O LÚDICO E SUA RELAVÂNCIA EDUCACIONAL NA … Graciano... · Dedico este trabalho aos meus...
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ANDREA GRACIANO
O LÚDICO E SUA RELAVÂNCIA EDUCACIONAL NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Faculdade de Educação
2008
ANDREA GRACIANO
O LÚDICO E SUA RELAVÂNCIA EDUCACIONAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Trabalho apresentado como requisito para conclusão da Habilitação Infantil à Comissão de professores responsáveis pelo Curso: Profas. Dras. Maria Anita V. Martins, Marisa Del Cioppo Elias, Mônica F. V. Mendes, Neide Aquino Noffs e Neide Barbosa Saisi, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Anita V. Martins.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Faculdade de Educação
2008
Dedico este trabalho aos meus queridos pais Ignes da Paz Graciano e
Gerson Tibúrcio Graciano que sempre incentivou e valorizou a busca pelo
conhecimento.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer á minha família que com muita paciência me acolheu nos
momentos de maior inquietação e nervosismo.
A querida Professora Dra.Maria Anita Viviani Martins que me orientou com
competência, dedicação e respeito.
E aos meus encantáveis alunos que me instigaram a buscar novas formas de
ensinar e aprender com ludicidade.
A todas as colegas de sala, mas em especial a minha grande amiga e companheira
Myriam Ávila que me auxiliou a construir minha historia acadêmica e uma grande e
bela amizade.
“Brincar não é perder tempo, é ganhá-lo.
É triste ter meninos sem escola,
mas mais triste é vê-los enfileirados em salas sem ar,
com exercícios estéreis,
sem valor para a formação humana.”
Carlos Drummond de Andrade
RESUMO
Pretendo neste trabalho apresentar reflexões sobre a relevância educacional
do lúdico no desenvolvimento infantil. Estas reflexões têm por objetivo oportunizar
ao educador a compreensão do significado e da importância das atividades lúdicas
na educação infantil, procurando provocá-lo, para que insira o brincar em seus
projetos educativos, tendo intencionalidade, objetivos e consciência clara de sua
ação em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem infantil. Procuro conceituar
o lúdico, demonstrar sua importância dentro da educação como uma metodologia
que possibilita mais vida, prazer e significado ao processo de ensino e
aprendizagem, tendo em vista que é particularmente poderoso para estimular a vida
social e o desenvolvimento construtivo da criança.
Palavras chaves: Lúdico - Educação - Afetividade
SUMÁRIO Introdução e Justificativa..........................................................................................8 1-Pesquisando Conceitos: Lúdico, Brincar, Brincadeira e Jogo.........................11 2-Estágios no desenvolvimento da brincadeira....................................................14 3-As teorias da brincadeira.....................................................................................18 4-O uso educativo do lúdico...................................................................................21 Considerações finais...............................................................................................24 Referências Bibliográficas......................................................................................26 Anexo:Projeto brinquedos e brincadeiras.............................................................28
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INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
A elaboração deste trabalho surge a partir da necessidade de subsidiar o
educador, para o conhecimento e compreensão das brincadeiras e dos jogos e sua
relevância educacional e social.
Percebe-se que alguns educadores ainda vêem o brincar como uma atividade
“não séria” e simplesmente deixam de usá-lo como uma excelente ferramenta de
trabalho.
O meu objetivo é trazer algumas reflexões a respeito do papel do lúdico no
desenvolvimento infantil. O jogo e a brincadeira são experiências vivenciais
prazerosas. Assim também a experiência da aprendizagem com a sustentação do
lúdico tende a se constituir em um processo vivenciado prazerosamente.
A escola, ao valorizar as atividades lúdicas, ajuda a criança a formar um bom
conceito de mundo, em que a afetividade é acolhida, a sociabilidade vivenciada, a
criatividade estimulada e os direitos da criança respeitados.
“A educação lúdica contribui e influencia na formação da criança,
possibilitando um crescimento sadio, um enriquecimento permanente,
integrando-se ao mais alto espírito democrático enquanto investe em uma
produção séria do conhecimento. A sua prática exige a participação franca,
criativa, livre, crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte
compromisso de transformação e modificação do meio.”
ALMEIDA (1995, P.41)
O brincar implica uma relação cognitiva e representa a potencialidade para
intervir no desenvolvimento infantil, além de ser um instrumento para a construção
do conhecimento escolar, dos processos de socialização e até mesmo da linguagem
do aluno.
“O brinquedo cria na criança uma nova forma de desejos. Ensina-a desejar,
relacionando seus desejos a um “eu” fictício, ao seu papel no jogo e suas
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regras. Dessa maneira, as maiores aquisições de uma criança são
conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível
básico de ação real e moralidade.”
VYGOTSKY (1991 b. P.114)
Para Vygotsky (1991 a ) , a brincadeira, o jogo, é uma atividade específica da
infância, em que a criança recria a realidade usando sistemas simbólicos. Essa é
uma atividade social, com contexto cultural e social. É uma atividade humana
criadora, na qual imaginação, fantasia e realidade interagem na produção de novas
possibilidades de interpretação, de expressão e de ação pelas crianças, assim
como de novas formas de construir relações sociais com outros sujeitos, crianças e
adultos.
Vygotsky (idem) acreditava que o desenvolvimento segue a aprendizagem.
Desde este ponto de vista, o desenvolvimento depende do contexto histórico e social
da criança. As crianças são capazes de realizar tarefas um tanto além do seu nível
de desenvolvimento se lhes é oferecido um estímulo. Este nível de desenvolvimento
que está um pouco além do nível da criança em qualquer momento é chamado de
zona de desenvolvimento proximal (ZDP). Vygotsky (idem) sugere que a brincadeira
representa o funcionamento da criança na ZDP e, portanto, promove o
desenvolvimento.
O brincar permite, ainda, aprender a lidar com as emoções. Pelo brincar, a
criança equilibra as tensões provenientes de seu mundo cultural, construindo sua
individualidade, sua marca pessoal e sua personalidade. Mas, é Piaget que nos
esclarece que o brincar, implica uma dimensão evolutiva com as crianças de
diferentes idades, apresentando características específicas, apresentando formas
diferenciadas de brincar.
Desta forma, a escola deve facilitar a aprendizagem utilizando-se de
atividades lúdicas que criem um ambiente alfabetizador para favorecer o processo
de aquisição de autonomia de aprendizagem. Para tanto, o saber escolar deve ser
valorizado socialmente e a alfabetização deve ser um processo dinâmico e criativo
através de jogos, brinquedos, brincadeiras.
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Com a utilização desses recursos pedagógicos, o professor poderá utilizar-se,
por exemplo, de jogos e brincadeiras em atividades de leitura ou escrita em
matemática e outros conteúdos, devendo, no entanto, saber usar os recursos no
momento oportuno, uma vez que as crianças desenvolvam o seu raciocínio e
construam o seu conhecimento de forma descontraída.
“As contribuições das atividades lúdicas no desenvolvimento integral indicam
que elas contribuem poderosamente no desenvolvimento global da criança e
que todas as dimensões estão intrinsecamente vinculadas: inteligência, a
afetividade, a motricidade e a sociabilidade são inseparáveis, sendo a
afetividade a que constitui a energia necessária para a progressão psíquica,
moral, intelectual e motriz da criança.” NEGRINE (1994, p.19)
As atividades lúdicas têm o poder sobre a criança de facilitar tanto o
progresso de sua personalidade integral, como o progresso de cada uma de suas
funções psicológicas, intelectuais e morais.
Com as atividades lúdicas, espera-se que a criança desenvolva a
coordenação motora, a atenção, o movimento ritmado, conhecimento quanto à
posição do corpo, direção a seguir e outros; participando do desenvolvimento em
seus aspectos biopsicológicos e sociais; desenvolva livremente a expressão corporal
que favorece a criatividade, adquira hábitos de práticas recreativas para serem
empregados adequadamente nas horas de lazer, adquira hábitos de boa atividade
corporal, seja estimulada em suas funções orgânicas, visando ao equilíbrio da saúde
dinâmica e desenvolva o espírito de iniciativa, tornando-se capaz de resolver
eficazmente situações imprevistas.
O presente trabalho está baseado em fundamentação teórica, e tem por
finalidade trazer algumas reflexões a respeito do papel do brincar na educação
infantil.
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1- Pesquisando Conceitos: Lúdico, Brincar, Brincadeira e Jogo.
“A essência de brincadeira é a possibilidade que a criança tem de evidenciar
maneiras simbólicas as motivações, os planos, as intenções, criando uma
nova relação entre situações reais, preenchendo suas próprias
necessidades.” VYGOTSKY (1991 a, p.105)
Ao brincar a criança representa situações do seu dia a dia, da sua experiência
de vida e sua integração com a realidade. O brincar para nós educadores nos revela
como a criança está aprendendo a ser pessoa e a interagir plenamente como ser
único e com o outro,
Segundo Piaget (1975) conceitos como jogo, brincadeira e brincar são
formados ao longo de nossa vivência.
É fundamental esclarecer o significado da palavra “lúdico “uma vez que
pretendo neste trabalho refletir sobre sua importância nos programas de educação
da primeira infância. O ato lúdico está presente nos mais variados momentos das
nossas vidas, no nosso dia a dia.
A palavra lúdico tem sua origem na palavra “ludus”, que do ponto de vista
etimológico, quer dizer “jogo”. Este termo está se referindo ao brincar ,ao jogar,ao
movimento espontâneo .
O brincar é cultural e não é neutro porque retrata padrões existentes em cada
cultura. O que é brincar para um determinado povo para o outro pode representar
um trabalho visando um preparo profissional.
A brincadeira é prazerosa, divertida. Mesmo quando não for acompanhada de
sinais de alegria, não tem objetivos externos ela é mais o desfrute dos meios do que
um esforço no sentido de algum fim em particular. A brincadeira é um momento
espontâneo e voluntário, não é obrigatória, mas escolhida livremente pelos
participantes. Este conjunto de critérios pode não ser conceitualmente puro, mas é
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provavelmente a melhor definição que os educadores podem ter. A brincadeira, em
certo sentido, autodefine-se. ”Ao brincarmos, permitimos e autorizamos-nos a ser autores de nossas
historias utilizando o jogo. Algumas fases de nossa vida que imaginávamos
esquecidas são resgatadas, reelaboradas.
Pelo jogo, observamos e lidamos com a dinâmica de nossas aprendizagens.
”NOFFS (2003, p.154)
O jogo é uma atividade de ocupação voluntária, exercida dentro de certos e
determinados limites de tempo e espaço, seguindo regras livremente consentidas,
mas absolutamente obrigatório dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de
um sentido de tensão, de alegria e de uma consciência de ser diferente da vida
cotidiana.
O lúdico é qualquer atividade que nos dá prazer ao executá-la, o brincar, a
brincadeira e o jogo. Através da ludicidade a criança aprende a conviver, a ganhar e
perder, a esperar sua vez, lidar com as frustrações, conhecer e explorar o mundo.
Ela facilita a convivência entre a criança e o professor.
A ludicidade se processa em torno do grupo como, das necessidades
individuais, recrear é educar, pois permite criar a satisfazer o espírito estático do ser
humano, oferece ricas possibilidades culturais
.
As atividades lúdicas têm um papel fundamental na estruturação do
psiquismo da criança, é no ato de brincar que a criança utiliza elementos da fantasia
e a realidade e começa a distinguir o real do imaginário. E através da ludicidade que
ela desenvolve não só a imaginação, mas também fundamenta afetos, elabora
conflitos e ansiedade, explora habilidades e à medida que assume múltiplos papéis,
fecunda competências cognitivas e interativas.
Através da ludicidade a criança vai estruturando e construindo seu mundo
interior e exterior. As atividades lúdicas podem ser consideradas como meio pelo
qual a criança efetua suas primeiras grandes realizações, que através do prazer, ela
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expressa a si própria e suas emoções e fantasias. Portanto, é de primordial
importância a utilização das brincadeiras e dos jogos no processo pedagógico, pois
os conteúdos podem ser ensinados por intermédio de atividades predominante-
mente lúdicas.
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2-ESTÁGIOS NO DESENVOLVIMENTO DA BRINCADEIRA
Piaget (1971) identificou três estágios na brincadeira das crianças pequenas-
os jogos de exercício, jogos simbólico e os jogos de regras - que são paralelos aos
três estágios do desenvolvimento intelectual identificados por ele-o pensamento
sensório-motor, o pré-operacional e o operacional concreto.
Jogos de exercício
Os jogos de exercício incluem as brincadeiras de manipulação dos bebês e
das crianças até a idade de começarem a caminhar.
Nos jogos de exercício a assimilação é funcional ou repetitiva, por ela temos
que,quando algo se estrutura como forma (se organiza como um sistema),
apresenta a tendência de se repetir funcionalmente, ou seja, caracteriza-se pelo
prazer da função, as crianças no primeiro ano e vida, formam hábitos, na qualidade
de esquemas sensórios-motores. Os hábitos como analisa Piaget, são a principal
forma de aprendizagem no primeiro ano de vida e constituem a base para as futuras
operações mentais.
Os jogos de exercício caracterizam a atividade lúdica da criança no período
de desenvolvimento que Piaget chamou de sensório-motor e que compreende, em
média, os primeiros dezoito meses de vida.
Jogos simbólicos “As funções do jogo simbólico afastam-se cada vez mais do puro exercício: a
compensação, a realização de desejos, a liquidação de conflitos etc. somam-
se incessantemente ao simples prazer de se sujeitar à realidade, a qual
prolonga, por si só o prazer de ser causa inerente ao exercício sensório-
motor” (Piaget, 1971 p.)
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No processo de desenvolvimento da criança, os jogos simbólicos, como
estrutura, vêm depois dos jogos de exercício, e caracterizam-se por seu valor
analógico, ou seja, por se tratar “A” como se fosse “B”, ou vice-versa. Trata-se,
portanto de repetir, como conteúdo, o que a criança assimilou como forma nos jogos
de exercício. Agir como a mãe, em uma brincadeira de boneca, por exemplo,
significa repetir, por analogia, o que a mãe fez com ela tantas vezes em seu primeiro
ano de vida. Significam também poder aplicar, agora como conteúdo, as formas dos
esquemas de ação que assimilou em seus jogos de exercícios.
Os jogos simbólicos caracterizam-se pela assimilação deformante (Piaget,
1971). Deformante porque nessa situação a realidade é assimilada por analogia,
como a criança pode ou deseja. Isto é, os significados que ela atribui aos conteúdos
de suas ações,quando joga ,são deformações –maiores ou não –dos significados
correspondentes na vida social ou física. Graças a isso, pode compreender as
brincadeiras, afetiva ou cognitivamente, segundo os limites de seu sistema cognitivo.
As fantasias ou mitos, que a criança inventa ou que escuta várias vezes e a
encantam, são igualmente expressões dessa assimilação deformante. Fantasiando
ou mitificando a criança pode compreender, a seu modo, os temas presentes nessas
fantasias .Este processo favorece a integração da criança a um mundo social cada
vez mais complexo.
Essas construções realizadas no contexto dos jogos simbólicos e as
regularidades adquiridas nos jogos de exercício serão fontes das futuras operações
mentais.
Jogos de regra
A importância estrutural dos jogos de regra corresponde a seu valor
operatório. Nessa estrutura de jogos, fazer no sentido de conseguir e compreender
são complementares e implicam a assimilação recíproca de esquemas.
Os jogos de regra contêm como propriedades fundamentais de seu sistema,
as duas características herdadas das estruturas anteriores.
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Mas há algo que é original e próprio à estrutura dos jogos de regra: seu
caráter coletivo. Ou seja, nessa estrutura só se pode jogar em função da jogada do
outro. Os jogadores, nesse sentido, sempre dependem um do outro. Por isso a idéia
de assimilação recíproca.
Nos jogos de regra o valor lúdico das ações continua tendo uma importância
fundamental. O tempo, o espaço, os critérios de vitória ou derrota, etc., são limites,
ainda que arbitrários, que regulam as condutas recíprocas dos participantes do jogo.
O jogo de regras é necessário para que as convenções sociais e os valores
morais de uma cultura sejam transmitidos.
As estratégias de ação, a tomada de decisão, a análise dos erros, lidarem
com perdas e ganhos, replanejar jogadas em função dos movimentos dos
adversários, tudo isso é importante para o desenvolvimento das estruturas
cognitivas de cada pessoa. O jogo provoca conflitos internos, a necessidade de
buscar uma saída, e é desses conflitos que o pensamento sai enriquecido,
reestruturado e apto para lidar com novas transformações.
Baseadas em tais informações, concluímos que, ao jogar, a criança constrói
conhecimento. E para isto uma das qualidades mais importantes do jogo é a
confiança que a criança tem, quanto à própria capacidade de encontrar soluções.
O jogo é a forma que as crianças encontram para representar o contexto em
que estão inseridas. Através do lúdico, a criança realiza aprendizagem significativa,
favorecendo a sua preparação para a vida, assimilando a cultura do meio em que
vive, a ele se entregando, adaptando-se às condições que o mundo lhe oferece e
aprendendo a competir, cooperar e a conviver como um ser social.
Nos educadores podemos observar nossos educandos enquanto brincam
para determinar o nível em que se encontra em vários ambientes. Pode-se também
intervir nessas brincadeiras modificando o ambiente, adicionando materiais,
propondo questões para as crianças que estão brincando ou mesmo participar do
jogo momentaneamente para fazê-lo progredir, mas sempre lembrando que esta
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intervenção precisa ser conduzida com sensibilidade, permitindo às crianças
manterem o controle daquilo que estão fazendo, a fim de que continue a ser uma
verdadeira brincadeira.
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3-AS TEORIAS DA BRINCADEIRA
Piaget (1975) acreditava que o desenvolvimento do intelecto humano envolve
dois processos relacionados: acomodação e assimilação. Juntos estes dois
processos criam um equilíbrio, que representa o estado do conhecimento de um
indivíduo em um momento específico. No processo de assimilação, os indivíduos
abstraem informações do mundo externo e as constituem em esquemas
organizados que representam o que eles já sabem. Eles também se acomodam ao
novo conhecimento, modificando seus esquemas de organização, quando estes não
são consistentes com a nova informação. A conseqüência destes dois processos é
um estado de equilíbrio. Segundo Piaget (idem), brincar é uma forma de acionar o
mundo externo para que ele se acomode nos esquemas de organização atuais de
uma pessoa. Assim sendo, ele tem uma função vital no intelecto em
desenvolvimento da criança e se mantém, em certo grau, sempre presente no
comportamento humano.
O brincar é uma atividade que oferece prazer. O prazer lúdico seria a
expressão afetiva da adaptação do eu do individuo ao seu mundo vida.
“Resgatando o brincar prazeroso, a alegria se faz presente e o fazer do
professor lentamente se transforma.....Brincar para produzir textos orais e
escritos,reorganizar o espaço dos brinquedos,agrupá-los,reordená-los,tornar
a brincar,conhecer apropriar-se de um saber.....brincar ,pensar, compartilhar,
conhecer, significar ,saber, aprender são ingredientes para a construção”
NOFFS(2003,p.153)
Lev S.Vygotsky (1991) acreditava que as crianças formam estruturas mentais
pelo uso de instrumentos e sinais. A brincadeira, a criação de situações imaginárias,
surge da tensão entre o indivíduo e a sociedade. As crianças podem usar objetos
para representar coisas diferentes do que eles realmente são. Uma vassoura pode
se tornar um cavalo e um pedaço de mangueira pode ser uma bomba de gasolina.
Na brincadeira, os significados são libertados de seus objetos e ações relacionadas,
de forma que as crianças podem utilizar processos de pensamento de ordem
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superior. Assim, o jogo de faz-de-conta assume um papel central na aquisição da
linguagem e das habilidades de solução de problemas por parte das crianças.
Segundo ele a brincadeira cria para a criança uma “zona de desenvolvimento
proximal”.Essa zona não é outra coisa senão a distancia entre o nível atual de
desenvolvimento, determinado pela capacidade de resolver independentemente um
problema, e o nível atual de desenvolvimento potencial determinado através da
resolução de um problema sob a orientação de um adulto ou com a colaboração de
um companheiro mais capaz.
Por meio das atividades lúdicas, a criança reproduz muitas situações vividas
em seu cotidiano, as quais, pela imaginação e pelo faz de conta, são reelaboradas.
Esta representação do cotidiano se dá por meio da combinação entre experiências
passadas e novas possibilidades de interpretações e reproduções do real, de acordo
com suas afeições, necessidades, desejos e paixões.
Freud considerava a brincadeira como uma atividade catártica que permite ás
crianças controlarem situações difíceis, livrando-se de sentimentos com os quais ela
não consegue lidar. Segundo ele o conteúdo da brincadeira é fortemente afetivo.
As crianças usam as brincadeiras de fantasia para desempenharem papeis
adultos, obtendo um sentimento de controle que lhes permite enfrentar as situações
reais. Pelas brincadeiras, elas podem reviver ocorrências dolorosas e dominar a dor,
lidando com ela na fantasia da situação de jogo. Este mesmo domínio na fantasia
também pode ajudar as crianças a lidarem com os elementos afetivos das situações
mais positivas da vida.
A atividade lúdica contribui para o surgimento da afetividade. O ambiente
descontraído, a atividade prazerosa, proporciona momentos para que os educandos
se conheçam melhor e, conseqüentemente, tenham oportunidades de encontrarem
no outro atitudes e habilidades que causem admiração, que combinem com a sua
maneira de pensar, que causem vontade de conhecer melhor o outro.
São caminhos para construir amizades, caminhos para a interação com o
outro.
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Para Winnicott(1971), a criança adquire experiência brincando. A brincadeira
é uma parcela importante de sua vida. As experiências, tanto externas quanto
internas, podem ser férteis para o adulto, mas, para a criança, essa riqueza
encontra-se principalmente na brincadeira e na fantasia. Tal como a personalidade
dos adultos se desenvolve por meio de suas experiências de vida, assim a das
crianças se desenvolve por intermédio de suas brincadeiras e das invenções de
brincadeiras feitas por outras crianças e por adultos.
Ainda para Winnicott (idem), a brincadeira é um dos métodos característicos
da manifestação infantil, um meio para perguntar e para explicar.Por meio dos jogos
e brincadeiras, a criança apresenta emoções primárias, como alegria, tristeza e
cólera. À medida que se desenvolve, apresenta emoções ligadas à estimulação
sensorial- dor, prazer, desprazer -, cresce, e seu emocional começa a ser controlado
ou, mesmo, disfarçado. As emoções estão ligadas ao mal ou bem-estar no grupo em
que a criança está inserida, sendo que a afetividade é, em parte, responsável pelas
características da personalidade de cada uma. Alguns autores sócio-interacionistas
dizem que o ser humano se desenvolve por meio da interação social, sendo que a
criança constrói seu conhecimento enquanto sujeito na interação com o adulto ou
com outra criança. Nesse processo, as atividades lúdicas têm sido ferramenta
importante para o desenvolvimento biopsíquico e social da criança.
As teorias do brincar sugerem que as atividades lúdicas, o jogo, o brincar, o
brinquedo, tem conseqüências significativas para o desenvolvimento infantil, que são
consistentes com objetivos básicos da educação da primeira infância. Nossa
preocupação enquanto educador deve ser com o conteúdo das atividades lúdicas, e
como movê-las nas direções desejadas. Devemos transformar o brincar em trabalho
pedagógico para que experimentem, como mediadores, o verdadeiro significado da
aprendizagem com desejo e prazer.
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4-O USO EDUCATIVO DO LÚDICO
As teorias discutidas acima nos trazem subsídios enquanto educador para a
compreensão da importância do brincar na formação do educando. No brincar está
na gênese do pensamento, da descoberta de si mesmo, da possibilidade de
experimentar, de criar e de transformar o mundo. Um entendimento destas teorias
pode nos permitir o uso das brincadeiras em situações pedagógicas.
“A educação lúdica contribui e influencia na formação da criança,
possibilitando um crescimento sadio, um enriquecimento permanente,
integrando-se ao mais alto espírito democrático enquanto investe em uma
produção séria do conhecimento. A sua prática exige a participação franca,
criativa, livre, crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte
compromisso de transformação e modificação do meio.”
ALMEIDA (1995, P.41)
Macedo (2005) defende a reintrodução das atividades lúdicas na escola. A
proposta do autor nos remete a pensar numa ação educativa que considere as
relações entre a escola, o lazer e o processo educativo como um dos caminhos a
serem trilhados em busca de um futuro diferente. Por isso, vê-se como positiva a
presença do jogo, do brinquedo, das atividades lúdicas nas escolas, nos horários de
aulas, como técnicas educativas e como processo pedagógico na apresentação dos
conteúdos.
“A inclusão do jogo infantil nas propostas remete-nos para as necessidades
de seu estudo nos tempos atuais. KISHIMOTO (2001, P.39)
As vivências cotidianas, aliadas ao pensamento de alguns teóricos, como
Macedo, Freud, Piaget, Vygotsky,permitem-nos aprofundar as reflexões sobre o
conhecimento construído por meio da ludicidade que implica uma escola mais
autônoma e democrática.
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A escola, ao valorizar as atividades lúdicas, ajuda a criança a formar um bom
conceito de mundo, em que a afetividade é acolhida, a sociabilidade vivenciada, a
criatividade estimulada e os direitos da criança respeitados.
Enquanto a aprendizagem é vista como apropriação e internalização de
signos e instrumentos num contexto sociointeracionista, o brincar é a apropriação
ativa da realidade por meio da representação. Desta forma, brincar é análogo a
aprender.
Assim, o trabalho a partir da ludicidade abre caminhos para envolver todos
numa proposta interacionista, oportunizando o resgate de cada potencial. A partir
daí, cada um pode desencadear estratégias lúdicas para dinamizar seu trabalho
que, certamente, será mais produtivo, prazeroso e significativo.
É por intermédio da atividade lúdica que a criança se prepara para a vida,
assimilando a cultura do meio em que vive, a ela se integrando, adaptando-se às
condições que o mundo lhe oferece e aprendendo a competir, cooperar com seus
semelhantes e conviver como um ser social.Além de proporcionar prazer e diversão,
o jogo, o brinquedo e a brincadeira podem representar um desafio e provocar o
pensamento reflexivo da criança.Assim, uma atitude lúdica efetivamente oferece aos
alunos experiências concretas, necessárias e indispensáveis às abstrações e
operações cognitivas.
“A concepção do brincar não deve se restringir a play-ground ou
brinquedoteca, o brincar vai além do lugar, brincar como forma de
desenvolver a autonomia das crianças requer uso livre de brinquedos e
materiais, que permite a expressão dos projetos criados pelas crianças”.
KISHIMOTO ( 1997, p. 35-6)
O brincar pode e deve ser contemplado em uma proposta pedagógica que
incorpore o lúdico como eixo do trabalho infantil, desde que conte com profissionais
que estejam comprometidos com a prática educacional
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O lúdico é essencial para uma escola que se proponha não somente ao
sucesso pedagógico, mas também à formação do cidadão, porque a conseqüência
imediata dessa ação educativa é a aprendizagem em todas as dimensões: social,
cognitiva, relacional e pessoal.
“A importância da intervenção deliberada de um individuo sobre outros como
forma de promover o desenvolvimento articula-se com um postulado básico
de Vigotsky: a aprendizagem é fundamental para o desenvolvimento desde o
nascimento da criança. A aprendizagem desperta processos internos de
desenvolvimento que só pode ocorrer quando o indivíduo interage com outras
pessoas.” DANTAS (1992, P.33)
Jogos bem elaborados e explorados podem ser vistos como uma estratégia
de ensino, podendo atingir diferentes objetivos que variam desde o simples
treinamento, até a construção de um determinado conhecimento.
“A aprendizagem através de jogos, como dominó, palavras cruzadas,
memória e outros permite que o aluno faça da aprendizagem um processo
interessante e até divertido. Para isso, eles devem ser utilizados ocasionalmente
para sanar as lacunas que se produzem na atividade escolar diária. Neste sentido
verificamos que há três aspectos que por si só justificam a incorporação do jogo nas
aulas. São estes: o caráter lúdico, o desenvolvimento de técnicas intelectuais e a
formação de relações sociais”. LARA (2004, p.23).
De acordo com o Referencial Curricular da Educação Infantil (1998, p.23),
educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e
aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o
desenvolvimento das capacidades infantis.Capacidades essas de relação
interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação,
respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da
realidade social e cultural.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das reflexões contidas neste trabalho e no relato de experiência
vivenciada no contexto escolar, procuro compreender questões relevantes para o
desenvolvimento infantil numa postura lúdica objetivando a aquisição do
conhecimento e assegurando melhor aproveitamento do brincar no projeto
educativo.
Sendo educadora acredito que mais importante do que ficar buscando
definições sobre os termos brincar, jogar, brincadeira é compreender a sua
amplitude na organização do planejamento do dia a dia na sala de aula visando à
aprendizagem de uma forma mais prazerosa e significativa.
Cabe ao educador por meio da observação perceber que aprendizagens
estão presentes nos momentos lúdicos vivenciados em diferentes atividades. Refletir
como organizar sua sala de aula com materiais que vão realmente interessar,
estimular e motivar as crianças; como monitorar e avaliar o que elas estão
aprendendo, fazendo e quais as suas atitudes em relação às tarefas
desempenhadas.
Aceitar o valor do brincar que deve ser adequadamente compreendido e
oportunizado dada a sua inquestionável importância por possibilitar o
desenvolvimento de estruturas mentais que levam à aquisição de capacidades e
competências cognitivas.
O brincar pode ser livre e exploratório ou dirigido, no entanto, o fundamental é
que leve a criança a progredir em sua aprendizagem, visando ampliar novos
conhecimentos.
As crianças aprendem brincando, pois este é um ato natural na sua vida. O
brincar é vital e motivador para a criança por desempenhar uma função recreativa.
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Entendo que o brincar está naturalmente associado à criatividade, pois as
crianças necessitam de usar habilidades, tentar solucionar problemas, criar e recriar
idéias e imagens sobre a realidade ampliando seu domínio cognitivo e afetivo.
Portanto, no ambiente escolar o lúdico dará subsídios ao educador a
compreender e aprender sobre as necessidades infantis fornecendo indicadores do
desenvolvimento geral dos educandos. Dará ao educador diretrizes para promover e
estimular novas aprendizagens num ambiente facilitador e significativo.
Sendo assim, com este trabalho procurei refletir e aprimorar idéias sobre a
importância da atividade lúdica no desenvolvimento infantil.
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REFERÊCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALMEIDA, Paulo Nunes de. Educação lúdica: técnicas e jogos pedagógicos.
São Paulo: Loyola, 1995.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação
Fundamental. ”Referencial Curricular nacional para a Educação Infantil”l.
Brasília, 1998. V2.
DANTAS, Heloysa. ”Brincar e trabalhar”. In: Kishimoto, Tizuko Morchida (org.)
Brincar e suas teorias. São Paulo :Pioneira, 2002
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28
Anexo: Relatando atividade lúdica: Uma historia pessoal
Projeto: Brinquedos e Brincadeiras
Esta proposta pedagógica foi desenvolvida numa escola da rede particular de
ensino com crianças na faixa etária de quatro á seis anos de idade.
O projeto surgiu em função da observação constante do dia a dia da nossa
sala de aula.
Este trabalho foi realizado em parceria com os pais; inicialmente fizemos uma
pesquisa para sabermos quais as brincadeiras que brincavam quando criança. Com
quem aprenderam? Com quem brincavam? Qual o sentimento de relembrar estes
momentos especiais? Após este levantamento em conjunto com as crianças
escolhemos as brincadeiras que seus pais brincaram quando criança e a partir deste
ponto iniciamos a pesquisa sobre os brinquedos e brincadeiras. Em conjunto com a
pesquisa teórica fizemos uma pesquisa de campo no museu do brinquedo localizado
na USP.
A avaliação foi feita da seguinte forma; dividimos as crianças em grupos, onde
cada grupo demonstrava uma brincadeira e em seguida os pais eram convidados a
participarem; no final foi realizada uma oficina para a construção de alguns
brinquedos.