, ontológica e epistemológica

identificadas muitas concepções alternativas associadas a cada um deles

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Mudança conceitual?

concepções espontâneas não ‘evoluem’ para o conhecimento científico através da ‘mudança conceitual’ de Posner et al. (1982)

são estáveis, resistem à mudança e coexistem com outras representações, inclusive com as do mundo científico

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O Perfil ConceitualMortimer (1995): a partir do Perfil Epistemológico de Bachelard (1940)útil para compreender a coexistência simultânea dessas diferentes visões da realidade num mesmo indivíduoinstrumento para acompanhar a evolução conceitual dos alunos em sala de aulaa consciência por parte do estudante do seu próprio perfil conceitual é relevante para que possa utilizar as suas diferentes visões de realidade nos contextos adequados

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O Perfil Epistemológico (Bachelard)

uma única doutrina filosófica não é suficiente conceito é sujeito a processo de evolução

filosófica abcissas: as diversas filosofias:

realismo ingênuo empirismo claro e positivista racionalismo newtoniano ou kantiano racionalismo completo racionalismo dialético)

ordenadas (alturas das zonas do perfil): importância relativa ou freqüência de utilização efetiva da noção

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O Perfil Epistemológico de Massa de Bachelard

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ComparaçãoSemelhanças: as pessoas têm formas diferentes de ver e

representar a realidade à sua volta as zonas contém categorias de análise com

poder explanatório crescente

Diferença fundamental: para além das características epistemológicas, as

zonas do perfil conceitual distinguem-se também por características ontológicas,

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Perfis já construídos

Química: reações químicas, átomo, estados físicos dos materiais, calor, espontaneidade, transformação e energiaBioquímica: energiaMatemática: funçãoFísica: periodicidade, radiação, massa e força

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Metodologia

estudo da evolução histórica e epistemológica do conceito

levantamento bibliográfico das concepções alternativas

reinterpretação à luz da noção de perfil

identificação das categorias do perfil

pesquisa prática: validação do perfil

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Formação histórica dos conceitos físicos

Os conceitos do pensamento pré-científico comum são, eles mesmos, o resultado do desmembramento arbitrário do coerente e contínuo substrato da experiência sensória. A Ciência como uma atividade técnica nunca tenta, propositadamente, separar-se a si própria das concepções formadas pela experiência cotidiana. Ao contrário, concepções cientificas, embora freqüentemente resultado da intuição espontânea, tendem a ser moldadas, tanto quanto possível, em analogia com as concepções da experiência diária. (JAMMER, 1957)

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Matriz Epistemológica

ontológica: materiae, propriedade geral da matéria, centrada na definição de quantidade de matéria, pré-teórica, sem relação com referencial teórico

I: massa indistinta de peso; uso da palavra ‘peso’ em referência à quantidade de matéria; peso como qualidade dos corpos, não se conservando por alteração na forma ou na velocidade

Antiguidade: massa é conceito inexistente; peso como propriedade dos corpos Neoplatonistas: matéria possui inércia, por razão da sua extensão

realismo ingênuo: massa como quantidade

Doménech et al.Piaget & GarciaJammerBachelard

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Perfil conceitual de massa

I: noção vaga, sensorial, indiferenciada de volume, pré-teórica, sem relação com referencial teórico, indistinta de peso; peso como propriedade geral da matéria, usado também como medida grosseira de quantidade de matéria, embora como quantidade não conservada;II: início da distinção entre peso e massa; massa como conceito realista, mais empírico que lógico, medida pela balança, medida da quantidade de matéria; identificação de massa com outras quantidades; inércia, impetus, calor, frio e secura proporcionais ao peso ou à quantidade de matéria; falsas relações entre o peso do corpo e seu tempo de queda;

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Perfil conceitual de massa

III: massa distinta de peso mas proporcional a este e fonte do fluxo de força gravitacional; massa definida em termos da densidade e correlacionada à força e à aceleração; definições relacionais entre grandezas massa, peso, força e aceleração, estruturadas num “sistema nocional”;IV: : massa relativística, não mais absoluta mas dependente da velocidade, congênere a energia;V: massa dualista na Mecânica Quântica Relativística, com a antimatéria;VI: massa como singularidade na métrica do espaço-tempo, relacionada à curvatura do espaço e definida a partir dos tensores momento-energia e de curvatura; massa inercial igual à massa gravitacional.

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Pesquisa PráticaAplicação de instrumento de teste: questões abertas – validação das categorias da proposta de perfil conceitual – público alvo: alunos de Física I, da Ulbra, Canoas. Objetivo: visão das representações dos estudantes sobre o conceito físico, relacionadas ao seu cotidiano.Análise dos dados: participação de ontologias dos alunos, sobre o conceito, comparadas às zonas (categorias) do perfil do conceito da Matriz Epistemológica, identificadas pela pesquisa bibliográfica.

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Exemplos de perfis individuais

alunos da cadeira de Física I (engenharias e licenciaturas) da ULBRA/Canoas

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Construção do Perfil Conceitual de força

Identificação de zonas representativas do conceito de força nas seguintes fontes: Jammer (1957): histórico-epistemológica; Piaget (1973): psicogenético-epistemológica; Bachelard (1940): filosófico-epistemológica; Literatura sobre concepções alternativas do conceito de

força.

Matriz Epistemológica: correlação das visões epistemológicas identificadas nessas

fontes montagem da Matriz Epistemológica – construção do ‘perfil conceitual’ do conceito de força

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Formação histórica do conceito de força

Tomado originalmente em analogia com o poder humano de vontade, influência espiritual ou esforço muscular, o conceito de força foi projetado nos objetos inanimados como um poder residindo em coisas físicas. [...] O conceito de força tornou-se instrumental para a definição de ‘massa’, que por sua vez deu origem à definição de ‘momento’. Subseqüentemente, a Mecânica Clássica redefiniu o conceito de força como a taxa de variação temporal da mudança do momento, excluindo portanto todos os vestígios animísticos das definições anteriores. Finalmente, ‘força’ tornou-se uma noção puramente relacional, quase pronta para ser eliminada de toda a construção conceitual. (JAMMER, 1957)

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Perfil conceitual de força

I: noção de força originada da percepção de nosso esforço físico, muscular; indistinta de energia, esforço, trabalho, potência, poder e movimento; antropomórfica, animista.

II: força dual (opostos em conflito), reguladora, de origem divina, inerente à matéria, atuando por contato;

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Perfil conceitual de força

III: força como ‘simpatia’ (atração dos semelhantes), corpórea, inerente ao objeto, de natureza ou origem divina, agindo à distância. Resistência ao movimento do objeto como força (vis resistiva). IV: força de ordem imaterial, passível de formalização matemática. Força como seqüência de impulsos instantâneos, externos, que se somam. Força centrífuga, real, como reguladora do movimento circular dos corpos.

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Perfil conceitual de força

V: força como conceito apriorístico na Mecânica Clássica. Força como propriedade de resistência inerente à matéria (inércia) ou como força impressa por ação externa, esta vetorial, componível segundo a regra do paralelogramo, agente causal da aceleração, agindo em pares ação e reação, possivelmente à distância mas através de espíritos etéreos, formando um ‘campo de forças’. VI: forças como trocas de partículas virtuais (píon, fóton, W/Z e gráviton), na Teoria Quântica de Campos.

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Perfil conceitual de força

VII: força na Relatividade Restrita análoga à força newtoniana, relacionando-se, porém com a massa relativística, dependente da velocidade, e não a massa inercial, de repouso. No entanto, a aceleração não é, em geral, codirecional à força e a ação à distância não é instantânea, mas propaga-se limitada pela velocidade da luz.VIII: Força associada ao desvio do corpo de seu percurso natural (geodésica) no espaço-tempo, na Relatividade Geral.

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Conclusões

A noção de força e a evolução do homem – Formas sinônimas (esforço, trabalho, energia) – Fortalecimento das idéias prévias dos estudantes.

Análise histórica: Identificação das zonas representativas do perfil conceitual de força (etapa prévia).

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ConclusõesPerfil conceitual: instrumento para aceder representações dos alunos sobre conceitos em ciências – estratégias de ensino para que os alunos evoluam para uma noção conceitual científica.Importância da tomada de consciência pelo estudante de seu perfil conceitual e o domínio do significado de conceitos em ciências, por profissionais da área. Tais aspectos fortalecem nossa visão quanto à relevância deste trabalho.

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BibliografiaBACHELARD, Gaston. La Philosophie du Non, PUF, Paris, 1940 (trad. Port.: A Filosofia do Não: O Novo Espírito Científico, Lisboa: Presença, 1991).JAMMER, Max. Concepts of Force: A Study in the Foundations of Dynamics. Mineola, NY: Dover Publications Inc., 1999 (orig. ed. 1957).PIAGET, JEAN et al.. La Formation de La Notion de Force, Études d’Épistémologie Génétique XXIX. Paris: PUF. 1973.

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Bibliografia

MORTIMER, Eduardo Fleury. Conceptual Change or Conceptual Profile Change? Science & Education, vol. 4, n. 3, pp. 265 287, 1995.‑PIAGET, Jean; GARCIA, Rolando. Psychogenèse et Histoire des Sciences, Paris: Flammarion, 1983 (ed. portug. Psicogénese e História das Ciências, Lisboa:Dom Quixote, 1987).

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Bibliografia

MORTIMER, Eduardo Fleury & AMARAL, Edenia Maria Ribeiro. Uma Proposta de Perfil Conceitual para o Conceito de Calor. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 1, n. 3, pp. 5-18, 2001.

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Bibliografia

AMARAL, Edenia Maria Ribeiro & MORTIMER, Eduardo Fleury, Conceptual profile of spontaneinity and the teaching of Thermochemistry. in 6th European Conference on Research in Chemical Education e 2nd European Conference on Chemical Education, Aveiro, 2001.

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Bibliografia

SCHNETZLER, Roseli Pacheco; ROSA, M. I. P. S., Perfil epistemológico de Bachelard e a noção de perfil conceitual para transformação química, in 20ª Reunião Anual da SBQ, 1997, Poços de Caldas. v.3. p.3, 1997

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Bibliografia

MICHINEL, José Luís, ALMEIDA, Maria José Pereira Monteiro, O Funcionamento da Leitura de Textos Divergentes Referentes a Energia: Perfil conceitual de Estudantes de Física. in VII Encontro de Pesquisa em Ensino de Física, 2000, Florianópolis - SC. São Paulo:SBF, 2000.

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Biliografia

OLIVEIRA, Gabriel Aguiar; SOUSA, Cristiane R.; DA POIAN, Andrea T. & LUZ, Mauricio Roberto Motta Pinto, Students' misconceptions on Energy Yielding Metabolism: Glucose as the sole metabolic fuel. Advances in Physiology Education. v. 1, 2003.

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Bibliografia

CARRIÃO, A., A aquisição do conceito de função: perfil das imagens produzidas pelos alunos. in: II Encontro Brasileiro de Estudantes de Pós-Graduação em Educação Matemática, 1998, Rio Claro, 1998, p. 99-103

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BibliografiaCOUTINHO, Francisco Ângelo. O Perfil Conceitual do Conceito de Vida. Tese de Doutorado (Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, 2002. GOBARA, Shirley Takeco, Profil conceptuel et Situation-problème. Une contribuition à l'analyse de l'apprentissage de la périodicité en Physique, Tese de Doutorado, Université Claude Bernarde Lyon I, LYON I, Lyon, França, 1999.

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Bibliografia

ZAÏANE, Najoua, Conceptual profile of pupils and students of the radiation, Proceedings of the 4th ESERA Conference, Noordwijkerhout, Holanda, 2003.

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BibliografiaSANTOS, Renato P. dos. Uma Proposta para o Perfil Conceitual do Conceito de Massa na Física. Atas do IX EPEF – Encontro de Pesquisa em Ensino de Ciências, Jaboticatubas, MG, SBF, 26 a 29 de outubro de 2004.RADÉ, Tane & SANTOS, Renato P. dos. Uma Proposta de Perfil Conceitual para o Conceito de Força. Atas do Simpósio Sul-Brasileiro de Ensino de Ciências, Canoas, RS, 8 a 10 de novembro de 2004.