O DESIGN DE MODA E A ARTE MODERNA - faesa.br · O final do século XIX e início do século...

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REVISTA CIENTÍFICA FAESA | VITÓRIA, ES | V. 6 | N. 1 | p. 33-40 | 2010 O DESIGN DE MODA E A ARTE MODERNA FASHION DESIGN AND MODERN ART RUI GONÇALVES DE SOUZA 1 ALBERTO CIPINIUK 2 ISSUE DOI: 10.5008/1809.7367.033 RESUMO Este artigo trata da relação entre arte moderna e design de moda e têxtil, considerando o contexto social que favorecerá essa aproximação. Realiza uma leitura particular de um momento especial do design de moda, caracterizado pela atuação ativa dos designers-artistas ligados às vanguardas modernistas no campo. Analisa como o processo social no campo do design e da arte afetou a vida dos designers- -artistas nas primeiras décadas do século XX, assim como eles também interferiram no processo e como esses acontecimentos se deram no campo do design de moda. Palavras-chave: Sociologia da moda. Design de moda e arte. Moda e arte moderna. ABSTRACT This article deals with the relationship between modern art and fashion and textile design, considering the social context that will favor this approach. The stady performs a particular reading of a special mo- ment in fashion design, characterized by active role of the designers-artists linked to the avant-garde modernists in the field. It Examines how the social process in the field of design and art has affected the lives of designers-artists in the early decades of the twentieth century, how they also interfered in the process, and how these events occurred in the field of fashion design. Keywords: Sociology of fashion. Fashion design and art. Modern art and fashion. A Europa do século XIX viveu uma expansão sem precedentes, o mercado de bens simbólicos, cujo resultado foi o surgimento de um campo literário e artístico, que tinha como objetivo a conquista da autonomização progressiva do sistema de relações de produção, circulação e o consumo desses bens, fundou aquilo que ficamos conhecendo como “l’art pour l’art” (arte pela arte) ou autonomização do campo. Assim, a Capital francesa passou a ser o centro dessas transformações ou o mundo da arte. Com o cres- cimento notável de uma população de jovens provenientes das classes médias e populares, que vinham tentar carreiras de artista ou escritor, a cidade, agora um centro internacional da vida artística e cultural, transforma-se em cenário privilegiado para uma verdadeira batalha simbólica protagonizada por artistas, apoiados por escritores, contra um sistema tradicional de nomeação artística, sobre a tutela acadêmica. 1 Mestre em Moda, Cultura e Arte – Centro Universitário SENAC (SP); doutorando em Design – Pontifícia Universidade Católica ( PUC – RJ ); professor no Departamento de Design (FAESA). 2 Doutor em História da Arte – Universidade de Bruxelas; Mestre em Filosofia – Estética (UFRJ); professor da Pós-Graduação em Design (PUC – RJ).

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Revista CientífiCa faesa | vitóRia, es | v. 6 | n. 1 | p. 33-40 | 2010

O DESIGN DE MODA E A ARTE MODERNA

FASHION DESIGN AND MODERN ART

Rui Gonçalves de souza1

albeRto Cipiniuk2

ISSUE DOI: 10.5008/1809.7367.033

RESUMO

este artigo trata da relação entre arte moderna e design de moda e têxtil, considerando o contexto social que favorecerá essa aproximação. Realiza uma leitura particular de um momento especial do design de moda, caracterizado pela atuação ativa dos designers-artistas ligados às vanguardas modernistas no campo. analisa como o processo social no campo do design e da arte afetou a vida dos designers--artistas nas primeiras décadas do século XX, assim como eles também interferiram no processo e como esses acontecimentos se deram no campo do design de moda.

Palavras-chave: sociologia da moda. Design de moda e arte. Moda e arte moderna.

ABSTRACT

This article deals with the relationship between modern art and fashion and textile design, considering the social context that will favor this approach. The stady performs a particular reading of a special mo-ment in fashion design, characterized by active role of the designers-artists linked to the avant-garde modernists in the field. It Examines how the social process in the field of design and art has affected the lives of designers-artists in the early decades of the twentieth century, how they also interfered in the process, and how these events occurred in the field of fashion design.

Keywords: Sociology of fashion. Fashion design and art. Modern art and fashion.

a europa do século XiX viveu uma expansão sem precedentes, o mercado de bens simbólicos, cujo resultado foi o surgimento de um campo literário e artístico, que tinha como objetivo a conquista da autonomização progressiva do sistema de relações de produção, circulação e o consumo desses bens, fundou aquilo que ficamos conhecendo como “l’art pour l’art” (arte pela arte) ou autonomização do campo. assim, a Capital francesa passou a ser o centro dessas transformações ou o mundo da arte. Com o cres-cimento notável de uma população de jovens provenientes das classes médias e populares, que vinham tentar carreiras de artista ou escritor, a cidade, agora um centro internacional da vida artística e cultural, transforma-se em cenário privilegiado para uma verdadeira batalha simbólica protagonizada por artistas, apoiados por escritores, contra um sistema tradicional de nomeação artística, sobre a tutela acadêmica.

1 Mestre em Moda, Cultura e arte – Centro universitário senaC (sp); doutorando em design – pontifícia universidade Católica ( puC – RJ ); professor no departamento de design (faesa).

2 Doutor em História da Arte – Universidade de Bruxelas; Mestre em Filosofia – Estética (UFRJ); professor da Pós-Graduação em design (puC – RJ).

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A construção de um campo de produção autônomo, capaz de impor os princípios específicos de percep-ção e de apreciação, consolida-se a partir da luta da vanguarda contra a instituição das artes maiores e contra sua ideologia elitista tradicional, isto é, associada ao antigo processo de legitimação exercido pela Académie, expondo-a fortemente à existência de um fazer artístico como instituição burguesa, isolado da práxis e de vida que ocorre no contexto social. Com movimento na direção de uma maior autonomia, emerge um processo de transformação dos modos de expressão artística e o nascimento de um espírito de experimentação, que leva ao desenvolvimento da forma que convém propriamente a cada arte ou a cada gênero.

As fronteiras que distinguem arte de artesanato foram sempre marcadas por sua indefinição. De um lado, está o trabalho do artesão criando objetos para uso e conveniência; do outro, o trabalho do artista visto como não instrumental. Considerar a arte como possuidora de maior valor simbólico ocorre pelo fato de ela agregar valores estéticos produzidos dentro de um campo de consagração autônomo, campo1 este constituído e legitimado por interlocutores especialistas em história da arte, por artistas consagrados, crí-ticos etc. Esses valores certamente surgiram a partir da estética kantiana, definida como não instrumental, desinteressada, sensível, distinta, distanciada das práticas do dia a dia.

O conceito de campo faz parte do corpo teórico de Pierre Bourdieu. Em sua definição, constitui-se de um espaço de relações entre grupos com distintos posicionamentos sociais, espaço onde ocorrem disputas dentro do jogo do poder. para bourdieu, a sociedade é formada por vários campos que gozam de relativa independência regida por regras próprias. em seu livro Regras da Arte, revela as normas que regem as instituições literárias e artísticas, desmitificando o mito do gênio criador. Mostra-nos como, a partir da Arte Moderna, artistas aliados a escritores, historiadores, construíram uma rede de conexões com o objetivo de transformar os meios de consagração da expressão artística e se tornarem sujeitos de sua própria criação.

dessa forma, o artista moderno amplia e aproxima a experiência estética à sua realidade cotidiana, não se limitando ao domínio da prática historicamente estabelecida. Propõe o fim da divisão que se estabeleceu entre belas-artes e profissões produtivas, e a oposição tradicional entre prática e estética, levando a uma reconsideração da arte, liberando-a do distanciamento que a separa da vida e das práticas cotidianas. dedica-se à síntese de todas as artes visuais, inclusive a arquitetura e o design; sonha com um tempo em que a práxis de vida seja elevada ao mesmo nível estético, com a alteração radical do estatuto da obra de arte.

o design de moda e têxtil, assim como o da cerâmica e o do mobiliário, era tradicionalmente classificado como atividade de artesão em vez de criação artística. tecelões, costureiros, alfaiates e marceneiros fo-ram, anteriormente à revolução industrial, vistos como servidores nas Cortes. esse fator foi determinante para o seu prestígio social, diferentemente do que ocorreu com os artistas e arquitetos que trabalhavam sobre regime de contratos. O final do século XIX e início do século seguinte foi o momento em que essas fronteiras deixaram de ser rígidas, por consequência das lutas protagonizadas pela autonomização do campo da arte, e pelo fim da hierarquia entre o ofício prático do artesão e a “atividade” estética do artista. o ponto crucial desse momento foi o ressurgimento dos ideais que caracterizavam o movimento inglês Arts & Crafts, na virada do século, movimento este que defendia o artesanato criativo como alternativa à mecanização e à produção em massa, pregava o fim da distinção entre o trabalho do artesão e do artista. o retorno ao movimento teve consequência direta no modo de vestir, popularizando roupas que fossem mais higiênicas, estéticas e práticas. tais condições propiciaram as mudanças radicais que ocorreram na roupa feminina e na criação têxtil e, consequentemente, criaram uma maior aproximação entre os campos do design de moda e da arte.

na virada para o século XX, muitos artistas-designers passaram a compartilhar do pensamento de que o campo da moda, pela sua expressão social e econômica, se constituía de importância tão significativa que não poderia ficar nas mãos só dos costureiros. Eles se apropriaram da moda como espaço privilegiado no

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qual poderiam transgredir os limites da arte “pura”, atuar diretamente na vida real e obter sua sobrevivência econômica. propuseram mudanças na roupa do homem moderno de maneira diversa em termos de estilo, mas, para todos eles, as inquietações partiam de um ponto em comum, a rejeição da moda proveniente do sistema francês pela sua lógica imoral e mercantilista. em contrapartida, propuseram uma nova moda utópica, uma anti-fashion. a denegação coletiva dos interesses e ganhos comerciais não se constituiu, no entanto, em completa recusa do interesse econômico. na realidade, forma de se fazer não reconhecer o jogo em sua prática, como meio de se obter os ganhos do desinteresse. para bourdieu, essas condutas mais “antieconômicas”, as mais “desinteressadas” visivelmente, aquelas que, em um universo “econô-mico” habitual seriam as mais condenadas sem o menor dó, contêm uma forma oculta de racionalidade econômica (até mesmo no sentido restrito) e, de modo algum, excluem seus autores dos ganhos, inclusive “econômicos” (BOURDIEU, 2008, p.19).

Movimentos antimoda aconteceram fora do campo da alta costura em outros países. esses movimentos não só pregavam a reforma do vestuário, mas se constituíram também em sentimento de oposição à influência de paris, como precursora das novidades na moda. os novos estilos de roupa propostos pelos modernos correspondem a outras expectativas – adaptar o vestuário às exigências cotidianas da nova burguesia, da vida profissional que está longe de excluir as funções tradicionais de representação social, ou do esporte, que se opõem tanto ao trabalho, quanto ao puro e simples consumo ostensivo de tempo e dinheiro (bouRdieu, 2008). Essa moda exalta o corpo natural, supõe que o próprio corpo, e não mais os símbolos sociais de riquezas e da autoridade, torna-se suporte da distinção social. na Rússia pós–revolução, a moda assumiu outro caráter: instrumento revolucionário no processo de reconstrução social.

a denegação da alta Costura pelos artistas-designers modernos, particularmente no que se refere às propostas de racionalização do vestuário nas primeiras décadas do século XX, pode ser vista como uma antevisão da necessidade de reestruturação do campo da moda, com declínio da classe dirigente, e a diversificação das categorias, tendo como consequência uma reorganização da divisão do trabalho. Esse empreendimento só foi acontecer definitivamente, e de forma bem-sucedida, na moda parisiense, nos anos 1960, sob a tutela do engenheiro civil e designer de moda andré Courrèges, que foi quem se empenhou em oferecer pelo menor preço, graças a uma gestação racional, produtos de sua criação, “modernos e dinâmicos”, “lógicos e funcionais”, “esportivos e livres”, obtendo o sucesso com a nova burguesia moderna.

Na década de 1920, muitos artistas-designers que estavam propondo, em outros países, alternativas ao sis-tema de moda francês, por razões diversas, migraram para paris. na frança, eles despertaram a atenção de grandes costureiros da alta Costura, que viam em seus trabalhos a oportunidade de atender à transformação da demanda, dotando a moda francesa de valores artísticos contemporâneos, que pudessem atender às exigências de uma nova burguesia de estilo de vida mais solto. para os costureiros, um produto de moda com intervenção de um artista era constituí-lo como raro–digno de ser procurado, consagrado, distinto – operação que caracteriza propriamente a produção dos bens simbólicos. para os artistas-designers, o fato de estar no espaço em que se ordenava a estrutura do campo nas leis que organizavam a acumulação do capital simbó-lico e sua circulação, era a oportunidade para transgredir e denegar, isto é, atuar profissionalmente de forma desinteressada e, ao mesmo tempo, interessada com o objetivo de obter ganhos econômicos.

Ao ocupar posições, tanto no campo da moda como no da arte, realizando o “jogo da homologia” (BOUR-DIEU, 2008), os artistas-designers procuravam usufruir de campos de consagração com diferente capaci-dade de distinção simbólica, por sua vez, transferidos para o produto vestuário. tratava-se de se apropriar de uma parcela cada vez maior do produto do trabalho de consagração, que constitui concretamente a parcela do lucro simbólico, por sua vez, econômico. Para Bourdieu (2008) as práticas e os discursos de agentes que ocupam posições homólogas em campos diferentes não excluem as diferenças associadas à posição que os diferentes campos, como tais, ocupam na hierarquia da legitimidade. Como recém-chegados, a estratégia foi denunciar os comprometimentos mercantis ou as manobras calculistas dos Costureiros, a quem eles se medem e, por conseguinte, seus produtos e o gosto daqueles que permanecem apegados

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a isso, tendo como consequência “[...] provocar uma translação dentro do campo e das estruturas de preferência” (BOURDIEU, 2008, p. 141).

ao analisar o design de moda das vanguardas, podemos identificar duas principais tendências: a pri-meira se constituiu das atividades na área têxtil. o design de tecidos, pela sua importância econômica, volume de produção e oportunidade de realizar negócios com as Maisons da alta Costura, atraiu um grande grupo de artistas-designers. os motivos predominantes nas padronagens têxteis da época podem ser denominados de decorativismo, que se constituiu, em parte, como influência da luta que se travou pela valorização da pintura decorativa realizada por Matisse e pelos fauvistas. as padronagens que incorporavam esse espírito ficaram conhecidas pelo seu culte de la vie, uma invocação ao movimento naturista, típico da obra de Matisse. seguindo essa tendência está a maior parte da produção realizada pela associação de artistas austríacos, a Wiener Werkstätte, liderados por Gustav klimt, (figura 1) e pelo Omega Workshops, grupo de artistas ingleses que trouxeram a linguagem experimental da arte das vanguardas modernistas para o design doméstico da Grã-bretanha edwardiana. Mas, se tivéssemos de citar um expoente principal dessa tendência, sem dúvida seria o artista-designer fauvista francês, Raoul dufy, que transformou a face do design de tecidos e moda. sua produção, nesse campo, deu-se entre 1909 e 1930, e seu estilo foi radicalmente influenciado pelas artes populares e pelo decorativismo em voga na europa. sua experiência com cores, design, textura e a imaginária de uma vasta gama de produtos, como capas de livros, perfumes, decoração de interiores, tecidos para mobiliários e para a produção de roupas, exercem influências até mesmo em nossos dias. Entre 1912 e 1928, como designer da indústria de seda Bianchini-Ferier, ele desenvolveu uma rica, variada e original produção de têxteis para a indústria de moda e para a decoração de interiores (figura 2).

Figura 1 – Gustav Klimt, Retrato de Johanna Staude fonte: volkeR, angela. textiles of the Wiener Werkstäte. londres: thames&Hudson, 2004.

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Figura 2 – Raoul Dufy, La jungle, seda estampada, 1923 fonte: ville de HonfleuR. Catálogo da exposição, La Passion des tissus. Paris: Imprimeur, 1993.

a segunda tendência predominante no design de moda das vanguardas se desenvolveu na direção do racionalismo e do funcionalismo estético, obcecada pela geometria de linhas, ângulos e volumes, imaginando o futuro em termos de uma nova sociedade tecnológica. em direção a esse espírito, muitos artistas-designers propuseram mudanças nas formas e investir na criação de padronagens abstratas, sonhando com um mundo melhor. nesse grupo, podemos citar os membros do Workshop têxtil da Bauhaus, os Construtivistas que atuaram na união soviética pós-revolução, os designers russos exilados em paris e os futuristas italianos, entre eles, ernesto thayat, criador do macacão de trabalho (figura 3) e que se tornou o principal colaborador de Madeleine Vionnet entre 1919 e 1925, atuando na Alta Costura francesa.

Figura 3 – Ernesto Thayat, Macacão de trabalho, 1918 – 1919 fonte: Catálogo da exposição, Thayaht Vita, scritti, carteggi. Florença: Museu do Plato, 2005.

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os futuristas se constituíram no mais extremo movimento entre as vanguardas. sentiam-se como pro-tagonistas de uma nova cultura e imaginavam revolucionar não só o vestuário e a indústria têxtil, mas também a poesia, a pintura, a arquitetura, a música, o filme e até mesmo a culinária.

na união soviética pós-revolução, os suprematistas, liderados por Malevich, e os construtivistas, stepa-nova, Rodchenko, popova e vladimir tatlin, juntos com outros jovens designers, entre eles, o designer sergei burylin, realizaram uma fascinante experiência no campo da moda. sonhando com uma síntese de todas as artes, eles esperavam que o desenvolvimento da arte abstrata levasse à renovação estética do design comercial. Seguindo as experiências que estavam acontecendo na Bauhaus, entre 1927 e 1933, investiram na transformação do vestuário e no design têxtil, no momento em que o partido Co-munista estava trabalhando para transformar os países agrários da recém-formada República soviética em potências industriais. ao apostarem em motivos das padronagens têxteis que enalteciam as metas revolucionárias em temas que permeavam o design de tecidos, como a industrialização, os serviços de transporte, a eletrificação etc. (Figura 4), eles acreditavam estar colaborando para a consolidação da revolução.

Figura 4 – Sergei Burylin, Locomotivas, 1924 fonte: kaCHukin, pámela. Soviet Textiles, designing the modern utopia. boston: fine art Museum, 2006.

o moderno design do século XX foi praticamente definido pela Bauhaus entre as duas grandes guerras. Como preeminente fenômeno da era no campo do design, quase todos os seus aspectos foram minu-ciosamente examinados. entre as exceções, a produção para a indústria de moda. apesar de pouco divulgada, as criações da oficina de tecelagem foram bem-sucedidas tanto nos anos iniciais em Weimar, quando trabalharam o tecido como suporte de expressão artística, quanto mais tarde, no desenvolvi-mento de tecidos para a indústria têxtil.

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sob a direção do artista plástico húngaro, Moholy-nagy, defensor da integração entre tecnologia e indústria no design e nas artes, os tecidos da bauhaus deixaram de ser somente meios de expressão de arte e ganharam a indústria. alguns membros do Workshop textil, como eram chamadas as oficinas, propuseram novos modelos de roupas de trabalhos e desenvolveram tecidos em fibras com novas tec-nologias para a indústria de moda, onde se destaca a colaboração que se firmou entre a Escola e Patou, um dos principais nomes da alta Costura francesa e conhecido pela modernidade de suas criações.

A revolução de outubro de 1917 levou um grande grupo de designers e artistas russos a migrar para outros países. paris foi o principal destino desse grupo de exilados, onde eles encontraram apoio de colegas franceses, intelectuais e de criadores de moda. trouxeram em suas bagagens as experiências do envolvimento como artistas-designers no campo da moda que já estava acontecendo na Rússia. alguns abriram negócio próprio ou se associaram diretamente a criadores de moda. esse foi o caso de iliazd, que se tornou o principal colaborador de Coco Chanel, ao assumir a direção-geral e o cargo de principal designer da Tissus Chanel, entre 1927 e 1933.

entre os designers russos que atuaram no campo da moda parisiense nas primeiras décadas do século passado até a eclosão da Segunda Grande Guerra, incontestavelmente, Sonia Delaunay foi a figura mais célebre. antes mesmo da chegada em massa dos exilados, ela já estava protagonizando expe-rimentações no design de moda, como consequência das pinturas simultâneas que estava realizando nos anos 1910, junto com seu marido, o pintor cubista francês Robert Delaunay. Entre seus empreen-dimentos, residindo em Madrid, logo após o fim da Primeira Guerra, pode-se citar a abertura da Casa Sonia, boutique com sucursais em Bilbao, Saint-Sebastian e Barcelona. Em 1920, de retorno à Paris, ela revolucionou a arte dos tecidos, substituindo as ornamentações tradicionais por motivos geométricos e combinações de planos coloridos (Figura 5).

Figura 5 – Sonia Delaunay, Carro e conjunto em padronagem abstrata, 1925 fonte: daMase, Jacques. Sonia Delaunay, fashion and fabrics. london: thames and Hudson, 1991.

os delaunay, pelo bom relacionamento que mantinham com costureiros e com mundo intelectual da Capital francesa, foram responsáveis pela introdução dos artistas-designers exilados no campo da moda parisiense e, por que não dizer, os protagonistas do encontro da alta Costura com a arte Moderna que estava sendo produzida em território russo.

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REFERÊNCIAS

bouRdieu, pierre. A produção da crença: contribuição para uma economia dos bens simbólicos. Porto Alegre: Zouk, 2008.

bouRdieu, pierre. As regras da arte. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

daMase, Jacques. Sonia Delaunay, fashion and fabrics. London: Thames and Hudson, 1991.

kaCHukin, pámela. Soviet textiles, designing the modern utopia. boston: Mfa, 2006.

kant, immanuel. Crítica da Faculdade do Juízo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993.

sCappini, alessandra. Catálogo da exposição, Thayaht Vita, scritti, carteggi. florença: Museu do plato, 2005.

ville de HonfleuR. Catálogo da exposição, Raoul Dufy, La Passion des tissus. paris: imprimeur, 1993.

volkeR, angela. Textiles of the Wiener Werkstäte. londres: thames&Hudson, 2004.

Recebido em abril de 2010Aceito em julho de 2010

Correspondência para / Reprint request to:prof. Rui Gonçalves de souzaFaculdades Integradas Espírito – Santenses – FAESA – Rua Anselmo Serat, 199 – Ilha de Monte Belo – Vitória/ES – BrasilCEP: 29040-010e-mail: [email protected]