O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na...

17
PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS FERROVIÁRIOS: UM ESTUDO DE CASO DO ATERRO DO KM 196 NA FERROVIA DO AÇO Vagner Emanuel da Silva Maria Esther Soares Marques (Orientadora) Instituto Militar de Engenharia Especialização em Transporte Ferroviário de Cargas RESUMO O aterro do km 196 da Ferrovia do Aço, nas proximidades de Conceição da Barra de Minas, no Estado de Minas Gerais, tem apresentado desde sua construção na década de 1980, recalques e movimentações que caracterizam um processo de ruptura. Este trabalho visa consolidar um histórico deste aterro, apresentando as características locais, patologias, ações para a estabilização do maciço e seu comportamento através da análise de dados da instrumentação realizada. Nota-se que há diversos fatores que levam a escolha de uma solução executiva para as patologias neste aterro, e que uma obra de terra pode apresentar problemas ao longo de sua existência por variáveis não previstas, ou que não puderam ser computadas por ocasião do projeto e obra. Um local problemático como o aterro do km 196, que desafiou inúmeras soluções, merece toda atenção e deve ser sempre acompanhado e monitorado a qualquer sinal estranho que possa afetar sua funcionalidade. ABSTRACT The earthwork km 196 of the Steel Railway, near Conceição da Barra de Minas, in Minas Gerais, has presented since its construction in the 1980s, settlements and movements that characterize a breaking process. This work aims at consolidating a history of this earthwork, with local characteristics, conditions, actions to stabilize the massive and behavior through the data analysis performed instrumentation. To note that there are several factors that lead to choosing an executive solution to the pathologies in this earthwork, and a earth building can present problems throughout its existence, for unforeseen variables, or which could not be computed on the occasion design and work. A problematic site as the earthwork km 196, which defied numerous solutions deserves attention and should always be accompanied and monitored at any strange signal that can affect its functionality. 1.INTRODUÇÃO / OBJETIVO O presente trabalho trata do estudo de caso de um aterro ferroviário com 26 metros de altura máxima, localizado no km 196 da Ferrovia do Aço, no município de Conceição da Barra de Minas, em Minas Gerais. O aterro foi construído na década de 1980, sobre um depósito de solo mole e sofreu diversas patologias nas últimas décadas. Esta estrutura faz parte de um importante corredor ferroviário, usado principalmente na exportação de minério e de grande importância a economia do país. É apresentada uma consolidação de informações com histórico da construção do aterro, suas características, patologias, ações para a estabilização do maciço e seu desempenho a partir de instrumentação, visando contribuir nos estudos para futuras intervenções, se necessárias, bem como no aumento de carregamento neste aterro. Ressalta-se a importância deste trabalho, já que o aterro em estudo é considerado um dos pontos de infraestrutura mais críticos em toda ferrovia sob concessão da MRS Logística S/A, sendo que as diversas soluções e intervenções foram elaboradas por diferentes projetistas e diferentes executores ao longo do tempo, com grande parte das informações já dispersas. 2. HISTÓRICO O km 196 da Ferrovia do Aço apresentava na morfologia local, uma grande depressão em seu greide vertical. Foi então, iniciada em 1980 a construção de um aterro, de elevado volume como solução de engenharia. Contudo, este trecho apresentava ocorrência de solo mole.

Transcript of O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na...

Page 1: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS FERROVIÁRIOS: UM ESTUDO DE

CASO DO ATERRO DO KM 196 NA FERROVIA DO AÇO

Vagner Emanuel da Silva

Maria Esther Soares Marques (Orientadora) Instituto Militar de Engenharia

Especialização em Transporte Ferroviário de Cargas

RESUMO

O aterro do km 196 da Ferrovia do Aço, nas proximidades de Conceição da Barra de Minas, no Estado de Minas

Gerais, tem apresentado desde sua construção na década de 1980, recalques e movimentações que caracterizam

um processo de ruptura. Este trabalho visa consolidar um histórico deste aterro, apresentando as características

locais, patologias, ações para a estabilização do maciço e seu comportamento através da análise de dados da

instrumentação realizada.

Nota-se que há diversos fatores que levam a escolha de uma solução executiva para as patologias neste aterro, e

que uma obra de terra pode apresentar problemas ao longo de sua existência por variáveis não previstas, ou que

não puderam ser computadas por ocasião do projeto e obra. Um local problemático como o aterro do km 196,

que desafiou inúmeras soluções, merece toda atenção e deve ser sempre acompanhado e monitorado a qualquer

sinal estranho que possa afetar sua funcionalidade.

ABSTRACT

The earthwork km 196 of the Steel Railway, near Conceição da Barra de Minas, in Minas Gerais, has presented

since its construction in the 1980s, settlements and movements that characterize a breaking process. This work

aims at consolidating a history of this earthwork, with local characteristics, conditions, actions to stabilize the

massive and behavior through the data analysis performed instrumentation.

To note that there are several factors that lead to choosing an executive solution to the pathologies in this

earthwork, and a earth building can present problems throughout its existence, for unforeseen variables, or which

could not be computed on the occasion design and work. A problematic site as the earthwork km 196, which

defied numerous solutions deserves attention and should always be accompanied and monitored at any strange

signal that can affect its functionality.

1.INTRODUÇÃO / OBJETIVO

O presente trabalho trata do estudo de caso de um aterro ferroviário com 26 metros de altura

máxima, localizado no km 196 da Ferrovia do Aço, no município de Conceição da Barra de

Minas, em Minas Gerais. O aterro foi construído na década de 1980, sobre um depósito de

solo mole e sofreu diversas patologias nas últimas décadas. Esta estrutura faz parte de um

importante corredor ferroviário, usado principalmente na exportação de minério e de grande

importância a economia do país.

É apresentada uma consolidação de informações com histórico da construção do aterro, suas

características, patologias, ações para a estabilização do maciço e seu desempenho a partir de

instrumentação, visando contribuir nos estudos para futuras intervenções, se necessárias, bem

como no aumento de carregamento neste aterro. Ressalta-se a importância deste trabalho, já

que o aterro em estudo é considerado um dos pontos de infraestrutura mais críticos em toda

ferrovia sob concessão da MRS Logística S/A, sendo que as diversas soluções e intervenções

foram elaboradas por diferentes projetistas e diferentes executores ao longo do tempo, com

grande parte das informações já dispersas.

2. HISTÓRICO

O km 196 da Ferrovia do Aço apresentava na morfologia local, uma grande depressão em seu

greide vertical. Foi então, iniciada em 1980 a construção de um aterro, de elevado volume

como solução de engenharia. Contudo, este trecho apresentava ocorrência de solo mole.

Page 2: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Como elemento complicador, havia também uma significativa bacia hidrográfica de

contribuição e área parcialmente inundável.

Estas características técnicas sugeriam a possibilidade de execução de um viaduto como

solução de engenharia. Entretanto, foi construído um grande aterro, em uma condição

geotécnica e hidrológica pouco favorável.

Desde a sua construção na década 1980, o aterro do km 196 da Ferrovia do Aço, tem

apresentado recalques e movimentações, que caracterizam um processo de ruptura.

Ao longo dos anos estes deslocamentos foram evoluindo, mas sem ocorrência de ruptura

global do aterro que impedisse o tráfego ferroviário. Os deslocamentos observados ocorriam

somente em um dos lados do aterro, já os demais trechos aparentemente preservados, não

demonstravam movimentos visíveis. Contudo nestas últimas décadas, os deslocamentos

observados paulatinamente interferiram no tráfego ferroviário.

Durante a retomada da construção da Ferrovia do Aço em 1987, foram executados serviços

para recuperação e estabilização do aterro, pois o mesmo já apresentava erosões e trincas em

seu corpo, mesmo antes da passagem dos trens que iniciaram somente em 1989. Desde então,

foram realizados pequenos serviços de manutenção para recuperação dos taludes, tanto na

gestão RFFSA, quanto MRS Logística S/A, o que foi suficiente para manter o aterro estável

até ocorrer o surgimento de uma grande trinca na plataforma em agosto de 2010. Com isso,

foram realizadas diversas obras, detalhadas a seguir, com o objetivo de manter a passagem

dos trens e estabilizar novamente o aterro, que se encontra em contínuo monitoramento.

3.DESCRIÇÃO DO LOCAL

O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos

trechos mais importantes da malha ferroviária brasileira, devido a sua extrema relevância

estratégica, pois neste trecho percorre a maior parte do volume de minério que escoa do

Estado de Minas para os portos do Rio de Janeiro e São Paulo.

Page 3: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Figura1: Localização do local de estudo

3.1 Características geométricas do aterro

Os aterros da ferrovia do aço são geralmente de grandes dimensões em função da morfologia

desta região mineira. As características geométricas do aterro em estudo estão apresentadas na

Figura 2.

Figura 2: Características geométricas do aterro

3.2 Características hidrológicas da região

A bacia de contribuição na região do aterro do km 196 é de aproximadamente 740.000 m²,

conforme figura 3 abaixo. No local existem três galerias de transposição sobre o aterro. Segue

abaixo foto aérea com indicação aproximada da área da bacia de contribuição.

Outra característica confirmada no local foi a presença de aquífero confinado ou artesiano.

Este tipo de aquífero ocorre quando a água subterrânea está confinada sob uma pressão

superior do que a pressão atmosférica, isto ocorre devido à existência de uma camada

confinante impermeável acima do aquífero. Pelo fato de a água encontrar-se a uma pressão

superior à atmosférica, quando se faz um furo para extração, a água sobe até a superfície

piezométrica, dando origem a um furo artesiano.

Page 4: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Figura 3: Características hidrológicas em relação ao aterro

3.3 Características geológico-geotécnicas do local

A região do aterro apresenta incidência de solo mole que combinada com o aqüífero artesiano

contribui por movimentações nos aterros adjacentes, conforme mostra figura 4 abaixo,

verificou-se a ocorrência da movimentação do aterro rodoviário lateral ao maciço em estudo.

Figura 4: Movimentação do maciço devido à incidência de solo mole e aquífero artesiano

Num levantamento de todas as 17 sondagens realizadas no aterro, somente uma, a SM-102A

apresentou uma camada de material argiloso muito mole a mole, com espessura de 4m,

indicando que estava restrita a uma pequena região (bolsão), vide figura 6. Já em relação às

áreas adjacentes ao aterro, o solo mole é facilmente constatado.

As seções definidas em projeto para realização das sondagens podem ser constatadas através

Page 5: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

da figura 5. O projeto com a sondagem nos pontos de maior interesse no aterro é apresentado

logo na sequência.

Figura 5: indicação de seções e furos de sondagens no aterro apresentadas

As Figuras 6 e 7 apresentam perfis geotécnicos do aterro apresentados acima. Verifica-se na

sondagem da seção 2 abaixo a ocorrência de solos com baixa resistência (NSPT = 3), nas

cotas 935 a 940.

Figura 6: Perfis de sondagem do aterro (Seção 2)

Na Figura 7 é apresentada a sondagem a percussão da seção 3 e seus resultados. Nesta

sondagem, o nível de água estava na cota 950 e o índice de resistência à penetração variou

entre a primeira e a segunda camada próximo de 15 e entre a terceira e última 34.

Page 6: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Figura 7: Perfis de sondagem do aterro (Seção 3)

4. OCORRÊNCIAS E SOLUÇÕES ADOTADAS

Foram diversas soluções de engenharia, desde cortinas atirantadas, rebaixamento de lençol

freático, injeções de calda de cimento, alteração do traçado original, aterro sobreposto

lateralmente, berma de equilíbrio etc. A linha acabou tendo seu traçado original alterado,

aumentando-se um dos lados do aterro considerado aparentemente estável e criando-se uma

curva para fugir da região abrangida pela mobilização do terreno e permitir a continuidade de

passagem dos trens.

Conforme informado anteriormente, as movimentações mais significativas ocorreram a partir

do ano de 2010, onde estaremos abordando na sequencia cada uma das soluções a partir desta

data.

Page 7: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

4.1 Cronologia dos Serviços Realizados

*Elaborado pelo autor

Figura 8: Cronologia das patologias e soluções propostas

A seguir são descritas as ocorrências e as ações:

2010: surgimento de trinca na plataforma.

Para garantir afastamento do carregamento ferroviário próximo a trinca surgida, foi realizada

uma alteração geométrica da linha, já que a plataforma na região possuía área para futura

duplicação, conforme quase toda Ferrovia do Aço. Afim de eliminar os vazios e evitar

percolação de água pela trinca, foi realizada injeções de solo-cimento nesta área. Outra ação

visando abaixar o nível d’água no corpo do aterro e diminuir a pressão do maciço foi à

execução de drenos horizontais e dreno profundo no pé do aterro. Por fim, visando à

estabilização do maciço foi construído um muro de gravidade de 25 metros de comprimento,

2 metros de altura e 0,30 metros de largura na região do pé da berma superior do aterro.

2011: Recalque do aterro, formação de cunha de ruptura e movimentações da

galeria de drenagem

Algumas tentativas de solução com execução de obras foram tentadas anteriormente, sem

êxito, foi realizada a contratação de uma consultoria especializada externa logo após o

período chuvoso terminado em abril de 2011, para analisar o problema e elaborar um novo

projeto executivo.

Page 8: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Após verificação de movimentação da plataforma com a formação visível de cunha de

ruptura, iniciou-se em 03/06/2011 o monitoramento topográfico com locação de 10 pontos no

aterro. As medições foram praticamente diárias de verificações de recalques e deslocamentos.

Constatou-se até 02/07/2011 um recalque próximo de 90 milímetros e deslocamento na casa

de 3milímetros, sem alterações a partir desta data até o final de 2011.

Através do levantamento de todas as 17 sondagens realizadas, somente uma, apresentou uma

camada de material argiloso muito mole a mole, com espessura de 4m, indicando que estava

restrita a uma pequena região (bolsão) abaixo do aterro. Considerando os resultados destas

sondagens, o projeto previu a execução de uma cortina atirantada inclinada com extensão de

170 metros, determinada pelas condições de instabilidade da ocasião e situada logo abaixo da

berma mais alta, com tirantes em dois níveis.

Já a galeria de águas, com dimensões internas de 2,00 por 2,50 metros de altura, construídas

com aduelas de 6 metros assentada no talvegue, sob o aterro, estava, nos seus primeiros 42m,

com indícios graves de grandes movimentações e se apresentava com as juntas muito abertas,

chegando até 30 centímetros na horizontal, com 40 centímetros de profundidade. O

fugenband, material empregado durante a construção para a vedação, apresentava-se rasgado,

proporcionando um intenso carreamento de material fino, o que aparentemente vinha

ocorrendo a muitos anos, resultando numa perda considerável de volume ocasionando o

afofamento do terreno, com a consequente perda de sua resistência geotécnica. Então foi

proposto um projeto de preenchimento de vazios e a consolidação do aterro no entorno do

trecho da galeria de drenagem modular danificada, com injeções de calda de cimento com

pressões e volumes controlados, executadas através de tubos colocados nas juntas da galeria

para sua recuperação. Os tubos foram distribuídos adequadamente no teto, na soleira e nas

duas laterais. Após a conclusão destas injeções, verificou-se um volume considerável de 700

metros cúbicos nata injetada, confirmando os vazios e afofamento do solo. Inevitavelmente,

esta fuga de materiais poderia causar recalques súbitos nos taludes e na plataforma ferroviária.

Complementando o projeto, foram previstas a execução de novos drenos suborizontais, a

reconstituição, complementação de todo o sistema de drenagem pluvial e a recomposição de

todos os locais do aterro afetados pela movimentação e nova instrumentação.

Por fim, foi realizado serviço paliativo de cravação de trilhos de aproximadamente 12 metros

e feito amarração com cabo de aço de um lado ao outro da linha modificada em 2010, como

tentativa de estabilização do solo que recebia grande parte do carregamento ferroviário.

2012: Deslocamento da cortina atirantada e recalque acelerado da plataforma

Após período chuvoso intenso, em janeiro de 2012, com precipitações da ordem de 130

milímetros por dia (o total do mês chegou a 634 milímetros), o aterro ainda continuava com as

obras de estabilização sendo executadas. Novamente, o maciço apresentou um movimento, no

lado montante, com abrangência maior e mais profunda que a situação estudada no ano

anterior. As medições de recalques e deslocamentos no período de 19/01/2015 a 17/05/2015

podem ser verificados nas figuras 9 e 10.

Page 9: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Figura 9: Gráfico controle de recalques de jan/2012 a mai/2012

Figura 10: Gráfico controle de deslocamentos de jan/2012 a mai/2012

Em caráter emergencial visando não interromper o tráfego ferroviário, optou-se pela

construção de um aterro adjacente na parte estável do aterro para realização de uma variante

da ferrovia. O objetivo (era) visa alterar o carregamento sobre a área do aterro que sofre

(sofria) seriamente (com) as patologias mencionadas.

O aterro adjacente utilizou-se de um volume de aproximadamente 17.500 metros cúbicos de

solo argilo-siltoso e parte de material proveniente de minério visando otimizar os trabalhos no

período chuvoso. Após treze dias ininterruptos de trabalho o aterro foi concluído em fevereiro

de 2012, logo em seguida foi construída a nova variante da linha férrea com descarga de brita

Page 10: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

e socaria manual. Por fim ocorreram as ligações definitivas e alteração do tráfego ferroviário

naquele mesmo mês.

Buscando diminuir a pressão no corpo do aterro, foram realizados oito poços para

rebaixamento do lençol freático. Outra ação simultânea foi a construção de mais drenos

suborizontais no corpo do aterro localizado no pé da primeira berma (topo da cortina) com

pelo menos quinze metros de comprimento espaçados a cada dez metros, aumento de três

DHP’s totalizando um leque de sete DHP’s no canto esquerdo do maciço, além de vala

drenante ao redor do brejo.

As fendas abertas, tanto na plataforma a montante do aterro como também na superfície do

talude em toda a sua extensão foram vedadas com solo argiloso apiloado. Para recuperação da

drenagem pluvial, em alguns casos foi necessário executar valetas e descidas d'água

provisórias, complementando com um trabalho de condução das águas pluviais para que não

ocorressem empoçamentos, retenções e nenhuma infiltração em toda a extensão da área da

plataforma e da superfície do talude. Tudo indica que estas infiltrações significativas de água,

além de saturar o aterro com incremento no seu peso e elevar o nível d’água, devem ter

provocado pressões hidrostáticas na superfície de ruptura, contribuindo, desta forma, para a

nova instabilização ocorrida. Controle dos níveis d’água através de leituras diárias foram

implementadas. Foi mantido também, observação permanente nas juntas da galeria de

drenagem, onde em caso de carreamento de material, seria necessário realizar reinjeção,

entretanto não houve nova incidência de carreamento.

Algumas ações foram então tomadas, como: monitoramento topográfico constante, visando o

nivelamento da linha férrea para evitar o aumento da sobrecarga dos trens sobre o aterro,

devido ao impacto das composições sobre os trilhos na passagem das locomotivas e vagões;

controle diário dos recalques através de marcos superficiais; controle dos níveis d’água

através de leituras diárias dos piezômetros; definição em campo da nova linha da crista da

ruptura por esta mesma equipe; colocação de lona plástica no talude sem vegetação acima do

muro de peso existente, afim de impedir a infiltração da água de chuva neste local; execução

de novas sondagens à percussão complementares de verificação. Cuidados adicionais neste

período foram tomados, como as passagens das composições que passaram a acontecer com

maior precaução, tendo a velocidade reduzida a 20 km/h, além disso, foi dada toda atenção

em relação a operação neste trecho, havendo vigilância vinte quatro horas afim de alertar

qualquer nova movimentação, podendo assim suspender o tráfego.

Houve necessidade em alguns pontos com afundamentos, de se substituir a placa de apoio do

tirante normal da cortina (250x250mm) por uma com dimensões maiores, para uma melhor

distribuição das pressões, capaz de evitar que a parede da cortina ficasse comprometida.

2013: surgimento de nova trinca na plataforma

Em 2012 foi elaborado um projeto executivo complementar, que contemplava principalmente

a execução de uma berma de equilíbrio e galerias drenantes longitudinal no pé do aterro,

sendo estas intervenções concluídas no final do ano de 2013.

“Bermas de equilíbrio são plataformas laterais de contrapeso, construídas junto ao aterro

principal e são responsáveis por criar um momento contrário ao de ruptura provocado pela

carga do aterro” (DNER/IPR, 2001 apud MACCARINI, 2009, p. 44).

Page 11: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Barreto (2008) afirma que as bermas de equilíbrio são utilizadas em situações em que se

busca minimizar a inclinação de uma obra de terra, fazendo com que o fator de segurança (Fs)

contra a ruptura aumente, sendo que os projetos de bermas são feitos por tentativas e erros,

em que se varia a geometria dentro da situação até chegar ao Fs desejado.

Figura 11: Seção do projeto da berma de equilíbrio e recomposição do aterro

Com base nos resultados das análises apresentadas a seguir, pode-se concluir que, com a

configuração de berma apresentada em projeto para o aterro do km 196, os fatores de

segurança obtidos são os mínimos exigidos na NBR 11682 – Estabilidade de Encostas.

Para o projeto da berma de equilíbrio, foram analisadas duas seções sondagens consideradas

críticas para o desenvolvimento do projeto, realizando ainda análises enumeradas abaixo.

1. Retroanálise considerando a cortina atirantada existente no local;

2. Análise global com a solução adotada (berma);

3. Análise local com a solução adotada (berma).

Análise global com solução (berma com 10 metros, talude 1:6 na cota 957 e cortina com 2

tirantes 350 kN, ev = 2,30, eh = 2,75) (FS = 1,44) e análise local (FS = 1,21), conforme figura

12. 1.44

1.21

Figura 12: Análise global e local com a solução adotada de berma

Por conta da altura relativamente grande do aterro e das características dos solos, chegou-se à

uma largura de berma também grande, visto que deveria haver um momento para resistir ao

momento criado pelo aterro e assim aumentar o fator de segurança. O volume de solo

utilizado foi de 49 mil metros cúbicos na berma de equilíbrio. O projeto previa também uma

recuperação da lateral do aterro com solo argiloso e nos últimos três metros referente a

plataforma reforço em solo-cimento, estes trabalhos despenderam 4500 metros cúbicos de

materiais, concluídos em novembro de 2013.

Foram projetados drenos de estaca de areia no fundo da nova galeria visando o rebaixamento

de NA do corpo do aterro e que permitem que água caminhe verticalmente, além de um fluxo

Page 12: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

horizontal radial aumentando a velocidade de expulsão da água do solo compressível

(CAPUTO, 1987).

Neste mesmo ano iniciou-se a construção da superestrutura para retorno da ferrovia a

geometria original, porém após a terraplenagem encerrada, constaram-se algumas trincas que

se desenvolveram ao longo da plataforma recém-construída, com profundidade superficial.

Estas trincas aparentemente superficiais e de pequena profundidade, não apresentavam uma

conformação de maior abrangência e não configuraram uma cunha de ruptura do corpo do

aterro. Provavelmente, tratava-se de pequenos movimentos de acomodação do terreno novo

sobre o terreno antigo. Iniciou-se a instrumentação e monitoramento do aterro com a

instalação de marcos topográficos em locais estratégicos.

2014: nenhum recalque significativo

Foram construídos quatro novos piezômetros medidores de nível d’água (MNA) para melhor

acompanhamento do nível d’água no corpo do aterro. Aqueles existentes anteriormente

haviam sido destruídos pela obra ou estavam em locais distantes da região da cunha de

ruptura que chegou a ocorrer precedentemente, mas, mesmo assim, quando possível, foram

também feitas leituras do NA.

As leituras têm se efetuado desde o dia 17/09/2013 (MNA) e 12/12/2013 (Recalques e

Deslocamentos), quase que semanalmente. Essas medidas indicaram, em princípio, que o

terreno estava se recalcando (30mm) e se deslocando (15mm) com o NA baixo mas variável.

Mas, a partir das leituras do mês de março estes movimentos têm se mostrado menos

variáveis, indicando uma estabilização. O NA tem se mantido baixo, confirmando que os

dispositivos de drenagem instalados estavam fazendo efeito. As leituras e os gráficos de

acompanhamento do período de movimentação daquele ano são apresentados na figura 13 e

14.

Figura 13: Gráfico de controle de recalques no aterro dez/2013 a mai/2014

Page 13: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

Figura 14: Gráfico de controle de deslocamentos no aterro dez/2013 a mai/2014

Ressalte-se que os meses anteriores a maio foram de estiagem, diferentemente dos anos

anteriores de muita chuva. Os meses de outubro a abril são em geral de muita precipitação

pluviométrica, o que não ocorreu neste período.

As trincas recém surgidas em dezembro de 2013 aparentemente superficiais e de pequena

profundidade, não configurando uma cunha de ruptura do corpo do aterro foram vedadas na

plataforma a montante do aterro com solo argiloso apiloado e aquelas existentes nas valetas

de concreto (foram) reparadas.

Em maio de 2014 foi autorizado pelos consultores o retorno da linha férrea ao traçado

original. Porém com o aparecimento da trinca citada e (com) as precipitações pluviométricas

abaixo da média do período na região, a concessionária optou, por segurança, manter o

tráfego no desvio existente, com uma adequação do raio da curva permitindo remover a

restrição de velocidade das composições até então existente.

2015: ressurgimento de trinca superficial na plataforma

Realizado uma vez por mês, as leituras topográficas têm se mantido desde o dia 17/09/2013

(MNA) e 12/12/2013 (Recalques e Deslocamentos). Essas medidas indicam, em princípio,

que o movimento do terreno têm se mostrado menos variáveis, indicando uma estabilização.

O NA tem se mantido baixo, confirmando que os dispositivos de drenagem instalados estão

fazendo efeito.

Apesar dos relatórios e cálculos da empresa projetista responsável pelas intervenções

permitirem a alteração geométrica da linha para seu traçado original desde maio de 2014, a

concessionária opta no momento, por não retornar a ferrovia em seu traçado original, movida

principalmente pelas precipitações pluviométricas previstas de 2013 a 2015 que continuaram

abaixo da média, além do ressurgimento de trinca em fevereiro de 2015, aparentemente

superficial na plataforma.

Page 14: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

5. RELATÓRIO FOTOGRÁFICO

2010:

2011:

2012:

Page 15: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

2013:

2014:

Page 16: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme demonstrado, o aterro do km 196 da Ferrovia do Aço foi construído em uma

condição geotécnica pouco favorável. Com as novas sondagens, foi descoberta a existência de

aqüífero artesiano na região, fator este de grande relevância, confirmado durante a perfuração

dos poços de alívio. Este artesianismo ocorre logo abaixo da camada intermediária de baixa

resistência e impermeável, existente na fundação, contribuindo para movimentação do

maciço. As sondagens demonstraram a existência de uma camada de solo mole confinado de

razoável espessura (bolsão). Verificamos que para propor os trabalhos de estabilização do

aterro e obter uma precisão no diagnóstico, as medidas e os resultados das leituras bem como

as investigações geotécnicas foram fundamentais, face às diversos componentes

intervenientes no processo: problemas construtivos, solo mole, nível d’água elevado,

precipitações pluviométricas com valores altos, artesianismo, e outros. Estas características

técnicas sugeriam a possibilidade de execução de um viaduto como solução de engenharia.

Diante o histórico apresentado, observa-se que a galeria de drenagem subterrânea

apresentava-se muito deformada, com quase todas as juntas abertas no lado montante,

deixando passar água e solo em quantidade razoável. Tal situação provocou a formação de

vazios no maciço acima da galeria, que provavelmente foi a causa primária do problema de

instabilização do aterro.

As medidas adotadas pelos projetos executivos realizados no sentido de aumentar a

resistência do corpo do aterro em conjunto ao rebaixamento do nível d’água e o projeto

complementar, baseado em informações mais detalhadas e confiáveis, permitiram que se

executassem obras de drenagem e terraplenagem para se obter a necessária estabilização. De

qualquer forma, uma obra de terra pode apresentar problemas ao longo de sua existência, pela

falta de manutenção ou por variáveis não previstas por ocasião do projeto e obra. O solo é um

elemento heterogêneo que apresenta comportamentos díspares a cada situação.

Para os projetos futuros deve-se considerar sempre a importância de uma solução compatível

com as características geotécnicas do local. Os trabalhos emergenciais propostos e realizados

têm-se mostrado eficientes no sentido de aumentar a resistência do solo do corpo do aterro,

concomitante ao rebaixamento do nível d’água.

Um local problemático como o aterro do km 196 da Ferrovia do Aço, que desafiou inúmeras

soluções, deve ser sempre acompanhado e monitorado a qualquer sinal estranho que possa

afetar a sua funcionalidade.

Através deste trabalho, foi possível consolidar as informações dispersas sobre este aterro,

sendo considerado um dos pontos de infraestrutura mais críticos de toda ferrovia sob

concessão da MRS Logística S/A. O estudo embasará futuras intervenções que sejam

necessárias no local, ou mesmo no estudo de aumento do carregamento sobre o maciço.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABNT (2015). Associação Brasileira de Normas Técnicas (2015).

ALMEIDA, M. S. S., Aterro sobre Solos Moles: da Concepção à Avaliação do Desempenho. Editora da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1996.

ALMEIDA, M. S. S. E MARQUES, M. E. S. Aterros Sobre Solos Moles. Projeto e Desempenho. Ed. Oficina de

Textos, São Paulo, 2010.

BARRETO, D. M. Condicionantes Geotécnicos para Projeto de Rodovias. Santa Maria, 2008.

Page 17: O Curso - PATOLOGIAS E SOLUÇÕES EM ATERROS ...O local de estudo (Figura 1) é localizado na Ferrovia do Aço, que tem 354 km, e é um dos trechos mais importantes da malha ferroviária

CAPUTO, H. P. Mecânica dos Solos e Suas Aplicações. Mecânica das Rochas – Fundações – Obras de Terra

Volume 2. Ed. Livros Técnicos e Científicos, 6a edição, Rio de Janeiro, 1987.

DNIT (2015). www.dnit.gov.br. Disponível em: <http://ipr.dnit.gov.br/normas/DNER-PRO381-98.pdf>. Acesso

em: julho 2015.

DYMINSKI, A. S. Obras Geotécnicas. Disponível em: <www.cesec.ufpr.br>. Acesso em: março 2015.

MACCARINI, F. J. Análise da Estabilidade de Aterro Sobre Solos Moles. Santa Maria, 2009.

PCE – PROJETOS CONSULTORIA DE ENGENHARIA (2011). Projetos e Relatórios Aterro km196 Ferrovia

do Aço – MRS Logística S/A., 2011.

PCE – PROJETOS CONSULTORIA DE ENGENHARIA (2012). Projetos e Relatórios Aterro km196 Ferrovia

do Aço – MRS Logística S/A., 2012.

PCE – PROJETOS CONSULTORIA DE ENGENHARIA (2014). Relatórios Aterro km196 Ferrovia do Aço –

MRS Logística S/A., 2014.

Vagner Emanuel da Silva ([email protected])

Especialização de Transporte Ferroviário de Cargas, Instituto Militar de Engenharia