o Fim Do Brasil Parte 2

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Como amplamente noticiado em verso e prosa, o Brasil adota, desde 1 o de junho de 1999, o regime de metas de inflação. Conforme definição do próprio Banco Central, o regime de metas de inflação caracteriza-se por quatro elementos: (i) conhecimento público de metas numéricas de médio prazo para a inflação; (ii) comprometimento institucional com a estabilidade de preços como objetivo primordial da política monetária; (iii) estratégia de atuação pautada pela transparência para comunicar claramente o público sobre os planos, objetivos e razões que justificam as decisões de política monetária; e (iv) mecanismos para tornar as autoridades monetárias responsáveis pelo cumprimento das metas para a inflação. Para o caso brasileiro especificamente, o CMN (Conselho Monetário Nacional) define a meta e o Banco Central passa a persegui-la. Temos definido o centro da meta em 4,50% para a variação do IPCA ao ano, com uma banda de dois pontos percentuais, para cima ou para baixo. Eis o que tem sido a inflação oficial brasileira: 25 de junho de 2014 [1] O FIM DO BRASIL PARTE 2 - O PROBLEMA DA INFLAÇÃO Criando Riqueza apresenta... CHARTON MACIEL BAGGIO - 389.858.290-68

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Finanças no Brasil Parte 2

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Como amplamente noticiado em verso e prosa, o Brasil adota, desde 1o de junho de 1999, o regime de metas de inflação.

Conforme definição do próprio Banco Central, o regime de metas de inflação caracteriza-se por quatro elementos:

(i) conhecimento público de metas numéricas de médio prazo para a inflação;

(ii) comprometimento institucional com a estabilidade de preços como objetivo primordial da política monetária;

(iii) estratégia de atuação pautada pela transparência para comunicar claramente o público sobre os planos, objetivos e razões que justificam as decisões de política monetária; e

(iv) mecanismos para tornar as autoridades monetárias responsáveis pelo cumprimento das metas para a inflação.

Para o caso brasileiro especificamente, o CMN (Conselho Monetário Nacional) define a meta e o Banco Central passa a persegui-la. Temos definido o centro da meta em 4,50% para a variação do IPCA ao ano, com uma banda de dois pontos percentuais, para cima ou para baixo.

Eis o que tem sido a inflação oficial brasileira:

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O FIM DO BRASIL PARTE 2 - O PROBLEMA DA INFLAÇÃO

Criando Riqueza apresenta...

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Traduzindo o óbvio (como se precisasse), temos sistematicamente namorado a parte superior do intervalo da meta, simplesmente abandonando o centro de 4,50% ao ano. Aqui já há um erro importante.

Por que existe a tal banda? Basicamente, para incorporar a possibilidade de choques exógenos, sobretudo de oferta. Por exemplo: uma interrupção na demanda por suprimento de forma súbita eleva a inflação. Sem que houvesse o intervalo, o Banco

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Central teria de responder tempestivamente ao choque exógeno, que poderia muito mais facilmente ser absorvido e dissipado de maneira natural a partir da flexibilidade concedida pela banda.

O que temos feito é simplesmente trabalhar com o teto como a verdadeira meta. Assim, acabamos muito sensíveis a eventuais novos choques exógenos (sim, eles existem e são frequentes) capazes de nos empurrar para fora do intervalo. Em adição, trabalhamos com uma inflação que fere princípios distributivos (o pobre é o mais afetado pela alta de preços) e reduz o crescimento econômico de longo prazo.

Tudo isso ainda com represamento de preços, cujos exemplos mais clássicos são os setores de petróleo e energia. Sem desonerações, a inflação já estaria notadamente acima da meta, entre 8% e 9% ao ano. Veja que, em entrevista na Folha de S. Paulo em 14 de maio, o ministro Mercadante reconhece que o governo controla preços de combustíveis e energia elétrica. O represamento de preços tem consequências amplamente conhecidas e nefastas.

Há um segundo elemento heterodoxo sendo usado para manter a inflação dentro da meta: o câmbio. O real tem se apreciado contra o dólar de maneira sistemática nos últimos meses e isso decorre, sobretudo, de duas forças: i) a queda recente do rendimento do Treasury de 10 anos, grosso modo de 3% para 2,50%, estimulando busca por ativos não denominados em dólar (dá-lhe carry trade); ii) pesada atuação do Banco Central, em especial por meio de oferta e rolagem vultosas de contratos de swap cambial.

Aqui falamos do segundo erro importante de política monetária. O Banco Central, influenciado pelas restrições à subida da Selic em ano eleitoral (veja que a queda dos juros é um dos pilares da nova matriz econômica; em caso de dúvida, recorrer ao relatório anterior do Fim do Brasil), tem utilizado o câmbio para combater a escalada dos preços.

Com isso, ferimos o estado da arte em política monetária. Conforme muito bem sintetizado por David Blanchflower, o trabalho do Banco Central deve seguir o princípio do “one tool, one target”. Ou seja, um instrumento e um objetivo. E o instrumento consagrado é o juro de curto prazo (Selic) e não o câmbio.

Para encerrar o tópico da inflação corrente e falar das expectativas, salientamos que mesmo a desaceleração recente ainda tem sido marcada por níveis ainda altos e acima das projeções de consenso.

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O IPCA de maio trouxe alta de 0,46%, contra elevação de 0,67% em abril, desacelerando diante de queda do preço de alimentos e menor pressão de itens regulados. Ainda assim, o comportamento superou a mediana das estimativas da Bloomberg, definida em 0,38%. E o IPCA-15 de junho trouxe comportamento semelhante, ao subir 0,47% contra alta de 0,58% em maio e uma expectativa de 0,42% (mediana das projeções).

Se o comportamento da inflação passada não é motivo de elogio, o futuro sugere ambientes ainda mais delicado. A mediana das estimativas do relatório Focus aponta inflação oficial de 6,46% em 2014 e 6,10% em 2015.

Encerramos este primeiro tópico com a evolução da inflação de serviços, tradicionalmente associada a produtos mais intensivos em mão-de-obra do que em capital. Ele ajuda a explicar um ponto a ser apresentado posteriormente, de que a inflação alta e persistente guarda relação forte com a espiral preços-salários. (Fonte: www.vitorwilher.com).

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Por que a inflação é alta?

Caracterizemos explicitamente o que é inflação: o aumento generalizado e persistente de preços. Trata-se de sintoma inequívoco do descolamento entre crescimento da oferta e da

demanda agregada. O fenômeno foi descrito inclusive por recentes atas do Copom, que apontava esse descompasso como o grande vilão para a inflação alta.

A demanda agregada tem crescido em ritmo substancialmente superior à oferta. Por que isso acontece? Grosso modo, porque a variável-chave para conferir esse alinhamento é o investimento, pois ele entra, no período inicial, como demanda agregada e, no momento subsequente, passa a ser oferta.

O que tem acontecido com o investimento? Desde o segundo trimestre de 2013, a formação bruta de capital fixo acumula sua terceira queda consecutiva, com redução acumulada de mais de 5%.

A relação do Investimento sobre PIB marcou seu pico de 19,5% no final de 2010 e agora registra apenas 18,1%, com implicações importantes sobre a evolução da oferta agregada. Esta redução retira cerca de 0,5 ponto percentual de capacidade de crescimento ao ano.

Note ainda que o percentual sugere fracasso completo da política industrial brasileira. A implementação do Plano Brasil Maior, em 2011, trazia como meta explícita elevar a taxa de investimento de 18,4% para 22,4% do PIB até 2014 - não somente falhamos em entregar a evolução prometida como demos um passo para trás.

Em outras palavras, estamos comprometendo fortemente a capacidade de expansão da oferta agregada. Enquanto isso, a demanda segue substancialmente estimulada, reforçado o tal descolamento supracitada.

Dois elementos puxam para cima a demanda agregada - e como a oferta não cresce no mesmo ritmo, a resposta óbvia é a inflação (há também uma segunda resposta, que é o déficit em conta corrente, sobre o qual podemos falar numa nova oportunidade).

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A primeira força estimulante da demanda é o consumo do governo, que ultrapassou 22% do PIB, o nível mais alto da série histórica iniciada em 1995, fazendo-nos um dos poucos países em que essa variável supera o investimento.

E a segunda decorre da concessão de aumentos de salários substancialmente superiores aos ganhos de produtividade, conforme demonstrado pelo gráfico abaixo: (Fonte: www.vitorwilher.com)

O corolário óbvio da dinâmica é a chamada espiral preços-salários, com relevante contribuição para o componente inercial da inflação. Em âmbito micro, a consequência de um aumento de salário superior à produtividade do trabalhador implica deterioração da margem de lucro do empresário. Para recompor sua margem, o empresário remarca preços para cima. Em reação, para preservar seu poder de compra, o trabalhador volta a exigir novos aumentos de salários. E a dinâmica segue indefinidamente.

Veja que o problema de salários crescendo acima da produtividade já é reconhecido pelos próprios técnicos do governo, incluindo aqui os maiores especialistas nas questões sociais. Em entrevista à Exame, Ricardo Paes de Barros, da secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência, deixa claro como será impossível continuar com os enormes aumentos do salário mínimo sem crescimento da produtividade.

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Disse o economista: “nosso maior risco é que a renda dos menos educados comece a crescer lentamente. Se não tivermos um crescimento grande da produtividade, essa será uma possibilidade real.”

O remédio

O Fim do Brasil carrega uma abordagem essencialmente construtiva. Detecta-se um problema e, sempre, propõe-se uma solução. Aqui não será diferente. Como combater o problema da inflação?

A solução passa necessariamente pelo reconhecimento de que a tal nova matriz econômica (juros baixos, câmbio depreciado e política fiscal expansionista) falhou, com posterior abandono dessa diretriz.

De imediato, como resposta de curto prazo, precisaríamos subir a taxa Selic. A inflação de 12 meses pode inclusive superar o teto da meta já em junho. Ademais, as expectativas de inflação sugerem inclusive a possibilidade do estouro dos 6,50% em 2015. Só pode haver uma resposta a essa dinâmica: subir a taxa de juro de curto prazo.

Para médio e longo prazo, precisamos criar mecanismos consistentes de alinhamento no ritmo de crescimento entre demanda e oferta agregada. Para tanto, precisamos criar regras para impedir evolução do custeio do governo em velocidade superior à expansão do PIB de forma consistente.

É fundamental também atrelarmos crescimento dos salários aos ganhos de produtividade. A forma mais simples e imediata de aumentar a produtividade na economia é incrementar os investimentos em infraestrutura. Isso é uma injeção na veia da produtividade.

Infelizmente, em pleno ano eleitoral e num governo com convicções equivocadas e pouca competência técnica, a maior parte das medidas não deve ser adotada agora. Isso posto, devemos conviver com uma inflação alta por algum tempo.

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As recomendações de investimento

1) Prefira os pós-fixados (LFTs) aos prefixados (LTNs e NTN-Fs): o instrumento clássico de combate à inflação é a taxa de juro de curto prazo. Cedo ou tarde, o Copom terá de subir a Selic. Pode ser depois das eleições, mas a retomada do processo de aperto monetário nos parece inevitável. Conforme supracitado, o atual comportamento da inflação e das expectativas de inflação já seria suficiente para isso. Há ainda agravantes. Na ata de sua última reunião, o Copom deixa claras duas hipótese de trabalho: i) cumprimento da meta fiscal; e ii) câmbio a R$ 2,20. A primeira, se já era pouco crível em face ao histórico, torna-se ainda mais improvável a partir do rombo do setor elétrico, que pode chegar a R$ 9 bilhões adicionais, exigindo novo socorro do governo. Em relação ao câmbio, as condições para o carry trade devem piorar com o provável aumento do yield dos Treasuries. O viés do câmbio nos parece claramente para cima.

2) Prefira as NTN-Bs às LTNs e NTN-Fs: por definição, os prefixados oferecem uma taxa de juro nominal no momento de sua compra. Ocorre, porém, que o interesse do investidor é no juro real (rendimento descontada a inflação). Então, a decisão entre LTN/NTN-F (prefixados) contra NTN-B (que paga variação do IPCA mais um juro) passa necessariamente por estimativas para a inflação. Note que na NTN-B o investidor tem a certeza sobre o juro real (rendimento atrelado à inflação), enquanto na LTN temos apenas a expectativa sobre o juro real - é uma certeza de proteção da inflação contra uma simples estimativa para a inflação. Deve-se cobrar um prêmio adicional portanto para correr esse risco de inflação. Ou seja, o rendimento da LTN é um juro real + expectativa de inflação + risco de inflação. Preferimos as NTN-Bs justamente por oferecer essa proteção contra a inflação e estar blindada quanto ao provável aumento do risco de inflação.

3) Compre ações protegidas da inflação: há excelentes alternativas em Bolsa cujas receitas estão protegidas da inflação (tarifas corrigidas por algum índice). Setores elétrico e de concessões rodoviárias oferecem alguns nomes. Oportunamente, divulgaremos uma carteira de cinco boas ações que estão blindadas à escalada dos preços.

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Disclosure

Elaborado por analistas independentes da Empiricus, este relatório é de uso exclusivo de seu destinatário, não pode ser reproduzido ou distribuído, no todo ou em parte, a qualquer terceiro sem autorização expressa. O estudo é baseado em informações disponíveis ao público, consideradas confiáveis na data de publicação. Posto que as opiniões nascem de julgamentos e estimativas, estão sujeitas a mudanças. Nem a Empiricus nem os analistas respondem pela veracidade ou qualidade do conteúdo.

Este relatório não representa oferta de negociação de valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros. As análises, informações e estratégias de investimento têm como único propósito fomentar o debate entre os analistas da Empiricus e os destinatários. Os destinatários devem, portanto, desenvolver suas próprias análises e estratégias.

Informações adicionais sobre quaisquer sociedades, valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros aqui abordados podem ser obtidas mediante solicitação.

Os analistas responsáveis pela elaboração deste relatório declaram, nos termos do artigo 17º da Instrução CVM nº 483/10, que: 

+ As recomendações do relatório de análise refletem única e exclusivamente as suas opiniões pessoais e foram elaboradas de forma independente.

+ Os analistas são sócios e participam dos lucros da Iguatemi Gestão, que mantém em fundos e carteiras de valores mobiliários que administra ativos objeto de análise por parte da Empiricus Research, podendo daí resultar conflito de interesses.    

* O analista Rodolfo Amstalden é o responsável principal pelo conteúdo do relatório e pelo cumprimento do disposto no Art. 16, parágrafo único da Instrução ICVM 483/10.

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Analistas Responsáveis

Beatriz Nantes, CNPI

Felipe Miranda, CNPI

Rodolfo Amstalden, CNPI*

Roberto Altenhofen, CNPI

Gabriel Casonato, CNPI

Assistentes de Análise

João Françolin

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