O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

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O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA Neste capítulo, estuda-se o leigo como homem da Igreja no mundo e homem do mundo na Igreja. Conforme foi visto no capítulo anterior, o batismo incorpora a Cristo, e com isso torna o batizado membro da Igreja: A fidelidade e coerência com as riquezas e exigências do seu ser lhe conferem a identidade de homem de Igreja no coração do mundo e de homem do mundo no coração da Igreja. De fato, o leigo se situa por vocação na Igreja e no mundo. Membro da Igreja, fiel a Cristo, acha-se comprometido na construção do Reino em sua dimensão temporal 170 . Como explicitação do tema, o capítulo divide-se nos seguintes pontos: os serviços do leigo como Igreja: ad extra e ad intra; a questão dos ministérios; o leigo e a nova evangelização; atuação social e liberdade; espiritualidade laical; matrimônio; o leigo: fundamental para a evangelização; a relação dos leigos com a hierarquia; a relação dos leigos com os consagrados. 3.1 Os serviços do leigo como Igreja: ad extra e ad intra Entendem-se por ad intra os serviços prestados pelos leigos à Igreja, e que estejam necessariamente ligados à sua estrutura. E, os serviços ad extra são aqueles prestados pelos fiéis leigos que não estejam ligados ou que não necessitam estar ligados à estrutura da Igreja. 170 DP 786-787

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O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA - TEOLOGIA - MISSÃO LAICAL - PAPA JOÃO PAULO II

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O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA

IGREJA

Neste capítulo, estuda-se o leigo como homem da Igreja no mundo e homem do

mundo na Igreja. Conforme foi visto no capítulo anterior, o batismo incorpora a Cristo,

e com isso torna o batizado membro da Igreja:

A fidelidade e coerência com as riquezas e exigências do seu ser lhe

conferem a identidade de homem de Igreja no coração do mundo e de

homem do mundo no coração da Igreja. De fato, o leigo se situa por

vocação na Igreja e no mundo. Membro da Igreja, fiel a Cristo, acha-se

comprometido na construção do Reino em sua dimensão temporal170

.

Como explicitação do tema, o capítulo divide-se nos seguintes pontos: os

serviços do leigo como Igreja: ad extra e ad intra; a questão dos ministérios; o leigo e a

nova evangelização; atuação social e liberdade; espiritualidade laical; matrimônio; o

leigo: fundamental para a evangelização; a relação dos leigos com a hierarquia; a

relação dos leigos com os consagrados.

3.1 Os serviços do leigo como Igreja: ad extra e ad intra

Entendem-se por ad intra os serviços prestados pelos leigos à Igreja, e que

estejam necessariamente ligados à sua estrutura. E, os serviços ad extra são aqueles

prestados pelos fiéis leigos que não estejam ligados ou que não necessitam estar ligados

à estrutura da Igreja.

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DP 786-787

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Pode-se entender que não basta que o leigo esteja no mundo e conheça a sua

missão. É preciso, antes de tudo, que ele aja nele, pois a tarefa não é de caráter

decorativo, e sim um compromisso com a promoção humana, a promoção da justiça.

João Paulo II afirma que os “trabalhadores da vinha são todos os membros do povo de

Deus: os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, os fiéis leigos, todos simultaneamente

objeto e sujeito da comunhão da Igreja e da participação na sua missão de salvação”171

.

O leigo atua, de diversas formas, na Igreja, cada um segundo sua vocação, entre

as atividades exercidas. João Paulo II dá acento especial aos catequistas, sem deixar de

reconhecer as várias outras contribuições dadas pelos fiéis leigos. Diz o Pontífice:

Na atividade missionária, devem-se valorizar as várias expressões do

laicato, respeitando sua índole e finalidade.(...) Entre os leigos, que se

tornam evangelizadores, contam-se, em primeiro lugar, os catequistas.

O decreto missionário define-os como sendo „aquele exército tão

benemérito da obra das missões entre os pagãos (...) que, penetrados de

espírito apostólico, prestam, com seus relevantes serviços, um singular

e indispensável auxílio à causa da propagação da fé e da Igreja172

.

Segundo o Papa Wojtyla,

ao lado dos catequistas, é preciso recordar outras formas de serviços à

vida da Igreja e à missão, e, por conseguinte, outros operadores:

animadores da oração, do canto e da liturgia; chefes de comunidades

eclesiais de base e de grupos bíblicos; encarregados das obras

caritativas; administradores dos bens da Igreja; dirigentes das várias

associações de apostolado; professores de religião nas escolas. Todos os

fiéis leigos devem oferecer à Igreja uma parte do seu tempo, vivendo,

com coerência, a própria fé173

.

O Concílio Vaticano II faz referência ao leigo assim:

Cada leigo individualmente deve ser perante o mundo uma testemunha

da ressurreição e vida do Senhor Jesus e sinal do Deus vivo. Todos

juntos e cada um na medida das suas possibilidades devem alimentar o

171

Cf. CfL 55. 172

JOÃO PAULO II. Carta encíclica Redemptoris Missio. São Paulo: Paulinas, 1991. 72-73. 173

Id., ibid., 74.

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mundo com frutos espirituais174

. Devem difundir no mundo aquele

espírito pelo qual são animados os pobres, os mansos e os pacíficos que

o Senhor no Evangelho proclamou bem-aventurados175

. Numa palavra,

„o que a alma é no corpo, isto sejam no mundo os cristãos‟176

.

SegundoYves Congar a Igreja aparece como sendo essencialmente missionária. Eis

suas palavras:

O tempo da Igreja, isto é, o que decorre entre a ascensão do Senhor e

sua volta entre a Páscoa e a parusia de Jesus Cristo é essencialmente

tempo de missão e de apostolado (cf. At 1,7-8). Por conseguinte, é

tempo da palavra, de anúncio e de conversão. Trata-se de levar sem

cessar para frente a realização do plano de salvação de Deus. A palavra

bíblica, a palavra cristã, tem isso por lei177

.

Seguindo ainda sua reflexão Congar acentua:

Os cristãos seculares exercem um apostolado múltiplo, tanto na Igreja

como no mundo. Em ambas as ordens se abrem vários campos de

atividade apostólica, dos quais queremos recordar aqui os principais:

são as comunidades da Igreja, a família, a juventude, o âmbito social, as

ordens nacional e internacional178

.

Paulo VI já chamava a atenção para a importância da missão do leigo, definindo-

a em seu campo de atuação179

.

174

Cf. Gl 5,22. 175

Cf. Mt 5,3-9. 176

LG 38. 177

CONGAR, Yves. Se sois minhas testemunhas – três conferências sobre o laicato, a Igreja e o mundo.

São Paulo: Paulinas, 1967, p. 95. 178

Cf. CONGAR, Y et al. El apostolado de los laicos. Madrid: Studium, 1973, p. 28.

179 “Os leigos, a quem a sua vocação específica coloca no meio do mundo e à frente de tarefas as mais

variadas na ordem temporal, devem também eles, através disso mesmo, atuar uma singular forma de

evangelização. A sua primeira e imediata tarefa não é a instituição e o desenvolvimento da comunidade

eclesial-esse é o papel específico dos Pastores – mas sim, o pôr em prática todas as possibilidades cristãs

e evangélicas escondidas, mas já presentes e operantes, nas coisas do mundo” (PAULO VI. Exortação

Apostólica sobre a evangelização no mundo contemporâneo Evangelii Nuntiandi. São Paulo: Paulinas,

1976. 70).

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Com a urgência da missão no mundo e na Igreja, o leigo ocupa um lugar de

destaque.

A Igreja conta com os cristãos leigos, que, no auxílio aos ministros ordenados,

ajudam a difundir a obra redentora de Jesus Cristo. “Ao anunciar e ao acolher o

Evangelho na força do Espírito, a Igreja torna-se comunidade evangelizada e

evangelizadora, precisamente por isso faz-se serva dos homens”180

.

A vocação leiga é, antes de tudo, um dos elementos de união com Deus. Ele é

quem chama a trabalhar para a Igreja, amá-la, sentir-se inserido em seu povo181

.

João Paulo II dá sempre uma conotação forte ao verdadeiro sentido da vida do

cristão leigo. Sua importância para a vida da Igreja, no desempenho de suas tarefas na

mesma, se faz necessária e até indispensável para a propagação do Evangelho. João

Paulo II lembra que novas situações, tanto eclesiais como sociais, econômicas, políticas

e culturais, reclamam hoje, com uma força toda particular, a ação dos fiéis leigos. Se o

desinteresse foi sempre inaceitável, o tempo presente torna-o ainda mais culpável. Não é

lícito a ninguém ficar inativo182

.

É dever dos pastores a promoção e o reconhecimento das funções dos leigos,

distintos dos ministros ordenados. Esses fiéis, podem exercer funções muito

semelhantes à deles, no oficio da Igreja: orações litúrgicas, como ministro

extraordinário da Eucaristia, ministro extraordinário do Batismo, na liturgia, etc. Porém,

180

CfL 36.

181 “A vocação e a missão dos fiéis leigos só pode compreender à luz de uma renovada consciência da

Igreja „como sacramento, ou sinal e instrumento da íntima união com Deus e de unidade de todo o gênero

humano” (LG 1) é do dever pessoal aderir mais livremente a ela. A Igreja é um mistério de comunhão

que tem origem na vida da Santíssima Trindade. É o Corpo místico de Cristo. É o povo de Deus, que

unido com a mesma fé, esperança e caridade, caminha na história rumo à definitiva pátria celeste. E nós,

como batizados, somos membros vivos deste maravilhoso e fascinante organismo, alimentado pelos dons

Sacramentais, hierárquicos e carismáticos que são co-necessários. Por isso, hoje mais que nunca é

necessário que os cristãos, iluminados e conduzidos pela fé, conheçam a Igreja como ela é, em toda sua

beleza e Santidade, para senti-la e amá-la como a própria mãe. E por fim é importante despertar em todo

povo de Deus o verdadeiro sensus ecclesiae, unido à íntima consciência de ser Igreja, mistério de

comunhão”( “Messagio del Santo Padre Giovanni Paolo II, ai participanti al congresso del laicato

cattolico, dal Vaticano, 21 novembre 2000. Capturado em 06 de novembro de 2003. On line Disponível

na Internet:http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/speeches/2000/oct-dec/documents/hf_jp-

ii_spe_20001125_jubilee-laity_it.html).

182

CfL 3.

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João Paulo II adverte que o exercício de semelhante tarefa não transforme o fiel leigo

em pastor183

.

O leigo é um homem da Igreja, inserido no mundo com a tarefa de construir o

Reino de Deus. Pois, além de ser um homem da Igreja, primeiro ele é um homem de

Deus. A Igreja de Deus está no mundo; por isso, o leigo é alguém que está na Igreja e

no mundo. E por essa razão, tem de desenvolver a missão é própria da Igreja que é

evangelizar e preparar as pessoas, que são membros de Cristo, para a salvação. Segundo

W. Amado, “ele o leigo se situa, por vocação, na Igreja e no mundo. E sua primeira

tarefa é construir o Reino de Deus a partir do engajamento nas realidades do mundo”

184.

Leiamos a reflexão que faz a CNBB acerca desse problema:

A missão dos leigos na sociedade é conhecida: „O campo próprio de sua

atividade evangelizadora é justamente o vasto e complicado mundo da

política, da realidade social e da economia, como também o da cultura,

das ciências e das artes, da vida internacional, dos „mass media‟, e ainda

outras realidades abertas à evangelização, como sejam o amor, a

família, a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho

profissional e o sofrimento185

.

Pode-se contar com as várias possibilidades de serviços possíveis de serem

exercidos pelos leigos, em várias instâncias da Igreja. O Documento de Puebla lembra:

A Igreja, para o cumprimento de sua missão, conta com diversidade de

ministérios. Ao lado dos ministérios hierárquicos, a Igreja reconhece o

lugar dos ministérios desprovidos de ordem sagrada. Portanto, também

os leigo, podem sentir-se chamados ou ser chamados a colaborar com

seus pastores no serviço à comunidade eclesial, para o crescimento e

vida da mesma, exercendo ministérios diversos, conforme a graça e os

carismas que ao Senhor aprouve conceder-lhes Os ministérios que se

podem conferir a leigos são serviços realmente importantes na vida

eclesial (p. ex, no plano da palavra, da liturgia ou da direção da

183

Id., ibid., 23. 184

AMADO W.Vocação, missão e organização dos leigos na Igreja e no mundo. Teocomunicação, Porto

Alegre, v. 20, n. 89, p. 271-272, jun. 1990.

185

Diretrizes gerais da ação pastoral da Igreja no Brasil. Doc. n. 45. CNBB . 263.

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60

comunidade), exercidos pelos leigos com estabilidade e que foram

reconhecidos publicamente e a eles confiados por quem tem a

responsabilidade na Igreja186

.

O testemunho de vida é o que o mundo espera como resposta às afirmações

sobre o Reino. Isto é, cada cristão leigo deve viver sua vida, de acordo com as propostas

do Evangelho, deixando, assim, através do seu trabalho prestado à Igreja, transparecer

toda a bondade de Deus. O serviço eclesial dos leigos torna-se motivo de crescimento e

de testemunho de fé para toda a comunidade. Por isso, nas várias vocações, nos vários

modos de prestar serviços, sejam encontradas atribuições em que cada um dos fiéis

leigos possa assumir seu verdadeiro lugar de agente da missão.

A identificação da missão do leigo no mundo se dá da mesma forma como se dá

a identificação da missão da Igreja, ou seja, o leigo não existe para si; pois, se assim

fosse, sua existência não seria mais que um egoísmo, inútil para a sociedade, embora a

sociedade moderna tenda para tal comportamento. Assim sendo, o leigo acaba

encontrando respaldo para sua missão, tanto no mundo como na Igreja: “A Igreja existe

em si, mas não para si mesma. Tem uma missão no mundo e para o mundo, que inclui

agir sobre ele de maneira a ordená-lo, o mais possível, segundo a vontade de Deus e

orientá-lo para Deus”187

.

Segundo Wolmir Amado,

a atuação e destaque do leigo no mundo não podem nos levar ao

dualismo de afirmar: aos leigos o mundo, ao clero a Igreja. Pelo

contrário, a Igreja, enquanto parcela do mundo, também é lugar da

presença do leigo. E fala o documento Christifideles Laici que os leigos

não só pertencem à Igreja, mas são Igreja. Além disso, contribuem para

construir a Igreja. Especialmente atuando nas múltiplas formas de

apostolado188

.

Assim, ele, o leigo, ajuda a hierarquia da Igreja a construir e edificar o Reino de

Deus, tornando-a cada vez mais instrumento de salvação.

186

DP 804-805. 187

CONGAR, Yves. Se sois minhas testemunhas. Três conferências sobre o laicato, a Igreja e o mundo.

São Paulo: Paulinas, 1967, p. 74. 188

AMADO, Vocação..., loc. cit., p. 272.

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O lugar do serviço do leigo é no mundo e na Igreja, serviço ad extra e serviço ad

intra para o Reino. Por isso, ele é chamado a atuar onde há necessidade. Segundo W.

Amado, a atuação e destaque do leigo no mundo não podem nos levar ao dualismo de

afirmar: aos leigos o mundo, ao clero a Igreja. Pelo contrário, a Igreja, enquanto parcela

do mundo, também é lugar da presença do leigo189

.

O Documento de Puebla, em suas conclusões sobre esse tema, deixa explícito

que todo o leigo é chamado para essa tarefa:

Fazemos um apelo urgente aos leigos para que se comprometam na

missão evangelizadora da Igreja, missão da qual a promoção da justiça

é parte integrante e indispensável e que mais diretamente diz respeito à

tarefa leiga, sempre em comunhão com os pastores. Exortamos a uma

presença organizada do laicato nos diversos setores pastorais, o que

supõe a integração e coordenação dos diversos movimentos e serviços

dentro de um plano de pastoral orgânica do setor leigo. Convidamos os

pastores a terem especial consideração pelo laicato organizado, com

vistas à ação eclesial, prestando-lhe a adequada assistência pastoral e o

devido apreço de seu papel na pastoral global da Igreja190

.

De fato, a missão do leigo como cristão é a de, sempre que possível, estar à

disposição de servir nos variados setores da vida da Igreja. Segundo a CNBB,

o Concílio Vaticano II, o Sínodo sobre os Cristãos Leigos e o

ensinamento do Magistério apontam fortemente para um novo perfil da

Igreja, aberta à presença ativa dos leigos, „que tem seu fundamento

sacramental no Batismo e na Confirmação, bem como, para muitos

deles, no Matrimônio‟. Eles são insistentemente chamados a viverem

sua vocação e assumirem sua missão, quer na Igreja, quer na sociedade.

À luz de tais orientações, torna-se necessário reexaminar a prática

eclesial com relação à vocação e à missão dos leigos, bem como em

relação à sua formação191

.

São muitas as funções que podem ser exercidas na Igreja pelos leigos. Por sua

condição de batizados, eles podem ser convocados ou sentir-se chamados a participarem

com mais intensidade desses trabalhos. Sobre esse aspecto João Paulo II lembra:

189

AMADO. Vocação..., loc. cit., p. 272. 190

D 827-829. 191

Diretrizes gerais da ação pastoral da Igreja no Brasil. Doc. n. 45. CNBB. 259.

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É necessário, portanto, que os fiéis leigos se conscientizem de sua

dignidade de batizados. Por seu lado, os pastores tenham profunda

estima do testemunho e da ação evangelizadora dos leigos que,

inseridos no povo de Deus com espiritualidade de comunhão, conduzem

os irmãos ao encontro com Jesus Cristo vivo192

.

De acordo com cada carisma, devem ser distribuídas as tarefas. Não é lícito

pretender que todos, de modo geral, possam exercer as mesmas funções, pois as

habilidades são diferentes e as condições humanas também. Os pastores não devem

pretender ser substituídos em suas funções que lhes são próprias. Tampouco os fiéis

leigos devem sentir-se pastores, por estarem exercendo funções que encerram algum

tipo de semelhança com as funções dos ministros ordenados.

Dado importante é o da não-substituição, ou seja, o sacerdote não pode ser

substituído por um leigo, pois sua condição é única. O leigo não possui o poder de

Ordem e, portanto, não pode exercer funções atribuídas expressamente ao ministro

ordenado.As funções que podem ser exercidas pelos leigos não são de caráter exclusivo

dos clérigos:

É, pois, necessário, em primeiro lugar, que os pastores, ao reconhecer e

ao conferir aos fiéis leigos os vários ministérios, ofícios e funções,

tenham o máximo cuidado em instruí-los sobre a raiz batismal dessas

tarefas. Igualmente os pastores deverão zelar para que se evite um

recurso fácil e abusivo a presumíveis „situações de emergência‟ ou de

„necessidade de suplência‟, onde objetivamente não existam ou onde é

possível remediar com uma programação pastoral mais racional193

.

A função do leigo não se deve confundir com a do clérigo. Não deve parecer, de

forma alguma, como sendo substituta daquelas que são de exclusividade do sacerdote.

O exercício de tarefas dentro da Igreja é para atender as necessidades da mesma e não

para criar qualquer tipo de concorrência entre clérigos e leigos. Assim,

os vários ofícios e funções que os fiéis leigos podem legitimamente

desempenhar na liturgia, na transmissão da fé e nas estruturas pastorais

192

JOÃO PAULO II. Exortação apostólica pós-sinodal Ecclesia in America. São Paulo: Paulinas, 1999.

44. 193

CfL 23.

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da Igreja, deverão ser exercidos em conformidade com as suas

específicas vocações laicais, diferentes da dos ministros sagrados194

.

A colaboração dos fiéis leigos na missão da Igreja não os qualifica como sendo

pastores, pois o ministério ordenado é insubstituível. Muitas tarefas podem ser

confiadas aos leigos, “caso, em alguns lugares, se verifiquem abusos e práticas

transgressoras, os pastores apliquem os meios necessários e oportunos para impedir

prontamente a sua difusão e evitar que se prejudique a correta compreensão da própria

natureza da Igreja”195

.

Entre os vários aspectos da participação dos fiéis não-ordenados na

missão da Igreja, toma-se em consideração a sua colaboração direta nas

tarefas específicas dos pastores. Com efeito, quando a necessidade ou a

utilidade da Igreja o requer, os pastores podem, segundo as normas

estabelecidas pelo direito universal, confiar aos fiéis leigos certos

ofícios e funções que, embora ligados ao seu próprio ministério de

pastores, não exigem, contudo, o caráter da Ordem196

.

Essas atribuições de tarefas aos leigos não devem possibilitar o desvio de

doutrina. Por isso, todos que recebem incumbências pastorais têm o dever de junto com

os pastores providenciar a devida formação, adequada e clara, de acordo com cada

tarefa a ser exercida.

3.2 A questão dos ministérios

Afirma João Paulo II sobre os ministérios leigos:

A missão salvífica da Igreja no mundo realiza-se, não só pelos

ministros, que o são em virtude do sacramento da Ordem, mas também

por todos os fiéis leigos: estes, com efeito, por força da sua condição

batismal e da sua vocação específica, na medida própria de cada um,

participam do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo. Por isso, os

pastores devem reconhecer e promover os ofícios e as funções dos fiéis

leigos, que têm o seu fundamento sacramental no Batismo e na

Confirmação, bem como, para muitos deles, no Matrimônio197

.

194

Id., ibid., 23. 195

Congregação para os institutos de vida consagrada. Instrução acerca de algumas questões sobre a

colaboração dos fiéis leigos no sagrado ministério dos sacerdotes. São Paulo: Paulinas, 1997, p. 21. 196

Id., ibid., p. 19. 197

CfL 23.

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64

Com isso, pode-se bem compreender que a Igreja, como instrumento de

salvação, tem o zelo pela Eucaristia, cuidando para que ela não falte a nenhum dos fiéis,

no caso da escassez de sacerdotes. A ela cabe a responsabilidade de prover comunhão

eucarística, mesmo agindo temporariamente, e não em caráter de substituição. Um

leigo, em razão de seu batismo, que o faz participar do sacerdócio comum, orienta a

liturgia, a oração e, quando devidamente autorizado, pode distribuir a Sagrada

Comunhão198

.

É importante que cada um seja consciente de sua missão, de sua

responsabilidade, sem que, para isso, precise abraçar todas as atividades 199

.

Eis as considerações feita por M. Santos acerca da diversificação das tarefas

ministeriais:

Em primeiro lugar, considere-se que as funções do ministério ordenado,

em seu conjunto, constituem uma unidade indivisível, por causa do seu

único fundamento. Tal unidade qualifica de maneira essencial o

exercício das funções do ministério sagrado, que, sob perspectivas

diversas, são sempre exercício da função de Cristo, Cabeça da Igreja.

Portanto, o exercício do munus docendi, sanctificandi et regendi, por

parte do ministro ordenado, constitui a substância do ministério

pastoral. As diversas funções dos ministros sagrados formam uma

unidade indivisível e não podem ser compreendidas separadamente

umas das outras. Somente em algumas delas, e em certa medida, é que

outros fiéis não-ordenados podem colaborar com os pastores, se forem

chamados a prestar tal colaboração. A tarefa que se exerce em

suplência recebe a sua legitimidade, formal e imediatamente, da

delegação oficial que lhe dão os pastores 200

.

Ainda,

só pode ser pastor quem é ao mesmo tempo cabeça da Igreja. O

presbítero age in persona Christi. Os serviços e os ministérios prestados

pelos leigos nunca são propriamente pastorais, nem sequer quando

suprem certas ações e certas preocupações do pastor. Só numa certa

198

Cf. JOÃO PAULO II. Carta encíclica Ecclesia de Eucharistia. São Paulo: Paulinas, 2003. 32. 199

Cf. CfL 56. 200

Cf. SANTOS, M. A relação entre “Sacerdócio Ministerial – Sacerdócio Comum” e Ministérios

Ordenados – Ministérios não-Ordenados. Teocomunicação, Porto Alegre, v. 31, n. 132, p. 225, jun. 2001.

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medida se pode aplicar também aos leigos o termo ministério: quando o

termo ministério (servitium) exprime só o trabalho com que os

membros da Igreja prolongam, no seu interior e para o mundo, a missão

é o ministério de Cristo. Porém, quando o termo é diferenciado na

relação e no confronto entre os diversos munera e officia, só em virtude

da Ordem é que „ministério‟ obtém aquela plenitude e universalidade de

significado, que a tradição sempre lhe atribuiu201

.

Conclui-se que, nessa vasta e importante diversidade de tarefas, onde existem as

especificidades, de um lado, as inerentes ao ministro ordenado, de outro, ao não-

ordenado, faz-se necessário advertir para o verdadeiro sentido do serviço. No caso do

leigo, não se trata de um serviço como (diaconia), e sim, serviço prestado como auxílio

e não como substituição.

É óbvio que nem todas as pessoas estão habilitadas a exercerem todas as

atividades. É preciso que haja competência e afinidade com tal função. É necessário que

haja realização humana para o exercício. E as habilidades se destacam de várias

maneiras, elas se manifestam, de formas diferenciadas, de acordo com cada serviço a ser

prestado. Existe relação entre ministérios e carismas:

O Espírito Santo, ao confiar à Igreja-comunhão os diversos ministérios,

enriquece-a com outros dons e impulsos especiais, chamados carismas.

Podem assumir as mais variadas formas, tanto como expressão da

liberdade absoluta do Espírito, que os distribui, como em resposta às

múltiplas exigências da história da Igreja202

.

Os ministérios conferidos aos leigos, na reflexão de Santo Domingo, devem

atender às necessidades da comunidade e da evangelização:

O Documento de Puebla recolheu a experiência do Continente, no que

diz respeito aos ministérios conferidos aos leigos e deu orientações

claras para que, de acordo com os carismas de cada pessoa e as

necessidades de cada comunidade, se fomentasse „uma especial

criatividade no estabelecimento de ministérios e serviços que possam

201

Id., ibid., p. 222. 202

CfL 24.

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ser exercidos por leigos, de acordo com as necessidades da

evangelização(P 833; cf. 804-805; 811-817) 203

.

Há que se ter o cuidado de não se clericalizar os leigos, observar que suas

funções não se confundam com as do sacerdote, a ponto de o leigo sentir-se como um

substituto do mesmo. Sobre esse aspecto a CNBB faz a seguinte análise:

Constata-se também que a presença dos leigos e seus serviços na

comunidade eclesial dão-se, com freqüência, num clima de suplência do

ministro ordenado. Esta situação levou, quer à clericalização de muitos

leigos, quer à sua permanência numa condição diminuída e dependente

em face de uma Igreja fortemente centrada no clero. Sua participação

nas decisões pastorais, com efetiva responsabilidade, é ainda muito

reduzida. Chegou, certamente, o momento de as Igrejas assumirem uma

maior definição quanto à presença e ação dos leigos na comunidade

eclesial. A experiência já adquirida deve ser amplamente alargada e

aprofundada204

.

Diante das urgências do mundo, a atuação do leigo é necessária. Porém, deve-se

recordar uma vez mais, que o leigo não é um substituto do sacerdote. Ele tem suas

funções bem-definidas e, mesmo que ele possa exercer ministérios, dentro da Igreja,

esses são essencialmente diferentes do ministério dos sacerdotes.

De fato, diante de tantas atribuições e de um ministério leigo vivo e atuante, cabe

também analisar o aspecto da sua contribuição quotidiana na vida da Igreja. São várias

as atividades confiadas a eles, que a exercem com o fim único de promover o Reino de

Deus, começando na família, e passando por diversos setores da sociedade, pode-se

colaborar, para que haja um mundo um pouco melhor, em que se possa viver e ser feliz.

Nesse ponto, é importante ter presente que, para salvaguardar a relação existente

entre as funções exercidas nos ministérios, também se conheça o que há de diferente

entre elas. Segundo M. Santos,

203

DSD 101. 204

Diretrizes gerais da ação pastoral da Igreja no Brasil. – Doc. n. 45. CNBB. 261-262.

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67

a diferença essencial entre o sacerdócio comum e o sacerdócio

ministerial não está, portanto, no sacerdócio de Cristo que sempre

permanece uno e indivisível, nem tampouco na santidade à qual todos

os fiéis são chamados. Através do sacerdócio ministerial, é outorgado

aos presbíteros, por Cristo no Espírito, um dom particular para que

possam ajudar o povo de Deus a exercer com fidelidade e plenitude o

sacerdócio comum que lhes é conferido205

.

Na verdade, quando se fala do ministério dos leigos e do ministério ordenado, a

referência maior é a do próprio Cristo, verdadeiro e único ministro e sacerdote. Todos

os outros que exercem algum tipo de ministério, seja como leigo, seja como ordenado,

o exercem em nome do único sacerdote, Cristo. A missão é dada em nome do próprio

Cristo, pois a Igreja é dele, Ele é o fundamento único e a causa da missão. M. Santos

afirma que

a Igreja apresenta uma só missão de conteúdo universal e, para cumpri-

la, um só sacerdócio, o de Cristo, de que participam, ainda que de modo

diverso, todos os membros do povo de Deus: a Igreja, dotada de uma

estrutura sacramental, é partícipe e depositária da missão que Cristo

recebeu do Pai, e é santificado pelo Espírito Santo para dar glória a

Deus, anunciando e estabelecendo seu Reino entre todos os homens206

.

Há uma relação de proximidade entre os dois tipos de ministérios. Pode-se dizer

até mesmo uma relação de dependência, pois o ministério ordenado possibilita a

condição da possibilidade de o ministério não-ordenado co-existir. Por outra, em

primeiro lugar, está o ministério ordenado que é instituição do próprio Cristo.Daí surge

a possibilidade, de acordo com a necessidade, de serem admitidos os ministérios não-

ordenados ou dos leigos. Na reflexão de M. Santos,

o sacerdócio comum atinge a plenitude do próprio valor eclesial, graças

ao sacerdócio ministerial. Com efeito, o sacramento da Ordem capacita

para atuar in persona Christi: através da Ordem, Cristo configura a

dimensão hierárquica da estrutura fundamental da Igreja207

.

205

SANTOS, M. A relação...,loc. cit., p. 224. 206

Id., ibid.,p. 226-227. 207

Id., ibid., p. 236.

Page 14: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

68

Uma reflexão que pode ser feita, no tocante à importância dos ministérios, é que

ambos têm seu valor diante da Igreja. Pelo fato de existirem os dois tipos de ministérios,

eles não existem para qualquer tipo de concorrência entre si, mas para que juntos

realizem o serviço da promoção humana e deixem transfigurar o Reino de Deus Pai.

Os ministérios, tanto os ordenados quanto os não-ordenados, não foram

instituídos com o fim de disputa entre si, mas para a edificação do Reino. Através do

serviço, eles realizam o que lhes é próprio. Os leigos não carecem de sentir-se menos

importantes, por pertencerem ao grupo dos não-ordenados, pois a Igreja também

encontra sua dinamicidade através dos seus serviços. As experiências pastorais têm

contado com a presença dos leigos no seu meio, exercendo funções nos vários lugares

onde são necessários. Segundo M. Santos, “a diferença é precisamente o decisivo na

compreensão relacional do ministério ordenado e do ministério não-ordenado, ambos

somente existem enquanto realidades vinculadas ao povo sacerdotal e ao sacerdócio de

Cristo”208

.

A relação existente entre os dois tipos de ministérios ocorre, tanto no âmbito da

semelhança, quanto da diferença, ou seja, eles são exercidos em conformidade do que é

próprio de cada um deles. Operam dentro das suas especificidades, porém, há que se

buscar o essencial nas suas diferenças, o que os torna distintos entre si. M. Santos

afirma:

Os ministérios ordenados são exercidos em virtude do sacramento da

Ordem, enquanto que os ministérios não-ordenados têm seu fundamento

sacramental no Batismo e na Crisma. A diferença essencial deve-se à

finalidade do sacerdócio ministerial: operar in persona Christi. Isso

penetra num âmbito mais extenso do sacerdócio de Cristo, em virtude

dos novos poderes ministeriais que lhe confere, de tal forma que lhe

proporciona uma situação nova e orgânica na comunidade dos

batizados209

.

Conclui-se que, em ambos os ministérios ordenados, e não-ordenados á

diferença fundamental é em função da Ordem, que muda a essência entre eles. Enquanto

208

Id., ibid., p. 249. 209

Id., ibid., p. 249-250.

Page 15: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

69

que os ministérios não-ordenados encontram seu fundamento no Batismo e na Crisma,

que também é comum aos ministérios ordenados, aqueles diferem dos ministérios

ordenados, que se fundamentam no sacramento da Ordem, o qual lhes é específico.

3.3 Atuação social e espiritualidade laical

João Paulo II lembra:

ao anunciar e ao acolher o Evangelho na força do Espírito, a Igreja

torna-se comunidade evangelizada e evangelizadora e, precisamente por

isso, faz-se serva dos homens. Nela, os fiéis leigos participam da missão

de servir a pessoa e a sociedade210

.

Sua atuação começa pelo compromisso assumido na qualidade de cristão.

Importante também na reflexão de João Paulo II é a questão da espiritualidade

do trabalho, quando afirma que, “ao carregar a cruz de cada dia, nas tarefas a que se é

chamado a desempenhar, nasce a possibilidade de se mostrar como verdadeiro discípulo

de Jesus Cristo”211

. “O próprio Jesus, nas suas parábolas sobre o Reino de Deus, refere-

se constantemente ao trabalho humano, nas suas diversas áreas”212

. Fornece, assim,,

elementos para uma espiritualidade do trabalho, com base no Evangelho de Jesus

Cristo.

O Concílio Vaticano II assim explica:

Uma vez que Cristo, enviado pelo Pai, é, torna-se evidente que a fecundidade do

apostolado dos leigos depende de sua união vital com Cristo. Pois é o Senhor quem diz:

„Quem permanecer em mim e Eu nele, este dá muito fruto, porque sem Mim nada

podeis fazer‟213

.

Segundo John Gerken,

210

CfL 36. 211

JOÃO PAULO II. Carta encíclica Laborem exercens. Castel: 1981, p. 67. 212

Id., ibid., p. 64. 213

AA 4.

Page 16: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

70

Os leigos devem permanecer fiéis aos deveres de seu estado de vida;

como sacrifício pessoal por suas famílias e o trabalho pela prosperidade

da comunidade. Tais deveres não devem ser encaradas como males

necessários ou como objetos de ressentimento, mas como obrigações

sagradas. O leigo católico é quem deve assumir a tarefa de construir a

cidade temporal, ligada, por sua vez, à cidade de Deus214

.

A posição do leigo, no direito da Igreja, e sua efetiva contribuição para a

edificação da obra salvífica é bem expressa por Rosário Colantonio:

O fiel leigo tem, com efeito, um modo próprio de dar vigor à sociedade

eclesial e de tomar ativamente parte na vida da Igreja. O último

Concílio assinala que a posição de todo o membro do povo de Deus é a

derivada da dignidade e liberdade dos Filhos de Deus. E esta condição

radical, que é comum a todos os fiéis, representa o modo próprio de

fieis leigos de vivificar a Igreja. Portanto, a posição do fiel leigo no

direito da Igreja, é em termos gerais, uma posição de liberdade,

compêndio de faculdade e capacidade de operar na vida sacramental,

litúrgica e no exercício do ministerium verbi. E com essa liberdade, que

lhe compete, por seu sacerdócio real, vive com a responsabilidade

assumida no batismo e coopera com o sacerdócio ministerial na

edificação da Igreja215

.

Um dos desafios importantes é a capacidade indivíduo agir integrado com a

sociedade, ou seja, o conjunto das relações que ele possa promover no meio em que

vive. Isso requer habilidade. Os políticos, por exemplo, são geralmente muito hábeis

para desenvolver seus papéis na sociedade, e com isso conquistam lugares de relevância

dentro do cenário público.

No mundo secular, há que ser participativo, envolvido com as decisões da vida

social, e há muitas formas de se estar inserido nela. Segundo José Illanes, “a atuação

pública é, sem dúvida, uma das possíveis atividades seculares. Uma atividade em que

em certo grau toda pessoa está implicada, posto que todo cidadão influencia na vida

pública de seu país, pelo menos com seu voto e sua opinião”216

.

214

GERKEN, John D. Teologia do laicato. São Paulo: Herder, 1968, p. 120. 215

COLANTONIO R. I laici nel diritto della chiesa. Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1987,

p. 49. 216

Cf. ILLANES, op. cit., p. 195.

Page 17: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

71

O que se espera é que cada cidadão possa ser uma presença decisiva na

sociedade e na Igreja, apesar das diferentes habilidades. Há que se reconhecer que nem

todos têm a mesma vocação: alguns nascem com disposição para desempenhar

determinadas funções, enquanto que outros requerem outras atividades.

Em conformidade com a fé, o fiel cristão age com liberdade nas ações do

mundo. Segundo Illanes,

a luz da fé, a doutrina social da Igreja, a visão do homem que implica a

fé, se situam a um nível profundo que influencia na totalidade do

comprometimento, porém que, ao mesmo tempo, não determina por si

só o conteúdo das sucessivas ações e decisões.A um médico se pode

dizer que cuide com zelo de seu paciente, que é filho de Deus, porém

não se pode dizer a ele como utilizar sua ciência217

.

A atuação social com liberdade dar-se-à, a medida que cada profissional, cada

indivíduo, situado na sua realidade, atuar segundo a sua fé. Illanes explica que

não é estranho que a Christifideles Laici, que começa falando de vida e

de missão, termina referindo-se à união com a Igreja e com a oração,

como condições indispensáveis para levar a cabo essa grande e

comprometedora e difícil obra, que é a nova evangelização. E que ao

fiel leigo lhe corresponde um papel de primeira importância218

.

Fica explícito que, para haver um resultado frutífero da missão, é necessário que,

em primeiro lugar, o leigo seja alimentado na sua fé, a partir da oração, meditação, das

Sagradas Escrituras e Eucaristia, e, sobretudo, associado a isso, ele viva intensamente a

justiça e a confiança em Deus, fonte de toda missão. Segundo Miguel Nicolau,

a vida espiritual, o empenho de aperfeiçoar o espírito, não pode

desvincular-se da atividade profissional. Seria cercear a natural

amplitude e profundidade da vida espiritual, que deve invadir todo o ser

e toda a atividade. Seria restringir a umas poucas horas ao dia,

esquecendo a maior parte delas219

.

217

Id., ibid., p. 197. 218

Id., ibid., p. 198. 219

Cf. NICOLAU, Miguel. Laicado y santidad eclesial – colegialidad y libertad religiosa. Madrid:

Studium, 1964, p. 32.

Page 18: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

72

A frutificação possível da missão do leigo na Igreja depende da sua entrega nas

mãos de Deus. Segundo Illanes, a santidade é, ao mesmo tempo, realidade atual e meta,

vida recebida e plenitude na direção em que se caminha220

. Ou seja, o leigo não é auto-

suficiente no exercício das suas tarefas, pois a missão não é dele. É na fonte que o leigo

deve buscar alento para seu serviço, unir-se a Deus, na confiança de filho, pois o

apostolado todo deriva de Jesus Cristo, que é a única fonte, da qual se origina a missão.

Buscar a santidade e promover a vida são caminhos que devem ser sempre

perseguidos por todos. Não é diferente para uma boa espiritualidade do leigo, que antes

de tudo alimenta sua caminhada pela fé, pela oração, pela caridade e na Eucaristia.

É fundamental que haja uma profunda espiritualidade do leigo, para que bem

possa conduzir sua missão. Como afirma Urbano Zilles, essa espiritualidade alimenta-se

dos meios próprios e comuns a todos os fiéis: “a Sagrada Escritura, a oração, os

Sacramentos, de modo especial a Eucaristia”221

. Porém, não bastam somente esses

meios. Na verdade, além desses alimentos espirituais, é necessário que haja uma retidão

no agir, caso contrario, de nada servem a oração e a Eucaristia, enfim, os meios

espirituais para a santificação.

Seria como uma fé morta, a ausência do bom senso no agir, a omissão com

relação às injustiças praticadas contra aqueles que não podem defender-se. O calar-se

diante das injustiças não é próprio de um cristão. U. Zilles explica que o maior pecado

do cristão continua sendo, não o mal praticado, mas o bem que ele deixa de fazer, ou

seja, a omissão222

.

Walter Ebejer questiona:

Como sacudir as massas de leigos católicos apáticos; como convencê-

los para assumir sua identidade laical, com sua secularidade e,

220

Cf. ILLANES, op. cit., p.166. 221

ZILLES, U. Quem é o leigo...,loc. cit., p. 25. 222

Id., ibid.,p . 25.

Page 19: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

73

principalmente, sua espiritualidade peculiar, e dar-lhes uma mística e

um novo ardor de protagonistas especiais. Diz ainda que o Papa deixou

bem claro que não seria possível a Nova Evangelização e a conseqüente

Promoção Humana e Cultura Cristã, sem alcançarmos a santidade e o

entusiasmo incontido produzido pelo evento original, e ao mesmo

tempo atual, de pentecostes; assim despertando em todos um novo

ardor, descobrindo novos métodos e novas expressões „na força e na

potência imorredouras de Pentecostes tempos novos de

Evangelização223

.

3.4 O leigo: fundamental para a evangelização

Em todas as partes, os fiéis leigos devem estar presentes, a fim de colaborar,

com a construção do Reino. Sua participação, juntamente com os ministros ordenados, é

de suma importância, por isso seu engajamento dia a dia se torna mais necessário do

que participações esporádicas. A participação dos leigos na vida da Igreja torna-se um

fundamento para sua continuidade. Os fiéis leigos participam da vida da Igreja, não só

pondo em ação os seus ministérios e carismas, mas também de muitas outras formas224

.

Toda a obra realizada na Igreja tem em vista o Reino de Deus. Por ser

instrumento de Cristo, ela se torna um meio eficaz de salvação. João Paulo II reforça a

idéia de que

o Reino de Deus presente no mundo, sem ser do mundo, ilumina a

ordem da sociedade humana, enquanto a força da graça a penetra e a

vivifica. Assim notam-se melhor as exigências de uma sociedade digna

do homem do agir em favor do bem. A esta tarefa de animação

evangélica das realidades humanas estão chamados, juntamente com

todos os homens de boa vontade, os cristãos, de modo especial os

leigos225

.

Assim, os fiéis leigos devem encontrar uma forma ou outra de engajar-se na

missão da Igreja e lançar-se ao serviço. João Paulo II, nos seus ensinamentos, afirma ser

absolutamente necessário que cada fiel leigo tenha sempre viva consciência de ser um

223

EBEJER, W. Perspectivas teológico-pastorais a partir da missão do cristão leigo. Teocomunicação,

Porto Alegre, v. 24, n. 105, p. 395, set. 1994. 224

CfL 25. 225

JOÃO PAULO II. Carta encíclica Centesimus annus. São Paulo: Paulinas, 1991. 25.

Page 20: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

74

„membro da Igreja‟, a quem se confia um encargo original insubstituível e indelegável,

que deverá desempenhar para o bem de todos226

.

Os fiéis cristãos leigos devem ser participantes ativos na vida da Igreja, com

suas contribuições, que levam à satisfação das necessidades pastorais. Para o Papa

Wojtyla, o Concílio Vaticano II incita fortemente os fiéis leigos a viver operosamente a

sua pertença à Igreja particular, assumindo simultaneamente um respiro cada vez mais

católico227

.

Nessa linha de reflexão, encontra-se o verdadeiro sentido missionário. Todo

cristão, por sua condição de batizado, é convocado ao trabalho. O Papa Wojtyla

lembra,“a voz de Jesus Cristo ressoa no íntimo do próprio ser de cada cristão, que,

graças à fé e aos sacramentos da iniciação cristã, torna-se imagem de Jesus Cristo,

insere-se na Igreja como seu membro vivo e é sujeito ativo da sua missão de

salvação”228

.

A tarefa evangelizadora se dá na Igreja e no mundo, pois é no mundo que estão

presentes aqueles que ainda desconhecem o Salvador, por motivo de suas culturas e pela

falta de evangelização. Muitos estão nos confins geográficos e por isso ainda não foram

atingidos por essa novidade. Cabe à Igreja fazer-se presente nesses meios. O mandado

„Ide por todo o mundo‟ é urgente e de responsabilidade de todos os cristãos. Cabe a

cada um a responsabilidade e a generosidade de se colocar a serviço. Segundo João

Paulo II,

A Igreja, ao perceber e ao viver a urgência atual de uma nova

evangelização, não pode eximir-se da missão permanente de levar o

Evangelho a quantos – e são milhões e milhões de homens e mulheres –

não conhecem ainda Cristo, Redentor do homem. Essa é a tarefa mais

especificamente missionária que Jesus confiou e continua todo o dia a

confiar à sua Igreja. A ação dos fiéis leigos, que, aliás, nunca faltou

neste campo, aparece hoje cada vez mais necessária e preciosa. Na

verdade, a ordem do Senhor „Ide por todo o mundo‟ continua a

encontrar muitos leigos generosos, prontos a deixar o seu ambiente de

226

CfL 28. 227

Id., ibid., 25. 228

Id., ibid., 3.

Page 21: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

75

vida, o seu trabalho, a sua região ou pátria, para ir, ao menos por um

certo tempo, para zonas de missão229

.

Assim o leigo tem um papel importante nessa obra de Deus.

A participação quotidiana do leigo na missão da Igreja é o que torna possível a

difusão maior na comunhão eclesial das suas ações particulares, ou seja, ele se põe a

serviço juntamente com todos os membros da sua Igreja. Segundo Illanes, “a Igreja se

encaminha precisamente a servir a comunhão entre os homens e Deus e

conseqüentemente dos homens entre si e o resto da criação”230

.

Santo Domingo ensina:

O povo de Deus está constituído em sua maioria por fiéis leigos. Eles

são chamados por Cristo como Igreja, agentes e destinatários da Boa

Nova da Salvação, a exercer no mundo, vinha de Deus, uma tarefa

evangelizadora indispensável. A eles se dirigem hoje as palavras do

Senhor „Ide também vós para a vinha‟ (Mt 20, 3-4) e estas outras: „Ide

por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura‟ (Mc

16,15)231

.

O laicato é um modo de ser do cristão, é uma condição de vida, e sua

importância para a vida da Igreja é fundamental. Sem a efetiva participação do laicato,

a dinâmica da Igreja seria muito difícil de se realizar. No mundo há várias formas e

possibilidades de realizações dos trabalhos; há espaços específicos para os clérigos e

para os leigos.

O leigo tem que ser, sim, um membro ativo. F. Alexandre lembra que mesmo os

mais humildes e os mais pobres dos cristãos são lavados, resgatados pelo batismo. Eles

não são mais então „os filhos da necessidade e da ignorância, mas da eleição e da

ciência‟232

.

229

Id., ibid.,35. 230

ILLANES, op. cit., p. 101. 231

DSD 94. 232

FAIVRE, Alexandre. Os leigos nas origens da Igreja. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 48.

Page 22: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

76

O fundamental da presença do leigo na missão é que haja uma unidade em torno

dela. Leigos e clérigos devem falar uma mesma linguagem, conhecer o teor da missão e

buscar uma forma de atendê-la dentro da sua diversidade, isto é, ninguém executa

qualquer tipo de tarefa, se não conhece seu fim. Paul Stevens faz a seguinte reflexão:

A Igreja é por natureza diferente de todas as outras sociedades da terra.

Em Efésios 2, Paulo fala sobre a parede derrubada que antes separava

judeus de gentios. A partir de dois povos antes estranhos, Deus criou

uma nova humanidade. Paulo dá a entender nessa passagem que, se

Deus pode unir judeus e gentios, não há nenhuma outra dupla de povos

que não possa ser unida em Cristo233

.

Assim sendo, mesmo que a Igreja seja dirigida pela hierarquia, pois foi o próprio

Cristo quem a quis assim, deve haver uma união entre clérigos e leigos, no sentido de

atender todas as necessidades da Igreja e do mundo.

Conclui-se que a presença ativa dos fiéis leigos na Igreja, atuando e

desempenhando as tarefas necessárias, é cada vez mais vinculada à urgência da missão.

Em comunhão com o clero, as atividades são exercidas de modo que a Igreja cresça

cada vez mais no mundo e descubra sempre, nas obras realizadas, a presença carinhosa

de Deus Pai e a sua salvação trazida por Jesus Cristo, através da conversão de cada um

de seus filhos.

3.5 A relação dos leigos com a hierarquia e com os consagrados

O Papa Wojtyla lembra,

a comunhão eclesial configura-se, mais precisamente, como uma

comunhão orgânica, análoga à de um corpo vivo e operante: ela

caracteriza-se pela diversidade de vocações. Graças a essa diversidade,

cada fiel leigo encontra-se em relação com todo o corpo e dá-lhe o seu

próprio contributo234

.

233

STEVENS, P. A hora e a vez dos leigos. São Paulo : ABU, 1998, p. 117. 234

CfL 20.

Page 23: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

77

Para o bem da Igreja é importante que se estabeleça a harmonia entre seus

membros. Em qualquer setor da sociedade, a união contribui para o crescimento. Na

Igreja não é diferente. O Concílio Vaticano II lembra que “os sagrados Pastores

reconheçam e promovam a dignidade e a responsabilidade dos leigos na Igreja. De boa

vontade utilizem-se do seu prudente conselho. Com confiança entreguem-lhes ofícios

no serviço da Igreja”235

.

Há que se buscar o fundamento evangélico da relação dos leigos com os

consagrados, isto é, como se pode compreender essa unidade para a realização das

tarefas na Igreja. Dentro das diversas possibilidades do exercício das funções pastorais,

encontram-se os vários segmentos que tornam possíveis essas realizações. O

importante é que a missão deixada por Jesus Cristo seja assumida pelo povo de Deus:

Os contatos com os leigos, no caso de Institutos monásticos e

contemplativos, apresentam-se prevalentemente como uma relação

espiritual, enquanto que, para os Institutos empenhados na vertente do

apostolado, se traduzem em formas de colaboração pastoral. Os

membros dos Institutos seculares, leigos ou clérigos, relacionam-se com

os outros fiéis nos moldes ordinários da vida quotidiana. Hoje alguns

Institutos, freqüentemente por imposição das novas situações, chegaram

à convicção de que o seu carisma pode ser partilhado com os leigos. E

assim estes são convidados a participar mais intensamente na

espiritualidade e missão do próprio Instituto. Pode-se dizer que, no rasto

de experiências históricas, como a das diversas Ordens seculares ou

Ordens Terceiras, se iniciou um novo capítulo, rico de esperanças, na

história das relações entre as pessoas consagradas e o laicado236

.

Outras considerações acerca da relação entre leigos e consagrados podem ser

feitas. É na realização do serviço evangélico que se consuma a unidade de fé entre os

mesmos. A ajuda mútua entre leigos e consagrados resultará finalmente na realização da

tarefa da missão:

Em qualquer atividade ou ministério em que estejam empenhadas, as

pessoas consagradas lembrem-se de que hão de ser primariamente guias

especializados de vida espiritual, e, nesta perspectiva, cultivem « o

talento mais precioso: o espírito ».Os leigos, por sua vez, ofereçam às

235

LG 37. 236

JOÃO PAULO II. Vita Consecrata. São Paulo: Paulinas, 1996. 54.

Page 24: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

78

famílias religiosas a ajuda preciosa da sua secularidade e do seu serviço

específico237

.

Também os leigos tornam-se importantes nessa relação com os consagrados, a

partir de sua adesão aos institutos, sem que para isso haja qualquer tipo de prejuízo, no

tocante à identidade a que se refere cada um destes segmentos.

Uma expressão significativa de participação laical nas riquezas da vida

consagrada é a adesão de fiéis leigos aos diversos Institutos, na nova

forma dos chamados membros associados ou, segundo as exigências de

alguns contextos culturais, de pessoas que partilham, por um certo

período de tempo, a vida comunitária e a específica consagração

contemplativa ou apostólica do Instituto, sempre com a condição,

obviamente, de que a identidade da sua vida interna não sofra dano238

.

João Paulo II conclama o povo de Deus à inteira adesão, em favor da

perseverança da vida consagrada, com estas palavras:

A todos os fiéis pede-se uma oração constante pelas pessoas

consagradas, para que o seu fervor e a sua capacidade de amar

aumentem continuamente, contribuindo para difundir, na sociedade

actual, o bom perfume de Cristo (cf. 2 Cor 2,15). Toda a comunidade

cristã — pastores, leigos e pessoas consagradas — é responsável pela

vida consagrada, pelo acolhimento e amparo prestado às novas

vocações239

.

No tocante à questão da índole do leigo e do ministro consagrado, o Papa

Wojtyla lembra:

Os leigos, em virtude da índole secular da sua vocação, refletem o

mistério do Verbo encarnado, sobretudo enquanto Ele é Alfa e Ómega

do mundo, fundamento e medida do valor de todas as coisas criadas. Os

ministros sagrados, por sua vez, são imagens vivas de Cristo, Cabeça e

237

Id., ibid., 55. 238

Id., ibid., 55. 239

Id., ibid., 105.

Page 25: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

79

Pastor, que guia o seu povo neste tempo do « já e ainda não », na

expectativa da sua vinda gloriosa240

.

W. Ebejer Acerca do tema em destaque diz:

Jesus Cristo enriqueceu seu Povo e instituiu na sua Igreja um grupo

especial de discípulos a quem deu sua Missão e consagração de

Mediador e cabeça, constituindo-os chefes de suas comunidades para

perpetuar sua presença e sua missão que recebera do Pai. A hierarquia,

que surgiu do grupo original dos Doze Apóstolos, tem a missão de

ensinar, governar e santificar os outros cristãos fiéis, membros da

mesma Igreja de Cristo. A hierarquia está a serviço dos fiéis, seus

irmãos, fiéis especificamente incumbidos com a tarefa das realidades

terrestres: família, sociedade, política, produção de bens, cultura, etc.,

para tudo impregnar ou perpassar com o espírito purificador e

renovador de Cristo, para glória de Deus Pai, num combate ao mal que

deforma, destrói, falsifica e aliena do plano divino original toda a

criação e as próprias atividades humanas241

.

Parece mesmo que a relação maior entre leigos, hierarquia e consagrados é o

serviço, seja na formação, seja no anúncio. A respeito da matéria sobre a relação dos

leigos com a hierarquia, o Papa Wojtyla lembra que “o reconhecimento dos leigos como

membros da Igreja, com pleno direito, exclui uma identificação com a hierarquia, porém

seria um erro anti evangélico conceber a Igreja exclusivamente como um corpo

hierárquico, uma Igreja sem povo”242

. “Clérigos e leigos, hierarquia e fiéis não-

ordenados, formam um só povo de Deus, uma só Igreja-comunhão de seguidores de

Cristo. A Igreja é de todos e de cada um, e todos somos responsáveis por sua vida e

desenvolvimento”243

.

240

Id., ibid.,16. 241

EBEJER, W. O laicato: autoconsciência e estruturação eclesial. Teocomunicação, Porto Alegre, v. 25,

n. 107, p. 39, mar. 1995. 242

JOÃO PAULO II. Creo en la Iglesia-Catequesis sobre el credo. Madrid: Palabra, 1997, p. 404. 243

Id., ibid., p. 404.

Page 26: O LEIGO: HOMEM DA IGREJA NO MUNDO E HOMEM DO MUNDO NA IGREJA

80

Na verdade, existe uma relação e mútua ajuda na execução de tarefas

fundamentais na divulgação do Reino de Deus, pois esta é a principal tarefa da Igreja no

mundo. A realização de tais tarefas depende do engajamento de cada um, seja como

leigo, como sacerdote ou como consagrado.