O Governo Enterrou de Novo o Debate Da Regulação Da Mídia_ — CartaCapital

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Intervozes Sociedade Análise O governo enterrou de novo o debate da regulação da mídia? "Governo vai debater a regulação da mídia. (Podemos tirar, se achar melhor)" poderia ser parte de algum novo documento do go verno federal, que voltou a silenciar sobre este tema. por Coletivo Intervozes — publicado 30/04/2015 16h32, última modificação 30/04/2015 18h57 Por Pedro Ekman* No segundo turno da campanha eleitoral do ano passado, Dilma Rousseff sinalizou que, finalmente, levaria ao debate público o tema da regulação da comunicação. Afirmou, inclusive, que faria a “regulação econômica da mídia”. Logo no início do novo governo, o novo ministro da pasta, Ricardo Berzoini , reiterou a proposta e chamou a sociedade civil

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O governo enterrou de novo o debate da regulaçãoda mídia?

"Governo vai debater a regulação da mídia. (Podemos tirar, se achar melhor)" poderia ser parte de algum novo documento do governo federal,que voltou a silenciar sobre este tema.

por Coletivo Intervozes — publicado 30/04/2015 16h32, última modificação 30/04/201518h57

Por Pedro Ekman*

No segundo turno da campanha eleitoral do ano passado, Dilma Rousseff sinalizou que,

finalmente, levaria ao debate público o tema da regulação da comunicação. Afirmou,

inclusive, que faria a “regulação econômica da mídia”. Logo no início do novo governo, o

novo ministro da pasta, Ricardo Berzoini, reiterou a proposta e chamou a sociedade civil

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para dialogar . Então, disse que as ações em

torno do tema começariam em março. Mas

parece que o que era um compromisso

político mais uma vez foi abandonado.

Nesta quarta (29/04), o ministro participou

de audiência pública na Comissão de

Ciência e Tecnologia, Comunicação e

Informática (CCTCI) da Câmara dos

Deputados. Por mais de duas horas,

discursou sobre a agenda do Ministério das

Comunicações. Ao ser questionado sobre a

necessidade de um novo marco regulatório,

o ministro respondeu apenas que a

liberdade de expressão deve ser exercida em equilíbrio com os demais direitos consagrados

na Constituição Federal. Ele não tocou no tema da abertura do debate com a sociedade,

ausência que confirma o que a própria presidenta Dilma havia sinalizado no início deste

mês. Então, em entrevista coletiva a blogueiros, ela afirmou que “não há a menor condição

de abrirmos essa discussão neste momento, por conta de toda a situação”. A frase,

registrada pela jornalista Cynara Menezes, foi seguida pela seguinte pérola: “Me disseram

que vocês estão para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular, que estão colhendo

assinaturas. Não sei como ele é, nunca vi mais gordo, mas acho que pode ser interessante”.

Pelo visto, mais uma vez, o governo abriu mão de travar o debate e promover políticas em

uma área fundamental para qualquer sociedade democrática.

 Ao mesmo tempo em que continuaremos cobrando os compromissos firmados

Em audiência na Câmara, Berzoini evitou

falar sobre regulação dos meios de

comunicação. Foto: Marcelo Camargo /

 Agência Brasil

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anteriormente pelo governo, seguiremos a pautar a necessidade de regulação da mídia. Isso

porque os meios de comunicação ocupam no sistema democrático, hoje, o lugar importante

do debate sobre temas de interesse público. Em uma sociedade como a em que se vive em

2015, tomar decisões em praça pública com centenas de milhões de pessoas ao mesmo

tempo não é algo factível. A Internet talvez um dia permita isso, mas, com o nível de

exclusão digital que temos, este cenário continua distante. O papel de mediação ainda édesempenhado pelos meios tradicionais, como a televisão.

 Aliás, foi para enfrentar o problema da impossibilidade de reunir todos fisicamente em um

espaço público comum que inventamos dois instrumentos: o sistema de representação

política e a comunicação social eletrônica, ambos descritos e definidos na Constituição

Federal. O Congresso Nacional passa a ser o lugar central dos debates, do qual participam

com direito a voto os representantes eleitos da sociedade. Já por meio do rádio e da TV, a

sociedade obtém o conhecimento de informações para tomar suas decisões, como eleger 

representantes ou sair às ruas para protestar contra o que percebe estar errado.

Vale notar que tanto o Congresso como os canais de rádio e TV são espaços públicos. A

Constituição Federal fez questão de defini-los assim, pois eles são estruturantes do sistema

democrático representativo. O problema é que a política brasileira privatizou o espaço

público ao longo de sua história, favorecendo os interesses privados em detrimento dos

interesses públicos e republicanos. Os representantes do nosso Parlamento são eleitos comcampanhas milionárias, financiadas por corporações que passam a ter seus interesses

verdadeiramente representados no Congresso. As cédulas de dólares e reais substituem as

de votação em importância, corrompendo a estrutura do sistema. Da mesma forma, os

canais de rádio e TV são entregues a poucas empresas privadas, que definem o debate

político e cultural do país.

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Para termos ideia do impacto da concentração de mercado no debate público, podemos

analisar a discussão que ocorre neste momento sobre a possibilidade da redução da

maioridade penal. Como será a reação de uma sociedade que é bombardeada diariamente

por programas policialescos e telejornais que veiculam crimes cruéis supostamente

cometidos apenas por adolescentes? Com adolescentes condenados na praça pública da

TV, sem sequer ter o direito constitucional da presunção da inocência, a sociedade se vêimpelida a apoiar a redução da maioridade penal, já que esse é o caminho mostrado como

razoável diante dos fatos que foram selecionados para serem levados ao debate.

Não à toa, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados que discute a Proposta de

Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que propõe a redução da maioridade penal de 18

para 16 anos, aprovou esta semana a convocação dos jornalistas Marcelo Rezende (TV

Record), José Luiz Datena (Bandeirantes), Rachel Sheherazade (SBT) e Caco Barcellos

(Globo) para uma audiência pública sobre o tema. Os três primeiros são recorrentes

defensores da mudança e usam a televisão para divulgar suas ideias com veemência. Isso

sem que o Ministério das Comunicações, por exemplo, os puna por, entre outros casos,

incitar à violência, como feito por Sheherazade ao comentar ação de “justiceiros”, no ano

passado. A falta de vontade política do governo, aliás, se dá não apenas quando ele se

nega a travar o debate estrutural da comunicação, mas também quando se nega a fazer o

que deveria e já pode ser feito com as leis existentes no país.

Diante desse cenário, a democracia existe no papel, mas não se realiza na prática. O artigo

220 da Constituição define que não pode haver monopólio ou oligopólio na comunicação

social eletrônica. A Globo, no entanto, controla 70% do mercado, faturando sozinha mais do

que todas as demais empresas de comunicação. Isso acontece porque o Congresso

Nacional nunca elaborou leis definindo mecanismos que impedissem a formação de

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monopólio. Por que o Congresso tem sido omisso nas suas obrigações? O artigo 54 da

mesma Carta Magna determina que deputados e senadores não podem ser donos de

concessionárias de serviço público (o que inclui canais de rádio e TV). No entanto, a família

Sarney, os senadores Fernando Collor, Aécio Neves, Agripino Maia e Edson Lobão Filho

são apenas exemplos das dezenas parlamentares que controlam inúmeras emissoras em

seus estados.

Criar leis que tornem viáveis os objetivos constitucionais é justamente o que se chama de

regulamentar a Constituição, um passo fundamental para a regulação do sistema de

comunicações do país, para que o jogo democrático possa ser justo e equilibrado. No

entanto, congressistas e grandes emissoras de TV definem a regulação da mídia como

cerceamento da liberdade de expressão e como um ataque de um suposto governo

autoritário, que quer impedir críticas à sua gestão. Isso acontece porque as corporações de

mídia, ao reconhecerem a possibilidade de um cenário em que terão que dividir o bolo que

sempre comeram sozinhas, atacam a proposta e provocam medo na sociedade, para que

ela também reaja contra a medida.

“Podemos tirar, se achar melhor”

Muitas vezes, o mais importante não é o que se comunica, mas aquilo que se deixa de

comunicar. Recentemente, as redes sociais foram surpreendidas por uma notícia que foi ao

ar com uma nota do jornalista ao editor que dizia: “Podemos tirar, se achar melhor ”. A frase

estava inserida após um trecho da reportagem que ligava o esquema de corrupção da

Petrobras ao governo FHC. O diálogo entre um jornalista e um editor é algo absolutamente

trivial mas, ao expor a preferência de se levar ao debate público algumas informações e não

outras, ele provocou a reflexão sobre quantas notas não foram tornadas públicas e quantas

informações foram simplesmente retiradas do debate. O fato de que a mídia tem lado,

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posicionamento e opinião contraria o discurso corrente de que os meios são técnicos e

sempre optam pela melhor forma de informar. Tendo isso claro, fica fácil perceber que um

cenário de mercado altamente concentrado, onde apenas poucos empresários decidem o

que toda a sociedade vai debater, é algo mortal para uma sociedade que se pretende

democrática.

Regular a mídia não é censura e nem coisa de comunista. Países não comunistas como a

Inglaterra, a França, a Alemanha e até os Estados Unidos regulam as comunicações de

maneira mais determinada que o Brasil. Enquanto os donos do The New York Times não

podem ser os mesmos donos de uma emissora de TV, em Nova York, porque a regulação

americana coloca limites à propriedade cruzada dos meios de comunicação, aqui os donos

da Globo podem ter canais de TV, rádio, jornais, editoras, gravadoras e outros tantos

veículos, sem qualquer limite. Se, no Brasil, as emissoras de TV questionam na Justiça a

Classificação Indicativa (mecanismo de regulação de conteúdo para proteger as crianças de

cenas impróprias), na Suécia a publicidade infantil é absolutamente proibida. Estados

Unidos e Suécia estão longe do projeto comunista e nem por isso definem regulação como

censura.

Entendendo que a solução para esse problema não virá espontaneamente do Congresso

Nacional e cansada de esperar por um governo que decida enfrentar a questão de fato, a

sociedade civil brasileira elaborou e colhe assinaturas para o Projeto de Lei da MídiaDemocrática (aquele que a Presidenta disse desconhecer). Vários meios alternativos e

outras iniciativas de comunicação, além de ações diversas das organizações sociais,

buscam fomentar esse debate. Se, com todo o esforço da sociedade em pautar o assunto,

ele não aparece na TV e no rádio, é porque certamente alguém achou melhor tirar. E isso

sim é praticar censura.

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* Pedro Ekman é membro da Coordenação Executiva do Intervozes.

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