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ISSN 2176-1396 O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: UM PROJETO EDUCACIONAL SOBRE DROGAS Letícia Alves da Cruz 1 - UCDB Suelen Regina Patriarcha-Graciolli 2 - UFMS / UCDB EixoEnsino e Práticas nas Licenciaturas Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O estágio supervisionado é um processo no qual se permite ao futuro docente desenvolver uma visão crítica a partir das observações realizadas em sala de aula e da sua atuação didática. Essa criticidade permite, por sua vez, desconstruir a visão simplista do ensino, um dos problemas atuais na educação brasileira. Além disso, o estágio supervisionado deve compreender a escola nos aspectos que regem sua organização e estrutura, itens que influenciam o planejamento de aula. Sendo assim, a prática desenvolvida durante o estágio supervisionado deve estar correlacionada com as teorias discutidas na graduação. Nesse contexto, durante a formação docente, por meio das discussões teóricas, o futuro docente deve obter um momento de reflexão crítica sobre as metodologias dos sistemas, se não ocorrer esse processo durante sua formação, principalmente no estágio supervisionado, o futuro docente se limita à reprodução de técnicas de ensino vivenciadas enquanto aluno da educação básica, sendo incapaz de reconhecer outras possibilidades. Nessa perspectiva, o objetivo do presente relato é descrever o estágio de regência de uma turma do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, realizado no ano 2016 em duas escolas públicas em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, mediante um projeto educacional com o tema Drogas, ressaltando os pontos principais da observação da sala de aula, planejamento e execução. Durante o período de estágio foi possível observar na prática a importância das reflexões teóricas relacionadas à educação, ao processo de ensino e aprendizagem, ao planejamento, a prática docente, aos aspectos que envolvem a docência, e a formação do professor. O estágio docente no formato de projeto didático contribuiu ainda para aproximação da escola e a universidade, de modo a efetivar as parcerias necessárias entre as instituições de ensino. Palavras-chave: Estágio de Regência. Prática pedagógica. Formação Docente. 1 Acadêmica de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) Campo Grande/MS. E-mail: [email protected]. 2 Bióloga, doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Docente da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). E-mail: [email protected].

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ISSN 2176-1396

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO CURSO DE LICENCIATURA EM

CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: UM PROJETO EDUCACIONAL SOBRE

DROGAS

Letícia Alves da Cruz1 - UCDB

Suelen Regina Patriarcha-Graciolli2 - UFMS / UCDB

Eixo–Ensino e Práticas nas Licenciaturas

Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

O estágio supervisionado é um processo no qual se permite ao futuro docente desenvolver uma

visão crítica a partir das observações realizadas em sala de aula e da sua atuação didática. Essa

criticidade permite, por sua vez, desconstruir a visão simplista do ensino, um dos problemas

atuais na educação brasileira. Além disso, o estágio supervisionado deve compreender a escola

nos aspectos que regem sua organização e estrutura, itens que influenciam o planejamento de

aula. Sendo assim, a prática desenvolvida durante o estágio supervisionado deve estar

correlacionada com as teorias discutidas na graduação. Nesse contexto, durante a formação

docente, por meio das discussões teóricas, o futuro docente deve obter um momento de reflexão

crítica sobre as metodologias dos sistemas, se não ocorrer esse processo durante sua formação,

principalmente no estágio supervisionado, o futuro docente se limita à reprodução de técnicas

de ensino vivenciadas enquanto aluno da educação básica, sendo incapaz de reconhecer outras

possibilidades. Nessa perspectiva, o objetivo do presente relato é descrever o estágio de

regência de uma turma do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, realizado no ano 2016

em duas escolas públicas em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, mediante um projeto

educacional com o tema “Drogas”, ressaltando os pontos principais da observação da sala de

aula, planejamento e execução. Durante o período de estágio foi possível observar na prática a

importância das reflexões teóricas relacionadas à educação, ao processo de ensino e

aprendizagem, ao planejamento, a prática docente, aos aspectos que envolvem a docência, e a

formação do professor. O estágio docente no formato de projeto didático contribuiu ainda para

aproximação da escola e a universidade, de modo a efetivar as parcerias necessárias entre as

instituições de ensino.

Palavras-chave: Estágio de Regência. Prática pedagógica. Formação Docente.

1Acadêmica de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) Campo

Grande/MS. E-mail: [email protected]. 2Bióloga, doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências da Universidade Federal de Mato

Grosso do Sul (UFMS). Docente da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). E-mail:

[email protected].

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Introdução

O estágio supervisionado é um processo no qual se permite ao futuro docente

desenvolver uma visão crítica a partir das observações realizadas em sala de aula e da sua

atuação didática. Essa criticidade permite, por sua vez, desconstruir a visão simplista do ensino,

um dos problemas atuais na educação brasileira. Além disso, o estágio supervisionado deve

compreender a escola nos aspectos que regem sua organização e estrutura, itens que influenciam

o planejamento de aula. Sendo assim, a prática desenvolvida durante o estágio supervisionado

deve estar correlacionada com as teorias discutidas na graduação. Nesse contexto, durante a

formação docente, por meio das discussões teóricas, o futuro docente deve obter um momento

de reflexão crítica sobre as metodologias dos sistemas, se não ocorrer esse processo durante sua

formação, principalmente, no estágio supervisionado, o futuro docente se limita na reprodução

de técnicas de ensino vivenciadas enquanto aluno da educação básica, sendo incapaz de

reconhecer outras possibilidades.

O estágio curricular é um processo que consiste de experiências práticas que aproximam

o futuro docente à realidade da sua profissão. De acordo com Scalabrin e Molinari (2013), o

estágio é o processo que permite a integração da teoria trabalhada na universidade com a

realidade escolar. Nesse contexto, para Carvalho e Gil-Pérez (2011), o estágio deve ser

entendido como um eixo articulador entre teoria e prática. Pimenta e Lima (2006) salientam

que o exercício de qualquer profissão exige a prática, no entanto, a prática isolada da teoria e

do pensamento crítico resulta em falhas na formação docente. Deste modo, se o estágio for

reduzido apenas à observação dos professores em aula e a imitação dos mesmos, reproduz um

sistema conservador e descontextualizado com a realidade. Um processo semelhante ocorre

quando o futuro docente acredita que as técnicas e habilidades são as resoluções de todos os

problemas confrontados e fica então reduzido ao “prático” acreditando não necessitar de

domínio dos conhecimentos científicos e pedagógicos.

A teoria deve estar em conjunto com a prática propiciando visão crítica ao futuro

docente sobre as observações feitas e sua atuação didática. A criticidade, por sua vez, permite

o rompimento da visão simplista de ensino tradicionalista. Carvalho (2013a) explica que

diferente das outras profissões, o professor se encontra em seu campo de trabalho durante toda

a sua vida escolar, criando perfis profissionais em relação ao papel do professor e suas

interações com os alunos, difíceis de serem removidas. Nessa perspectiva, um dos objetivos do

estágio é permitir que os futuros docentes vivenciem na prática, os aportes teóricos discutidos

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na universidade de modo a refletir e construir sobre sua própria prática. O futuro docente pode

escolher e separar aquilo que considera adequado nas observações e acrescentar novos modos,

adaptando-os a realidade escolar conforme os saberes construídos na teoria acadêmica e

realizando sua aplicação durante a regência (PIMENTA; LIMA, 2006; CARVALHO, 2013a).

Neste sentido, o objetivo do presente relato é descrever o estágio de regência de uma

turma do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, da Universidade Católica Dom Bosco

(UCDB), no ano de 2016, mediante um projeto educacional, ressaltando os pontos principais

do planejamento e execução que devem estar presentes na construção de conhecimento, no

processo educativo e na formação docente.

Apontamentos sobre Estágio Docente do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas

A união entre teoria e prática, rompimento da visão simplista do processo ensino e

aprendizagem e desenvolvimento de um olhar crítico sob a atuação didática se torna possível

por meio do estágio supervisionado. A resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE)

nº2 de 1 de julho de 2015 (BRASIL, 2015) institui a duração e a carga horária dos cursos de

licenciatura de formação de professores da Educação Básica em nível superior e dispõe “400

(quatrocentas) horas dedicadas ao estágio supervisionado, na área de formação e atuação na

educação básica”.

O cumprimento da carga horária estabelecida pelo CNE no curso de licenciatura em

Ciências Biológicas da UCDB em 2016 seguiu os seguintes critérios: I – 160 (cento e sessenta)

horas de estágio de observação (observação e problematização do ensino fundamental e médio);

II – 100 (cem) horas para elaboração de materiais didáticos pedagógicos (preparação para

estágio de regência); III – 20 (vinte) horas de diagnose dos Projetos Político-Pedagógicos (PPP)

das escolas; IV – 20 (vinte) horas pela elaboração de resenha crítica a partir de um documentário

sobre a docência; V – 100 (cem) horas de regência em educação formal (ensino fundamental e

médio).

O processo de observação das salas nas quais a regência se concretizou foi um item

importante para a construção dos planos de aula, pois, cada sala possui características

específicas, as quais interferem na construção da metodologia de trabalho. Outro item

importante para o desenvolvimento do planejamento é a análise do PPP, este documento de

acordo com Veiga (2008), contém as diretrizes gerais para a elaboração de todos os outros

documentos da escola. Nesse sentido, o docente analisa por meio do PPP a realidade escolar

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quanto aos alunos presentes, comunidade, teorias de ensino, dificuldades, entre outras questões

particulares da escola, o que influencia no planejamento docente.

A construção do material didático foi fundamental na formação pedagógica, visto que

ao elaborarem materiais didáticos, os acadêmicos puderam refletir sobre a atuação profissional,

suas necessidades formativas e no planejamento da sua prática.

Do mesmo modo, elaborar uma resenha crítica, a partir de um documentário brasileiro

sobre os conflitos e desafios da docência e da educação do Brasil, fez com que os acadêmicos

ampliassem seus olhares para a realidade educacional brasileira e pensassem em possibilidades

de mudanças, visto que foram promovidos debates em sala de aula, a partir dos questionamentos

da professora responsável pelo estágio docente.

O Estágio de Observação docente

De acordo com Carvalho (2013a), o estágio de observação deve apresentar ao futuro

docente condições que possibilitem uma reflexão crítica para problematizar as situações

decorrentes na escola. Ainda segundo a mesma autora, o futuro docente analisará cada aspecto

da sala de aula, buscando integrar com a teoria discutida na universidade. Essa detecção é

importante para a mudança de aspecto conceitual do futuro professor, permitindo que as

problematizações das ações docentes sejam significativas e permitam o rompimento da visão

de ensino tradicionalista.

Além disso, o futuro docente deve compreender que a observação não deve ser realizada

somente durante o estágio em virtude da complexidade do processo educacional. Nesse

contexto, Borba (2011) explica que, ao elaborar um plano de aula, o educador deve levar em

consideração o perfil de cada sala: Se eles são mais ou menos ativos; se há educandos com

alguma necessidade especial; quais as necessidades reais daqueles estudantes.

Além disso, o estágio de observação é um processo que permite compreender a escola

nos aspectos que regem sua organização e estrutura. Carvalho (2013a) aponta que o futuro

docente deve compreender toda a complexidade do seu futuro local de trabalho, já que ele,

enquanto aluno, não conhecia. Isso implica na análise crítica de documentos importantes para

a organização escolar e que norteiam as ações escolares. Além disso, a estrutura física também

deve ser observada conforme ressalta Almeida (2011) quando aponta que um bom

planejamento do educador implica no conhecimento de espaços da instituição e os recursos

físicos que podem ser ocupados na ação pedagógica.

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O estágio de observação pode ser mais proveitoso ainda quando é realizado em

diferentes locais, pois assim, há possibilidades de analisar criticamente professores com

didáticas diferentes e em realidades diferentes. Além disso, permite observar a complexidade e

diferenças que existem nas gestões escolares, visto que elas interferem na ação pedagógica

docente. Nessa perspectiva, o estágio docente foi realizado em duas escolas públicas estaduais,

uma na região oeste, denominada de Escola Mandala, outra na região norte, denominada de

Escola Terena, (os nomes das escolas são fictícios, mantendo-se o sigilo das identidades das

escolas) ambas em Campo Grande no Mato Grosso do Sul (MS).

Estágio de Regência: um projeto educacional

De acordo com Carvalho (2013a), há várias formas de estágios de regência que vão

desde a participação ativa de um professor regente em conjunto com o futuro docente até a

regência autônoma. Entretanto, qualquer uma das formas de estágios de regência deve atingir

um objetivo em comum: promover condições ao futuro docente para que ele possa discutir

sobre sua atuação didática.

O estágio em formato de projeto educacional foi o escolhido pela turma de Ciências

Biológicas da UCDB em 2016. Hernández e Ventura (1998), apontam que o projeto permite a

conexão entre teoria e prática e permite participação mais ativa, significativa e instigante dos

educandos, valorizando as interações e mediações entre professor-aluno e aluno-aluno. O

projeto educacional também permite que o futuro docente desenvolva metodologias que

busquem a construção do processo de ensino e aprendizagem, algumas vezes rompendo com a

visão tradicionalista do ensino. Além disso, essa forma de estágio promove também condições

para que o futuro docente avalie sua própria prática, sendo um dos pontos mais importantes no

estágio de regência apontado por Carvalho (2013a). O projeto educacional ainda contribui com

o estreitamento das relações e trabalho desenvolvidos em ambas as instituições de ensino,

possibilitando um diálogo.

De acordo com Hernández e Ventura (1998), a escolha do tema é o ponto de partida do

projeto, portanto, deverá ser relevante e contextualizada com a realidade e interesse dos alunos.

O tema do projeto educacional do estágio de regência aqui descrito foram as “Drogas”,

escolhido a partir das observações realizadas nas escolas e por consulta aos gestores

educacionais das escolas envolvidas quanto às necessidades locais. Além disso, de acordo com

o relatório brasileiro sobre drogas (DUARTE, STEMPLIUK; BARROSO, 2009), MS está entre

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os estados com maior índice de internações decorrentes do uso de drogas, sendo também o

quarto estado com decorrências de crimes envolvendo o uso de drogas ilegais. Na região centro-

oeste, MS lidera as apreensões de maconha. De acordo com pesquisa realizada pelo governo do

estado e prefeitura municipal de Campo Grande, um dos maiores problemas que acomete a

cidade está no uso de drogas cada vez mais precoce pelos adolescentes (GOVERNO DO

ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, 2015).

Portanto, justificou-se assim a necessidade de trabalhos pedagógicos que dimensionem

aos educandos as consequências do uso de drogas em termos biológicos e fisiológicos.

Estágio de regência: Projeto Educacional “Drogas” no Ensino Médio e Fundamental nas

Escolas Mandala e Terena

A realização do projeto educacional na Escola Terena no ensino médio ocorreu em um

auditório, na própria escola, e na escola Mandala, em sala de aula. Iniciamos a regência com a

apresentação dos acadêmicos, e em seguida, dos educandos. A apresentação é fator importante

na interação entre futuros docentes e educandos, pois permite também desenvolver de início

um ambiente educativo que busca a participação ativa dos educandos.

Em seguida, iniciamos dinâmica com o material didático “Caixa das Concepções” que

foi desenvolvida pelos acadêmicos durante o planejamento da regência. Consiste em uma caixa

de papelão colorida com abertura em um dos lados, onde foram colocados protótipos simulando

algumas drogas (Lança-perfume, álcool, refrigerante, gordura, chocolate, cigarro, narguilé,

crack, cocaína e drogas injetáveis). A participação era voluntária, o educando selecionava ao

acaso um protótipo da caixa e explicava tudo que sabia sobre a droga específica. Em alguns

casos, os alunos diziam desconhecer o assunto, quando isso ocorria, eram apresentados novos

questionamentos a ele. A intenção das perguntas era instigar a participação desse aluno e como

resultado, na próxima tentativa, eles apresentavam seus saberes com mais naturalidade. De

acordo com Freire (1987), o educador precisa entender que o aluno não é uma “tábua rasa” em

sala de aula, alguma concepção, ideia ou opinião ele possui, e é tarefa do professor explorar

essas concepções prévias.

De acordo com Oliveira (2005), o educando é a parte atuante e alvo de interesse no

processo ensino e aprendizagem, portanto, deve ser considerada sua visão acerca do mundo.

Para a mesma autora, as concepções de mundo do aluno são construídas desde seu nascimento

e não desaparecem na sala de aula, local onde os conceitos científicos são inseridos

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continuadamente no processo de ensino e aprendizagem. Deste modo, as concepções prévias

apresentadas pelos educandos devem ser consideradas para a introdução de um novo assunto

(OLIVEIRA, 2005; ALMEIDA, 2011). Nessa perspectiva, o material didático é um recurso que

permite caracterizar as concepções dos educandos.

De acordo com Krasilchik (2011), as falas e o comportamento do professor influenciam

diretamente no clima da aula e na participação dos alunos. Moraes e Varela (2007) explicam

que, o homem é um ser social que necessita ser aceito em um grupo e desempenha um

determinado papel sendo construído a partir da sua autoestima. A interação dos acadêmicos

com os educandos por meio da “Caixa da Percepção” apresentou resultados positivos, visto que

os alunos passaram a participar mais da aula, desenvolvendo confiança e liberdade de perguntar

e expor suas ideias.

A partir das concepções prévias apresentadas pelos educandos, inicia-se uma aula

interativo-explicativa com base nas discussões já ocorridas e abordando os conteúdos

programados sobre as drogas e seus efeitos.

Almeida (2011) aponta que, à medida que um novo assunto é introduzido na aula, o

docente deve observar os rostos e comportamentos dos educandos, buscando indícios de

possíveis dúvidas. Nessa perspectiva, ao iniciar-se a abordagem do sistema nervoso, alguns

estudantes demonstraram desentendimento, desse modo, utilizou-se de outras estratégias

metodológicas a fim de contextualizar o conteúdo, com uso de pequenos vídeos, imagens e

pequenas representações teatrais. A contextualização auxilia no processo ensino e

aprendizagem, pois permite que o aluno perceba a sua complexidade (ALMEIDA, 2011). Todas

as estratégias metodológicas utilizadas, em conjunto, auxiliaram na compreensão do conteúdo

pelos educandos.

Em seguida, foi proposta questão para avaliar o acompanhamento lógico dos alunos

durante a aula expositiva. A questão foi planejada para contribuir com a reflexão e o raciocínio

do aluno, e não à memorização conforme orientações de Carvalho (2013b). Um exemplo foi o

que ocorreu na abordagem do LSD com a seguinte pergunta: “Quais as consequências

apresentadas sete anos depois a um indivíduo que fez o uso da LSD?”. Nesse tipo de questão,

o aluno teve que raciocinar sobre os conceitos ensinados sobre entropia do sistema nervoso,

tempo de vida da droga no organismo, efeitos da LSD e criar hipóteses para chegar a uma

conclusão, portanto sua resposta depende da construção dos conceitos ocorridos durante o

desenvolvimento da aula interativa e não a partir de uma simples memorização.

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Muitos alunos considerados por alguns docentes como “bagunceiros”, participaram

ativamente das atividades propostas pelos estagiários. Nesse contexto, Albrecht e Kruger

(2013) apontam que a falta de interesse do aluno pode estar vinculada com a metodologia do

professor. Os autores defendem que uma aula diferenciada e voltada para o cotidiano é muito

mais motivadora do que uma aula embasada no tradicionalismo, sendo, portanto, papel do

professor buscar inovações e recursos diferentes para uma aula construtivista.

Outro fator importante e vivenciado pelos estagiários foi a flexibilidade do plano de

aula, ou seja, durante a realização das aulas explicativas, utilizou-se de metodologias que não

estavam apresentadas anteriormente no plano de aula. Isso demonstrou que cada sala possui de

fato uma realidade diferente mesmo pertencendo à mesma escola. Além disso, o planejamento

de aula de uma escola para a outra variou muito, isso porque durante a realização do estágio na

Escola Terena, pode-se perceber que as metodologias propostas não eram coerentes com o

tempo, portanto, para a sua realização, foi necessário retomar criticamente a durabilidade de

cada atividade e modificar o plano de aula.

Santos e Santos (2007) explicam que muitas vezes o plano de ensino se resume no

preenchimento de alguns formulários pré-determinados, ou seja, o planejamento possui um

caráter de “camisa de força” no qual, o docente acredita que todos os passos devem ser seguidos

rigorosamente quanto às etapas das metodologias e o tempo destinado. Entretanto, o

planejamento além de conter a programação das ações docentes, constitui também um momento

de reflexão e de autoavaliação. Para que o plano de aula seja um instrumento efetivo de

orientação pedagógica ele deve apresentar ordem sequencial, objetividade, coerência e

principalmente flexibilidade, visto que o processo de ensino é dinâmico e sofre modificações

com as condições reais em que se encontra.

Além do conteúdo conceitual, o processo de ensino e aprendizagem deve ser

direcionado para as dimensões procedimentais (experimentos, atividades) e atitudinais.

Portanto, na abordagem sobre drogas foi realizado um experimento que consistia na simulação

dos efeitos do cigarro no pulmão. De acordo com Carvalho (2013b), a demonstração-

experimental deve ser realizada em conjunto com todos os educandos, mas a conclusão dos

efeitos e consequências deverão ser construídas pelos alunos. Para isso, após a realização do

experimento, contextualizou-se o processo investigativo aplicando-se um questionário, no qual

os alunos obtiveram liberdade para discutir sobre o problema e criar suas hipóteses. Os alunos

deveriam recordar as características do cigarro, assimilar com o experimento e apresentar as

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justificativas para a resolução do problema apresentado. Para Carvalho (2013b), essa é uma

estratégia de grande valor no processo de aprendizagem, visto que puderam discutir, refletir e

ampliar seus conhecimentos tendo em vista que é uma atividade que exige fundamentos

reflexivos e críticos.

Sendo assim, durante a realização tanto do experimento quanto da investigação, pode-

se perceber o envolvimento dos alunos. Eles estavam separados em grupos e havia interação

entre eles, visto que discutiam suas hipóteses e relacionavam com os conceitos que haviam

construídos durante a aula. Poucas foram às vezes que pediram orientação durante a realização

da atividade, demonstrando liberdade de pensamento.

Durante a observação realizada entre os grupos durante a realização da atividade

investigativa, foi possível visualizar a aceitação das opiniões opostas entre os educandos de um

mesmo grupo, evidenciando o respeito ao próximo, além da busca da resolução dos problemas.

Nesse contexto, Zômpero e Laburú (2011) ressaltam que as atividades investigativas além de

possibilitar o aprimoramento do raciocínio, aumentam também a cooperação entre os alunos,

sendo, portanto, uma metodologia que considera os aspectos atitudinais do processo de ensino

e aprendizagem. No mesmo contexto, Carvalho (2013b) aponta que discussões a partir das

conclusões de cada grupo são relevantes no processo de desenvolvimento da argumentação.

Muitos alunos durante os apontamentos das conclusões desenvolveram argumentação mais

científica se comparada com a linguagem cotidiana que apresentaram no início da aula. Todos

os alunos de cada grupo, uns mais outros menos, contribuíram nas apresentações finais, eles se

expressavam por meios gestos espontâneos, demonstrando habilidades nas dimensões

conceituais e atitudinais.

Já o projeto educacional no ensino fundamental em ambas as escolas iniciou com o

mesmo propósito do ensino médio: valorizar as concepções do educando mediante a elaboração

do material didático; buscar interação entre futuros docentes e educandos; e a evolução

crescente da participação dos alunos durante a aula.

A aula expositiva desenvolvida no ensino fundamental obedeceu aos critérios apontados

por Almeida (2011) que recomenda, nesse nível de ensino, fazer uma contextualização com

outras linguagens (vídeos, pinturas ou músicas), diferentes daquela que é utilizada

constantemente, assim, a contextualização foi intensificada nos recursos visuaisenriquecendo a

prática pedagógica.

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O diferencial do planejamento do ensino fundamental foram as atividades

sociointeracionistas. Carvalho (2013b) destaca que os educandos possuem condições de

desenvolver potencialmente seus conhecimentos e habilidades mediante a discussão e interação

com os colegas. Nesse contexto, a realização de dinâmicas envolvendo a competição em grupos

foi proposta como sistematização de ensino e desenvolvimento dos aspectos atitudinais. Uma

parte das atividades foi na quadra e despertou a curiosidade e entusiasmo do aluno sem

desconsiderar os aspectos pedagógicos do processo de ensino e aprendizagem.

Considerações Finais

O estágio supervisionado é um processo no qual se permite ao futuro docente

desenvolver na prática as metodologias e teorias discutidas durante sua formação docente.

Outro aspecto importante do estágio é o planejamento das aulas por meio do qual o futuro

docente desenvolve a habilidade de organização do processo ensino e aprendizagem, e, além

disso, pode ponderar sobre as ações pedagógicas que resultarão ou não na construção de

conhecimentos. Logo, a elaboração do planejamento exige reflexão crítica sobre as

metodologias de ensino e aprendizagem muitas vezes discutidas na universidade. A prática de

desenvolver o planejamento e a aplicação em sala de aula permite ao futuro docente reflexão

quanto às peculiaridades desse processo principalmente quanto a sua flexibilidade.

A prática pedagógica também se demonstrou única aos acadêmicos. Aquilo que antes

era contextualizado no campo teórico na universidade pode ser vivenciado por cada um e em

diferentes realidades socioculturais, contribuindo com sua formação docente.

Além disto, o desenvolvimento do estágio docente na forma de projeto auxiliou o

cumprimento da carga horária descrita na resolução vigente e ainda permitiu maior

aproximação da universidade com a escola, bem como dos docentes responsáveis por ambas as

instituições de ensino, permitindo a troca de conhecimento.

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