O ETHOS E A CENOGRAFIA NA PRODUÇÃO DE SENTIDOS … · A construção do ethos e da cena ... Para...
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IV CONALI - Congresso Nacional de Linguagens em Interação
Múltiplos Olhares 05, 06 e 07 de junho de 2013
ISSN: 1981-8211
O ETHOS E A CENOGRAFIA NA PRODUÇÃO DE SENTIDOS PARA O
COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Marlon Richard ALVES1
Daiany BONÁCIO2
Introdução
Na atualidade, tornou-se comum observarmos a mídia realizando campanhas às
quais buscam conscientizar as mulheres a não aceitar nenhum tipo de violência doméstica.
Isso ocorre por meio de discursos os quais propagam que as mulheres têm o direito a uma
vida sem sofrimento. Ademais, tais discursos as incentivam a denunciar seus agressores,
uma vez que elas têm todo o suporte legal para protegê-las, dando uma punição adequada a
quem comete tais ações.
A partir dessas considerações, o presente trabalho tem como objetivo discutir o
papel que os discursos midiáticos exercem no combate a violência doméstica e quais
recursos são utilizados para a construção desses discursos. Para tanto, mobilizaremos os
conceitos de ethos (Maingueneau, 2001; Amossy, 2005) e de cena enunciativa
(Maingueneau, 2001), presentes na teoria da Análise do Discurso de linha francesa. Por
meio dessa discussão, será possível vislumbrarmos que a mídia constrói um ethos e uma
cenografia essenciais para que os sujeitos envolvidos nessas questões sejam atingidos, pois,
como revela Maingueneau (2001), a cena enunciativa não é apenas um cenário, mas é
condição de sentido, que auxilia na constituição da enunciação.
O corpus de análise selecionado é composto por duas campanhas comunitárias,
sendo que uma pertence ao ministério público do Rio Grande do Sul e, a outra, ao Instituto
1 Acadêmico do curso de Letras Português/Espanhol da Faculdade Alvorada de Tecnologia e Educação de
Maringá e participante do Projeto de Iniciação Científica (PIC-Alvorada).
2 Professora Doutora da Faculdade Alvorada de Tecnologia e Educação de Maringá - orientadora.
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Patrícia Galvão em parceria com a empresa Avon. O objetivo dessas campanhas é mostrar
como a figura do homem agressor é vista pela família e também pela sociedade que o
rodeia, uma vez que ao agredir a esposa, o homem “agride” toda a família, tanto
fisicamente como psicologicamente.
Com essa análise será possível perceber como os discursos machistas, que pregam
uma mulher submissa ao seu marido a qualquer custo, estão sendo refutados nos dias de
hoje, isto é, estamos em uma sociedade que a mulher está ocupando um posicionamento
igualitário ao dos homens em vários aspectos sociais, sendo um deles o direito a uma vida
sem sofrimentos e sem ser vítima de homens agressores. A construção do ethos e da cena
da enunciação de uma mulher que denuncia seu agressor auxiliarão a vislumbrar como os
meios de comunicação agem para formar uma nova identidade para homens e mulheres
envoltos a violência doméstica.
Pressupostos teóricos
Iniciaremos nossa discussão apresentando os conceitos selecionados que servirão de
embasamento teórico para nossa análise. Primeiramente, temos o conceito de ethos, o qual
tem sua origem nos estudos sobre a retórica realizados por Aristóteles. Para o referido
autor, é no discurso que o sujeito pode usar todo o seu poder de persuasão e construir uma
imagem de si no intuito de conquistar os interlocutores com sua fala.
Amossy (2005) coloca que os antigos designavam pelo termo ethos a construção de
uma imagem de si destinada a garantir o sucesso do empreendimento oratório, indo de
encontro com aquilo que Aristóteles diz em seus estudos da retórica. Todavia essa a
concepção de ethos vem sendo muito discutida e toma um valor discursivo, no qual a partir
do que é dito pelo sujeito, é possível depreender uma imagem física e psicológica do
indivíduo. A partir desse valor discursivo, Amossy (idem), também menciona que o ethos
contribui para que o locutor possa conferir certo status ao seu discurso, além de estar ligado
também às questões de legitimidade da produção discursiva. Por meio do ethos é possível
projetar a imagem do sujeito sem que ele fale nada sobre si: construímos um conceito sobre
o enunciador por meio das palavras usadas por ele. Diante disso, Amossy (2005) afirma
que:
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Todo ato de tomar a palavra implica a construção de uma imagem de si.
Para tanto, não é necessário que o locutor faça seu auto-retrato, detalhe
suas qualidades nem mesmo que fale explicitamente de si. Seu estilo,
suas competências lingüísticas e enciclopédicas, suas crenças implícitas
são suficientes para construir uma representação de sua pessoa. Assim
deliberadamente ou não, o locutor efetua em seu discurso uma
apresentação de si. (AMOSSY, 2005, p. 9).
Sobre o assunto, Maingueneau (2001) afirma que por meio da enunciação revela-se
a personalidade do sujeito, uma vez que a noção de ethos se desenvolve e se articula com a
enunciação.
Além dessas características elencadas, Maingueneau (2001) nos mostra outras que
também auxiliam na construção do ethos: o tom, a corporalidade e o caráter. Para o autor, é
por meio do discurso que temos a possibilidade de descobrir o tom da fala. Segundo o
linguista, “um tom dá autoridade ao que é dito. Esse tom permite ao leitor construir uma
representação do corpo do enunciador (...) (MAINGUENEAU, 2001, p. 98).” Além disso, a
construção do ethos nos permite depreender o caráter e a corporalidade do orador, isto é,
os traços psicológicos e as características físicas de quem está enunciando. Ainda temos o
fiador, que nada mais é do que a personagem mostrada em cena e que vai garantir a
autoridade e a possibilidade do discurso, já que ela é quem dá o corpo a enunciação.
Após essa explanação do conceito de ethos, falemos do segundo conceito o qual
será de grande utilidade para analisarmos os enunciados propostos para este artigo: a cena
da enunciação. Em relação à cena da enunciação, Maingueneau (2001) afirma que podemos
encontrar três tipos de cena: cena englobante, cena genérica e cenografia.
Primeiramente, temos à cena englobante, a qual Maingueneau (2001) afirma que “é
a que corresponde ao tipo de discurso”, isto é, o tipo de cena a qual devemos nos situar para
interpretarmos os enunciados, que pode ser: religioso, político, publicitário, escolar,
familiar, dentre outros. O autor apresenta também a cena genérica: a esta cabe os gêneros
do discurso, pois é insuficiente pensarmos apenas em tipos discursivos, uma vez que esses
tipos então inseridos em gêneros discursivos. Assim Maingueneau (2001) define esses dois
conceitos como sendo o quadro cênico de um texto. Todo texto insere-se em um quadro
cênico: é ele que define o espaço estável no tipo (cena englobante) e no gênero de discurso
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(cena genérica). Por último, temos a cenografia. A esse respeito, o linguista pontua que o
leitor não se depara diretamente com o quadro cênico, apresentado anteriormente, mas com
uma cenografia, que pode ser vista como um primeiro plano antes do quadro cênico. A
respeito dessa cenografia Maingueneau (2001) afirma que:
[...] não é simplesmente um quadro, um cenário, como se o discurso
aparecesse inesperadamente no interior de um espaço já construído e
independente dele: é a enunciação que, ao se desenvolver, esforça-se para
construir progressivamente o seu próprio dispositivo de fala.
(MAINGUENEAU, 2001, p. 87)
Com isso, percebemos que a cenografia está diretamente ligada à construção de seu
próprio dispositivo de fala e tem como foco legitimar o discurso.
Por fim, chegamos à noção da importância da cena da enunciação na produção de
sentidos, afinal os enunciados devem seguir as coerções que a cenografia coloca. Em outras
palavras, os discursos exigem certas cenas que são típicas deles, ou seja, próprias a
determinados discursos, como por exemplo, temos uma escola, uma igreja cujas
cenografias são pré-estabelecidas.
Aplicando conceitos
Para que possamos iniciar nossa análise, verificando qual a cena e ethos estão
presentes nas campanhas, apresentaremos o primeiro corpus, que é uma campanha
realizada pelo Instituto Patrícia Galvão3 em parceria com outras instituições.
3 Como se trata de um vídeo, recortamos algumas cenas que julgamos representativas para a análise.
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Figura 1 – Violência contra mulher (Instituto Patrícia Galvão)
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No vídeo trazido, primeiramente, temos uma câmera que mostra uma família
reunida para tomar o café da manhã. A primeira ação envolvendo essa cena da enunciação é
quando o pai estende a mão para apanhar o adoçante e a filha se afasta rapidamente,
esquivando-se do pai. Neste momento, todos olham apreensivamente para ele e a mãe
coloca a mão na boca, com ar de preocupação. Em outro momento, o pai se aproxima da
mesa em que o filho supostamente faz seu dever de casa para apanhar sua chave, e seu filho
tem a mesma reação de sua irmã, afastar-se do pai, por medo. Em seguida, vemos a mãe
penteando a sua filha e o pai se aproxima para pegar sua carteira que está em frente ao
espelho. Neste instante, a mãe puxa sua filha para perto de si, mostrando o medo que
ambas tem deste homem. Por fim, o pai abre a porta de casa para sair e até o seu cachorro,
com um choro de medo, se afasta do dono. Ao final da apresentação dessas cenas, aparece a
voz de um narrador o qual diz: “Homem que bate, machuca a mulher, os filhos e ele
mesmo. Homem que é homem, não bate”.
O vídeo apresentado pode ser considerado a representação de alguns momentos
vividos por uma família em seu cotidiano. A presente cena evidencia que o pai gera medo
nos filhos e na mulher. Isso é possível de ser compreendido porque, sempre que o pai se
aproxima de um dos filhos, da mulher e até mesmo quando passa por seu cachorro, todos se
afastam dele, demonstrando medo. A partir disso, observamos que esses comportamentos
não são comuns na sociedade, uma vez que não é típico associarmos a imagem paterna ao
temor da família. Nesse sentido, vemos que essa campanha nos revela um “pai” que deixa
sua família angustiada, apreensiva, amedrontada, porque, com certeza, pratica a violência
doméstica. Por agredir sua esposa, o sujeito desestabiliza todo o alicerce familiar, gerando
temor na família. Esses sentimentos elencados nos mostram a aflição da mulher que sofre
tanto por ser agredida quanto por ver seus filhos envolvidos psicologicamente/fisicamente
nessa “dor”.
Toda essa cenografia construída nesta propaganda edifica uma representação de que
as mulheres devem buscar seus direitos, como ser livre e feliz em seu lar. Uma nova
identidade é proposta a ela: a de uma pessoa que não aceita os discursos e práticas
machistas e que luta por uma vida sem agressões.
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Seguindo o conceito de cena da enunciação de Maingueneau (2001), podemos dizer
que a cena englobante presente neste texto – tipo de discurso – é a cena do discurso
doméstico, no qual foi retomado para mostrar que ele foge ao imaginário do que as pessoas
pensam sobre as cenas vividas em uma casa. É na cena englobante que os personagens são
caracterizados, sendo assim, quem produziu esse anúncio não poderia colocar uma família
feliz, um pai carinhoso com seus filhos e sua esposa ou que fosse em um escritório, pois
ele deseja mostrar como é o sofrimento e o medo da família, cuja mãe é espancada e que é
algo que afeta a todos que vivem neste ambiente.
Ainda na perspectiva da cena enunciativa, podemos dizer que a cena genérica, a
qual corresponde ao gênero do discurso, presente no corpus é o gênero campanha
comunitária, uma vez que se procura persuadir, fazer com que as mulheres denunciem seus
agressores, e assim viva uma vida tranquila. Assim, a cena apresentada constrói um
discurso de uma mulher livre da violência e dos discursos machistas.
A partir dessas considerações, observamos que a cenografia apresentada na
campanha evidencia que a partir do momento que a mulher se cala frente a esse tipo de
violência, não é apenas ela quem sofre, mas sim toda a família, comprovado pelo fato de
que, sempre que o pai se aproxima, todos fogem dele. Assim como é revelado por
Maingueneau (2001), a cenografia construída não é alicerce apenas para o cenário de
“súplica” por uma vida sem violência, mas é condição de sentido que auxilia na
constituição da enunciação.
É na cenografia que ocorre a legitimação do discurso contra o tipo de violência em
questão, visto que é algo validado em nossa sociedade, pois toda a sociedade se mobiliza
para o fim desse tipo de agressão. Também se deve pontuar que, ao promover esse tipo de
cena, são utilizados recursos os quais nos levam o mais próximo da verossimilhança do
fato, para que as mulheres sintam e vejam aquilo que ocorrem ao seu redor.
Além dessas considerações, utilizaremos o conceito de ethos para dar contribuição a
nossa análise. Como vimos, o modo de falar, de agir, de se portar, denuncia o modo de ser
do sujeito, construindo assim um ethos para ele. A partir disso, verificaremos qual ethos foi
assumido pelos fiadores na presente campanha a fim de construir sentidos sobre a violência
contra a mulher.
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É sabido que, para a construção do ethos, é preciso que o fiador, isto é, a
personagem que se apresenta em cena, assuma um caráter e uma corporalidade. O caráter
corresponde às características psicológicas, as quais podem ser notadas no momento em
que o pai se aproxima dos filhos. Essa aproximação gera medo e tristeza na família; isso
pode ser percebido nas expressões mostradas em cena e no momento em que todos se
afastam do pai. Já a corporalidade, isto é, os traços físicos, o modo como os fiadores se
vestem ou agem, ajudam a construir a imagem típica de uma família: temos pessoas
sentadas à mesa do café, realizando suas atividades diárias, como cumprir a tarefa escolar
ou sair para o trabalho. O que gera uma cena de denuncia nessa corporalidade assumida
pelos fiadores é o tom. Toda essa cena é revestida por um tom de temor e aversão ao pai.
A partir do que foi descrito acima, percebemos que foram assumidos dois ethos para
a construção dessa campanha: o primeiro é o ethos de um pai que é visto como um vilão,
um homem mau, que maltrata sua esposa e machuca sua família, um homem que pensa ser
superior a sua companheira e está transbordando de discursos machistas. O segundo diz
respeito ao ethos da família que tem medo deste pai que agride sua mãe, uma família
completamente transtornada e que vive com muitas angústias.
Assim, para que fosse possível construir os efeitos de sentidos pretendidos –
convencer as mulheres a buscarem seus direitos – foi preciso a construção de uma cena
enunciativa, com a presença de fiadores convincentes com tom, caráter e corporalidade
pertinentes, isto é, a edificação de ethos diferentes para as personagens envolvidas, para que
pudesse persuadir o sujeito feminino a sair de sua submissão.
Tal trabalho também poderá ser observado no próximo corpus que selecionamos
para esse artigo. Trata-se de uma campanha produzida pelo ministério estadual do Rio
Grande do Sul. Vejamos:
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Figura 2 - Violência contra mulher (Ministério público do estado do Rio Grande do Sul)
Nesta campanha, temos, primeiramente, uma mulher jogada ao chão de sua casa
com um folheto em uma mão (provavelmente esse folheto tem alguma informação de como
buscar ajuda) e o telefone na outra. Ela encontra-se machucada e seu filho observa o que
está ocorrendo. O fato de o filho estar em cena, incentiva à mulher a completar a ligação,
evidenciando que ela fez a denúncia. Simultâneo a esta cena, é trazida outra mulher que
está defronte a uma delegacia. Ela usa um lenço para esconder as marcas que tem no
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pescoço, supostamente por ter sido agredida. Ao tocar seus machucados, ela toma coragem
e entra na delegacia, evidenciando que tal mulher também realizou a denuncia. Ao final da
cena, temos a fala de um narrador o qual diz: “Violência doméstica: vergonha é não fazer
nada. Denuncie!”
O primeiro ponto que chama atenção nessa sequência é que temos duas fiadoras, as
quais, ao contrário da campanha anterior, tomam coragem para denunciar seus agressores.
Nesta campanha, podemos observar que a cena englobante presente no texto é novamente
do tipo de discurso doméstico na primeira cena, ou seja, é preciso ativar o discurso do
ambiente familiar para que possa ser interpretado o enunciado. Na segunda cena, a presença
de uma mulher em frente à delegacia evidencia que foi convocado o discurso policial,
órgão que auxilia as mulheres no combate à violência.
No tocante à cena genérica, temos o gênero campanha comunitária, visto que é
produzida por institutos governamentais e sociais para tentar conscientizar as mulheres
vítimas de agressões a acabar com esse problema. Esse tipo de discurso não poderia ter
ocorrido de outra maneira se não no ambiente familiar ou policial, pois se não fosse dessa
maneira, não se conseguiria construir os sentidos pretendidos. Como foi dito anteriormente,
é por meio da construção de uma cenografia que o discurso é legitimado, e isso é feito neste
corpus de análise, uma vez que, trazendo mulheres as quais denunciam seus agressores, tal
campanha incentiva o fim da violência doméstica. Além disso, constrói-se discursos de uma
mulher moderna que refuta discursos machistas e agressões domésticas.
Em relação ao ethos, observamos a presença de duas fiadoras feridas,
psicologicamente e fisicamente. Isso pode ser observado no momento em que a primeira
mulher está jogada no chão, toda machucada e praticamente sem forças para se levantar
dali, ou pela segunda que esconde, por meio de um lenço, as marcas deixadas por seu
agressor. Ambas as fiadoras representam as mulheres que denunciam seus agressores, não
aceitando a violência doméstica sofrida.
Verificando o caráter e a corporalidade presentes no vídeo em questão, vemos que
as fiadoras têm um caráter de mulher sofredora, mas que tem esperança de que isso possa
mudar. A corporalidade mostra mulheres totalmente machucadas, com muitos hematomas,
mas que mesmo assim não deixarão a vida acabar desta forma.
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A construção do ethos e da cena enunciativa nesta campanha constituem a imagem
de que as mulheres devem lutar e procurar a ajuda disponível para ajudá-las a sair de uma
situação tão deplorável.
As duas campanhas trazidas evidenciam a construção de dois ethos de mulheres
agredidas que se encontram e que também se distanciam: ambas as cenas trazem sujeitos
que sofrem com a violência doméstica, nesse ponto, vemos uma proximidade entre elas.
Contudo, ao contrário da primeira campanha, na qual a mulher era totalmente submissa ao
marido, a segunda cena evidencia mulheres que tomam uma atitude contra o que sofreram.
Ademais, as duas campanhas incentivam as mulheres para que busquem auxílio no combate
à violência doméstica.
Considerações finais
O presente trabalho nos propiciou um entendimento mais amplo dos conceitos de
ethos e cena da enunciação, visto que eles são de suma importância na compreensão e
análise dos discursos e enunciados que circulam em nossa sociedade, sobretudo nos meios
de comunicação social.
Através deste artigo também conseguimos perceber como os instrumentos
midiáticos operam na produção de discursos que tentam propagar a luta e conscientização
por uma sociedade na qual a violência doméstica contra a mulher seja abolida de uma vez
por todas. Nesse sentido, percebemos o quão importante é o trabalho realizado pela mídia,
pois com ela novos sujeitos e novas ideologias aparecem a todo o momento. Além disso, os
discursos midiáticos nos permitem identificar como cada sujeito se porta, e que pelo seu
comportamento conseguimos identificar qual imagem e quais sentidos ele transpassa.
Para tal conclusão, o aparato teórico de Maingueneau (2001) e Amossy (2005) foi
de estrema importância, uma vez que foram eles que nos permitiram compreender e
“destrinchar” todos os sentidos de cada corpus aqui analisado.
Referências
AMOSSY, Ruth. Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto,
2005.
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Campanha pela Não Violência Contra a Mulher. In:
http://www.youtube.com/watch?v=oNFRg0bPBdc, acesso em 08 de maio de 2012
Campanha de Combate à Violência Doméstica contra a Mulher - MP/RS. In:
http://www.youtube.com/watch?v=mQNuKzBJTT0, acesso em 08 de maio de 2012
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. Tradução de Cecília
P. de Souza e Silva, Décio Rocha. São Paulo: Cortez, 2001.
_______. Novas tendências em análise do discurso. Tradução de Freda Indursky.
Campinas, SP: Pontes: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 3 ed, 1997.