O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO E A INFLUÊNCIA DO MODELO FRANCÊS

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O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO E A INFLUÊNCIA DOMODELO FRANCÊS.Martha Abrahão Saad Lucchesi

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1 O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO E A INFLUNCIA DO MODELO FRANCS. Martha Abraho Saad Lucchesi RESUMO O objetivo geral deste trabalho demonstrar a influncia do ensino superior francs na gneseedesenvolvimentodestegraudeensinonoBrasil.Aprimeirauniversidade brasileiraaserefetivamenteinstitucionalizadanoBrasilfoiaUniversidadedeSo Paulo, fundada em 25 de janeiro de1934, integrando faculdades autnomas j existentes ecriandoaFaculdadedeFilosofia,CinciaseLetras.Oobjetivoespecficodesta pesquisa estudar a histria das instituies municipais de ensino superior do Estado de SoPaulo,quecaracterizaramaeducaourbanaeainteriorizao,aolongoda segunda metade do sculo XX. Na dcada de 1950, surgem os Institutos Municipais de EnsinoSuperiordoEstadodeSoPaulo,comopartedapolticadeexpansoda educaosuperior.Parte-sedapesquisatericaqueutilizaomtodohistricoeo mtodocomparativo.Comotcnicasdecoletadedadosforamempregadasapesquisa bibliogrfica, documental e ainda, coleta de dados empricos. A anlise evidenciou que, oensinosuperiorbrasileirofoiinfluenciadopelomodelofrancs,apartirdeescolas isoladas, mais tarde algumas foram agrupadas em universidades. Palavras-chave:HistriadaEducao,PolticasEducacionais,EnsinoSuperior, Interiorizao, Expanso. 2 INTRODUO. NoBrasil,aliteraturaidemonstraquesomentecomachegadadaFamliaReal Portuguesa em 1808, sculo XIX, transferindo a Coroa para alm mares, para o Rio de Janeiro,foipermitidaafundaodosprimeiroscursossuperiores.Tratava-sede instituiesisoladasdeformaodeprofissionaisliberais:mdicos,advogadose engenheiros. Os primeiros cursos foram: Medicina em 1808, na Bahia e Engenharia, no RiodeJaneiro.AformaoemDireitojeratradicionalnauniversidadeportuguesa, ondeestudavamalgunsjovensdaelitebrasileira.Emlugardainstalaodecursos superiores,ametrpoleconcediabolsasparaquecertonmerodefilhosdecolonos pudesse concluir seus estudos em Coimbra. (CUNHA, 2000). O Curso Jurdico em Olinda e em So Paulo foi criado apenas em 1827, contemplando-se as trs carreiras liberais que predominaram nos sculos XIX e XX. Datam dos anos de1808acriaodaAcademiadeMarinhaede1810,acriaodaAcademiaReal Militar,noRiodeJaneiro,voltadasparaaformaodeoficiaiseengenheiroscivise militares. (CUNHA, 2000, PELETTI e PELETTI, p. 153, 1990). Registra-seque,emboraaFranadeNapoleoestivesseemguerracomanao portuguesa que colonizou o Brasil, este implantou o modelo francs de ensino superior criadonoperodonapolenico.ConformeFigueiredoeCowen(2005,p.176) paradoxalmente, a Frana- o pas que havia produzido a conturbao na Europa e uma mudananasrelaescoloniaisdetodoomundo-foiadotadacomoexemplodeboas prticaseducacionais.Instituiesdeensinosuperiorforamimplantadassegundoo modelo Napolenico das grands coles francesas. Nestapoca,surgiramainda,escolasmodernizadoras,comoaEscolaPolitcnicaeas EscolasNormais.Ressalte-sequeoBrasilcontava,em1930,com86escolas superiores.(TEIXEIRA,1989,p.115).Quantitativamente,aevoluodonmerode escolas superiores assim se desenhou no decorrer do perodo republicano em apreo: em 1900 havia 24; at 1910, foram criadas mais 13; at 1920, mais 34; e at 1930, mais 15, totalizandoaofinalda PrimeiraRepblica86escolassuperiores(TEIXEIRA,1989,p. 114-115 apud ARAJO, 2008, p. 80). Paraoseducadores-FernandodeAzevedofrente-,o modelodeveriaserodacoleNormalefrancesa,eo objetivo,aformaodeprofessores (noeraoutracoisa, alis,quepreviamalegislaofederaleeraoobjetivo explcitodaFaculdadedeEducaodaUDF).As faculdades trazidas ao novo sistema universitrio vinham com suas prprias estruturas e modelos. (SCHWARTZMAN, 1982, p.159). Somente no sculo XX comeou a criao de universidades, que nasceram da fuso de institutosisolados.Apartirdeentoasociedadebrasileirabuscarecuperardoatraso histrico em relao fundao das universidades. ApenasnosculoXX,em1930oBrasilregistravaa presena de duas Universidades: uma em Minas Gerais e 3 outranoRiodeJaneiro.Oensinosuperiorsfoi efetivamente institucionalizado no Brasil com a fundao daUniversidadedeSoPaulo,em1934.iiAqui,a universidadepblicacresceuprincipalmenteentreos anos 1930 e 1960. (LUCCHESI, 2010, p.2) OmarcoinicialfoiafundaodaFaculdadedeFilosofia,CinciaseLetrasda UniversidadedeSoPaulo,consideradaaclulamaterdauniversidade,apartirda qualseaglutinaramescolassuperioresisoladasentoexistentes,quedeacordocom Schwartzman (1979, p.225) reuniam vrios professores europeus no poucos de renome internacional,quepropicioucondiesparaqueseformasseumnovomodelode cientista, alunos que se tornaram pesquisadores, cujo prestgio em So Paulo lanou as bases para criao da Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo. TeodoroRamos,daEscolaPolitcnica,eDumassoos responsveispelorecrutamentodosintegrantesdachamada missofrancesadaUSP,quesedesenvolveuemtrsfases distintas.Em1934,socontratadosprofessoresexperientes em universidadeseliceusfranceses,comoobjetivodeabriros cursos.Dosseisnomesquecompemessaprimeiraleva- mileCoornaert(histria),PierreDeffontaines(geografia), RobertGarric(literaturafrancesa),Paul-ArbousseBastide (sociologia),tienneBorne(filosofiaepsicologia)eMichel Berveiller(literaturagreco-latina)-somenteBerveillere Arbousse-Bastiderenovamosseuscontratoscoma universidadenoanoseguinte.Em1935,operfildogrupose alteraassimcomoaduraodoscontratos,agoradetrsanos: trata-sede jovensagrgs, semexperinciano ensino superior, comexceodeFernandBraudel.Almdoprofessorde histria,chegamaopasnestemomento:PierreHourcade (literaturafrancesa),PierreMonbeig(geografia),ClaudeLvi-Strauss(segundacadeiradesociologia)eJeanMaug (filosofia). Monbeig e Maug permanecem no pas at 1944 e 1947, respectivamente, em funo da ecloso da guerra. A partir de1938,Dumasdecideconvidardocentesmaisvelhos,como fizeranaUniversidadedoDistritoFederal,noRiodeJaneiro, em1935.Destenovogrupodeprofessoresfazemparte:Roger Bastide(substitutodeLvi-Strauss),JeanGag(nolugarde Braudel),AlfredBonzon(literaturafrancesa)ePaulHugon (economia),queseestabelecerdefinitivamentenopas. (FUNDAO BIBLIOTECA NACIONAL, 2009, P,1) Schwartzman(1982)afirmaqueapesardainflunciaalem,quesurgiu,sobretudo,no finaldosculoXIXporinflunciadospositivistas,auniversidadebrasileiratomou comobaseomodelofrancsetambmfoiinfluenciadapelomodeloingls, principalmenteCambridge.Algunsaspectosideolgicosforammarcantespela influnciafrancesa:alaicidade,apredominnciadascinciashumanas.Atradio francesaeraliberalehumanistaefoiestaamaisforteinfluncianaformaoda universidadebrasileira.QuandooBrasilcriouaFaculdadedeFilosofia,Cinciase Letras, as cincias biolgicas e exatas j consistiam, na Frana, outra faculdade. Mas o 4 Brasil, sem condies de criar naquele momento duas faculdades diferentes para formar professores, adotou o antigo modelo francs. Posteriormente, tambm a Universidade de SoPaulocriouoInstitutodeFsica,aFaculdadedeBiologiaeoutras,mantendo apenasascinciashumanasnoncleooriginal.AtualmenteaantigaFaculdadede Filosofia,CinciaseLetraschama-seFaculdadedeFilosofia,LetraseCincias Humanas e inclui tambm os cursos de Histria, Geografia.iii (USP, 2011). Evidencia-seque,universidadebrasileiranasceucomofilhatardiadauniversidade europia,sobretudodomodelofrancs,queinstituafaculdadesisoladas,maistarde agrupadasemuniversidades.Essauniversidadeteriasidoobradosenciclopedistase filsofosiluministas.ComNapoleo,oEstadoencampouoensinosuperior, privilegiandoasescolasisoladas,comoacolePolitchniqueeacoleNormale,que so at hoje formadoras de profissionais de nvel superior. Esse modelo atendia melhor aos interesses da burguesia industrial, formando elites fora do sistema universitrio e foi seguido pelo ensino superior brasileiro no perodo de sua formao. De acordo com Almeida: As razes do pensamento francs no solo brasileiro foram institucionalmenteplantadasem1934.Afundaoda UniversidadedeSoPaulofacilitouaconsolidaodo encantointelectualentrefrancesesebrasileiros.George Dunas,consultordaaristocraciaeintelectualidade paulistanaconstituiuma"missofrancesa",aqual,em conjuntocoma"missoitaliana",coordenadapor GiuseppeUngaretti,fomentamasbasesmacro-institucionaiseideolgicasdoensinodascincias humanasnoBrasil.SegundoLvi-Strauss,ementrevista aDidierEribon,acriaodaUSPaconsolidaodo projetodaburguesiaparaequaliz-laculturaeuropia. (2002, p2). Nestecontextohistrico,oobjetivogeraldestetrabalhodemonstrarainflunciado ensino superior europeu na gnese e desenvolvimento deste grau de ensino no Brasil. O objetivo especfico estudar a histria das instituies municipais de ensino superior do EstadodeSoPaulo,quecaracterizaramaeducaourbananointeriordoestado,ao longo da segunda metade do sculo XX.Asquestesnorteadorasdadiscussopropostaso:Qualainflunciadosinstitutos isoladoseuropeusnacriaodasinstituiesdeensinosuperiornoBrasil?Quaisas condieshistricas,sociaiselegaisqueproporcionaramosurgimentonascidades mdias,nadcadade1950,dasInstituiesMunicipaisdeEnsinoSuperiornoEstado de So Paulo? Foirealizadoumestudoquantitativoequalitativosobrehistriadasinstituies municipais de ensino superior (IMES) do Estado de So Paulo. Os dados foram obtidos dosrgosoficiaisdaeducaobrasileira,doConselhoEstadualdeEducaodeSo Paulo(CEE-SP)edasinstituiespesquisadas,quecomparadosconstituem-seem informaesoriginais.Omtodohistricofoiutilizadonestapartedapesquisaeo perodoenfocadovaidametadedosculoXX(1950)ataprimeiradcadadosculo 5 XXI (especificamente 2007). O balizamento histrico desse perodo se justifica porque vaidosurgimentodaprimeiraIMES,nacidadedeFranca,EstadodeSoPaulo,em 1951eestende-seat2007,ltimoanoemqueametodologiadecoletaeorganizao dosdadosreferentesaoensinosuperiorbrasileiropermitecomparaescomperodos anteriores.Apartirdoanoseguinte,pormudanasmetodolgicasnaavaliaodas instituiesmunicipaisdeensinosuperiornoBrasil,nopossveltraarumparalelo com perodos anteriores. A anlise terica foi elaborada com base Ladd (1907) Charle e Verger (1996), Almeida (2002),Cunha(2000),PelettiePeletti,(1990),Schwartzman(1979,2003),Durham (2002,2003,2005),Castilho(2009)eoutrosparaoperodohistricoeuropeue brasileiro, delineiam-se ainda, o contexto e as consequncias da criao das IMES para a expanso e interiorizao do ensino superior no Estado de So Paulo. A INFUNCIA FRANCESA Emboraamonarquiaportuguesatenhasidosubjugadapelopodernapolenico,a influncia da cultura francesa no Brasil fez-se presente , seja por intermdio das outras naes europias tambm influenciadas pela cultura francesa, seja diretamente por meio deconvitesaartistaseintelectuais.Houvemesmoumamissoculturalfrancesano perodoimediatamenteanteriorindependnciabrasileira.Caberessaltarque,coma Restaurao,ivaFranadeixardeserumpasrevolucionriocujasidiasameaavama estabilidade de seus vizinhos. Entretanto,omodelodeeducaosurgidonoperodonapoleniconofoiafastado.O ensinoescolsticoefilosficodasuniversidadesmedievaisfoisubstitudopeloensino modernizadordasgrandescoles.Esteensinosuperiorvisavaformarumanovaelite dirigente e intelectual (BOURDIEU, 1989). Nodecorrerdosculo19,asfamliasdaelitebrasileiramandavamseusfilhospara estudar na Frana. A seguir, implantaram aqui escolas nos moldes da educao francesa, iniciando-secomacriaonoRiodeJaneirodoColgioPedroII,em1857.O historiadordaeducaoNelsonSchapochnikobservaqueatomaterialdidticoeo contedoforamimportados.AprpriaorganizaocurricularnoBrasilcomeou calcadanomodelofrancs.Essecolgioserviudemodeloparavriasinstituiesno Brasil,especialmenteapsaProclamaodaRepblica.Schwartzman(2003)afirma queareformadoantigoinstitutodeEducaonoRiodeJaneironadcadade1930, deveria ser uma verso brasileira da cole Normale francesa e um modelo para o pas.Ainflunciadaculturafrancesafoiamplaeprofunda.Foipormeiodastradues francesasqueosclssicosdaliteraturamundialchegaramaoBrasil.Alnguafrancesa intermediounossaleituradosclssicos,inclusivegregoseromanos.Tambmhouve umainfluncianapercepodasquestessociais,inclusiveporquenoapenasaelite quesealimentavadaideologiafrancesa,mastambmasclassesdominadasbuscavam sua inspirao nos ideais revolucionrios. ..emergeumasituaoconjunturalderesistnciaao monopliodaburguesia:estudantesvindosdasclasses 6 modestas,homensemulheresjengajadosnavida profissional e que desconfiam dos grandes burgueses que fundaramauniversidade(deSoPaulo)passamaouvir, discutir e, por vezes, a ensinar os mestres europeus. "Ns nosencontrvamosentredoscampos",dizLvi-Strauss: "deumladogentepreciosa,deoutroosservidoresda classe dominante".v Em seu livro "Tristes Tpicos", o pai doestruturalismofrancsenftico:"anossamisso universitriacontribuiuparaaconstituiodeumanova elite,aqualiriadesligar-sedensnamedidaemque DunasedepoisQuaid'Orsayrecusavamcompreender queeraessanossacriaomaispreciosa(LVI-STRAUSS; 1995 p. 15, apud ALMEIDA, 2002). Charles e Verger (1996, p. 7-8) destacam que as universidades so apenas uma parte do ensino superior. Eles entendem que a universidade, tal como a conhecemos hoje, uma criaoespecficadacivilizaoocidental,nascidanaItlia,naFranaenaInglaterra no incio do sculo XIII. Esse modelo [...] perdurou at hoje (apesar da persistncia, no menosduradoura,deformasdeensinosuperiordiferentesoualternativas).ocaso das Instituies Municipais de Ensino Superior, tema deste trabalho. Elas nasceram em sua maioria como instituies isoladas e poucas cresceram at se tornarem universidade ouforamreunidasemuniversidades.Mas,paraCharleeVerger(1996,p.8),A procuradeumadefiniodeuniversidade,impossveldeserencontrada,imobilizada entre tautologia ( universidade o que se autodenomina universidade) eanacronismo, deve ento ser substituda por uma abordagem diacrnica, at mesmo descontnua, mas firmemente ancorada nas grandes articulaes da histria geral. O Modelo dacole NormaleLadd(1907,p.2)afirmaqueaimportnciadainflunciafrancesasedeveuaofatode queelescolocaramesperanaseexpectativaspositivasemumplanodeeducao.No seuentender,asoberaniaeainflunciafrancesassederampormeiodaeducao.Ele ressalta (LADD, 1907, p.3) que a cole Normale duplamente importante. Em primeiro lugarporqueestabeleceasimesmacomonorma,comomodeloepadro,emsegundo porque se prope a formar professores, que, por sua vez tambm seriam professores de outrosprofessores.EleafirmaaindaqueaRevoluoFrancesamobilizouopastodo em funo da educao.O plano para aeducao aprovado pela Assemblia em25 de outubrode1795,previatrsnveisdeensino:primrio,secundrioesuperior.Alm disso,incluaoensinoruraleoensinoprofissional.Esseplano,antesdeseraprovado sofreuvriasidasevindasdesde1791,quandofoipropostoporCondorcet.(LADD, 1907, p. 8-12). AcoleNormalefoifundadaoficialmenteemoutubrode1794.SegundoLadd(1907, p.10)elaretomavaumaidiaanteriordefundarumaescolaleiga.Aidiadeuma instruo pblica e no religiosa surgira em 1763, com a expulso dos jesutas. Ressalta ainda,queocorpodocenteeosdirigentesdacoleNormaleeramformadospor professores oriundos das diversas faculdades j existentes na Frana. 7 Ladd(1907,p.58)concluiqueacoleNormaleera,defato,umauniversidade,no sentido de promover a produo do conhecimento. E acrescenta que, durante 50 anos foi anicauniversidadeafuncionaremParis.Poroutrolado,acoleNormalenose dedicou nesse perodo ao estudo da pedagogia e das prticas de ensino. Posteriormente, aUniversidadedeParispassouacompetircomacoleNormale.Em1888,acole Normale foi anexada Universidade de Paris e coube-lhe tratar da formao pedaggica dos futuros professores.No Brasil, mais especialmente no Estado de So Paulo, a Lei161,de1948,possibilitouosurgimentodemais cursossuperioresnointeriordeSoPaulo,comoas FaculdadesdeMedicinadeRibeiroPreto,Farmciae OdontologiadeBaurueEngenhariadeSoCarlos, criadaspelaUSP,masfuncionandodeformaisolada,o quegeroucertaresistnciaporpartedaUniversidadede SoPaulocriaodenovasFaculdades.(LUCCHESI, 2010, p.3)AimplantaodauniversidadenoBrasilgeroualgunsconflitosentreasvrias tendnciase concepes. Entretanto, inquestionvel que se buscou apoio no exterior, por meio da vinda de professorese tambm com visitas tcnicas feitasauniversidades estrangeiras. (ARAUJO, 2008, p.71). O Brasil por sua extenso e diversidade apresenta necessidades heterogneas. Depoisdeumperodoautoritrio,sobGetlioVargas,em1946,oPasvoltou democracia,iniciandoumnovoperodoat1964,caracterizadopelaampliaodo nmero de universidades pblicas. (DURHAM, 2005, p.194).Apartirdessemomento,arededeinstitutosisoladosnointeriordeSoPaulocriados pela USP, portanto de carter pblico,laico e gratuito expandiu-se como uma resposta s presses,principalmentedosplosligadosaodesenvolvimentourbano,agrcolae industrial. Essa integrao entre universidade e escola isolada foi possvel no caso brasileiro, pois emboraaquiaindanohouvesseumauniversidadeparadarsuporteaumaescola normal,osInstitutosIsoladosdeEnsinoSuperior,criadospelaUniversidadedeSo Paulo,sobinflunciafrancesa,queseespalhavampeloEstadoderamorigem Universidade Estadual Paulista- UNESP, que se estende por toda a extenso do Estado de So Paulo.A Criao das Instituies Municipais de Ensino Superior no Estado de So Paulo. Na dcada de 1960, o interior do Estado de SoPaulo se tornou uma das regies mais ricasedesenvolvidasdopascujabasedoreflorescimentops-1956encontra-sena transformao da estrutura produtiva industrial, que trouxe a ampliao do processo de industrializao,modernizaoagrcolaedeinfra-estrutura,entreoutrosfatorese refletiram-setambmnossetoresprimrioseterciriosresultandomudanas significativasemtodosossetoresdaeconomia(BGUSeBAENINGER,1989,p.69), cenrioqueconstituiu-seumambienteadequadoparaaproliferaodeInstituies MunicipaisdeEnsinoSuperior,poriniciativadospodereslocais,enodopoder 8 estadual. Pode-se entender que a necessidade de oferta de ensino superior para os jovens do interior de So Paulo tenha levado o poder municipal a cri-lo.Nesse sentido, deve-se pensar a origem da IMES como o ensino superior possvel para aquelemomentodahistriabrasileira.Trata-sedeummomentoemqueasclasses mdiasbuscamaascensosocialatravsdaeducaodanovagerao,voltadaparao desenvolvimento regional no Estado de So Paulo. As IMES no se dirigiam apenas s elites, como as primeiras faculdades e universidades brasileiras.Oquepodemosdestacarquesodoismomentos:oprimeiroocorreno sculoXIXenaprimeirametadedosculo XXeconsisteemoferecerensino superior aos filhos das classes altas, onde o modelo francs foi predominante atravs da antigaFaculdadedeFilosofia,CinciaseLetrasdaUniversidadedeSoPauloe tambmdacriaodosInstitutosIsoladosdeEnsinoSuperior,pelopoderestatal,em vrias cidades do Estado. OaparecimentodasFaculdadesdeFilosofia,CinciaseLetras (FFCL)pblicasnointeriordoEstadodeSoPaulo,nas cidades de Araraquara, Assis, Marilia, Presidente Prudente, Rio ClaroeSoJosdoRioPreto,comoinstituiesisoladasde ensinosuperior(IIES),ocorreuemumperodoemque convergiramdiversosfatoresdeordempolticaeeconmica. Criadasentre1957e1959,essasEscolasespalharam-sepor regiesdeocupaorecenteouquepassavamporrenovao dasatividadeseconmicas.OmodelodequeestasFaculdades seinspirarameraodaFFCLdaUniversidadedeSoPaulo (USP),criadaem1934,que,porsuavez,tinhacomoobjetivo primeiroaformaoerenovaodaselitesdirigentes,atravs doestudodesinteressadodascincias,e,secundariamente,a formaodeprofessoresparaoensinomdio.Logo,porm, ficouprivilegiadanaFFCLdaUSPapreparaodedocentes. (VAIDERGORN, 2003, p.10) O segundo momento se configura a partir da segunda metade do sculo XX quando as classes mdias comeam a exigir acesso ao ensino superior e o governo decide ampli-lopormeiodaexpansotantodeinstituiespblicascomoprivadas. Deacordocom Durham(2005,p.195)comoaumentodademanda,acumulou-seumcontingentede candidatosexcedentes,constitudoporalunosaprovadosnosexamesvestibulares,que no podiam ser admitidos por falta de vagas. Aanlisehistricapermiteevidenciarqueomodelonapolenicofoioseguidopelo Governo Vargas, que propunha a criao de escolas isoladas de cunho profissionalizante ecentralizaoestatal.AlgunspasesdaAmricaLatina,entreosquaisoBrasil, passaram por longo perodo de regimes autoritrios, geralmente de cunho militar. Esse contexto no poderia contribuir para o desenvolvimento da autonomia universitria e do pensamento acadmico. Apesar disso, nesse perodo, no Brasil, aumentou o nmero de universidadesefaculdadesindependentes,pblicaseprivadas.(LUCCHESI,2002, p.63) 9 nessecontextoquesurgemasIMES,criadasouincorporadaspelopodermunicipal, laicas,mascomautorizaoparacobrarmensalidades,aindaquenoinciodemaneira simblica.Ressalte-sequenahistriadaeducaobrasileiraasIMESforamasnicas instituiesdecarterpblico,nasfigurasjurdicasdeautarquias,fundaespblicas ou privadas com o recurso financeiro proveniente dos alunos. Castilho(2009,p.37)afirmaquefoiaexpansodoensinodoensinomdioou secundrio, um dos motivos que levou ao surgimento do ensino superior no interior do Estado de So Paulo. A necessidade de formar professores para atuarem nos ginsios e noscolgioslevounecessidadedeformarprofessoresdenveluniversitrio,sendo, por conseqncia, necessria a criao de vagas em faculdades e universidades. Inicialmente, o governo estadual supriu a necessidade de ensino superior no interior do EstadodeSoPaulo,criandoinstitutosestaduais.Natentativadeseguiromodelo estadual, as Prefeituras assumiram essa tarefa, levando ao crescimento das instituies isoladasdeensinosuperiornointeriordoEstadodeSoPaulo.(DURHAM,2003,p. 9) Elashaviam-seexpandidomaisacentuadamenteentre1964e1968,quandoogoverno procura atender a reivindicao da classe mdia por acesso ao curso superior e as IMES, disseminadaspelointeriordoEstadodeSoPaulo,representavammaisumelemento favorvel para a interiorizao do desenvolvimento, uma das metas governamentais. NoEstadodeSoPaulo,ainteriorizaodasIMESefetivou-seemregiesondeno havia ensino superior privado. Ainda hoje, de todas asIMES no Estado, apenas quatro estonaGrandeSoPaulo,contribuindoquasetodassignificativamenteparaa interiorizaodoensinosuperior.Asriehistricanogrficoabaixodemonstraoano de incio de funcionamento das IMES no Estado de So Paulo.

Grfico 1. Incio das Atividades das IMES 10 Fonte: Conselho Estadual de Educao de So Paulo e sites das instituies (elaborado pela autora). As IMES apresentam crescimento de 2,8% entre 1974 e 1998.A partir de ento, ocorre umaquedaabrupta,parcialmentecompensadaat2000,oquepodeseratribudo,em parte, LDBN n. 9.394/96, que determina, no artigo 11, inciso V, que os municpios s poderoatuarnosnveisdeensinomdioesuperior,seatendidosplenamentea educaoinfantileoensinofundamental,devendodispordeoutrosrecursos,almdo percentual de 25%, vinculado manuteno e ao desenvolvimento do ensino. (BRASIL, 1988) AsmudanasnalegislaopossibilitaramacriaodeIMES,apartirdoincioda dcada de 1950. Embora parea que houve decrscimo no nmero deIMES no Estado de So Paulo, elas no desapareceram, mas adaptaram-se s alternativas oferecidas pela legislao vigente. De acordo com DURHAM; SAMPAIO: Noquesereferedistribuioregionaldos estabelecimentosdeensinosuperior,verifica-sequea opodoensinosuperiorpblicofoitradicionalmente, mas,sobretudo,duranteoperododeexpanso,ade instalar-seemregiesgeogrficasmenosfavorveisao financiamentoprivadodeensinosuperior,oque,de algum modo, promovia uma maior eqidade de acesso ao sistema (1995, p. 9). AsIMES,noEstadodeSoPaulo,surgiramantesdoperododemaiorexpansodo ensinosuperior,entreosanos1960e1980,umcrescimentode480,3%dematrculas nessesvinteanos(SAMPAIO,2000),enquantooensinosuperiorprivadocresceu 11 843,7%.Emnmerosabsolutos,asmatrculaspassaramde200.000para1.400.000, ocorrendo o maior crescimento nos anos 1968, 1970 e 1971.Tabela 1. Ano de criao de IMES do Estado de So Paulo

Perodo N i!stitui"#es $ do tota%A!terior a 1961 4 10,25&!tre 1961 e 1988 31 79,50A'(s 1988 4 10,25)ota% 39 100 AsIMES,quenasceramemumdeterminadomomentodahistriabrasileira,vivem agoraoutrarealidadequalprocuramadaptar-se,semperdersuaidentidade.As transformaespolticastrazidascomaredemocratizaodoPaseaConstituio Federal de 1988 as obrigam a redefinir-se, transformar-se e atualizar-se. CONSIDERAES FINAIS A anlise evidenciou que, o ensino superior brasileiro seguiu o modelo francs, a partir de escolas isoladas, mais tarde algumas foram agrupadas em universidades. Demonstrou ainda, a grande influncia dos professores franceses na criao da Universidade de So Paulo,eseusdesdobramentosnosurgimentodosinstitutosisoladosdeensinosuperior criados como extenso da USP. Posteriormente, por influncia norte-americana e alem, buscou criar universidades a partir de institutos integrados.Atualmente no Brasil, os modelos coexistem, com relaes de complementaridade. No setrata,contudodeumarelaoharmoniosa.Existemtenseseconflitosentreas propostasdemodelosparaoensinosuperiorbrasileiro.Osinstitutosisoladoscriados pela USP foram incorporados e deram origem UNESP em 1976.AsInstituiesMunicipaisdeEnsinoSuperiorforamcriadassegundoomodelode instituies isoladas. Isto se deve no apenas influncia francesa, mas tambm ao fato de que o porte das cidades no comportava uma universidade, pois era suficiente para o atendimento da demanda apenas instituies de pequeno porte. Atualmente, apesar do crescimento das cidades e do aumento do nmero de estudantes noensinosuperior,apenasduasIMESsetornaramuniversidades(SoCaetanoe Taubat)eoutrasquatrosocentrosuniversitrios.AsoutrasIMEScontinuamcomo institutos isolados ou faculdades integradas.AsIMESconstituramumarespostaadequadasdemandasenecessidadesdointerior paulista.AsIMEStmumaestreitarelaodecompromissocomacidadeemque foram instaladas. Seu grande mrito foi contribuir para a interiorizao e regionalizao do ensino superior no incio de sua histria. 12 i Autores consultados: Cunha (2000), Peletti e Peletti, (1990), Durham (2005) Schwartzman (1982) e outros. ii Atualmente, A Universidade de So Paulo (USP) ocupa o primeiro lugar na relao das principais universidades latino-americanas. QS University Rankings 2011: Amrica Latina. Disponvel em< http://www.topuniversities.com/ > acesso em: 2011-10-05. iii Segundo ranking internacional feito pela TopUniversities, nove cursos da Universidade de So Paulo aparecem entre os 200 melhores do mundo. Dentre esses, seis so da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas: Filosofia, Sociologia, Histria, Lingustica, Cincia Poltica e Geografia. Disponvel em: http://fflch.usp.br/acesso em 20/07/2011. ivArestauraotrouxedevoltaFranaamonarquialegtimae,comesta,opoderdaIgrejaedaaristocracianobiliria,que recuperaram a maior parte de sua antiga influncia, at que veio o momento oportuno de reconquistar tudo.(Bakunin,1882, p.81) v Claude Lvi-Strauss. De perto e de Longe. Entrevista a Didier Eribom... REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ALMEIDA, Maria da Conceio. Palestra na mesa-redonda "A presena do pensamento francsnoBrasil"porocasiodaVIFeiraPan-AmaznicadoLivrorealizadapela Secretaria Executiva de Cultura do Par. Belm 18 a 29 de setembro de 2002. ARAJOJosCarlosSouza.Concepesdeuniversidadeedeeducaosuperiorno Inquritode1926deFernandodeAzevedo.RevistaBrasileiradeHistriada Educao / SBHE N 17 - Maio/Agosto 2008, pp.73 a 102. BAKUNIN,M.DeuseoEstado.Trad.PlnioA.Coelho-recuperaaprimeiraEd.,de 1882, organizada por Carlo Cafiero e EliseReclus, publicada em Genebra pela Grfica Juraciana. BGUS, Lucia M. M. & BAENINGER, Rosana. Reorganizao espacial da populao no interior paulista .So Paulo em Perspectiva, So Paulo, Fundao SEADE, v. 3, n. 3, p. 69-74, July-Sept. 1989.BOURDIEU, Pierre. La noblesse d`tat: grandes coles et esprit de corps. Paris: Les ditions de Minuit, 1989. (Le sens commun). CUNHA,LuizAntonio.EnsinoSuperioreUniversidadenoBrasil.500Anosde Educao no Brasil/ organizado por Eliane Marta Teixeira Lopes, Luciano Mendes de Faria Filho, Cynthia Greive Veiga, - Belo Horizonte: Autentica 2000. 2 a edio. CASTILHO, Myrian Lucia Ruiz.Memria e histria da formao da Faculdade de Filosofia,CinciaseLetrasdeMarlia(19571976).2009,256folhas.Tese (DoutoradoemEducao,comreadeConcentraoemPolticasPblicase AdministraodaEducaoBrasileira).FaculdadedeFilosofiaeCinciasda Universidade Estadual Jlio de Mesquita Filho, Campus de Marlia, 2009. DURHAM,E.R.Educaosuperior,pblicaeprivada.In:SCHWARTZMAN,S.; BROOCK,C.(orgs.).OsdesafiosdaeducaonoBrasil.SoPaulo:EditoraNova Fronteira, 2005, p. 191-233. ______. O ensino superior no Brasil: o pblico e o privado. So Paulo: NUPES, USP, 2003.Documento de trabalho 03/2003.36pp. 13

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