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O ORDENAMENTO OCUPACIONAL NA GESTO DE UNIDADES DE
CONSERVAO INSERIDAS NO ESPAO URBANO: O CASO DO
PARQUE MUNICIPAL DA LAGOA DO PERI (FLORIANPOLIS-SC)
rea temtica: Gesto Ambiental e Sustentabilidade
Tadeu Maia Portela Nogueira
Ctia Regina Carvalho Pinto
Resumo. O presente estudo traz a anlise de trabalhos acadmicos que prope melhorias
para a gesto e planejamento ambiental do Parque Municipal da Lagoa do Peri
(Florianpolis/SC). O principal objetivo levantar nestes estudos informaes sobre o
ordenamento e conflitos de carter ocupacional. Esta unidade de conservao (UC)
encontra-se em processo de recategorizao, embora seja reconhecida como uma UC de
proteo integral, ainda no est enquadrada em nenhuma categoria do Sistema Nacional de
Unidades de Conservao. Os procedimentos metodolgicos se deram atravs da pesquisa
documental de legislaes concernentes ao estudo, trabalhos acadmicos publicados em
revistas cientficas, e teses e dissertaes de programas de ps-graduao. Dos seis trabalhos
que especificam problemas com ocupaes ou subsdios para o plano de manejo do PMLP,
todos retrataram a existncia da comunidade do Serto do Peri, inserida no parque, trs
enfatizaram os conflitos ocupacionais que a envolve. Um dos trabalhos expe outro conflito
ocupacional interno e considerado por moradores e gestores como o mais complexo. Refere-
se s edificaes na plancie da praia da armao, a sudeste do parque, que no momento do
zoneamento no foram includas em seus limites. Nenhum trabalho evidenciou aspectos do
ordenamento ocupacional das reas externas a unidade de conservao, e nem aspectos
relacionados gesto de zona de amortecimento.
Palavras-Chave: Gesto de Unidades de Conservao, Ordenamento Ocupacional,
Zoneamento, Parque Municipal da Lagoa do Peri.
mailto:[email protected]
1. Introduo
Nas dcadas de 1960 e 1980, a cincia da conservao reconheceu a criao de reas
protegidas como a medida de poltica pblica mais eficaz para a conservao da
biodiversidade (DIAMOND, 1975; SIMBERLOFF, 1976; SOUL, 1985). Da em diante a
ideia de se isolar ambientes naturais da ao antrpica passou a ser aplicada em todo mundo.
No demorou muito para a comunidade cientfica perceber que estas reas sofrem
perturbaes por conta da dificuldade de gerenciamento das ocupaes humanas internas e
externas. Por isso, em busca da gesto ideal de reas protegidas, o trabalho de planejamento
das unidades de conservao deve estar o mais ajustado possvel aos interesses da populao
local e as Leis que regem o zoneamento e planejamento urbano dos municpios (DIEGUES,
1998; ISHIHATA, 1999; HAILA, 1999; BRUNCKRST, 2001).
No dia 17 de janeiro de 2014, a Lei Complementar n 482 instituiu o novo Plano Diretor de
Florianpolis. As estratgias de gesto territorial e planejamento urbano do municpio,
atualmente, colocam o Sul da Ilha de Santa Catarina, territrio insular da cidade de
Florianpolis, como destino principal da expanso imobiliria. A falta de cumprimento do
ordenamento territorial, comum na maioria das metrpoles Brasileiras em processo de
expanso, algo que traz bastante preocupao com a integridade dos ambientes naturais
desta regio, que considerada a mais ecologicamente conservada do municpio. A regio
tambm abriga o Parque Municipal da Lagoa do Peri (PMLP), que atualmente uma das
unidades conservao de proteo integral mais importante de Florianpolis, pois abrange a
Bacia Hidrogrfica da Lagoa do Peri, considerada como o principal manancial de gua
potvel da Ilha de Santa Catarina, alm de abrigar um dos ltimos remanescentes de floresta
primria da Mata Atlntica do litoral Catarinense. (IPUF, 1978; FLORAM, 2016).
Portanto a investigao de trabalhos na rea de gesto ambiental que tratem da caracterizao
institucional e de subsdios ao gerenciamento desta unidade de conservao (UC) de
fundamental relevncia para o aprimoramento de novas pesquisas que devam contribuir para a
melhoria na gesto da UC. Nesse contexto, o objetivo deste estudo avaliar em trabalhos
acadmicos relacionados gesto ambiental do PMLP a abordagem de temticas associadas
ao ordenamento de ocupaes dentro e fora do parque.
2. O Parque Municipal da Lagoa do Peri
A Bacia Hidrogrfica da Lagoa constitui o maior manancial de gua potvel da Ilha de Santa
Catarina e responsvel por abastecer a regio Sul e Sudoeste. No ano de 1952, toda a poro
Sul da Ilha passou a ser considerada como floresta remanescente pela Lei Federal n. 30.443,
em 1976 a Bacia Hidrogrfica da Lagoa do Peri foi tombada como Patrimnio Natural do
Municpio de Florianpolis atravs do Decreto Municipal n. 1.408. J em 1978 o Instituto de
Planejamento Urbano de Florianpolis (IPUF) ficou responsvel por elaborar um plano
diretor, conhecido como Plano Diretor do Parque da Lagoa do Peri, para a efetiva criao do
Parque. O PMLP foi fundado em 1981, por meio da Lei Municipal n 1.828/81, sua
regulamentao ocorreu por meio do Decreto Municipal n. 091, de 1982. Atualmente o
PMLP, uma das mais importantes Unidades de Conservao do Municpio, objetiva proteger
o manancial hdrico da bacia da Lagoa do Peri de modo a permitir uma utilizao adequada de
seu potencial, visando abastecer a populao do Sul da Ilha de Santa Catarina, preservar o
patrimnio natural representado pela fauna, flora e da paisagem, propiciar o desenvolvimento
social da comunidade nativa e aproveitar as condies peculiares da sua paisagem natural e
cultural para o desenvolvimento de atividades educativas, de lazer e recreao (IPUF, 1978).
O zoneamento estabelecido pelo IPUF atravs do Plano Diretor dividiu o parque em trs
zonas para utilizao do solo: 1) rea de Reserva Biolgica: abriga os remanescentes de
Floresta Ombrfila Densa da Ilha de Santa Catarina que cobrem a encostas e topos dos morros
distribudos em volta do manancial. Tem objetivo de preservao, a utilizao s permitida
para pesquisas cientficas e educao ambiental; 2) rea de Paisagem Cultural: Esta rea
ocupada pela comunidade tradicional do Serto do Peri (serto do Ribeiro) que desenvolve
atividades agrcolas de subsistncia e criao de animais; 3) rea de Lazer: destinada a
apreciao dos recursos naturais do parque pela populao e educao ambiental da mesma,
conciliando o lazer com a conservao. Estas reas esto representadas na figura a seguir e as
caractersticas biogeogrficas discutidas mais adiante. (FLORAM, 2016; IPUF, 1978).
Figura 1: O ilustra o zoneamento das trs reas descritas pelo IPUF (1978). Destaque para a representao
das florestas primrias e secundrias em estgio inicial e mdio de regenerao.
Fonte: Sbroglia (2010)
3. Histrico da ocupao territorial que abrange o PMLP
A fundao da Colnia Espanhola do Sacramento, em 1680 no Uruguai, levou a preocupao
da Coroa Portuguesa em reforar a representao militar em seus territrios ao sul da
Amrica, que ainda eram pouco conhecidos e povoados. O que resultou na instalao da
Capitania de Santa Catarina, governada pelo Brigadeiro Jos da Silva Paes. Com a chegada do
Brigadeiro, em 1739, o primeiro governo de Santa Catarina sugeriu a Coroa o intercmbio de
imigrantes com o objetivo de fornecer mo de obra e contribuir para o processo de
desenvolvimento e ocupao da Capitania. A chegada em massa desses primeiros imigrantes,
a maioria eram nativos do arquiplago de Aores, repercutiu no primeiro marco significativo
de alterao no ambiente natural da Ilha de Santa Catarina (CECCA, 1997).
Tanto o solo arenoso da plancie costeira, quanto o clima quente e mido da Amrica
subtropical no foram favorveis ao tradicional cultivo de milho, centeio e linho dos
Aorianos. A mandioca ento passou a ser o maior cultivo agrcola na Ilha de Santa Catarina e
com a introduo e dos engenhos, passou a ser o principal produto de exportao do sculo
XIX. O modelo itinerante da lavoura aoriana utilizava as roas de coivara, avanando sempre
para reas mais frteis e recm-desmatadas, sem qualquer preocupao com o extermnio da
abundante floresta. A madeira extrada destinava-se a construo civil, naval, utenslios
domsticos, artesanato e exportao. Em 1820 a explorao predatria da Mata Atlntica na
Ilha de Santa Catarina j era retratada por alguns viajantes, como o botnico August de Saint-
Hilaire: Do lado leste ainda se acham coroados de matas virgens, com pedreiras brotando no
meio delas, e o restante das terras foi todo desmatado, e apresenta trechos ora cultivados,
ora capoeiras.
Por consequncia das relaes comerciais com outros centros mais desenvolvidos, como as
capitais do Sudeste, Nordeste e at Montevidu, no incio do sculo XX, produtos agrcolas
como a cana-de-acar e caf passaram a ser cultivados tambm em larga escala e destinados
exportao. Neste perodo a expanso das lavouras substituiu grande parte das florestas
nativas e a paisagem passa a ser realmente um mosaico composto por poucos remanescentes
florestais, capoeiras em regenerao e lavouras (CARUSO, 1983). Como Vrzea (1985)
retrata em sua obra: a bela ilha do sul se acha transformada num imenso cafezal. Segundo
Caruso (1990), 83% da cobertura florestal nativa j havia sido desmatada em 1938 e em 1978
o desmatamento aumentou para 87%. Abaixo segue uma imagem area de 1957 onde pode ser
observada a transformao da paisage