O Novo Acordo ortográfico: as modificações e as dúvidas

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Considerações sobre Considerações sobre o Novo Acordo o Novo Acordo Ortográfico Ortográfico Maria Bernadete M. Maria Bernadete M. Abaurre Abaurre [email protected] [email protected] IEL/Unicamp IEL/Unicamp 23 de março de 2009 23 de março de 2009

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Considerações sobre o Considerações sobre o Novo Acordo OrtográficoNovo Acordo Ortográfico

Maria Bernadete M. AbaurreMaria Bernadete M. Abaurre

[email protected]@matrix.com.brIEL/UnicampIEL/Unicamp

23 de março de 200923 de março de 2009

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Texto publicitário publicadona contracapa da revista Língua Portuguesa, ano III, no. 35,Setembro de 2008

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O NAO entrou em vigor em 01.01.2009O NAO entrou em vigor em 01.01.2009

No Brasil: período de transição de No Brasil: período de transição de quatroquatro anos. anos.

Em Portugal: período de transição de Em Portugal: período de transição de seisseis anos. anos.

Nesse período, durante o qual se adaptarão os livros Nesse período, durante o qual se adaptarão os livros didáticos, as gramáticas, os dicionários os documentos didáticos, as gramáticas, os dicionários os documentos públicos e os concursos, conviverão as duas grafias. públicos e os concursos, conviverão as duas grafias.

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Histórico e objetivos Histórico e objetivos do Acordodo Acordo

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De 1986 até os dias atuaisDe 1986 até os dias atuais 19861986 – Reunião de representantes dos sete países de – Reunião de representantes dos sete países de

língua portuguesa no Rio de Janeiro resulta nas Bases língua portuguesa no Rio de Janeiro resulta nas Bases Analíticas da Ortografia Simplificada da Língua Portuguesa Analíticas da Ortografia Simplificada da Língua Portuguesa de 1945 (nunca foram implementadas).de 1945 (nunca foram implementadas).

19901990 – – Surge o Surge o Acordo de Ortografia Simplificada entre Acordo de Ortografia Simplificada entre Brasil e Portugal para a LusofoniaBrasil e Portugal para a Lusofonia, nova versão do , nova versão do documento de 1986.documento de 1986.

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Principais negociadores do Acordo:Principais negociadores do Acordo:

Pelo Brasil: Atônio Houaiss (ABL)Pelo Brasil: Atônio Houaiss (ABL)

Por Portugal: João Malaca Casteleiro (Instituto de Por Portugal: João Malaca Casteleiro (Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Língua Portuguesa Lexicologia e Lexicografia da Língua Portuguesa da Academia de Ciências de Lisboa. Autor do da Academia de Ciências de Lisboa. Autor do Dicionário da Língua Portuguesa ContemporâneaDicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, , 2001, ACL)2001, ACL)

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Um parêntese...Um parêntese... “ “Considerando que o projecto de texto de ortografia Considerando que o projecto de texto de ortografia

unificada de língua portuguesa (...) constitui um passo unificada de língua portuguesa (...) constitui um passo importante para a defesa da unidade essencial da língua importante para a defesa da unidade essencial da língua portuguesa e para o seu prestígio internacional,portuguesa e para o seu prestígio internacional,

Considerando que Considerando que o texto do acordo que ora se aprova o texto do acordo que ora se aprova resulta de um aprofundado debate nos países signatáriosresulta de um aprofundado debate nos países signatários (...)”(...)”

(seguem-se: lista dos países signatários, 4 artigos e as assinaturas) (seguem-se: lista dos países signatários, 4 artigos e as assinaturas)

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19951995 – Brasil e Portugal aprovam oficialmente o documento – Brasil e Portugal aprovam oficialmente o documento de 1990 (assinado pelos representantes de Angola, Brasil, de 1990 (assinado pelos representantes de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe), que passa a ser reconhecido como Acordo e Príncipe), que passa a ser reconhecido como Acordo Ortográfico de 1995 (no Brasil: Ortográfico de 1995 (no Brasil: Decreto Legislativo no. 54 de Decreto Legislativo no. 54 de 19951995).).

19981998 – No Primeiro – No Primeiro Protocolo Modificativo ao Acordo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa fica estabelecido que todos Ortográfico da Língua Portuguesa fica estabelecido que todos os membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa os membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) devem ratificar as normas propostas no Acordo (CPLP) devem ratificar as normas propostas no Acordo Ortográfico de 1995 para que este seja implantado.Ortográfico de 1995 para que este seja implantado.

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20022002 – O Timor Leste torna-se independente e passa a fazer parte – O Timor Leste torna-se independente e passa a fazer parte da CPLP.da CPLP.

20042004 – Com a aprovação do Segundo Protocolo Modificativo ao – Com a aprovação do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, fica determinado que Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, fica determinado que basta a ratificação de três membros para o acordo entrar em basta a ratificação de três membros para o acordo entrar em vigor. No mesmo ano, o Brasil ratifica o acordo.vigor. No mesmo ano, o Brasil ratifica o acordo.

20062006 – Cabo Verde e São Tomé e Príncipe ratificam o documento, – Cabo Verde e São Tomé e Príncipe ratificam o documento, possibilitando a entrada em vigor do acordo.possibilitando a entrada em vigor do acordo.

20082008 – Portugal aprova o acordo ortográfico. – Portugal aprova o acordo ortográfico.

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Objetivos e justificativaObjetivos e justificativa Principal objetivo do novo acordo ortográfico:Principal objetivo do novo acordo ortográfico:

““Unificar a ortografia da língua portuguesa Unificar a ortografia da língua portuguesa que, atualmente, é o único idioma do que, atualmente, é o único idioma do ocidente que tem duas grafias oficiais - a do ocidente que tem duas grafias oficiais - a do Brasil e a de Portugal”. Brasil e a de Portugal”.

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Justificativa apresentada:Justificativa apresentada:

O português é língua oficial de oito países: Angola, Brasil, O português é língua oficial de oito países: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste (cerca de 230 milhões de Tomé e Príncipe e Timor Leste (cerca de 230 milhões de falantes).falantes).

A unificação facilitará a circulação de materiais, como A unificação facilitará a circulação de materiais, como documentos oficiais e livros, entre esses países, sem que documentos oficiais e livros, entre esses países, sem que seja necessário fazer uma “tradução” do material.seja necessário fazer uma “tradução” do material.

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O fato de haver duas grafias oficiais dificulta o O fato de haver duas grafias oficiais dificulta o estabelecimento do português como um dos estabelecimento do português como um dos idiomas oficiais da Organização das Nações idiomas oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU).Unidas (ONU).

Segundo o texto oficial do acordo, ele “constitui Segundo o texto oficial do acordo, ele “constitui um um passo importante para a defesa da unidade passo importante para a defesa da unidade essencial da língua portuguesaessencial da língua portuguesa e para o seu e para o seu prestígio internacional”.prestígio internacional”.

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Segundo o MEC:Segundo o MEC:

““com o acordo, as diferenças ortográficas com o acordo, as diferenças ortográficas existentes entre o português do Brasil e o de existentes entre o português do Brasil e o de Portugal serão resolvidas em 98%”.Portugal serão resolvidas em 98%”.

““A unificação da ortografia acarretará alterações A unificação da ortografia acarretará alterações na forma de escrita em 1,6% do vocabulário na forma de escrita em 1,6% do vocabulário usado em Portugal e de 0,5%, no Brasil”.usado em Portugal e de 0,5%, no Brasil”.

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Segundo Antônio Huaiss:Segundo Antônio Huaiss:

““Portugal, o Brasil e os cinco países africanos de Portugal, o Brasil e os cinco países africanos de língua portuguesa reconhecem que língua portuguesa reconhecem que a inexistência a inexistência de uma única ortografia oficial traz não apenas de uma única ortografia oficial traz não apenas dificuldades de natureza linguísticadificuldades de natureza linguística, mas também , mas também de natureza política. Daí o esforço desses países de natureza política. Daí o esforço desses países em efetivar o novo Acordo”.em efetivar o novo Acordo”.

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““O novo texto da unificação é menos radical que o proposto O novo texto da unificação é menos radical que o proposto em 1986 e em 1986 e atende de forma mais satisfatória às atende de forma mais satisfatória às necessidades linguísticas dos diferentes países que falam o necessidades linguísticas dos diferentes países que falam o Português, evitando, assim, a Português, evitando, assim, a desagregação do idioma”.desagregação do idioma”.

““São dois os objetivos básicos do Acordo: o primeiro é fixar São dois os objetivos básicos do Acordo: o primeiro é fixar e delimitar as diferenças atualmente existentes entre os e delimitar as diferenças atualmente existentes entre os falantes da língua; o segundo é criar uma comunidade que falantes da língua; o segundo é criar uma comunidade que constitua uma unidade linguística expressiva, ampliando constitua uma unidade linguística expressiva, ampliando seu prestígio junto aos organismos internacionais”.seu prestígio junto aos organismos internacionais”.

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““O novo Acordo privilegia o critério fonético O novo Acordo privilegia o critério fonético em detrimento do etimológico, ou seja, é o em detrimento do etimológico, ou seja, é o critério de pronúncias que justifica a critério de pronúncias que justifica a existência de grafias duplas e a supressão existência de grafias duplas e a supressão das consoantes ‘mudas’ ou não articuladas”. das consoantes ‘mudas’ ou não articuladas”.

Houaiss, A. Houaiss, A. A Nova Ortografia da Língua PortuguesaA Nova Ortografia da Língua Portuguesa. São Paulo: . São Paulo: Ática. 1991.Ática. 1991.

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O texto do Novo O texto do Novo Acordo: estrutura Acordo: estrutura

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Estruturado em 21 bases, sobre os temas:Estruturado em 21 bases, sobre os temas:

Alfabeto e grafia de nomes próprios estrangeiros (Base I)Alfabeto e grafia de nomes próprios estrangeiros (Base I) Uso do h (Base II)Uso do h (Base II) Grafemas consonânticos (Base III)Grafemas consonânticos (Base III) Sequências consonânticas (Base IV)Sequências consonânticas (Base IV) Vogais átonas (Base V)Vogais átonas (Base V) Vogais nasais (Base VI)Vogais nasais (Base VI) Ditongos (Base VII)Ditongos (Base VII) Acentuação gráfica (Bases VIII, IX, X, XI, XII, XIII)Acentuação gráfica (Bases VIII, IX, X, XI, XII, XIII)

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Uso do trema (Base XIV)Uso do trema (Base XIV) Uso do hífen (Bases XV, XVI, XVII)Uso do hífen (Bases XV, XVI, XVII) Uso do apóstrofo (Base XVIII)Uso do apóstrofo (Base XVIII) Uso de letras maiúsculas e minúsculas (Base XIX)Uso de letras maiúsculas e minúsculas (Base XIX) Divisão silábica (Base XX)Divisão silábica (Base XX) Grafia de assinaturas e firmas (Base XXI)Grafia de assinaturas e firmas (Base XXI)

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As principais As principais modificaçõesmodificações

Fonte: Faraco, C. A. Fonte: Faraco, C. A.

Mudanças ortográficas no horizonte. Mudanças ortográficas no horizonte.

Publicado originalmente em: ww.cbncuritiba.com.brPublicado originalmente em: ww.cbncuritiba.com.br

Reproduzido em:Reproduzido em:

www.museudalinguaportuguesa.org.brwww.museudalinguaportuguesa.org.br

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I. AcentuaçãoI. Acentuação

a) desaparece o acento circunflexo do primeiro a) desaparece o acento circunflexo do primeiro oo em em palavras paroxítonas terminadas em palavras paroxítonas terminadas em oooo, seguidas ou não , seguidas ou não de de ss::vôovôo, , enjôoenjôo, , abençôoabençôo voovoo, , enjooenjoo, , abençooabençoo; ; 

b) desaparece o acento circunflexo das formas verbais da b) desaparece o acento circunflexo das formas verbais da terceira pessoa do plural terminadas em terceira pessoa do plural terminadas em –eem–eem::lêem, dêem, crêem,lêem, dêem, crêem, vêemvêem leem, deem, creem, veem;leem, deem, creem, veem;

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cc) deixam de ser acentuados os ditongos abertos ) deixam de ser acentuados os ditongos abertos éiéi e e óiói das das palavras paroxítonas:palavras paroxítonas:idéia, assembléia, heróico, paranóicoidéia, assembléia, heróico, paranóico ideia, assembleia, heroico, ideia, assembleia, heroico,

paranoico;paranoico;

d) fica abolido, nas palavras paroxítonas, o acento agudo no d) fica abolido, nas palavras paroxítonas, o acento agudo no ii e no e no uu tônicos precedidos de ditongo: tônicos precedidos de ditongo: feiúra, baiúcafeiúra, baiúca feiura, baiucafeiura, baiuca;;

e) fica abolido, nas formas verbais rizotônicas, o acento agudo do e) fica abolido, nas formas verbais rizotônicas, o acento agudo do uu tônico precedido de tônico precedido de gg ou ou qq e seguido de e seguido de ee ou ou ii..averigúeaverigúe, , apazigúeapazigúe e e argúemargúem averigue, apazigue, arguem;averigue, apazigue, arguem;

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f) deixa de existir o acento agudo ou circunflexo nas palavras f) deixa de existir o acento agudo ou circunflexo nas palavras paroxítonas que, tendo vogal tônica aberta ou fechada, são paroxítonas que, tendo vogal tônica aberta ou fechada, são homógrafas de palavras átonas. homógrafas de palavras átonas.

Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico:– Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico:– parapara, , flexão do verbo flexão do verbo pararparar, e , e parapara, preposição; – , preposição; – pela(s) pela(s) (é), (é), substantivo e flexão do verbo substantivo e flexão do verbo pelarpelar, e , e pela(s)pela(s), combinação da , combinação da preposição preposição perper e o artigo e o artigo a(s)a(s);– ;– polo(s) polo(s) (ó), substantivo, e (ó), substantivo, e polo(s)polo(s), combinação antiga e popular de , combinação antiga e popular de porpor e e lo(s)lo(s); – pelo (é), ; – pelo (é), flexão de flexão de pelarpelar, , pelo(s)pelo(s) (ê), substantivo, e (ê), substantivo, e pelo(s)pelo(s) combinação combinação da preposição per e o artigo da preposição per e o artigo o(s)o(s);– ;– perapera (ê), substantivo (fruta), (ê), substantivo (fruta), perapera (é), substantivo arcaico (pedra) e (é), substantivo arcaico (pedra) e perapera preposição preposição arcaica.arcaica.

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A reforma de 1971 aboliu os acentos circunflexos diferenciais. A reforma de 1971 aboliu os acentos circunflexos diferenciais. Manteve esse acento apenas para a forma verbal ‘Manteve esse acento apenas para a forma verbal ‘pôde’pôde’. O texto do . O texto do Acordo mantém esta exceção e acrescenta, facultativamente, o uso Acordo mantém esta exceção e acrescenta, facultativamente, o uso do acento na palavra do acento na palavra fôrmafôrma..

O Acordo manteve a duplicidade de acentuação (acento circunflexo O Acordo manteve a duplicidade de acentuação (acento circunflexo ou agudo) em palavras como ou agudo) em palavras como econômico/económicoeconômico/económico, , acadêmico/académicoacadêmico/académico, , fêmur/fémurfêmur/fémur, , bebê/bebébebê/bebé..Esta acentuação reflete o timbre fechado (mais freqüente no Brasil) e Esta acentuação reflete o timbre fechado (mais freqüente no Brasil) e o timbre aberto (mais frequente em Portugal e nos demais países o timbre aberto (mais frequente em Portugal e nos demais países lusófonos) das pronúncias cultas das vogais nestes contextos, por lusófonos) das pronúncias cultas das vogais nestes contextos, por isso não foi alterada. isso não foi alterada.

As duas formas passam a ser aceitas em todo o território da As duas formas passam a ser aceitas em todo o território da lusofonia e devem ambas constar dos dicionários. lusofonia e devem ambas constar dos dicionários.

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II. Uso do hífenII. Uso do hífen

a) Nas palavras e expressões compostas:a) Nas palavras e expressões compostas:

O Acordo manteve inalteradas as disposições anteriores, O Acordo manteve inalteradas as disposições anteriores, determinando apenas que devem ser grafados sem hífen certos determinando apenas que devem ser grafados sem hífen certos compostos compostos nos quais se perdeu a noção de composiçãonos quais se perdeu a noção de composição ((mandachuvamandachuva e e paraquedasparaquedas, por exemplo, mas guarda-chuva)., por exemplo, mas guarda-chuva).

“ “Para saber quais compostos perderão o hífen, teremos de esperar Para saber quais compostos perderão o hífen, teremos de esperar a publicação do novo Vocabulário Ortográfico pela Academia das a publicação do novo Vocabulário Ortográfico pela Academia das Ciências de Lisboa e pela Academia Brasileira de Letras. O texto Ciências de Lisboa e pela Academia Brasileira de Letras. O texto do Acordo prevê a aglutinação, dá alguns exemplos e termina o do Acordo prevê a aglutinação, dá alguns exemplos e termina o enunciado com um etc. – o que, infelizmente, deixa em aberto a enunciado com um etc. – o que, infelizmente, deixa em aberto a questão.” questão.”

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b) Nas palavras formadas por prefixação:b) Nas palavras formadas por prefixação:

Emprega-se o hífen quando:Emprega-se o hífen quando: o segundo elemento começa por o segundo elemento começa por h h ( ( pré-história, super-homem, pan-pré-história, super-homem, pan-

helenismo, semi-hospitalarhelenismo, semi-hospitalar))Exceção: manteve-se a regra atual para as palavras formadas com os Exceção: manteve-se a regra atual para as palavras formadas com os prefixos prefixos desdes- e - e inin-, grafadas sem hífen (-, grafadas sem hífen (desumanodesumano, , inábilinábil, , inumanoinumano).).

o prefixo termina na mesma vogal com que se inicia o segundo o prefixo termina na mesma vogal com que se inicia o segundo elemento (elemento (contra-almirante, supra-auricular, auto-observação, micro-contra-almirante, supra-auricular, auto-observação, micro-

onda, infra-axilaronda, infra-axilar))Exceção: manteve-se a regra atual em relação ao prefixo Exceção: manteve-se a regra atual em relação ao prefixo co-co- ((coordenaçãocoordenação, , cooperaçãocooperação, , coobrigaçãocoobrigação) )

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Aboliu-se o uso do hífen quando:Aboliu-se o uso do hífen quando:

o segundo elemento começa com o segundo elemento começa com ss ou ou rr, devendo estas consoantes ser , devendo estas consoantes ser duplicadas (duplicadas (antirreligiosoantirreligioso, , contrarregracontrarregra, , infrassom, minissaia, infrassom, minissaia,

ultrarromânticoultrarromântico).).Exceção: manteve-se o hífen quando os prefixos terminam com Exceção: manteve-se o hífen quando os prefixos terminam com rr, ou , ou seja, seja, hiperhiper-, -, interinter- e - e supersuper- (- (hiper-requintadohiper-requintado,, inter-resistente inter-resistente, , super-super-

revistarevista). ). 

quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com uma vogal diferente (uma vogal diferente (extraescolar, aeroespacial, autoestrada, extraescolar, aeroespacial, autoestrada,

autoaprendizagem, antiaéreo, agroindustrial, hidroelétricaautoaprendizagem, antiaéreo, agroindustrial, hidroelétrica). ).

Observação: permanecem inalteradas as demais regras do uso do hífen.Observação: permanecem inalteradas as demais regras do uso do hífen.

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Atenção, revisores de texto!Atenção, revisores de texto!

Na Base XX (Da divisão silábica) do Acordo, lê-se:Na Base XX (Da divisão silábica) do Acordo, lê-se: “ “Na translineação de uma palavra composta ou de uma Na translineação de uma palavra composta ou de uma

combinação de palavras em que há um hífen, ou mais, se a combinação de palavras em que há um hífen, ou mais, se a partição coincide com o final de um dos elementos ou partição coincide com o final de um dos elementos ou membros, deve, membros, deve, por clareza gráficapor clareza gráfica, repetir-se o hífen no , repetir-se o hífen no início da linha imediata” início da linha imediata”

ex-ex- -alferes-alferes serená-serená- -los-emos-los-emos

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III. O tremaIII. O trema

O trema fica abolido pelo Acordo:O trema fica abolido pelo Acordo:lingüísticalingüística, , cinqüentacinqüenta, , seqüestroseqüestro linguísticalinguística, , cinquentacinquenta, , sequestrosequestro

Obs.: mantém-se este diacrítico apenas em Obs.: mantém-se este diacrítico apenas em palavras derivadas de nomes próprios palavras derivadas de nomes próprios estrangeiros: estrangeiros: müllerianomülleriano (de (de MüllerMüller) )

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IV. Sobre o alfabeto do portuguêsIV. Sobre o alfabeto do português

Passa a ser constituído de 26 letras, com a Passa a ser constituído de 26 letras, com a incorporação do incorporação do KK, do , do WW e do e do YY..

Essas letras continuam a ser usadas apenas em Essas letras continuam a ser usadas apenas em casos especiais (antropônimos: casos especiais (antropônimos: DarwinDarwin; ; topônimos: topônimos: Kuwait; Kuwait; siglas: siglas: KLM;KLM; símbolos: símbolos: kgkg [quilograma] e unidades de medida: [quilograma] e unidades de medida: kilowattkilowatt). ).

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V. Sobre maiúsculas e minúsculasV. Sobre maiúsculas e minúsculas

Uso obrigatório das maiúsculasUso obrigatório das maiúsculas

Em antropônimos, topônimos, nome de seres mitológicos ou Em antropônimos, topônimos, nome de seres mitológicos ou antropomorfizados, nomes de instituições, nomes de antropomorfizados, nomes de instituições, nomes de festividades, títulos de periódicos, nomes de pontos cardeais festividades, títulos de periódicos, nomes de pontos cardeais empregados absolutamente (Nordeste, por nordeste do empregados absolutamente (Nordeste, por nordeste do Brasil), siglas, símbolos, iniciais de abreviaturas (Sr.) Brasil), siglas, símbolos, iniciais de abreviaturas (Sr.)

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Uso facultativo das maiúsculas:Uso facultativo das maiúsculas:

Nos nomes que designam domínios do saber, cursos e Nos nomes que designam domínios do saber, cursos e disciplinas (disciplinas (português/Português, letras/Letrasportuguês/Português, letras/Letras); em ); em palavras usadas reverencialmente ou hierarquicamente palavras usadas reverencialmente ou hierarquicamente ((santa/Santa Genoveva, doutor/Doutor Magalhãessanta/Santa Genoveva, doutor/Doutor Magalhães); em ); em categorizações de logradouros públicos, templos, edifícios; categorizações de logradouros públicos, templos, edifícios; nos bibliônimos, após o primeiro elemento, que é sempre nos bibliônimos, após o primeiro elemento, que é sempre grafado com maiúscula (grafado com maiúscula (Menino de engenho/Menino de Menino de engenho/Menino de

EngenhoEngenho). ).

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VI. Além disso...VI. Além disso...

O Acordo, na Base XVIII (Do apóstrofo), incorpora, sob a forma de O Acordo, na Base XVIII (Do apóstrofo), incorpora, sob a forma de proibição, uma tradição gramatical de rejeição à contração da proibição, uma tradição gramatical de rejeição à contração da preposição com o artigo ou pronome em construções com infinitivo: preposição com o artigo ou pronome em construções com infinitivo: É difícil explicar oÉ difícil explicar o fato fato de os eleitoresde os eleitores por vezes preferirem votar por vezes preferirem votar em candidatos com ficha suja... em candidatos com ficha suja...

Passa a constituir erro de ortografia, portanto, a grafia:Passa a constituir erro de ortografia, portanto, a grafia: ... O fato ... O fato dos eleitoresdos eleitores por vezes preferirem... por vezes preferirem...

(embora, segundo E. Bechara [(embora, segundo E. Bechara [Moderna gramática portuguesaModerna gramática portuguesa], essa ], essa contração seja atestada em vários escritores clássicos da língua).contração seja atestada em vários escritores clássicos da língua).

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Algumas dúvidasAlgumas dúvidas

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As maiores dúvidas dizem respeito ao uso do hífenAs maiores dúvidas dizem respeito ao uso do hífen

no caso das palavras compostas, como interpretar a observação, na no caso das palavras compostas, como interpretar a observação, na Base XV: “certos compostos, Base XV: “certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composiçãomedida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente: , grafam-se aglutinadamente: girassol, girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista, etc” madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista, etc” ??..

Como afirmar que a noção de composição se perdeu em formações com Como afirmar que a noção de composição se perdeu em formações com verbo+substantivo como verbo+substantivo como mandachuva, mandachuva, mas não emmas não em guarda-chuva? guarda-chuva? EmEm paralama paralama ee parabrisa, parabrisa, mas não emmas não em para-choque? para-choque? Quem decide? Os Quem decide? Os autores do Novo VOLP, membros da Comissão de Lexicologia e autores do Novo VOLP, membros da Comissão de Lexicologia e Lexicografia da ABL (Eduardo Portella, Evanildo Bechara e Alfredo Bosi), Lexicografia da ABL (Eduardo Portella, Evanildo Bechara e Alfredo Bosi), tiveram de solucionar problemas como esse para lançar a obra em tiveram de solucionar problemas como esse para lançar a obra em março de 2009. março de 2009.

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No caso do prefixo No caso do prefixo re-, re-, o NAO é omisso. Há dúvidas sobre a o NAO é omisso. Há dúvidas sobre a escrita de palavras como escrita de palavras como re-elegerre-eleger, , re-escreverre-escrever.. Por ser Por ser átono, deveria o átono, deveria o re-re- seguir a regra aplicável a seguir a regra aplicável a pre-pre- ( (preverprever, , mas mas pré-escolapré-escola) e a ) e a pro-pro- ( (promoverpromover, mas , mas pró-africanopró-africano) e ) e aglutinar-se ao elemento seguinte?aglutinar-se ao elemento seguinte?

Essa foi a solução adotada pelo VOLP. Segundo Bechara, o Essa foi a solução adotada pelo VOLP. Segundo Bechara, o NAO apresenta alguns “silêncios normativos” (sic), o que NAO apresenta alguns “silêncios normativos” (sic), o que criou a necessidade de interpretação do espírito do criou a necessidade de interpretação do espírito do documento por parte dos membros da Comissão documento por parte dos membros da Comissão responsável pela preparação do novo VOLP...responsável pela preparação do novo VOLP...

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Questões frequentesQuestões frequentes

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Consultar lista de 17 FAQ’s (questões Consultar lista de 17 FAQ’s (questões freqüentes) sobre o NAO no site da freqüentes) sobre o NAO no site da Comunidade dos Países de Língua Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP):Portuguesa (CPLP):

www.cplp.orgwww.cplp.org

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Um exemplo:Um exemplo:

Questão 14: Mas se o critério fonético está subjacente às Questão 14: Mas se o critério fonético está subjacente às alterações, o Português falado é alterado?alterações, o Português falado é alterado?

Não. A forma falada do Português não sofrerá qualquer Não. A forma falada do Português não sofrerá qualquer alteração, no curto prazo (embora não seja de excluir que, alteração, no curto prazo (embora não seja de excluir que, no futuro, o “p” que os portugueses utilizam em no futuro, o “p” que os portugueses utilizam em baptismobaptismo e e pronunciam muito levemente, venha a desaparecer)pronunciam muito levemente, venha a desaparecer)

(...)(...)

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A polêmicaA polêmica

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Há defesa do/oposição ao NAO tanto em Portugal como no Brasil. Há defesa do/oposição ao NAO tanto em Portugal como no Brasil. As discussões, no entanto, têm sido muito mais acaloradas em As discussões, no entanto, têm sido muito mais acaloradas em Portugal.Portugal.

para um exemplo do “tom” das discussões em Portugal, ver posts para um exemplo do “tom” das discussões em Portugal, ver posts no blog oficial da no blog oficial da Petição em Defesa da Língua Portuguesa contra Petição em Defesa da Língua Portuguesa contra

o Acordo Ortográficoo Acordo Ortográfico,, do Prof. António Emiliano (linguista e do Prof. António Emiliano (linguista e filólogo, Universidade Nova de Lisboa), em:filólogo, Universidade Nova de Lisboa), em:

www.emdefesadalinguaportuguesa.blogspot.comwww.emdefesadalinguaportuguesa.blogspot.com

Artigos sobre o NAO do escritor Vasco Graça Moura, um dos mais Artigos sobre o NAO do escritor Vasco Graça Moura, um dos mais ferrenhos opositores do Acordo, em Portugal.ferrenhos opositores do Acordo, em Portugal.

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para uma defesa do NAO no Brasil, ver texto de para uma defesa do NAO no Brasil, ver texto de Carlos Alberto Faraco (membro da Comissão para Carlos Alberto Faraco (membro da Comissão para a Definição da Política de Ensino-Aprendizagem, a Definição da Política de Ensino-Aprendizagem, Pesquisa e Promoção da Língua Portuguesa do Pesquisa e Promoção da Língua Portuguesa do MEC), MEC), Uma mudança necessáriaUma mudança necessária, no site do , no site do Museu da Língua Portuguesa:Museu da Língua Portuguesa:

www.museudalinguaportuguesa.org.brwww.museudalinguaportuguesa.org.br

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Alguns problemas apontados por Faraco com relação à Alguns problemas apontados por Faraco com relação à dupla ortografia:dupla ortografia:

impedimentos à livre circulação, nos países lusófonos, de impedimentos à livre circulação, nos países lusófonos, de livros com ortografia brasileira, o que força a existência de livros com ortografia brasileira, o que força a existência de “traduções”, aumenta em muito os custos editoriais e “traduções”, aumenta em muito os custos editoriais e causa prejuízos culturais e econômicos ao Brasil.causa prejuízos culturais e econômicos ao Brasil.

Impedimento a ações conjuntas na certificação de Impedimento a ações conjuntas na certificação de proficiência em português como língua estrangeira e na proficiência em português como língua estrangeira e na promoção internacional da língua.promoção internacional da língua.

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““(...) o melhor resultado do Acordo é o fim da duplicidade de ortografias. (...) o melhor resultado do Acordo é o fim da duplicidade de ortografias. Esta duplicidade não seria, em princípio, um problema, já que as Esta duplicidade não seria, em princípio, um problema, já que as diferenças não são de tal monta que interfiram na compreensão dos diferenças não são de tal monta que interfiram na compreensão dos textos.textos.

No entanto – e este é um ponto que raramente aparece nos debates No entanto – e este é um ponto que raramente aparece nos debates -, Portugal transformou a duplicidade de ortografias em um -, Portugal transformou a duplicidade de ortografias em um instrumento político para embaraçar a presença brasileira seja na instrumento político para embaraçar a presença brasileira seja na relação com os demais países lusófonos, seja na promoção relação com os demais países lusófonos, seja na promoção internacional da língua. No fundo (...), Portugal teme a internacional da língua. No fundo (...), Portugal teme a ‘brasilianização da língua’ (afinal, 85% dos falantes estão aqui) e ‘brasilianização da língua’ (afinal, 85% dos falantes estão aqui) e tenta nos neutralizar, praticando uma política da língua que busca tenta nos neutralizar, praticando uma política da língua que busca sempre nos deixar em plano secundário”. sempre nos deixar em plano secundário”.

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Para pensar (sobre as escritas Para pensar (sobre as escritas “marginais”)...“marginais”)...

Lemle, Miriam. Lemle, Miriam. Reforma ortográfica: uma Reforma ortográfica: uma

questão linguística ou política?questão linguística ou política?

Em: Boletim da ABRALIN 1, pp. 18-24. Em: Boletim da ABRALIN 1, pp. 18-24. 19811981

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Uma opinião...Uma opinião...

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RL: Como o acordo de unificação ortográfica é visto em Moçambique?RL: Como o acordo de unificação ortográfica é visto em Moçambique?

MC: De uma maneira muito displicente. Percebe-se que não é isso MC: De uma maneira muito displicente. Percebe-se que não é isso que falta, nem que vá resultar grande coisa. É como se fosse uma que falta, nem que vá resultar grande coisa. É como se fosse uma questão só de Portugal e Brasil. Meus livros são publicados no Brasil questão só de Portugal e Brasil. Meus livros são publicados no Brasil com grafia moçambicana, que é portuguesa, e ninguém me disse com grafia moçambicana, que é portuguesa, e ninguém me disse que ficou muito atrapalhado com isso. que ficou muito atrapalhado com isso. Leio com enorme prazer os Leio com enorme prazer os livros brasileiros e um dos prazeres é o fato de vocês terem uma livros brasileiros e um dos prazeres é o fato de vocês terem uma grafia distinta. A existência dela não é problema, pois sentir certa grafia distinta. A existência dela não é problema, pois sentir certa falta de familiaridade mostra que ali está um outro povo, uma outra falta de familiaridade mostra que ali está um outro povo, uma outra cultura falando.cultura falando.

Mia Couto: A voz de MoçambiqueMia Couto: A voz de Moçambique. (Entrevista concedida a Luiz Costa Pereira . (Entrevista concedida a Luiz Costa Pereira Junior. Junior. Revista Língua PortuguesaRevista Língua Portuguesa, ano III, no. 33, pp. 12-16)., ano III, no. 33, pp. 12-16).

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A morte é como o umbigo: o quanto nela existe é a sua cicatriz, a A morte é como o umbigo: o quanto nela existe é a sua cicatriz, a lembrança de uma anterior existência. A bordo do barco que me leva à lembrança de uma anterior existência. A bordo do barco que me leva à ilha de Luar-do-Chão não é senão a morte que me vai ditando suas ilha de Luar-do-Chão não é senão a morte que me vai ditando suas ordens. Por motivo de falecimento, abandono a cidade e faço a viagem: ordens. Por motivo de falecimento, abandono a cidade e faço a viagem: vou ao enterro do meu avô Dito Mariano.vou ao enterro do meu avô Dito Mariano.

Cruzo o rio, já é quase noite. Vejo esse poente como o desbotar do Cruzo o rio, já é quase noite. Vejo esse poente como o desbotar do último sol. A voz antiga do Avô parece dizer-me: depois deste poente último sol. A voz antiga do Avô parece dizer-me: depois deste poente não haverá mais dia. E o gesto gasto de Mariano aponta o horizonte: ali não haverá mais dia. E o gesto gasto de Mariano aponta o horizonte: ali onde se afunda o astro é o mpela djambo, o umbigo celeste. A cicatriz onde se afunda o astro é o mpela djambo, o umbigo celeste. A cicatriz tão longe de uma ferida tão dentro: a ausente permanência de quem tão longe de uma ferida tão dentro: a ausente permanência de quem morreu. No Avô Mariano confirmo: morto amado nunca mais pára de morreu. No Avô Mariano confirmo: morto amado nunca mais pára de morrer. morrer.

(Mia Couto.(Mia Couto.Um rio chamado tempo, uma casa chamada terraUm rio chamado tempo, uma casa chamada terra, dois parágrafos , dois parágrafos iniciais. São Paulo: Companhia das Letras.2003 [2002])iniciais. São Paulo: Companhia das Letras.2003 [2002])

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(...), Me apetece deitar, me anichar na terra macia. Deixo cair ali a (...), Me apetece deitar, me anichar na terra macia. Deixo cair ali a mala onde trago os cadernos.mala onde trago os cadernos.

Uma voz interior me pede para que não pare. É a voz de meu pai que Uma voz interior me pede para que não pare. É a voz de meu pai que me dá força. Venço o torpor e prossigo ao longo da estrada. Mais me dá força. Venço o torpor e prossigo ao longo da estrada. Mais adiante segue um miúdo com passo lento. Nas suas mãos estão adiante segue um miúdo com passo lento. Nas suas mãos estão papéis que me parecem familiares. Me aproximo e, com sobressalto, papéis que me parecem familiares. Me aproximo e, com sobressalto, confirmo: são os meus cadernos. Então, com o peito sufocado, confirmo: são os meus cadernos. Então, com o peito sufocado, chamo: chamo: Gaspar!Gaspar! E o menino estremece como se nascesse por uma E o menino estremece como se nascesse por uma segunda vez. De sua mão tombam os cadernos. Movidas por um segunda vez. De sua mão tombam os cadernos. Movidas por um vento que nascia não do ar mas do próprio chão, as folhas se vento que nascia não do ar mas do próprio chão, as folhas se espalham pela estrada. Então, as letras, uma por uma, se vão espalham pela estrada. Então, as letras, uma por uma, se vão convertendo em grãos de areia e, aos poucos, todos os meus escritos convertendo em grãos de areia e, aos poucos, todos os meus escritos se vão transformando em páginas de terra. se vão transformando em páginas de terra.

(Mia Couto. (Mia Couto. Terra SonâmbulaTerra Sonâmbula, parágrafo final. São Paulo: , parágrafo final. São Paulo: Companhia das Letras.2007 [2002])Companhia das Letras.2007 [2002])