O CONTO FANTÁSTICO COMO PRÁTICA DISCURSIVA · 1 Pós-graduação Lato Sensu em Língua Portuguesa...
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O CONTO FANTÁSTICO COMO PRÁTICA DISCURSIVA DIDATIZADA
Autora: Fátima Crespilhio1
Orientadora: Professora Drª. Elvira Lopes Nascimento2
Resumo
Este artigo apresenta o resultado de pesquisa realizada com alunos do 6º ano do ensino fundamental do Colégio Estadual Maestro Andréa Nuzzi, localizado no município de Cambé. Trata-se de nosso projeto de intervenção pedagógica que passou por várias etapas prévias até chegar à implantação de uma sequência didática focalizando um gênero da esfera da criação literária: o conto fantástico. Esse gênero foi escolhido por abordar uma temática envolvente e ao mesmo tempo excitante, em que o sobrenatural e o fantástico atraem o leitor, provocando assim o letramento literário. Essa sequência foi organizada em 10 módulos com propostas de atividades articuladas aos diferentes níveis de análise propostos pelo interacionismo sociodiscursivo que tem como objetivo investigar práticas discursivas e sociais em contextos específicos, materializadas em gêneros textuais. Nessa perspectiva, defendemos que o desenvolvimento das capacidades de linguagem mediadas pelos gêneros textuais constitui o cerne do trabalho didático e contribui para a melhoria da qualidade do ensino de Língua Materna na educação básica da escola pública do Paraná.
Palavras-Chave: gênero textual; conto fantástico; sequência didática; letramento
literário.
1. INTRODUÇÃO
O papel da escola é preparar o estudante para que ele possa atuar de
forma ativa e crítica na sociedade. É no ambiente escolar que o aluno encontra
espaço para as práticas de linguagem que lhe possibilitem interagir na sociedade
e nas mais diferentes circunstâncias de uso da língua.
Nesta perspectiva, torna-se evidente a importância de trabalhar com as
práticas discursivas sociais, através dos gêneros textuais/discursivos, que nos 1 Pós-graduação Lato Sensu em Língua Portuguesa pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Pós-
graduação Lato Sensu em Administração, Supervisão e Orientação Educacional pela Universidade Norte do Paraná (Unopar). Graduação em Letras pela Faculdade de Ciências Letras e Educação de Presidente Prudente (Faclepp). Professora do Colégio Estadual Maestro Andréa Nuzzi. 2 Doutorado em Filologia e Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP). Mestrado em Filologia
e Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP).Graduação em Letras Anglo Portuguesas pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Docente Associada da Universidade Estadual de Londrina (UEL).
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permitem essa interação social, tomando por base as proposições do
interacionismo sociodiscursivo proposto por Bronckart (2006).
De acordo com as Diretrizes Educacionais do Paraná (DCE), o ensino-
aprendizagem de língua portuguesa visa aprimorar os conhecimentos linguísticos
e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender e produzir
discursos nas diferentes situações da vida social. Pensar o ensino-aprendizagem
tendo como foco as práticas discursivas sociais materializadas através dos
gêneros do discurso implica fomentar no espaço escolar “por meio de uma gama
de textos com diferentes funções sociais, o letramento do aluno, para que ele se
envolva nas práticas de uso da língua – sejam de leitura, oralidade e escrita.”
(DIRETRIZES, 2008, p.50).
Segundo Bronckart (2003, p.103), “a apropriação dos gêneros é um
mecanismo fundamental de socialização, de inserção prática nas atividades
comunicativas humanas”. Então, cabe a nós, professores de língua portuguesa,
confrontarmos nosso aluno com gêneros das mais variadas esferas sociais,
propiciando leituras e práticas discursivas que possibilitem, além da escrita e da
fala, o contato com outras linguagens (multiletramentos). Conforme Soares, (apud
DIRETRIZES, p.51), a leitura dessas múltiplas linguagens, realizadas com
propriedade garante o envolvimento do sujeito com as práticas discursivas
alterando “seu estado ou condição em aspectos sociais, psíquicos, políticos,
cognitivos, linguísticos e até mesmo econômicos”.
Para promover os múltiplos letramentos que é o objetivo maior deste
estudo, optei pelo gênero textual/discursivo do narrar ficcional configurado nos
“contos fantásticos”. Vários fatores contribuíram para escolha desse gênero, mas
o que mais influenciou foi o público para o qual o projeto foi destinado (6º ano).
Levando em conta a faixa etária desses alunos, algumas hipóteses foram
levantadas com relação à aceitação. Primeiro, porque o conto é uma narrativa
literária breve, que, como afirma Gotlib (1990, p.33), lê-se “de um só fôlego”.
Segundo, porque as narrativas ficcionais apresentam uma sequência de ações
imaginárias como se fossem reais, envolvendo personagens em um determinado
tempo e espaço, e que por isso atraem a atenção do leitor. E, por fim, porque a
presença do elemento sobrenatural no conto fantástico traz um clima de mistério,
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suspense e medo, provocando efeito estimulante no leitor, ou seja, prendendo o
nosso aluno às atividades de leitura.
A partir deste gênero foram desenvolvidas práticas discursivas que
envolveram os quatro eixos que fundamentam o ensino de língua portuguesa:
oralidade, leitura, escrita e análise linguística.
A prática discursiva mais utilizada pela maioria das pessoas é a fala,
portanto, cabe ao professor de língua portuguesa desenvolver atividades orais em
sala de aula que ofereçam possibilidades ao aluno de falar com fluência em
situações formais; adequar a linguagem conforme as circunstâncias
(interlocutores, assuntos, intenções); aproveitar a infinidade de recursos
expressivos de que dispõe a língua e, principalmente, “praticar e aprender a
convivência democrática que supõe o falar e o ouvir”. (DIRETRIZES, p.65).
Para compreender o funcionamento de um texto escrito, o aluno precisa
conhecer os elementos que o compõem, tais como organização, unidade
temática, coerência, coesão, intenções, interlocutor(es), situação de produção, e
outros. Por isso a prática da escrita, como propõe as Diretrizes, requer
planejamento tanto do professor quanto do aluno do que será produzido;
ampliação das leituras sobre a temática proposta; leitura dos textos do gênero
solicitado para a escrita, a fim de melhor compreender a esfera social em que
este circula; delimitar o tema; definir o objetivo e a intenção; prever os possíveis
interlocutores; refletir sobre a situação em que o texto irá circular e organizar as
idéias.
A leitura deve propiciar ao aluno o desenvolvimento de uma atitude crítica
que o leve a perceber o sujeito presente nos textos e, ainda, tomar uma atitude
responsiva diante deles. Neste desafio, a tarefa do professor é atuar como
mediador, provocando os alunos a realizarem leituras significativas e que atraiam
o interesse dos mesmos. Conforme as Diretrizes (p. 71), “Somente uma leitura
aprofundada, em que o aluno é capaz de enxergar os implícitos, permite que ele
depreenda as reais intenções que cada texto traz.”
Entender as estruturas de uma língua é fundamental, faz parte do
letramento escolar. A análise linguística é uma prática didática que complementa
as práticas de leitura, oralidade e escrita e por isso é necessária no processo de
ensino-aprendizagem das práticas discursivas sociais.
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Neste projeto, essas práticas discursivas foram desenvolvidas por meio
das ferramentas denominadas modelo didático de gênero textual e sequência
didática formuladas pelos pesquisadores do grupo de Genebra/Suíça, DOLZ E
SCHNEUWLY e defendidas por vários pesquisadores aqui do Brasil
(NASCIMENTO, HILA, SAITO, GONÇALVES e outros).
1.1 Por que trabalhar com Sequência Didática
A apatia e a indisciplina, que cada vez mais se instalam na sala de aula,
especialmente nas escolas da rede pública, tem sido tema de muitas discussões
não só no âmbito da escola como também no campo da pesquisa em busca de
novas metodologias e práticas inovadoras que possam contribuir para despertar o
interesse do aluno pelas atividades escolares, “porém ainda sem repercussões
significativas nas escolas” (HILA, 2009).
Com isso, muitas de nossas crianças estão se perdendo no processo já
nas séries iniciais e chegam ao 6º ano sem adquirir domínio efetivo da leitura e da
escrita nas diferentes esferas da vida social, tornando-se um alfabetizado
funcional (NASCIMENTO; ZIRONDI, 2009).
Basta conferir os resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica) “para percebermos que a formação de leitores críticos, em
especial, na rede pública, tem passado ainda longe das escolas” (HILA, 2009).
Essa falta de interesse por parte do estudante é, muitas vezes atribuída a
fatores de ordem familiar, social, emocional, ou, ainda, pelo fato da escola não
desenvolver práticas que aproximem o estudante de seu universo de preferências
que nem sempre está ligado à escola, como jogos, cinema, música, internet, entre
outros, embora sejam pertinentes ao contexto escolar porque promovem a
interação social.
De acordo com Nascimento (2009), o mundo ao qual estamos inseridos
necessita de leitores não apenas de textos verbais, mas de textos que
apresentam uma diversidade de linguagem (verbal, visual, audiovisual, gestual).
A autora ressalta que:
o bom leitor é aquele que consegue dar sentido às múltiplas formas de linguagem, e o grande desafio do professor de língua portuguesa é
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oferecer aos alunos a oportunidade de se apropriarem dos mais variados gêneros textuais de modo a ampliar os multiletramentos. (NASCIMENTO, op. cit).
Dessa forma, não é possível dar aulas recorrendo somente ao livro
didático, ao quadro de giz e à linguagem oral como instrumentos no processo de
mediação das atividades didáticas (NASCIMENTO, op. cit). Estes recursos não
mais dão conta de atender às exigências da nova realidade no processo de
ensino-aprendizagem.
Diante de todos esses problemas vivenciado por nós, professores, no
cotidiano da escola, vi a necessidade de contribuir para mudar esse cenário de
apatia, indisciplina e baixo nível de aprendizagem buscando novas ferramentas
didáticas que possibilitassem inovar nossas práticas em sala de aula.
Portanto, este artigo tem por objetivo apresentar passo a passo como essa
sequência didática foi desenvolvida em sala de aula, bem como os resultados
obtidos com os alunos.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 O gênero como objeto de ensino
A base de todo o processo de ensino-aprendizagem da Língua Materna
está pautada no trabalho com gêneros textuais. Conforme as Diretrizes
Curriculares da Educação Básica, a dimensão dada pelo Conteúdo Estruturante
de Língua Portuguesa é que a língua seja trabalhada, em sala de aula, a partir da
linguagem em uso e por meio dos gêneros discursivos que circulam nas diversas
esferas sociais. Este é um dos principais motivos pelo qual se faz necessário
trabalhar com gênero. Como afirma Dolz & Schneuwly (1997), é por intermédio
dos gêneros que se dá “articulação entre as práticas sociais e os objetos
escolares, mais particularmente, no domínio do ensino da produção de textos
orais e escritos”. Para eles, o gênero constitui-se num “megainstrumento” de
aprendizagem.
Rojo (1999) assegura que “os gêneros do discurso são uma poderosa
ferramenta de ensino aprendizagem de língua.” Hila e Nascimento (2009)
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apontam os gêneros textuais como objetos de ensino e, por isso as atividades de
linguagem devem estar voltadas para as “formações sociais, práticas, situadas
em um dado contexto sócio-histórico” e acrescentam que, entre outros motivos, o
ensino através do gênero é mais atraente do que o ensino construído pela
gramática descontextualizada. Para as autoras “o gênero responde de maneira
mais adequada às questões relacionadas aos diferentes usos da linguagem e sua
interface com o exercício da cidadania”.
Para Bakhtin (1997, p.282) “a riqueza e a variedade dos gêneros são infinitas”,
e que o estudo dessa variedade é indispensável em qualquer área. De acordo
com o autor:
Ignorar a natureza do enunciado e as particularidades de gênero que assinalam a variedade do discurso em qualquer área do estudo linguístico leva ao formalismo e à abstração, desvirtua a historicidade do estudo, enfraquece o vínculo existente entre a língua e a vida. A língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua.
2.2 O que são gêneros do discurso
O conceito de gêneros do discurso tem sua origem em Bakhtin (1997), que
os define como sendo “tipos relativamente estáveis de enunciados, presentes em
cada esfera da atividade humana e sócio-historicamente construídos”. Para ele a
língua é utilizada em forma de enunciados orais ou escritos que marcam, através
dos seus recursos (conteúdo temático e estilo) e, principalmente, pela sua
construção composicional, as especificidades e as finalidades de cada esfera da
atividade humana. A esses enunciados concretos o autor denomina de gêneros
do discurso que, na perspectiva do interacionismo sociodiscursivo são
denominados gêneros textuais, reservando o uso do termo “tipo de discurso” para
os segmentos que constituem os textos (discurso do Narrar e discurso do Expor).
São “fenômenos históricos”, como os caracteriza Marcuschi (2002), constituindo
funções sociais que, segundo o autor, “contribuem para ordenar e estabilizar as
atividades comunicativas do dia-a-dia”.
Nascimento (2009) enfoca a noção de gênero como “instrumento
(socialmente elaborado) que media, representa e materializa a prática de
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linguagem de um enunciador” que se apresenta em forma de um texto que circula
na sociedade.
O gênero é, portanto, um evento comunicativo, que surge “das
necessidades e das atividades socioculturais” (MARCUSCHI, 2002) .
2.3 O gênero do narrar pertencente à esfera da criação literária
Dentre a infinita variedade de gêneros do discurso citada por Bakhtin (op.
cit) encontram-se os gêneros literários que, segundo o autor, foram os gêneros
mais estudados, porém tanto na Antiguidade como na época contemporânea,
esses gêneros sempre foram estudados pelo ângulo artístico-literário de sua
especificidade, das distinções diferenciais intergenéricas (nos limites da
literatura), e não enquanto tipos particulares de enunciados que se diferenciam de
outros tipos de enunciados, com os quais têm em comum a natureza verbal.
Os gêneros literários pertencem à ordem do narrar ficcional e, de acordo
com a definição de Massaud Moisés (1967), o gênero narrativo se apresenta
como “formas em prosa” que tem como elementos a ação, as personagens, o
tempo, o espaço, a trama, a estrutura, o drama, a linguagem, o leitor, a
sociedade, os planos narrativos entre outros. Para o autor, embora esses
elementos sejam comuns a todas as formas em prosa (romance, novela, conto,
crônica, etc.), “uma vez que se movem no mesmo território – a prosa de ficção –
há distinção entre elas com relação a densidade, intensidade e arranjo dos
componentes”.
Para Fiorin; Savioli (1996), a narrativa se estrutura no narrador, nas
personagens, no espaço, no tempo e na narração. Com relação ao narrador, os
autores esclarecem que este é quem conta a história e não quem a escreve. Ele
pode estar explícito (um eu que fala no texto) ou implícito (não participa dos
acontecimentos) num texto e assume várias funções tais como relatar a história,
marcar as articulações, as conexões, as inter-relações da história, a de organizar
o texto, a de atestar a veracidade dos fatos, a de avaliar o ponto de vista de uma
visão de mundo expressa no texto (ideologia), a de povoar a história de
personagens e, também, criar os espaços para que elas possam se mover e o
tempo em que se situam os episódios.
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Narração, de acordo com Fiorin; Savioli (op.cit) é o texto que “opera com
personagens, situações, tempos e espaços bem determinados, trabalha
predominantemente com termos concretos, sendo, portanto, um texto figurativo”.
Os gêneros da esfera literária mais explorados no processo de ensino-
aprendizagem são romances, novelas, fábulas, contos e crônicas, porém, neste
projeto o enfoque é o conto fantástico. Das especificidades desse gênero, falarei
mais adiante.
2.4 O Interacionismo Sociodiscursivo: Uma proposta de análise
O interacionismo sociodiscursivo (ISD) proposto por Bronckart (2003)
apresenta uma análise de gêneros textuais em dois planos, o primeiro trata-se da
análise do contexto de produção que o autor define como “parâmetros da situação
de ação”, que apontam as propriedades de dois mundos: o mundo físico e o
mundo social e subjetivo que podem influenciar sobre a produção de um texto.
Neste plano, pensando na análise de um texto do gênero do narrar
analisamos primeiramente os quatro parâmetros do mundo físico estabelecidos
por Bronckart (2003, p.93):
1) O lugar de produção: numa narrativa, refere-se ao lugar onde se situa o
texto, ou seja, o “suporte textual”
2) O momento de produção: refere-se ao tempo utilizado para a
realização da produção;
3) O emissor: quem produziu o texto, ou seja, o autor ou escritor da
narrativa;
4) O receptor: quem, concretamente, pode receber ou recebe o texto.
Ainda no plano do contexto de produção, Bronckart estabelece quatro
parâmetros do mundo sociossubjetivo:
1) O lugar social: em que forma de interação comunicativa ocorreu a
produção, ou seja, o local social de onde fala/escreve o enunciador,
(escola, mídia, etc.);
2) A posição social do emissor: que papel social exerce o enunciador
(aluno, professor, escritor, etc.);
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3) A posição social do receptor: a que destinatário o texto foi
provavelmente produzido, que papel social ele exerce, (aluno,
professor, etc);
4) Objetivo(s) da interação: que efeitos o enunciador queria produzir no
destinatário.
Convém ressaltar que, embora o contexto físico seja importante porque dá
origem ao texto, é o contexto sociossubjetivo que promove a interação
comunicativa..
No segundo plano, Bronckart (2003) propõe uma análise da organização
da arquitetura interna dos textos que se concentra na análise do folhado textual:
a) infraestrutura global do texto (plano geral/global do texto, tipos de
discurso, sequências);
b) mecanismos de textualização (conexão, coesão nominal e verbal);
c) mecanismos enunciativos (modalizações e vozes presentes no texto).
Para analisar o folhado textual (BRONCKART, 2003) de um segmento
narrativo, começamos pelo primeiro nível:
1) Infraestrutura geral do texto: composta pelo plano global dos conteúdos
temáticos, pelos tipos de discurso e pelas sequências. O plano global
dos conteúdos temáticos corresponde aos conteúdos que aparecem no
texto, como se fosse um resumo do texto. Já os tipos de discurso
podem ser definidos como configurações particulares de unidades e de
estruturas linguísticas em número limitado: Expor e Narrar. Os tipos de
sequências “designam os modos de planificação de linguagem, que se
desenvolvem no plano geral de texto”, na sequência narrativa referem-
se à organização sustentada por um processo de intrigas e apresenta
as seguintes fases: situação inicial, complicação, ações, resolução,
situação final + avaliação e moral.
2) Mecanismos de textualização: caracterizado pela coerência e pela
coesão. A primeira diz respeito às relações entre os níveis de
organização de um texto e é explicitada pelos organizadores textuais
(conjunções, advérbios ou locuções adverbiais, grupos preposicionais,
grupos nominais e segmentos de frases), responsáveis pela conexão
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das ideias do texto. A segunda pode ser dividida em coesão nominal,
que de um lado cumpre o papel de tema e/ou personagens novos no
texto e, de outro a de assegurar sua retomada ou substituição
(retomadas nominais e pronominais, ou anáforas e catáforas) e verbal,
que na narrativa predomina o pretérito perfeito e imperfeito (tempos e
modos verbais).
3) Mecanismos enunciativos: contribuem para a clarificação da coerência
pragmática (ou interativa) do texto; para o esclarecimento dos
posicionamentos enunciativos que se referem às vozes que se
expressam no texto. Essas vozes, de acordo com Bronckart ( 2003),
podem se reagrupar em três subconjuntos:
a) a voz do autor empírico;
b) as vozes sociais, ou seja, de pessoas ou instituições humanas que não
fazem parte do conteúdo temático do texto;
c) as vozes das personagens, ou seja, de pessoas ou instituições que
estão diretamente envolvidas com o conteúdo temático do texto.
Ainda nesse nível, pode-se analisar a questão das modalizações,
responsáveis pelas diversas avaliações do enunciador sobre alguns aspectos do
conteúdo temático e que podem ser divididas, segundo Bronckart (2003) em
lógicas (enunciados verdadeiros, possíveis, prováveis, improváveis); deônticas
(fatos enunciados socialmente permitidos, proibidos, necessários, desejáveis,
etc.); apreciativas e pragmáticas. Estas últimas envolvem as avaliações subjetivas
(intencionalidade; enunciados positivos, negativos, estranhos, etc.) na visão da
instância que faz a apreciação.
Considerando essa proposta de análise em todos os níveis, vale esclarecer
que para o ISD, as práticas de linguagem são o maior instrumento para o
desenvolvimento humano.
2.5 A importância do modelo didático de gênero
O modelo didático é uma proposta do ISD, desenvolvida pelo grupo de
Genebra que busca “abarcar a questão da análise e descrição de gêneros
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textuais, tendo em vista a construção de materiais didáticos” que auxiliem no
trabalho do professor e favoreça o ensino-aprendizagem da língua materna
(NASCIMENTO; GONÇALVES; SAITO, 2009, p.4).
Portanto, para ensinar a língua por meio de gênero textual (GONÇALVES,
2009) é necessário, em primeiro lugar, buscar as dimensões ensináveis do
gênero a ser estudado, fazer um mapeamento das capacidades de ação,
discursivas e linguístico-discursivas dos alunos envolvidos no processo de
transposição didática, e, a partir daí, elaborar um modelo didático do gênero que,
segundo a autora, “se constitui num programa que vai nortear as ações do
docente em sala de aula”.
Dolz & Schneuwly (apud GONÇALVES, 2009, p.227) expõem que o
modelo didático “constitui uma síntese com objetivo prático, destinada a orientar
as intervenções dos professores; ele evidencia as dimensões ensináveis com
base nas quais diversas sequências didáticas podem ser concebidas”.
O modelo didático é, portanto, uma “ferramenta preliminar" e de grande
importância para o processo de didatização do gênero, ou seja, é o ponto de
partida para ensinar um objeto de estudo, neste caso, gênero textual configurado
no discurso do narrar ficcional, o conto fantástico.
2.5.1 O modelo didático de gênero conto fantástico
Com o intuito de fisgar o meu aluno-leitor – público alvo deste projeto – é
que busquei uma temática envolvente - e ao mesmo tempo excitante - para
desenvolver um projeto pedagógico em sala de aula. Com esse objetivo didático,
o foco do trabalho passou a ser o conto fantástico, um gênero de narrativa literária
em que o sobrenatural e o fantástico atraem o leitor, provocando o letramento
literário que, segundo as Orientações Curriculares para o Ensino Fundamental e
Médio (2009, p.55), “ é o estado ou condição de quem não apenas sabe ler e
escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita”.
Entretanto, para a transposição didática dos contos fantásticos considerado
aqui como um gênero textual da esfera da criação literária, é crucial que o
professor fundamente o planejamento das atividades didáticas nas regularidades
do gênero, ou seja, ao mesmo tempo que dele se apropria por conhecê-lo, o
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professor seleciona os objetos de ensino que são pertinentes para o contexto
escolar em que será realizada a transposição didática.
Segundo Nascimento (2008), o “modelo didático” (MD) tem o propósito
definido de subsidiar o trabalho docente e favorecer o ensino/aprendizagem na
compreensão/produção de textos. Segundo Dolz & Schneuwly (2004), o modelo
didático do gênero aponta as regularidades do funcionamento dos gêneros que
serão postos em prática em sala de aula. Segundo os autores, o MD deve ter as
seguintes características: a) uma dimensão prática; b) uma força normativa (da
qual, segundo os autores, é impossível fugir); c) é o centro do processo de todo
ensino e posterior aprendizagem; d) é o ponto de início e o ponto de chegada do
trabalho a ser realizado; e)permite, a partir das práticas sociais referenciais,
produzir sequências didáticas; f) é o lugar de reflexões e práticas pedagógicas.
O modelo didático a seguir apresentará as características gerais do gênero
conto fantástico que será alvo de transposição nas aulas de língua portuguesa.
E quais seriam as características desse tipo de narrativa? Em primeiro
lugar vamos falar do conto.
2.5.2 O que dizem os especialistas sobre o gênero conto
O conto é um gênero da esfera da criação literária (BAKHTIN, 1997) que
apresenta especificidades ambíguas para a sua descrição. No dicionário Aurélio
online o verbete “conto” é definido como “gênero de prosa de ficção. / Narrativa
folclórica. / História mentirosa. / Historieta, estória, narrativa; conto popular. Conto
(ou história) da carochinha, lenda ou conto popular para crianças”. Em Coelho
consta que o verbete vem do latim:
“comentum, in. (invenção, ficção, plano, projecto), ligado ao v. contueor, eris (olhar atentamente para, contemplar, ver, divisar). Narração oral ou escrita (verdadeira ou fabulosa); obra literária de ficção, narração sintética e monocrónica de um fato da vida”. (apud E-DICIONÁRIO DE TERMOS LITERÁRIOS).
Muitos autores atentam para a dificuldade de se explicar as
características dos gêneros enquadrados na família dos “contos”, uma vez que
todos eles apresentam, na essência, a capacidade de narrar, de maneira sucinta,
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um evento em que o foco central é um conflito que pode ou não ser resolvido ao
final. De acordo com Gotlib (1990, p.15), o conto conserva características da
fábula e da parábola pela economia de estilo e pela situação e proposição
temática resumida.
Edgar Allan Poe (1959) também se refere a essa característica dos
contos: a brevidade. Mas o autor acrescenta a intensidade, conseguida através da
brevidade e da unidade.
Para Coelho (op. cit), o conto se caracteriza formalmente desde suas
origens, pela brevidade. A autora o define como uma narrativa curta e linear,
envolvendo poucas personagens; concentrada em uma única ação, de curta
duração temporal e situada num só espaço. Dessa necessidade de brevidade,
deriva a grande arte do conto que, mais que qualquer outro gênero em prosa,
exige que o escritor seja um verdadeiro alquimista na manipulação da palavra.
Bronckart (2003, p.118; 119) expõe que todo conto apresenta um conjunto
de segmentos dominantes em que se narra uma sucessão de acontecimentos a
partir de uma origem temporal, de um lugar e de personagens que dialogam, que
acabam com um desfecho, formando, portanto uma história. O que ocorre,
segundo o autor é que apenas essas características não dão conta de diferenciar
o conto de outros gêneros do narrar, para tanto, convém fazer “uma análise mais
apurada da organização interna do texto”. Uma análise que não fique apenas no
que é fornecido pela leitura e dos índices paralinguísticos disponíveis, mas que
deve basear-se “nas hipóteses, nos conceitos e nos métodos que as ciências da
linguagem elaboraram até hoje, a partir do exame comparativo das múltiplas
espécies de textos existentes”.
2.5.3 O conto fantástico
Furtado (1980), referindo-se ao conto fantástico, relata que ele se
desenvolveu ao longo do século XIX, num cenário sociocultural desfavorável a
ele, tendo de contar com a ascensão do progresso científico, do positivismo e do
materialismo filosófico.
No século XX a narrativa fantástica passa por transformações e essas
transformações, de acordo com Barine (apud RODRIGUES,1988, p. 17), têm
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origem, provavelmente na ciência. Para o autor, “a ciência é não só a grande
aliada do escritor fantástico como também a grande inspiradora”.
Levando em conta seu contexto histórico, o conto fantástico é
considerado um gênero novo, com marcas peculiares. Essas marcas estão
ligadas essencialmente ao sobrenatural cuja temática abordada remete à ideia
aparente de fenômenos racionalmente inexplicáveis.
Um dos elementos básicos para a caracterização desse gênero é a
ambiguidade, resultado da hesitação (tanto da personagem quanto do leitor)
diante de um fenômeno. Sobre essa hesitação gerada no conto fantástico,
Todorov explica:
...o fantástico se fundamenta essencialmente numa hesitação do leitor – um leitor que se identifica com a personagem principal – quanto à natureza de um acontecimento estranho. Esta hesitação pode se resolver seja porque se admite que o acontecimento pertence à realidade; seja porque se decide que é fruto da imaginação ou resultado de uma ilusão; em outros termos, pode-se decidir se o acontecimento é ou não é. (TODOROV,1975, p.165-166).
Outro elemento importante no fantástico é a atmosfera física. Sobre isso
Lovercraft confirma que:
A atmosfera é a coisa mais importante, pois o critério definitivo de autenticidade (do fantástico) não é a estrutura da intriga, mas a criação de uma impressão específica. (...). Eis por que devemos julgar o conto fantástico não tanto em relação às intenções do autor e aos mecanismos da intriga, mas em função da intensidade emocional que ele provoca (1945, apud TODOROV, 2007, p. 40).
Essa intensidade emocional de que fala Lovercraft, provocada por essas
histórias é, certamente, o fator responsável por despertar no leitor o interesse por
tal gênero.
2.6 O corpus em análise
A análise de um gênero de texto que aponte as suas características
principais passa por várias etapas. Para isso, contamos com um corpus de textos
do gênero que foram escolhidos levando em consideração os alunos para os
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quais se destina o projeto didático. Para essa análise os textos selecionados
foram:
Texto A: “As formigas” de Lygia Fagundes Telles
Texto B: “A vingança da casa” de José Cláudio da Silva
Texto C: “Prisão” de Ambrose Bierce
O estudo minucioso destes contos contribuiu para identificar algumas
marcas que lhes são próprias e que os caracterizam como tal. Partindo da
proposta de análise de textos do interacionismo sociodiscursivo (Bronckart, 2003),
apresentaremos as principais marcas identificadas nos textos.
a) O contexto de produção:
Dos três contos selecionados para esta análise, os dois primeiros,
textos A e B foram extraídos de livros com coletânea de contos do
próprio autor e o texto C da antologia Os 100 melhores contos de crime
e mistério da literatura universal.
Quanto à esfera de comunicação: os contos emergem da esfera da
criação literária. Trata-se, portanto, de um gênero escrito, da ordem do
narrar ficcional, como às demais narrativas ficcionais, apresentam uma
intriga no domínio do verossímil, do imaginário, do ficcional.
Quanto ao autor/produtor/enunciador: foi produzido por um enunciador
letrado (escritor/contista), com objetivo econômico-cultural, ou seja, de
publicar a obra para fins lucrativos e ao mesmo tempo levar cultura e
fruição ao destinatário.
O conto fantástico tem maior circulação em livros impressos e internet.
Quanto aos destinatários/leitores: os leitores se interessam por
narrativas curtas e intensas, que mexam com a emoção, mas é também
um gênero escolar muito utilizado nas escolas no processo de ensino-
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aprendizagem de leitura, portanto é um gênero não só destinado ao
entretenimento, mas, sobretudo para fins pedagógicos.
A temática é de caráter fantástico, envolvendo mistério e terror, busca
despertar no destinatário emoções fortes e perturbadoras tais como
medo, angústia, aversão, estranhamento, encanto, surpresa, dúvida,
incômodo diante das situações narradas rodeadas de tensão e
suspense com a presença do sobrenatural quase sempre maléfico.
Nesse tipo de narrativa, nem sempre há um final previsível, o
enunciador, muitas vezes, cria um clima de mistério que não é
explicado, deixando o desfecho por conta da imaginação do
destinatário.
b) A arquitetura interna dos textos
Quanto ao plano textual global: os textos se apresentam com título (em
caixa alta) e corpo do texto (em C há o nome do autor logo abaixo do
título e do tradutor ao final do texto)
Quanto ao tipo de discurso: nos contos predomina o discurso do Narrar
ficcional, em disjunção com o mundo real da ação de linguagem e em
autonomia quanto ao ato de produção, ou seja, não apresenta dêiticos
que remetem para o mundo real (de pessoa, de lugar ou de tempo).
Para que o leitor compreenda o tempo da narrativa e o espaço em que
acontecem os fatos narrados, não leva em consideração o tempo e o
espaço da ação de linguagem do produtor. Tudo é ficcional: o tempo, o
espaço, as personagens, os fatos relatados.
Presença de discurso direto: marcado por parágrafo e travessão.
Foco da narrativa: os contos se apresentam em diferentes focos do
narrador. O texto A o narrador se apresenta como personagem, ou seja,
a narrativa está em primeira pessoa. Há presença de diálogo entre o
17
personagem-narrador e as outras personagens. O discurso direto é
predominante no texto A. Os outros dois, B e C, são marcados pelo
discurso indireto. Há somente a presença do narrador, e os
acontecimentos são narrados em terceira pessoa.
Quanto ao tipo de sequência predominante: é a sequencia narrativa. De
acordo com Bronckart (2003, p. 120-121), a sequência narrativa é
sustentada por um processo de intriga que consiste em selecionar e
organizar os acontecimentos (início, meio e fim) formando um todo.
Esse processo de seleção e organização dos acontecimentos
apresenta-se em cinco fases principais cuja ordem de sucessão é
obrigatória:
1) Situação inicial: apresenta um “estado de coisas” em equilíbrio que
será introduzido nele uma perturbação;
2) Complicação: a presença da perturbação desencadeia um estado de
tensão;
3) Ações: consiste em reunir os acontecimentos desencadeados por
essa perturbação;
4) Resolução: introdução de acontecimentos que reduzem
efetivamente a tensão;
5) Situação final: apresenta um novo estado de equilíbrio obtido pela
resolução.
A essas cinco fases, Bronckart (op. cit), acrescenta mais duas sem
obrigatoriedade na ordem de sucessão:
1) Avaliação: propõe comentário sobre o desenrolar da história e sua
posição na sequência é totalmente livre.
2) Moral: explicita o significado global da história e aparece,
normalmente, no início ou no final da sequência.
Presença de sequências descritivas dialogando com as sequências
narrativas. A sequência descritiva compõe-se de três fases e não seguem
uma ordem linear obrigatória. Essas fases são agrupadas e inseridas em
uma ordem hierárquica ou vertical:
18
1) Fase de ancoragem: em que o tema da descrição é marcado com mais
frequência por um tema-título. Quando esse tema-título ocorre no início
da sequência, dá-se a ancoragem propriamente dita, se aparecer no
final da sequência dá-se a afetação. Há casos em que aparece no curso
da sequência e é retomado posteriormente, assim dá-se a
reformulação;
2) Fase de aspectualização: em que os diversos aspectos do tema-título
são enumerados, assim o tema é dividido em partes, às quais são
atribuídas propriedades;
3) Fase de relacionamento: em que os elementos descritos são
assimilados a outros por meio de comparação metafórica.
O quadro abaixo aponta alguns exemplos de sequência descritiva
encontradas nos contos em estudo:
FA
SE
S
ANCORAGEM: ASPECTUALIZAÇÃO RELACIONAMENTO
TE
XT
O A
“No sonho, um anão louro de
colete xadrez e cabelo
repartido no meio entrou no
quarto fumando charuto.”
“Duas camas, dois armários
e uma cadeira de palhinha
pintada de dourado”.
“A dona era uma velha
balofa, de peruca mais
negra do que a asa da
graúna”.
TE
XT
O B
“O bairro da Lapa é tranquilo.
Possui muitas ruas
arborizadas onde os
moradores caminham
tranquilamente. Numa
dessas ruas, sem saída,
morava um casal de velhos
aposentados”.
“A casa tem três quartos,
sala, cozinha, dois
banheiros, um quintal no
fundo e um jardim na frente,
onde cultivam rosas”.
“Os rapazes cortaram
várias vezes a planta,
arrancaram pela raiz, mas
ela sempre ressurgia, cada
vez mais forte. Uma flor
fênix.”
19
TE
XT
O C
“A noite estava escura, não
havendo lua ou estrelas, e
como Brower nunca andara
por aquelas redondezas,
desconhecendo a região,
claro que logo estava
perdido”.
“Dirigiu-se à entrada
principal, tocou a maçaneta
pesada da porta de ferro,
empurrou-a sem que
ninguém lhe mandasse,
entrou e se viu na presença
de meia dúzia de homens
armados”.
“O captor era Burton Duff,
pálido como a morte,
trazendo ainda na fronte a
marca vívida da barra de
ferro”.
A sequência dialogal está presente somente no texto A. Esse tipo de
sequência, de acordo com Bronckart (op. cit.), concretiza-se somente
nos segmentos de discursos interativos dialogados e são estruturados
em turnos de fala que podem ocorrer por meio de discursos interativos
primários, ou seja, a interação verbal entre os agentes-produtores ou
por meio de discursos interativos secundários, que são atribuídos a
personagens postos em cena. Esta sequência está organizada em três
fases gerais:
1) Fase de abertura: de caráter fático, quando os interactantes entram
em contato;
2) Fase transicional: o conteúdo temático da interação verbal é co-
construído;
3) Fase do encerramento: também fática, põe fim na interação de
forma explícita.
c) Mecanismos de textualização
Quanto à conexão: nos três textos os organizadores predominantes são
advérbios que marcam o tempo e o espaço (Quando..., quase noite..., lá
embaixo..., já estão..., sempre..., nunca..., aqui..., logo..., longe..., etc.).
São organizadores que contribuem para a articulação entre as frases da
sequência narrativa.
Quanto à coesão nominal: a estratégia mais usada nas retomadas
textuais, nos três textos, são realizadas por meio de nomes, pronomes
20
e repetições. No texto A: por nomes (a dona, a mulher, a bruxa), por
pronomes (ela, nos, neles, ele, a, as, lhe, dela, etc.); no texto B: por
meio de pronomes (eles, os, nenhum, sua, etc.), por repetições (casal,
velhos, jovens, casa, etc.) e por numerais (ambos, os dois, um); no
texto C: por pronomes (lhe, as, isso, seus, seu, o outro, ele, eles, etc.).
Quanto à coesão verbal: os tempos verbais dominantes são o pretérito
imperfeito e perfeito. O enunciador inicia a narrativa com o imperfeito
(com algumas ocorrências do mais-que-perfeito no início do texto C) e
quando começa a complicação ocorre a mudança para o perfeito e
presente nas sequências dialogais. Prevalecem os verbos de ação.
d) Mecanismos enunciativos
A voz predominante nos textos é a do narrador, sendo que no texto A
ocorre diálogo (discurso direto) entre personagens.
Há, também, a presença de muitos advérbios modalizadores
(pacificamente, pontualmente, ligeiramente, fartamente, nitidamente,
etc.)
A variedade linguística privilegiada nos textos é a norma padrão, com
algumas ocorrências de informalidade e gírias sobretudo nas falas das
personagens. No texto A, na voz da personagem que dialoga com a
personagem narradora, com a presença de expressões coloquiais e
gírias (“É mesmo, a gente vê que já estão formados...” “...é raro à beça
esqueleto de anão.” “Me dá o vidro de álcool.” “...o que essas bandidas
vêm fuçar aqui.” “— Me lembro que botei o crânio em cima da pilha,
me lembro que até calcei ele com as omoplatas ...” “Acordei pra fazer
pipi...”).
Quanto à escolha lexical, os substantivos são, na maioria, concretos.
Há substantivos próprios designando nomes de pessoas e lugares
(Grassmann, Lapa, Canadá, Brower, etc.), substantivos no diminutivo
(caixotinho, dentinhos, ossinhos, etc.).
21
Há ocorrência de adjetivos nos três textos que designam características
de pessoas, objetos e lugares, porém no texto A encontram-se adjetivos
diminutivos, superlativos (miudinhos, raríssimo, rapidíssima, etc.) e
também locuções adjetivas (sofá de palhinha, casal de velhos, crosta de
esmalte, etc.)
Com relação à pontuação, o travessão é uma marca constante no texto
A, utilizado não só para indicar a mudança de interlocutor como
também isolar palavras, frases ou expressões.
Outros sinais de pontuação frequentes neste texto são dois pontos,
ponto de interrogação, reticências, exclamação, além do ponto final e
da vírgula que também são os sinais de pontuação ascendentes dos
textos B e C.
A partir do modelo didático do gênero que será alvo da transposição
didática, passamos ao momento de elaboração do trabalho a ser realizado.Para
isso, o instrumento utilizado para a mediação das atividades foi uma sequência
didática do gênero contos fantásticos.
3. O PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NA ESCOLA
A sequência didática foi organizada em 10 módulos, com propostas de
atividades articuladas a uma prática discursiva da esfera da comunicação da
criação literária. Está norteada pelas Diretrizes Curriculares da Educação Básica
(2008), que se apoiam em concepções teóricas recentes e inovadoras, trazendo a
noção de gênero do discurso/textual como configuração das práticas discursivas
para o primeiro plano nas discussões relacionadas ao processo de ensino-
aprendizagem. O gênero conto fantástico foi escolhido por abordar uma
temática envolvente e ao mesmo tempo excitante, em que o sobrenatural e o
fantástico atraem o leitor, provocando o letramento literário.
O quadro a seguir apresenta os títulos dos contos selecionados, seus
respectivos autores bem como a fonte de publicação pesquisada para este
projeto.
22
TÍTULO AUTOR SUPORTE DE PUBLICAÇÃO
As formigas Lygia Fagundes Telles
Coletânea de contos da autora: Mistérios Ficções
A vingança da casa José Cláudio da Silva
Coletânea de contos do autor: O pacto maldito e outras histórias de morte Disponível no site Domínio Público
Prisão Ambrose Bierce
Antologia organizada por Flávio Moreira da Costa: Os 100 melhores contos de crime e mistério da literatura universal
Os contos citados no quadro acima foram lidos pelos alunos. Todos narram
histórias excepcionais povoadas por elementos que não habitam no mundo real,
por isso são denominados contos fantásticos. A seguir apresento o passo a
passo do trabalho realizado.
O primeiro passo desse trabalho foi apresentar o projeto aos diretores,
equipe pedagógica e corpo docente do Colégio, onde foi feita a exposição do
tema, justificativa, objetivos e procedimentos. Essa apresentação foi realizada
durante a semana pedagógica.
O segundo passo foi iniciar o trabalho com os alunos a partir do segundo
semestre do ano letivo de 2011 e teve duração de aproximadamente três meses.
Neste período os alunos desenvolveram atividades de leitura, produções orais,
produções escritas e análise linguística.
O material utilizado para realização desse trabalho, além dos livros já
mencionados no quadro acima, também foram utilizados textos impressos, slides
com informações verbais e imagens, músicas e filme.
4. DESENVOLVIMENTO DA PROPOSTA
Dos dez módulos que compõem a SD, todos foram desenvolvidos,
cumprindo todas as atividades propostas em cada um, porém, neste artigo
constarão apenas algumas das atividades realizadas em sala de aula.
4.1 Apresentação da situação
23
A proposta de trabalho foi apresentada aos alunos de maneira que eles se
manifestassem diante de questionamentos tais como: Já ouviram falar a palavra
conto? O que significa? Vocês conhecem o significado da palavra fantástico?
A maioria respondeu que conto era uma história, e fantástico significava
fantasia, o que não existe na vida real.
À medida que os alunos foram respondendo, fui anotando na lousa as
definições dadas por eles. A partir desse conhecimento prévio sobre as duas
palavras, incentivei-os a relacioná-las formando a expressão “conto fantástico”,
em seguida, pesquisamos no dicionário os verbetes “conto” e “fantástico” e
formulamos um conceito de conto fantástico. Com esse conceito chegamos ao
entendimento do gênero em estudo. Neste momento abordei um pouco do
contexto histórico com relação ao gênero (quando surgiu; os primeiros autores a
escrever contos com seres sobrenaturais, etc.). Busquei aproximá-los do gênero
falando da temática que geralmente envolve essas histórias, com os seguintes
questionamentos: Já leram ou ouviram histórias que despertaram medo, quais?
Já assistiram a filmes que tenham causado medo, quais? O que, normalmente,
provoca a sensação de medo em vocês?
Informei a eles que os contos que iríamos trabalhar são chamados de
fantásticos porque têm a presença de seres sobrenaturais, ou seja, não
pertencem ao mundo real. São seres imaginários que aparecem somente nas
histórias. Falamos sobre seres sobrenaturais que aparecem em filmes, novelas,
séries e livros. Alguns alunos falaram sobre filmes apavorantes com fantasmas,
vampiros, alienígenas, outros contaram histórias (causos) de pessoas que já
viram seres sobrenaturais.
Nesta fase, foi possível constatar que eles não conseguiam interagir com
organização. Todos queriam falar ao mesmo tempo. Foi necessário estabelecer
um tempo para cada um. Foi um momento difícil e ao mesmo tempo
enriquecedor, pois oportunizou a verificação de como cada um sabia se
comunicar oralmente, alguns alunos não conseguiam se expressar, faltavam
palavras para completar o pensamento.
Feita essa aproximação com o gênero por meio da oralidade, organizei o
ambiente (penumbra, efeitos sonoros, etc.) para a leitura do conto “AS
24
FORMIGAS” de Lygia Fagundes Telles, em seguida, distribuí os contos para
leitura em sala de aula.
A leitura foi feita primeiramente por mim e em seguida pelos alunos. Neste
momento eles fizeram seu primeiro contato com o gênero escrito.
Apesar de a turma ser bem agitada, todos ouviram em silêncio. Procurei
ler com entonação de suspense, parava em algumas partes e eles falavam:
“Continua, professora!”
Gostaram da história, assimilaram muitas informações na 1ª leitura. Em
seguida, foi exibido na TV pendrive, slides com uma breve biografia da autora e a
capa do livro o qual se encontra o conto “As formigas”.
Antes de iniciar a primeira produção, fizemos uma reflexão sobre as
características do gênero “conto fantástico”, partindo do que eles já sabiam:
a) Como se apresenta o ambiente (espaço) destas histórias? (casas
enormes ou castelos assustadores; quartos mal-assombrados; floresta
sombria; mata fechada; ambiente macabro; clima frio; etc.);
b) Como se dá a apresentação das personagens? (apresentação de um
fato estranho ou de um ser estranho que desencadeia a ação);
c) Como se dá o desenvolvimento da trama? (com criação de um clima de
suspense, de mistério que nem sempre se desvenda no final);
d) Que outras características podemos identificar nestas histórias?
(efeitos sonoros, cores sombrias, isolamento, etc.).
Exibi, na TV pendrive, imagens que provocassem a sensação de medo,
tais como: O Grito (Edvard Munch); noite de lua cheia; casa com aparência
sombria. Exploramos cores, luminosidade, atmosfera, etc.
a) Módulo 1: Produção inicial
Propus aos alunos que criassem uma história com seres fantásticos:
assombração, vampiro, lobisomem ou algum outro ser que provocasse um clima
de mistério. Deixei-os a vontade para escrever como quisessem ou como
soubessem.
Observei que eles não tiveram dificuldades na criação do texto, mas sim
para estruturá-lo. Uns escreveram muito, outros escreveram poucas linhas e
25
completaram a história com desenho. Ao término da produção, recolhi os textos
para fazer as intervenções necessárias.
Após a verificação dos textos as principais dificuldades diagnosticadas na
produção inicial dos alunos encontram-se no quadro a seguir:
Aspectos analisados Dificuldades dos alunos
Org
an
ização
te
xtu
al
(cap
acid
ad
e d
iscu
rsiv
a) Plano textual
Ausência de título; início de parágrafos com letra minúscula; corpo do texto com ausência de parágrafos.
Tipos de discurso
dificuldade em criar o mundo ficcional por meio do discurso do narrar com relação ao tempo e ao espaço e ausência do discurso do descrever.
Foco narrativo e personagens
Presença de dois focos narrativos no mesmo texto; ora em 1ª pessoa, ora em 3ª pessoa; personagens descaracterizadas.
Tipos de sequências Desorganização das fases da sequência narrativa: situação inicial, complicação, ações, resolução, situação final e até ausência de situação final.
Asp
ecto
s
lin
gu
ísti
co
-dis
cu
rsiv
os
(cap
acid
ad
e l
ing
uís
tico
-
dis
cu
rsiv
a)
Conexão textual
Falta de articulação entre as fases da sequência narrativa.
Coesão textual nominal e
verbal
Repetições em excesso; ausência de retomadas por meio de substituições. Desconhecimento dos tempos verbais.
Voz
Predomínio da voz do narrador; ausência do discurso direto e quando há ele se confunde com a voz do narrador.
Modalização
Ausência de advérbios; marcas de oralidades; precariedade na pontuação; uso abusivo de gírias; dificuldades na ortografia.
Constatadas as dificuldades apresentadas pelos alunos, passamos às
atividades elaboradas com o intuito de superar essas dificuldades.
b) Módulo 2: Análise do contexto de produção
Leitura do texto B: “A VINGANÇA DA CASA”, conto de José Cláudio da
Silva. O procedimento foi o mesmo realizado na leitura do texto A. Todos ficaram
atentos a minha leitura. Observei que tiveram maior compreensão do enredo do
que o texto A, talvez por ser menos extenso e ter uma linguagem mais simples,
próxima à linguagem do aluno.
O texto B causou certa inquietação nos alunos. Fizeram vários
comentários a respeito do assassinato do casal de velhos, relacionaram com
26
histórias reais, com filmes que haviam assistido. Enfim, muitas discussões
surgiram a partir do texto. Também foi apresentado slides com a biografia do
autor e a capa do livro. Em seguida, trabalhamos oralmente todo o contexto de
produção com os seguintes questionamentos: onde, normalmente, esse tipo texto
é encontrado? (lugar onde se situa o texto, ou seja, o suporte textual); quem é
emissor? (aquele que produziu o texto, ou seja, o autor ou escritor da narrativa);
quem é o receptor? (aquele que recebe o texto, ou seja, o leitor); para quem o
emissor fala ou escreve, ou seja, com que receptor ele pretende interagir? Que
papel social esse emissor exerce? (de professor, de aluno, de escritor?); E,
vocês, aqui na sala de aula, como receptores, que papel social vocês exercem?
Com que objetivo o emissor escreveu esse texto?
c) Módulo 3: Hora do filme
Foi exibido aos alunos o filme “A casa amaldiçoada”, dirigido por Jan de
Bont.
Durante a exibição do filme, observei que os alunos não se preocupavam
com a história e sim com as ações das personagens, com os efeitos especiais,
com o cenário, com o clima tenso, o que comprova a teoria de Lovercraft (1945,
apud TODOROV, 2007, p. 40), que diz que no gênero fantástico, o mais
importante não é a estrutura da intriga e sim a atmosfera.
A partir das leituras e exibição do filme, realizamos uma atividade oral.
Fizemos uma análise comparativa entre os textos escritos e o filme. Perguntei aos
alunos o que mais chamou a sua atenção, quais cenas causaram maior tensão,
medo. Pedi que falassem das características do ambiente, dos efeitos especiais.
Como eram as personagens, para que público foi produzido e com que intenção.
Terminada a discussão sobre o filme e os contos lidos, procedeu-se a
leitura do texto C: “PRISÃO”, de Ambrose Bierce, da mesma forma como foram
lidos os textos A e B. Embora tenha sido o texto menos extenso, percebi que não
chamou muito a atenção dos alunos, observei que o problema estava na
linguagem do texto, por estar mais distante da linguagem deles. Então, após a
leitura, contei a história de uma forma mais simples para que houvesse maior
compreensão.
27
Depois da apresentação da biografia do autor, falei sobre o contexto de
produção e em seguida realizaram uma atividade escrita, um caça-palavras onde
eles deveriam encontrar a resposta para as seguintes questões:
Atividade:
a) A que gênero pertencem os textos em estudo?
b) Qual a sua esfera social?
c) Que suporte é utilizado para sua circulação?
d) Que posição social os produtores ocupam?
e) Qual é a sua posição social como leitor destes textos?
f) Encontre o primeiro nome dos autores dos textos A, B e C.
g) Nos três textos escritos há a presença de seres ....
h) Por isso são chamados de contos ....
i) Essas histórias tem como principal objetivo despertar ....
j) Essas história não são verdadeiras, pertencem ao mundo da...
d) Módulo 4: Análise da arquitetura interna dos textos
Antes de iniciar as atividades, pedi aos alunos que retornassem aos textos
e numerassem os parágrafos para facilitar os trabalhos. Buscamos reconhecer a
estrutura dos contos. Discuti com eles sobre a organização dos textos desse
gênero com relação a outros gêneros (jornalísticos, HQ, poéticos, etc.), para isso
apresentei slides na TV pendrive com textos pertencentes a outros gêneros para
que meu aluno percebesse a diferença estrutural. Falamos sobre as personagens
e suas ações, identificamos o narrador, o tempo, o espaço, para que eles
conseguissem enteder a organização do enredo e desenvolvessem as atividades
escritas propostas para este módulo que trataram do foco narrativo, das
personagens, do tempo e espaço.
Atividades: sobre o texto B.
1) Que palavras o narrador utiliza para caracterizar:
O bairro: _______________________________________________
28
As ruas: _______________________________________________
O casal:________________________________________________
A casa: ________________________________________________
2) Que características você atribuiria aos jovens?____________________
e) Módulo 5: Tipos de sequência
Para realizar as atividades deste módulo foi necessário mais tempo do que
eu havia previsto. propus atividades que explorassem as sequências narrativas,
descritivas e dialogais dos três contos lidos. Eles precisavam buscar informações
nos textos, fazer interpretações. Para isso era preciso ler várias vezes os textos.
Foram propostas quatro atividades das quais uma se encontra no quadro
abaixo, que tratavam dos tipos de sequências presentes nos contos: sequência
narrativa, descritiva e dialogal.
Atividade: Situe cada parte do enredo do conto A à fase correspondente, em
seguida copie os parágrafos organizando a sequência, formando um resumo:
Situação inicial Complicação Clímax Situação final
A estudante de medicina ficou fascinada quando abriu o caixotinho. Os ossos
eram de um anão, o que era muito raro. Naquela noite um cheiro estranho tomou
conta do quarto e, de repente apareceu uma trilha espessa de formigas que foram
em direção ao caixotinho do anão e depois desapareceram misteriosamente. Na
noite seguinte voltaram a atacar. ____________________
Imediatamente arrumou as malas, acordou sua prima e ambas fugiram antes que
o anão ficasse pronto. ________________________
As estudantes eram primas, uma estudava direito e a outra medicina. No quarto
de pensão onde elas foram morar encontraram um caixotinho com ossos humano
que, segundo a dona da pensão, havia sido esquecido lá pelo antigo inquilino que
também cursava medicina. _______________________
29
As estudantes constataram que os ossos do anão estavam se organizando.Na
outra noite as formigas voltarm. A estudante de medicina viu as formigas
trabalhando dentro do caixotinho e percebeu que o esqueleto estava quase
pronto.___________________________
f) Módulo 6: produção de texto
Esta proposta apresentava a situação inicial e a situação final de um texto,
cabia a eles criar uma complicação que levasse a um clímax e dar um título ao
texto. Pedi que produzissem em duplas.
g) Módulo 7: Análise dos mecanismos de textualização
Fizemos a releitura de alguns trechos dos textos a fim de detectar palavras
ou expressões que marcavam o tempo e o espaço e que contribuíam para a
articulação das frases. Aproveitei para falar sobre advérbios ou palavras que
indicam circunstâncias de tempo, lugar, modo, etc. Usei exemplos dos textos.
Falei também sobre as várias maneiras de nos referirmos a alguém ou a
algo utilizando substituições. Antes de iniciar as atividades propostas, utilizei
exemplos dos textos que eles produziram, para falar sobre as retomadas, as
substituições para evitar repetições, e sobre os tempos verbais. Durante a
realização das atividades, observei que a maioria dos alunos teve maior
dificuldade em reconhecer os tempos dos verbos.
Atividade: O parágrafo a seguir foi retirado do texto A. Leio-o e faça o que se pede. “Levantei e dei com as formigas pequenas e ruivas que entravam em trilha
espessa pela fresta debaixo da porta, atravessavam o quarto, subiam pela
parede do caixotinho de ossos e desembocavam lá dentro, disciplinadas como
um exército em marcha exemplar.”
a) Faça um círculo nas palavras que expressam ação e copie-as.___________
b) Em que tempo elas estão?_______________________________________
30
c) Que nome se dá às palavras que expressam ação?___________________
d) Agora, copie no caderno o parágrafo colocando as ações no tempo
presente.
h) Módulo 8: Análise dos mecanismos enunciativos
Nesta etapa, trabalhei com os alunos os recursos expressivos e efeitos de
sentido, sempre buscando exemplos em trechos dos textos. Iniciei falando das
vozes que falam nos textos. Expliquei a eles que nos textos narrativos,
geralmente têm duas vozes, a voz do narrador que é a que conta a história, e a
voz das personagens que conversam na história. Aproveitei, nesse momento,
para falar dos discursos direto e indireto, do uso adequado da pontuação, da
variedade linguística (norma culta, com a ocorrência de expressões coloquiais e
gírias nos discursos diretos) e da escolha lexical (substantivos e adjetivos)
privilegiadas nos textos. Neste módulo os alunos tiveram dificuldades em realizar
a atividade 3 que tratava da produção de uma entrevista, tinham muitas dúvidas
com relação ao uso da pontuação.
Atividade: O trecho a seguir foi retirado do texto B. Leia-o e escreva um
diálogo entre o casal e os jovens no momento da entrevista. Fique atento à
pontuação (uso do travessão a cada fala, o ponto de interrogação, etc.)
“A aposentadoria dos dois não estava dando para comprar os remédios caros
que usavam. Resolveram alugar dois quartos. Colocaram uma placa no poste.
Logo surgiram candidatos. O casal entrevistava os candidatos querendo saber
sobre os hábitos e costumes dos pretendentes.”
i) Módulo 9: Produção final
Levando em conta tudo o que foi estudado sobre o gênero, propus aos
alunos que produzissem um conto fantástico. Passei algumas orientações para
que eles pudessem direcionar seus trabalhos tais como:
31
a) crie as personagens que irão povoar o seu texto e dê características a
elas;
b) imagine, agora o cenário e dê características sombrias a ele;
c) Pense sobre o enredo, o que vai acontecer na sua história?
d) o narrador será personagem ou apenas observador? Defina.
e) agora é só começar a contar a história.
A partir dos encaminhamentos, começaram a buscar ideias, isso gerou
tumulto na sala. Alguns alunos não conseguiam encontrar um cenário para sua
história, foi necessário que eu fizesse algumas intervenções para que eles
decidissem. Logo, todos estavam produzindo.
j) Módulo 10 – Refacção
Terminada a produção recolhi os textos para fazer a verificação e o registro
dos problemas encontrados. Após essa verificação observei um avanço
significativo com relação à organização da estrutura dos textos, embora ainda
apresentassem problemas de ortografia, uso dos mecanismos de textualização,
porém, vale ressaltar que as atividades trabalhadas em cada módulo, após a
produção inicial contribuíram de forma significativa para melhoria da atividade de
escrita na produção final.
Os textos foram devolvidos aos alunos com algumas anotações, indicando
os problemas apresentados para que fizessem a releitura e a reescrita dos
mesmos, bem como os ajustes necessários.
Concluído o trabalho de refacção, os textos foram digitados, impressos
formando uma coletânea com um título escolhido pelos alunos “Histórias
Assustadoras” e encadernados para serem expostos na biblioteca da escola.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O nosso grande desafio é despertar o interesse do nosso aluno pelas
aulas, por isso estamos sempre buscando temas atrativos e práticas inovadoras,
32
e o conto fantástico é um gênero que desperta a curiosidade dos alunos,
principalmente alunos de 6º ano.
Esta proposta foi desenvolvida por meio de uma Sequência Didática,
ferramenta esta que propiciou realizar, de forma organizada, um trabalho
abrangendo leitura, escuta, oralidade, escrita e análise linguística a partir do
gênero conto fantástico.
Todas as atividades que compõem os módulos desta SD foram realizadas
pelos alunos. Um fator importante que contribuiu para que esse trabalho fosse
realizado na íntegra foi que não houve interrupção durante o período de
implementação.
No decorrer do processo acompanhei o desenvolvimento da turma em
todos os eixos trabalhados. Logo no início os alunos mostraram interesse pela
temática, o que facilitou muito o desenvolvimento do projeto. Houve participação
da maioria da turma em todas as atividades propostas, porém as aulas que eles
mais se envolveram foram as de leitura dos textos, as de produção oral e de
produção escrita, embora a ação mais difícil tenha sido a produção e reescrita
textual, nesta observei a dificuldade que os alunos têm em registrar suas ideias e
depois em analisar a sua produção. Contudo, a aprendizagem dos alunos foi
atestada a partir do reconhecimento e apreciação do gênero conto fantástico; da
apropriação da estrutura do gênero, bem como o reconhecimento de suas
características; da identificação de elementos que marcam o gênero tais como
temporalidade, ambientação, desenvolvimento da trama e a resolução; pela
organização da sequência narrativa do texto, utilizando estratégias de coesão:
uso de pronomes, substituição lexical e, em especial, pela interação com a leitura,
escrita e reescrita dos contos.
Essa forma de trabalho foi muito bem recebida pelos alunos, mesmo nos
momentos de refacção dos textos que foram os mais cruciais do projeto, a maioria
não desistiu, mas para isso foi necessário trabalhar com a autoestima do aluno,
fazendo-o entender a importância daquela prática para o seu desenvolvimento.
Ressalto que em vários momentos os alunos deixaram claro que essa
forma de trabalho é mais interessante do que a apresentada pelo livro didático,
portanto, não só valido a ferramenta SD como recomendo aos meus colegas de
todas as áreas. Mas, para que esse trabalho dê bons resultados não depende só
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do planejamento bem fundamentado das atividades didáticas ou de uma temática
pertinente ao contexto em que será realizada a transposição didática, é preciso
também que o professor tenha o domínio e a confiança da turma, rapidez nas
decisões quando houver necessidade de fazer adaptações imediatas e muita
dedicação, pois o trabalho é enriquecedor, porém, árduo.
REFERÊNCIAS
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