O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO DA PARAÍBA: UMA OUTRA … · fundador da Sociedade dos Professores...
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Eixo: 07. Instituições Escolares
O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO DA PARAÍBA: UMA OUTRA
ANÁLISE SOBRE SUA CRIAÇÃO (1935-1937)
Mariana Marques TeixeiraI
UFPB/PPGE/CAPES
Resumo:
Esta comunicação tem por intuito divulgar as primeiras constatações de uma análise,
que está em andamento por meio da realização de um doutoramento em História da
Educação no programa de pós-graduação em Educação da Universidade da Paraíba, e
versa sobre a contexto da formação de professores, da criação do Instituto de Educação
da Paraíba e sua configuração nos seus primeiros anos de funcionamento no período de
1935 a 1937. Neste sentido, tomou-se como objeto de estudo o principal aparelho
educativo para formação docente no Estado à época: o Instituto de Educação da Paraíba
(IEP). O referencial teórico-metodológico balizou-se numa perspectiva exploratória
qualitativa através da qual teve-se como principais interlocutores Savianni (2007)
quando se tratou da categoria de Instituições Escolares e Magalhães (2004) quando do
uso de sua sistematização para compreensão das fases pelas quais passa uma instituição
escolar. Nosso recorte temporal centrou-se no período entre 1935 – ano em que a
legislação educacional do Estado criou o Instituto de Educação da Paraíba - até o de
1937 – ano no qual o país passou por uma grande mudança política dando início ao
estado de exceção do Estado Novo. Para realizar a discussão tomou-se como fontes
principais a documentação oficial legislativa (leis e decretos-leis) encontrada em
arquivos públicos e particulares do Estado e as notícias encontradas no jornal A União
referentes ao Instituto. Além disso, muito deve essa análise à interlocução realizada com
valiosa bibliografia referente a temática em questão. Dessa maneira, diante do que
temos estudando em nossas análises, em nossos resultados parciais concluímos que
entre a criação e os primeiros anos de consolidação do IEP houveram particularidades
que fizeram o instituto paraibano ir tomando sua forma peculiar ao mesmo tempo em
que apresentava, em certa medida, como a referência para orientar, fiscalizar e, de certa
forma, uniformizar o Ensino Normal na Paraíba.
Palavras-chave: Instituição Escolar; Institutos de Educação; Formação de Professor;
I Mariana Marques Teixeira é formada em História, cursa Pedagogia, é mestra em Educação e doutoranda
pelo Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE na Universidade Federal da Paraíba- UFPB
vinculada a linha de História da Educação sob orientação do Profº Dº Antonio Carlos Ferreira Pinheiro.
Sua tese, ainda em processo de construção, tem o título provisório: “O Instituto de Educação na Paraíba:
a formação de professores por meio de uma instituição de referência (1939-1958)”.
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1. Introdução:
O Brasil e o favorecimento da relação entre a modernização do ensino, a Escola
Nova e a formação docente.
Não há como iniciar nossas reflexões sem localiza-las, ainda que em breve
apontamentos, do ponto de vista do cenário social e político do Brasil no início do
século XX. Neste momento o país estava marcado pela perspectiva de uma República
oligárquica coronelista de política centralizada nos interesses, principalmente, dos
estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais – que garantia o poder político
regional a elites locais dessa região do país. Todavia, já nos idos dos anos 1920, essa
tendência começou a mudar dando lugar a um processo de transição no qual a economia
agrária de exportação de café, que já havia possibilitado ao país um considerável
acúmulo de capital, passou gradualmente a investir numa nascente industrialização, pelo
menos no Sudeste.
Simultaneamente a esse cenário, o país precisava conviver com uma crise
mundial concomitantemente a crise de suas próprias oligarquias rurais – que atingiu em
cheio a produção cafeeira devido a chegada gradual da industrialização, o consequente
aumento da urbanização e, por fim, a crescente consolidação da classe operária. Além
disso, é preciso que não se esqueça que esse conjunto de fatores, todavia, se deu em
meio ao advento do processo (que era reflexo de um movimento global) da
modernização. Assim, também no Brasil, como pensa Le Goff (1990, p.185), a questão
do “moderno” foi posta paralelamente a da identidade nacional e não tardou para que as
instituições, também as educacionais, fizessem parte da implementação da tal
modernidadeII a ser efetivada.
Foi neste interim que mais tarde, em 1930, o Brasil viveu uma revolução que
possibilitou a tomada de poder, por uma nova elite, a industrializante, representada, à
ocasião, por Getúlio Vargas. Esse foi o marco de um novo momento para a República
brasileira no qual passou a predominar a modernização cunhada ainda num sistema
político elitista, mesmo que com maior participação popular.
II Para maiores reflexões acerca das questões que envolvem a discussão sobre modernidade, modernismo
e o moderno no Brasil, consultar, dentre outros, Le Goff (1990) e Mate (2002).
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No tocante a Paraíba, essa tendência modernizadora também pôde ser observada,
tanto de um ponto vista mais amplo – econômico, comercial, social, cultural – como,
principalmente, do ponto de vista educacional, fazendo com que a Educação também
sofresse pressão a fim de colaborar no preparo de um novo homem, para uma nova
sociedade, a moderna.
...a preparação de uma nação moderna, com o trabalho agrícola
avançado e técnico, com a produção mineira e fabril em fase de
industrialização crescente, e com os serviços de transportes e de
comunicações, de assistência médica e social, de educação e de justiça
etc, elevados a níveis consideráveis de especialização e complexidade.
Tal sociedade se faz toda ela tecnológica, exigindo para seu
funcionamento um nível escolar considerável para toda a população
(Teixeira, 1994, p.14)
Neste contexto, em esfera Nacional e também Estadual, quando se tratou de
Educação, o que representou com mais veemência essa modernidade foi o advento e a
força com que a concepção pedagógica trazida pela Escola NovaIII tomou os debates
educacionais no país.
Os pressupostos teórico-metodológicos da Escola Nova começam a melhor
influenciar a educação no Brasil após a Primeira Guerra Mundial, quando nosso país
estreitou os laços comerciais com os EUA. Esse aumento de contato comercial nos
trouxe também transformações culturais, uma vez o que estilo de vida norte americano
passou a ser bastante difundido em solo brasileiro. Dessa forma, a influência educativa
dos EUA também começou a nos alcançar por meio da leitura que esse país Norte
Americano propunha acerca do Movimento da Escola Nova, principalmente sob a
perspectiva dos olhares de John Dewey e William Kilpatrick. O “encontro” dessa
perspectiva escolanovista com o clima de otimismo pedagógicoIV que se vivia no Brasil
III Em linhas gerais pensamos que é preciso dizer que a Escola Nova no Brasil dos anos 1930 (que já era
discutida desde a década anterior) era tida moderna, reformadora e renovadora, pois, propunha, dentre
outros aspectos: a laicização do ensino, o ensino público, gratuito e para todos de maneira democrática,
considerando os regionalismos e com intuitos profissionalizantes baseado numa filosofia extremamente
pragmatista, que valoriza a ação por meio da experiência. IV O otimismo pedagógico no Brasil, segundo Ghiraldelli Junior (2001), “centrava suas preocupações na
reorganização interna das escolas e no redirecionamento dos padrões didáticos e pedagógicos”. Essa é
uma perspectiva menos preocupada com o quantitativo educacional do que com a qualidade com que a
Educação deveria ser ofertada ao povo.
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favoreceu a ampla disseminação dessa nova concepção educativa para os brasileiros. E,
além disso tudo, foi possível perceber que, no Brasil, a Escola Nova muito mais do que
uma indicação pedagógica, tomou corpo, diferente da maioria dos países em que se foi
proposta, de política pública educacional - o que em muito fomentou um ciclo de
reformas educativasV estaduais que foi levado a cabo combatendo principalmente a
Pedagogia Tradicional. Assim, o escolanovismo, no Brasil, ficou conhecido de muitas
formas, dentre elas: Escola Ativa, Progressista, Formadora ou pragmatista Deweyana.
Além das inovações pedagógicas que propunha, essa propositura educacional foi muito
debatida no país principalmente por que, além de ser pensada como possibilidade real
de política pública educacional nacional, fazia frente a tida escola Tradicional, que se
encontrava majoritariamente espalhada pelo paisVI.
Na tentativa de melhor elucidar os distanciamentos entre ambas as perspectivas
educacionais no caso brasileiro, Ghiraldelli Junior (2001) demonstra alguns aspectos
das divergências entre essas concepções que nós aqui resolvemos sistematizar em forma
de quadro afim de facilitar compreensão e reflexão
Quadro 01:
Distanciamentos entre as perspectivas pedagógicas antagônicas em questãoVII
Escola Tradicional/Conservadora Escola Nova/ reformadora
Geralmente associava-se aos interesses e
aspirações das oligarquias e da Igreja
Católica.
Geralmente associava-se a movimentos da
burguesia e da classe média em prol da
modernização da sociedade e do Estado.
Foi composta por substratos de modernas
teorias pedagógicas alemãs e americanas
O movimento influenciado por John Dewey
enfatizava “métodos ativos” de ensino-
V A expansão das perspectivas da Escola Nova no país, inspirou muitas das reformas educativas que
aconteceram em vários Estados brasileiros, quais sejam: a de 1920 – realizada por Sampaio Dória realizad
em São Paulo; a de 1922-1923 – realizada por Lourenço Filho no Ceará; a de 1924 – por Anísio
Teixeira realizada na Bahia; a de 1925-1928 – realizada por José Augusto Bezerra de Menezes no Rio
Grande do Norte e as de 1927-1928 realizada por Lisímaco Costa no Paraná, Francisco Campos em
Minas Gerais e a da capital da República, liderada por Fernando de Azevedo nos anos de 1927-1930. VI A crítica que se fazia a tida Escola Tradicional (e muitas vezes ainda se faz) dizia respeito
principalmente quando as práticas desta, pois por meio delas o “professor ensina, fala, sabe, disciplina
enquanto que os alunos aprendem, escutam, nada sabem, são disciplinados” Freire (2016). Ou seja, essa é
uma pedagogia que favorece, segundo os escolanovistas, uma escola passiva, expositiva, memorizadora e
formalista. VII Para maiores minúcias acerca do que foi apresentado no Quadro 01 indica-se a consulta Ghiraldelli
Junior (2001).
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condensadas no conhecido herbatismo, de
J.F.HerbartVIII
aprendizagem.
Interesse e motivação dos alunos eram frutos
de pensamentos ideativos, logo, resultado dos
processos de ensino aprendizagem.
Interesse e motivação dos alunos eram as
condições básicas para o início do processo
de ensino aprendizagem.
Herbart preparou os famosos “cinco passos
formais de ensino”:
1.preparação do conteúdo
2.apresentação do conteúdo
3.associação do conteúdo
4.generalização do conteúdo
5.aplicação do conteúdo
Dewey propõe “cinco passos para o
funcionamento do raciocínio indutivo”:
1.consciência do problema
2.coleta de dados e análise dos elementos
3.sugestões de solução dos problemas
4.desenvolver sugestões e experiências
5.recusa ou aceitação das soluções propostas
FONTE: Ghiraldelli Junior (2001, P.20-29).
Diante dos distanciamentos observados entre as duas principais tendências em
questão à época compreende-se melhor os motivos de tantos embates entre os
conservadores – tradicionais, geralmente representados pela Igreja – e os liberais –
representados pelos escolanovistas.IX
Reforçando esse cenário de densidão e conflitos educacionais paraibanos
Kuleska também contribui na apresentação de uma Paraíba, nos idos anos 1930, que
seguia a tendência Nacional de grande investimento em educação popularX
Num contexto nacional marcado pelas escolhas das constituintes
federal e estadual, nas quais as demandas por educação tinham um
papel destacado, não só em termos ideológicos, mas também em
termos eleitorais, o impulso educacional em prol da educação primária
ia se mantendo, apesar de seu apelo original estar claramente
direcionado para uma sociedade urbano-industrial. (KULESKA, 2001,
pg.2)
VIII A teoria do herbatismo, apesar de ser uma pedagogia laica, foi muito utilizada por educadores
católicos que dela se apropriaram, como é o caso de Otto Williann, educador muito citado pelos
educadores conservadores. No caso brasileiro também foram acopladas às teorias de herbatismo as teorias
de Pestalozzi e as positivistas, que, juntas, genericamente pode-se dizer, formavam as características
gerais relativamente homogêneas da Pedagogia Tradicional brasileira. IX O maior defensor paraibano, à época, e representante desta última, foi José Baptista de MelloIX que
tinha fortes e explícitas orientações/inspirações na Escola Nova. Mello foi ex-aluno da Escola Normal,
fundador da Sociedade dos Professores Primários, editor na década de 1920 da revista O Educador,
diretor da Instrução Pública de 1931 a 1935, criador da Revista do Ensino em 1932, criador das Semanas
Pedagógicas a partir de 1933 no Estado e Primeiro diretor da Escola de Aperfeiçoamento de Professores
da Paraíba em 1934. X Tomando-se apenas os dados censitários, verifica-se que enquanto a população total no país aumentou
34% de 1920 a 1940, a matrícula no ensino primário cresceu 300%. Nenhum período da história da
educação brasileira conhecera até então – 1932-1936 – um crescimento efetivo da mesma envergadura
(Romanelli, 1980, pg. 57).
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Entretanto, o autor também faz coro à historiografia paraibana no sentido da
observação do complexo contexto no qual essa tendência se desenrolava na Paraíba pois
conviviam neste Estado as liberais orientações de José Baptista de Mello, a força da
tradição da educação católica e os interesses preeminentes das oligarquias rurais
...as hostes católicas no Estado eram lideradas pelo Monsenhor Pedro
Anísio, que publica em 1933 seu Tratado de Pedagogia, já no interior
da disputa entre católicos e liberais acerca do papel do Estado na
Educação, contendo forte crítica aos partidários da Escola Nova. Por
outro lado, refletindo o pensamento das oligarquias de base rural, o
companheiro de Mello no Serviço de Estatística Educacional,
Sizenando Costa, defende na Revista de Ensino em 1934, órgão oficial
do Departamento de Educação do Estado, a necessidade de se criar na
Paraíba uma Escola Rural Modelo, exatamente para aprimorar a base
produtiva da economia paraibana (Pinheiro, 2001, pg.186). Como se
vê, a redistribuição produtiva encabeçada pelo capital industrial do
Sudeste em curso no Brasil a partir de 1930 demorou a ser assimilada
pela oligarquia local. (KULESCA, 2001, pg.3)
Neste contexto, em 1931 o país passou por uma grande reforma educacional,
conhecida como Reforma Francisco Campos, que esteve sob responsabilidade do
Ministro da Educação e Saúde. Todavia, no que tangia o Ensino Normal ela não
apresentou mudanças consistentes, uma vez que esse nível de ensino seguiu sendo de
responsabilidade e competência dos Estados – herança imperial e do Ato Adicional de
1834 nele ocorrido. Por isso que nos parece que mesmo nestas circunstâncias (e após a
criação em 1930 do Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública) somente
com a Constituição de 1934, através do Plano Nacional de Educação/ PNE, o país
conseguiu definir que caberia a União, dentre outros deveres, a fiscalização,
coordenação e difusão no país do ensino em todos os níveis e graus e nos parece que foi
nessa oportunidade oficial que a União tratou de conduzir a Educação sutilmente para
os fins a que lhe interessavam.
Com a Constituição de 1934 e diante dessa incipiente, mas estimulante
organização da Educação, no Brasil foi publicado em 1932 o Manifesto dos pioneiros
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da Educação NovaXI. Esse importante documento, assinado por relevantes educadores e
intelectuais brasileiros à época, foi também usado como arma política na busca por uma
consistente reforma do sistema educacional do país que solicitava ao Estado o
cumprimento de seu dever histórico, ainda não assumido – segundo o documento - de
educar a todos dando-lhes iguais oportunidades. Para tanto, o Manifesto apresentava,
inclusive, um plano de reconstrução da educação nacional.
Dentre tantos pontos relevantes presentes e discutidos neste Manifesto, nos
deteremos nesse artigo, ao que chama atenção para a necessidade de uma outra
formação para o docente no Brasil, uma formação preocupada em elevar verticalmente
o nível cultural dos professores não só de maneira geral no nível secundário, mas com
formação universitária, superior, conforme demonstra o trecho abaixo
Da elite culta do país deve fazer parte evidentemente o professorado
em todos os graus, cuja preparação geral se adquirirá nos
estabelecimentos de ensino secundário. Devem no entanto, formar seu
espírito pedagógico, conjuntamente, nos cursos universitários, em
faculdades ou escolas normais, elevadas ao nível superior e
incorporadas à universidades (...) a formação universitária dos
professores não é somente uma necessidade da função educativa, mas
o único meio de, elevando-lhes em verticalidade a cultura, e abrindo-
lhes a vida sobre todos os horizontes, estabelecer, entre todos para a
realização da obra educacional, uma compreensão recíproca, uma vida
sentimental comum e um vigoroso espírito comum nas aspirações e
nos ideias. (Manifesto dos pioneiros da educação, 1932, p.9) – grifos
nossos.
É preciso lembrar que até esse momento da História da Educação brasileira, a
instituição formal que respondia oficialmente pela formação docente primária no país
ainda era a Escola Normal. Essa instituição de formação docente não foi criada no
Brasil, pois, ainda em 1794, pós Revolução Francesa, ela surgiu naquele país ocidental.
No caso brasileiro, foi somente no período Regencial (1831-1840) que a primeira
Escola Normal surgiu em Niterói/RJ por meio do Ato nº10 de 01/04/1835.
XI Para acesso a esse documento é possível busca-lo virtualmente em: Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova – a reconstrução educacional no Brasil ao povo e ao governo (1932). Disponível em
www.pedagogiaemfoco.pro.br..
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Mergulhado nessa conjuntura, Anísio TeixeiraXII, um dos principais mentores do
Manifesto e nesta ocasião Diretor da Instrução Pública do Distrito Federal no Brasil,
propôs no estado do Rio de Janeiro uma “transformação ampliativa” da antiga Escola
NormalXIII, quase 100 anos após sua criação, transformando-a no primeiro Instituto de
EducaçãoXIV do país com vistas de melhorar e qualificar a tão necessária formação
docente brasileira.
2. Desenvolvimento:
2.1 Pensando uma instituição de Educação
Neste momento pensamos que se faz necessário esclarecer que compactuamos
da perspectiva desse pensador quanto ao fazer do historiador no caminho da
“reconstrução histórica”, pois, assim como ele, pensamos que
O objeto do historiador não é construído por ele, enquanto
pesquisador. O que lhe cabe construir é o conhecimento do objeto e
não o próprio objeto. E construir o conhecimento do objeto não é
outra coisa senão reconstruí-lo no plano do pensamento (Idem, p.15)
Neste sentido, o que temos tentado fazer neste texto é a reconstrução histórica do
o Instituto de Educação da Paraíba de maneira sintética e sistematizada. Todavia, para a
melhor aproximação e trato com o objeto de estudo em questão, o IEP, adentraremos a
uma reflexão analítica de fundamental importância que nos direcionará os olhares para o
manejo com o mesmo.
Essa reflexão perpassa a necessidade premente de tentar definir e conceituar qual
a nossa ideia de instituição, enquanto categoria de análise. Entretanto, essa não é tarefa
XII Aproximar-nos de Anísio Teixeira e sua primeira experiência de Instituto de Educação nos parece ser
fundamental já que muitos são os indícios que apontam para o Instituto do Distrito Federal como a
principal referência para a experiência do IE na Paraíba. Foi devido ao contato de Anísio a partir de 1927,
por meio de sua pós-graduação nos EUA, que seu olhar parece ter encontrado em meio ao universo
educacional um foco central. Isso deveu-se, principalmente, ao tempo que passou junto com educador e
filósofo norte americano John Dewey e a sua perspectiva pragmatista de pensar a Educação. Teixeira foi
aluno, orientando e tradutor de algumas obras de Dewey no Brasil. Em 1931 Teixeira assumiu a Diretoria
da Instrução Pública do Distrito Federal função por meio da qual realizou considerável reforma na rede de
ensino integralizando-a da escola primária à Universidade. Neste contexto surge o Instituto de Educação
do Rio de Janeiro. XIII Mais sobre essa temática, principalmente na perspectiva paraibana, consultar Rose (2010). XIV O termo Instituto de Educação, daqui em diante, pode ocasionalmente ser escrito por sua abreviação
IE, assim como o Instituto de Educação da Paraíba também poderá aparecer no decorrer do texto como
IEP, segundo sua abreviação oficial.
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fácil, uma vez que muitas podem ser as leituras a essa categoria direcionadas. Neste
artigo, todavia, preferimos entende-la, inspirados em Saviani (2007), como um lugar de
educação no qual aglutinam-se pessoas em torno de determinados procedimentos,
ordenando o que estava disperso, com objetivos de formação dos seres vivos e
favorecimento à criação.
Assim, definida essa questão, partimos para a necessidade, no caso do nosso
estudo, de associar a primeira categoria, instituição, a outra: escolar – termo
proveniente da ideia de escola. Também nesse caso foi preciso fazer uma escolha de
leitura do termo que pareceu-nos responder nossa necessidade, qual seja:
Pensar a definição de “escola” indissociada da ideia de “educação”
não parece possível, pois se concebe neste estudo a ideia de escola
como lugar de promoção de educação (...) Assim, decidiu-se
compreendê-la [a educação] como um processo de desenvolvimento
humano no qual se adquirem experiências de acordo com as
necessidades do tempo e do espaço em que se vive, a fim de integrar
socialmente o indivíduo. Nessa direção é que se percebe a escola
regular formal como apenas mais um espaço difusor de educação, mas
não o único. (Teixeira, 2012 p.33)
Neste ensejo, encaramos também a instituição escolar não só como aquela que
ficou reservada à função de reproduzir desigualdades sociais do sistema capitalista –
como pensam muitos os historiadores da educação marxistas. Mas comungamos da
leitura de Antonio Gramsci quando diz que a escola pode ser, em certa, medida
Transformadora, sempre que possa proporcionar as classes subalternas
os meios iniciais para que, após uma longa trajetória de
conscientização e luta, se organizem e se tornem capazes de
“governar” aqueles que as governam (MOCHCOVITCH, 1988, p.02
Escolhemos encarar a instituição escolar como um espaço que pode possibilitar
aos sujeitos das mais diversas classes sociais, sobretudo das subalternas, uma condição
de esclarecimento e de conhecimento de seus direitos e deveres em uma sociedade
moderna que os torne mais críticos e proativos socialmente.
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Logo, assim como Gramsci, não pretendemos negar a função reprodutora e
produtora de conformismo e adesão também presentes na instituição escolar, mas
preferimos lê-la priorizando sua outra capacidade: a de levar esclarecimento e, por
consequência, elevação cultural às massas. Dessa forma, e, na medida do possível,
iremos considera-la sempre nessa sua dupla dimensão.
Gramsci, conforme lembra MOCHCOVITCH (1988), esteve menos preocupado
em interpretar o mundo do que em transforma-lo e é por isso que acreditamos ser esse
um bom interlocutor para as reflexões sobre a implementação dos Institutos de
Educação uma vez que o maior mentor desses Institutos no país, Anísio Teixeira,
também parecia ter essa preocupação primeira, transformar.XV
Mas seria possível aproximar Antonio Gramsci, um intelectual assumidamente
de esquerda que refletiu sobre perspectivas de transformações sociais a partir de um
contexto italiano fascista do início do século XX, de Anísio Teixeira, que defendeu
também durante o século XX transformações sociais, mas numa perspectiva muito mais
liberal inspirada em muitos sentidos na sociedade norte americana? Pensamos que sim,
pelo menos no que nos interessa: a discussão da educação, e mais especificamente da
instituição escolar, como promotora de uma outra consciência educacional e como
instrumento de transformação de comportamento de pessoas através do acesso ao
conhecimento e a consequente elevação cultural.
A cultura é um bem em si mesmo a ser adquirido pelas vantagens
diretas que oferece e não em virtude de “direitos” que a lei venha
XV Acreditamos que Anísio se aproxima de Gramsci também em outro aspecto – que entendemos como
improcedente e contraditório – quando uma vez que por muitos, em seu tempo, (principalmente e
veementemente pelos católicos conservadores) ele foi/é interpretado como tendo sua inspiração
educacional nas teorias de Marx e no materialismo histórico, viga mestra do comunismo. Acusavam-no
principalmente de pregar o monopólio estatal da Educação como forma de revolução social através da
escola e que, em consequência disso, Anísio seria inimigo da educação privada e, portanto, também das
instituições religiosas por ela responsáveis - o que redundaria no laicismo do ensino. Por anos, Anísio foi
perseguido pelos educadores tradicionais que o taxavam, dentre outros adjetivos, de “comunista”,
“excessivamente democrático”, defensor de uma educação “agnóstica e materialista”. Mas o educador
sabia que por trás dos ataques pessoais a sua pessoa estava um duro embate entre projetos antagônicos de
educação no país, o da escola pública e o da escola privada. Assim, ele ressentia-se, pois, acreditava que
seu pensamento era “tendenciosamente” deturpado. Aqui inferimos que o problema, no fundo, era que
pensar uma educação para todos era ameaçar a tradicional divisão social reproduzida pela educação do
país até então: elite intelectual X massa trabalhadora braçal, o tal “dualismo educacional” tão combatido
por Anísio.
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acrescentar aos títulos que a pressuponham. (TEIXEIRA, 1994,
pg.116)
Como vimos, no caso do Brasil e da Educação, essa aquisição cultural estava
sendo proposta com maior ênfase pelos pioneiros da Educação Nova, todavia, a
assimilação do pragmatismo no Brasil também não foi homogênea, variadas leituras
foram feitas dele. Uma das mais aceitas o percebia como uma propositura de escola
“não-dualista”, “progressiva” e “experimental”, pensando-a como a única metodologia
capaz de se constituir um agente de mudança cultural, consequentemente, capaz de
contribuir para a formação de uma consciência comum favorável ao desenvolvimento.
(MENDONÇA, 2005, pg.17).
Nesse interim é relevante a lembrança de que para John Dewey, o teórico
inspirador de Anísio, a escola pública não seria apenas uma instituição transmissora de
cultura, nem tampouco de adaptação do ser humano à sociedade existente, mas, sim, um
meio de melhoria social.
Nessa perspectiva Anísio nos mostra em seus registros que o que propõe e
defende, inclusive por meio do Manifesto, não se tratava de uma simples substituição do
direcionamento pedagógico no país, mas de uma renovação do racionalismo tradicional,
naquilo em que ele se mostrava insuficiente – grifos nossos. Nisso o vemos um tanto
distante de Gramsci uma vez que enquanto Anísio, balizado em seus referenciais
liberais, pensa a educação, mas no melhoramento, reordenando o que está posto (mesmo
que ousando em suas dimensões, nunca antes vividas neste país) para favorecer a
demanda de modernidade nacional e seu consequente desenvolvimento, Gramsci fala
explicitamente em esclarecimento, ascensão cultural, crítica ao senso comum também
pela escola, mas para a transformação, não apenas para o melhoramento – grifos
nossos. Ou seja, entendemos que melhorar, para Gramsci, seria transformar
completamente, enquanto que para Anísio, seria reconstruir, mas somente o que
considerava insuficiente – mesmo que isso fosse boa parte do todo.
Adentrando ainda mais nessa seara percebemos, focando na escola em sua dupla
dimensão – a de reprodutora do sistema e a de possibilitadora de esclarecimento, que
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Gramsci reflete também sobre a dimensão ideológica da dominação, que a nosso ver
tem terreno fértil em ambiente escolar. Esse intelectual, todavia, subdivide essa
dimensão ideológica da dominação em dois momentos: a dominação econômica (que é
a do capital sobre o trabalho, gerando a exploração dos subalternos) e a dominação
político-ideológica (que se faz tanto por meio da repressão estatal como pela dominação
ideológica, que produz consensos sociais que favorecem a aceitação da direção dada
pela classe dominante à sociedade). Além disso, o teórico demonstra que a dominação
acontece tanto pela interiorização da ideologia dominante, como pela ausência de uma
visão de mundo coerente e homogênea que não esteja tão ligada ao folclore, religião e
ao senso comum por parte das classes subalternas. Por esse motivo, Gramsci diz que é
muito difícil que os subalternos alcancem autonomia, enquanto se encontrarem
subordinados ideologicamente e, consequentemente intelectualmente. Se, para o teórico,
a base que sustenta e unifica essa dominação ideológica das massas é o senso comum,
então para ele esse tal senso precisaria ser combatido.
O ideal, para Gramsci, seria substituir o senso comum, visão de mundo reinante
entre a classe subalterna, que é ocasional, desagregador, inconsciente e conformista –
funcionando quase no plano da crença e fé - pelo bom senso, que é coerente,
homogêneo, consciente. Por essa razão, como não pensar na instituição escolar como
um dos ambientes favoráveis para a promoção da autonomia e criticidade que Gramsci
diz ser imprescindível para que seja rompida a aceitação cega e a obediência irracional
ao senso comum em prol do advento de sujeitos afeitos ao bom senso coerente e
homogêneo? E mais, como não pensar que essa superação do senso comum na
propositura da formação dos sujeitos mais críticos e autônomos tem tudo a ver com as
orientações educacionais indicadas por Anísio Teixeira, e pelos pioneiros da Educação
Nova nos anos 1930 para o Brasil, por meio de uma escola que não deveria ser
privilégio e que seria canal de desvelamento de habilidades individuais utilizadas em
prol do progresso e do desenvolvimento do país?
...para criar-se uma escola capaz de introduzir as novas técnicas de
produção requeridas pelo desenvolvimento em ser, e não apenas
habilitar o indivíduo a delas aproveitar-se para a fruição e gozo mais
ou menos inteligente. A modificação necessária para isso não é fácil,
importanto em escolas muito mais caras em instalações, equipamento,
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tempo letivo e, sobretudo, servidas por um novo professor, cujo
preparo, para se fazer aceleradamente, exigiria esforços equivalentes
aos do preparo dos quadros de um exército moderno, ante uma guerra
em curso. (TEIXEIRA, 1994, pg.171)
Gramsci delineia caminhos de ascensão cultural dos sujeitos que os levem a
transformação do sistema econômico. Anísio pensa no melhoramento desses sujeitos,
entretanto associado ao desenvolvimento do sistema econômico. Muitos podem
analisa-los preferindo focar em seus antagonismos, se observarem claro, apenas o fim
de seus propósitos. Aqui, no entanto, escolhemos olhar esses dois grandes pensadores
em suas aproximações quanto a importância que ambos deram ao desenvolver
intelectual, cultural e esclarecedor dos indivíduos para que esses se tornem críticos e
autônomos enquanto sujeitos por meio da Educação. Ou seja, é na proposição de um
viés social da Educação que os encontramos.
Ambos, Gramsci e Anísio, em seus contextos, estão embebidos de
intencionalidades políticas e econômicas quando apresentam suas argumentações. Mas
o fato é que, ainda assim, não nos parece que há como negar a convergência de
pensamentos entre eles quanto a relevância do papel do acesso à cultura na vida e
comportamento dos sujeitos independente do uso que esse sujeito de fato faça com o
que adquiriu.
O desenvolvimento crítico das concepções de mundo proposto por Gramsci se
dá, segundo o teórico, por meio da filosofia da práxis – que acontece inicialmente com a
crítica ao senso comum e posteriormente à crítica das filosofias dos intelectuais,
atualizando-as e sustentando-as. Dessa forma, quem seria o sujeito, segundo Gramsci,
responsável por levar às massas a prática da tal filosofia da práxis? O intelectual
orgânico, a partir da prática cotidiana das massas e de sua experiência. Esses
intelectuais deveriam procurar, dessa forma, elevar a consciência dispersa e
fragmentária das massas ao nível de uma concepção de mundo coerente e homogêneo.
No nosso contexto, pensamos que o intelectual orgânico descrito nas teorias de
Gramsci se faz no ambiente escolar formal principalmente pela figura do professor, mas
do professor preparado, formado e consciente do papel “revolucionário” que tem no
14
favorecimento de um ambiente de vivências, experiências e reflexões que levem seus
alunos ao esclarecimento, à cultura. Neste sentido, tanto Gramsci como Anísio pensam
em seus intelectuais orgânicos/professores como os canais para a elevação da
consciência do senso comum à consciência filosófica das massasXVI.
Neste bojo, não há como relegar a importância das instituições escolares
responsáveis pela formação desses professores, aqui lidos por nós como potenciais
intelectuais orgânicos, não importando em que nível educacional atuassem, uma vez
que eles deveriam ser uns dos maiores catalizadores para a transformação dos sujeitos
tendo como instrumento principal a educação.
2.2 Uma perspectiva de leitura quando da constituição de uma Instituição escolar
Somada ao esclarecimento do tipo de leitura conceitual que faremos sobre a
Instituição Escolar que é nosso objeto neste estudo, o IEP, pensamos ser também
necessário, mesmo que brevemente, compreende-lo em sua particular sistemática de
organização a fim de melhor entender o processo que o configurou.
Nesse sentido, e para efeitos de reconstrução histórica do IEP, por meio da
propositura de Magalhães (2004, p.133-169) trazemos abaixo seu esquema figurativo
que, segundo esse autor, descreve etapas pelas quais passam as instituições escolares,
com as quais concordamos.
Quadro 02: Demonstração das fases pelas quais passa uma instituição
segundo Magalhães (2004)
Etapa Fase Descrição
1. Instituir Da materialidade A escola já está instalada. Há suporte
físico para as práticas educativas.
2. Institucionalizar Da representação Apresenta o papel desempenhado pela
Instituição. São seus modelos, currículos,
XVI Todavia, é importante que não se simplifique o processo. O intelectual orgânico não surge
eventualmente, precisa ser também formado. Para tanto, e ainda assim, mesmo num contexto brasileiro de
incentivo a pedagogia moderna em 1932 e às práticas desse tipo intelectual, Vidal (2001, p.36) nos mostra
situação de resistência docente, no IE do Distrito Federal – referência para o país como local de
favorecimento do “novo fazer pedagógico” – quando trás o seguinte relato de entrevista: “Nem todos os
professores seguiam a Escola Nova. No dizer de D. Helena (ex-aluna entrevistada), os “empistolados”
ou aqueles que não faziam parte da “patota do Anísio Teixeira” continuavam com suas aulas
tradicionais, “de cuspe”. Para sua turma, havia três tipos de professores no Instituto: os “cultos”, os
“semicultos” e os “empistolados”.
15
planejamentos, estatutos. Antecipa o ideal
daquilo que deverá constituir a atividade
própria da instituição.
3. A Instituição Da apropriação São as práticas pedagógicas propriamente
ditas. É a aprendizagem que possibilita a
incorporação do ideal pedagógico.
É a definição da identidade do sujeito e da
instituição.
FONTE: Saviani (2007, P.25
A relevância da apresentação do quadro acima, e das reflexões que Magalhães
(2004) propõe através dele nesse estudo, é fundamental primeiro porque foi partindo
desse pressuposto que tentamos reconstruir os muitos movimentos educacionais feitos
em prol dos Institutos de Educação no país, e especialmente na Paraíba, e depois porque
foi esse esquema que nos despertou para questões cruciais para os debates seguintes,
quais sejam: apenas o ato de criação legal de uma instituição já a institui em si? Pode-se
dizer institucionalizada uma instituição que, até onde foi possível apurar, nem
oficialmente nem legalmente apresentou a sociedade documentos que demonstrem sua
representação? Como lidar com uma instituição oficial aparentemente despreocupada
em institucionalizar-se formalmente?
Essas e tantas questões demonstram a complexidade do estudo e análise do
Instituto de Educação da Paraíba que em alguns períodos de sua existência parece ter
funcionado, na prática, com muito pouco ou quase nada de orientação formal e
institucionalização legal, concidentemente numa conjuntura de resseção política
(iniciada durante a Ditadura do Estado Novo /1937-1945/ e de seus reflexos na política
estadual) que parece ter interferido diretamente para essa situação - e, infelizmente,
para a atual realidade de raros registros documentais salva guardados da época na
própria instituição, devido a um incêndio vivido no IEP durante a Ditadura MilitarXVII.
Some a isso a dificuldade de encontrar documentação oficial ou legal do mesmo
XVII Essa informação foi obtida informalmente com funcionários do IEP em 2015 quando interpelados
quanto a ausência da documentação particular da instituição, principalmente anterior aos anos 1950.
16
período, de uma maneira geral, nos arquivos por onde já estivemosXVIII e entenda
melhor a breve reflexão que apresentaremos daqui em diante.
2.3 O Instituto de Educação do Rio de Janeiro
Parece não haver outro caminho que nos leve ao IEP, se não aquele que tem
como primeira parada o IE do Rio de Janeiro/Distrito Federal já que este foi, ao que
tudo indica, a maior inspiração para o que se deu em terras paraibanas.
O primeiro Instituto de Educação do Brasil foi o carioca, criado em 1932 sob os
auspícios do então Diretor Geral da Instrução Pública do Distrito Federal/Rio de
Janeiro, Anísio Teixeira. As primeiras informações que nos chegaram sobre o
funcionamento cotidiano dessa instituição no Distrito Federal se deu por meio do
Relatório de viagem de José Baptista de Mello de 1935 publicado na Paraíba pelo jornal
“A União”. Como Diretor da Instrução Pública, Mello foi enviado ao Distrito Federal
para observar a organização educacional desse centro de referência no país. No tocante
aos nossos interesses, focamos no seu relato quanto a formação de professores através
do Instituto de Educação.
De acordo com o que foi observado no Rio de Janeiro percebemos Mello
encantado com o que estava encontrando do ponto de vista da renovação educacional e
de sua reorganização, em muitas medidas, bastante aproximadas do que pretendia a
Escola Nova. No caso carioca, o cenário parecia bastante favorável naquele momento ao
escolanovismo, uma vez que Anísio era o Diretor do Departamento de Educação e
Lourenço Filho o diretor do Instituto de Educação do Rio – ambos declarados
defensores da metodologia da Escola Ativa. Aliada a influência desses dois pioneiros da
educação estava as suas inserções em cargos administrativos/políticos da Educação
daquele Estado transformando muito do que o Manifesto indicou em efetiva política
educacional. Segundo Mello, a presença dessa nova política influenciara os cariocas do
XVIII Do ponto de vista metodológico este estudo está assentado na pesquisa documental, realizada,
prioritariamente, no Arquivo do próprio IEP, no Arquivo Histórico Waldemar Bispo Duarte, do Estado da
Paraíba, vinculado à Fundação Espaço Cultural – FUNESC, no Instituto Histórico e Geográfico Paraibano
(IHGP), no acervo documental particular Maurílio de Almeida recentemente aberto à pesquisas e ainda
sob sistematização, ao Arquivo Afonso Pereira – alimentado majoritariamente por documentação de
acervo particular do intelectual e mantido aberto ao público com zelo exemplar além das consultas setor
de Obras Raras da Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba.
17
aparelhamento escolar, cuidados com a saúde dos alunos à renovação do professorado.
Quando o foco de Jose Baptista de Mello foi a formação docente e o pessoal do ensino
muito pôde observar no Rio, principalmente através do Instituto de Educação. O
estabelecimento dirigido por Lourenço Filho recebia professores que convergiam dos
mais diversos Estados no país e contava com um operoso Arquivo de publicações
internas que informava sobre sua organização e cotidiano. Assim, chamava atenção o
cuidado institucional com sua função de arquivo de dados para pesquisas educacionais e
possível sensibilização do pensamento pedagógico brasileiro.
O segundo contato com o intramuros do Instituto de Educação do Rio de Janeiro
se deu pelo acesso ao livro de tese O exercício disciplinado do olhar: livros, leituras e
práticas de formação docente do Instituto de Educação do Distrito Federal (1932-
1937) da professora Diana Vidal. Dentre outras e profundas análises o livro expõe as
práticas de Inquérito, (nucleares no Programa Institucional), o regime disciplinar
institucional subvertido por táticas sutis, dispositivos de formação docente vazados
pelos preceitos da Educação Nova e a maneira como o livro e a leitura tinham atenção
especial. O objetivo maior seria, portanto, apresentar as forças e limites do programa de
formação docente institucionalizando-se na Escola de Professores daquela instituição
nos anos 1930.
Muitas foram as semelhanças encontradas nas descrições entre o relatório de
Mello e as análises de Vidal (2001) – não esquecendo, claro, o fato de um documento
ser um relatório e o outro ser uma tese de doutoramento e por isso mesmo ressalvamos
aqui as devidas proporções. Todavia foi Vidal (2001, pg. 19) que nos confirmou com
mais clareza e assertividade que foi no IE do Distrito Federal que pela primeira vez, a
formação do magistério era elevada ao nível superior. Ou seja, exigia-se a frequência
ao curso secundário para o ingresso na Escola de professores. Além disso, a autora
seguiu inferindo, após observação das atividades ali desenvolvidas, sobre a possível
gestação de princípios de uma nova cultura profissional docente.
Dessa forma, a aproximação com a reconstrução histórica do cotidiano e
organização do IE carioca, declaradamente fonte de inspiração para o Diretor da
Instrução Pública à época tanto por meio do relatório de Mello como pelas análises de
18
Vidal foram fontes de ricas reflexões de interface entre o que aconteceu na capital
federal e o que se desenvolveu na Paraíba, logo, foi a partir dessas leituras que
chegamos às novas inquietações que apontamos a seguir.
2.4 O Instituto de Educação da Paraíba: outra leitura das abordagens clássicas
Como sabemos, quando o assunto é Escola Nova nos anos 1930 na Paraíba, o
Diretor do Ensino Primário, José Baptista de Mello que, foi o seu maior representante.
Segundo Pinheiro (2002 p.186), foi “[...] bastante receptivo aos processos educacionais
e de ensino, ou seja, a ideia era dar à escola paraibana um teor mais prático, mais
utilitário seguindo os ideais propostos pelo Manifesto”.
Dessa maneira, sabemos que havia harmonia entre a condução dada por Mello
na Paraíba e pelos educadores que representavam o pensamento escolanovista à nível
nacional - dentre outros preceitos uma das principais orientações era que não deveria
haver efetivação dos novos e modernos ideais da Escola Nova no país sem a formação
de um novo e moderno professor, intelectual orgânico, que precisava ser reconhecido,
valorizado e formado como tal.
Assim, atuando constantemente em favor da Educação paraibana José Baptista,
ainda em função do supracitado cargo, foi enviado pelo Governador do Estado da
Paraíba em 1935, Argemiro de Figueiredo, para realizar visitas de observação e estudo
de a organizações escolares no Rio de Janeiro e em São Paulo que resultaram no já
supracitado minucioso relatório de viagem e um “Plano de Reforma” da instrução
pública na Paraíba.
Não obstante, o “Plano de Reforma” posto oficialmente por Mello em agosto
daquele ano já apresentava visíveis diferenças entre o que ele observou e relatou
minuciosamente tanto no Rio como em São Paulo, e o que ele planejara para a Paraíba.
Pensamos, a priori, que isso se dá pelo que o próprio justifica
Estudando cuidadosamente a organização escolar dos dois grandes
estados brasileiros, tive vista, particularmente delas tirar o maior
proveito para o ensino parahybano. Não tenho veleidade de querer
transplantar para o nosso Estado os trabalhos formidáveis que
realizam Rio e São Paulo. Além da impossibilidade material, o
nosso meio não comportaria ainda uma renovação completa de
19
nosso aparelhamento de ensino. Mas precisamos agir – grifos
nossos. (A UNIÃO, 03/08/1935).
Como principal resultado dessa viagem, no mês de outubro do mesmo ano, foi
levado pelo líder da maioria dos partidos na Câmara Estadual paraibana, um projeto
inspirado no plano de Mello, que propunha a reorganização da Instrução Pública - que
ainda era regida sob as orientações legais do Regulamento da Instrução Pública nº873
de 1917, atualizado e reformado pelo Decreto nº1.484 em 1927.
Abaixo, a fim de melhor visualizar as aproximações e os distanciamentos no
processo iniciado por Mello (1996) que culminou com a efetivação da Lei nº 16 de 13
de dezembro de 1935, elaboramos o quadro abaixo que melhor apresenta o que ele
apresentou como Plano de Reforma e o que de fato foi regulamentado pela lei.
Plano de Reforma para a
Instrução paraibana
(Agosto de 1935)
Lei nº16 de 13 de dezembro de 1935
Departamento de Educação
para superintender todos os
serviços da Instrução Pública.
Organizado nas seguintes
secções:
I. Secretaria
II. Inspetoria Geral do Ensino
e Serviço de Estatísticas
Educacionais.
III. Biblioteca, Rádio, Cinema
Educativo, Publicidades e
Instituições auxiliares do
Ensino.
IV. Serviço de prédio,
mobiliário e Almoxarifado.
Os serviços de Instrução Pública na Paraíba passam a formar o
Departamento de Educação mantido com verbas consignadas nos
orçamentos e com as contribuições a que os municípios estão sujeitos pela
Constituição Federal.
Além disso, terá as seguintes divisões:
I. Secretaria
II. Inspetoria Geral do Ensino e Serviço de Estatísticas Educacionais.
III. Instituto de Educação
IV. Escola Normal Rural.
V. Escola Rural Modelo.
VI. Escolas Profissionais.
VII. Ensino Primário em geral.
Conselho de educação: órgão
consultivo e julgador
constituído por autoridades de
ensino de estabelecimentos
oficiais e particulares.
Conselho de educação: constituído por autoridades de ensino de
estabelecimentos oficiais e particulares, sendo eles os diretores do
Departamento de Educação, do Instituto de Educação e de seu curso
ginasial, do Liceu Paraibano, do Inspetor Geral do Ensino.
Múltiplas instituições
escolares auxiliares do ensino:
cinema educativo, serviço de
rádio difusão, clubes agrícolas,
oficinas, museu de artes e
produtos regionais.
(-)
20
Plano de Reforma para a
Instrução paraibana
(Agosto de 1935)
Lei nº16 de 13 de dezembro de 1935
Ensino Normal, para elevar o
nível cultural do professorado,
com a seguinte organização:
Escola de Professores, Escola
Secundária,
Grupos Escolares
e Jardim de Infância.
Instituto de Educação - composto por: Escola de Professores,
Escola Secundária,
Escola de Aplicação
e Jardim de Infância
Logo que os atuais alunos do curso normal terminarem esse curso,
este será extinto pois passará a acontecer no Instituto de Educação.
As atuais escolas equiparadas à Escola Normal serão assim
chamadas até que se equiparem ao Instituto de Educação.
Aos atuais professores efetivos da Escola Normal serão
garantidos seus direitos atuais quando passarem a exercer sua função no
Instituto de Educação.
Tipos escolares: Normal
Rural, Rural Modelo, Escolas
profissionais.
Tipos escolares: Grupos Escolares (divididos em 3 categorias conforme o
número de alunos existentes)
Ensino Particular:
*Teria suas escolas
elementares subvencionadas,
se regulamentadas como o
previsto, pelo governo, sendo
regidas por professoras
diplomadas.
*Os particulares, para ensinar,
deveriam ter a licença do
Departamento de Educação e
se não diplomado deverá
passar por prova da
habilitação.
*Esses estabelecimentos
estariam sempre sujeitos a
fiscalização.
*pessoas sem título de
habilitação precisariam
ministrar gratuitamente aula a
30% de seus alunos.
Ensino Particular:
*Escolas particulares e rudimentares serão subvencionadas pelo governo
se regulamentadas como o previsto e funcionando regularmente a pelo
menos um ano, sendo regidas por professoras diplomadas e dando aula
gratuitamente a pelo menos 10% dos seus alunos. As Escolas
profissionais e rurais serão subvencionadas se regidas por técnicos
diplomados.
*Esses estabelecimentos estarão sempre sujeitos a fiscalização.
Fundo Escolar. (-)
(-) (-)
Recenseamento Infantil. (-)
(-) (-)
Educadoras sanitárias. (-)
(-) (-)
Pessoal do Ensino:
*seria imprescindível uma
reforma no quadro de
vencimentos do professorado.
*cada turma de escola pública
seria provida de um professor
Pessoal do Ensino:
*No Estatuto dos funcionários públicos serão incluídos dispositivos
especiais referentes ao magistério nas seguintes bases:
A) classe uniforme, dividida e classificada em 5 entrâncias tendo em vista
seus vencimentos:
- 5ª Entrância (os que lecionem em escolas diurnas elementares da Capital
21
Plano de Reforma para a
Instrução paraibana
(Agosto de 1935)
Lei nº16 de 13 de dezembro de 1935
normalista.
*para ser nomeado, esse
professor precisaria, no
mínimo, de um ano de estágio
num Grupo Escolar.
*os atuais adjuntos
diplomados seriam
promovidos à professores.
*os professores nomeados
teriam vencimentos fixos e, de
quatro em quatro anos,
seguindo os Regulamentos,
receberiam gratificações.
*as atuais Escolas
Rudimentares passariam a
Escolas Elementares regidas
por uma normalista.
*as Escolas Rudimentares em
sítios poderiam ser
interinamente regidas por
pessoas aprovadas em
concurso até que requeridas
por normalistas diplomadas.
*em cada município um
estabelecimento seria
transformado em Escola Rural
regida por professora
diplomada que faria estágio na
Escola Rural Modelo na
Capital.
+ atuais adjuntos efetivos da Capital trabalhando a mais de 16 anos no
serviço público). 4ª entrância (os que lecionem em escolas elementares da
cidade + atuais adjuntos efetivos da Capital trabalhando de 12 a 16 anos
no serviço público). 3ª entrância (os que lecionem em escolas elementares
de vila + atuais adjuntos efetivos da Capital trabalhando de 8 a 12 anos no
serviço público). 2ª entrância (os que lecionem em escolas diurnas
elementares de povoados + atuais adjuntos efetivos da Capital trabalhando
de 4 a 8 anos no serviço público). 1ª entrância (os que lecionem em
cadeiras rudimentares diurnas e noturnas + atuais adjuntos efetivos da
Capital com menos de 4 anos de serviço público).
*para o interior valerá a mesma norma.
B) estágio no magistério para nomeação efetiva.
C) promoção quatrienal, mediante requisitos predeterminados.
* os atuais regentes das cadeiras noturnas da Capital passarão a
professores da 4ª entrância.
*professores não diplomados: atuais adjuntos leigos do interior e os
habilitados por concurso de habilitação continuarão no desempenho da
função enquanto bem servirem a Instrução (observada por meio de
inquérito administrativo) sendo-lhes assegurados todas as vantagens à
exceção da promoção, ao qual não terão direito.
* só serão nomeados professores diplomados normalistas e só haverá
promoção para entrância imediata.
*na falta normalistas, o Governo pode nomear interinamente, pessoas
habilitadas em concurso.
*em cada município um estabelecimento seria transformado em Escola
Rural regida por professora diplomada que faria estágio na Escola Rural
Modelo na Capital.
Sobre o Plano de Reforma da Instrução paraibana de Mello temos algumas
consideraçõesXIX a fazer quanto o que é dito por parte da historiografia paraibana. Foi
XIX Fizemos essas considerações no único intuito de propor a ampliação das reflexões sobre os discursos
que temos construído ora sobre José Baptista de Melo, ora sobre seu Plano de Reforma e ora sobre a Lei
nº 16 de 13 dezembro de 1935. Concordamos que há real mérito em todos eles e que muito deve a
Educação paraibana aos três. Todavia, ratificamos o desejo que as afirmações sobre todos sejam
colocadas menos incisivamente, com cautela, principalmente quando além das fontes que permitem
nossas pesquisas ainda não serem tão diversas e numerosas – ainda não foi encontrado até hoje, por
exemplo, um projeto pedagógico, um regulamento, um estatuto interno (ou similares) do IEP ou do
Ensino Normal no geral no período que vai de 1935 até 1952 (quando da Reforma Estadual do Ensino
Normal, que atingiu minuciosamente seu funcionamento) – falar sobre IEP, Ensino Normal ou formação
docente entre as complexas décadas de 1930 e 1940 nos parece muito difícil diante da densidade da
conjuntura política, ideológica, social da época tanto na Paraíba como no Brasil.
22
por nós “comum” encontrar um discurso historiográfico de muita exaltação ao Plano de
Reforma já mencionado. Obviamente que não há como negar, e a história da educação
paraibana não nos deixaria, que parece mesmo ter havido da parte de Mello muito
empenho e interesse pelo melhoramento da Educação no Estado no seu tempo. Neste
sentido, seu Plano de Reforma instrucional é mesmo um bom, quiçá o melhor, exemplo
disso. Entretanto, pensamos que é preciso que a historiografia não seja parcial ou tão
“apaixonada” a ponto de não ponderar determinadas perspectivas nesse sentido. É assim
que inferimos sobre citações como essas:
O plano de Reforma estadual estabelecia a criação de um
Departamento de Educação, e previa a renovação do mobiliário e
das instalações escolares, a construção de novos grupos escolares e
a criação, em João Pessoa, do Instituto de Educação da Paraíba.
(Oliveira, 2013, pg.13) – grifos nossos.
Optou-se por essa instituição porque ela foi projetada como modelo
do novo arranjo do sistema educacional paraibano previsto pelo
Plano de Reforma da Instrução Pública de 1935. (Oliveira, 2013,
pg.13) – grifos nossos.
De fato, o Plano era ousado em muitos aspectos, mas nele não encontramos
indicações, nem diretas nem indiretas, quanto a renovação do mobiliário e das
instalações escolares, a construção de novos grupos escolares e a criação, em João
Pessoa, do Instituto de Educação da Paraíba, assim como nada observamos quanto a
criação do IEP, muito menos sobre essa instituição como sendo projetada como modelo
do novo arranjo do sistema educacional paraibano previsto pelo Plano de Reforma da
Instrução Pública de 1935.
Um outro caso que podemos citar neste mesmo sentido é o de Freire (2016) quando
defende que
Foi tão expressiva a preocupação de José Baptista de Mello pela
qualificação dos professores primários que o mesmo elaborou um
projeto para a organização do Instituto de Educação da Paraíba, tomando como referência o Instituto de Educação do Rio de Janeiro
que foi inspirado por Anísio Teixeira. (...) Vale a pena ressaltar que
todo esse projeto foi pensado para ser executado pelos professores
primários, prioritariamente nos grupos escolares, haja vista que
23
estes eram os espaços de excelência onde se efetivava em tese o
melhor ensino primário. (Freire, 2016, pg.53) – grifos nossos.
Voltamos a dizer: nada no Plano de Reforma de Mello, em nossa leitura, aponta
para diretamente para a organização do Instituto de Educação da Paraíba ou para o
fato de Mello ter pensado que seu plano deveria necessariamente ser executado pelos
professores primários, prioritariamente nos grupos escolares – inclusive no Plano ele
só cita os Grupos Escolares uma única vez, como uma das divisões da nova organização
do Ensino Normal que está propondo, mas não desenvolve nada para além disso.
Outra leitura sobre a época em questão faz críticas severas ao que foi o Instituto de
Educação já foi desde sua criação
Conforme o apresentado, percebemos que o Instituto de Educação na
Paraíba não conseguiu caminhar de acordo com o modelo previsto.
E julgamos que, o que se concretizou na Paraíba, não coube
chamar naquele momento de “Instituto de Educação” (Crispim,
2012, pg.92) – grifos nossos.
Ora, mas que modelo era previsto? Sim, porque não há fonte oficial – pelo menos
até aqui encontrada - nenhuma que explicite diretamente qual o modelo ou o projeto a
ser seguido. O que se sabe é de um agente da Educação do Estado, Mello, que em 1935
foi enviado para observação de uma de instituição de referência nacional (O IE do Rio
de Janeiro) e que posteriormente, inspirado no que viu, propôs um Plano de Reforma –
plano este que, como vimos, em muitos aspectos não se concretizou em forma de Lei. É
isso o que temos no caso da Paraíba, uma inspiração. Ou seja, a partir disso seria
possível concluir que a Paraíba não conseguiu caminhar de acordo com o modelo
previsto? E mais, seria mesmo possível diz que o que se concretizou na Paraíba, não
coube chamar naquele momento de “Instituto de Educação”?
Até o momento discordamos dessas leituras. Baseados no fato da ausência de fonte
oficial que apresente qual o modelo ou o projeto (pedagógico, político/ideológico) bem
como demais documentações que indiquem orientações para o funcionamento cotidiano
do IEP (ou seja, para sua institucionalização, sua representação, que antecipe o ideal
24
daquilo que deveria constituir a atividade própria da instituição), logo, não podemos
inferir sobre o “não cumprimento do modelo” e consequente sobre não ter havido – ao
menos nesse recorte estudado – um Instituto de Educação na Paraíba. Pelo contrário,
acreditamos que justamente por aparentemente não haver uma normatização oficial, um
modelo oficial a se seguir para além da inspiração carioca e dos preceitos da teoria
escolanovista, é que o IEP, desde sua criação, construção e até seus primeiros anos de
funcionamento, se consolidou e funcionou de maneira bastante particular, de acordo
com o que o contexto político e educacional paraibano permitiu e foi o conduzindo.
Dessa maneira, o argumento defendido aqui é que desde o início houve sim IEP, mas “à
moda paraibana de ser”.
3. Conclusão
Neste artigo propõe outra reflexão sobre, principalmente, o instituir e o
institucionalizar do Instituto de Educação da Paraíba no que concerne ao contexto de
sua criação em 1935 até o início do endurecimento do governo, com a ditadura do
Estado Novo, em 1937.O contexto paraibano que fomentou o instituir do IEP, em suas
particularidades, muito nos ajuda a entender a maneira como esta Instituição começou a
se organizar e funcionar no Estado.
A presença forte dos preceitos educacionais escolanovistas em solo paraibano é
inegável, tanto os jornais como os relatórios de governo, é possível averiguar indícios
dessa influência. Ademais, a defesa pública dessa perspectiva de Educação por parte do
Diretor da Instrução Pública à época, José Baptista de Mello, a reforçou. Todavia
encontrar indícios dessa inspiração, como é o caso do IE do Distrito Federal para a
Paraíba, não foi suficiente, a nosso ver, para que oficialmente fossem criados
instrumentos institucionalizantes do IEP (pelo menos nesses primeiros anos de seu
funcionamento) o que, mostra-nos os registros históricos, pode em muito ter contribuído
para a maneira como foi sendo conduzida a instituição daí em diante.
Não obstante, as fontes nos mostram que tanta complexidade conjuntural para o
surgimento do IEP não o impediram de se colocar enquanto instituição “modelar” para
25
o Estado e, em muitas medidas, como o que se tinha mais próximo como referência para
orientar, fiscalizar e, de certa forma, uniformizar o Ensino Normal na Paraíba.
4. Referências Bibliográficas:
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